A Importância da literatura infantil para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança
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1. RESUMO
Na busca de compreender a importância da literatura infantil no desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança e de que forma os conceitos estão relacionados, mostrando assim a relevância da proposta e a importância de inserir as crianças no universo literário. Apresenta-se inicialmente o conceito e contexto histórico da literatura infantil e posteriormente a definição de desenvolvimento infantil, com enfoque em crianças na idade escolar (3-6 anos), subdividido em: Desenvolvimento afetivo com base em algumas concepções de Wallon; Desenvolvimento cognitivo com embasamento no período pré-operatório de Piaget; E Desenvolvimento Social com base na teoria Psicossocial de Erikson. Para compreender de que maneira a literatura infantil está relacionada a esses aspectos do processo de desenvolvimento. Observou-se que através das histórias infantis a criança pode se comunicar, exteriorizar sua vida, impulsionar seus pensamentos e transformar o mundo real em função de seus desejos e fantasias, no qual futuramente poderá utilizá-las como referência e aplicá-las à sua realidade. Através da representação simbólica e da ação de ouvir e contar histórias, ela poderá desenvolver, também, diversas funções cognitivas, como, atenção, percepção, memória, linguagem e funções executivas que permitem controlar e regular os pensamentos, emoções e ações diante de conflitos ou distrações.
Palavras-chave: Literatura infantil; Desenvolvimento infantil; Desenvolvimento cognitivo; Desenvolvimento psicossocial.
ABSTRACT
In the quest to understand the importance of children's literature in the cognitive, affective and social development of the child and in what way the concepts are related, thus showing the relevance of the proposal and the importance of inserting children into the literary universe. The concept and historical context of children's literature and later the definition of child development, focusing on children at school age (3-6 years), is subdivided into: Affective development based on some Wallon conceptions; Based cognitive development in the preoperative period of Piaget; And Social Development based on Erikson's Psychosocial Theory. To understand how children's literature is related to these aspects of the development process. It has been observed that through children's stories the child can communicate, externalize his life, boost his thoughts and transform the real world according to his desires and fantasies, in which in the future he can use them as a reference and apply them to his reality. Through the symbolic representation and the action of hearing and telling stories, it can also develop various cognitive functions, such as attention, perception, memory, language and executive functions that allow controlling and regulating thoughts, emotions and actions in the face of conflicts or distractions.
Key-words: Children's literature; Child development; Cognitive development; Psychosocial development.
2. INTRODUÇÃO
Com os avanços da tecnologia, as redes de internet mais acessíveis à população, o uso cada vez mais presente de plataformas de pesquisa digitais, canais de televisão com desenhos educativos e até mesmo as mudanças que ocorrem no cotidiano e rotina familiar nos últimos anos, tudo isso tem feito com que o hábito de ler para uma criança ou dedicar alguns minutos do dia para contar uma história se torne cada vez mais raro. Assim, a literatura infantil passa a ser vista apenas como parte de um contexto pedagógico com ênfase na alfabetização, deixando de abordar a importância que a mesma tem para o desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança.
O contato com a literatura infantil e com o universo lúdico dos Contos de Fadas e histórias com moral, possibilitam que a criança vivencie vários papéis sociais que podem auxiliar na construção da sua personalidade, na afetividade e transmissão de valores, além de promover o desenvolvimento da imaginação, criatividade, atenção, raciocínio, senso crítico e sua percepção do mundo, através das diversas possibilidades apresentadas de conflitos e soluções vivenciadas pelos personagens e a maneira como os enfrentam. De modo subjetivo e até mesmo inconsciente as crianças podem trazê-los para o mundo real, o que pode auxiliá-las e fornecer condições para o seu desenvolvimento e aprendizado à medida em que determinadas situações surgirem.
Este trabalho consiste em uma revisão de literatura, um estudo baseado em material publicado em livros, artigos científicos que tem como objetivo compreender e transmitir a importância da literatura infantil para o desenvolvimento das crianças na fase escolar de três a seis anos, nos setores cognitivo, afetivo e social.
Serão apresentados neste trabalho, três capítulos, dos quais o primeiro é uma introdução sobre conceito e contexto histórico da literatura infantil. O segundo é referente ao processo de desenvolvimento infantil, subdividido em desenvolvimento cognitivo, afetivo e social, com embasamento em alguns teóricos como Piaget e Erikson. Já o capítulo final correlaciona a literatura infantil e o desenvolvimento da criança, com ênfase na importância das situações oferecidas de forma simbólica e lúdica e a forma como ela contribui para esse processo.
Além disso, este trabalho também busca contribuir para a formação e prática de psicólogos e psicopedagogos, que acompanhem o processo de desenvolvimento de crianças, seja no ambiente escolar ou ambientes terapêuticos propriamente.
2.1. Problema de Pesquisa
Qual a importância da literatura infantil no processo de desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança e qual a relação existente entre histórias com moral e o processo de amadurecimento e desenvolvimento infantil?
2.2. Objetivos do Trabalho
Geral:
Compreender a importância da literatura no desenvolvimento infantil a nível cognitivo, afetivo e social, por meio da relação entre o conteúdo abordado nas histórias e o processo de amadurecimento e desenvolvimento infantil.
Específicos:
- Conceituar a Literatura Infantil.
- Caracterizar o processo de desenvolvimento infantil.
- Relacionar a literatura infantil e o desenvolvimento da criança, com ênfase na importância das situações oferecidas de forma simbólica e lúdica para o processo de amadurecimento e desenvolvimento cognitivo, afetivo e social da criança.
3. LITERATURA INFANTIL – CONCEITO E CONTEXTO HISTÓRICO
3.1. O que é Literatura Infantil?
A literatura infantil é, antes de tudo, literatura e arte, pois é considerada um fenômeno de criatividade que representa o mundo, o homem, e a vida, através da palavra, e que funde os sonhos e a vida prática; o imaginário e o real; os ideais e sua possível/impossível realização. Ela leva a criança à descoberta do mundo, onde sonhos, fantasia e realidade se unem, permitindo que a criança se envolva, descubra e atue num mundo mágico, podendo assim, modificar a realidade seja ela boa ou ruim. (CAGNETI, 1996).
Coelho (1991), conceitua a literatura infantil como uma abertura para a formação de uma nova mentalidade se caracterizando como um instrumento de emoções, diversão ou prazer, que são desempenhados pelas histórias, mitos, lendas, poemas, contos, teatro, etc, criadas pela imaginação, ao nível da mente infantil, com objetivo na educação integral da crianças, ajudando-a na formação de seu próprio estilo.
De acordo com Silva (2009), apesar da literatura infantil ser uma vertente da literatura geral, na maioria das vezes com escrita direcionada à determinada faixa etária, possui obras com conteúdo capazes de lapidar a imaginação e auxiliar na compreensão e resolução de conflitos internos de forma particular.
Pode-se dizer que, desde a sua origem, a literatura infantil, sempre esteve ligada à diversão ou aprendizado das crianças. Os conteúdos eram adaptados de forma a se adequarem ao nível de compressão e interesse subjetivo dos indivíduos, o que resultou inicialmente em adaptações de textos direcionados a adultos para compreensão infantil, onde eram retiradas situações e conflitos não exemplares, e realçadas ações ou peripécias de caráter aventuroso ou exemplar, assim as obras atingiam um novo objetivo que era levar a criança a participar de diversas experiências a nível real ou imaginário, conforme Meireles (1984), escreveu.
Ainda com base na autora “o livro infantil”, dirigido à criança, de invenção e intenção do adulto, transmite os pontos de vista que este considera mais úteis à formação de seus leitores. E transmite-os na linguagem e no estilo que o adulto igualmente crê adequados à compreensão e ao gosto do seu público.
Assim as crianças se deslumbram com o fabuloso, com o mistério, aventura, fantasia, prazer e emoção ligadas às histórias. E são essas características que são capazes de despertar o seu interesse pela leitura e concentrar sua atenção como ouvinte.
Ouvir histórias é algo extremamente importante para qualquer criança. Abramovich (1997), afirma que ao ouvi-las ela pode aprender a ser um leitor, o que trará para ela condições para compreender o mundo, estimular a imaginação, chegar a resposta de questões, adquirir novas idéias por intermédio dos personagens, se identificar com eles de acordo com a situação em que se encontra e assim esclarecer melhor as próprias dificuldades ou encontrar um caminho para a resolução delas.
O autor ainda afirma que quando as crianças ouvem histórias, passam a visualizar de forma mais clara sentimentos que tem em relação ao mundo, neste sentido, quanto mais cedo a criança tiver contato com os livros e perceber o prazer que ela produz, maior a probabilidade dela tornar-se um adulto leitor.
A literatura infantil é capaz de trazer uma lição de vida de forma imaginária, que contribui de forma positiva para a formação da criança no processo de construção de sua personalidade. Considera-se assim também que a literatura infantil é um dos meios mais eficazes de desenvolvimento sistemático no trabalho da linguagem e na formação da criança.
Ah, como é importante para a formação de qualquer criança ouvir muitas, muitas histórias [...] Escutá-las é o início da aprendizagem para ser leitor, e ser leitor é ter um caminho absolutamente infinito de descoberta e compreensão do mundo [...] (ABRAMOVICH, 1997, p 16).
É por meio do imaginário que a criança reconhece suas próprias dificuldades e aprende a lidar com elas, podendo assim, se reconhecer melhor e se conhecer como parte integrante do mundo que a cerca.
A natureza e intensidade dessas emoções podem repercutir na vida do pequeno leitor de maneira definitiva. Não apenas ele se lembrará, até a morte, desse primeiro encantamento, [...]; muitas vezes, a repercussão tem resultados práticos: vocações que surgem, rumos de vida, determinações futuras. (MEIRELES, 1984, p.128).
3.2. Contexto histórico da Literatura Infantil
Durante a Idade Média em terras européias, surgiu uma literatura narrativa de duas fontes diferentes: uma popular, que deriva de narrações orientais ou gregas, e a narrativa culta, que se dá através de aventuras de cavalarias com inspiração ocidental, e entre os séculos IX e X, iniciou-se oralmente na Europa a circulação de literatura popular, que séculos mais tarde se tornou a Literatura Infantil que conhecemos hoje. (COELHO, 1991).
Século após século, as histórias foram transmitidas e levadas a outros povos, que narravam sobre as suas vivências, divulgavam ideais, em busca de ensinar e divertir.
No final do século XVII e durante o século XVIII, foram produzidos os primeiros livros para crianças, pois antes disso não existia o conceito atual de infância e as crianças e adultos compartilham os mesmo eventos sociais. Foi com a valorização de um modelo familiar burguês que começaram a dar enfoque e escrever para crianças, devido ao interesse em uma educação melhor e a transmissão dos valores da burguesia e do conceito de família unicelular. (SILVA, 2009).
Dessa forma, segundo Becker (2001), o papel da literatura infantil aliada a escola, com produções de textos dirigidos a crianças, foi empregar objetivos e valores impostos por essa nova classe social emergente.
Cademartori (1994), categorizou a literatura infantil em dois momentos: O primeiro é lendária que nasceu da necessidade que as mães tinham de se comunicar com seus filhos, para contar as coisas que os rodeavam, que eram apenas contadas oralmente; e o segundo momento é a escrita, que ocorre no século XVII com o surgimento dos primeiros livros infantis, os quais foram obras de fundo satírico, concebidas por intelectuais que lutavam contra a opressão para estigmatizar e condenar usos, costumes e personagens que oprimiam o povo, onde os autores para não serem atingidos pela força do despotismo, precisaram esconder suas verdadeiras intenções sob um manto fantasioso.
Nesse período, chamado por Coelho (1991), de “entre séculos”, a educação passava por lentas transformações, e em 1890 São Paulo já era considerado um “centro pioneiro de renovação educacional”, porém a produção editorial não acompanhava esse desenvolvimento. A partir da segunda metade do século XIX é que começaram a surgir as “leituras escolares”, caracterizando-se assim como a primeira manifestação consciente da produção de leitura específica para crianças no Brasil.
Segundo Cademartori (1994), o escritor Perrault marcou no início da literatura infantil, com os livros: Cinderela; Barba Azul; O gato de botas; Mãe Gansa; A Gata Borralheira, entre outros, no período de 1628 e 1703. Já no Brasil a literatura infantil foi marcada com o livro “O Patinho Feio” de Andersen, no século XX, seguido por Monteiro Lobato, cujo suas histórias até hoje despertam o prazer e o gosto pela leitura e encantam milhares de crianças.
Nesse período, com base em Coelho (1991), a necessidade nas escolas era uma literatura mais didática. E os livros de Lobato foram proibidos nas escolas religiosas, acusados de desviar as crianças da “verdade”. A partir daí surgiu uma literatura mais “documentária” e/ou “cotidiana”, onde os textos passaram a incentivar a obediência, a ordem e a permanência, em contraposição à aventura e às travessuras narradas por Lobato. Mais tarde as histórias em quadrinhos também foram proibidas, acusadas de deixarem as crianças com preguiça de ler. E somente na década de 1950 é que a Literatura infantil redescobriu a fantasia, com a obra As aventuras de Xisto (1957), de Lúcia Machado de Almeida, seguida por outros nomes. Assim a literatura deixou de ser refém da escola, e passou a servir como entretenimento para as crianças.
Para compreender melhor, podemos dividir a literatura infantil no Brasil em quatro fases, com base em Becker (2001); a primeira fase tem início entre o final do século XIX e começo do século XX, onde a preocupação era com a modernização do país em que a escola era uma das responsáveis por incentivar valores patrióticos às crianças, sendo assim a literatura infantil se integrou aos esforços de instalação da cultura nacional, vinculada à escola e à valorização do nacionalismo; a segunda fase ocorreu no período de 1920 a 1945, que foi uma época caracterizada por diversos conflitos, e um deles era em relação a situação da educação, pois o índice de analfabetismo estava muito alto, isso fazia com que o Brasil se caracteriza como um país atrasado, para reverter essa situação foi proposto uma reforma educacional, criando assim a Nova Escola, na qual a proposta era um ensino intelectual e pragmático; enquanto que, terceira fase se deu no período da democracia, entre as década de 50 e o início da década de 60, este período foi marcado pelo surgimento da educação popular e alfabetização, porém com o golpe de 1964 a cultura brasileira ficou prejudicada e a literatura infantil passou a ter um caráter conservador, abordando temas que privilegiam a agricultura e patriotismo; e por último a quarta fase que abrange as décadas de 70 e 80, que foram marcadas por grandes transformações, onde a literatura infantil ganhou um número maior de autores e obras, nas quais a linguagem e o ambiente das histórias se aproximavam do cotidiano e da realidade dos brasileiros. Nessa fase também se recuperou o folclore, canções de ninar e brincadeiras de roda.
Atualmente a literatura infantil, não se concretiza apenas de forma didática, mas também enfatiza a importância de se mostrar valores culturais e, sobretudo, de despertar na criança a imaginação e o prazer mágico da leitura desde os primeiros anos de vida.
4. O DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA
Para compreender o desenvolvimento da criança nos aspectos afetivo, cognitivo e social, primeiro deve-se conhecer o conceito de desenvolvimento humano que serviu como base para as diversas teorias a respeito do desenvolvimento infantil.
Com base em Berns (2002), o desenvolvimento humano é estudado para se compreender quem somos, por que somos, como chegamos a esse modo de ser, e o que podemos fazer para nos aprimorar. De modo geral, desenvolvimento refere-se a mudanças progressivas ao longo tempo, que podem ser quantitativas no que diz respeito a mudanças em volume, como no crescimento físico ou vocabulário, e qualitativas referindo-se a mudança de tipo, como compreensão moral ou adaptação social.
A autora explica que essas mudanças progressivas podem ser classificadas em: ordenadas, direcionais e estáveis. São ordenadas porque ocorrem em uma sequência ou série, são direcionais porque mostram certo tipo de acumulação e organização de componentes e as mudanças progressivas são estáveis porque seus efeitos não desaparecem a curto prazo.
Ainda com base na autora, pode-se dizer também que o desenvolvimento humano continua ao longo da vida, mas neste trabalho iremos abordar o desenvolvimento infantil, no qual surgiram várias teorias que explicam as influências sobre o desenvolvimento, das quais pode-se usar três designações para categorizar as principais teorias: Forças essencialmente internas à criança (influências biológicas); forças essencialmente externas à criança (influências contextuais); e interação entre forças internas e externas à criança (influências internacionais).
A autora escreve que, para explicar o desenvolvimento infantil, surgiram várias teorias, cada uma com enfoque e objetivo em determinados aspectos que influenciam no desenvolvimento humano. Essas teorias são denominadas: Teorias biológicas; teorias do aprendizado; teorias culturais; teorias psicanalíticas; teorias cognitivas e teorias sistêmicas.
Este trabalho utilizará duas dessas teorias, que são a psicanalítica e a cognitiva. Na teoria psicanalítica será utilizada a Teoria psicossocial de Erikson e na cognitiva a Teoria cognitivo-desenvolvimental de Piaget. E para falar sobre os aspectos do desenvolvimento afetivo serão citadas algumas concepções sobre a teoria de Wallon.
4.1. Desenvolvimento Afetivo
A afetividade refere-se à capacidade, à disposição do ser humano de ser afetado pelo mundo externo e interno por meio de sensações ligadas a tonalidades agradáveis ou degradáveis. (MAHONEY; ALMEIDA, 2007).
As autoras se embasaram na teoria de Wallon, para destacar três momentos marcantes, sucessivos na evolução da afetividade, que são: a emoção, sentimento e paixão. Esses três elementos resultam de fatores orgânicos e sociais e correspondem a configurações diferentes e resultantes de sua integração, em suma, na emoção há o predomínio da ativação fisiológica; no sentimento a ativação representacional e na paixão a ativação do autocontrole.
Explicam também, que a emoção é a exteriorização da afetividade, é sua expressão corporal e motora considerada um recurso de ligação entre o orgânico e o social, também estabelece os primeiros laços com o mundo humano e através deste com o mundo físico e cultural. A emoção também é uma forma de participação mútua que funde as relações interindividuais, e estimula o desenvolvimento cognitivo. A respeito do sentimento, as autoras ressaltam que este é a expressão representacional da afetividade e não implica reações instantâneas e diretas como na emoção, sendo assim, tende a reprimir e a impor controles que quebram a potência da emoção. Os sentimentos, então, podem ser expressos pela mímica e pela linguagem. Enquanto que a paixão revela o aparecimento do autocontrole como condição para dominar uma situação, para tanto configura a situação (cognitivo), o comportamento de forma a atender às necessidades afetivas. Segundo as autoras, Wallon distribuiu a dimensão temporal do desenvolvimento em estágios que expressam características da espécie cujo conteúdo é determinado histórica e culturalmente do ponto de vista afetivo.
E com base no estudo da teoria de Wallon, as autoras explicam que na fase de 3 anos a 6 anos, denominada Estágio Personalismo, a criança encontra-se na fase de se descobrir como diferente das outras crianças e do adulto. Esse estágio também é composto por três fases: oposição, sedução e imitação, e está voltado para o enriquecimento do eu e a construção da personalidade em que a criança vai tomando consciência de si como sujeito social que luta para se individualizar.
Além de Wallon, Piaget também estudou a respeito da afetividade, e com base em Arantes (2003), pode-se dizer que Piaget escreveu pouco sobre o tema, mas a considerou como uma dimensão importante no estudo da inteligência e desenvolvimento psicológico. De modo geral, a evolução da afetividade vai do que Piaget denomina sentimentos instintivos, correspondentes às montagens hereditárias (reflexos), aos sentimentos interindividuais (simpatias e antipatias), e, posteriormente, aos sentimentos semi normativos (correspondentes às construções representacionais), para chegar aos sentimentos normativos, pertencentes a uma escala de valores e a um sistema mais amplo, correspondente ao sistema operatório, no que se refere à inteligência. Para a autora, é nesse contexto de correspondências que Piaget inseriu o conceito de vontade, ou força de vontade, que é o instrumento de conservação dos valores. A expressão da vontade é a conservação e o ato de vontade consiste em subordinar a situação dada, qualquer que seja ela, a uma escala permanente de valores.
4.2. Desenvolvimento Cognitivo
Jean Piaget (1896-1980), proporcionou uma visão mais abrangente do desenvolvimento cognitivo, ele foi o cientista mais influente no estabelecimento das bases para muitas ideias atuais sobre o desenvolvimento, que impulsionaram diversas experiências de pesquisa com bebês, crianças e adolescentes. (BERNS, 2002).
Em relação a aprendizagem Piaget (1973), diz que ela só se dá com a desordem e ordem daquilo que já existe dentro de cada sujeito. É necessário obter contato com o difícil, com o incômodo para desestruturar o já existente, e em seguida estruturá-lo novamente, com a pesquisa e também motivações tanto intrínseca como extrínseca para obter a aprendizagem. Ressalta que a motivação intrínseca é mais importante porque o sujeito tem que estar interessado em aprender, sendo que a junção dos dois (intrínseca e extrínseca) formam importantes aliados para a melhor aprendizagem do sujeito. Para Piaget o processo do conhecimento se dá na interação do sujeito e objeto e a denomina como assimilação e acomodação.
O autor descreve a Assimilação como uma integração a estruturas prévias, que podem permanecer invariáveis ou são mais ou menos modificadas por esta própria integração, mas sem descontinuidade com o estado precedente, ou seja, sem serem destituídas, e simplesmente acomodando-se à nova situação.
Pode-se dizer então que o processo de assimilação é a articulação de ideias já existentes com as que estão sendo aprendidas, adaptando um novo conhecimento com as estruturas cognitivas já existentes.
Já a acomodação é descrita por Piaget (1973) como toda mudança de comportamento, alteração do sujeito, isto acontece quando o sujeito se transforma, amplia ou muda seus esquemas. Esquema é a estrutura da ação, que integra o novo com aquilo que o indivíduo já tinha contato prévio, dessa forma se articula o que já foi conhecido com o que está sendo apresentado, e assim se modifica e amplia o esquema já existente.
Piaget descreveu as habilidades cognitivas qualitativamente diferentes que as crianças possuem conforme se desenvolvem e assim delineou em quatro estágios o desenvolvimento cognitivo. Em cada estágio observa-se que as crianças apresentam um conjunto típico de comportamentos que refletem suas estruturas e organização cognitivas. (BERNS, 2002).
Este trabalho busca o enfoque no que Piaget denominou período pré-operatório que ocorre entre dois a sete anos de idade.
Segundo Berns (2002), o período pré-operatório, ou pré-operacional, distingue-se pelo desenvolvimento de funções simbólicas, ou esquemas cognitivos relativamente desorganizados. A autora descreve o funcionamento simbólico como a capacidade de fazer um elemento ou objeto representar um elemento diferente que não está presente.
Com base em Piaget (1973), pode-se dizer que o período pré-operatório de dois a sete anos, é onde a criança possui uma capacidade simbólica, faz uso de símbolos mentais como a linguagem e imagens, nesta fase há uma explosão da linguística. Ele cita cinco características desse estágio: a primeira é a imitação ou imitação de objetos distantes; a segunda é o jogo simbólico que também é imitativo no qual a criança só se preocupa com o seu entendimento e não se o outro irá entendê-la; a terceira é o desenho, que é a forma que a criança possui de deixar sua marca, desenhando o que quer, sem distinguir se é real ou não; a quarta é a imagem mental, são imagens que representam o interno, algo que já foi passado; e a quinta é a linguagem falada, onde a criança começa a falar uma palavra como se fosse uma frase e aos poucos vai aumentando o seu vocabulário.
Outras características não menos importantes deste estágio são: o egocentrismo, que é a incapacidade de se colocar no ponto de vista do outro, isso ocorre entre quatro e cinco anos, onde a criança acha que todos pensam como ela e não questiona ninguém, já por volta dos seis ou sete anos ela começa a ceder às pressões e a se questionar, o que gera um conflito e assim ela vai percebendo que cada indivíduo pensa de um jeito; raciocínio transformacional que é a incapacidade para raciocinar com sucesso sobre transformações, a criança não focaliza a transformação; centração, é quando a criança foca em apenas um aspecto de determinada situação, ignorando o todo, nesse caso ela leva em consideração a percepção e não o raciocínio; a irreversibilidade que é quando a criança não consegue reverter as operações que realizou para comprovar o seu raciocínio; e o raciocínio transdutivo, que é quando a criança liga dois fatos que não mantêm relação entre si. O raciocínio transdutivo está ligado ao egocentrismo, onde a criança sente que os fatos da natureza estão ligados, ou são influenciados, por sua vontade.
Com base no estudo da teoria de Piaget, Berns (2002), diz que o desenvolvimento cognitivo é influenciado por maturação, experiência física, interação social e equilíbrio. E explica que a maturação refere-se ao desenvolvimento de funções ou estruturas geneticamente determinadas, em que a progressão cognitiva da criança baseia-se em mudanças na estrutura intelectual resultantes de predisposições inatas; a experiência física se refere ao envolvimento das crianças na manipulação e pensamento sobre objetos e processos concretos; a interação social refere-se a conversar, brincar, ou trabalhar com outros, e é por meio da interação que a criança aprende os pontos de vista, costumes e padrões de outras pessoas; e o equilíbrio caracteriza-se como o processo de assimilar experiências no arcabouço mental já existente e acomodar estruturas desse arcabouço em resposta à experiências.
4.3. Desenvolvimento Social
A socialização começa no nascimento e ensina os modos da sociedade em que o indivíduo está inserido, como por exemplo, como deve se comportar, a forma de se vestir, comer, falar, entre outras, que contribuem para o processo de formação da personalidade, identidade e relações sociais. (BERNS, 2002).
Esses conceitos estão relacionados também à aprendizagem, pois em cada fase do desenvolvimento a criança aprende algo.
Erikson (1971), propõe uma compreensão da aprendizagem como produto da interação das necessidades que ao longo do desenvolvimento vão se modificando e configurando novos conflitos. A maneira como estes conflitos resolvem-se passa a ter um papel importante na formação da personalidade do indivíduo, influenciando as etapas posteriores do desenvolvimento e a forma destas serem experienciadas.
Sendo assim, Erikson começou identificando as características de uma personalidade saudável e estudando como essa personalidade se desenvolvia. Passou a acreditar que o desenvolvimento da personalidade continuava ao longo da vida e energia da resolução progressiva de conflitos entre as necessidades ou instintos da pessoa e a resolução resultava da maturação e das expectativas ou exigências sociais. (BERNS, 2002).
Para compreender melhor, na teoria psicanalítica de Erikson, ele acredita que a identidade emerge como resultado de conflitos, ou crises, internos e externos que a personalidade saudável enfrenta. Ele descreveu oito estágios do nascimento até a morte, onde em cada um deles há um conflito ou crise, pois acredita que a forma que se resolve essas oito crises ou estágios, encontrados ao longo da vida, determina o modo como a personalidade se desenvolve, pois em cada estágio, a crise envolve o indivíduo interagindo em um ambiente social, e por isso que ele os denomina como estágios psicossociais. (BERNS, 2002).
Erikson (1971), relacionou esses estágios com as faixas etárias e com as etapas vivenciadas neste processo, referindo como tarefas de resolução de conflitos do ego, a relação entre as necessidades internas e as respostas do ambiente. De acordo com sua concepção, quando o desenvolvimento acontece de uma forma adequada, cada etapa bem resolvida favorece a continuidade do bom desenvolvimento, e por outro lado, o fracasso em uma dada etapa poderá comprometer a seguinte.
Uma crise precisa ser resolvida em cada estágio psicossocial e tipicamente há duas tendências opostas operando no momentos de cada crise, sendo que uma é positiva, no sentido que promove o desenvolvimento, e a outra é negativa, no sentido que retarda o desenvolvimento, por exemplo: confiança e desconfiança. Quando a crise é resolvida resulta em uma consequência. As consequências ou metas positivas dos estágios psicossociais são: esperança, força de vontade, determinação, competência, fidelidade, amor, atenção e sabedoria. (BERNS, 2002).
Dos oito estágios psicossociais de Erikson, nos concentramos em apenas dois que são: Autonomia x Vergonha e dúvida, que ocorre entre dois e três anos; e Iniciativa x Culpa, que acontece entre quatro e cinco anos.
No estágio autonomia x vergonha e dúvida, Berns (2002), diz que, por volta do segundo ano de vida, as crianças podem controlar seus próprios músculos e começar a afirmar a sua individualidade, ele marca a passagem do controle dos impulsos que antes eram externos, para o próprio sujeito. Ao mesmo tempo, os pais começam a impor exigências para que a criança se conforme a um comportamento socialmente aceitável. A crise durante este estágio é se a criança desenvolve um sentimento de autonomia ou de autocontrole sobre as suas ações ou desenvolve um sentimento de vergonha e dúvida por sentir-se incapaz de controlar suas próprias funções corporais e seu próprio comportamento.
Pode-se citar como exemplo o desfralde, pois neste estágio, a criança passa a ter controle de suas necessidades fisiológicas e a responder pela higiene pessoal, o que faz com que desperte nela a confiança, autonomia e liberdade para tentar novas coisas sem medo de errar. Porém, se ela for criticada e envergonhada, poderá desenvolver a dúvida quanto à própria capacidade de autonomia e essa crise pode, então, provocar um retrocesso ao estágio anterior que seria o da dependência.
Já no estágio de Iniciativa x Culpa, a autora ressalta que as crianças de quatro anos são donas de seu próprio corpo, e agora elas podem experimentar ideias e tomar iniciativa para atingir metas. Durante esse período, as crianças não só estão lidando com ideias como também com sentimentos conflitantes em relação ao genitor do sexo oposto. Aqui é importante ressaltar que se a criança conseguir superar os sentimentos de impotência no controle de suas ideias por meio da iniciação bem-sucedida de atividades, e no controle de seus sentimentos por meio da identificação com o genitor do mesmo sexo, este estágio terá um resultado positivo para a criança, mas por outro lado, se ela for continuamente impedida de iniciar atividades, este estágio terá um resultado negativo. A criança se sentirá culpada por ter ideias e sentimentos e em consequência sentir-se impotente para controlar seu ambiente. Erikson alerta ainda para o perigo da personificação, quando a criança, tentando escapar da frustração de ser incapaz para algumas coisas, exagera na fantasia de ter outras personalidades, de ser totalmente diferente do que é várias vezes, ela pode se tornar compulsiva por esconder seu verdadeiro “eu”; nesse caso, pode passar a sua vida desempenhando “papéis”,e afastar-se cada vez mais do contato consigo mesmo.
5. A LITERATURA INFANTIL NO DESENVOLVIMENTO DA CRIANÇA
Após apresentar o conceito e contexto histórico da literatura infantil, bem como o desenvolvimento infantil nos setores cognitivo, afetivo e social, com base nas concepções de alguns autores, pode-se correlacionar ambos para compreensão da relevância da proposta e a importância que a literatura infantil tem no desenvolvimento da criança e de que forma ela pode auxiliar nesse processo.
5.1. Qual a relação entre a literatura e o desenvolvimento infantil?
A Literatura infantil possui um importante significado no desenvolvimento das crianças, na qual se refletem situações emocionais, fantasias, viagens lúdicas e despertam a curiosidade e o prazer pela leitura. Pinto (2004), a leitura de histórias influi em todos os aspectos da educação da criança: na afetividade: desperta a sensibilidade e o amor à leitura; na compreensão: desenvolve o automatismo da leitura rápida e a compreensão do texto; na inteligência: desenvolve a aprendizagem de termos e conceitos e a aprendizagem intelectual.
Ler histórias para uma criança, é poder sorrir, rir, gargalhar com as situações vividas pelos personagens, como a ideia do conto ou com o jeito de escrever de determinado autor, e, então poder ser um pouco cúmplice desse momento de humor, brincadeira e divertimento, além de suscitar o imaginário, e ter a curiosidade respondida em relação a tantas perguntas, é encontrar outras ideias para solucionar questões, como os personagens fizeram, é uma possibilidade de descobrir o mundo imenso dos conflitos, dos impasses, das situações que todos vivemos e atravessamos de um jeito ou de outro. É a possibilidade de se identificar com os personagens no momento em que corresponde aquele que está sendo vivido pela criança e assim, esclarecer melhor as próprias dificuldades ou encontrar um caminho para a resolução delas. (ABRAMOVICH, 1997).
O autor ainda destaca e enfatiza que o ato de ler, pode significar abrir todas as comportas para entender o mundo através dos olhos dos autores e da vivência dos personagens.
Como foi visto no capítulo anterior, no que se refere ao aspecto afetivo com base em Wallon, pode-se dizer que o ato de contar histórias para uma criança está ligado a afetividade no sentido de que ela pode favorecer nos aspectos emocionais, e na construção de valores culturais que irão influenciar nas suas relações sociais.
No conto “O patinho feio”, temos um exemplo de história que pode influenciar nas relações afetivas da criança, pois ele retrata a falta de adaptação e sensação de não pertencimento à família, além de enfrentar a hostilidade com que é recebido no meio social e cultural em que nasceu. Esse sentimento é muito comum nas crianças que são vistas como diferentes, que sofrem bullying e se sentem excluídas. Ao perceber essas diferenças dá-se início ao processo de individualização. Sendo assim, no conto podem ser trabalhados temas relacionados a aceitação do próximo e de si mesmo, a empatia, e a angústia gerada através da tentativa de adaptação para pertencimento do meio.
Além disso, ouvir histórias pode gerar prazer pela situação de aconchego que estas representam, auxiliando assim no desenvolvimento da afetividade e possibilitando que nesse período a criança possa interagir por meio do imaginário com o mundo real e o mundo da fantasia.
Quanto ao desenvolvimento cognitivo no que diz respeito ao período pré-operatório, sabe-se que ele está relacionado com a capacidade simbólica da criança e o desenvolvimento da linguagem, sendo essa considerada uma condição necessária para o desenvolvimento da inteligência, pois acarreta modificações importantes nos aspectos cognitivos, afetivos e sociais da criança, uma vez que ela possibilita as interações interpessoais e fornece a capacidade de se trabalhar com as representações atribuindo significados à realidade. E com base em, Pinto (2004), pode-se dizer que a criança é capaz de compreender e interpretar histórias, codificar símbolos e significados relacionados ao seu cotidiano em um processo no qual o afetivo e cognitivo estão interligados, pois acredita-se que as estruturas da afetividade e cognição, funcionem psicologicamente de maneira dinâmica e construtiva, como peças conjuntas de um processo único no funcionamento psicológico.
Conforme Berns (2002), embora o alcance do pensamento apresente transformações importantes, o estágio pré-operatório é caracterizado pelo egocentrismo, no qual a criança é centrada em si mesma e não consegue se colocar no lugar do outro.
Relembrando que as outras características desse estágio são a centração, irreversibilidade, raciocínio transdutivo e animismo, pode-se dizer que ao contar uma história para uma criança nessa fase e pedir para que ela reconta, a mesma poderá modificá-la em função dos seus desejos e trazer à tona experiências do passado, além de buscar justificativas e explicações para os fatos.
Em relação ao desenvolvimento cognitivo (inteligência) e afetivo (sentimentos, interesses, desejos, valores e emoções), pode-se dizer que ambos ocorrem de forma concomitante, tornando difícil separar os comportamentos, que sofrem constantemente os efeitos do processo de assimilação (na tentativa do indivíduo em solucionar determinada situação a partir da estrutura cognitiva já existente) e acomodação (capacidade de modificação da estrutura mental antiga para dar conta de dominar um novo objeto do conhecimento), na busca de atingir um equilíbrio, que perdure por toda a vida do indivíduo, pois sempre irão surgir novas necessidades que o levarão a buscar novas soluções.
Piaget (1971), afirma que a vida afetiva e a vida intelectual são uma adaptação contínua e as duas adaptações são, não somente paralelas, mas interdependentes, pois os sentimentos exprimem os interesses e os valores das ações, das quais a inteligência constitui a estrutura. No que se refere a afirmativa de que o desenvolvimento social age sobre o desenvolvimento cognitivo e afetivo, o autor diz que, as relações entre o sujeito e o meio consistem em uma interação radical, de tal modo que a consciência não começa pelo conhecimento dos objetos nem pelo da atividade do sujeito, mas por um estado indiferenciado; e é desse estado que derivam dois movimentos complementares, um de incorporação das coisas ao sujeito, o outro de acomodação das próprias coisas.
Em relação ao conhecimento, Piaget (1975), diz que não se reduz apenas ao que o meio pode oferecer ao sujeito através de suas experiências, mas sim a algo mais rico devido às possibilidades das ações acrescentarem aos objetos elementos novos dessa relação. O autor diz que, conhecer é, portanto, agir sobre os objetos e transformá-los, e essa colocação retrata de forma significativa o ato de contar histórias para crianças, visto que age de forma recíproca no momento em que a criança interage com as histórias e se envolve com estas, e é nesse processo de compreensão e assimilação do imaginário com o real que pode-se observar a contribuição que a literatura infantil tem para o desenvolvimento da criança.
Segundo Bettelheim (1980), para que uma estória realmente prenda a atenção da criança, deve entretê-la e despertar sua curiosidade. Mas para enriquecer a sua vida, deve estimular a imaginação, ajudá-la a desenvolver seu intelecto e a tornar claras as suas emoções, estar harmonizada com suas ansiedades e aspirações, reconhecer plenamente suas dificuldades e, ao mesmo tempo, sugerir soluções para os problemas que a perturbam. Ou seja, deve se relacionar com todos os aspectos da personalidade da criança sem nunca a menosprezar, promovendo a confiança nela mesma e no seu futuro.
No aspecto psicossocial visto no capítulo anterior a respeito das duas fases escolhidas para serem apresentadas com base na teoria de Erikson, podemos exemplificá-la com o conto de fadas “Os três porquinhos”, relembrando que no estágio Autonomia x Vergonha e dúvida é marcado pelo início da exploração do seu meio e do controle dos músculos e necessidades fisiológicas, nesse estágio é necessário que os pais utilizam a vergonha e o encorajamento para dar o nível certo de autonomia para as crianças. E no estágio Iniciativa x Culpa, pode ser desenvolvido o senso de responsabilidade, no qual a criança sente necessidade de realizar tarefas e cumprir papeis, assim os pais devem dar oportunidade para que os filhos realizam tarefas de acordo com o seu nível motor e intelectual, é importante também saber dosar para que a criança não fique fixada em apenas desempenhar papéis e não desenvolva o seu “eu”. Com isso pode-se dizer que no conto “Os três porquinhos” a mãe deu autonomia para que eles construíssem suas próprias casas, e os dois porquinhos que construíram de palha e madeira ao finalizar a tarefa se sentiram satisfeitos e orgulhosos, porém ao verem seu trabalho ser destruído pelo lobo se envergonham, pois foram criticados e ridicularizados o que fez com que sentissem dúvidas a respeito de suas capacidades, sendo assim eles não conseguiram passar por essa crise de maneira positiva e retrocederam nesse estágio voltando a dependência ao irem se refugiar na casa de tijolos do terceiro porquinho que já estava no estágio seguinte, no qual a combinação de confiança e autonomia lhe deu um sentimento de determinação que alavancou a iniciativa de explorar coisas novas e ir em busca de conhecimento para um novo método de construção diferente dos irmãos e desempenhou o papel de protetor e cuidador ao recebê-los em sua casa. Observa-se assim que o terceiro porquinho passou por essa crise de maneira positiva de modo que direcionou à formação da responsabilidade.
Sabe-se que a criança nessas fases não irá compreender a história dessa maneira, mas esses aspectos estarão presentes de maneira subjetiva ao ouvirem o conto, ainda que a moral que sobressaia seja a de se você não deve ser preguiçoso e que o resultado positivo só se dá através do trabalho árduo.
É fácil perceber como a criança se relaciona com o universo inanimado, interagindo, entrando na história, e isso de certa forma faz com que ela se sinta parte do texto, com base no que diz Bettelheim (1980), uma criança confia no que o conto de fada diz porque a vida ali apresentada está de acordo com a sua. Sendo assim a criança está aberta a agir sobre aquela história, a representá-la, fazendo algum tipo de conexão entre a narração da história e seu mundo interno e ou sua vida cotidiana.
A criança necessita viver essas experiências e é necessário que sejam oferecidas sugestões simbólicas sobre como ela pode lidar com estas questões da vida e crescer. No caso dos contos de fadas onde existe o bem e o mal, a criança pode criar relações com esses sentimentos, vivenciar as vitórias e derrotas e por fim criar para si uma convicção moral. Com base em Chalita (2003) pode-se dizer que sem o passaporte mágico dessas narrativas, é difícil conceber viagens, aventuras, temores, medos e receios imaginários que são fundamentais ao nosso desenvolvimento intelectual e emocional.
Corso e Corso (2006), afirmam a importância do conto de fadas no auxílio dos conflitos da criança, à medida que favorece a organização destes, que são para a criança um tanto confuso e exemplifica que assim como é para o adulto um alívio saber a respeito do que traz incômodo ou dor, assim o é para a criança entender seus conflitos. E concordam que se a criança se apoiar nas histórias, terá mais facilidade para enfrentar seus problemas, porém ressaltam que esse resultado virá por meio daquele que ouve, lê, ou assiste a história, este sim colherá os elementos da história, produzindo uma receita, que resultará em efeito terapêutico.
Também é importante ressaltar a adequação dos conteúdos das histórias aos estágios de desenvolvimento. Sendo assim Coelho (2000) afirma que durante o desenvolvimento a criança passa por estágios psicológicos que precisam ser respeitados e observados no momento da escolha dos livros para ela. É importante saber também que estas etapas não dependem exclusivamente da sua idade, mas de seu nível de amadurecimento psíquico, afetivo e intelectual, seu conhecimento e mecanismos de leitura, para que seja possível que ela relacione o conteúdo da narrativa com os acontecimentos da própria vida. E explica que a narrativa deve desenvolver uma situação simples, linear que tenha princípio meio e fim, pois o pensamento lógico da criança exige unidade, coerência e organicidade independente de ser fantástica, imaginária ou realista.
Sendo assim, também deve-se levar em consideração toda a vivência e conhecimento que a criança traz de casa e do seu cotidiano.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O propósito deste trabalho foi buscar compreender a importância da Literatura infantil no processo de desenvolvimento da criança a nível cognitivo, afetivo e social. Com base nos aspectos levantados no decorrer do trabalho, pode-se dizer que as histórias infantis fornecem um amplo contexto com o qual pode-se trabalhar de diversas maneiras, não só no contexto pedagógico ou como ferramenta de alfabetização, mas sim com ênfase nos demais aspectos da aprendizagem e desenvolvimento.
Considera-se importante ressaltar que a literatura infantil encontra-se presente de modo geral no contexto social, afetivo e cognitivo da criança, sendo possível interligá-las. Portanto é necessário que desde cedo a criança seja inserida no universo literário, não só na instituição educacional, como também na família que deve ser a mediadora desse primeiro contato, a fim de desenvolver o hábito de ouvir e contar histórias, pois através dessa atividade poderá auxiliá-la no desenvolvimento do vocabulário, linguagem, atenção, memória, na construção de ideias, capacidade de fantasiar e imaginar, e no desenvolvimento da comunicação e expressão que pode ser considerado um facilitador nas relações interpessoais.
E no que diz respeito aos conteúdos abordados nas histórias, conclui-se que eles podem auxiliar as crianças na representação entre a fantasia e a realidade, fazendo com que simbolicamente elas se identifiquem com os personagens e com as experiências vividas por eles, bem como os conflitos existentes e as resoluções para os mesmos abrindo a possibilidade de transformar o mundo real em função de seus desejos e fantasias, que poderão utilizar futuramente como referência e aplicar a sua realidade.
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Publicado por: Joice dos Santos Inacio
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