O uso de smartphones em sala de aula: um caso de estudantes do ensino médio em Cuiabá

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1. RESUMO

O smartphone (celular inteligente) se encontra atualmente com importante centralidade no cotidiano de uma parcela significativa de pessoas, principalmente em áreas urbanas. Este trabalho de conclusão de curso teve por objetivo analisar o uso de smartphones por estudantes do Ensino Médio em sala de aula. As metodologias de caráter qualitativo e quantitativo foram realizadas por meio de observações com descrições em diário de campo de uma turma do 2º ano do Ensino Médio de uma escola pública de Cuiabá, aplicação de questionários aos estudantes e realização de entrevistas semiestruturadas com os dois professores que ministravam as aulas onde sucederam as observações. Os resultados da pesquisa apontam que o smartphone está amplamente inserido na rotina dos estudantes e que eles utilizam esses aparelhos para diversos fins durante as aulas e nas pausas das aulas. Portanto, desenvolveram formas de usos para não serem surpreendidos pelos professores. Foi identificado que a sanção da lei estadual nº 10. 232, em dezembro de 2014, que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula exceto para fins pedagógicos, não alterou de forma significativa os eventos em relação ao uso dos smartphones pelos estudantes nas classes.

Palavras-chave: Smartphone. Estudante. Sala de aula. Juventude. Consumo de tecnologia.

ABSTRACT

The smartphone is very important in daily life, especially in urban areas. This work aimed to analyze the use of smartphones by high school students in the classroom. The qualitative and quantitative methodologies were made by observation of a class in a public high school, questionnaires to students and interviews with the two teachers who taught the classes where the observation was made.The research results indicate that the smartphone is largely inserted into the routine of the students, and they use these devices during classes and classes breaks for various purposes. However, they developed ways of using the smartphones without getting caught by teachers. It was identified that the state law that prohibits the use of electronic devices in the classroom, except for educational purposes, didn’t make any significantly changes in the use of smartphones by students in the classroom.

Keywords: Smartphone. Student. Classroom. Youth. Technology consumption.

2. INTRODUÇÃO

Esta pesquisa intitulada “O uso de smartphones em sala de aula: um caso de estudantes do Ensino Médio em Cuiabá” surgiu primeiramente da observação pessoal da intensa utilização de smartphones1 por uma grande parcela da população urbana em espaços como ônibus, bancos, restaurantes, lojas entre outros. Logo, os jovens estudantes também estão de posse destes aparelhos nas salas de aula.

A construção deste trabalho advém do interesse em analisar o fenômeno do uso dos telefones celulares a partir de elementos sociológicos. Portanto, se tratando de uma pesquisa para trabalho de conclusão de licenciatura em Ciências Sociais, foi optado pelo recorte com o objetivo de investigar os usos de smartphones em sala de aula por estudantes do Ensino Médio. Contudo, os estudos que abordam o tema são majoritariamente das áreas da Educação e Comunicação Social. Estes estudos têm por objetivo pensar o uso das Tecnologias da Informação e Comunicação (TICs) como ferramentas pedagógicas. Como não foram localizadas pesquisas no campo da Sociologia nas plataformas pesquisadas (Google acadêmico, Scielo, Google, Bibliotecas virtuais de Instituições de Ensino Superior) a respeito do uso do celular em sala de aula, alguns contributos sociológicos foram relevantes na análise da tecnologia e sociedade. Além disso, houve como apoio a perspectiva da Educação acerca da relação entre escola e culturas juvenis, e de estudos das Ciências Sociais sobre consumo na sociedade contemporânea.

Após o início do projeto desta pesquisa, foi sancionada a lei estadual 10.232/20142 proibindo em escolas fundamentais e médias de Mato Grosso o uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula, exceto para fins pedagógicos. A nova lei não foi compreendida como empecilho para a construção da pesquisa, mas sim um elemento novo diante do objetivo de analisar o uso do smartphone pelos estudantes em sala de aula.

A pesquisa constituiu-se a partir da formulação do problema se os estudantes fazem uso intenso do smartphone em sala de aula. Deste modo, o objetivo geral pretende analisar o uso do smartphone pelos estudantes em sala de aula, e os objetivos específicos visam identificar quais as finalidades do uso do smartphone pelos estudantes em sala de aula; analisar o que motiva os estudantes a utilizarem o smartphone em sala de aula; verificar se os estudantes se sentem constrangidos com a proibição do uso do smartphone em sala de aula; analisar como o smartphone está inserido nas relações entre os estudantes em sala de aula; verificar por que os estudantes possuem o modelo de celular smartphone; identificar como os estudantes têm alcance ao consumo do aparelho smartphone; verificar o perfil socioeconômico dos estudantes e analisar o que os professores das aulas observadas pensam sobre o uso de smartphones pelos estudantes em sala de aula. Assim, foram levantadas as seguintes hipóteses: os estudantes utilizam o smartphone diversas vezes em sala de aula com variadas finalidades; os estudantes desenvolveram maneiras de utilizar o smartphone em sala de aula, a fim de não serem surpreendidos pelos professores.

A pesquisa de caráter qualitativo e quantitativo foi realizada a partir de levantamentos bibliográficos, observações com descrições em diário de campo (etnografia) de um grupo de estudantes do 2º ano matutino da Escola Estadual “Moreira” 3, aplicação de questionários aos estudantes e realização de entrevistas semiestruturadas com os professores que ministravam as aulas observadas. As metodologias da pesquisa serão abordadas em capítulo específico.

Na primeira seção deste trabalho foi tecida uma revisão bibliográfica de algumas produções teórico-acadêmicas que dialogam com o tema da pesquisa. No segundo capítulo foram tratados o histórico do smartphone e discussões sobre a tecnologia na educação. O terceiro capítulo trouxe informações sobre as metodologias e relatos do diário de campo. Por fim, o último capítulo analisou os dados empíricos levantados pela pesquisa.

3. Capítulo 1 - TECNOLOGIA E SOCIEDADE: REVISÃO DA LITERATURA

Atualmente o uso do smartphone tem sido central para uma significativa parcela da população urbana, e os jovens estudantes estão de posse destes aparelhos nas salas de aula. Conforme pontuado na introdução deste trabalho, não foram localizadas pesquisas da Sociologia a respeito do uso do smartphone em sala de aula, mas alguns contributos sociológicos foram relevantes na análise da relação entre tecnologia e sociedade, além do auxílio de pesquisas da Educação e demais Ciências Sociais. Portanto, este trabalho não pretende abordar toda a produção teórico-acadêmica que dialogue com o tema do uso de telefones celulares. A revisão de literatura a seguir busca expor alguns estudos publicados em livros impressos, e-books4 e artigos científicos que foram relevantes para a constituição da pesquisa.

O smartphone sofreu transformações ao longo dos anos, e o avanço tecnológico permitiu que este modelo de telefone celular se configure atualmente como uma pequena central multimídia, com diversos aplicativos e algumas capacidades de um pequeno computador portátil. Segundo Castells (1999), a revolução tecnológica do século XX desenvolveu a tecnologia digital que se caracteriza pelo empacotamento de variadas mensagens, som, imagens e dados. A linguagem e comunicação globais passaram a existir de forma horizontal sem centros de controle.

Para Castells (1999), hoje a sociedade se integra em rede, e existe uma transformação das sociabilidades, cujos contatos são cada vez mais autodirigidos e selecionados por meio de códigos. Portanto, ocorre uma sociabilidade em rede independente do meio, pode ser via internet, telefones celulares ou face a face. Dentro da rede só é possível que sejam compartilhados os mesmos códigos de comunicação, baseados em valores, por exemplo. A questão fundamental para o autor é o desenvolvimento de redes de sociabilidades baseadas em escolhas por afinidade. A formação dos grupos de pares em torno desses códigos e significados compartilhados entre seus membros levam ao surgimento da identidade coletiva. Cabe salientar, que as culturas juvenis também se caracterizam pela presença desses códigos.

No capítulo The Mobile Youth Culture in Cross-Cultural Perspective do livro Mobile Communication and Society: a global perspective (2007), Castells e outros autores analisam estudos importantes desenvolvidos entre os anos 2000 e 2004 na Europa que tratam da relação dos jovens com seus telefones celulares. Essas pesquisas estavam voltadas para o momento onde os aparelhos eram utilizados pelos jovens principalmente para envio de mensagens de texto via SMS, pois possuíam tarifações mais baixas e exigia tempo para escrever a mensagem. Ou seja, isso caracterizava uma diferenciação dos adultos que tinham neste tipo de telefone uma ferramenta de trabalho para atender e realizar ligações.

Apesar da diferença temporal e espacial das análises de Castells et al (2007), as mesmas não devem desconsideradas. Para os autores na atual sociedade em rede as culturas juvenis se constroem numa perspectiva transcultural, apesar das suas particularidades existem práticas juvenis difundidas de forma global com variações nacionais em cada sociedade. A maneira como os jovens criam expressões e formas de escritas específicas nas suas mensagens de texto, os distingue dos adultos e de outros grupos juvenis. Neste sentido, a comunicação é crucial na formação e manutenção de identidade coletiva da juventude.

Segundo Castells et al (2007, tradução nossa), a cultura jovem encontrou na comunicação via celular uma forma importante de expressão. Os autores explicam que as tecnologias se difundem apenas em estruturas sociais e valores culturais já existentes. Portanto, quando uma determinada cultura utiliza uma potente tecnologia que se encaixa em seu padrão, essa tecnologia cresce e abrange uma proporção sempre maior no seu grupo de referência, neste caso a juventude.

Conforme explica Canclini (2005), a internacionalização ampliou os limites territoriais através das práticas de consumo. Adultos e principalmente jovens estão em “sintonia” com o mundo através de logotipos de marcas criadas fora do país. O nacional se tornou o fragmento de vários países, havendo uma interação econômica de culturas dispersas ao incorporar bens materiais e simbólicos de outras sociedades.

É comum a sociedade contemporânea ocidental associar o uso e centralidade de tecnologias emergentes às vivências juvenis. O artigo Digital natives, digital imigrantes publicado em 2001 por Prensky, afirma que os jovens são “nativos digitais”, e os adultos ao contrário, “imigrantes digitais”. Conforme propõe o próprio título, os jovens dominariam o idioma digital, porque nasceram permeados por esse tipo de tecnologia. Porém, Fantin (2010) afirma que muitos adultos estão inseridos no contexto dos dispositivos digitais, e observa que essas tecnologias de grande uso entre os jovens não foram por eles criadas. Logo, essa distância entre adultos e jovens é menos significativa do que propõe a teoria de Prensky. Para a autora o conceito de “nativos digitais” deve ser utilizado com ressalvas, já que essa definição compreende que apenas os jovens falam o “idioma digital”.

A grande difusão de tecnologias digitais no cotidiano de diversos grupos adultos e juvenis tem despertando discussões nas áreas da Educação e Comunicação com o objetivo de utilizar as tecnologias em prol do ensino/aprendizagem. Pois, os estudantes além de fazerem usos de computadores e jogos digitais fora da escola levam para a sala de aula os telefones celulares.

O filósofo Pierre Lévy, estudioso da cultura virtual contemporânea, afirma que o professor deve se tornar um “animador” da inteligência coletiva dos grupos de estudantes. As tecnologias da informação e comunicação devem ser por eles utilizadas centralizando a atividade no intuito de acompanhar e administrar os aprendizados, incitamento “a mediação relacional e simbólica e a pilotagem personalizada dos percursos de aprendizagem etc.” Para o autor é importante o uso de ferramentas tecnológicas para ensinar e aprender, a exemplo, do ensino a distância, já que paralelo a crescente demanda por educação no mundo, existe uma limitação na quantidade de professores. (LÉVY, 1999, p. 171).

Contudo, Assis (2013) explica que no Brasil desde a década de 1980 alguns estudos vêm pensando a inserção de tecnologias e do computador na escola. Mas, no dia a dia são observados muitos problemas no que se refere a escola e as TICs. A escola pública no país demanda implementação de várias políticas públicas, logo, as necessidades imediatas raramente são relacionadas às tecnologias, tornando a possibilidade de utilização destas, mais problema do que solução. A autora observa que enquanto o estudante possui um celular moderno, algumas escolas nem têm computador com acesso a internet.

Para Pauly & Vivian (2012), alguns educadores possuem uma visão otimista da tecnologia na escola e defendem o uso do celular em sala de aula. Muitos recursos tecnológicos dos quais as escolas públicas sempre careceram estão agora nas mãos dos estudantes, e isso deveria ser explorado em favor do ensino. Muitos estados brasileiros já possuem leis de proibição ao uso dos celulares em sala de aula, reafirmando a ideia de haver mais aspectos negativos que positivos nos usos destes aparelhos em sala de aula.

Zuin (2010) critica o modo como as TICs foram consideradas no documento final da Conferência Nacional de Educação (CONAE), cujas considerações servem de base para a elaboração das diretrizes e estratégias de ação do novo Plano Nacional da Educação (PNE) 2011-2020. As inovações tecnológicas causaram importantes ressignificações no que concerne infância, inclusão e exclusão social e nos processos educacionais formativos. Assim, o tema das TICs não deveria ser assunto secundário e superficial neste documento. A ênfase sobre os aspectos técnicos envolvidos no uso dos instrumentais listados no documento não pode ser absolutizada a ponto de ofuscar a necessária discussão sobre o papel da tecnologia como processo social que reconfigura as características identitárias dos agentes educacionais. (ZUIN, 2010, p. 967).

Nas discussões acerca das tecnologias, escola e sala de aula, existe um sujeito central, o estudante, compreendido como jovem, geralmente apontado como transgressor das regras e ordens impostas. Para Mannheim (1968), os estudantes das últimas séries do Ensino Médio não integram à contribuição da tessitura psicológica e econômica da sociedade constituída, e pouco se interessam ou conhecem sobre a ordem existente. É comum a inadequação deles ao mundo dos adultos, pois enquanto eram crianças viviam sob a regulação de tradições e emoções familiares, mas ao se tornarem jovens entram em contato com a vida pública, sociológicamente falando, são inseridos ao mundo em que os costumes, valores, crenças e hábitos são diferentes do que conheciam até aquele momento. Mannheim explica que o conflito de valores muitas vezes antagônicos é comum às sociedades modernas, pois nas sociedades primitivas o rompimento entre ensinamento familiar e vida pública ocorre de forma sutil.

Dayrell (2007) explica que ainda persiste a separação entre sociedade e escola, onde essa última deveria levar ao estudante valores e normas universais. Muito próximo ao modelo que regia o mundo do trabalho na sociedade moderna, esperava-se que esses sujeitos fossem disciplinados, obedientes, pontuais e se envolvessem aos estudos com eficiência. Segundo o autor, a escola foi invadida pela vida juvenil, com seus estilos, costumes, práticas de grupos, amizades, namoros etc. Portanto, hoje esses jovens não se transmutam em estudantes como no passado, mas constroem eles mesmos a experiência como tal.

Para Castells et al (2007, tradução nossa), a crise da família patriarcal tradicional fez muitos jovens se emanciparem mais cedo. Contudo, a família continuou sendo suporte financeiro e apoio emocional para os mesmos. Logo, a manutenção e existência da condição dos jovens tem se relacionado a gerenciar autonomia e segurança em suas relações familiares.

Ao analisar as pesquisas desenvolvidas sobre a relação dos jovens e telefones celulares, Castells et al (2007, tradução nossa), afirmam que o celular tem se mostrado uma das mais importantes ferramentas na manutenção dos grupos de pares juvenis. Para os autores o telefone celular permite que a rede social dos jovens esteja sempre alinhada, ampliando as esferas de intimidade, formas e momentos de comunicação que estão no cerne da juventude móvel.

Atualmente os jovens estudantes possuem em mãos o smartphone, um modelo de telefone celular que ampliou a capacidade comunicacional do modelo de aparelho anterior, principalmente por agregar diversos aplicativos e permitir conexão com a internet. Ao questionamento do que são vivências “reais” ou “virtuais”, Castells (1999, p.455), explica:

Em todas as sociedades, a humanidade tem existido em um ambiente simbólico e atuado por meio dele. Portanto, o que é historicamente específico ao novo sistema de comunicação organizado pela integração eletrônica de todos os modos de comunicação, do tipográfico ao sensorial, não é a indução à realidade virtual, mas a construção da realidade virtual. (...) “virtual” é o que existe na prática, embora não estrita ou nominalmente, e “real é o que existe de fato”.

Castells (1999) afirma ainda, que esses novos sistemas de comunicação implicam uma transformação radical no espaço e tempo que são fundamentais à vida humana. O tempo é eliminado, pois passado, presente e futuro podem estar interagindo na mesma mensagem. O autor define esses espaços de fluxos contínuos e intemporais de “cultura da virtualidade real”, já que transcendem o que foi historicamente transmitido e ao mesmo tempo o incluí, onde o “faz de conta” vai se tornando realidade. A capacidade de abrangência de diversas culturas na rede digital implica na presença ou ausência dentro desse sistema de comunicação, ou seja, é necessário estar integrado ao mesmo para comunicar e socializar mensagens. “Todas as outras mensagens são reduzidas à imaginação individual ou às subculturas resultantes de contato pessoal, cada vez mais marginalizadas.” (CASTELLS, 1999, p. 457- 458).

Já para Levy (1996), a virtualização promove a unidade do tempo sem a unidade de espaço, sendo que a sincronização substitui a unidade de lugar, e a interconexão, a unidade de tempo. A virtualização não está apenas relacionada ao desenvolvimento acelerado das tecnologias de informação e comunicação. As invenções de novas velocidades já possuem um grau da virtualização, os meios de transporte, por exemplo, possibilitam maior interação de pessoas situadas em locais distantes através da maior possibilidade de deslocamento entre um local e outro.

A partir de outra perspectiva da ação do tempo, Bauman (2001), explica que as constantes mudanças e adaptações atuais fazem parte do que ele denomina de “tempos líquidos. A liquidez está associada à fluidez e capacidade de se mover facilmente. A modernidade com o objetivo de dissolver aquela sociedade estagnada e resistente às mudanças necessárias ao “espírito moderno”, encontrou na liquidez a possibilidade de retirar a centralidade das tradições e valores que suprimiam o instrumental racional. Assim, era necessário construir uma nova solidez aperfeiçoada, “imune a qualquer ação que não fosse econômica”. Para o autor, essa nova ordem veio dominar outras esferas da vida humana, pois “o que quer que pudesse ter acontecido nessa vida tornou-se irrelevante e ineficaz no que diz respeito à implacável e contínua reprodução dessa ordem”. (BAUMAN, 2001, p.9).

Para Giddens (2002), vivemos uma alta modernidade, onde a ordem pós-tradicional acentuou as principais características da modernidade (para o autor a modernidade ainda está em movimento). A grande disseminação de mídias eletrônicas e a globalização levaram a inevitável escolha de um estilo de vida. Ter um estilo de vida, significa incorporá-lo a rotina através de diversas práticas, como vestir, comer, agir, escolher lugares e etc., ou seja, é principalmente dar forma material a auto-indentidade, não necessariamente preencher urgências utilitárias. Entretanto, todas essas escolhas estão sempre suscetíveis a mudanças.

Castells (1999) afirma que a revolução da tecnologia da informação foi fundamental para a reestruturação do sistema capitalista a partir da década de 1980.

O informacionalismo visa o desenvolvimento tecnológico, ou seja, a acumulação de conhecimentos e maiores níveis de complexidade do processamento da informação. Embora graus mais altos de conhecimentos possam resultar em melhores níveis de produção por unidade de insumos, é a busca por conhecimento e informação que caracteriza a função da produção tecnológica no informacionalismo. (CASTELLS, 1999, p. 54).

A partir das análises de Castells, cabe pontuar que o lançamento de tecnologias agregando um novo componente com funcionalidade mais avançada é constante. Logo, informacionalismo além de produzir mais em curto período, também permite que aparelhos diferentes sejam lançados no mercado em menor espaço de tempo, e ainda, quando um produto é apresentado ao mercado já existe conhecimento e tecnologia para produção de vários modelos subsequentes.

Para Silva (2012), a obsolescência programada que surgiu na indústria do século XX, é central na discussão sobre o processo que leva as pessoas a consumirem um produto de novo modelo em um curto espaço de tempo. A obsolescência programada não diz respeito apenas a durabilidade dos produtos, não se limita a questão especificamente tecnológica, está também no âmbito psicológico. Para muitos ser feliz está associado a adquirir o último modelo de qualquer coisa para “estar na moda”, ou seja, esses sujeitos estão atendendo a necessidades fabricadas pelo mercado.

A obsolescência programada (...) é uma estratégia da indústria para “encurtar” o ciclo de vida dos produtos, visando a sua substituição por novos e, assim, fazendo girar a roda da sociedade de consumo. Poderíamos dizer que há uma lógica da “descartabilidade” programada desde a concepção dos produtos. Em outras palavras, as coisas já são feitas para durarem pouco (...). (SILVA, 2012, p. 182).

No Brasil as políticas de estímulo ao consumo têm relação direta com a melhoria da renda dos trabalhadores. Para Pochmann (2014), houve nos últimos anos diminuição na base da pirâmide do país, ou seja, uma parcela da população saiu da linha da miséria e passou a fazer parte do grupo dos trabalhadores pobres das grandes cidades com acesso a crédito, e consumo de bens anteriormente acessíveis apenas a classe média. Esses produtos foram popularizados em decorrência das alterações produtivas do capitalismo e das políticas de distribuição de renda. Assim, o autor aponta que a fragmentação do processo produtivo na globalização capitalista diminuiu o valor de produção de bens considerados duráveis como eletrodomésticos, computadores e smartphones, tornando-os produtos de consumo dos trabalhadores, mas, sem fazer deles uma classe média. Apenas uma pequena parcela terá acesso a bens de maior valor como casa própria, automóvel, ou ingressarão ao ensino superior.

Os novos modelos de telefone celular foram rapidamente absorvidos pela população brasileira nos grandes centros e em cidades do interior do país como Cuiabá. De acordo com estudo realizado no Brasil pela International Data Corporation (IDC) 5, no ano de 2014 o país havia comercializado 54 milhões de smartphones, representando 76,1% dos aparelhos celulares. Em Maio de 2015 os smartphones já representavam 94,4% do mercado total de telefones celulares no país.

Segundo a Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada em 2014 e divulgada pelo Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE) em abril de 2016, o smartphone se tornou o maior meio de acesso a internet pelos brasileiros, de 2013 para 2014 o percentual passou de 53,6% para 80,4%.

Barbosa (2004), afirma ser importante pensar o consumo no Brasil além das perdas e ausências. Devem ser enfatizadas as melhoras no padrão de vida dos grupos que antes não tinham acesso a esses bens, e desvincular os temas do materialismo, lassidão moral, individualismo etc., tão pejorativos e associados ao consumo desde o início do século XVII. Para a autora, as análises negativas sobre o consumo dificultam e misturam conceituação e análise sociológica com moralidade e crítica social.

A antropologia do consumo busca trazer às suas análises aspectos subjetivos das escolhas de consumo. Para Douglas & Isherwood (2013), quando um sujeito consome pretende assegurar que os outros farão parte do seu ritual e que ele também será convidado ao deles. Deste modo, através do consumo os sujeitos definem os eventos que são tradicionalmente importantes e menos importantes, como dia das mães, natal e ano novo. “O desfrute do consumo físico é só uma parte do serviço prestado pelos bens: a outra parte é o desfrute do compartilhamento de nomes” (DOUGLAS; ISHERWOOD, 2013, p. 122).

Os estudos descritos neste capítulo inicial de revisão da literatura tratam de um breve panorama acerca das principais referências utilizadas nesta pesquisa para discutir o uso e consumo de tecnologias digitais pela sociedade urbana contemporânea, e da relação dos jovens estudantes com o smartphone.

4. Capítulo 2 - UM BREVE HISTÓRICO SOBRE O SMARTPHONE

Segundo Ipanema & Ipanema (1967), há aproximadamente 40 mil anos surgiu através da tinta a forma mais primitiva de comunicação. O homem pré-histórico começou a inscrever nas paredes das cavernas o que hoje é conhecido como arte rupestre, a partir daí foram criados instrumentos para melhor utilizar a tinta, e um suporte para receber registros. Esses instrumentos desenvolvidos para auxiliar/melhorar a comunicação, também são chamados de tecnologia. Portanto, o smartphone pode ser apontado como um aparelho tecnológico contemporâneo integrante da história que a sociedade ocidental vem desenvolvendo no propósito de se comunicar.

Conforme explicam Ipanema & Ipanema (1967), no século XV quando já existiam os manuscritos a base de tinta e papel, surgiu a prensa de tipos móveis, criada pelo alemão Johannes Gensfleish Gutenberg. O livro impresso se tornou então a grande invenção do período moderno, e mais de um século e meio depois nasceu o jornal impresso. Durante os séculos XVII, XVIII e XIX o jornal periódico foi protagonista na divulgação de notícias, e também utilizado como meio de dominação ideológica pela nobreza e aristocracia europeia.

Segundo Castells (1999), entre os anos 1960 e 1964, Paul Baran visou e criou na Rand Corporation um sistema de comunicação que não fosse vulnerável a ataques nucleares. Essa tecnologia de comunicação criada por Baran era baseada na troca de pacotes e possuía uma rede independente de centros de comando, logo, a mensagem procurava sua rota na rede e poderia voltar a ter sentido coerente em qualquer ponto dela.

Quando, mais tarde, a tecnologia digital permitiu todo o tipo de empacotamento de todos os tipos de mensagens, inclusive de som, imagens e dados criou-se uma rede que era capaz de comunicar seus nós sem usar centros de controles. A universalidade da linguagem digital e a pura lógica das redes do sistema de comunicação geraram as condições tecnológicas para a comunicação global horizontal. (CASTELLS, 1999, p.82).

Castells (1999) afirma, que o primeiro grupo de computadores em rede, a ARPANET, nome do seu patrocinador, começou a operar em setembro de 1969, em centros de pesquisa da Universidade da Califórnia, Santa Bárbara e na Universidade de Utah. Esses centros contribuíam com pesquisas ao departamento de defesa dos Estados Unidos, mas os cientistas passaram a utilizar a rede também para comunicação entre eles. Em 1983 houve a divisão entre ARPANET para fins científicos e MILNET para aplicações militares.

Athique (2013, tradução nossa), compreende o avanço das tecnologias de forma importante durante a Guerra Fria ocorrida entre os Estados Unidos e União Soviética, no período de 1945 a 1991. Neste contexto o capitalismo e comunismo se lançaram numa intensa competição científica com objetivo de dominar as tecnologias existentes naquele período. Segundo o autor, o processo de miniaturização da informática se deu relacionado à questões de ordem política, cultural e, sobretudo, mediante interesses estatais de controle que passavam pela guerra, e interesse na expansão de mercados. O desenvolvimento das mídias digitais em especial o processo de miniaturização dos computadores surgido nos anos 70, se deu principalmente em consequência da disputa pela corrida espacial que demandava tornar objetos tecnológicos portáteis e, portanto, viáveis de serem acoplados aos ônibus e foguetes espaciais.

Porém, Castells (1999) compreende que a expansão da microinformática não deve ser explicada por uma necessidade da Guerra Fria. O choque ocasionado pelo Sputink6 (entre 1957 e 1960) foi respondido com tecnologias desenvolvidas na década de 60, não da década de 70, e o impulso da tecnologia militar norte americana se deu em 1983 com o programa “Guerra nas Estrelas” que expandiu as tecnologias da década anterior. Apesar de a internet ter se originado de pesquisas patrocinadas pelo Departamento de Defesa dos Estados Unidos, só foi usada para aplicações militares anos depois, no mesmo período em que os grupos da contracultura estavam se organizando para expandir os usos das redes. Portanto, a miniaturização e o desenvolvimento de tecnologias como computadores pessoais é muito mais consequência de uma conjuntura estabelecida na Califórnia dos anos 70, do que de necessidades militares.

[...] a invenção do microprocessador por Ted Hoff, enquanto tentava atender ao pedido de uma empresa japonesa fabricante de calculadoras de mão em 1971, resultou dos conhecimentos e habilidades a cumulados na Intel, em uma estreita interação com o meio de inovação criado desde 1950, no Vale do Silício. Em outras palavras, a primeira revolução em tecnologia da informação concentrou-se nos Estados Unidos e, até certo ponto, na Califórnia nos anos 70, baseando-se nos progressos alcançados nas duas décadas anteriores e sob a influência de vários fatores institucionais, econômicos e culturais. Mas não se originou de qualquer necessidade preestabelecida. (CASTELLS 1999, p. 98).

Conforme explica Lemos (2010), a microinformática foi formulada por radicais californianos que tinham por objetivo descentralizar a informação do poder científico, econômico, industrial e militar. Existiram então dois eventos importantes: um técnico, marcado pelo advento das tecnologias digitais, da miniaturização de componentes, do aumento da memória e da velocidade de processamento, além da invenção de máquinas com menor valor e mais potentes. O outro sociocultural, que diz respeito a efervescência de sociedades digitais e origem da cibercultura. Nessa conjuntura a contracultura buscou transformar o computador racional, individual e desconectado numa rede planetária de computadores interligados.

Segundo Coutinho (2014), no contexto da profusão da internet e da sua capacidade de comunicação instantânea e não instantânea que surge em 1992 o denominado primeiro smartphone. O Simon, desenvolvido pela IBM, revolucionário para a época possuía tela sensível ao toque e teclado para envio de mensagens e e-mails, porém não se perpetuou entre seus usuários por motivos incertos e logo foi retirado do mercado.

Para Lemos (2010), o uso comum do termo “novas tecnologias de comunicação” para designar mídias digitais recém-lançadas, deve ser utilizado com cautela, pois essa concepção de “novo” pode ser utilizada no sentido de que uma “nova era” seja fundamentalmente diferente das anteriores. “Tecnologia emergente” é o mais adequado a ser utilizado. Conforme explica Santaella (2007 apud Lemos, 2010), uma tecnologia ao surgir é recebida aos poucos pela sociedade e assim gradualmente se coloca junto das demais. Para a autora a tecnologia emergente diz respeito ao que está em destaque naquele momento histórico e esses remanejamentos provocam novos ambientes socioculturais.

Segundo Mccarty (2011), apenas em 1997 a Ericcson utiliza propriamente o termo smartphone ao lançar o modelo GS88, porém a Nokia havia lançado o modelo 9000 communicator no ano anterior que obteve maior sucesso de vendas e críticas, sendo então considerado o primeiro smartphone por excelência.

O sistema operacional da Nokia (Symbiam OS) foi líder de mercado de 1996 até 2011, quando surgiu o Android sistema operacional para smartphones da Google. Cabe abrir um parêntese para o lançamento do Iphone em 2007, idealizado pela Apple com formato e aplicações peculiares que permanecem até os dias atuais e fizeram parte do movimento de popularização de smartphones pelo mundo.

Imagem 1 – Nokia 9000 Communicator (1996)


Fonte:
Site computer history 7

Conforme aponta a pesquisa de Coutinho (2014), o smartphone que em tradução literal significa “telefone inteligente”, não possui definição exata e definitiva pelo meio acadêmico, mas é difundido pela indústria como aparelho celular de altíssima tecnologia, ou que oferece recursos parecidos aos de um notebook, suportam uma série de aplicativos desenvolvidos por outras empresas (terceiros), e operam com sistemas como Android, IOS e demais menos populares. O autor obtém um conceito mais completo para smartphone no estudo A Risk Of Assesment Method for smartphones, realizado pelo departamento de informática da Athens University of Economics and Business:

Smartphone é um celular com capacidade avançada, que executa um sistema operacional identificável permitindo aos usuários estenderem suas funcionalidades com aplicações terceiras que estão disponíveis em uma loja de aplicativos [...] devem incluir um hardware sofisticado com: a) capacidade de processamento avançada (CPU’s modernas, sensores) b) Capacidade de conexões múltiplas e rápidas (Wi-Fi, HSDPA) e c) tamanho de tela adequado e limitado. Além disso, seu Sistema Operacional deve ser claramente identificável, como Android, Blackberry, Windows Phone, Apple`s IOS, etc. (THEOHARIDOU; MYLONAS; GRITZALDIS, 2012, apud COUTINHO, 2014, p. 13, tradução do autor).

Imagem 2 – Modelo de smartphone em 2015


Fonte:
Site mobile expert 8

Segundo pesquisa realizada pela Gartner (consultoria norte americana especializada no mercado de tecnologia) entre abril e junho de 2015 foram vendidos no mundo 329,6 milhões de smartphones.9 As informações divulgadas no portal TechTudo em agosto do mesmo ano, afirmam, que deste total, 319 milhões – ou 96,8% do total – rodam os sistemas Android e IOS. Esses sistemas operacionais assim como o popular Windows em computadores, sustentam e administram todos os programas existentes no aparelho celular.

Além das características supracitadas, o smartphone possui redes de internet móveis com alta velocidade 3G (terceira geração) e 4G (quarta geração) e acessam redes locais sem fio através de wi-fi (Wireless fidelity). A rede wi-fi é formada por ondas de rádio e suporta conexão de vários usuários simultaneamente, assim, é possível acessar à internet no limite de algumas centenas de metros sem necessidade de conexão a um cabo de rede. Esses celulares também apontam localização geográfica através do GPS- Geopositioning System,(sistema de posicionamento terrestre) e podem acessar redes sociais que utilizam deste recurso.

Pontuando o smartphone no contexto das mídias emergentes com sua multiplicidade de aplicativos, entre eles os populares whatsApp10 e facebook11 , é possível afirmar que estes recursos estão inseridos no sentido da comunicação descentralizada, entre grupos e pessoas, sendo utilizados para conversas informais entre amigos e familiares ou mesmo para assuntos relativos a trabalho. O smartphone é então um aparelho tecnológico de comunicação móvel com grande centralidade na atual vida dos sujeitos, principalmente em áreas urbanas.

4.1. A tecnologia na educação

As abordagens sobre o uso da tecnologia na educação estão em sua maioria amparadas por estudos da Educação e Comunicação Social, onde a inserção destas teria o objetivo de tornar as aulas mais atraentes e menos expositivas. Se tratando especificamente do celular, muitos desses trabalhos explanam sobre as potencialidades da câmera, vídeo, pesquisa, internet, entre outros, presentes no aparelho. E ainda advertem que o uso de laboratórios de informática não deve servir apenas para aprender a usar o computador e seus programas. Logo, professores de diversas disciplinas devem criar aulas possíveis a este espaço, muitas vezes pouco explorados nas escolas, ora por problemas estruturais, ora por falta de qualificação dos educadores.

Conforme explica Assis (2013), no Brasil desde a década de 1980 estudiosos vem pensando a inserção de tecnologias e do computador na escola. Contudo, no dia a dia são observados muitos problemas no que se refere as TICs (Tecnologias da informação e comunicação) e a escola. São limitações de ordem estrutural, de utilização dos aparelhos pelos professores e dificuldades da gestão escolar em adotar a tecnologia como recurso pedagógico. O projeto Um Computador por Aluno (UCA) criado em 2010 capitaneado pelo Ministério da Educação é um exemplo que não obteve sucesso nem mesmo no âmbito piloto. Haviam casos onde existia o projeto, mas a rede elétrica não conseguia carregar os laptops e a internet era lenta, além do professor que não tinha suporte técnico para utilização dos aparelhos. Para a autora a escola pública no país demanda da implementação de várias políticas públicas, ou seja, muitas vezes existem necessidades mais imediatas que o uso das tecnologias, o que “atropela” a utilização das mesmas e consequentemente acabam sendo vistas mais como problema do que solução. Observa ainda, que existe um descompasso entre o que a escola proporciona e a realidade, enquanto o estudante possui um celular de modelo avançado, algumas escolas nem possuem um computador com acesso a internet.

Martin (2014) salienta que estudos relativos ao uso dos celulares pela população tiveram início em países da Ásia como Coreia do Sul, Singapura, Taiwan e Japão, e a partir de 2001 em países da Escandinávia. A autora observa que essas pesquisas verificaram particularidades culturais e socioeconômicas nos padrões de adoção e na construção de regras de usos em cada país estudado, além da recorrente constatação de que os jovens estão sempre entre seus principais usuários. No Brasil estudos com essa temática são ainda recentes, já que até 2006 esses aparelhos ainda eram pouco populares no país.

Bento & Cavalcante (2013) propõem o uso das tecnologias em sala de aula como instrumento pedagógico. Os autores colocam que a crescente desenvolvimento e popularização de equipamentos de comunicação móvel, como o celular, lançam um desafio aos educadores de se adequarem ao uso dos mesmos, e estarem preparados para mediar a utilização dos objetos tecnológicos como ferramenta de aprendizado. Portanto, a tecnologia é um item motivador e o estudante deve ser convidado a interagir nos processos de ensino e aprendizagem.

Souza (2013) afirma que a tecnologia seria um item motivador dos estudantes durante o processo de aprendizado. É necessário deixar o modelo tradicional do professor como sujeito central, e pensar um ensino aprendizado dinâmico, interativo e integrado em contextos com significados para os estudantes. A autora observa que elementos como a disciplina, didática, pedagogia e experiências do professor devem dialogar com a inserção da tecnologia no cotidiano dos educadores. As mensagens de texto nos celulares, por exemplo, poderiam ser utilizadas como estímulo a escrita, leitura e estudos de gêneros textuais. Assim, as TICs podem transformar a sala de aula em um novo local de aprendizado.

Pauly & Vivian (2012) observam que educadores defensores da utilização do celular em sala de aula possuem uma visão mais otimista. A escola pública sempre sofreu da deficiência de recursos tecnológicos e agora muitos estudantes estão com eles em mãos e isso deveria ser explorado em favor do ensino. Os autores ainda atentam para fato de muitos estados do Brasil já possuírem leis que proíbem o uso dos celulares em sala de aula, reafirmando a ideia de que as maiorias, inclusive alguns educadores, veem mais aspectos negativos que positivos no uso dos aparelhos celulares em sala de aula. No entanto, deve-se entender que muitos profissionais criam barreiras para o uso de tecnologias, e mesmo com acesso a elas continuarão a ministrar aulas sem inovação. Logo, tais práticas não devem ser impostas aos professores, mas eles devem compreender essa necessidade e seus resultados.

Deste modo, Moura (2010) aponta que proibição do uso do celular e demais aparelhos, continuará sem sentido enquanto os professores não encontrarem estratégias para o uso dos dispositivos em práticas pedagógicas. Para o autor, o celular não deve substituir outros meios de aprendizado, mas ser integrado a eles, já que faz parte de uma cultura social. Porém, incluí-lo no aprendizado formal é um grande desafio para as instituições tradicionais de educação.

No ano de 2007, surgem as primeiras leis de proibição do uso de celulares em sala de aula no país, no estado de São Paulo e em seguida na cidade de Anápolis (GO). É possível compreender que a partir desse ano os celulares começaram a incomodar os gestores escolares no Brasil.

Ainda há de se ponderar sobre a distância considerável entre as políticas e as legislações educacionais. Enquanto o MEC distribuiu tablets aos professores de Ensino Médio, deputados criaram projeto de lei que versa sobre a proibição do uso de aparelhos eletrônicos portáteis nas salas de aula dos estabelecimentos de educação básica e superior. Uma instância distribuiu tablets, e outra os proibiu. (MARTIN, 2014, p.40).

Ramos (2012), licenciando de Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Londrina, desenvolveu uma pesquisa empírica sobre o celular na escola e seu possível potencial pedagógico. O autor aponta que as tecnologias levadas à escola pelos estudantes não são potencialmente aproveitadas para aulas mais produtivas e que conduzam a melhores reflexões sobre os assuntos abordados nas disciplinas. Os estudantes interlocutores de sua pesquisa numa escola pública na cidade de Londrina informaram que é comum a prática de troca de mensagens durante as provas com resultados das questões. No campo da pesquisa, identificou ainda que alguns estudantes que utilizam touca em sala de aula colocam fones de ouvidos e se mantém sem atenção na exposição dos conteúdos. Ramos concluí que essas tecnologias não estão sendo utilizadas em favor da educação pela equipe pedagógica.

Com o objetivo de identificar os usos das mídias e os consumos culturais dos professores do ensino fundamental, Fantin & Rivoltella (2010) realizaram um estudo empírico nas áreas metropolitanas de Milão e Florianópolis. Conhecimento, interação/comunicação, informação, rapidez, inovação, inclusão e globalização foram os termos mais utilizados pelos professores para definir a ideia de mídias e tecnologia. Os autores observam que esses termos conotam sentidos positivos e aqueles voltados a questões como desafios e perigo foram expressos poucas vezes.

Tais representações fazem parte de um imaginário social construído em torno de discursos e práticas sociais que nos últimos anos têm destacado a importância das TIC na educação, por mais contraditório que isso possa ser com a conhecida postura defensiva e de reserva de grande parte dos professores em relação à presença de certas mídias na escola. (FANTIN; RIVOLTELLA, 2010, p. 7).

Fantin & Rivoltella (2010), identificaram que 78% dos professores pesquisados utilizavam celulares no cotidiano de suas vidas privadas, mas era totalmente ausente para fins didáticos. Sendo que alguns afirmavam desconhecer as possibilidades pedagógicas do aparelho celular por falta de formação, enquanto outros explicitavam não ver sentido nessa forma de uso, e ainda houveram afirmações que o celular causaria muita distração entre os estudantes.

Para Lévy (1999), o professor ao utilizar as tecnologias da comunicação e da informação deve se tornar um “animador” da inteligência coletiva dos grupos de estudantes. Sua atividade deve estar centralizada no intuito de acompanhar e administrar os aprendizados, incitamento a troca de saberes, “a mediação relacional e simbólica e a pilotagem personalizada dos percursos de aprendizagem etc.” A demanda do mundo atual por educação, tornou crescente o número de pessoas indo para escolas e universidades, consequentemente os custos com infraestrutura e formação de professores são cada vez maiores, principalmente nos países pobres. A quantidade de professores formados no mundo não cresce na proporção dos estudantes, ou seja, para o autor é importante o uso de ferramentas tecnológicas para ensinar e aprender, a exemplo, do ensino a distância.

Em novos "campus virtuais", os professores e os estudantes partilham os recursos materiais e informacionais de que dispõem. Os professores aprendem ao mesmo tempo que os estudantes e atualizam continuamente tanto seus saberes "disciplinares" como suas competências pedagógicas. (A formação contínua dos professores é uma das aplicações mais evidentes dos métodos de aprendizagem aberta e à distância.) (LÉVY, 1999, p. 171).

Segundo Thoaldo (2010), é muito importante a capacitação dos professores para lidar com as novas linguagens tecnológicas, a fim de compreenderem a importância desses instrumentos na atualidade. A autora adverte que instalar televisores, computadores e internet não solucionam os problemas do ensino, é preciso preparar os mediadores e muitas vezes os estudantes estão mais preparados para lidar com esses recursos que os professores.

A escola deve deixar de ser simplesmente transmissora de informação e direcionar sua intenção com a aprendizagem, pois o objetivo da aprendizagem é a busca da informação significativa, da pesquisa, o desenvolvimento de projetos e não somente a transmissão de conteúdos específicos. E a tecnologia está aí como um instrumento para essa aprendizagem. [...] Sendo assim, os profissionais da educação devem aprofundar no novo modo de aprender e ensinar, onde todos são emissores e receptores de informação, portanto professores e alunos constroem juntos os conhecimentos, ensinando reciprocamente. (THOALDO, 2010, p. 35).

Zuin (2010) critica o modo como as TICs foram consideradas no documento final da Conferência Nacional de Educação (CONAE), cujas considerações servem de base para a elaboração das diretrizes e estratégias de ação do novo Plano Nacional da Educação (PNE) 2011-2020. As inovações tecnológicas causaram importantes ressignificações no que concerne a infância, a inclusão e exclusão social e nos processos educacionais e formativos, portanto, o tema das TICs não deveria ser assunto secundário e superficial neste documento.

Se as inovações acarretam tantas ressignificações em nossas vidas e, particularmente, na construção de nossas identidades como educadores, por que tal preocupação não adquiriu a condição de eixo temático no Documento- Referência da CONAE? Talvez, as respostas para essas questões se refiram ao fato de que tais transformações proporcionadas pelo desenvolvimento das forças produtivas, notadamente as de âmbito tecnológico, ocorrem numa tal velocidade que dificultam a composição de reflexões mais elaboradas sobre tal processo [...]. Se, por exemplo, na sociedade atual, alguém não se apresenta por meio de uma identidade eletrônica, é como se essa pessoa não existisse fisicamente; como se a sua existência concreta necessitasse ser virtualmente confirmada, pois, caso contrário, não seria percebida pelos outros. (ZUIN, 2010, p. 964-965).

No Documento-Referência da CONAE, há uma série de considerações sobre a importância da ampliação da chamada educação tecnológica. Mas, segundo Zuin (2010) as abordagens estão limitadas aos usos de tecnologias presentes em laboratórios de informática nas escolas, pesquisas on-line, intercâmbios científicos e tecnológicos, nacional e internacional, entre instituições de ensino, pesquisa e extensão. A ênfase sobre os aspectos técnicos envolvidos no uso dos instrumentais listados no documento não pode ser absolutizada a ponto de ofuscar a necessária discussão sobre o papel da tecnologia como processo social que reconfigura as características identitárias dos agentes educacionais. (ZUIN, 2010, p. 967).

Martin (2014) observa que o celular no ambiente escolar não advém de políticas públicas como no caso dos laboratórios de informática. O celular está integrado ao cotidiano das pessoas e foi levado para a escola, mesmo onde o uso é proibido. A popularização dos celulares de nova geração fez muitas pessoas trazerem consigo uma pequena central multimídia que garante a constante possibilidade de comunicação, manutenção das relações sociais, sem fio e a distância. A proporção da mobilidade vivenciada através desses dispositivos principalmente entre os jovens não possui fronteiras claras, logo, é importante refletir sobre essa cultura na escola.

Para Joaquim (2014) é importante os professores de Sociologia compreenderem as mudanças significativas ocorridas na vida dos estudantes cada vez mais imersos no ciberespaço. As aulas devem explorar o interesse desses jovens não apenas para melhoria do ensino aprendizagem, mas também contribuir na legitimação da disciplina no Ensino Médio. Deste modo, o autor relata sua experiência utilizando a rede social facebook como ferramenta para auxiliar as aulas de Sociologia de uma escola pública estadual no interior do Estado de São Paulo. Assim, o ambiente físico da sala de aula com limitação de tempo foi estendido ao ciberespaço. Entretanto, é de grande relevância a pesquisa para o planejamento dessas atividades:

Planejar uma atividade que faz uso de redes sociais virtuais demanda embasamento teórico e pesquisa, principalmente em temas como cibercultura, web 2.0 e TICs. Mas se o professor não tiver o cuidado de repensar seu papel em sala de aula e romper com a aula expositiva tradicional e com a figura do aluno passivo e receptor de conhecimento seu objetivo pode ficar comprometido. Para buscar embasamento teórico-pedagógico e planejar essa atividade, um novo campo conhecido como educomunicação oferece elementos que podem contribuir muito para o ensino de sociologia. (JOAQUIM, 2014, p. 10).

Baseado no conceito de educomunicação, Joaquim (2014) explica que o professor atua como guia dos processos. A perspectiva é fazer reflexões e questionamentos para continuação das atividades no facebook, demais espaços virtuais ou em sala de aula. As propostas dessas atividades descentralizadas da figura do professor causam estranheza aos estudantes no primeiro momento, pois eles não conseguem dissociar aprendizagem da rigidez e autoritarismo da escola. O projeto e as discussões no grupo do facebook tiveram como eixo central “O papel social e transformador da esperança e do sonho”, e foi concluído com trabalhados produzidos em formatos escolhidos pelos próprios estudantes.

[...] etapa final, que serviu como avaliação, foi mais fácil e gratificante. Após as discussões em sala de aula os alunos se dividiram em três grandes grupos e desenvolveram sua própria mensagem de sonho e utopia. Um dos grupos produziu um vídeo em que todos davam depoimentos sobre seus desejos para o futuro. Outro produziu um pequeno sarau de poesia. O terceiro apresentou um texto dissertativo em que todos os conteúdos postados no grupo do facebook eram de algum modo citados. (JOAQUIM, 2014, p. 13).

No entanto, Joaquim (2014), afirma que seu projeto de utilizar o facebook para auxiliar as aulas de Sociologia não esteve isento de equívocos e merece reflexões. Essa rede social é uma ferramenta nova no que concerne o uso pedagógico e não foi desenvolvido para ser uma plataforma de aprendizagem. Além disso, houve a dificuldade inicial dos estudantes entenderem que a escola não é um mundo separado daquele que elas fazem parte. Portanto, o autor analisa que o professor de Sociologia deve mudar sua postura e utilizar novos meios que possam continuar possibilitando ao estudante a construção de um olhar que desnaturalize a realidade dada.

Foram colocados acima alguns pontos de vista principalmente de educadores sobre a questão da inserção de tecnologias na educação. Existe um consenso entre os autores a respeito da centralidade desses aparelhos na vida dos estudantes, e da necessidade de pensar metodologias de ensino que incluam essas tecnologias. Todavia, foi verificado nessas análises que o professor é o principal responsável pela constituição da “mudança” e “avanço” no ensino/aprendizagem. Embora tenham sido citados os problemas estruturais da escola pública, e da importância da formação continuada, as problemáticas em torno das condições da carreira docente, da limitação de tempo para pesquisa, da baixa renumeração, entre outros, não foram colocados como fator relevante nas propostas de inserção das TICs nas aulas das escolas fundamentais e médias.

5. Capítulo 3 - METODOLOGIA DA PESQUISA

Segundo Gil (2008), a pesquisa social visa buscar novos entendimentos no campo da realidade social, obtendo, portanto, respostas para problemas através de métodos científicos sistemáticos. Para o desenvolvimento desta pesquisa, foram utilizados os métodos qualitativo e quantitativo.

A metodologia consistiu primeiramente no levantamento de materiais científicos como artigos e livros no intuito de localizar estudos anteriores sobre o tema. Conforme já pontuado, não foram localizadas pesquisas no campo da Sociologia sobre o uso do celular em sala de aula, mas foram relevantes alguns contributos sociológicos na análise da tecnologia na sociedade, tendo como apoio a perspectiva da Educação acerca da relação entre escola e culturas juvenis, e de estudos das Ciências Sociais sobre consumo na sociedade contemporânea. O levantamento bibliográfico para essa pesquisa se deu desde o projeto até a constituição de sua estrutura escrita.

A pesquisa de campo se realizou em três momentos. Primeiro foram realizadas observações com descrições em diário de campo (etnografia), do grupo de estudantes durante seis semanas no período matutino, totalizando doze aulas. Sendo seis de Matemática e seis de Sociologia. Os relatos das observações serão tratados no último item deste capítulo. Segundo Gil (2008), a observação pode ser utilizada como procedimento científico, desde que sirva aos objetivos da pesquisa, seja sistematicamente planejada e submetida à verificação. Genzuk (1993, apud Fino 2008, p.6), explica que essa maneira de fazer etnografia é definida como naturalismo:

O objectivo [sic] da pesquisa social é a compreensão do comportamento humano, o que só pode ser conseguido através de um contacto directo [sic] e não através de inferências a partir do modo como as pessoas se comportam em ambientes experimentais e artificiais, ou a partir do modo como elas declaram comportar-se, em entrevistas. Esta é a razão pela qual os investigadores etnográficos levam a cabo as suas investigações em cenários “naturais”, que existem independentemente do processo de investigação, em vez de as efectuarem [sic] em ambientes especialmente preparados para o efeito. Como é evidente, no primeiro caso – em cenários naturais – o investigador tenta minimizar o efeito da sua presença no comportamento das pessoas em estudo, com o propósito, além da fidelidade, de aumentar as hipóteses de o que vier a ser revelado seja generalizável para situações semelhantes que não foram ainda estudadas. Além disso, a ideia de naturalismo implica que os acontecimentos e os processos sociais devem ser explicados em função da sua relação com o contexto onde decorrem.

Na segunda fase da pesquisa de campo, foram aplicados questionário aos estudantes com o objetivo de obter informações acerca do uso do smartphone em sala de aula. Cabe salientar que a escolha pela aplicação do questionário aos estudantes advém do compartilhamento informal de outros pesquisadores a respeito da entrevista com estudantes. Conforme experienciado, esses jovens raramente demonstram interesse na construção de diálogos com pessoas que eles não possuem relação. Além disso, para a constituição de um trabalho de conclusão de curso se mostrou inviável entrevistar 23 sujeitos, e limitado reduzir opiniões à apenas uma amostra do grupo observado.

Segundo Gil (2008), as informações obtidas através do questionário irão permitir descrever características da população pesquisada, bem como testar as hipóteses da pesquisa. Ou seja, o questionário é também uma maneira de relacionar respostas dadas com alguns fatos observados em campo.

Na última etapa da pesquisa de campo foram realizadas entrevistas com os dois professores que ministravam as aulas onde foram realizadas as observações. Cada entrevista trouxe a opinião dos docentes sobre o uso de smartphones em sala de aula, sobre a compreensão como educadores desse objeto tecnológico no dia a dia dos estudantes, e quais suas opiniões quanto às proibições e inserções do smartphone nas aulas.

Para Gil (2008), a entrevista de formato semiestruturada ou guiada por pautas é realizada com poucas perguntas diretas. O entrevistado pode falar livremente no que tange às pautas assinaladas, caso haja distanciamento do tema o entrevistador deve intervir de forma sutil, preservando o diálogo espontâneo.

Após o levantamento de todos os dados, foram desenvolvidas interpretações qualitativas das descrições provenientes das observações e das informações obtidas nas entrevistas. Para Dalfovo et al (2008), o método qualitativo não visa empregar instrumental estatístico na análise, mas principalmente interpretar os dados com foco na perspectiva dos sujeitos participantes da pesquisa. Além disso, pode conter informações importantes obtidas em fotografias, filmes, gravuras e etc.

A análise quantitativa foi empregada no processo de transformação das respostas contidas nos questionários aplicados aos estudantes em dados numéricos e percentuais passíveis de interpretação. Segundo Dalfovo et al (2008), o método quantitativo será caracterizado pela quantificação tanto da coleta de dados como da interpretação através da estatística, com o objetivo de garantir precisão e poucas distorções nos resultados.

Segundo Gil (2008), as análises possibilitam a organização dos dados e a obtenção de respostas para os problemas empregados à pesquisa. Entretanto, a interpretação deve fornecer uma amplificação das respostas, mediante relação com conhecimentos adquiridos anteriormente.

Apesar do pouco conhecimento pessoal na aplicação do método quantitativo, foi um desafio importante introduzir esses dados ao capítulo de análises das informações da pesquisa empírica. Compreende-se como relevante a opinião de toda população pesquisada, a fim de interpretar essas informações com base nas teorias utilizadas na pesquisa.

5.1. Definição dos sujeitos da pesquisa

É importante pontuar quem são os sujeitos objeto da pesquisa a partir de conceitos sociológicos de juventude. Weller (2007), explica que Karl Mannheim pode ser considerado um dos pioneiros da Sociologia da juventude, e observa que seu trabalho introdutório acerca do tema trata do conceito de gerações. Segundo a autora, as análises de Mannheim continuam pertinentes para estudos das juventudes contemporâneas. Acerca do conceito de gerações, Mannheim (1982, p. 72) explica sobre a importância sociológica dos fatores biológicos. A questão geracional não deve ser explicada apenas pelos fatores naturais:

O fenômeno sociológico das gerações está baseado, em última análise, no ritmo biológico de nascimento e morte. Mas estar baseado num fator não significa necessariamente ser deduzível dele, ou estar implicado nele. Se um fenômeno está baseado em outro, ele não poderia existir sem o outro; entretanto, ele possui certas características peculiares a si próprio, características de modo algum emprestadas do fenômeno básico. Não fosse pela existência de interação social entre seres humanos, pela existência de uma estrutura social definida, e pela história estar baseada em um tipo particular de continuidade, a geração não existiria como um fenômeno de localização social; existiria apenas nascimento, envelhecimento e morte. O problema sociológico das gerações, portanto, começa nesse ponto onde é descoberta a relevância sociológica dos fatores biológicos. Começando com o próprio fenômeno elementar, precisamos antes de tudo tentar compreender a geração como um tipo particular de situação social.

Todavia, Pais (1990), afirma que existem algumas limitações da própria Sociologia da juventude em relação ao conceito de juventude. Algumas análises apontam que esta é uma fase da vida constituída de sujeitos com interesses e características homogêneas, formando uma “cultura juvenil”. Já outras análises explicam que o jovem faz parte de um conjunto social altamente diversificado “perfilando-se diferentes culturas juvenis, em função de diferentes pertenças de classe, diferentes situações econômicas, diferentes parcelas de poder, diferentes interesses, diferentes oportunidades ocupacionais, etc.”. O autor então reitera:

Alguns dos mais afamados trabalhos da sociologia da juventude, em vez de se basearem em observações diretas, funcionam, de certo modo, como «caixas de ressonância» dos media, acabando os estilos mais badalados das culturas juvenis por serem tomados como indiscutíveis e mesmo dominantes. A realidade poderá ser diferente. Para a ela chegar torna-se, contudo necessário penetrar nos meandros dos quotidianos dos jovens. Finalmente, nalguns media é possível encontrar uma imagem das culturas juvenis retratada como «ameaçadora» para a sociedade. Paradoxo dos paradoxos, essa imagem pode ser alimentada ou caucionada por análises sociológicas centradas nos mais «espectaculares» aspectos da «cultura juvenil », que, justamente, são os que mais interessam aos media. A definição da cultura juvenil, nos termos acabados de descrever, é, como qualquer mito, uma construção social que existe mais como representação social do que como realidade. (PAIS, 1990, p. 145).

Mannheim (1968), explica que existe uma comum inadequação dos jovens ao mundo dos adultos. Pois, enquanto eram crianças estes viviam sob a regulação de tradições e emoções familiares, mas ao se tornarem jovens entram em contato com a vida pública, sociológicamente falando adentram ao mundo em que costumes, valores, crenças e hábitos são diferentes do que conheciam até aquele momento. Esse conflito de valores muitas vezes antagônicos é comum das sociedades modernas, pois nas sociedades primitivas não existe essa ruptura radical entre o que a família ensina e a vivência na vida pública.

Podemos colocar os camponeses, dispersos por distritos remotos e quase intocados pelas transformações atuais, em um mesmo grupo etário real juntamente com a juventude urbana do mesmo período? Certamente que não! - e precisamente porque permanecem intocados pelos acontecimentos que afetam a juventude urbana. Assim, falaremos de uma geração enquanto uma realidade apenas onde é criado um vínculo concreto entre os membros de uma geração, através da exposição deles aos sintomas sociais e intelectuais de um processo de desestabilização dinâmica. Deste modo, os jovens camponeses que mencionamos acima partilham apenas a mesma situação de geração sem que, contudo, sejam membros da mesma geração enquanto realidade, juntamente com os jovens urbanos. (MANNHEIM, 1982, p. 86).

Logo, diante desses conflitos é costumeiro os jovens se diferenciarem e transgredirem aos constumes impostos pelos adultos. Dayrell (2007), explica que as socializações juvenis são múltiplas com centralidade no âmibito dos seus grupos de iguais, das mídias, da escola, entre outros, confrontando com valores e comportamentos colocados pela família.

Porém, Castells et al (2007), explicam que apesar dos agrupamentos, os jovens tendem a personalizar o comportamento dentro da cultura jovem. Paralelamente à afirmação de uma identidade coletiva, há também o reforço do indivíduo ser distintivo dentro dessa coletividade. A cultura juvenil contemporânea é a afirmação de cada indivíduo que compartilha da cultura, levando a constituir uma comunidade de indivíduos, sem sinais de individualismo nos processos de comunicação. Cada pessoa personaliza sua mensagem na posição emissor/receptor. (CASTELLS et al 2007, p. 159, tradução nossa.).

Os jovens são constituídos fisicamente e socialmente diferentes dos adultos, e buscam demarcar esses limites. Entretanto, muitos deles, principalmente por ainda residirem com familiares, seguem alguns de seus valores, como os relativos a crença e religião. Segundo os dados levantados no questionário aplicado aos estudantes nesta pesquisa, 52,17% declararam ser evangélicos/protestantes; 30,43% disseram ser católicos; 8,69% declararam não possuir religião; 4,35% disse pertencer a Seicho- no-ie e com mesmo percentual 4,35% a Umbanda ou Camdomblé. Deste modo, 91,30% dos estudantes pesquisados declaram possuir alguma religião, sendo que 82,60% são cristãs. Esses números podem ser relacionados aos dados divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), no censo 2010 realizado em Cuiabá. Naquele ano, 85,04% da população afirmou seguir religiões cristãs, mas a maioria 58,68% se declarou católica, diferente da realidade dos estudantes pesquisados que são predominantemente evangélicos/protestantes.

Esses jovens são financeiramente e psicologicamente dependentes de seus pais e familiares, e como ainda demandam da segurança dos adultos, acabam sendo levados e influênciados a seguir hábitos e costumes familiares. Mas, quando reunidos em seus grupos os jovens demonstram e afirmam um “modus juvenil” por eles construídos, como, por exemplo, utilizarem o smartphone para jogar ou ouvir música em sala de aula, conforme foi observado na pesquisa de campo deste trabalho. Contudo, não é excluído o fato dos estudantes adultos fazerem uso de seus celulares durante as aulas com finalidades divergentes das pedagógicas.

Para Castells et al (2007), atualmente os jovens precisam gestar sua necessidade de autonomia e segurança. Afinal, a crise da família tradicional patriarcal levou muitos a algum nível de emancipação social e psicológica ainda no início da vida juvenil, mas a família continuou sendo um centro de suporte no quesito financeiro, e segurança nos termos psicológicos com orientação e apoio emocional. Para esses autores, atualmente gerenciar a relação entre autonomia e segurança nas relações familiares é essencial para a existência e manutenção da condição dos jovens.

Esta pesquisa não compreende que o fenômeno do uso de smartphones se trata de uma especificiadade do cotidiano juvenil, mas está presente na rotina de diversos grupos adultos que também carecem de estudos específicos. Sobre o comum destaque das investigações aos dados “excêntricos” e julgados problemáticos da vida juvenil, Echevarria (1968, p. 182-183) pontua:

[...] o que há de mais sério na atual produção bibliográfica não se ocupa da juventude problema, mas do problema da juventude [...]. Com efeito, quando se fala do problema da juventude se destaca o caráter problemático de um período, não pouca injustiça, seja dito de passagem, diante da situação possivelmente semelhante de outras idades. Isso quer dizer que se considera a juventude como sujeita íntimamente a maiores problemas ou como constituindo por sua vez um problema dentro de uma determinada estrutura social, enquanto o adulto sobrecarregado de problemas não se vê a si mesmo como um problema social.

Os sujeitos pertencentes ao grupo objeto desta pesquisa são definidos como jovens pertencentes a uma turma de 23 estudantes de 15 a 19 anos. Sendo 14 do sexo feminino e 9 do sexo masculino, cursando o 2º ano do Ensino Médio matutino da escola pública “Moreira” situada na região Leste de Cuiabá (as demais informações de cunho socioeconômico serão tratadas no capítulo 4). Logo, o termo adolescente não será utilizado neste trabalho, pois tem maior proximidade às classificações etapistas das Ciências Biomédicas e da Psicologia. A juventude está além do recorte de vida exclusivamente biológico e determinista, mas é principalmente um estilo de vida.

Para Giddens (2002), a alta modernidade de ordem pós-tradicional não rompeu, mas acentuou as principais características da modernidade (para o autor a modernidade ainda está em movimento). A grande disseminação de mídias eletrônicas na globalização levou a inevitável escolha de um estilo de vida, não necessiarimente com o objetivo de preencher necessidades utilitárias, mas de dar uma forma material a auto-indentidade. Esse estilo de vida é incorporado às rotinas através das práticas de vestir, comer, agir, de escolher lugares, de frequentar espaços ,entre outros. Todas as escolhas estão sempre suscetíveis a mudanças.

Pereira (2010), ao analisar diversos anúncios publicitários voltados para públicos diferentes, identificou neles um estilo de vida jovem, urbano e integrado às novas tecnologias. A autora explica que a influência desse estilo de vida, tem levado muitos adultos a adotar costumes jovens e constituir uma “juventude estendida”, inclusive adiando responsabilidades e alguns deveres comuns da vida adulta. Assim, a representatividade dos jovens na sociedade urbana contemporânea vem despertando grande interesse de estudos acadêmicos e de mercado sobre o denominado estilo de vida juvenil.

Em relação ao uso de tecnologias como o smartphone, os jovens são comumente definidos como “nativos digitais”. Segundo Fantin (2010), o conceito criado por Prensky publicado em 2001 no artigo Digital natives, digital immigrantes, utilizado para definir os jovens que nasceram inseridos na era da internet, vídeo games, celulares entre outros e por isso falariam o idioma digital, deve ser utilizado com ressalvas. Atualmente os adultos também estão inseridos no mundo digital, sendo importante salientar inclusive que essas tecnologias não foram criadas por esses jovens. Portanto, a distância geracional entre jovens e adultos (em relação a linguagem digital) apontada por Prensky, está cada vez menor, porque tecnologias como smartphones, laptops12, tablets13 entre outras estão cada dia mais incorporadas ao cotidiano de diversos grupos sociais.

Para Echevarria (1968), existem divisões clássicas na investigação acadêmica sobre a juventude. São destacados como fundamentais as que se referem ao meio familiar, ao meio educativo, ao ambiente de trabalho, e ao emprego do tempo livre, e nos últimos anos iniciaram as investigações sobre consumo juvenil, considerado de grande relevância socioeconômica e característico das sociedades industriais. O autor afirma que a contribuição empírica mais recente no esforço diversificado de analisar a juventude parte dos sociólogos, afinal, diferente dos pedagogos e psicólogos interessa a estes compreender questões relacionadas a unidade temporal e social dos jovens desde a perspectiva das condições sociais gerais e concretas.

Segundo Eisenstein (2005), a Organização Mundial da Saúde (OMS) define as pessoas entre 10 e 19 anos como adolescentes, enquanto a Organização das Nações Unidas (ONU) utiliza principalmente para fins estatísticos e políticos a faixa etária de 15 a 24 anos nomeada pela entidade como jovens. Já no Brasil o Estatuto da Criança e do adolescente (ECA), compreende como adolescentes pessoas de 12 a 18 anos. A autora observa que apesar da cronologia ser o critério mais utilizado em diversos estudos acerca dos jovens, não é o mais adequado para pesquisas comunitárias, populacionais, antropológicas (inclua-se também os sociológicos), pois, existem variabilidades psicossociais que devem ser consideradas.

Existem claramente diversas análises sobre o que vem a ser juventude, e estas se ampliam e divergem em diferentes áreas do conhecimento. O mais relevante para este trabalho é diferenciar de forma sucinta o adolescente dos parâmetros mundiais e biológicos, do jovem como sujeitos sociais existentes com variados estilos de vida.

5.2. Relatos do diário de campo

As observações descritas no diário de campo são relativas ao uso que os estudantes fazem do smartphone em sala de aula. Diante disso, cabe pontuar que em Dezembro de 2014 (três meses após a escolha do tema para pesquisa) foi aprovada a lei estadual 10.232 que proíbe o uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula, exceto para fins pedagógicos. Quando as observações em sala de aula iniciaram em 13 de Abril de 2015, fazia pouco mais de 3 meses da lei sancionada.

Antes de iniciar a pesquisa de campo na escola, a coordenação pedagógica foi procurada para a apresentação dos objetivos da pesquisa. O documento para autorização das observações solicitava que a pesquisa fosse realizada junto de uma turma do 1º ano do Ensino Médio, em aulas de duas disciplinas diferentes. Mello14, a coordenadora pedagógica em meio a diversos afazeres nos recebeu em sua sala, onde foram explicados os motivos e interesses da pesquisa.

A escola é um ambiente estruturado em hierarquias com procedimentos, regras e controle dos transeuntes, logo, é comum o receio relativo aos “observadores”. É aparente o temor de que alguém esteja ali para apontar as possíveis falhas existentes. Assim, foi procurado esclarecer à coordenação que o objetivo era levantar dados para a pesquisa que constituiria um trabalho de conclusão de curso, e que a recepção da escola para tal seria muito importante.

A coordenadora pedagógica se retirou da sala e foi até a direção da escola com o documento formalizado solicitando autorização da pesquisa. Este documento foi previamente assinado pela coordenação de licenciatura do curso de Ciências Sociais da Universidade Federal de Mato Grosso. Enquanto o retorno da coordenadora era aguardado, uma professora trouxe um estudante do 1º ano que estava utilizando o celular durante a aula, ela então diz para uma servidora da escola:

“Fala pra Mello que ele estava no celular, preciso voltar pra sala.”

Após alguns minutos a coordenadora retorna explicando que a direção da escola autorizava a pesquisa, mas as observações deveriam ser feitas com o 2ª ano A. Segundo ela os 1º anos já eram acompanhados por estagiários e bolsistas PIBID15,e a equipe pedagógica evita causar constrangimento à rotina dos estudantes. Questionada sobre a possibilidade de acompanhar aulas de humanas e outras de exatas, a coordenadora pedagógica informou que iria nos apresentar dois professores, e caberia a eles aceitar ou não as observações em suas aulas.

Mello apresentou então o professor Souza, docente da disciplina de Matemática com quem foi possível conversar no pátio da escola, enquanto ele colava um aviso no mural. Souza, não fez objeções e aceitou a presença nas aulas. Já o professor Silva que ministrava as aulas de Sociologia estava no intervalo entre aulas, foi até a sala da coordenação para ter informações sobre o interesse das observações em suas aulas. Silva, um pouco mais curioso sobre a pesquisa, perguntou o que seria observado, mas, aceitou a pesquisa em suas aulas. Ambos foram esclarecidos sobre a importância dos estudantes não saberem o objetivo das observações em sala, para evitar interferência nos comportamentos relativos ao uso dos smartphones.

Conforme citado, em 13 de Abril de 2015 iniciaram-se as observações. Às 08h50 da manhã na aula da disciplina de Matemática, ministrada pelo professor Souza, adentramos a sala, sentamos ao fundo na diagonal, enquanto os estudantes se acomodavam. O professor não nos apresentou a turma, e assim permanecemos. O primeiro estranhamento foi verificar que os estudantes não possuem sala fixa, ao término de cada disciplina, seguem para outra sala. Então, naquela manhã de segunda feira, 15 minutos após o horário oficial do início da aula, o professor começa a ministrar o conteúdo da disciplina. É notado que as trocas de salas interferem nos tempos de aula. Foi possível visualizar que os estudantes nesse trajeto entre salas, em sua maioria, estão manuseando seus celulares ou com os fones conectados entre os celulares e ouvidos.

Enquanto procuramos manter a discrição no ambiente, abrimos o diário de campo (neste caso, um caderno capa dura no formato 15x21 em espiral) e mantemos a atenção fixa no que se referia os estudantes e o uso dos smartphones. Então, uma estudante dispara em voz alta para a colega do outro lado da sala:

“Altas fotos sua no whats né?”

Se referindo claramente ao aplicativo de trocas de mensagens instantâneas.

Enquanto isso, outra estudante faz uso da câmera frontal do seu celular como espelho, para se olhar e arrumar os cabelos. O professor adverte chamando pelo nome.

Não demora muito toca o celular de um estudante. Este rapidamente bloqueia o ruído com o aparelho ainda no bolso da calça, enquanto os demais emitem sons de algazarra e repreensão por causa da chamada.

Em todas as aulas foi observado que os estudantes utilizam o celular, e procuram meios de não serem surpreendidos pelo professor. As “estratégias” para disfarçar o uso do celular são: manusear o celular dentro da mochila ou bolsa, manusear o celular por trás das bolsas e mochilas que se encontram acima da mesa e manusear o celular com as mãos abaixo da mesa. É comum bolsas e mochilas dispostas acima das mesas, o que facilita o acesso ao celular. Alguns utilizam agasalho com capuz, para esconder o fone plugado aos ouvidos (no caso das salas com condicionador de ar funcionando). Há também o uso explícito do celular (em menor quantidade), sendo possível inclusive, identificar em alguns casos qual a finalidade.

A sala de aula nos parece muito próxima, afinal a aprendizagem formal e institucionalizada ocorre na escola durante um processo longo de rituais e passagens de anos, onde os sujeitos alfabetizados estiveram inseridos. Então, os ruídos, as conversas, as advertências dos professores, o quadro (que agora é branco, não negro/verde), as cadeiras puxadas pelos estudantes arranhando o chão e escritos em paredes, enfim, é uma série de memórias familiares.

Damatta (1978, p. 28), afirma que etnografar é transformar o exótico em familiar, ou o familiar em exótico. Deste modo, observar o que está próximo constitui-se:

[...] num movimento semelhante a um auto-exorcismo, pois já não se trata mais de depositar no selvagem africano ou melanésico o mundo de práticas primitivas que se deseja objetificar e inventariar, mas de descobri-las em nós, nas nossas instituições, na nossa prática política e religiosa. O problema é, então, o de tirar a capa de membro de uma classe e de um grupo social específico para poder - como etnólogo - estranhar alguma regra social familiar e assim descobrir (ou recolocar, como fazem as crianças quando perguntam os “porquês”) o exótico no que está petrificado dentro de nós pelos mecanismos de legitimação.

Enquanto são feitas as observações dos fatos ocorridos em sala de aula, continuamos o exercício de “estranhar o familiar”. Logo, uma estudante diz:

“Professor, deixa eu atender o celular? Já me ligaram várias vezes!”

Ele responde:

“Na hora do intervalo você retorna.”

Ela insiste:

“Então deixa eu ir no banheiro?”

Ele responde em tom irônico:

“Tá bom!”

A estudante desiste e continua a acompanhar a aula. Enquanto isso outra estudante pergunta:

“Professor deixa eu fazer foto do quadro?” (Se referindo ao exercício que ele acabara de passar).

O professor permite que a estudante fotografe.

No dia 29 de Abril de 2015 iniciamos as observações nas aulas de Sociologia. O professor Silva nos apresenta a turma:

“Pessoal, lá no fundo é a Jaqueline, ela estuda na UFMT, vai passar uns dias conosco fazendo uma pesquisa.”

Após duas observações acompanhando a turma na disciplina de Matemática, foi possível identificar já no início da aula de Sociologia que os eventos não são diferentes. Enquanto o professor pede que a sala se organize e faz a chamada, além dos ruídos e conversas diversas não identificáveis, os estudantes estão manuseando o smartphone, trocando entre si os aparelhos ou conversando sobre funções do celular. Uma estudante exclama aos colegas do outro lado da sala:

“Ou, esse plano da Claro tá muito ruim. E eu só preciso usar o facebook e o instagram16 essas coisa básica.”

A conversa não continua e a aula inicia com apresentação de trabalho por um grupo de estudantes. Enquanto esses se apresentam, muitos estão utilizando o celular, e uma estudante está com o fone nos ouvidos. O professor naquele momento atento à apresentação não repreende quem utiliza o aparelho. Uma das estudantes utiliza a câmera filmadora do celular e grava a apresentação.

Em outra data, na aula de Sociologia, enquanto a exposição de conteúdo não era iniciada, uma estudante atende o celular em sala de aula. Havia muito ruído no ambiente e na posição de observação não foi possível identificar o teor da ligação.

No início de uma das aulas de Sociologia, o professor Silva adverte os estudantes:

“Não quero ninguém usando o celular, a não ser quando formos fazer algum trabalho!”

O professor aponta para uma estudante com o fone nos ouvidos e diz:

“Vamos, retira o fone!”

A estudante retira os fones, e assim que o professor se vira, ela faz uma expressão de desdém em direção a ele.

Analisando as relações entre professores e estudantes, é possível afirmar que apesar dos visíveis conflitos, há uma relação de interdependência entre eles. Conforme explica Elias (1994), os indivíduos que conjuntamente formam a sociedade não podem ser pensados separadamente, muito menos o “todo” deve ser compreendido como uma unidade harmoniosa. Portanto, há uma relação importante de interdependência entre os indivíduos na constituição dos elos da rede que se movimentam e formam a totalidade que chamamos de sociedade. Contudo, “a vida social é repleta de contradições, tensões e explosões”. A partir de Norbert Elias é possível analisar a relação estudante/professor, e vice e versa, como uma coexistência.

Essa ligação origina um sistema de tensões para o qual cada fio isolado concorre, cada um de maneira um pouco diferente, conforme seu lugar e função na totalidade da rede. A forma do fio individual se modifica quando se alteram a tensão e a estrutura da rede inteira. No entanto essa rede nada é além de uma ligação de fios individuais; e, no interior do todo, cada fio continua a constituir uma unidade em si; tem uma posição e uma forma singulares dentro dele. (ELIAS, 1994, p. 30).

Para Mannheim (1968), a relação professor/estudante não é entre dois representantes de uma consciência em comum. Existe entre estes uma tensão impossível de ser solucionada sem um fator de compensação: o professor ensina o estudante, mas o estudante também ensina o professor. O autor afirma que as gerações estão em um estado de interação constante.

Segundo Dayrell (1996), a relação entre estudantes e professores parece óbvia e naturalizada nas salas de aula, onde eles próprios não demonstram ter consciência da sua dimensão. Existe entre esses sujeitos uma dinâmica complexa continuamente construída por conflitos e negociações decorrentes de diversas circunstâncias. É uma trama cotidiana onde as relações sociais entre professores e estudantes incluem diariamente alianças, imposição de normas e estratégias individuais, ou coletivas, transgressões e acordos.

Em outra data, o professor de Sociologia inicia a exposição retirando do bolso o telefone celular com a função lanterna do aparelho acesa e diz:

“Pessoal vamos ter foco na aula!”

Uma estudante rapidamente zombeteia:

“Que isso hein professor! Iphone 8!” (Ironizando o celular considerado de tecnologia ultrapassada que o professor trazia consigo)

O Iphone é um modelo de smartphone de alta tecnologia fabricado pela Apple. No Brasil o aparelho importado é comercializado por altos valores. Segundo informa o site especializado em tecnologia Tech Tudo, o modelo disponível no ano de 2015 é o Iphone 6, o modelo “8”, ainda não tem previsão de lançamento.

Os demais riem do comentário da colega, enquanto o professor ignora e opta por dar andamento à aula. É possível continuar ouvindo alertas sonoros comuns de atividades em smartphones. O professor precisa se retirar para buscar um equipamento e rapidamente alguns se juntam para emendar alguma conversa com o celular nas mãos.

O professor Silva retoma a explanação sobre um vídeo que vai exibir. Como diminui o volume das conversas é possível identificar ruídos de música que um estudante ouve através dos fones, claramente escondidos pelo uso do capuz de seu moletom. Durante a exibição do vídeo, o estudante pausa a música no celular. Enquanto os demais também se mantêm atentos, três estudantes ainda manuseiam o smartphone.

As observações que tiveram início em 13 de Abril de 2015 se encerraram 27 de Maio de 2015. Nas doze aulas observadas foram constatadas regularidades referente ao uso do smartphone pelos estudantes. Conforme foi explicado no capítulo sobre a metodologia da pesquisa, a fotografia é um material importante no método qualitativo, mas para manter ao máximo a discrição das observações em sala de aula, foram feitos poucos registros fotográficos, e serão expostos na seção anexos deste trabalho.

O objetivo das descrições acima não é trazer à íntegra todas as horas observadas. Foram destacados alguns eventos em relação ao uso do smartphone, evitando assim, descrever repetições do tipo “estudante retira novamente celular do bolso”, ou “estudante joga no celular”, identificado dezenas de vezes. Entretanto, as informações relativas as observações serão importantes para discorrer as análises dos dados empíricos presentes na segunda seção do capítulo 4 .

6. Capítulo 4 - O USO DE SMARTPHONES POR ESTUDANTES

As questões relativas ao celular no ambiente escolar não estão limitados ao universo desta pesquisa. Em Janeiro de 2015, conforme publicação no site de notícias G117, o prefeito da cidade de Nova York, Bill de Blasio, retirou a proibição dos usos de celulares, tablets e outros das escolas. Antes esses aparelhos não podiam entrar no espaço escolar, deviam ser deixados em casa ou guardados em armários pagos do lado de fora. Segundo o prefeito, os pais devem ser capazes de ligar ou enviar mensagens para seus filhos, mantendo a proximidade entre eles, além de ser uma ferramenta eficiente nos casos de emergência. No entanto, aparelhos como tablets e celulares devem continuar guardados em mochilas ou armários, tendo seus usos liberados nos intervalos, ou em locais pré-definidos pela instituição. Em sala de aula só devem ser utilizados para aplicações educacionais planejadas. Essa mesma notícia informa que na China, professores da Universidade Normal de Hebei, adotaram uma bolsa coletiva “porta celulares” com identificação, onde os estudantes devem guardar os mesmos na frente da sala, evitando a distração frequente por conta das utilizações diversas de aparelhos eletrônicos durante as aulas.

A lei 10.232/2014 do estado de Mato Grosso que proíbe totalmente os aparelhos eletrônicos em sala de aula, exceto para fins pedagógicos, é similar a nova regra adotada pela prefeitura de Nova York. Contudo, não torna claro onde, ou como esses aparelhos devem ser mantidos na escola quando não utilizados para esses fins. É importante destacar que as escolas públicas no estado de Mato Grosso não possuem armários disponíveis aos estudantes, tornando o controle das circulações destes dispositivos, uma nova demanda a ser pensada pelas direções e coordenações escolares. Conforme identificado nesta pesquisa, os estudantes continuam com os smartphones em sala de aula, nas bolsas, mochilas, bolsos das calças, entre outros, cabendo ao professor o papel de coibir, chamar atenção ou em casos mais complicados encaminhar o estudante à sala da coordenação pedagógica.

Diante dos fatos relativos à utilização e popularização de equipamentos como smartphones é possível identificar as motivações para a criação de leis proibitivas no Brasil. Nos espaços escolares as leis objetivam regular o uso desses equipamentos, pois, no cotidiano raramente existem regras claras que normatizem o bom senso para uso dos mesmos.

Por serem usados em praticamente todos os lugares e situações, os pequenos aparelhos desafiam a etiqueta, os costumes as normas e as leis. E, como não poderia deixar de serem, essas maravilhas tecnológicas estão presentes também nas escolas, nas mãos dos professores, funcionários e de alunos, até das crianças pequenas. Entretanto, embora úteis, celulares e tablets, além de computadores pessoais como laptops, têm trazido grandes desafios para a educação formal, sobretudo quando se trata de ensino público. (ASSIS, 2013, p. 81).

Segundo o portal de notícias Uol Educação18, em Julho de 2014, um Juiz de Ouro Fino no Estado de Minas Gerais, determinou a proibição do uso de celulares nas salas de aulas de uma escola do Ensino Médio na cidade. A intenção é fazer com que se cumpra o que já é regulamentando desde 2002 numa lei estadual que disciplina a conversação com celulares em teatros, cinemas, salas de aula e igrejas. A diretora da escola afirma que a situação era insuportável, os estudantes usavam os aparelhos com fones para ouvir músicas, trocar mensagens em redes sociais e conversar entre eles, e ela nada podia fazer com os celulares, a não ser devolvê-los. A diretora afirma ainda, que cerca de 80% deles possuem celular, os que não têm residem em zonas rurais onde muitos pais não permitem o uso, ou mesmo não possuem condições de adquirir. Com a determinação, os aparelhos apreendidos são retirados pelo estudante junto dos pais ou representantes legais na Vara da Infância e da Juventude de Ouro Fino. Em pouco mais de 20 dias da regulamentação, 20 estudantes já haviam retirado os celulares na entidade. Segundo o juiz, a determinação é proveniente do uso abusivo dos aparelhos principalmente durante as aulas. O objetivo da justiça e da escola é melhorar o desempenho dos estudantes, que estava prejudicado com os usos dos aparelhos interferindo na qualidade das aulas.

É importante observar que o Estado de Minas Gerais já possui uma lei que proíbe usos de aparelhos eletrônicos em sala de aula. Há na pequena cidade de Ouro Fino, segundo o Censo 2010, pouco mais de 30 mil habitantes19. Portanto, a intervenção jurídica da Vara da Infância e da Juventude em relação ao uso do celular pelos estudantes, se mostra como um recurso local de fazer “valer” a lei, já que pode existir algum nível de constrangimento familiar em ir até a entidade retirar o aparelho.

Este caso é importante para refletir sobre as leis sancionadas em diversos estados em que o smartphone e outros aparelhos não deixaram de circular nas salas de aula. Os legisladores como representantes públicos compreendem a dinâmica cotidiana de uma sala de aula, da escola, ou mesmo da vida juvenil? É provável que muitos educadores, pais e demais cidadãos sem fazerem a reflexão necessária afirmem que deve existir a proibição e ponto. Contudo, os diversos relatos das experiências nas salas de aula mostram que a lei foi pensada num modelo desconexo da realidade a que se aplica, logo, é ineficaz. Afinal, os estudantes continuam adentrando a escola e sala de aula com seus aparelhos eletrônicos prontos para uso.

Apesar de algumas especificidades dos casos supradescritos, é possível identificar em todos eles o uso de celulares pelos estudantes em sala de aula. Diante dos percalços encontrados nessas situações as equipes pedagógicas buscam com pouca eficiência se amparar às leis, determinações e regulamentações. São localizados casos peculiares, como o publicado pelo portal IstoÉ20 em fevereiro de 2015. Na Califórnia (Estados Unidos), seis faculdades e cinco escolas do Ensino Médio adotaram um aplicativo desenvolvido por dois estudantes da Universidade Estadual da Califórnia, com objetivo de gerar recompensas em formas de pontos a cada 20 minutos que o estudante fica sem acionar o celular em sala de aula. Os pontos acumulados podem ser posteriormente trocados em estabelecimentos por produtos ou serviços. Um dos criadores acredita que o aplicativo é positivo, pois os estudantes melhoram seus rendimentos não utilizando os celulares em aula, e os comerciantes ganham mais clientes.

Giddens (2005), ao questionar se os telefones celulares seriam a onda do futuro, afirma que de fato em tempo de mobilidade constante entre trabalho, viagens e diversos compromissos, o celular se tornou vantajoso para a vida das pessoas. É possível se comunicar mais vezes e economizar tempo entre idas a uma linha de telefone fixo para falar com seus filhos, por exemplo. Mas, justamente por estar acessível em todos os lugares, o telefone celular tem se tornando um problema, consequentemente algumas medidas estão sendo tomadas a fim de restringir seu uso.

Em outubro de 2014, o site de notícias G121 divulgou que estudantes que iriam prestar o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) estavam criando grupos no aplicativo whatsApp para trocar mensagens relativas a questões e dúvidas das provas. Antes eles se reuniam para trocar informações em grupos no facebook, agora desenvolveram este método de estudos. A reportagem do site participou de um dos grupos por três dias e visualizou mensagens de estudantes de estados como Maranhão, Bahia, Minas Gerais e Paraná, que recorreram ao celular para esclarecer dúvidas sobre gramática, conhecimentos gerais, atualidades e ainda para formular argumentos para a redação.

É possível identificar a questão do uso de smartphones por estudantes, além do caso local analisado nesta pesquisa. Se trata de um fenômeno com variações e similitudes em uma série de escolas em áreas urbanas. Wright Mills em A Imaginação Sociológica (1969), afirma que ocorrem diariamente milhares de pequenos eventos em diversos “grupos pequenos” ao redor do mundo, segundo ele, essa variedade não é desordenada como parece ser.

A luta por esses pontos de vista é a principal e permanente luta da ciência social. Nosso objetivo é definir essa realidade e discernir esses sentidos; é em termos deles que os problemas da ciência social clássica são formulados, e assim as questões e preocupações que esses problemas representam, são enfrentadas. É necessário procurarmos uma compreensão plenamente comparativa das estruturas sociais que surgiram e hoje existem na história mundial. É necessário que os ambientes de pequena escala sejam selecionados e estudados em termos das estruturas históricas em grande escala. [...] A ideia da estrutura social, juntamente com a afirmação de que ela constitui a unidade genérica da ciência, está historicamente associada de perto à Sociologia, e os sociólogos têm sido seus expoentes clássicos. A matéria tradicional, tanto da Sociologia como da Antropologia, tem sido a sociedade total; ou, como os antropólogos dizem "a cultura". O que é especificamente "sociológico" no estudo de qualquer característica particular de uma sociedade total é o esforço permanente para relacionar essa característica com outras, para se chegar a uma concepção do todo. A imaginação sociológica, já observei, é em parte considerável resultado do treinamento nesse tipo de esforço. (MILLS, 1969, p. 145-146,149).

Para Dayrell (2007), ainda persiste na escola a gestão da sociedade moderna, com uma separação entre sociedade e escola, onde cabia a essa última levar aos estudantes valores e normas universais. Quando o jovem chegava naquele espaço se “convertia” em estudante na tentativa de internalizar a disciplina e centrar nos aprendizados. Em um modelo ideal, muito próximo àquele que regia o mundo do trabalho, esperava-se que ele fosse disciplinado, obediente, pontual e se envolvesse aos estudos com eficiência. Segundo o autor, hoje a escola é invadida pela vida juvenil, com seus estilos, costumes, práticas de grupos, amizades, namoros etc. Enfim, os jovens não se transmutam ao modelo dado como no passado, mas constroem eles mesmos a experiência como tal.

O smartphone em sala de aula é um assunto evidente em diversas escolas em áreas urbanas ao redor do mundo. As leis proibitivas veem o aparelho como um sério problema à aprendizagem, enquanto alguns estudiosos compreendem que as tecnologias digitais devem ser pensadas e utilizadas em favor do ensino. Essas questões são recentes e por enquanto não existe um consenso sobre o “melhor” e “pior” uso do celular em sala de aula.

6.1. O uso de smartphones pelos estudantes pesquisados

Conforme dados levantados pelos questionários aplicados durante a pesquisa, 92% dos estudantes possuem smartphone. Este número representa 23 do total dos 25 sujeitos do grupo observado. Além disso, a pesquisa identificou que o smartphone faz parte do dia-a-dia desses jovens, inclusive em sala de aula.

Para Dayrell (2007), os jovens ostentam junto dos seus corpos roupas, acessórios, piercings, brincos ou tatuagens para marcar a adesão individual ou coletiva de um determinado estilo, e também para pontuar um status social desejado. O autor observa, que o uso de aparelhos eletrônicos, principalmente os celulares tem mostrado grande impacto no cotidiano juvenil, carecendo de maiores estudos a respeito.

Antes de analisar o uso do celular em sala de aula pelos estudantes, cabe pontuar sobre a interação dos sujeitos com as tecnologias digitais no contexto hiperconectado. São comuns os questionamento e críticas a respeito das vivências, como jogos, posts22 e publicações de fotos em redes sociais. Afinal, essas não seriam experiências reais, pois estão no âmbito do virtual.

Em todas as sociedades, a humanidade tem existido em um ambiente simbólico e atuado por meio dele. Portanto, o que é historicamente específico ao novo sistema de comunicação organizado pela integração eletrônica de todos os modos de comunicação, do tipográfico ao sensorial, não é a indução à realidade virtual, mas a construção da realidade virtual. [...] “virtual” é o que existe na prática, embora não estrita ou nominalmente, e “real é o que existe de fato”. (CASTELLS, 1999, p. 455).

Castells (1999) explica que os novos sistemas de comunicação implicam uma transformação radical no espaço e tempo, fundamentais a vida humana. Logo, tempo é eliminado, já que passado, presente e futuro podem estar interagindo na mesma mensagem. O autor define esses espaços de fluxos contínuos e intemporais de “cultura da virtualidade real”, pois transcendem o que foi historicamente transmitido e ao mesmo tempo o incluí, e o “faz de conta” vai se tornando realidade.

No entanto, para Levy (1996), a virtualização promove a unidade do tempo sem a unidade de espaço (graças às interações em tempo real por redes eletrônicas, às transmissões ao vivo, e sistemas de telepresença). Há uma continuidade de ação apesar de uma duração descontínua. A sincronização substitui a unidade de lugar, e a interconexão, a unidade de tempo. Para o autor, a virtualização, apesar de ser um assunto emergente devido ao desenvolvimento cada dia mais acelerado das tecnologias de informação e comunicação, não está somente relacionada a esse fator. As invenções de novas velocidades possuem um primeiro grau da virtualização, a exemplo dos meios de transporte que possibilitam maior interação de pessoas situadas em locais distantes, através das possibilidades de deslocamento entre um lugar e outro.

Cada novo agenciamento, cada “máquina” tecnossocial acrescenta um espaço-tempo, uma cartografia especial, uma música singular a uma espécie de trama elástica e complicada em que as extensões se recobrem, se deformam e se conectam, em que as durações se opõem, interferem e se respondem. A multiplicação contemporânea dos espaços faz de nós nômades de um novo estilo: em vez de seguirmos linhas de errância e de migração dentro de uma extensão dada, saltamos de uma rede a outra, de um sistema de proximidade ao seguinte. Os espaços se metamorfoseiam e se bifurcam a nossos pés, forçando-nos à heterogênese. (LÉVY, 1996, p. 22-23).

A partir da análise de Castells (1999) sobre o tempo na era da integração eletrônica digital, é possível afirmar que os estudantes estão em vários momentos desconstruindo o tempo da aula, e construindo uma realidade a partir de seus interesses, através de jogos no celular, da música conectada aos fones de ouvido, ou das conexões com whatsApp, facebook, instagram, entre outros.

Enquanto Castells (1999) e Lévy (1996) analisam o espaço/tempo no âmbito do “real” e do “virtual” com perspectivas distintas, Bauman (2001), afirma que as constantes mudanças e adaptações atuais fazem parte do que ele denomina de tempos líquidos. A liquidez é caracterizada pela capacidade de fácil mobilidade influenciada pela ação do tempo, não se prende a forma e está sempre propensa a alterações. A liquidez foi um caminho constituído pela própria modernidade a fim de dissolver a sociedade estagnada e resistente às mudanças necessárias ao “espírito moderno”, e teve por objetivo retirar a centralidade de tradições e valores que suprimiam a racionalidade instrumental. Era necessário construir uma nova solidez aperfeiçoada, “imune a qualquer ação que não fosse econômica”. Assim, essa nova ordem veio a dominar as outras esferas da vida humana, pois “[...] o que quer que pudesse ter acontecido nessa vida tornou-se irrelevante e ineficaz no que diz respeito à implacável e contínua reprodução dessa ordem.” (BAUMAN, 2001, p.9).

Na esfera do uso do smartphone, umas das questões aos estudantes indagava qual a finalidade de possuir este modelo de celular. Logo, puderam optar por mais de uma resposta, conforme especificado na tabela a seguir:

Tabela 1 – Finalidade de possuir um smartphone



Média de respostas por entrevistado


Fonte:
Questionário aplicado aos estudantes. 2015.

Segundo as informações descritas na tabela acima os estudantes marcaram em média 2,26 opções de resposta. Possuir um smartphone para se comunicar com amigos/familiares que também usam este tipo de celular aparece em primeiro lugar entre as respostas; a alternativa porque acessa a internet e redes sociais ficou em segundo lugar; já a opção porque pode ser usado para várias funções ficou na terceira posição das respostas marcadas, enquanto a resposta outro motivo teve menor importância e foi assinalada apenas uma vez, onde o estudante afirma que o outro motivo é “pra tudo”, conforme mostra a imagem a seguir:

Imagem 3 – Resposta de um estudante


Fonte:
Questionário aplicado aos estudantes. 2015.

As respostas contidas na tabela 1 revelam que possuir este modelo de celular significa estar inserido na comunicação com o grupo de pertencimento, através de aplicativos de mensagens, redes sociais e etc. Apesar do caráter utilitário do aparelho aparecer apenas em terceiro lugar na frequência de opções, teve quantidade relevante de respostas. Entretanto, a alternativa em aberto “outro motivo” foi explorada apenas por um estudante, não revelando mais opiniões, e ainda apontando que os estudantes não fizeram maiores reflexões a respeito, simplesmente pelo fato que um telefone celular de modelo anterior não se adéqua às suas motivações de uso e são considerados ultrapassados.

Em outra pergunta os estudantes responderam o que motiva o uso do aparelho celular em sala de aula, conforme demonstra o gráfico a seguir:

Gráfico 1 – Motivo para utilizar o smartphone em sala de aula


Fonte:
Questionário aplicado aos estudantes. 2015.

Conforme os números descritos, 72% dos estudantes assumem que utilizam o smartphone em sala de aula. 30% acreditam que podem utilizar o celular em sala de aula, conforme fazem outros espaços, porcentagem idêntica àqueles que dizem utilizar apenas entre as pausas nas atividades de aula. Enquanto, 22% afirmam estar cansados da aula quando resolvem acessar/utilizar o celular.

Segundo Dayrell (2007), existe atualmente um “ruir” dos muros da escola pública, onde a mesma absorve contextos sociais que vão desde a violência às informações de meios eletrônicos e cultura de massas. A escola apesar de possuir o monopólio da cultura acadêmica, concorre cada vez mais com diversos meios de socialização. O autor explica que o jovem leva para a escola as experiências vividas em outros espaços e tempos, e isso interfere na sua vivência naquele ambiente e na atribuição dos significados dados a ele. A escola como instituição se constituí de normas e regras que buscam unificar e delimitar a ação dos seus sujeitos. No que tange o cotidiano escolar o autor afirma:

No cotidiano, porém, convive com uma complexa trama de relações sociais entre os sujeitos envolvidos – alunos, professores, funcionários, pais – que incluem alianças e conflitos, imposição de normas e estratégias, individuais ou coletivas, de transgressão e de acordos; um processo de apropriação constante dos espaços, das normas, das práticas e dos saberes que dão forma à vida escolar. Fruto da ação recíproca entre o sujeito e a instituição, esse processo, como tal, é heterogêneo. Nessa perspectiva, a realidade escolar aparece mediada, no cotidiano, pela apropriação, elaboração ou reelaboração expressas pelos sujeitos sociais, fazendo da instituição educativa um processo permanente de construção social. (DAYRELL, 2007, p. 1118).

Para Certeau (2003, apud Duran 2007), o cotidiano se constitui como uma arte de fazer, no sentido de recriar, refazer. Significa, alterar os objetos e códigos reapropriando o espaço ao modo de cada um, a fim de constituir por meio de “táticas de resistência” uma sobrevivência diária. Existe uma liberdade onde cada pessoa busca vivenciar da melhor maneira a ordem social e a violência das coisas impostas, e esses modos de proceder são denominados como uma espécie de antidisciplina.

Encontrar sentidos nas artes de fazer de professores e alunos e considerar a legitimidade dos saberes e valores que tais práticas subterrâneas do coletivo escolar, suas estratégias e táticas próprias – este o deslocamento de perspectiva presente em pesquisas do cotidiano que se ocupam das “artes de fazer” dos praticantes, na busca da compreensão de suas regras próprias e de seu desenvolvimento. (DURAN, 2007, p. 120).

A partir das evidências do campo desta pesquisa, é possível incluir o smartphone na atual variedade de “coisas” que fazem parte da escola pública. Os estudantes levam o celular para este espaço, utilizam o aparelho nos trajetos entre salas, durante as aulas, nas pausas de aulas, de forma velada ou explícita. Esses jovens não estão apenas levando para escola aspectos simbólicos de experiências vividas fora dali, mas estão utilizando o celular em sala de aula, assim como utilizam nos ônibus, nas ruas, nas praças, em casa, no cinema e etc. Cabe salientar que não se pretende excluir as entidades privadas de ensino das questões em torno do celular em sala de aula.

O smartphone amplia as possibilidades de comunicação, interação e integração, mas existe uma evidente necessidade de conexão e de utilização das suas “ferramentas”. Atualmente não possuir um celular de modelo smartphone caracteriza uma limitação no âmbito do consumo (mesmo que isso seja uma escolha), uma desconexão com as tecnologias ubíquas (onipresentes) e uma restrição de integração social que acaba se limitando ao face a face, a um computador desde que conectado a internet ou ainda ao “estranho” telefone fixo.

O que caracteriza o novo sistema de comunicação, baseado na integração em rede digitalizada de múltiplos modos de comunicação, é sua capacidade de inclusão e abrangência de todas as expressões culturais. Em razão de sua existência, todas as espécies de mensagens do novo tipo de sociedade funcionam em um modo binário: presença/ausência no sistema multimídia de comunicação. Só a presença nesse sistema integrado permite a comunicabilidade e socialização da mensagem. Todas as outras mensagens são reduzidas à imaginação individual ou às subculturas resultantes de contato pessoal, cada vez mais marginalizadas. (CASTELLS, 1999, p. 457- 458).

A formulação da questão sobre quais usos são feitos do smartphone em sala de aula, foi baseada nas observações realizadas na pesquisa de campo. Deste modo, os estudantes puderam assinalar diversas opções, conforme descreve a tabela a seguir:

Tabela 2 – Quais os usos feitos do smartphone em sala de aula

Média de respostas por entrevistado


Fonte:
Questionário aplicado aos estudantes. 2015.

Conforme descreve a tabela acima, os estudantes assinalaram em média 2,56 respostas. Ouvir música com fones de ouvido é a primeira opção dentre os usos feitos do smartphone em sala de aula; o uso para auxilio em atividades de aula aparece em segundo lugar; o uso do aplicativo whatsApp e jogos aparecem como a terceira forma mais utilizada; atender ligações é a quarta opção mais assinalada; ver/fazer fotos e visualizar vídeos aparecem entre as opções menos importantes, já a resposta nunca fez uso do smartphone em sala de aula foi assinalada apenas duas vezes, surgindo na última colocação das respostas assinaladas.

Ainda em relação aos dados contidos na tabela 2, o uso do aplicativo de trocas de mensagens whatsApp que aparece apenas na terceira colocação das respostas dadas, sinaliza que os grupos de interesses para envio de conversas estão dentro da própria escola e não fora dela. Afinal, os jovens não trocam algumas imagens, assuntos ou piadas com adultos, mas entre eles mesmos, e na escola conforme foi observado, fazem isso mostrando a própria tela do celular para o colega em sala de aula, na entrada da escola ou no intervalo. Segundo pesquisa divulgada em dezembro de 2015 pela Conecta23 (Plataforma web do ibope inteligência), o whatsApp é o aplicativo para smartphones mais utilizado entre os brasileiros.

Além disso, as observações mostraram que o aparelho celular para auxílio em atividade pedagógica esteve presente em todas as aulas da disciplina de Matemática, através do uso autônomo da calculadora pelos estudantes. Existindo a hipótese destes usos se estenderem às aulas de Física, Química e demais que demandam cálculos. Na disciplina de Sociologia não foi identificado nenhum uso para auxílio das aulas, apenas uma estudante utilizou o smartphone para gravar em vídeo o grupo que realizava apresentação de trabalho. Verifica-se que a resposta “uso de aplicativo que ajuda na atividade/assunto de aula” em segundo lugar mais assinalada só pode ser confirmada se houverem este tipo de uso nas aulas das demais disciplinas não observadas.

Conforme demonstra a tabela 2, o item ouvir música aparece com maior número de respostas, podendo ser relacionado aos 30% (ilustrados no gráfico 1), que dizem usar o smartphone em sala de aula porque acreditam que o mesmo pode ser utilizado ali conforme é em outros espaços, e ainda aos 30% demonstrado no mesmo gráfico que afirmam utilizar o smartphone porque naquele momento não há atividade de aula, o professor não está em sala, ou terminou de fazer algum exercício proposto. É importante pontuar que o uso do celular conectado aos fones é caracterizado como uma forma de uso particular/privado, relacionado a escolha pessoal de ouvir determinada música naquele momento, de não ouvir a aula e os colegas ao lado. Castells et al (2007), observam que os telefones celulares são dispositivos individuais e pessoais, amarrados indissoluvelmente à vida cotidiana dos jovens, permitindo formas flexíveis do seu uso.

É importante pensar qual a atual centralidade da escola tradicionalmente afirmada como local de transmissão do conhecimento para a formação dos jovens em futuros adultos. O fato das tecnologias digitais terem provocado transformações importantes na relação entre sujeitos e seus referenciais tradicionais não deve ser ignorado, não obstante, as religiões parecem ter se adaptado rapidamente a essas “demandas” expandindo a missão evangelizadora e formadora dos fiéis às redes sociais, sites, blogs e etc. Deste modo, os estudos da educomunicação propõe introduzir a tecnologia em sala de aula de maneira qualitativa, a fim de alinhar a escola com a realidade vivenciada pelos estudantes. Se tratando obviamente da escola pública, é irreal fazer um paralelo ao que as igrejas vêm desenvolvendo, até porque os objetivos são distintos, e o caráter material/financeiro é decisivo. Porém, este exemplo prático mostra como o tradicional se ressignificou para além do que já era praticado.

A inclusão da maioria das expressões culturais no sistema de comunicação integrado baseado na produção, distribuição e intercâmbio de sinais eletrônicos digitalizados tem consequências importantes para as formas e processos sociais. Por um lado, enfraquece de maneira considerável o poder simbólico dos emissores tradicionais fora do sistema, transmitindo por meio de hábitos sociais historicamente codificados: religião, moralidade, autoridade, valores tradicionais, ideologia política. Não que desapareçam, mas são enfraquecidos a menos que se recodifiquem no novo sistema [...]. (CASTELLS, 1999, p. 458).

A penúltima pergunta do questionário buscou relevar se os estudantes acreditam que o uso do smartphone pode os atrapalhar durante as aulas, conforme ilustra o gráfico a seguir:

Gráfico 2 – Se o uso do smartphone atrapalha o estudante nas aulas


Fonte:
Questionário aplicado aos estudantes. 2015.

Conforme demonstra o gráfico acima, 61% dos estudantes acreditam que o uso do celular em sala de aula pode os atrapalhar de alguma maneira; 35% afirmam que não os atrapalha e 4% disseram não saber. Diante desses dados é possível afirmar que existe uma contradição entre a ação e a forma de pensar dos estudantes. A maioria afirma que o uso do celular pode os atrapalhar nas aulas, mas, conforme mostram as informações contidas na tabela 2, os próprios estudantes dizem fazer vários usos do celular em sala de aula. Conforme evidenciado nas observações, mesmo que a sala de aula tenha momentos “vagos”, o tempo predominante é empregado pelos professores em aulas expositivas e realização de atividades. Logo, é possível verificar que os estudantes compreendem em alguma instância que a sala de aula constitui-se por normas e regras a serem cumpridas, onde disciplina e atenção estão sempre relacionadas ao bom aprendizado, sucesso nas avaliações e boas notas. Ou seja, usar o celular em sala de aula com fins não pedagógicos, pode ser um problema quanto ao objetivo principal de estar na escola.

Acredito ser aqui, na forma como os jovens vêm se constituindo como alunos, que reside um dos grandes desafios na relação da juventude com a escola, colocando em questão velhos modelos, com novas tensões e conflitos [...]. Nesse cotidiano, o jovem aluno vivencia a ambiguidade entre seguir as regras escolares e cumprir as demandas exigidas pelos docentes, orientadas pela visão do “bom aluno”, e, ao mesmo tempo, afirmar a subjetividade juvenil por meio de interações, posturas e valores que orientam a ação do seu grupo (DAYRELL, 2007, p. 1119; 1121).

Os estudantes foram questionados na última pergunta se sentem constrangimento quanto à proibição do uso do celular em sala de aula, se a resposta fosse positiva, deveriam explicar por quê. Os dados levantados revelaram que 60,86% dos estudantes diz não sentir constrangimento quanto a proibição do uso. Os 39,14% que afirmaram se sentir constrangidos, justificaram o motivo do constrangimento conforme reproduções24 das respostas nas descrições a seguir:

“Porque as [sic] vezes realmente é necessário usar. Ou em tempo livre quero ouvir música e não pode.”

“pois muitas vezes o professor não está passando nada, não está em sala ou quando já acabei a matéria.”

“Porque eu acho que smartphone é objeto de distração para você usar quando você não estiver oculpado [sic] com tarefas ou atividades.”

“Porque o uso do smartphone pode ajudar nas aulas. E as [sic] vezes aconteceu algo grave na familia [sic], tipo acidente e acaba ligando no celular e não na escola.”

“Porque o smartphone pode ajudar em pesquisas, quando temos dúvidas de algumas atividades, por ex: traduzir algumas coisas de Inglês.”

“Por que nem sempre é para uso de aplicativo, ou para fins fúteis, as [sic] vezes precisa falar algo urgente com alguém [sic] e não pode, isso causa irritação ou discusãos [sic] desnecessárias.”

“Não exatamente, para alguns ficar sem celular é como morrer, entre tanto [sic] o motivo pelo uso do aparelho, conta para a proibição ou não, se for para auxilio [sic] e entreterimento [sic] da aula não há motivos para proibição, mas se o aparelho for usado simplesmente por puro interesse e atrapalhar a linha de raciocínio [sic] de outros alunos, que estão em sala, então a proibição deve ser colocada.”

“sim, porque as [sic] vezes é preciso usar o smartphone em sala.”

“não vai dar de conversar e ver alguns Videos [sic].”

Algumas respostas acima descritas mostram que os estudantes se sentem constrangidos com a proibição do uso do celular em sala de aula, porque desejam fazer usos no tempo “vago” de aula, colocando o aparelho celular como objeto de passa tempo e distração. É possível afirmar que os 60,86% não constrangidos com a proibição, fazem parte do grupo daqueles que sempre fazem uso do aparelho, independente do momento, de forma explícita, ou velada. As tentativas dos professores em coibir o uso do celular em sala de aula (a fim de seguir as regras) são de fato tentativas, pois, é evidente que o principal objetivo docente é dar continuidade aos conteúdos, e não utilizar o pouco tempo das aulas chamando atenção de estudantes, ou os levando para “sofrer sanções” junto a coordenação pedagógica. Durante as doze aulas observadas, nenhum estudante foi retirado da sala e encaminhado a coordenação por conta do uso do celular.

Nas respostas dos estudantes existem afirmações que o smartphone pode ajudar nas aulas, o que mostra um desconhecimento dos mesmos sobre a lei proibitiva. O celular sob mediação e autorização do professor pode ser utilizado nas aulas como auxílio pedagógico. Portanto, justificar a necessidade de utilizar o celular nas atividades de aula não é plausível, já que, por exemplo, a calculadora do celular é muito utilizada para tal. Todavia, o uso do aparelho sem planejamento do professor, acaba claramente desviado para outros fins.

Os estudantes também justificam necessitar atender ligações urgentes de familiares, pois estes não ligam no telefone da escola. Essa questão pode ser resultante de fatores como o pouco envolvimento de pais e familiares com a comunidade escolar, intensificado pela jornada de trabalho e a distância entre residência e escola. Afinal, os estudantes são de bairros variados fora do perímetro escolar. Além disso, as tarifas de ligação entre celulares têm menor valor, levam informação ao destinatário rapidamente sem intermediários, e a escola possui uma linha de telefone fixo para receber ligações externas. Portanto, se os pais de fato efetuam ligações diretas para seus filhos em sala de aula, é evidente que a escola necessita estabelecer um diálogo com os mesmos, a fim de constituir acordos harmônicos. Esses sujeitos possuem, utilizam e criam comunicação entre si através do telefone celular.

O resultado das observações do grupo objeto da pesquisa traz como evidência o fato de que em todas as aulas observadas houve o uso do celular em sala de aula pelos estudantes. Na mesma aula os estudantes utilizam o aparelho com o mesmo objetivo mais de uma vez, como para outros fins. Assim, apesar da heterogeneidade do ambiente escolar, é identificável fatos comuns relativos ao uso do smartphone pelos estudantes. Estes usos nem sempre são individualizados, ocorrem situações que eles mostram uma mensagem para outro, uma foto, um vídeo, emprestam o aparelho para o colega jogar, usar a calculadora ou a câmera. Os professores, não retiram muito tempo para advertir os estudantes sobre o uso indevido do celular (definido pela lei), pois o tempo de aula é limitado, além de ser algo desgastante, laborioso e pouco eficiente para os docentes.

Deste modo, é possível afirmar que os estudantes compartilham entre si vários interesses em relação ao uso do smartphone. Dialogam em sala de aula sobre a “capinha” do celular, sobre as fotos que o outro compartilhou no whatsApp, sobre a dificuldade de instalar algum aplicativo, sobre o plano de internet móvel, sobre como se faz para avançar em um jogo, entre outros. Então, a regularidade do uso dos celulares em sala de aula perpassa as multi funções dos atuais aparelhos e o interesse desses jovens por essas “ferramentas” disponíveis.

Castells et al (2007, p. 166, tradução nossa), afirmam que a juventude adota e se apropria da tecnologia do celular a fim de construir sua própria cultura (uma identidade coletiva juvenil) através da diferenciação dos adultos, e particularmente dos seus pais. Conforme verificado nesta pesquisa, apesar do telefone celular se constituir como um elo de ligação entre os pais e seus filhos, é utilizado entre os jovens de formas variadas, buscando de alguma maneira serem distintas a dos adultos, como por exemplo, executarem jogos específicos que o grupo todo também joga no smartphone.

[...] o telefone celular é uma das ferramentas mais importantes na criação e manutenção de grupos de pares. Para os autores, o celular se constituí como uma engenhoca que permite que a rede social dos jovens possa estar continuamente alinhada. O telefone celular cria novas esferas de intimidade, novas formas e momentos de comunicação que estão no cerne da cultura da juventude móvel, e parece ter tido um impacto significativo na mudança da forma como os jovens se comunicam. (CASTELLS et al, 2007, p. 158, tradução nossa).

O smartphone possui características de um pequeno laptop, onde as pessoas se comunicam por aplicativos de mensagens instantâneas, utilizam e-mail, acessam ao banco, pagam contas, visualizam redes sociais, fazem registros através da câmera fotográfica, ouvem música, leem livros etc, ou seja, possui inúmeras funcionalidades, e estas estão inseridas na rotina dos estudantes pesquisados. Uma característica importante dos smartphones é a ubiquidade que o celular de 2ª geração já possuía, agora agregado a essas diversas funções e possibilidade de acesso a internet com maior velocidade.

Esse deslocamento na visão espaço-tempo ocorre, pela mobilidade do celular, e devido aos avanços da tecnologia, que possibilitaram agregar novas funções e serviços aos aparelhos, destacando a conectividade, o estabelecimento de uma comunicação e obtenção de informações em qualquer lugar sempre disponível e acessível, desde que de posse de um celular, devidamente conectado, carregado e com créditos. (ABONIZIO; FONSECA, 2010, p.9).

Para Lévy (1999), o ambiente proporcionado pela internet e computadores em rede é denominado de ciberespaço, e nele existe a possibilidade de interação e aproximação entre os usuários que se encontram fisicamente distantes (ou não). O termo ciberespaço surgiu em 1984 no livro de ficção científica de William Gibson intitulado Neuromancer. Assim, o autor na obra Cibercultura (1999), afirma que o termo (cibercultura) é um neologismo para designar as práticas, maneiras de pensar e valores que se desenvolveram justamente com o crescimento importante do ciberespaço.

Segundo Lévy (1999), as tendências tecnológicas contemporâneas foram importantes nas transformações sociais e culturais, mas afirma que a técnica em si não é central. A cibercultura compreende que a tecnociência desenvolveu a bomba atômica no mesmo século que criou as redes interativas, onde a internet e o telefone acima de tudo possibilitaram a ampliação da comunicação humana. Este foi então um movimento oposto ao da razão e da técnica. Para Lévy, a microinformática rompeu com a informática racional e burocrática de fins militares e fez os computadores serem utilizados pelas pessoas e não contra elas.

Deste modo, Lemos (2010) explica que a cultura contemporânea, associada às tecnologias digitais (ciberespaço, simulação, tempo real, processos de virtualização, etc.), criam uma nova relação entre a técnica e a vida social que é chamada de cibercultura. Logo, essa perspectiva acredita que as novas tecnologias são vetores de agregação social, e a cibercultura advém da convergência entre sociabilidade contemporânea e as novas tecnologias de base microeletrônica.

As análises sobre o uso de smartphones pelos sujeitos nos contextos urbanos podem ser abordadas por diversos pontos de vista, mas não devem se limitar a sociabilidade, as suas funcionalidades e às abrangentes possibilidades de comunicação. É importante compreender que a posse e consumo destes aparelhos tecnológicos estão também no contexto de uma sociedade de consumo.

6.2. Considerações sobre o consumo

Canclini (2005), explica que a internacionalização abriu as fronteiras geográficas para incorporar bens materiais e simbólicos de outras sociedades, havendo a interação econômica de culturas dispersas. Para o autor, no século XX as tecnologias audiovisuais contribuíram para o desenvolvimento do público e o exercício da cidadania, porém estes meios que antes levaram as massas à esfera pública deslocaram a cidadania para práticas de consumo. Logo, esses cidadãos consumidores descobriram maneiras de adquirir informação, compreender a realidade pertencente e exercer direitos fora da burocracia institucional estatal, partidárias e sindicais. (CANCLINI, 2005, p.39).

Para Canclini (2005), as práticas de consumo colocam pessoas em sintonia além de limites territoriais, nacionais e culturais, principalmente entre os jovens ao diluírem suas “lealdades nacionais”. O logotipo de uma marca criada em outro país fará sentido para todos, inclusive para os que nunca saíram lá. O nacional se tornou o fragmento de vários países.

O smartphone faz parte de um conjunto de bens pensados fora do território nacional, onde o movimento “global” associado ao próspero mercado consumidor brasileiro trouxe para o país fábricas como da coreana Samsung, instalada em Manaus no ano de 2011, conforme noticiado pelo portal Tech Mundo.25 Os novos modelos de celular foram rapidamente absorvidos pela população brasileira nos grandes centros e em cidades do interior do país como Cuiabá. De acordo com estudo realizado no Brasil pela International Data Corporation (IDC) 26, no ano de 2014 o país havia comercializado 54 milhões de smartphones, representando 76,1% dos aparelhos celulares. Em Maio de 2015 os smartphones já representavam 94,4% do mercado total de telefones celulares.

Segundo a Pesquisa Nacional Por Amostra de Domicílios (PNAD) realizada em 2014 e divulgada pelo Instituto Nacional de Geografia e Estatística (IBGE) em abril de 2016, 77,9% das pessoas (136,6 milhões) entre 15 e 54 anos tinham telefones celulares. O smartphone se tornou o maior meio de acesso a internet pelos brasileiros, de 2013 para 2014 o percentual passou de 53,6% para 80,4%. A pesquisa apontou ainda que o acesso a internet via smartphone, tablet, smartTv, entre outros que não o computador, representava 60,8% nas áreas urbanas e apenas 16,5% nas rurais.

No questionário aplicado, além de responderam perguntas sobre o uso do telefone celular, os estudantes também forneceram informações relativas ao consumo do aparelho. Primeiramente eles foram questionados sobre como o smartphone foi adquirido, e aqueles que afirmaram ter comprado o próprio celular, deveriam obrigatoriamente responder a questão seguinte, conforme ilustram os gráficos 3 e 4 a seguir:

Gráfico 3 – Como o smartphone foi adquirido


Fonte:
Dados questionário aplicado aos estudantes. 2015.

Conforme os dados descritos no gráfico acima, 44% dos estudantes afirmam ter comprado seu smartphone; 43% dizem que seu aparelho celular foi adquirido pelos pais/familiares e 13% afirmaram ter tido acesso ao smartphone de outra maneira. Estes últimos deveriam escrever qual foi essa outra maneira, duas das respostas afirmam, igualmente “eu ganhei” e “ganhei”, mas não explicam, e outra resposta diz especificamente que foi “presente de um ex-namorado”.

Gráfico 4 – Smartphone comprado pelo próprio estudante


Fonte:
Dados questionário aplicado aos estudantes. 2015.

No gráfico 4 acima, dos estudantes que afirmaram ter comprado seu próprio smartphone, 50% dizem ter adquirido através de economia de dinheiro ganho de pais/familiares; 40 % com salário próprio, e 10% afirmam ter comprado com recurso de algum trabalho temporário.

Interpretando as informações dos gráficos 3 e 4 é possível afirmar que pais e familiares estão envolvidos em 65,21% das compras de smartphones que os estudantes possuem. Essa porcentagem corresponde a 15 respostas onde pais e familiares tiveram participação direta ou indireta na compra do aparelho. Portanto, conforme dados obtidos no universo pesquisado, onde 26,08% dos estudantes trabalham, e 73,91% não trabalham, a renda de pais e familiares é preponderante para esses jovens acessarem variados bens de consumo como o smartphone.

O telefone celular é muitas vezes um presente para os jovens usuários. As duas razões principais declaradas pelos pais para justificar a compra são a segurança e o que podemos chamar de "dote tecnológico" que os pais consideram importante dar aos seus filhos, a fim de ultrapassar um possível atraso tecnológico. (CASTELLS et al 2007, p. 161-162, tradução nossa).

Segundo Douglas & Isherwood (2013) existem convenções em torno dos presentes e algumas normas de bom senso, como, por exemplo, é correto enviar flores para alguém no hospital, mas não um cartão juntamente de uma quantia em dinheiro escrito “compre flores”! Para os autores, existem sanções sociais que protegem esses limites, assim, o direito de dar e receber dinheiro é privado à intimidade familiar.

Castells (1999) afirma que a revolução da tecnologia da informação foi fundamental para reestruturação do sistema capitalista a partir da década de 1980. Este processo foi moldado segundo as lógicas e interesses do próprio sistema, onde o informacionalismo surgiu como novo modo de desenvolvimento capitalista que outrora se baseava no industrialismo.

O informacionalismo visa o desenvolvimento tecnológico, ou seja, a acumulação de conhecimentos e maiores níveis de complexidade do processamento da informação. Embora graus mais altos de conhecimentos possam resultar em melhores níveis de produção por unidade de insumos, é a busca por conhecimento e informação que caracteriza a função da produção tecnológica no informacionalismo. (CASTELLS, 1999, p. 54).

É possível relacionar a análise de Castells sobre informacionalismo e a acumulação de conhecimento aos processos de intensa inovação de aparelhos eletrônicos como os celulares. O lançamento de novos modelos agregando um novo componente com funcionalidade mais avançada é constante, ou seja, o informacionalismo além de produzir mais em período reduzido, também permite que tecnologias diferentes sejam lançadas no mercado em menor espaço de tempo. Aliás, quando um produto é apresentado ao mercado já existe conhecimento e tecnologia para produção de alguns modelos subsequentes. Segundo notícia divulgada em outubro de 2015 pelo portal Tec Mundo27, a Intel28 afirma que em 2025 possivelmente exista a “internet das coisas”. A conexão irá além dos smartphones, laptops e tablets, estará nos automóveis, casas e outros objetos. Portanto, atualmente existem projeções de modelos tecnológicos que estarão em uso daqui 10 anos.

Para Silva (2012, p. 182-183), a obsolescência programada que surgiu na indústria do século XX, é central na discussão sobre o processo que leva as pessoas a consumirem um produto de novo modelo em curto espaço de tempo:

A obsolescência programada [...] é uma estratégia da indústria para “encurtar” o ciclo de vida dos produtos, visando a sua substituição por novos e, assim, fazendo girar a roda da sociedade de consumo. Poderíamos dizer que há uma lógica da “descartabilidade” programada desde a concepção dos produtos. Em outras palavras, as coisas já são feitas para durarem pouco [...] a história da obsolescência programada confunde-se com a história da indústria no século XX [...] visto que, na década de 1920, um cartel que reunia em Genebra fabricantes de todo o mundo decidiu que as lâmpadas teriam uma validade de apenas 1.000 horas, embora a tecnologia da época já pudesse produzir lâmpadas mais duráveis. Com a crise de 1929 e a consequente queda do consumo, a obsolescência programada se consolidou como uma estratégia da indústria para retomar o crescimento [...] até tempos bem recentes, com o famoso caso da primeira geração do iPod em que um artista de Nova York pagou US$ 500 por um iPod cuja bateria parou de funcionar oito meses depois e, quando foi reclamar, a resposta da Apple foi de que valeria a pena comprar um novo. O caso gerou passeata e ação coletiva na justiça.

Silva (2012) acrescenta que a obsolescência programada não diz respeito apenas a durabilidade dos produtos, e não se limita a questão especificamente tecnológica, mas está também no âmbito psicológico. Para muitas pessoas ser feliz está associado a adquirir o último modelo de qualquer coisa para poder “estar na moda”. Logo, esses sujeitos estão atendendo a necessidades fabricadas pelo mercado.

Neste aspecto cabe pontuar a diferenciação entre consumo e consumismo. Conforme explica Bauman (2008), o consumo relaciona-se a sobrevivência humana, sendo comum às sociedades. Enquanto o consumismo diz respeito à satisfação de necessidades criadas pelo sistema capitalista. Para o autor, na sociedade onde o consumidor é sujeito soberano, a inconveniência das escolhas mal sucedidas de produtos é facilmente solucionada pela substituição de um novo “aperfeiçoado”. O produto defeituoso ou apenas imperfeito é descartado.

Além da análise pontuada sobre obsolescência programada, é possível também relacionar o caso do consumo de smartphones a crítica feita por Bauman (2008). Pois, este modelo de telefone celular demanda programas para seu funcionamento que são constantemente atualizados, e num curto espaço de tempo esses programas não “cabem” mais no espaço anteriormente disponível, tornando o aparelho pouco eficiente, de memória limitada, consequentemente obsoleto.

A curta expectativa de vida de um produto na prática e na utilidade proclamada está incluída na estratégia de marketing e no calculo de lucros: tende a ser pré-concebida, prescrita e instilada nas práticas dos consumidores mediante a apoteose de novas ofertas (de hoje) e a difamação das antigas (de ontem). Entre as maneiras a que o consumidor enfrenta a insatisfação, principal é descartar o objeto que as causam. A sociedade de consumidores desvaloriza a durabilidade, igualando “velho” a “defasado”, impróprio para continuar sendo utilizado e destinado à lata de lixo. (BAUMAN, 2008, p. 31).

No Brasil, o crescente acesso aos bens de consumo tem sido associado às discussões acerca da melhoria de renda dos trabalhadores. No entanto, Pochmann (2014) observa que houve diminuição na base da pirâmide do país, ou seja, uma parcela da população saiu da linha da miséria e passou a fazer parte do grupo dos trabalhadores pobres das grandes cidades com renda média de 1,5 salários mínimos (pouco mais de mil reais). Além disso, essa população obteve acesso a crédito para consumo de bens anteriormente acessíveis apenas a classe média. Estes produtos foram popularizados por conta das alterações produtivas do capitalismo e das políticas de distribuição de renda.

Portanto, para Pochamann (2014) a fragmentação do processo produtivo na globalização capitalista diminuiu o valor da produção dos bens considerados duráveis. Eletrodomésticos, computadores e smartphones tornaram-se produtos de consumo dos trabalhadores, mas, sem fazer deles uma classe média. Apenas uma pequena parcela teve, ou terá acesso a bens de maior valor como casa própria, automóvel e ingresso ao ensino superior.

Não é central neste trabalho relacionar renda ao consumo de smartphones (comum às pesquisas de mercado), afinal, compreende-se que este modelo de telefone celular é atualmente um bem ampliado, acessível a diversos estratos sociais. Entretanto, não deixam de ser consideradas as informações socioeconômicas fornecidas pelos estudantes a respeito da renda e local de residência.

Os estudantes objeto da pesquisa residem nas regiões Sul e Leste da cidade de Cuiabá. Os bairros informados são Renascer, Jardim Petrópolis, Jardim Imperial, Jardim Itália, Costa Mar, Osmar Cabral, Jardim Eldorado, Boa Esperança, Residencial Coxipó, Coophema, Parque Cuiabá, Tijucal e Santa Cruz, alguns periféricos e outros considerados de “classe média”. A escola está situada em região acessível ao transporte público direto de todos os bairros mencionados. Os estudantes possuem passe livre29 que possibilita frequentar escolas fora dos locais onde residem.

Em relação a renda 39,13% responderam que os rendimentos da família são de 1 a 3 salários mínimos; 17,39% de 4 a 6 salários mínimos e 34,78% não soube responder. Foi considerado o salário mínimo de R$ 788,00, vigente no ano de 2015. O grupo de estudantes que declarou ter renda familiar de 1 a 3 salários mínimos residem na sua maioria (77,77%) em bairros periféricos da cidade. Portanto, a renda é um fator que implica muito mais nas condições de moradia das famílias, do que o acesso a bens como o smartphone. Residir em bairros próximo às regiões centrais, com acesso a água, esgoto, postos de saúde, escolas, entre outros, demanda recursos que muitas famílias trabalhadoras não possuem. Por isso, muitos se espantam ao ver uma TV de LED em um dos poucos cômodos de uma casa sem muro na periferia.

É importante considerar que poucos jovens nessa faixa etária têm informação de renda média da família, o que pode ser um indicador dos 34,78% que não deram nenhuma reposta sobre essa questão. Para Mannheim (1968), os estudantes das últimas séries do Ensino Médio não integram à contribuição da tessitura psicológica e econômica da sociedade constituída, portanto, pouco se interessam ou conhecem sobre a ordem existente.

Na pergunta seguinte, os estudantes foram questionados quanto ao valor médio dos aparelhos celulares, conforme demonstra o gráfico abaixo:

Gráfico 5 – Valor médio do aparelho smartphone


Fonte:
Questionário aplicado aos estudantes. 2015.

Conforme os dados obtidos, 31% dos estudantes possuem smartphone de R$ 750,00 a R$ 1.000,00, porcentagem igual aos aparelhos com valores entre R$ 500,00 e R$ 750,00. Já os smartphones de R$ 250,00 a R$ 500,00 e aqueles acima de 1.000,00 representam igualmente 17% dos aparelhos. Apenas um estudante declarou não saber o valor do seu smartphone, representando 4% do total. Diferente da pergunta relativa a renda da família (onde 34,78% não souberam responder), nesta questão, 96% dos estudantes responderam sobre o valor do smartphone, comprovando sua interação junto de pais e familiares no momento da compra, e àquelas realizadas por eles com economias de dinheiro ganho da família ou ainda de recursos do próprio trabalho. A maioria dos aparelhos, 62%, varia no valor de R$ 500 a R$ 1.000,00,

Ao tratar da centralidade do consumismo na atual sociedade, Bauman (2008), explica que entre as décadas de 1920 e 1970 ocorreu uma reestruturação entre capital e trabalho, com grandes processos de privatizações e terceirizações. As relações de trabalho no capitalismo se tornaram flexíveis, ou mesmo descartáveis, havendo então a passagem do centro da atenção do produtor (trabalhador) para o consumidor. Para o autor, quando as vidas, os corpos e os sentimentos são expostos on-line, as pessoas se tornam um produto, que deve ser cada vez mais atraente e desejado por conta das mercadorias que consomem. Então, além de serem promovidas por essas mercadorias as pessoas também são propagadoras das mesmas.

No caso da mercadoria na sociedade de produtores foi o ato de comprar e vender sua capacidade de trabalho que, ao dotá-la de um valor de mercado, transformou o produto do trabalho numa mercadoria – de uma forma não visível (sendo oculta) na aparência de uma interação autônoma de mercadorias [...]. A “subjetividade” dos consumidores é feita de opções de compra – opções assumidas pelo sujeito e seus potenciais compradores; sua descrição adquire a forma de uma lista de compras. O que se supõe ser a materialização da verdade interior do self é uma idealização dos traços materiais - "objetificados" - das escolhas do consumidor. (BAUMAN, 2008, p. 23-24).

Contudo, para Douglas & Isherwood (2013), o consumidor necessita da aprovação de seu consumo por outras pessoas, para que esse ato público seja inteligível. Portanto, na perspectiva antropológica, o consumidor pretende assegurar que os outros farão parte do seu ritual e que ele também será convidado ao deles. Através do consumo, as pessoas definem os eventos que são tradicionalmente importantes e menos importantes, como dia das mães, natal e ano novo. “O desfrute do consumo físico é só uma parte do serviço prestado pelos bens: a outra parte é o desfrute do compartilhamento de nomes” (DOUGLAS; ISHERWOOD, 2013, p. 122).

A Antropologia do consumo compreende que as Ciências Sociais tendem a explicar o ato de consumir a partir de aspectos pejorativos. Barbosa (2004), afirma ser necessário analisar o consumo no Brasil além das perdas e ausências. É importante enfatizar os ganhos e mudanças positivas em grupos sociais e nas melhoras do seu padrão de vida. No entanto, é preciso desvincular a noção automática de consumo com temas negativos como materialismo, exclusão, individualismo, hedonismo, lassidão moral, falta de autenticidade, desagregação dos laços sociais e decadência tão associados ao consumo desde o início do século XVII. A autora compreende que essas discussões dificultam e misturam conceituação e análise sociológica com moralidade e crítica social.

Barbosa & Campbell (2006), apontam que as análises acadêmicas no Brasil sobre o consumo, ainda estão muito relacionadas com os “males da sociedade do consumo” ou sobre o “materialismo da vida contemporânea”. Além disso, os intelectuais das Ciências Sociais ignoraram por muito tempo os segmentos das classes C e D como consumidores. Esses grupos estiveram sempre recortados nas pesquisas em relação à carência material e desigualdade social. Segundo as autoras, ironicamente os interesses da propaganda e do marketing também não se interessavam em pesquisar esse grupo que não possuía dinheiro para consumir, mas apenas para sobreviver. Porém, esses indícios contrariavam a grande evidência de que a base da pirâmide também consumia. As autoras tecem ainda críticas às abordagens das Ciências Sociais no Brasil sobre consumo:

Mas essa “ausência do consumo” como tema acadêmico e de pesquisa precisa ser qualificada. Não se trata apenas da falta de trabalhos, teses, pesquisadores e publicações. Trata-se, na verdade, mais da exclusão de certas abordagens teóricas e enfoques metodológicos, por um lado, e da presença seletiva de temas e vieses interpretativos, por outro. Consumismo, materialismo, fetichismo e hedonismo, manipulação, entre outros, sempre foram discussões privilegiadas nas ciências sociais brasileiras no que concerne o tema do consumo, paralelamente às abordagens marxistas da escola de Frankfurt, pós-modernas e semióticas. (BARBOSA; CAMPBELL, 2006, p.10)

Deste modo, a Antropologia busca trazer às suas análises aspectos subjetivos das escolhas de consumo. Barbosa & Campbel (2006), observam a importância de analisar o consumo além do produto direto, pois a produção não deve ser a única determinante do consumo, afinal, a mercadoria como lócus privilegiado nas análises reduz os consumidores a “sujeitos passivos” da propaganda e marketing e do capitalismo. Os corpos se equiparam a cabides, os shoppings centers e demais locais de compra a palcos onde circulam as variadas identidades do homem contemporâneo “expressas nos bens e serviços que portam e de que fazem uso”. Assim, as autoras apontam ser necessário ampliar as perspectivas teóricas e interpretativas para compreender a “complexidade do fenômeno do consumo no mundo contemporâneo”.

Para Pochmann (2014), o barateamento de bens considerados duráveis é importante para a crescente popularização do seu consumo. Esses produtos são monopólio de grandes corporações, movimentam grandioso capital e tecnologia. O consumo massificado desses bens no mundo todo supre uma enorme quantidade de produção. O autor compreende que esse consumo massivo é uma necessidade do próprio sistema capitalista.

Conforme foi pontuado neste subcapítulo, o caso do smartphone e a acelerada obsolescência implicam em constante consumo de um novo aparelho, tornando praticamente indissociável a análise do seu consumo ao modo de produção capitalista. Desta maneira, não se pretendeu enfatizar o caráter utilitarista do aparelho, tampouco desconsiderar os aspectos das relações sociais imbricadas em torno do telefone celular.

6.3. A opinião dos docentes entrevistados

Na última etapa da pesquisa de campo, foram realizadas entrevistas semiestruturadas com os professores Souza, da disciplina de Matemática e Silva da disciplina Sociologia que ministravam as aulas onde foram realizadas as observações. Uma das entrevistas se deu na escola em período vespertino, enquanto ocorriam as olimpíadas escolares, a segunda foi realizada no mesmo local, em período matutino no início das férias discentes. Ambas as entrevistas foram gravadas e transcritas.

Como a sala de aula se configura da relação diária entre professores e estudantes, considera-se importante a opinião desses docentes sobre o uso de smartphones em sala de aula. As entrevistas buscaram trazer a compreensão deles a respeito do celular na rotina dos estudantes e quais suas opiniões quanto às proibições e possíveis inserções do smartphone nas aulas. Portanto, nas próximas linhas serão descritas as principais falas dos professores obtidas através de áudio original da entrevista, a fim de dialogar com o objeto pesquisado.

O professor de Matemática discorreu a entrevista de forma suscinta, numa fala de aproximadamente 15 minutos. Ele afirmou que busca estabelecer uma relação de acordos com os estudantes em relação ao uso do celular em sala de aula, acreditando ser importante a flexibilidade, desde que os acordos sejam cumpridos.

Eu sou contra a lei, eu acho que a gente pode utilizar a tecnologia sim em sala de aula. Eu acho que, por exemplo, na verdade é o contrato do professor com o aluno né? Se o professor estabelecer a regras, você vai poder usar, só que neste horário, naquele horário. É fora isso, vai muito dessa troca né? De o professor estabelecer e fazer um acordo. Então, eu não tenho muito problema em sala de aula com o celular. É certo que tem sempre um ou outro que sempre insiste, mas eu trabalho em outra escola [[privada]] e não existe a proibição do uso e a aula acontece do mesmo jeito. Inclusive eu até uso o celular pra fazer pesquisa em sala de aula, fazer gráficos. Então eu sou a favor do uso do celular, mas eu sou a favor que tenha um acordo antes. (informação verbal) 30

O professor Silva citou ainda, que mudar as formas de interagir com os equipamentos levados pelos estudantes a escola, vai além da questão pedagógica, está relacionada também a formação que os docentes têm acesso nas universidades. Logo, ele acredita que o governo deveria investir em formação continuada para preencher essa lacuna que a formação superior ainda deixa no que tange as questões do uso de tecnologias menos tradicionais em sala de aula.

Eu acho que os professores não estão preparados pra isso. Eu tenho uma formação recente, a minha formação também não foi pra isso. Minha formação eu aprendi a usar o datashow, é a tecnologia que eu aprendi usar, né? Usar datashow, a fazer gráfico no computador, mas, por exemplo, lá na universidade eu não aprendi a ensinar matemática através do smartphone. Entendeu? Tem várias questões. Eu acho que o governo devia investir em formação continuada dos professores. Por exemplo, a professora de português pode usar o celular pra usar o dicionário em sala de aula. A gente não ter que ficar carregando o dicionário. A mesma coisa o inglês, o espanhol, usar o tradutor do celular né? Matemática eu consigo alguns gráficos, mas é um programinha mais pesado, então ai depende muito do celular que os alunos têm. Mas a gente corre riscos deles não usarem para o objetivo da aula. A dificuldade daqui, como de qualquer outra escola, é que têm sempre dois os três que fazem e cinco seis não fazem, digo, de professores. Têm professores que proíbem e permitem só o uso essencial pra aula, mas tem professor que não ta nem ai, ele usa, o aluno usa, entendeu? Eu sou a favor do uso do celular para fins pedagógicos, sou contra a proibição total. Na minha aula, a gente usa muito a calculadora e o cronômetro, por exemplo. (informação verbal). 31

Observa-se na fala acima, a crítica da limitação da formação nas universidades para utilizar novas tecnologias no ensino. É importante compreender que de fato a formação nas licenciaturas são insuficientes neste aspecto, mas deve ser considerado que as discussões sobre utilização das TICs na educação são muito recentes, e que nem mesmo as universidades possuem docentes preparados para ensinar essas novas metodologias. Além disso, não se trata de ter computadores em sala de aula, smartphones e etc., o ideal seria que esses equipamentos fossem abastecidos por programas desenvolvidos exatamente para finalidades de ensino/aprendizagem. Do contrário, estarão sempre limitados ao uso de calculadoras, câmeras, cronômetro sem preparação alguma. Silva, afirma ser positivo o uso do celular para fins pedagógicos, mas é identificável seu receio no trecho “mas a gente corre riscos deles não usarem para o objetivo da aula”, afinal, conforme foi verificado nas observações os usos dispersos do smartphone ocorrem todos os dias em sala de aula.

O professor de Sociologia discorreu sua fala em maior tempo, a gravação da entrevista durou aproximadamente 38 minutos. Para ele a escola é tradicionalista, as formações dos professores são diversas, por isso, é comum que haja o conflito em torno do smartphone em sala de aula.

Há professores com formação mais tradicionalista, mais conservadores, há professores com formação mais progressistas, mais abertos às questões desse novo tempo, mais atuais. A questão do uso do smartphone na escola, muitas vezes fica inviabilizada por esse ethos que predomina na escola. A escola ainda é muito tradicionalista, conservadora, e por isso ela é muito refratária ao novo. Então acaba gerando conflitos entre professores e os educandos. Mas eu creio que muito desse conflito existe porque não se encontrou um meio pra assimilar essa tecnologia pra um fim realmente pedagógico. Ai o educando quando não tem esse direcionamento, desse recurso para um fim pedagógico, ele acaba usando esses aparelhos, no caso o smartphone, de uma forma inapropriada, que não se encaixa ao que o professor propõe como atividade. (informação verbal).32

Souza demonstra ter pontos de vistas distintos sobre o smartphone, é possível verificar na próxima reflexão a junção da opinião de Cientista Social, ao da sua posição como educador que se relaciona com os jovens estudantes:

A respeito do smartphone eu penso que exerce um grande poder de fetichismo, de fetiche, os nossos jovens, não só jovens, os adultos, mas principalmente os nossos jovens, eles de certa forma veneram, é uma questão de status, né, possuir o smartphone, a questão de identidade, questão de pertencimento de grupo. Mas eu vejo que muitos jovens eles sacrificam muitas coisas pra ter essa maravilha entre aspas que o sistema capitalista e a sociedade de consumo oferecem. Mas assim, por outro lado, eu vejo que o smartphone, não só o smartphone, como outras mídias também, fazem parte da sociabilidade contemporânea, vivemos na sociedade da informação, e esse aparelhos nesse sentido oferecem múltiplas condições pra você ter conhecimento, informações. (informação verbal).33

O professor de Sociologia acredita que o smartphone é um objeto de fetiche e maravilha (entre aspas) oferecida pelo sistema capitalista, e que muitos jovens se sacrificam para consumir esses produtos. Observa-se na fala de Souza uma crítica ao modelo da sociedade de consumo, além da perspectiva como graduado em Ciências Sociais de desnaturalização da realidade social. Entretanto, adiante ele afirma que os aparelhos tecnológicos são meios de ampliar o acesso às informações e conhecimento, mas não problematiza a qualidade da informação que se tem acesso.

É importante pontuar, que ambos os professores tiveram opiniões sobre as questões pedagógicas em torno do uso do celular, pois, como educadores é evidente que a relação entre eles, estudantes e essa tecnologia em sala de aula vai além de controlar, coibir ou fazer valer uma legislação.

Ainda mais se tratando do caso específico da Sociologia, eu como professor procuro trabalhar os clássicos, há sim uma necessidade que a própria disciplina exige de uma concentração, de um poder de abstração né. Não que não fosse possível usar o smartphone vinculando com o conteúdo da Sociologia, poderia até propiciar um esclarecimento melhor sobre certos assuntos, mas isso requer que o professor faça um planejamento, uma reformulação. A minha formação, quando eu me formei, eu não passei por isso, é muito atual isso, recente, mas eu vejo necessidade sim, de como professor de preparar aulas, planejar aulas, adotar estratégias para trazer essa tecnologia, essa ferramenta como recurso de aprendizado da Sociologia. Como forma até de ampliar o conhecimento sociológico, otimizar o conhecimento sociológico. Eu acho que ele pode servir sim como um potencializador para o educando absorver conhecimentos. Mas pra isso é necessário que seja canalizado a atenção do educando para esse fim pedagógico. (informação verbal).34

O professor de Sociologia afirmou saber que os estudantes fazem diversos usos do celular em sala de aula, mas que tenta ser flexível e não ficar o tempo todo controlando os estudantes, porém, acredita na importância de otimizar o uso desses aparelhos.

Eu fico assim num dilema né, na minha postura em relação ao uso dessas mídias, no caso do celular smartphone. As estratégias pra acessar o smartphone são inúmeras. Alguns pedem pra ir ao banheiro, mas portando de uma forma escamoteada o smartphone, pra lá fora ele acessar. Ou muitos camuflam dentro da mochila, ou as escondidas atrás de um colega, pra acessar de uma forma que os professores não enxerguem. E há também devido a essa repressão que há na sala de aula para o não uso, de um denuncismo, “professor o aluno tal, ta mexendo no celular”. E o professor se sente na obrigação de coibir o uso. Agora quanto a mim, embora a escola tenha feito um acordo pedagógico entre todos os docentes para evitar o uso do celular, mas muitas vezes eu faço vistas grossas né, não sou assim tão radical, intolerante, mas por outro lado, se não houver um projeto da escola para lidar com esses recursos, não há como. (informação verbal).35

Os relatos de Souza reafirmaram o que foi identificado nas observações como “estratégia” dos estudantes para usar o telefone celular e não serem repreendidos. Além disso, conforme foi pontuado no capítulo 4, o professor não utiliza muito tempo para controlar o uso e trânsitos do smartphone durante as aulas, pois o andamento do conteúdo é claramente mais importante, mesmo que não haja atenção unânime.

O docente da disciplina de Sociologia, afirmou que muitas vezes é complicado estabelecer um diálogo, um debate com os estudantes sobre as teorias sociológicas, porque a sua proposta didático pedagógica busca ouvir a opinião deles sobre determinada questão. Relacionar as vivências com o conhecimento científico carece de discussão, de conversa, de atenção na proposta da aula, e o smartphone desvia o foco dos estudantes.

Nesse sentido que eu me sinto muito incomodado com a questão do smartphone, porque a proposta pedagógica que eu adoto, é esse debate, essa interação o diálogo sempre. Mas, devido a ubiquidade do smartphone, eles ficam tentados, vejo que isso até se tornou uma espécie de problema social também. Virou uma espécie de um vício. Eu mesmo como adulto, já tenho 35 anos, muitas vezes eu me deito tarde, porque fico nas redes sociais. É claro que eu como homem esclarecido, procuro usar as redes sociais com um fim pedagógico, tenho muitos educandos adicionados no facebook. Então minhas postagens sempre buscam um quê pedagógico. (informação verbal)36

É importante destacar na fala acima, que o professor se considera um “homem esclarecido”, e por isso usaria as redes sociais de forma responsável, demonstrando a visão do adulto que considera os jovens irresponsáveis. Contudo, ele afirma que o uso das tecnologias digitais se tornaram um problema social, um vício, e que inclusive ele vai dormir tarde porque fica nas redes sociais. Portanto, a “irresponsabilidade” de dormir tarde com afazeres na manhã seguinte não se restringe a vida juvenil, o que os distingue neste caso, é o fato do estudante cochilar durante as aulas que o professor ministra.

Esta pesquisa não pretende discutir o ensino de Sociologia na escola média, afinal acompanhar as aulas da disciplina foi uma condição/proposta da escola, não uma escolha do projeto de pesquisa. Mas cabe salientar que os estudos acerca do ensino de Sociologia continuam discutindo a melhor transposição do conhecimento acadêmico para a escola. Logo, pensar o uso do smartphone nessas aulas revela-se a priori algo laborioso, mas também poderia ser uma ferramenta importante neste processo.

Para o docente da disciplina de Matemática, o conflito entre professores e estudantes ocorre principalmente porque os jovens desafiam a ordem, quebram os acordos estabelecidos entre eles e não têm capacidade de refletir que suas atitudes interferem na vida das demais pessoas.

Na verdade eu acho que eles querem provar, que eles conseguem usar o telefone em sala de aula. Apesar que muitos deles, nem internet tem, eles ficam mexendo e tal, tem uns alunos aqui, que eles ficam provocando pra ver a reação do professor. Eles pegam a capinha do celular e eles ficam fingindo que estão mexendo, ai professor chama a atenção, ele mostra a capinha e ta vazia, não tem celular. Entendeu? (...) colocar o fone de ouvido alto, pra sala inteira ouvir, atrapalha o colega também, mas depende do uso, mas eu acho que quase 60% atrapalha mais o indivíduo que usa, mas atrapalha os outros também, irrita o professor, deixa o professor fora do eixo. Na verdade essa juventude ai, ela pensa nela só, né? Não vê as consequências. As consequências que eles veem é sobre eles mesmos. Eles acham que as atitudes que eles tomam, só interferem a eles. (informação verbal).37

Para Silva, a escola tem se amparado na lei de proibição do celular porque acredita que isso assusta os estudantes. Ele afirmou ser contra a lei, pois a escola poderia ter imposto isso sempre, independente da lei existir, sendo que o estudante só faz uso inconveniente do celular se o professor permitir e não estabelecer acordos. Já o docente da disciplina de Sociologia, disse ser a favor da proibição apesar da dificuldade da escola manter as sanções e controles. Segundo Souza, houve uma pequena melhora no aprendizado dos estudantes em relação ao ano anterior.

Para o professor de Matemática, a dificuldade de agregar as tecnologias digitais nas aulas começa ainda na formação universitária. A limitação neste aspecto se estende pela ausência de qualificação por parte governo, e da inexistência de projetos na escola para utilizar os aparelhos com finalidades de ensino e aprendizagem. O docente da disciplina de Sociologia também afirmou que na sua graduação esses assuntos nem eram discutidos, mas acredita que ele pode repensar e reformular as aulas para a tecnologia ser uma ferramenta que amplie o conhecimento sociológico.

O tema da proibição do celular e da adequação dos seus usos para fins pedagógicos estiveram muito presentes nas falas dos professores. Foi possível identificar nas opiniões relatadas uma tentativa constante de compreender que os smartphones fazem parte da vida dos estudantes, e que isso pode ser acordado sem grandes conflitos. Contudo, nesses mesmos depoimentos os professores demonstraram se incomodar com o uso do celular em sala de aula. Deste modo, apesar das falas dos docentes terem demonstrado o desejo do trânsito qualitativo do celular em sala de aula, também evidenciaram que o melhor seria apenas proibir, pois está claro aos mesmos que as mudanças implicam também alterações nas suas metodologias de ensino, ou seja, mais projetos e trabalho na rotina já sobrecarregada de horas aula, horas atividade e baixa renumeração.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa buscou fazer uma reflexão sobre a centralidade do smartphone na vida dos jovens estudantes, e investigar como isso tem se manifestado em sala de aula, através da observação de uma turma do 2º ano de Ensino Médio de uma escola pública em Cuiabá. Conforme já explicado, não foram localizados contributos específicos no campo da Sociologia sobre o tema, mas foram relevantes alguns estudos sociológicos para analisar a tecnologia na sociedade contemporânea. As metodologias utilizadas possibilitaram a produção de dados fundamentais na constituição de análises baseadas nesses estudos, e nos demais referenciais.

No primeiro capítulo de revisão da literatura, foram expostos os principais estudos utilizados na pesquisa para analisar as questões acerca da tecnologia na sociedade contemporânea, do uso de telefones celulares e dos jovens como categoria social. Além do mais, foram apontadas algumas reflexões sobre o uso de tecnologia no contexto educacional brasileiro, e por fim discussões que concernem o consumo de tecnologia na sociedade capitalista.

Em seguida, o segundo capítulo fez um breve histórico a respeito do avanço da tecnologia. Na segunda metade do século XX, a miniaturização de componentes desencadeou a criação de celulares de alta tecnologia (os smartphones) ainda no final desse período. No subcapítulo 2.1, foram expostos alguns estudos, principalmente de educadores, a respeito das necessidades e dificuldades de inserção qualitativa de tecnologias na educação brasileira.

O terceiro capítulo trouxe a conceituação das metodologias utilizadas para a constituição da pesquisa. A etnografia da sala de aula, a aplicação de questionários e as entrevistas foram elementos de grande importância para alcançar os objetivos do trabalho. O subcapítulo 3.1, apontou conceituações a respeito da categoria juventude, observando a importância de desvincular a ideia de etapa da vida. A partir da compreensão de quem eram os sujeitos da pesquisa, o subcapítulo 3.2 relatou as observações realizadas em campo.

O quarto capítulo iniciou trazendo informações a respeito do uso de smartphones por estudantes de outras cidades no mundo, destacando que o caso desta pesquisa não se tratava de um evento isolado. Além disso, foi realizada uma breve reflexão acerca das leis que proíbem o uso de aparelhos eletrônicos em sala de aula. As análises dos dados obtidos nos questionários foram descritas nos subcapítulos 4.1 e 4.2. O primeiro releva a opinião dos estudantes a respeito dos usos do smartphone, com centralidade no que concerne o espaço da sala de aula, enquanto o segundo tratou especificamente das informações relativas ao consumo desses aparelhos. O trabalho encerra-se no subcapítulo 4.3, onde foram colocadas as opiniões obtidas nas entrevistas realizadas com os dois professores que ministravam as aulas observadas. Foi interpretada na fala desses docentes uma conjunção de opiniões positivas, negativas e contraditórias a respeito do telefone celular em sala de aula.

Conforme levantado nas hipóteses, foi confirmado durante a pesquisa que os estudantes fazem uso dos smartphones em sala de aula em grande quantidade, para fins diversos e consequentemente desenvolveram meios de não serem surpreendidos nos momentos que os usos não estão relacionados ao conteúdo de aula. Em relação aos objetivos específicos, os estudantes utilizam o smartphone em sala de aula para finalidades de ouvir música; auxiliar em atividades de aula; utilizar o aplicativo de mensagens whatsApp; jogar; atender ligações; ver/fazer fotos e visualizar vídeos.

Os principais motivos apontados para utilizar o celular são que no momento não está havendo atividade de aula, e porque acreditam que o aparelho pode ser utilizado neste espaço conforme é no dia a dia. A maioria dos estudantes afirmou não sentir constrangimento quanto a proibição do uso do celular, a minoria que se sente constrangida afirma que o celular poderia ser usado sem conflitos, nas pausas de atividades da aula, ou para receber uma ligação urgente da família. As observações identificaram que o celular está inserido nas relações entre os estudantes em sala de aula, através de trocas de informações sobre o aparelho, trocas de conteúdos, uso compartilhado e etc.

Sobre o porquê de possuir o telefone celular de modelo smartphone, está a necessidade de comunicação com amigos e familiares que também têm este tipo de aparelho; porque acessa internet e redes sociais e ainda porque o mesmo agrega várias funções. Sobre o acesso ao smartphone, a maior parte foi adquirida com ajuda financeira direta ou indireta de pais e familiares. O perfil socioeconômico dos estudantes revelou que a maioria possui renda familiar de 1 a 3 salários mínimos, e que neste grupo se encontra a maior parcela daqueles que residem nos bairros considerados periféricos da cidade. As opiniões dos professores revelaram que o celular poderia ser uma ferramenta pedagógica qualitativa, no entanto, demanda formação continuada e mudanças metodológicas, não havendo garantias que os estudantes deixarão de fazer outros usos do aparelho em sala de aula.

Cabe salientar no âmbito das considerações finais que apesar da suposta proximidade de um licenciando com a escola, existem regras, normas, hierarquias e receio de equipes pedagógicas receberem pesquisadores, principalmente nas salas de aula, temendo julgamentos, críticas e análises negativas a instituição. O projeto da pesquisa previa observações no 1º ano do Ensino Médio, mas a coordenação da escola “Moreira” não permitiu a pesquisa junto a esses estudantes, alegando que essas turmas já são acompanhadas por projetos do PIBID e estágio, sendo limitada a circulação de pessoas diferentes nas salas de aula para não haver constrangimento aos estudantes. Porém, durante a pesquisa de campo, os professores Souza e Silva informaram que aquela turma do 2º ano (observada) era “tranquila”, que os 1ºs anos são mais “agitados”, porque são estudantes vindos do ciclo38. Deste modo, existe a hipótese, não comprovada, de que seria possível ter observado fatos diferentes (ou apenas em maior quantidade) aos verificados no 2º ano em relação ao uso do smartphone em sala de aula.

As tecnologias digitais, principalmente o smartphone rompem as portas das salas de aula e são naturalmente absorvidas pelos estudantes neste ambiente. Enquanto isso, os professores, escola e sala de aula são imbuídos da cultura escolar hegemônica determinante na formação de sujeitos que atendam às expectativas dos adultos e a demanda do mundo do trabalho. O celular tem se configurado como uma ameaça a essa ordem e disciplina. Por isso, este aparelho tão disseminado entre crianças, jovens e adultos e em alguma medida tido como símbolo de “modernidade”, é visto com desconfiança pela maioria, principalmente entre os sujeitos da comunidade escolar, pois os smartphones se encontram ali “soltos” a livre opção de uso dos jovens, descortinando uma espécie de competição entre o conteúdo de aula e as possibilidades contidas no smartphone e seus aplicativos.

A questão do uso do smartphone em sala de aula pelos estudantes está relacionada a atual conexão da sociedade urbana ocidental com as tecnologias digitais, e de como elas têm sido fundamentais e centrais na vida de uma quantidade importante desses sujeitos. Logo, não se trata exatamente de uma juventude desobediente conforme seria simplista afirmar, mas de situar esses estudantes no contexto de um determinado estilo de vida que deve ser conectado, antenado e atualizado. Ou seja, algo construído por adultos dentro de uma lógica de consumo é incorporado pelos jovens para manter, impor ou mesmo ampliar suas vivências, não havendo uma divisão entre escola, rua, casa, sala de aula e etc.

Deste modo, não se pretendeu concluir se o smartphone é bom ou ruim, se deve ou não ser excluído da escola ou mesmo se tem afetado negativamente ou positivamente as vidas dentro e fora da sala de aula. Contudo, deve ser considerado que a tecnologia ubíqua acessível a uma diversidade de sujeitos é resultado dos caminhos pensados pelo capitalismo para introduzir esses bens à sociedade. Assim, tem ampliado seus lucros através da obsolescência tecnológica. Indo além das discussões sobre consumo e capitalismo, a tecnologia desenvolvida no século XX criou bombas e transplantou órgãos como o coração, ela destruiu e salvou vidas, a internet e o celular uniram e afastaram pessoas, ou seja, a tecnologia possui características tão contraditórias quanto a própria humanidade que a criou.

Conforme já pontuado, esta pesquisa não tem caráter pedagógico, por isso, o que concerne o uso do celular em sala de aula não vislumbra apontar caminhos aos educadores, mas fazer uma reflexão sobre o smartphone na realidade dos estudantes em sala de aula, formulando assim contributos preliminares neste aspecto às diversas áreas das Ciências Humanas e Sociais.

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9. ANEXOS

9.1. ANEXO A

 

9.2. ANEXO B

 


9.3. ANEXO C

Imagem 1.Estudantes no pátio da escola.
Fotografia: Jaqueline da S. Pereira.
Cuiabá, 13 abr. 2015.


Imagem 2. Smartphone acima da mesa.
Fotografia: Jaqueline da Silva Pereira
Cuiabá, 27 abr. 2015.

 

Imagem 3. Estudante joga no celular durante a aula.
Fotografia: Jaqueline da S. Pereira.
Cuiabá, 20 maio. 2015.


Imagem 4. Estudantes conversam sobre jogo.
Fotografia: Jaqueline da S. Pereira
Cuiabá, 25 maio. 2015.

9.4. ANEXO D

1 No decorrer do trabalho o nome smartphone será predominantemente utilizado, porém o uso da palavra celular deve ser considerado para este modelo de aparelho, já que os demais não foram considerados na pesquisa. As especificidades sobre o smartphone serão tratadas no capítulo 2 deste trabalho.

2 Projeto de lei 357/2013 de autoria do deputado estadual Mauro Savi.

3 Escola situada em Cuiabá. Nome fictício.

4 Livros em formato digital, eletrônico.

5 Disponível em: Acesso em: 07 ago. 2015

6 Sputnik foi o primeiro satélite artificial enviado para a órbita da terra em 1957 pela União Soviética. Este fato deu início a corrida espacial durante a Guerra Fria. Disponível em: Acesso em: 23 jan. 2016.

7 Disponível em: http://www.computerhistory.org/revolution/mobile-computing/18/341/1755> Acesso em: 24 ago. 2015

8 Disponível em: Acesso em: 24 ago. 2015.

9 Disponível em: Acesso em: 20 nov. 2015.

10 Aplicativo para troca de mensagens instantâneas. Depende de conexão com internet para operação.

11 Mais popular site e serviço de rede social mundial, sediado na Califórnia Estados Unidos.

12 Computador portátil. No Brasil comumente chamado de notebook.

13 Computador portátil de tamanho reduzido que utilizam sistemas operacionais de telefones celulares.

14 Para preservar o anonimato dos interlocutores, todos os nomes verdadeiros foram alterados.

15 Programa Institucional de Iniciação a Docência. Vinculado ao Ministério da Educação e agenciado pela Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES). Através de projetos supervisionados por docentes há uma antecipação do contato dos futuros professores com as salas de aula da rede pública.

16 Rede social para compartilhamento de fotos e vídeos.

17 Disponível em: Acesso em: 08 jan. 2015.

18Disponível em: Acesso em: 09 out. 2014.

19 Disponível em: < http://cod.ibge.gov.br/1JQF> Acesso em: 30 mar. 2016.

20 Disponível em: usar+celular+durante+a+aula> Acesso em: 21 dez. 2015.

21 Disponível em: < http://g1.globo.com/educacao/enem/2014/noticia/2014/10/candidatos-do-enem-estudam-para-provas-em-grupos-no-whatsapp.html> Acesso em: 10 fev. 2015.

22 Publicação ou compartilhamento de conteúdo e imagens em redes sociais como o facebook e instagram.

23 Disponível em: Acesso em 13 jan. 2016.

24 As respostas foram originalmente transcritas sem alterações ou correções.

25 Disponível em: < http://www.techtudo.com.br/artigos/noticia/2012/06/galaxy-siii-ja-esta-sendo-montado-na-fabrica-da-samsung-no-brasil.html> Acesso em: 16 fev. 2016.

26 Disponível em: Acesso em: 07 ago. 2015

27 Disponível em: Acesso em: 06 jan. 2016.

28 Multinacional norte americana fabricante de microprocessadores, circuitos integrados entre outros.

29 Passagem gratuita nos transportes coletivos da capital.

30 Entrevista concedida por SILVA, T. Arquivo.m4a. Cuiabá, julho de 2015.

31 Entrevista concedida por SILVA, T. Arquivo. m4a. Cuiabá, julho de 2015.

32 Entrevista concedida por SOUZA, S. 1Arquivo.m4a. Cuiabá, julho de 2015.

33 Entrevista concedida por SOUZA, S. 1Arquivo.m4a. Cuiabá, julho de 2015.

34 Entrevista concedida por SOUZA, S. 1Arquivo.m4a. Cuiabá, julho de 2015.

35 Entrevista concedida por SOUZA, S. 1Arquivo.m4a. Cuiabá, julho de 2015.

36 Entrevista concedida por SOUZA, S. 1Arquivo.m4a. Cuiabá, julho de 2015.

37 Entrevista concedida por SILVA, T. Arquivo. m4a. Cuiabá, julho de 2015.

38 Sistema concebido como alternativa ao tradicional sistema de séries e na qual a avaliação é feita ao longo do ciclo – e não ao fim do ano letivo.


Publicado por: Jaqueline da Silva Pereira

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