A RELAÇÃO ENTRE CRISTIANISMO E EDUCAÇÃO

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1. RESUMO

O presente trabalho apresenta uma análise sobre a relação entre o cristianismo e a educação, levando em consideração o valor cultural do cristianismo em nosso país, bem como suas contribuições à sociedade, abrangendo características históricas e hodiernas dessa polêmica relação. O trabalho constitui-se de uma pesquisa bibliográfica e exploratória, com vistas a levantar discussões sobre um tema pouco abordado. Deste modo, a pesquisa proporciona uma comparação entre as características do ensino de Jesus Cristo e de sua Igreja com o processo educativo na atualidade; aborda temas inerentes ao processo educativo quanto à origem do conhecimento, a difícil relação entre fé e ciência, os métodos de ensino, as concepções de mundo, o papel da religião na sociedade e suas implicações no ensino público e privado e na cultura, perpassando sobre a ação do cristianismo na História da Educação. Demonstrando que o cristianismo em si, não apenas mantém uma relação com a educação, mas, também se constitui em um processo educativo, com objetivos semelhantes aos objetivos da educação laica.

Palavras – chave: Cristianismo, educação, Jesus Cristo, metodologia de ensino.

ABSTRACT

This paper presents an analysis about the relation between Christianity and Education, taking into account the cultural value of Christianity in our country, as well as their contributions to society, including historical and current characteristics of this controversial relation. This work constitutes in a bibliographical research and exploratory, with objective to bring on discussions about this few addressed theme. Thus, the research provides a parallel between the characteristics of the teaching of Jesus Christ and his Church with the educational process nowadays. Approaching issues inherent in the educational process concerning to the origin of knowledge, the difficult relationship between faith and science, methods of teaching, conceptions of the world, the role of religion in society and their implications for public and private education and culture, span the action of Christianity in the History of Education. Demonstrating that Christianity in itself, not just maintains a relationship with education, but, also it constitutes in an educational process, with similar goals to education secular.

Keywords: Christianity, education, Jesus Christ, teaching methodology.

2. INTRODUÇÃO

Há mais de dois mil anos, na história da humanidade, surgiu um homem que perturbou e intrigou os alicerces de sua época – Jesus de Nazaré, o Cristo como é conhecido por seus seguidores.

A repercussão de seus ensinamentos foi intensa, possuindo seguidores até hoje. O cristianismo atualmente consiste no conjunto dos mais diversos grupos que tem em Cristo seu referencial de fé, estando espalhado nos mais diversos países. Em uma análise sobre o nosso país, por exemplo, é fácil perceber a base cristã desde a sua formação como nação, e como até hoje é grande sua influência sobre a sociedade brasileira.

Desde a infância até os dias atuais estive1 envolvido no cristianismo. Nasci numa família católica, participei ativamente do catolicismo durante nove anos até quando me converti ao protestantismo o qual sigo atualmente desde o ano 2006. Desta forma, estive envolvido nas principais vertentes do cristianismo, o que me permitiu compreendê-lo de uma forma significativa.

Durante minha graduação em pedagogia, não pude deixar de notar como muitos princípios, métodos, e maneiras de pensar do saber pedagógico assemelhavam-se aos princípios que aprendi na minha vivência cristã. Em contrapartida percebi dentro da universidade que o cristianismo é muitas vezes tratado de forma equivocada, por exemplo: enfatizam-se apenas os erros que alguns religiosos cometeram em nome de Cristo, condenando o cristianismo como um todo, sem, no entanto, refletir sobre a importância deste segmento de forma aprofundada na sua base. Tal fato me inquietava como cristão, porque considero que os princípios cristãos podem ajudar grandemente no processo educativo sem que isso consista necessariamente em uma conversão ao cristianismo, ou venha desrespeitar pessoas com crenças diferentes. A religião possui forte influência sobre a identidade pessoal e cultural de um povo. Sendo o cristianismo a cosmovisão que possui maior número de adeptos no nosso país, precisa ser analisado a fim de serem percebidas as suas influências e contribuições na formação cultural e ética do ser humano e do cidadão. A escola, como espaço de promoção do conhecimento, possui como objetivo o desenvolvimento pleno do ser humano, como construtor do conhecimento e também como cidadão, não pode ignorar, portanto, o cristianismo como algo presente na vida dos educandos.

A história da humanidade nos mostra que a religião sempre possuiu estreitas ligações com a educação, com o cristianismo não foi diferente; vemos que seus objetivos e os da educação se cruzam em determinados momentos. Portanto, levando em consideração o grande número de cristãos no Brasil, e o fato de Jesus ter sido considerado um mestre, procurei responder a questão: que relações são estabelecidas entre os preceitos teóricos – metodológicos cristãos e a educação? Há algo em comum entre ambos? A ciência e a fé poderiam manter algum diálogo? Este trabalho visa refletir sobre esses questionamentos que por muitas vezes são evitados dentro das universidades e das escolas.

Desta forma, considerando o termo amplo do que consiste educação, o objetivo desta pesquisa foi analisar a relação entre os preceitos teórico-metodológicos cristãos e a educação, com vistas a identificar aproximações e distanciamentos, onde discorri sobre aspectos históricos do cristianismo a partir do seu fundador, e as suas interfaces com a educação; identificando quais orientações cristãs que se aproximam dos princípios educacionais hodiernos; e refletindo sobre as contribuições dos pressupostos cristãos na prática pedagógica.

O grande problema em se falar em cristianismo e, consequentemente, em Jesus Cristo em um trabalho científico são os fatos sobrenaturais que rodeiam a sua história, todavia faz-se necessário esclarecer que essa pesquisa buscou discutir os aspectos pedagógicos do ensino de Jesus e de seus seguidores, dialogando com as teorias pedagógicas atuais, e em que outros aspectos o ensino cristão poderia contribuir no pensamento pedagógico. Mesmo assim, eventualmente, esses fatos sobrenaturais são citados, todavia, com o objetivo de extrair as implicações didáticas, visão de mundo e valores éticos do cristianismo e não de defender ou contestar sua veracidade.

O Brasil é um país laico, ou seja, não possui religião oficial, no entanto, é um país multicultural. Sendo assim, devemos perceber a educação como um processo que respeite essa multiculturalidade e a laicidade de maneira dialógica a fim de que favorecer o relacionamento pacífico e respeitoso entre os atores sociais das mais diversas culturas. A escola e a universidade, por sua vez, devem ser espaços capazes de desenvolver esse diálogo, o que não é uma tarefa fácil.

As diversas percepções sobre o ensino de Cristo, possivelmente originaram os diferentes segmentos cristãos, tornando hoje o cristianismo uma cosmovisão heterogênea, destarte, também a sua compreensão tornou-se complexa, primaremos, pois, por discorrer sobre o cristianismo em seus primórdios a partir dos ensinamentos do próprio Cristo, como também das principais vertentes que fazem parte da história e da sociedade brasileira: o catolicismo e o protestantismo.

Para tanto, este trabalho foi organizado em três capítulos. No primeiro discorri sobre a interface educação-cristianismo focalizando a sociedade brasileira, bem como os desafios que a discussão proporciona, uma vez que o cristianismo representa a profissão de fé da grande maioria da população e está intrinsecamente ligado à nossa cultura e nossa história enquanto nação. Em seguida, apresentei o percurso histórico da relação entre cristianismo e educação enfatizando em alguns momentos a herança educacional que o cristianismo legou à educação pública do nosso país. Já no terceiro capítulo analisei as implicações teórico-metodológicas do ensino de Jesus Cristo de acordo com os Evangelhos Canônicos2, uma vez que Jesus é o personagem central do cristianismo e é reconhecido como mestre por seus seguidores.

Dada a abrangência e a complexidade do tema, não pretendo exaurir a discussão, mas fazer com que a presente pesquisa sirva de instigação a novas, no intuito de aprofundá-la e trazer reflexões acerca de sua importância.

3. CRISTIANISMO, EDUCAÇÃO E SOCIEDADE

Atualmente existem mais de 2 bilhões de cristãos no mundo (RAMPAZZO, 2004), no Brasil, por sua vez, de acordo com o Censo 2010, estima-se que cerca de 167 milhões de pessoas são cristãs (aproximadamente 87% da população brasileira)3, já o número de ateus no país é menor que 1% da população. Tais dados nos permitem perceber a grandiosidade da influência cristã no mundo e no Brasil, e o quanto a fé cristã faz parte da identidade cultural do povo brasileiro.

As principais vertentes do cristianismo no Brasil são a Igreja Católica Apostólica Romana e as Igrejas Evangélicas. Ambos os segmentos conferem a sociedade importantes contribuições, visto que cooperam na formação ética do indivíduo e dialogam pela luta dos menos favorecidos, as ONGs associadas às igrejas são algumas das principais ferramentas utilizadas para as suas obras sociais.

A mensagem de Jesus Cristo ainda é pregada com veemência, o que mostra que Deus e a necessidade de transcender não foram aniquilados da mente ou do sentimento das pessoas. De acordo com o Censo 2010, mesmo entre as pessoas com formação superior o número de cristãos é aproximadamente 75%, levando em consideração apenas os católicos romanos e evangélicos.

Também é importante considerar que embora o número de católicos tenha caído nos últimos dez anos, em contrapartida o número de protestantes cresceu no país, manifestando que o fluxo de mudança na posição religiosa da população acontece em sua maior parte dentro do próprio cristianismo. Os cristãos e seus princípios, por sua vez, podem estar inseridos em todas as áreas da sociedade brasileira, modelando a cultura e influenciando comportamentos do modo implícito ou explícito.

3.1. EDUCAÇÃO E RELIGIOSIDADE

Ao falarmos em educação nos remeteremos a uma gama de concepções do que esta consiste. No sentido etimológico da palavra, “educação” possui procedência latina oriunda a partir de dois termos: educare (alimentar, cuidar, criar) e educere (tirar para fora, conduzir para, modificar um estado). Assim sendo, as diferentes concepções de educação concordam, quase unanimemente, que esta consiste em um processo de desenvolvimento do ser humano através de uma transformação contínua, no entanto, a concepção de educação é bem mais complexa e variável tão quanto as teorias da educação (LIBÂNEO, 2010).

Para Libâneo (2010, p.73)

o acontecer educativo corresponde à ação e ao resultado de um processo de formação dos sujeitos ao longo das idades para se tornarem adultos, pelo que adquirem capacidades e qualidades humanas para o enfrentamento de exigências postas por determinado contexto social.

Esse contexto pode ser a escola, a família, a igreja, a fábrica e outros segmentos sociais, portanto o acontecer educativo está presente em suas diferentes modalidades em todas as áreas das relações humanas.

No que concerne às modalidades da educação podemos defini-la como: informal, não-formal, e formal. A educação informal consiste em uma educação não-intencional ou não-sistematizada, é o que ocorre, por exemplo, na família. A formal é sistemática, é “aquela estruturada, organizada, planejada intencionalmente” (LIBÂNEO, 2010, p. 88), educação típica das escolas. Já a não-formal consiste em “atividades com caráter de intencionalidade, porém com baixo grau de estruturação e sistematização, implicando certamente relações pedagógicas, mas não formalizadas” (LIBÂNEO, 2010, p. 89) que ocorre, por exemplo, em grupos sociais. Todas essas modalidades possuem forte influência na formação da personalidade do indivíduo.

O ser humano é um ser complexo que desenvolve sua personalidade e seu caráter a partir das relações que mantém com as diversas instituições sociais em que está inserido, desse modo, essa personalidade é desenvolvida através do chamado processo de socialização, e não é simplesmente uma característica biológica; ou seja, embora o ser humano nasça com maiores potencialidades que os demais animais, muitas dessas potencialidades só serão desenvolvidas através desse processo de socialização. A família, a escola, e a religião são exemplos de instituições sociais básicas que contribuem para essa formação da personalidade (TOSCANO, 2001).

A religião estando também ligada intrinsecamente a personalidade do individuo, exerce grande influência sobre a sociedade humana através do tempo, despertando o interesse de psicólogos, sociólogos e antropólogos para o estudo de suas correlações com as demais instituições sociais (TOSCANO, 2001).

O termo “religião” segundo Cury (2004) provem do verbo latino “religare”, o que nos remete a reunião de algo ou alguém, o restabelecimento de um elo, Cury (2004, p. 188) rejeita a ideia de que tal termo provenha simplesmente das religiões monoteístas, para ele “outras manifestações de caráter religioso, místico, cósmico ou transcendental também aspiram por um reencontro do ser humano e do conjunto dos seres humanos vivos ou já mortos com a ‘Totalidade’”. A etimologia da palavra nos ajuda a compreender o seu sentido em termos práticos, deste modo, a religião consiste em uma instituição social, que procura reunir pessoas, ou seres em sentido natural e/ou sobrenatural.

Instituições sociais, por sua vez, consistem em meios pelos quais o homem procura ajustar-se ao ambiente natural, social, ou sobrenatural. A instituição religião consiste na qual o homem se ajusta no seu ambiente sobrenatural (LAKATOS e MARCONI, 2011). Assim, podemos definir a religião como “um sistema unificado de crenças e práticas relativas às coisas sagradas, isto é, a coisas colocadas à parte e proibidas – crenças e práticas que unem numa comunidade moral única todos os que a adotam” (CHINOY apud LAKATOS e MARCONI, 2011, p. 181).

Na atualidade, dentre as instituições sociais, a escola é promovedora da educação sistematizada, e a religião é um espaço de propagação da fé, mesmo assim, esta última contribui fortemente para a propagação de valores, princípios e do conhecimento, assim como a educação sistematizada. Tal circunstância nos leva a analisar a história da educação aferindo sua ligação com a religiosidade.

A história da educação está intimamente ligada à própria história das instituições religiosas. A casta sacerdotal que nas sociedades arcaicas, detinha o poder político ou pelo menos dele participava ativamente, deve ter compreendido de maneira bastante clara, a importância de chamar a si o controle do sistema educacional, por mais informal e limitado que ele fosse (TOSCANO, 2001, p. 139)

Essa relação se mantém, portanto, desde as comunidades primitivas até as sociedades modernas. Aranha (2006, p. 35) nos explicita como já “nas comunidades tribais as crianças aprendiam imitando os gestos dos adultos e nas atividades diárias e nos rituais”. No entanto, essa relação torna-se mais clara a partir do momento em que as sociedades tornam-se mais complexas. Como exemplo, podemos citar o Egito antigo, onde a transmissão do saber era restrita a poucos, dentre eles os sacerdotes; a Mesopotâmia onde a classe sacerdotal também era encarregada da educação; Índia onde a educação era privilégio dos brâmanes, que teriam sido gerados da cabeça do deus Brahaman, segundo as crenças dos indianos. E os hebreus, propagadores do monoteísmo ético (ARANHA, 2006), que diverge das demais civilizações por crerem em um deus4 único, que requeria dos seus seguidores a absorção de determinados valores, descritos na Torá5. Borges (2002) faz consonância com Aranha ao relatar que

[...] Nas civilizações antigas, a religião, ou a magia e o misticismo determinavam praticamente os aspectos da vida humana. Portanto, ao serem transmitidos os ensinamentos relativos aos aspectos práticos da vida primitiva, transmitia-se igualmente, o ensino religioso, pois eram temas interdependentes (BORGES, 2002, p. 28-29).

O que podemos destacar sobre as considerações de Aranha (2006), Borges (2002) e de Toscano (2001) é que a educação não esteve somente relacionada à religiosidade, mas por muito tempo fora apenas um privilégio da classe sacerdotal dos diferentes tipos de religiões e culturas, como também a religiosidade intervinha em toda esfera das sociedades primitivas.

O cristianismo, por sua vez, surgido também dentre o povo hebreu, mantém um relacionamento intenso com as práticas educativas no decorrer da história até a atualidade, “os cristãos legaram ao mundo um vastíssimo patrimônio cultural e uma extraordinária riqueza filosófica e pedagógica” (BORGES, 2002, p. 40). Podemos perceber na sociedade brasileira atualmente, por exemplo, organizações religiosas educacionais ligadas à Igreja Católica e outras igrejas cristãs da atualidade, como diversas instituições católicas de ensino6, dentre elas a PUC – Pontifícia Universidade Católica, e no âmbito evangélico7 podemos citar a Universidade Presbiteriana Mackenzie e os Colégios Presbiterianos. Muitas dessas escolas organizam-se também em associações como a Associação de Escolas Cristãs de Educação por Princípios (AECEP), e a Associação Internacional de Escolas Cristãs (ACSI), ambas, organizações evangélicas8. De tal modo, podemos encontrar no cristianismo todas as modalidades da educação, a informal - através dos valores vivenciados nas igrejas; não-formal – através das ONGs ligadas às instituições religiosas; e formal – através das escolas confessionais cristãs.

3.2. O DIREITO À FÉ E A INTOLERÂNCIA RELIGIOSA

O artigo XVIII da Declaração Universal de Direitos Humanos afirma:

Toda pessoa tem direito à liberdade de pensamento, consciência e religião; este direito inclui a liberdade de mudar de religião ou crença e a liberdade de manifestar essa religião ou crença, pelo ensino, pela prática, pelo culto e pela observância, isolada ou coletivamente, em público ou em particular. (ONU, 1948)

Como podemos perceber, o artigo versa sobre o direito a fé, mudança de religião, a sua expressão pelo ensino e pelo culto, o que inspirou a Constituição Brasileira de 1988 a garantir no inciso VI do artigo 5º que trata dos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos:

é inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e as suas liturgias (BRASIL, 1988)

O Brasil é um país laico, ou seja, não toma partido por nenhuma religião, no entanto, não consiste em um país irreligioso ou antirreligioso (CURY, 2004), por isso garante ao cidadão o direito a liberdade de culto e expressão religiosa. Tal garantia da lei torna-se necessária devido à diversidade de religiões que existe em nosso país, embora a grande maioria da população se autodetermine cristã, com vistas a respeitar os direitos das minorias e também da maioria.

Dada a diversidade religiosa e a laicidade do nosso país, deparamo-nos perante a um dilema que chega aos limiares da escola. O Estado não toma mais partido de uma única religião, a escola pública estando sobre o domínio do Estado deve acolher pessoas de diferentes crenças. É importante considerar que a diversidade religiosa do nosso país está relacionada a sua multiculturalidade, o que não se reduz somente a religião, assim, eis o desafio: tornar a escola um espaço acolhedor para as diversas pessoas, respeitando suas crenças, seus valores, hábitos e costumes, através de um diálogo pacífico, “imparcial”, e não preconceituoso.

De acordo com Souza (2002, p. 156) multiculturalidade é um fenômeno do nosso tempo, “que traz para o campo da educação uma série de questionamentos e desafios, tais como o respeito a diversidade cultural e o redimensionamento das práticas educativas, a fim de se adequar às recentes demandas por uma escola mais democrática e inclusiva”.

Assim, propõe Semprini citado por Souza (2002) uma educação com uma “epistemologia multicultural”, essa epistemologia se fundamentaria em quatro aspectos:

  1. A realidade é uma construção;

  2. As interpretações das realidades são subjetivas

  3. A verdade é relativa

  4. O conhecimento é um ato político

Quanto ao terceiro fundamento destaca que “a principal consequência do caráter radicalmente interpretativo e subjetivo da realidade é a impossibilidade de fixar-lhe uma verdade objetiva. Sendo assim, ‘a verdade só pode ser relativa’, condicionada ao indivíduo e ao significado que ele dá” (SOUZA, 2002, p. 159). Cada ser, portanto, possui a sua verdade ou relidade, não existe verdade absoluta ou universal, o que pressupõe a existências de “verdades” ou “realidades”.

Souza (2002) considera a própria complexidade de se compreender essa “epistemologia multicultural”, algumas considerações, por exemplo, nos permite perceber como a mesma pode tornar-se paradoxal, ao afirmar que “não existe verdade absoluta”, o próprio enunciado torna-se “uma verdade”, e por conseguinte, não é absoluta, nos dando margem para subentender que existe sim verdade absoluta, contradizendo, portanto, o enunciado. Mesmo que existam verdades absolutas e relativas, os dilemas permanecem em definir o que é absoluto e o que é relativo. A concepção de “verdade” ou se ela é absoluta ou relativa, entretanto, nos enviará a um debate antigo, no qual não nos reteremos.

Souza (2002) defende uma educação que valorize a dialética entre igualdade e a diferença, entre o universal e o particular, para tanto, ressalta a necessidade de compreender que diferença e igualdade não são antônimos. Igualdade e diferença afirmam, respectivamente, a inclusão e a abertura, enquanto a desigualdade e a indiferença supõem a exclusão do outro, e sua desqualificação. Portanto, a diferença deve existir, mas não a desigualdade.

A diferença e igualdade fazem parte de nossa humanidade, no entanto, tanto o relativismo radical, como a igualdade como um parâmetro de padronização dos indivíduos devem ser rejeitados. E assim questiona,

como é possível entender a nossa humanidade enquanto iguais e diferentes? E até que ponto somos iguais e diferentes? Em que somos iguais? Em que somos iguais e em que somos diferentes? Como articular igualdade e diferença a fim de garantirmos a tolerância e o respeito e necessária articulação das temáticas, principalmente na educação escolar? (SOUZA, 2002, p. 168)

De tal modo, os questionamentos perduram com a finalidade da articulação entre a diferença e a igualdade nas práticas pedagógicas. Outro fator importante considerado por Souza (2002) é a intolerância, que se caracteriza em uma negação agressiva e ódio à diferença alheia, um ódio muitas vezes violento e assassino, o que não é apenas não tolerar as opiniões divergentes.

Em se trantando de religiosidade, mas especificadamente sobre o cristianismo, é necessário considerar que, embora o cristianismo seja uma cosmovisão ou uma religião, sua visão de mundo determina valores que podem abranger todas as instituições da esfera social, assim temos no cristianismo uma espiritualidade voltada não somente para o transcendente, mas que volta-se também para a constituição da família, para os valores necessários ao sistema político, para a origem do conhecimento, o cuidado com as emoções do indivíduo, enfim, para a sociedade como um todo. O pensamento cristão ou a epistemologia cristã é essencialmente universalista, embora possa aceitar as diferenças individuais de cada pessoa9.

Mesmo sendo hegemônico na sociedade brasileira, na perspectiva multicultural apresentada por Souza (2002), se enquadra apenas como mais uma visão de mundo. Por mais que o considerem “uma verdade”, em determinadas linhas de pensamento, o cristianismo se considera “a verdade”, não somente quanto ao sobrenatural, mas também no que diz respeito a valores morais. Tais situações podem ocasionar a intolerância religiosa, o que não acontece somente no cristianismo, mas também contra ele, embora o ódio não faça parte da sua filosofia.

À luz do que nos fala Souza (2002) sobre intolerância, podemos entender a intolerância religiosa como um ódio destrutivo à religiosidade de outrem. No entanto a intolerância não pode ser tolerada. Portanto, podemos compreender que é direito de qualquer religião possuir a sua visão de mundo, questionar valores, criticar a realidade e a sociedade segundo os seus princípios e defender sua fé, entretanto, lhe é vedado o desrespeito à pessoa humana e às decisões individuais de cada ser. Em outras palavras, lhes são outorgado o direito de discordar, na sua liberdade de expressão, mas não o de desrespeitarem os demais indivíduos ou “obrigá-los a aceitar sua visão”, ambos aspectos são direitos humanos e garantidos por lei.

3.3. CIÊNCIA, RELIGIOSIDADE E ENSINO

3.3.1. Religião, Conhecimento Religioso e Ciência

Ao propor-nos discorrer sobre a relação entre religião e ciência nos remetemos a um debate antigo e nevrálgico, a exemplo temos o tenso confronto entre criacionismo e evolucionismo, entretanto, cada uma remete-se a uma maneira diferente de compreender a realidade. A religião é detentora do conhecimento religioso10, o qual é fundamentado na fé e na revelação, enquanto o conhecimento científico é baseado na experimentação, verificação e observação dos fatos (RUIZ, 1991). Ambos os conhecimentos - religioso e científico, subsistem e partem de ópticas diferentes sobre a realidade, assim como os demais tipos de conhecimentos (filosófico e popular), Lakatos e Marconi (2001) afirmam, inclusive, que um cientista pode ser um crente praticante, ser adepto de algum tipo de sistema filosófico, e orientar sua vida cotidiana por pressupostos oriundos do senso comum.

Mesmo o conhecimento religioso ou teológico sendo fundamentado na fé, para Rampazzo (2004, p. 30), “o conhecimento teológico tem uma ‘veste’ científica, no sentido de que é racional, metódico e sistemático,” onde “o objeto do conhecimento teológico são os dados da fé; e método é a procura da integração entre fé e razão”.

Para Lakatos e Marconi (2001, p. 79), o conhecimento teológico

apóia-se em doutrinas que contêm proposições sagradas (valorativas), por terem sido reveladas pelo sobrenatural (inspiracional) e, por esse motivo, tais verdades são consideradas infalíveis e indiscutíveis (exatas); é um conhecimento sistemático do mundo (origem, significado, finalidade e destino) como obra de um criador divino; suas evidências não são verificadas: está sempre implícita uma atitude de fé perante um conhecimento revelado.

Para Ruiz (1991) o conhecimento religioso parte da premissa que Deus existe, possui ciência infinita, tem poder infinito, inclusive, de se comunicar com os homens através da relação direta com cada um, ou da revelação direta a alguns profetas e de seu filho Jesus Cristo. E a Bíblia é onde está escrito o que Deus falou ou parte do que ele falou. Deste modo, os textos bíblicos são autênticos, portanto, merecem todo o crédito. Cabe, entretanto, ao teólogo provar que Deus existe, que falou aos homens, e que os textos bíblicos possuem inspiração divina. Segundo Ruiz (1991, p. 103),

os princípios subjetivos operativos que guiam o filósofo ou o cientista são os sentidos corporais e a inteligência ou razão natural, diversamente acontece com o teólogo ou como o fiel que operam com sua razão iluminada, ilustrada, elevada pelo dom sobrenatural e gratuito da fé, conforme ensina a própria teologia. A fé eleva a razão a uma ordem superior e divina de conhecimento.

Deste modo, no conhecimento religioso a razão está a serviço da fé, como defende Tomás de Aquino (1225-1274), entretanto, nem a teologia, nem a ciência do fato religioso conseguem explicar a fé cabalmente, por ser de ordem místico-intuitiva (RUIZ, 1991).

É necessário considerar que o conhecimento religioso abrange fenômenos sobrenaturais, o que ocorre não só no cristianismo. Dentre algumas definições apresentadas por Lakatos e Marconi (2011), o sobrenatural consiste naquilo que se crê, mas não se pode ser comprovado pelo o método científico, o próprio Deus consiste em um ser sobrenatural, assim sendo, a ciência não possui métodos de verificação que possam atestar ou não a sua existência.

Rampazzo (2004) afirma que existem alguns aspectos religiosos que podem ser provados cientificamente, por exemplo, historicamente é comprovada a existência de Jesus e que ele foi crucificado, no entanto, aceitá-lo como salvador da humanidade e que sua morte foi vicária, é uma questão de fé; o dado de fé é uma revelação que não pode ser descoberta pela ciência, pela filosofia, ou pelo conhecimento popular, ele só tem valor para aquele que vivencia a experiência da fé.

Já Hammes (2006) discute sobre a possibilidade da Teologia se configurar como ciência, para tanto, levando em consideração o debate do que consiste a ciência, afirma que “a questão da cientificidade da Teologia, [...] depende, em primeiro lugar, de um conceito aberto de ciência, capaz de abranger áreas de pesquisa e metodologias diferentes das meramente positivas” (HAMMES, 2006, p. 546), o que não é uma discussão exclusiva da Teologia, mas também, quanto ao Direito e algumas ciências sociais, dentre outras. A Teologia seria então para Hammes (2006) a logos da fé, e não a própria fé. Aqui, define fé não como irracionalidade, mas como fidelidade ou confiança em alguém. Assim,

a Teologia, por seu método e conteúdo, está entre as ciências humanas, e pode ser entendida como uma ciência hermenêutica, na medida em que seu objeto são textos e tradições aceitos por comunidades humanas como normativos de sua existência. Cabe-lhe a tarefa educativa de relacionar esses textos com a realidade e, com os recursos das outras ciências, mediar o diálogo entre as demais visões de mundo, garantir a paz religiosa, relativizar os absolutismos políticos, econômicos e sociais, e prevenir os fundamentalismos e a intolerância. É o que se poderia designar de papel universalizador da Teologia (HAMMES, 2006, p. 552-553).

Destarte, Hammes (2006) defende o caráter científico da teologia, e não a vê como simples conhecimento religioso. O Conselho Nacional de Educação (CNE) parece também pugnar pelo caráter científico da teologia ao direcionar a composição da matriz curricular dos cursos de teologia, o que até então ficava sobre o critério de cada instituição. No parecer nº118/2009, assegura a necessidade de diálogo quanto às demais áreas científicas:

É importante, portanto, que os cursos de graduação em Teologia, bacharelado, no País garantam o acesso à diversidade e à complexidade das teologias nas diferentes culturas e permitam analisá-las à luz dos diferentes momentos históricos e contextos em que se desenvolvem. Devem, ainda, garantir uma ampla formação científica e metodológica, por meio da flexibilidade curricular na área do conhecimento e interação com as áreas afins.

Por essa razão, o estudo das teologias, dentro da área de Ciências Humanas conforme classificação CAPES/CNPq, não pode prescindir de conhecimentos das Ciências Humanas e Sociais, da Filosofia, da História, da Antropologia, da Sociologia, da Psicologia e da Biologia, entre outras. O estudo da Teologia deve, ainda, buscar diálogo com outras áreas científicas, possibilitando estudos interdisciplinares11.

A resolução do CNE acaba por objetivar maior criteriosidade científica da teologia, ao requerer dos novos cursos a investigação não somente de uma linha de pensamento, combatendo assim o teor proselitista dado a determinados cursos. O CNE assegura que sendo o Estado laico, não pode reconhecer cursos com tal teor, no entanto, não pode também negar o direito do caráter confessional das universidades particulares.

3.3.2. O Ensino Religioso

O caráter laico do Estado proporciona outra discussão a respeito dessa relação ciência-educação-religião: o ensino religioso nas escolas públicas de ensino fundamental, o que também não é um debate novo.

O ensino religioso manteve-se nas escolas enquanto disciplina facultativa no currículo do ensino fundamental devido às pressões das instituições religiosas desde a Constituição 1934 (CURY, 2004), destarte, a Constituição atual assegura no Art. 210:

§ 1º - O ensino religioso, de matrícula facultativa, constituirá disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental (BRASIL, 1988).

O Estado vê-se em situação complicada, contudo, em definir o currículo da disciplina, e quem estaria apto a lecioná-la. O Art. 33 da LDBEN em sua redação anterior assegurava o direito à disciplina, além de facultativo, poderia ser confessional ou interconfessional, sem ônus para o Estado, caberia, portanto, as instituições religiosas credenciar e manter os professores de ensino religioso, o que era inviável para as igrejas, resultando na reformulação do art. 33:

O ensino religioso, de matrícula facultativa, é parte integrante da formação básica do cidadão e constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, vedadas quaisquer formas de proselitismo.

§ 1º Os sistemas de ensino regulamentarão os procedimentos para a definição dos conteúdos do ensino religioso e estabelecerão as normas para a habilitação e admissão dos professores.

§ 2º Os sistemas de ensino ouvirão entidade civil, constituída pelas diferentes denominações religiosas, para a definição dos conteúdos do ensino religioso (BRASIL, 1996).

Vemos que o ensino religioso, segundo o artigo, constitui-se como parte da formação básica do cidadão e rejeita qualquer tipo de proselitismo, responsabilizando os sistemas de ensino por sua regulamentação em parceria com as denominações religiosas, sendo o Estado responsável pelo ônus. Todavia, Paily (2004) considera que tal lei impede a definição de parâmetros nacionais para o ensino religioso, além de conferir ao docente da disciplina uma formação distinta dos demais docentes do ensino fundamental, e de implicitamente ignorar o fato de que nos estados e nos municípios não ocorreriam discriminações contra a diversidade religiosa. Assim continua o dilema na definição do currículo da disciplina e em definir quem estaria apto a lecioná-la.

Em fevereiro de 2010, o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, promulgou o decreto Nº 7.107/2010, aprovando o “Acordo entre o Governo da República Federativa do Brasil e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil, firmado na Cidade do Vaticano, em 13 de novembro de 2008”. O Estatuto, dentre outras polêmicas, assegura no artigo 11:

A República Federativa do Brasil, em observância ao direito de liberdade religiosa, da diversidade cultural e da pluralidade confessional do País, respeita a importância do ensino religioso em vista da formação integral da pessoa. 

§1º. O ensino religioso, católico e de outras confissões religiosas, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental, assegurado o respeito à diversidade cultural religiosa do Brasil, em conformidade com a Constituição e as outras leis vigentes, sem qualquer forma de discriminação (BRASIL. 2010). 

“O polêmico artigo 11 tem promovido a manifestação dos mais variados movimentos acadêmicos, políticos, religiosos e sociais no sentido de reverter esse quadro, podendo configurar- se em uma longa batalha” (CARVALHO e CARVALHO, 2012, p. 65). Várias, críticas, portanto, foram feitas ao presente artigo, dentre elas de ferir a Constituição Brasileira e de estar em conflito com o artigo 33 da LDB, o qual vedava o proselitismo.

Como podemos perceber o embora no §1º do artigo 11 do Estatuto, assegure o ensino religioso das diversas confissões religiosas, e primar pelo respeito à diversidade cultural, é dado destaque ao ensino religioso católico, reavivando o debate sobre o caráter laico do Estado.

3.3.3. O desafio da discussão

Cury (2004, p. 2) afirma que

o ensino religioso é problemático, visto que envolve o necessário distanciamento do Estado laico ante o particularismo próprio dos credos religiosos. Cada vez que este problema compareceu à cena dos projetos educacionais, sempre veio carregado de uma discussão intensa em torno de sua presença e factibilidade em um país laico e multicultural.

Paily (2004) discorre sobre “O dilema epistemológico do ensino religioso”, Hammes (2006) define a teologia como “uma polêmica científica”, nas discussões destes dois últimos autores juntamente a Cury (2004) fica evidente como qualquer debate a respeito de crenças religiosas, como a cientificidade da teologia e o ensino religioso nas escolas públicas, é árduo e requer muito diálogo. Criar um diálogo pacífico, entretanto, ainda é um grande desafio, mesmo dentro da academia.

Paiva (1999), nos mostra em “Representação Social da Religião Em docentes – Pesquisadores Universitários” importantes considerações sobre a pesquisa em religião destaca que, “existem diversos objetos sociais que interessam ao grupo acadêmico, como a arte, a política, o esporte, o papel da universidade na sociedade, e existem também objetos sociais que parecem alheios aos interesses acadêmicos, como o comércio e a religião (PAIVA, 1999). Algo semelhante comenta Robbins (2011, p.1) embora se referindo ao cristianismo enquanto objeto de estudo da Antropologia, ao afirmar que “[...] de algum modo, durante seu primeiro século de existência, a Antropologia, que afirmava ter o mundo inteiro como campo de estudo, negligenciou a religião mais praticada no mundo”.

Paiva (1999) ainda destaca que “no meio acadêmico a questão da religião é uma questão delicada; as pessoas se inclinam a esquivar-se de falar do assunto, embora hoje os professores não mais se sintam envergonhados de sua crença; [...] a posição dos colegas quanto à religião conhece-se superficialmente”. É o ponto nevrálgico que citamos anteriormente, a pesquisa de Paiva (1999) nos permite perceber como é tenso discussão sobre a fé dentro da universidade.

Brooke (1991) e Marsden e Longfield (1992) citados por Paiva (1999) explicitam que, no decorrer da história, por muito tempo ciência e religião andaram juntas na universidade, tendo, inclusive, a religião lutado pela autonomia da ciência, inclusive, em países de tradição científica e tecnológica mais consolidada, teólogos e cientistas reúnem-se com certa frequência para discussões e debates acerca da relação ciência e religião. No Brasil não tem sido assim, o caráter laico das instituições públicas, recolheu às instituições privadas e confessionais o debate religioso com finalidade de manter o diálogo entre fé e ciência. Assim, sua pesquisa concluiu que não há representações sociais da religião dentro da academia nos sujeitos pesquisados.

Deste modo, falar em ciência e religião não é tarefa fácil, mas requer grande exercício do diálogo para aliviar tais tensões que circundam essa relação, cabe também para a manutenção desse diálogo um espírito aberto e desprovido de preconceitos, afim de que os diferentes atores sociais possam compreender-se e conviverem.

4. ASPECTOS HISTÓRICOS DA RELAÇÃO CRISTIANISMO – EDUCAÇÃO

4.1. A EDUCAÇÃO HEBRAICA

Como já discutimos no capítulo anterior, a educação hebraica, assim como nas demais antigas civilizações, estava estritamente ligada ao ensino da religiosidade, no entanto, os hebreus possuíam características culturais diferentes dos outros povos: apesar de honrar seus antepassados, não os cultuavam, sendo exigida aos seguidores do seu deus a absorção de valores morais, assim “desenvolveram uma nova ética voltada para os valores da pessoa: os mandamentos são um apelo ao ser humano interior” (ARANHA, 2006, p. 49). O cristianismo é uma cosmovisão oriunda do judaísmo, portanto, faz-se necessário compreender a priori as concepções de educação da sociedade hebraica a fim de percebermos suas contribuições educacionais ao cristianismo.

Na Torá (ou Pentateuco, para os cristãos) a primeira referência ao conhecimento aparece quando Yahweh12 teria proibido ao homem comer do fruto da “árvore do conhecimento do bem e do mal”. Assim, ao comer do fruto proibido o homem teria decidido julgar por si mesmo o que é certo e o que é errado, afastando-se de Deus. Tal referência, desde já, sugere que o conhecimento estaria relacionado ao juízo de valor em discernir o que é bom ou mau. Entretanto, para os israelitas, o verdadeiro conhecimento provém de seu deus, como descreve o livro de Provérbios: “Porque o Senhor dá sabedoria, e da sua boca vem o conhecimento e o entendimento” (Provérbios 2:6). O que nos remete a ideia de sacralização do saber citada por Cambi (1999), o que é típico do conhecimento religioso. O homem teria no éden, portanto, rejeitado o conhecimento provindo de Deus.

De acordo com os escritos bíblicos, Deus exige do seu povo a santidade e a obediência, ou seja, o total afastamento daquilo que é considerado impuro, mal e imoral (MELO, 2002). Assim, a excelência do ser humano parte do princípio do “temor do Senhor”, o que é o princípio da sabedoria; esse temor afastaria o homem daquilo que é considerado impuro, e a santidade deveria abranger a totalidade do ser humano partindo de seus sentimentos mais íntimos à suas ações (BORGES, 2002).

O conhecimento para os judeus, portanto, era os ensinamentos do seu deus, o que não era simplesmente um privilégio dos sacerdotes, pois esses ensinamentos deveriam ser passados para todo o povo, cabendo também aos pais a responsabilidade de ensinar os filhos nos diversos momentos oportunos:

Ponde, pois, estas minhas palavras no vosso coração e na vossa alma, e atai-as por sinal na vossa mão, para que estejam por testeiras entre os vossos olhos. E ensinai-as a vossos filhos, falando delas assentado em tua casa, e andando pelo caminho, e deitando-te, e levantando-te; E escreve-as nos umbrais de tua casa, e nas tuas portas (Deuteronômio 11:18-20)13.

É importante destacar nessa citação bíblica, o método descrito para que os filhos pudessem aprender os princípios e os costumes do povo israelita. Esse conhecimento deveria estar presente e exposto no cotidiano das pessoas para que elas não o esquecessem (BORGES, 2002). O que indica que esses filhos deveriam aprender a ler. O domínio da leitura, portanto, deveria ser importante para que o povo de Israel pudesse guardar os mandamentos. Além de que, apesar dos ensinamentos serem “transmitidos” pela oralidade, encontravam-se também escritos.

A educação hebraica era rigorosa e minuciosa desde a infância, e além de valorizar o temor a Deus, também pregava a obediência aos pais. A concepção de família é o modelo que na atualidade conhecemos como tradicional, ou seja, pai, mãe e filhos; onde o casamento deve ser monogâmico, heterossexual, com coabitação exclusiva, sob a liderança masculina (SZYMANSKI, 2002), embora, muitos patriarcas e líderes de Israel não tenham seguido algumas dessas orientações, como a coabitação exclusiva e a monogamia - segundo os relatos bíblicos. Na verdade, por vezes, os hebreus desobedeceram aos mandamentos, em muitos casos a nação quase em sua totalidade afastava-se da fé e dos princípios do “Deus de Israel” (BORGES, 2002).

No que diz respeito ao relacionamento dos pais e filhos, Torres (2011, p. 40) defende que o cuidado com as crianças, descritos pela Bíblia Hebraica, revelava “a mesma atenção paterna e materna presentes nos escritos pertinentes aos primórdios da educação grega”. Como inicialmente na sociedade hebraica não havia escola, cabia ao pai, como chefe da família, a responsabilidade pela educação dos filhos (MELO, 2002). Cambi (1999) afirma que essa educação era severa. Podemos analisá-la segundo os trechos abaixo, perceberemos, inclusive, que a lei de Israel não tolerava a rebeldia dos filhos aos pais:

Quando alguém tiver um filho contumaz e rebelde, que não obedecer à voz de seu pai e à voz de sua mãe, e, castigando-o eles, lhes não der ouvidos, então seu pai e sua mãe pegarão nele, e o levarão aos anciãos da sua cidade, e à porta do seu lugar; e dirão aos anciãos da cidade: este nosso filho é rebelde e contumaz, não dá ouvidos à nossa voz; é um comilão e um beberrão. Então todos os homens da sua cidade o apedrejarão, até que morra; e tirarás o mal do meio de ti, para que todo o Israel ouça e tema (Deuteronômio 21: 18 - 21).

O que retém a sua vara aborrece a seu filho, mas o que o ama, a seu tempo, o castiga (Provérbios 13: 24).

Não retires a disciplina da criança, porque fustigando-a com vara, nem por isso morrerá. (Provérbios 23: 13).

Na primeira citação vemos que a desobediência obstinada dos filhos aos pais era digna de sentença de morte, o castigo também era orientado pelas escrituras, como um meio de disciplina. Por vezes, nesse mesmo livro de Provérbios (o qual mais possui orientações quanto à educação dos filhos), os filhos também são orientados a ouvirem seus pais e a amarem a repreensão, pois esta os tornaria sábios: “Ouve o conselho, e recebe a correção, para que sejas sábio nos últimos dias” (Provérbios 19: 20). Todavia, o livro destaca a excelência da sabedoria, onde a mesma seria mais valiosa que o ouro fino.

Bem-aventurado o homem que acha sabedoria, e o homem que adquire conhecimento; porque é melhor a sua mercadoria do que a mercadoria de prata, e sua renda do que o ouro mais fino. Mais preciosa é do que os rubis, e tudo o que podes desejar não se pode comparar a ela. Aumento de dias há na sua mão direita; e na esquerda, riquezas e honra. Os seus caminhos são caminhos de delícias, e todas as suas veredas, paz. É árvore de vida para os que a seguram, e são bem-aventurados todos os que a retêm (Provérbios 3: 13-18).

Afirma também que pela doçura dos lábios se aumenta o ensino: “O sábio de coração será chamado prudente, e a doçura dos lábios aumentará o ensino” (Provérbios 16: 21). Isso nos permite fazer algumas conexões com a importância da afetividade na aprendizagem, algo amplamente discutido no âmbito da relação professor-aluno.

Em suma, as orientações práticas do livro de Provérbios incentivavam a não tolerar a rebeldia, mas também não desanimar diante da crítica, e o ensinamento deveria ser feito de forma doce e amorosa, para que fosse mais bem apreendido. E ainda, como afirma Torres (2011), talvez, a concepção bíblica que mais influenciou a educação infantil seja: “Instrui o menino no caminho em que deve andar, e, até quando envelhecer, não se desviará dele” (Provérbios 22:6). O provérbio enaltece a importância de ensinar valores ao ser humano, desde sua meninice, pois ao crescer levaria o ensinamento para sua vida inteira.

Fora do âmbito familiar, a educação estava sob a responsabilidade dos sacerdotes, juízes, e de outro personagem interessante e que merece destaque: o profeta.

Os profetas [...] eram educadores de Israel, inspirados por Deus e continuadores do espírito de sua mensagem ao “povo eleito”. [...] São educadores de todo povo, mas falam a cada indivíduo, com palavras solenes e brutais, que pretendem sacudir o espírito e transformá-lo. E são educadores inspirados previdentes, que falam contra e além do seu tempo. [...] O papel do profeta é despertar metaforicamente da “morte” (CAMBI, 1999, p.70).

Embora na antiguidade muitos reis buscassem aconselhamentos dos oráculos, no caso de Israel, por muitas vezes, os profetas eram quem procuravam os reis para denunciar seu “desvio”. De tal modo, os profetas condenavam as atitudes injustas dos reis, o enriquecimento deles e a desigualdade social, além de criticarem a usura, os expropriadores de terras, e a concentração de riquezas, como também a política religiosa e cultural dos monarcas, mais preocupadas com a suntuosidade do culto do que propriamente com a religião e a justiça. Possuíam uma maneira incisiva em transmitir sua mensagem, alertando a população sobre as consequências em não consertar suas atitudes, da mesma forma davam esperanças aos que se voltassem para seu Deus, o qual lhes garantiria amor e cuidado. Anunciavam a vinda do “Libertador” aquele que viria salvar o povo de Israel, o qual segundo o cristianismo é Jesus (MELO, 2002).

Os profetas possuíam um discurso lírico, carregado de simbolismos, com parábolas e atitudes arrojadas com o objetivo de chamar a atenção da população para o seu desvio. Anunciavam a destruição de Jerusalém e o domínio de Israel por nações estrangeiras caso o arrependimento do povo não ocorresse.

A preocupação, portanto, dos hebreus centralizava-se no ensino da moral de dos “bons costumes” como meio de edificação do homem. E as escrituras eram seu principal instrumento de ensino, a

Torá ou Pentateuco mostra como Deus formou o seu povo e lhe deu a sua lei, que incluía prescrições detalhadas sobre o culto. Os livros históricos descrevem a trajetória ora ascendente ora descendente de Israel no que se refere à aliança contraída com Deus. A literatura sapiencial ilustra o que significa observar a lei divina em situações concretas da vida. Finalmente, os profetas eram os fiadores da aliança, os instrumentos enviados por Deus para alertar e exortar o povo escolhido quanto às suas responsabilidades diante de Iavé. [...] Todo esse processo tinha um forte componente educacional. A lealdade e a obediência a Deus exigiam constante orientação e treinamento (MATOS, 2008a, p. 10).

Quanto às escolas para crianças, somente a partir de 75 a. C. passam a ser mencionadas, mas

desde o século VIII a. C., havia na Palestina escolas para escribas e jovens de uma idade mais madura podiam formalmente se tornar discípulos dos profetas, o costume de colocá-los sob a tutela de grandes rabinos só se desenvolveu após o cativeiro babilônico. [...] Na época de Jesus, a educação grega já era famosa no mundo todo e era praticada com entusiasmo na palestina (TORRES, 2011, p. 35).

A sinagoga era o local da instrução para a interpretação da lei, apenas a partir do século I foi acrescentado, além dos estudos de trechos da Torá, o estudo da escrita e da aritmética.

A história dos hebreus e sua fé em seu Deus é o berço do desenvolvimento do cristianismo. Para Johnson (2001) inclusive, o cristianismo seria nada mais que um nova roupagem do judaísmo. O deserrolar da história nos permitirá analisar onde e como a educação esteve ainda mais relacionada ao cristianismo.

4.2. A EDUCAÇÃO CRISTÃ E OS PRIMÓRDIOS DO CRISTIANISMO

O cristianismo, segundo Cambi (2006), provocou uma profunda transformação cultural no mundo antigo, esta revolução caracterizada por uma nova visão de mundo, é também uma revolução pedagógica e educativa.

Trata-se da afirmação de um novo tipo de homem (igualitário, solidário, caracterizado pela virtude e pela humildade, do amor universal, da dedicação pessoal, como ainda, pela castidade e pela pobreza) que no âmbito religioso vem modelar toda a visão da sociedade e também os comportamentos coletivos, reinventando a família (baseada no amor e não apenas e, sobretudo na autoridade e no domínio), o mundo do trabalho (abolindo qualquer desprezo pelos trabalhos “baixos” manuais e colocando num plano de colaboração recíproca os patrões e os escravos, os serviçais, os empregados e os dependentes) e o da política (que deve inspirar-se, nos valores éticos – sociais de igualdade e solidariedade, devendo ver o soberano agir como um pai e um guia do povo, para dar vida a uma res publica Christiana) (CAMBI, 1999, p. 121).

Vemos desta forma que o cristianismo passa a influenciar completamente a sociedade do mundo antigo, introduzindo novos valores baseados nos ensinos de Cristo, e as consequências dessa revolução são perceptíveis no mundo atual, principalmente os valores concernentes ao tipo de homem (igualitário, solidário e humilde) como também a concepção de família.

Não se pode falar de cristianismo sem, no entanto, falar de Jesus Cristo. O qual, para Cambi (1999) fora um mestre-profeta, onde sua doutrina fora preservada através dos Evangelhos, juntamente com os Atos dos Apóstolos, as Epístolas Paulinas, e o Apocalipse de João, os quais guardam os magistérios de Cristo e da Igreja Apostólica.

Cristo, enquanto mestre possuía uma pregação que propunha uma “catástrofe interior, uma renovação espiritual, através de uma mensagem que inquieta e que desafia a tradição e a indiferença subjetiva” (CAMBI, 1999, p. 123). Havia desta forma, um desejo de transformação interna para que posteriormente essa transformação se externalizasse (BORGES, 2002). O amor é a chave mestra de toda educação cristã.

Nos evangelhos, Jesus é identificado como um rabi judeu que exerceu um ministério itinerante de pregação, ensino e socorro aos sofredores (Mt 4.23). Boa parte do material dos evangelhos é constituída de ensinamentos religiosos e éticos, nos quais Jesus se notabilizou pelo uso inteligente e criativo de uma grande variedade de recursos: ilustrações, símiles, dramatizações e as inconfundíveis parábolas. Seus seguidores mais próximos receberam a incumbência de utilizar o método educativo no cumprimento de sua missão: “Ide, fazei discípulos de todas as nações... ensinando-os a guardar todas as coisas que vos tenho ordenado” (Mt 28.19,20) (MATOS, 2008a, p. 11)

Jesus, portanto, possuía uma “metodologia de ensino” embora não sistematizada e teorizada, mas eficaz. Ansiava não só a transformação dos seus ouvintes, mas desejava que estes se tornassem também agentes de transformação. Retoma a proposta de santidade, reivindicada pelo Deus de Israel, e abraçando a todas as pessoas. “O cristianismo, portanto, inaugura-se já como um projeto educacional destinado, indistintamente, aos homens e mulheres de todas as raças, de todas as nações, e de todas as camadas sociais (BORGES, 2002, p. 37)”.14

O ensino dos seus seguidores é demonstrado nos livros subsequentes aos Evangelhos no Novo Testamento. Paulo, por exemplo, possui uma escrita mais sofisticada, algo que pode ser explicado porque era um hebreu romanizado, suas epístolas estão carregadas de teor pedagógico, incentiva a disciplina e a autoeducação como meio do ser humano controlar seus instintos e vencer a si mesmo. O espírito humano, segundo Paulo, se contrapõe a carne – a natureza pecaminosa do homem, aquela que o inclina para fazer o que é incorreto, o espírito deve consequentemente subjugar a carne (CAMBI, 1999). O ardor do trabalho educativo de Paulo, o fez responsável pela propagação do cristianismo para o povo não-judeu, sendo considerado pela tradição cristã “o Apóstolo dos gentios”; ensinou aos gregos a fé em Cristo. Assim a consequência de seu trabalho ultrapassa os limites geográficos e de tempo, chegando aos dias atuais (BORGES, 2002).

Em suma, a proposta cristã de educação propunha uma mudança interior, uma regeneração, por um método autoeducativo. O que não significava que outros tipos de aprendizagens (além da mudança de valores) deveriam ser desprezados; pelo contrário a absorção de outros conhecimentos torna-se útil para a propagação do cristianismo, como veremos adiante. A escatologia (doutrina das últimas coisas, tendo o Apocalipse como principal referência sobre “os tempos do fim”) fazia os cristãos olharem para além de seu tempo e desejarem uma remissão da humanidade por completo, inclusive,

não podemos deixar de afirmar que o projeto pedagógico da expansão cristã partia de uma filosofia humanista e igualitária, sustentando, pela primeira vez, que todos poderiam ter acesso ao saber, conquanto todos poderiam aprender e, conseqüentemente, almejar a “salvação” (NUNES, 2003 apud GROSS, 2006, p. 144)

Para isso, o domínio do conhecimento fazia-se necessário para a defesa da fé, além do combate as heresias.

A Igreja, entre a morte de Cristo e a aderência do Império Romano ao cristianismo por Constantino (272-337) através do Édito de Milão15, vinha desenvolvendo a sua prática educativa. E, após tornar-se a religião oficial do Estado, passa a intervir progressivamente nas questões administrativas o que acarretará, posteriormente, o domínio da Igreja sobre a cultura e sua ligação com o Estado (CAMBI, 1999).

Alguns grupos cristãos não “viam com bons olhos” a aderência do Estado ao cristianismo. Segundo Johnson (2001) muitas conversões ao cristianismo após o Édito de Milão, passam a ser insinceras, inclusive, a do próprio Constantino. Essa conciliação entre o cristianismo e o Império Romano intensificará o contato dos cristãos com a cultura helênica, e a influência desta sobre a cultura cristã.

Segundo Cambi (1999), todavia, embora o cristianismo absorvesse pricincipalmente a cultura intelectual presente no mundo greco-romano, utilizando-se da filosofia e retórica grega, ele não abandona o seu discurso sobre a “imitação de Cristo”. O Novo Testamento escrito em grego, seria, portanto, um bom exemplo da utilização da cultura grega para propagação do cristianismo.

Surge, ainda nesse período, o monasticismo. O mosteiro, de acordo com Cambi (1999) é o lugar onde residiam os monges, os quais se afastavam do restante da sociedade para dedicar-se a uma vida de meditação e contemplação na busca da disciplina espiritual e a perfeição na vida solitária, através da renúncia e da mortificação (a ascese). Além de se dedicarem ao trabalho e a contemplação, posteriormente, os monges passaram também a se dedicar aos estudos, incluindo as Sagradas Escrituras, a tradição dos padres, e os clássicos greco-latinos, os quais faziam parte da disciplina de leitura monástica, o que acarreta futuramente o monopólio da ciência e da cultura medieval pelos monges; o mosteiro, deste modo, torna-se um novo modelo de escola cristã, sendo uma de suas características a centralidade no magister.

4.2.1. A Paidéia Cristã

A palavra “Paidéia” é um conceito do ensino grego que propunha uma formação integral do ser humano. A Paidéia, portanto, possui origem grega, no entanto, a Paidéia Cristã, fruto da influência helênica sobre o cristianismo, é uma releitura da Paidéia grega. “Cedo no cristianismo evidenciou-se a necessidade de se estabelecer nexos entre fé cristã, conhecimento e educação, dentro do contexto de crer e aprender, e da integração da fé com o ensino” (GROSS, 2006, p. 143). Assim a releitura da Paidéia grega, nasce para fortalecer a defesa da fé cristã. Clemente de Alexandria (153-220), um dos responsáveis pelo aprofundamento da noção de Paidéia cristã, afirmava que esse desenvolvimento pleno do ser humano só se realiza através do cristianismo. Tal circunstância é explicada pelo fato de que, na Idade Antiga, muitos líderes cristãos receberam uma educação clássica nas escolas gregas, inclusive ainda

no final do 2º século, algumas escolas de catecúmenos começaram a expandir os seus currículos. Sob a influência da cultura predominante, surgiram estruturas educacionais mais complexas para pessoas de maior nível intelectual que queriam integrar o cristianismo com a tradição filosófica grega. No ano 179, a primeira escola catequética foi aberta por Panteno para a grande comunidade cristã de Alexandria, no Egito. [...] O currículo incluía a interpretação das Escrituras, a regra de fé (síntese das principais convicções cristãs em forma de credo) e “o caminho”, ou seja, um conjunto de instruções morais, como se pode ver na Didaquê. (MATOS, 2008a, p. 14)

A Escola de Alexandria é uma das primeiras escolas cristãs, Clemente e Orígenes (185-253) são os seus principais representantes, concebem o papel do educador como um guia espiritual e cultural que oferece instrumento para se chegar a “sapiência” e ao crescimento espiritual interior. Contudo, é com Basílio de Cesarea (329-379), Gregório de Nazianzo (330-389) e Gregório de Nissa (335-394) que será delineado o currículo da nova Paidéia cristã, através da produção de literatura propriamente cristã (CAMBI, 1999).

O relacionamento de culturas diferentes (helênica e cristã) produz, na verdade, uma mútua influência, principalmente no âmbito educacional (MATOS, 2008a). O cristianismo propaga no mundo antigo uma nova cosmovisão e absorve a cultura intelectual, deste modo para os cristãos da época, o cristianismo deveria nutrir-se da cultura greco-romana e superá-la.

4.2.2. A Patrística

A patrística constitui-se de um sistema filosófico desenvolvido entre os séculos II e V, período esse em que também se desenvolve o conceito de Paidéia Cristã. Seu principal objetivo era a apologética - a defesa da fé, e conversão dos não-cristãos. Dentre seus representantes estão Clemente de Alexandria, Orígenes e Tertuliano (160 - 220), mas, seu principal foi Agostinho de Hipona (354 - 430).

Clemente, nascido em Atenas, e embora educado na filosofia grega, converteu-se ao cristianismo. Escreveu “O Pedagogo” (ou O Educador) (ROSA, 1971), onde apresenta Jesus como um mestre diferente dos gregos, ele é um modelo, onde os alunos podem encontrar a referência de exortação, preceito, a correção e o amor. Jesus visava, enquanto mestre, uma organização da vida levando o homem a um estado de espírito satisfatório e belo (BORGES, 2002). O Pedagogo pode ser, inclusive, considerado o primeiro tratado da educação cristã, apresentando Deus como “o Pedagogo do homem” (ROSA, 1971).

Quanto a Agostinho, monge e defensor da “ascese”, seu pensamento influenciará a postura do cristianismo frente à cultura e ao processo educativo por muitos séculos, possuindo influência, inclusive, ainda nos dias atuais (BORGES, 2002). Seu pensamento caracterizava-se, dentre outros aspectos, pela reinvenção dos princípios da filosofia platônica no cristianismo (o inatismo da verdade; o dualismo alma/corpo; a ascese ética e mística). Defendia que a razão e a fé estavam intimamente ligadas (CAMBI, 1999), buscando dessa forma, uma harmonização entre ambas, a fim de conhecer a natureza de Deus e da alma (ARANHA, 2006). Cambi (1999) relata que Agostinho incentivava a busca de conhecimento além do religioso, porém resguardando o objetivo de utilizar-se do conhecimento não-religioso para propagação do cristianismo. A prova disso é que não priva seu filho Adeodato da instrução secular (ROSA, 1971).

Para Agostinho

[...] o ser humano recebia de Deus o conhecimento das verdades eternas, o que não significa desprezar o próprio intelecto, pois como o sol, Deus ilumina a razão e torna possível o pensar correto. O saber, portanto, não é transmitido pelo mestre ao aluno, já que a posse da verdade é uma experiência que não vem do exterior, mas de dentro de cada um. Isso é possível por que “Cristo habita no homem interior”, Toda educação é, dessa forma uma auto-educação, possibilitada pela iluminação divina (ARANHA, 2006, p. 114).

O pensamento de Agostinho segue o princípio bíblico que o conhecimento provém de Deus, no entanto, o homem deve ser instigado a procurá-lo, Deus daria condições ao homem para encontrar a sabedoria, a autoeducação e a disciplina permanecem como características do cristianismo. Essa autoeducação é, inclusive, citada pelo Apóstolo João em uma de suas epístolas: “E a unção que vós recebestes dele fica em vós, e não tendes necessidade de que alguém vos ensine; mas, como a sua unção vos ensina todas as coisas, e é verdadeira, e não é mentira, como ela vos ensinou, assim nele permanecereis (1 João 2:27)”. A unção recebida, de que fala João refere-se à própria presença de Deus, onde concorda Agostinho, ao afirmar que Cristo habita no homem interior.

Suas obras o levam a ser reconhecido como “o mestre do ocidente cristão”, pois, “preocupava-se em descobrir quais os fundamentos do conhecimento” (BORGES, 2002, p. 42), assim “investigou os aspectos fundamentais de uma pedagogia de estatuto religioso e lhe deu soluções exemplares: pela espessura cultural, pelo vigor teórico e também pelo significado espiritual” (CAMBI, 1999, p. 135).

Borges (2002) ainda considera que para ele ainda, a educação é essencial para desenvolver as potencialidades mais elevadas do ser humano, criado a imagem e semelhança de Deus; o conhecimento deve objetivar uma verdadeira sabedoria, capaz de tornar feliz aquele que a possui e a cultiva. O ser humano possuiria, portanto, uma necessidade de completude que só pode ser preenchida em Deus, essa necessidade o impulsionaria a buscar Deus, e essa busca, por sua vez, é o ponto de partida para o verdadeiro conhecimento.

4.3. A EDUCAÇÃO CRISTÃ NA IDADE MÉDIA

Conhecida como “Idade das Trevas” por muitos, isso por ser considerada um período de retrocesso cultural, a Idade Média constituiu-se um período de aproximadamente mil anos, onde a religiosidade na cultura ocidental era intensa. Sua longa duração a torna um período de diferentes momentos, portanto, sua caracterização não é simples. A alcunha de Idade das Trevas é rejeitada pela maioria dos historiadores, pois, surgiram nessa época muitas inovações que estão presentes no nosso dia-a-dia, como o relógio mecânico, os bancos, a imprensa e as universidades (MOTA e BRAICK, 2002).

No início da Idade Média, a Europa passa por profundas transformações. Com a queda do Império Romano e o desenvolvimento da sociedade feudal a Igreja tinha um papel agregador, onde inclusive os reis convertiam-se ao cristianismo para receber seu apoio.

Apesar dessa instabilidade e turbulência desde o início da Idade Média, a herança cultural greco-latina foi resguardada nos mosteiros. Os monges eram os únicos letrados, porque os nobres e muito menos os servos sabiam ler. Podemos então compreender a influência que a Igreja exerceu não só no controle da educação, como na fundamentação dos princípios morais, políticos e jurídicos da sociedade medieval (ARANHA, 2006, p. 104).

Para Cambi (1999, p. 163), “A reflexão pedagógica medieval permanece toda inserida dentro da Paidéia cristã, da qual ela acentua a dimensão religiosa reunida em torno da figura de Cristo”. Na Idade Média, mais do que em qualquer outro momento, a educação esteve fortemente ligada à fé, isso porque com o passar do tempo a Igreja torna-se detentora da cultura intelectual, e responsável pelo ensino.

4.3.1. As Escolas Monásticas

Manacorda (2010) relata que no início Idade Média, a escola clássica desaparece paulatinamente e surge a escola cristã. Ainda assim, o nível cultural era baixo inclusive entre os clérigos, alguns sabiam se quer ler. Tal fato leva o Concílio de Roma (465 d. C) a proibir a ordenação de analfabetos, quem quisesse ser monge deveria, portanto, conhecer as letras. Tal medida com o passar do tempo, acaba por conferir maior competência ao mosteiro na dedicação do ensino, principalmente na educação de crianças, cujos pais anelassem para estas, o sacerdócio. Destarte, o monasticismo intensifica seu papel na responsabilidade da educação.

Segundo Aranha (2006), o monaticismo, é uma prática que possuirá importante influência sobre a educação medieval. Entretanto,

[...] criar escolas não era a finalidade principal dos mosteiros, mas a atividade pedagógica tornou-se inevitável à medida que era preciso instruir os novos irmãos. Surgiram então, as escolas monacais (nos mosteiros) em que se aprendiam latim e as humanidades. Os melhores alunos coroavam a aprendizagem com o estudo da filosofia e da teologia (ARANHA, 2006, p. 106)

Podemos perceber que no intuito de orientar os novos integrantes do mosteiro, o ensino era essencial, mas o principal objetivo era a formação religiosa. Destarte, essa necessidade de ensinar aos novos irmãos acarretará o desenvolvimento de técnicas para a aprendizagem, que se estende desde os métodos de discussão e estudo de textos, até a organização do ambiente de ensino (MANACORDA, 2010).

A sinagoga judaica, como espaço de ensino, serve de inspiração para as escolas monacais, principalmente em relação ao método de memorização e aculturação das tradições práticas, como também o princípio de acesso ao ensino às camadas populares,

O cristianismo, fundado na tradição hebraica, marca uma nítida separação da antiga tradição que excluía as classes populares da instrução. [...] Caracterizava uma nova atitude mental: todos deviam ser, se não cultos, pelo menos aculturados (MANACORDA, 2010, p. 145).

A preocupação primordial dos mosteiros é com a educação moral, a participação na liturgia e um pouco de instrução literária, esta última promovida através de um método mnemônico. O ensino no mosteiro destaca a centralidade ao mestre, ao qual cabia falar, e o discípulo ouvir. Havia punições para os monges adultos, que iam da advertência secreta à expulsão do convento, no entanto, os velhos e as crianças, recebiam um cuidado mais afetuoso, ainda que as crianças também fossem punidas fisicamente diante do erro, isso por serem consideradas inferiores intelectualmente. Embora houvesse uma severidade em relação ao erro dentro do mosteiro, nos demais momentos a relação afetuosa era presente. O trabalho também era incentivado, assim como o ócio era condenado; muitos monges, inclusive, eram artesãos (MANACORDA, 2010).

Por conta do controle sobre a cultura intelectual, o clero veio a ser utilizado nas atividades administrativas estreitando a aliança Igreja-Estado. Um exemplo dessa aliança ocorre no Renascimento Carolíngio16.

“O imperador Carlos Magno buscou revigorar a educação durante o seu longo reinado, com o auxílio do intelectual inglês Alcuíno de York. Entre outras medidas, foi executado um plano no sentido de estabelecer uma escola em cada cidade” (MATOS, 2008a, p. 15). Surge, deste modo, a escola palatina, sede de um novo movimento de difusão dos estudos que visava a reestruturação e fundação de escolas monacais (nos mosteiros), escolas catedrais (ao lado das igrejas), e as escolas paroquiais (de nível elementar). Quanto ao currículo, era compreendido pelo trivium (três vias) - gramática, retórica e dialética, correspondendo ao ensino médio; e o quadrivium (quatro vias) – geometria, aritmética, astronomia e música (o ensino superior). Vemos assim, nesse momento, a organização das escolas sempre ligadas às instituições religiosas.

4.3.2. O Surgimento das universidades

Ainda na Idade Média nascem as universidades, o termo era utilizado inicialmente para se referenciar qualquer assembleia corporativa, no entanto a universidade de mestres e estudantes surge da influência da classe burguesa desejosa de ascensão social (ARANHA, 2006). Mas é através do trabalho dos mestres livres, os quais ensinavam fora das escolas episcopais, ainda que sob a tutela da Igreja, que, segundo Manacorda (2010) provavelmente tenham nascido as universidades.

Inicialmente três campos de conhecimento compreendiam o ensino na universidade: as artes liberais, medicina e a jurisprudência; esta última inclusive incluía o direito canônico. Posteriormente, por solicitação do Papa Inocêncio III, acrescenta-se a teologia, ensinada pelos dominicanos, formando assim as quatro faculdades típicas das universidades medievais (MANACORDA, 2010). A teologia, desde já fazia parte do interesse de estudos daquela sociedade, e “a partir das escolas das catedrais, surgiram no século 12 as primeiras universidades, como as de Paris, Oxford e Bolonha (MATOS, 2008a, p. 15)”. À medida que aumentava a importância da universidade, aumentava o controle dos reis e da Igreja sobre elas. “As universidades, apesar de suas características próprias, são uma corporação eclesiástica, que visa o monopólio cultural da Igreja, quer de forma direta, quer indiretamente” (COSTA, 2008, p. 29).

Segundo Aranha (2006), no século XIV as universidades entram em decadência, sufocada pelo dogmatismo, devido à ausência de debate crítico, da observação e da experimentação.

4.3.3. A Escolástica

A escolástica representa a alta expressão da filosofia cristã (ARANHA, 2006). Desenvolvida entre os séculos IX e XIV, possui seu apogeu no século XIII e começo do XIV. Era uma filosofia “estimuladora de um pensamento original, porém obediente as leis da razão” (CAMBI, 1999).

O cristianismo, ainda no seu anseio pela defesa da fé, permanece se utilizando da educação, entretanto, em circunstâncias diferentes de outrora. Desse modo, a cultura do mundo clássico conserva-se no ensino da Idade Média, apenas com um valor instrumental (MANACORDA, 2010).

Na escolástica o ensino religioso não se separava do conceito de educação, possuía um método de ensino constituído pelas etapas: a leitura (lectio), o comentário (glossa), as questões (quastio), e a discussão (disputatio) (ARANHA, 2006). O método era formalizado, e o conteúdo era baseado nas crenças. Para a escrita era utilizado o productalis, “espécie de tabuinha em que estão traçadas as letras que a criança deve copiar, ou o modelo traçado pelo mestre” (MANACORDA, 2010, p. 154). No entanto, entre os monges ermos e cenóbios encontram-se “testemunhos de uma aprendizagem ‘global’ das crianças que aprendiam a ler e a escrever sem conhecer antes o alfabeto ou a ordem das letras, só observando as escrituras ou talvez as didascálias sob as imagens sagradas” (MANACORDA, 2010, p. 154).

Para a argumentação da fé, a Igreja utilizava-se da lógica aristotélica, portanto, o princípio de que a razão deve estar a serviço da fé, assim como na patrística, permanece. Não convindo impor a crença, era necessário um trabalho de argumentação sustentado por um sistema lógico de exposição e defesa dos pontos de vista. No entanto, devido o temor as heresias as discussões não eram aprofundadas, e diante dos pontos difíceis de entender, caberia respeitar os sábios e intérpretes da Igreja, evitando a pluralidade de interpretações – era o chamado Princípio da Autoridade, uma forte expressão do controle e acesso cultural da época, pela Igreja (ARANHA, 2006).

Seu principal representante foi Tomás de Aquino, monge dominicano e mestre em Teologia, “sumo doutor da escolástica, sintetizou suas teses num organismo filosófico inspirado nos princípios do racionalismo aristotélico, que funcionam como critérios de compreensão e justificação de toda a metafísica cristã” (CAMBI, 1999, p. 188) sua obra mais famosa foi Suma Teológica, justamente na qual se usa da lógica aristotélica, defendendo que a razão é o principal meio de se chegar à verdade (ROSA, 1971). Para ele “[...] a educação é uma atividade em potencial. Assim, nada mais é do que a atualização das potencialidades da criança, processo que o próprio educando desenvolve com o auxílio do mestre” (ARANHA, 2006, p. 116).

O ensino de Tomás de Aquino fundamenta-se na existência de Deus, um ser cognoscente e ordenador de todas as coisas. A educação consiste em um meio de superar as dificuldades causadas pelo pecado. A ordem do universo se deve a essa inteligência, e o ser humano faz parte da essência de Deus, portanto, seu aperfeiçoamento estaria em buscar o caráter divino, desse modo a ética é a base da metafísica tomista, o que acaba fornecendo elementos para

uma pedagogia como um instrumento para realizar o que pede a natureza humana. “O bem objetivo, único capaz de proporcionar à natureza humana a felicidade perfeita, é Deus. A razão, secundada pela revelação, mostra o caminho que se deve seguir para alcançá-lo (COSTA apud ARANHA, 2006, p. 116-117)

Embora o cristianismo medieval primasse pelo saber, ainda que este estivesse a serviço da fé, o controle desse saber, devido o temor às heresias, sufoca o debate crítico. Apesar dos clérigos não negarem a sua fé diante do acesso aos conteúdos não cristãos, mesmo assim, vedavam esses conteúdos ao restante da população, vale ressaltar também que com o passar do tempo a Igreja passou a vedar o acesso a própria Escritura Sagrada, como relata Borges (2002, p. 44):

[...] a Igreja Cristã, afastando-se dos ensinos do Evangelho, negligenciou não só a educação popular, como a educação do próprio clero. Aquele ideal de piedosa sabedoria, defendido pelos apologetas, perdeu-se num passado remoto, e as trevas da ignorância dominaram, juntamente com um clero soberbo e indiferente aos ideais de Jesus Cristo e às necessidades do povo.

Segue-se, desse modo, um histórico de incoerências dentro da Igreja Cristã, as Cruzadas, a Inquisição, as indulgências, são exemplos de abusos cometidos pela Igreja. Assim sendo, tal quadro só transformará com a Reforma Protestante.

4.4. REFORMA PROTESTANTE E CONTRARREFORMA

A Reforma Protestante foi um movimento intelectual religioso iniciado no século XIV que provocou profundas transformações no mundo europeu. Tal movimento contestava a autoridade do Papa e da Igreja (ROSA, 1971), assim como o seu papel de mediadora entre os homens e Deus.

De acordo com Aranha (2006, p. 127),

a Reforma Protestante criticava a Igreja medieval e propunha o retorno às origens, pela consulta direta ao texto bíblico sem a intermediação dos padres, estabelecida pela tradição católica. No plano religioso surgia a característica humanista de defesa da personalidade autônoma, que repudiava a hierarquia para restabelecer o vínculo direto entre Deus e o fiel. Ao dar iguais condições de leitura e interpretação da Bíblia a todos, a educação tornou-se importante instrumento para a divulgação da reforma.

Os predecessores da Reforma ou os pré-reformistas foram o inglês John Wycliffe (c. 1330-1384) e Jan Huss (c. 1370- 1415) natural da Boêmia; ambos criticavam em suas respectivas épocas a postura da Igreja Católica frente às concepções de salvação, e a corrupção do clero, defendendo a obediência aos textos sagrados (MOTA e BRAICK, 2002).

A importância desse acontecimento histórico para educação é inegável. Mais do que nunca, no período da Reforma Protestante, a educação foi considerada importantíssima para a formação da Imago Dei (BORGES, 2002). Como descreve Aranha (2006), a crítica à Igreja Católica reivindicava o acesso direto à Bíblia, no entanto, para que assim fosse, era necessário que a população soubesse ler; deste modo, a Reforma “renovou o interesse pela educação dos povos, alterando a história da educação e da própria civilização” (BORGES, 2002, p. 45), pois promovia a “difusão da instrução a fim de que cada um pudesse ler e interpretar pessoalmente a Bíblia sem mediação do clero” (MANACORDA, 2010, p. 238).

Desde os prenúncios da Reforma, Wycliffe já desejava que cada um se tornasse um teólogo; e Huss, por sua vez, contribuiu grandemente para alfabetização do povo. Destarte, a Reforma, posteriormente, promoveu a luta pela instrução popular e a democracia (MANACORDA, 2010). A preocupação dos reformistas com a instrução era tão intensa, que depois, o próprio futuro Papa Pio III chegou a afirmar: “aquela infiel progênie humana pelo menos tem uma boa qualidade: ama a instrução” (MANACORDA, 2010, p. 239).

Os protestos de Wycliffe, na Inglaterra, e de Huss, na Boêmia, juntamente com a corrupção do clero e o desenvolvimento do espírito crítico, foram os motivos determinantes para a Reforma (ROSA, 1971), a qual se consolida apenas um século depois, tendo o seu estopim com a publicação das 95 teses de Martinho Lutero (1483-1546), as quais foram pregadas na porta da Igreja de Wittenberg, na Saxônia, onde criticava o papado e seus abusos, dentre os principais: as indulgências em troca de ofertas. Tal fato levou Lutero a ser excomungado da Igreja Católica, desencadeando o surgimento das Igrejas Protestantes (MOTA e BRAICK, 2002).

O movimento reformista resgatou os princípios do cristianismo primitivo, bem como a importância dada à educação, possuindo personalidades e grandes educadores cristãos como: o próprio Lutero, Felipe Melanchton e João Calvino, os quais merecem, inicialmente, destaque em suas contribuições para educação.

Matinho Lutero foi um monge agostiniano, nascido na Saxônia. Defendia a salvação pela fé, na medida em que condena a salvação pelas obras, todavia, cabe ao cristão uma vida de boas obras cumpridas espontaneamente por amor; para ele, a religião é uma vida e não uma ciência (ROSA, 1971). Segundo Borges (2002), aos publicar suas teses, provoca drásticas mudanças no cristianismo. A Igreja havendo restringido a interpretação das “Escrituras Sagradas” ao clero, vedava a população o conhecimento da principal fonte de informações de sua fé. Criticando, desse modo, a mediação da Igreja, defendia a autonomia de cada ser humano frente às questões espirituais. A conquista dessa autonomia, por sua vez, requer um processo educativo, destarte, aprender a ler é crucial para que o povo venha entender por si mesmo a escritura, fazendo assim consonância com o pensamento de Huss e de Wycliffe.

Lutero também valorizava todo tipo de instrução, inclusive o conhecimento secular, visto que, em seu país

[...] deu impulso prático e força política à programação de um novo sistema escolar, voltado também à instrução de meninos destinados não a continuação dos estudos mas ao trabalho. “mesmo se não existisse nem alma nem inferno – escrevia ele –, deveríamos ter escolas para as coisas deste mundo” (MANACORDA, 2010, p. 240-241).

Sua visão sobre a educação possui influência no processo educacional até os dias atuais, como, por exemplo, a organização da escola em três ciclos de ensino (fundamental, médio, e superior) e o princípio de ensino útil, os quais são características de seu pensamento (FERRARI, 2008b), como também, o anseio por um ensino universal e público, sob a responsabilidade do Estado (ARANHA, 2006).

Enaltecia o papel social da escola, e tecia críticas contra a falta de investimentos na educação, inclusive, assegura que o dinheiro ao ser investido na educação traria menos custos do que em armas, e muito mais benefícios. Afirmava que a força e a prosperidade de uma cidade dependem de ter cidadãos instruídos, cultos, honestos e racionais. Para tanto, defendia ele, que era necessário investir na educação desde a tenra infância (MANACORDA, 2010), segundo ele “não há outra forma que pese tanto diante de Deus e que mereça maior castigo do que negligenciar a educação das crianças” (GILES, 1987 apud BORGES, 2002, p. 46).

Dentre outras características do seu pensamento sobre a educação, Lutero: criticava o uso de castigos e o verbalismo da escolástica; incentivava jogos, exercícios físicos, música; como também, valorizou os conteúdos literários e o estudo de história e matemática (ARANHA, 2006); inovou ao admitir mulheres no magistério (BORGES, 2002); dava igual valor ao trabalho intelectual e manual; e chamava à responsabilidade os pais, os quais deviam incentivar os filhos a irem para escola.

Lutero defendeu também um projeto de uma escola nova, que realizasse um programa educativo em três anos, criticando a educação tradicional, que para o mesmo programa exigia uma vida inteira (MANACORDA, 2010).

Como podemos perceber, sua preocupação com a educação era intensa, mas todo o seu pensamento educacional estava a serviço de sua fé, e por conta disso foi muito criticado por sua visão extremamente cristã, no entanto, suas contribuições foram de grande importância para o sistema educacional da Alemanha, o qual serviu de modelo para as nações modernas (MOSER, 2011).

Felipe Melanchton (1497- 1560) foi um grande colaborador de Lutero na implantação da escola primária para todos (ARANHA, 2006), elaborou códigos escolares e atuou como conselheiro educacional, sendo conhecido como “O Mestre da Germânia” (BORGES, 2002). Para Manacorda (2010) Melanchton é o espírito mais genuíno da Reforma, pois defendia uma pedagogia serena e humana.

João Calvino (1509 - 1564) foi um teólogo francês de formação humanista e convertido ao luteranismo em 1530 (MOTA e BRAICK, 2002), considerava impossível separar a questão educacional da questão teológica, fundou a Universidade de Genebra, e para ele, a Igreja além de ser uma comunidade de fé e adoração, também era uma comunidade de ensino (BORGES, 2002). Nas suas críticas à Igreja Católica afirma que não existe fé onde não haja conhecimento, manter o povo na ignorância afastando do ensino da “Palavra de Deus” é uma atitude anticristã (COSTA, 2008).

Assim como Lutero apoiava o ensino secular, porém, sempre focalizando sua utilidade para o “Reino de Deus”. Não existe, todavia, para ele, distinção entre os saberes mundanos e sagrados, todo verdadeiro conhecimento leva o homem a Deus, como afirma Borges (2002, p. 47), para Calvino “[...] não há distinção ou hierarquia de valores entre o estudo de línguas, história, ciência ou religião, porque todo ensino visa o aperfeiçoamento do ser humano para o cumprimento de sua vocação”; inclusive “os homens que possuem conhecimento científico podem penetrar mais detalhadamente nalguns segredos da sabedoria divina” (FERREIRA, 1985 apud BORGES, 2002, p. 48).

Como já comentado, Calvino fundou a Universidade de Genebra, a qual possuía em seu currículo as disciplinas de teologia, hebraico, grego, filosofia, matemática e retórica, assim como eram estudados textos de autores gregos e latinos, dentre eles Heródoto, Xenofonte, Homero, Demóstenes, Plutarco, Platão, Cícero, Virgílio e Ovídio. Entre os reformadores, compreendeu amplamente a abrangência das implicações do evangelho na vida humana, afirmava que “o Evangelho não é uma doutrina de língua, senão de vida”. Portanto, não se podia compreendê-lo somente pelo uso da razão, para assimilá-lo na sua forma total deveria ser compreendido pela a alma e penetrar no mais íntimo do coração (COSTA, 2008).

4.4.1. Educação Cristã pós-Reforma

A Reforma Protestante, portanto, transforma a cosmovisão cristã, ou melhor, faz um clamor para que ela volte às suas origens. Embora inicialmente fosse uma proposta de renovação da Igreja Católica, nasce uma nova Igreja que assume uma luta contra a ignorância, levando os reformadores a sistematizarem e organizarem o ensino, e ansiarem a implantação de escolas em todos os lugares possíveis (BORGES, 2002).

A Reforma Protestante foi fundamental para o avanço educacional do Ocidente. [...] e foi com o pietismo (luterano) que a prática da leitura se difundiu amplamente na Alemanha. Mais à frente [...] a leitura e posse de livros se tornaram mais evidentes nos países protestantes (COSTA, 2008, p. 42)

Na Nova Inglaterra (atuais Estados Unidos), o puritanismo inglês, baseado no movimento calvinista, demonstrava grande interesse pela regulamentação escolar, seis anos após a chegada dos colonizadores, fundam a faculdade Harvard (BORGES, 2002). “Os estudantes ministeriais em Harvard não apenas aprendiam a ler a Bíblia na sua língua original e a expor teologia, mas também estudavam matemática, astronomia, física, botânica, química, filosofia, poesia, história e medicina” (COSTA, 2008, p. 44-45). O puritanismo, contribuiu significativamente para o processo educacional na América do Norte, os puritanos percebiam a vida e a sociedade de uma maneira integrada, onde a educação era fundamental, criaram assim diversos colégios dentre eles Harvard, como já citamos anteriormente, e Yale, hoje famosas universidades (MATOS, 2008a).

“Após a Reforma Protestante a educação nunca mais foi a mesma” (BORGES, 2002, p. 49), pois, torna-se prioridade para a Igreja, embora a Igreja valorizasse a mais alta erudição não desprezava a educação popular, ao contrário, o princípio de educação universal é reafirmado, chamando a Igreja à responsabilidade do ensino, pois “a finalidade última do cristianismo, tal como se revela no Sagrado Volume e manifesta-se nas páginas da História, consiste em educar a humanidade” (GILES, 1987 apud BORGES, 2002, p. 54).

O resultado dessa preocupação com a educação, faz surgir dentro da nova Igreja diversos educadores como: François Rebelais, Valentino Andreae, João Amós Comênio, Augusto Herman Frank, John Lock, Joham Heinrich Pestalozzi, Friedrich Wilhelm August Froebel, Andrew Bell e Joseph Lancaster, os quais concordam com os apologetas da Igreja do primeiro século que a verdade vem de Deus, onde quer que seja encontrada, e pertence a Igreja. A sacralização do saber, próprio do cristianismo, se reafirma como próposito de busca pela santidade prática, onde tudo o que o homem faça, deveria ser feito para Deus; o amor – atitude fundamental para a santidade – é aquilo que liga o processo educativo ao cristianismo, fazendo assim consonância com os princípios da educação hebraica, e do Novo Testamento (BORGES, 2002).

Desse modo, é importante ressaltar que a sistematização do ensino, proposto por esses educadores cristãos pós-reformistas, influenciaram grandemente o desenvolvimento da ciência da educação.

4.4.2. A Contrarreforma

A Contrarreforma, conhecida também como Reforma Católica, aconteceu como resposta da Igreja Católica frente à Reforma Protestante na defesa do catolicismo, através também de uma orientação educativa, fixada no Concílio de Trento (1545-1564) (MANACORDA, 2010).

O Concílio condenou a publicação de livros e principalmente sem a aprovação de algum clérigo, como proteção à “maldade herética”. Providenciou a reorganização das escolas católicas, investindo na formação do clero, e aprovando propostas para a fundação de seminários de teologia (MOTA e BRAICK, 2002). A formação dos Jesuítas e suas escolas, estruturada nesse concílio, torna-se forte arma contra o protestantismo (MANACORDA, 2010).

Como um meio de contenção da Reforma Protestante, as ordens religiosas são de fundamental importância para a sustentação do cristianismo católico, uma dessas principais ordens é a Companhia de Jesus – os jesuítas, fundada por Inácio de Loyola (1491-1556). Os jesuítas eram padres que se misturavam aos fiéis a fim de propagar a fé católica, e para que isso ocorresse, a criação de escolas tornou-se fundamental instrumento. Para Moser (2011, p. 98),

os jesuítas foram o primeiro grupo organizado a tentar sistematizar a educação, e aqueles que estudam nessas escolas, ainda hoje existentes, possuem características interessantes e inegáveis de seus fundadores. Com o tempo, a Sociedade dos Jesuítas, junto com suas ideias de educação, foi estendida para a maioria dos países da Europa. [...] A educação jesuítica procurou desenvolver não só os aspectos religiosos, mas também a potencialidade das pessoas.

Os jesuítas espalharam-se pelo mundo e sua influência sobre a ação pedagogia perdurou muitos anos. Foram inclusive, os primeiros educadores do Brasil (ARANHA, 2006). A formação do mestre jesuíta era rígida e uniforme, uma vez que a Ratio Studiorum regulamentava rigorosamente o sistema escolástico de ensino jesuítico (MANACORDA, 2010).

4.4.3. João Amós Comênio e a Didática Moderna

Conhecido como Pai da Didática Moderna, João Amós Comênio (1592-1670), foi um pastor protestante e educador cristão, que contribuiu grandemente para sistematização de métodos de ensino.

Contemporâneo a um período onde o método passa a ser valorizado, Comênio defende uma pedagogia do aprender fazendo, assim como um escultor aprende a esculpir esculpindo, e um pintor pintando. Deste modo defende a experimentação, influenciado pela nova concepção de ciência da Idade Moderna (MANACORDA, 2010). É também, o primeiro a conceber uma ciência da educação (PIAGET, 2010). Pode ser, inclusive, segundo Piaget (2010, p. 18) “considerado um dos precursores da ideia da genética na psicologia do desenvolvimento e o fundador de uma didática progressiva ajustada ao estágio de desenvolvimento que o aluno alcança”, trazendo grandes contribuições para educação infantil.

No âmbito religioso, Comênio via a educação não como um meio de superar as deficiências causas pelo pecado, embora, este tenha multiplicado a necessidade de educação no homem. Antes mesmo de pecar, o homem já possuía o desejo de aprender, o qual era suprido pelo próprio Deus, pois, como consiste em um ser criado, não tinha consciência da eternidade, portanto, a vida na Terra seria nada mais que uma escola para a vida eterna. E assim, como é típico da visão cristã sobre a educação, a ciência não poderia estar separada da moral:

Que é a ciência sem a moral? Quem progride na ciência e regride na moral anda mais para trás do que para a frente [...]. A ciência não deve juntar-se a libertinagem, mas a virtude, para que uma aumente o brilho da outra. E, quando uma e outra se junta a uma piedade verdadeira, então a perfeição será completa. De fato o temor de Deus, da mesma maneira que é o princípio e o fim da sabedoria, é também o cume e a coroa da ciência, porque a plenitude da sabedoria consiste em temor ao Senhor (Comênio, 1996 apud BORGES, 2002, p. 66).

O ensino universal, também marca sua teorização pedagógica, seu principio máximo era “ensinar tudo a todos”, a base desse princípio constitui-se na própria fé professada por Comênio, onde Deus não privilegiava certo tipo de pessoas, de tal modo, tanto o rico, como o pobre, os nobres, os plebeus, os rapazes e as moças tinham o direito de acesso à escola (ARANHA, 2006); Comênio, para alcançar o objetivo da exortação de Jesus Cristo: “ide e ensinai a todos os povos”, ansiava por “uma escola para vida toda (desde o seio materno até a morte)” (MANACORDA, 2010, p. 269).

Na sua fundamentação da didática criticava a memorização de textos e as respostas prontas; os alunos deveriam ser motivados a pesquisar sobre sua realidade (e a “realidade divina”), a pensar por si mesmas de maneira profunda descartando a superficialidade; cabia ao professor despertar os seus desejos em aprender; e, jamais obrigá-los a estudar, apresentar o conhecimento fragmentado, ou grande quantidade de conteúdo e tarefas, respeitando sempre a fase de desenvolvimento de cada um. Segundo Comênio deve-se ensinar com poucas regras em poucas palavras e de forma clara; a aprendizagem ocorre eficazmente através da experiência, e o ensino através do exemplo, principalmente a educação moral, a qual é indispensável para o desenvolvimento integral do ser humano (BORGES, 2002).

O ensino não deveria ser feito de forma vazia, ou seja, apenas ensinar por ensinar, mas, propunha um ensino que valorizasse o que serve para vida, estabelecendo conexões para aprendizagem a partir daquilo que já é conhecido do aluno, para o desconhecido, do simples para o complexo, do concreto para o abstrato; como também a autonomia do aluno o qual não era visto apenas como um espectador deste mundo, mas, um ator (ARANHA, 2006). A atividade física e o lúdico também poderiam fazer parte da aprendizagem, assim como a pedagogia sadista deveria ser anulada (FERRARI, 2008a).

Sua fundamentação está exposta na Didática Magna, sua principal obra, na qual, objetivando tornar o ensino mais eficaz e atraente, organizou métodos para atingir esse objetivo. Interessava-se grandemente na formulação de manuais, compêndios e dicionários a fim de sistematizar o saber (MANACORDA, 2010).

No livro [Didática Magna], [...] realiza uma racionalização de todas as ações educativas, indo da teoria didática até as questões do cotidiano da sala de aula. A prática escolar, para ele, deveria imitar os processos da natureza. Nas relações entre professor e aluno, seriam consideradas as possibilidades e os interesses da criança. O professor passaria a ser visto como um profissional, não um missionário, e seria bem remunerado por isso. E a organização do tempo e do currículo levaria em conta os limites do corpo e a necessidade, tanto dos alunos quanto dos professores, de ter outras atividades (FERRARI, 2008a, p. 1).

A responsabilidade da educação cabe a toda sociedade, e assim como Lutero afirmava que o Estado deveria investir na escola; os pais e a Igreja são também peças fundamentais no processo educativo. Sobre esse compartilhamento da responsabilidade, é interessante destacar que considerava que o ensino oferecido na Igreja e na família era insuficiente para a formação do cristão, assim como o ensino oferecido na escola era insuficiente para a formação integral do ser humano (BORGES, 2002), portanto, as ações educativas de cada instituição social se complementam.

Para Aranha (2006) e para Piaget (2010), o pensamento de Comênio, possui um caráter inovador, onde os princípios de democracia no ensino, e desejo de ensinar tudo a todos, contém um teor bem atual. Já Manacorda (2010), não o vê como um revolucionário, pois estava repleto de saudosismos medievais, ressalta que Comênio foi um grande sistematizador atrasado e utopista. Borges (2002) pondera que Comênio, apesar de suas grandes contribuições para a pedagogia, possuía alguns pensamentos contraditórios, dentre eles, desconsiderar as individualidades humanas, e desencorajar o contato do professor com os alunos fora da sala de aula, no entanto, suas contribuições ofuscam suas deficiências.

4.5. A RELAÇÃO ENTRE CRISTIANISMO E EDUCAÇÃO NO BRASIL

4.5.1. Os Jesuítas

A Companhia de Jesus fundada em 1534, e aprovada pelo Papa Paulo III em 1540, chegou ao Brasil no ano de 1549 (MOSER, 2011). Foi enviada ao Brasil Colônia junto com outras ordens religiosas, como os franciscanos, os carmelitas, e os beneditinos, “com a finalidade principal de converter o gentio e impedir que os colonos se desviassem da fé católica, conforme as orientações da Contrarreforma” (ARANHA, 2006, p. 139).

Portanto, como já afirmado, os jesuítas foram os primeiros educadores do Brasil, sua influência na educação brasileira perdurou por mais de duzentos anos. Segundo Aranha (2006, p. 140) “[...] promoveram maciçamente a catequese dos índios, a educação dos filhos dos colonos, a formação de novos sacerdotes e da elite intelectual, além do controle da fé e da moral dos hábitos da nova Terra.”

No entanto, a preocupação primordial da metrópole ao permitir que os jesuítas fossem para a colônia não era a fim de promover pessoas pensantes através do ensino, visto que a coroa portuguesa, não queria que a colônia se tornasse independente. Por esse motivo suas atividades centravam-se em catequizar os índios e educar a elite (MOSER, 2011).

Dois períodos dividem o período de permanência dos Jesuítas no Brasil: a fase heróica, onde os jesuítas tentavam catequizar os índios através da pregação, entrando em grandes atritos com os pajés, os quais possuíam bastante influência sobre a tribo e rejeitavam os ensinamentos dos padres; por conta disso, os jesuítas passaram a focar seu trabalho de catequização nas crianças das tribos. E a fase das missões, ao perceber que as pregações eram insuficientes para a conversão e para o processo “civilizatório”, os jesuítas passam a conviver com os índios, surgindo assim as Missões Jesuíticas, onde procuravam aculturar os índios aos costumes europeu-cristãos (MOSER, 2011). Os jesuítas consideravam os índios como a infância da humanidade, assumindo desta forma, uma postura paterna sobre eles, o que os estimularam a prosseguir em seus trabalhos de evangelização (ARANHA, 2006).

O ensino para elite era organizado em Studia Inferiora e Studia Superiora, semelhantes aos atuais ensinos médio e superior, ofereciam os cursos de filosofia e teologia, além dos cursos elementares, o de humanidades e o de artes (MOSER, 2011)

Receberam muitas críticas, dentre elas de não respeitarem a multiculturalidade e buscarem a homogeneidade da cultura; desprezavam o ensino das ciências naturais em preferência as humanas; segregavam a cultura negra e indígena que não se adequavam aos costumes europeus, rejeitavam inclusive os mestiços e os negros (ARANHA, 2006). Apesar disso, sua contribuição foi inegável para a educação brasileira, fundaram inúmeros colégios, e favoreceram a fundação de várias cidades, dentre elas, São Paulo.

Para Aranha (2006) a formalidade do ensino, distante da vida cotidiana, que ignorava as descobertas científicas contemporâneas, sufocava o espírito crítico, observação e a experimentação, juntamente com a retomada da escolástica, o que levou o ensino jesuítico ao declínio.

Em 1759 os jesuítas foram expulsos do Brasil por Sebastião José de Carvalho Mello, o Marquês de Pombal, o qual alegou que estavam interferindo em assuntos do Estado, almejando fundar um “Império Temporal Cristão”, além de estarem enriquecendo a custa da Coroa (MOSER, 2011)

4.5.2. Protestantismo no Brasil

Como discorremos anteriormente, os jesuítas possuíram grande participação na história da educação brasileira, visto que Portugal era um país aliado a Igreja Católica. Destarte, a participação do protestantismo no nosso país e suas contribuições na educação ocorreu de maneira mais árdua.

Os primeiros protestantes vieram para o Brasil em 1557, porém fracassaram ao tentar implantar a fé protestante; a segunda tentativa, também fracassada, foi na invasão do nordeste pelos holandeses em 1630 (GARRIDO, 2005). Como os Países Baixos eram protestantes, durante seu domínio sobre o nordeste, chegaram a organizar sua Igreja reformada abrindo portas para os missionários que atuaram junto aos índios. No entanto, sua atuação só perdurou até 1654 com a expulsão dos holandeses do Brasil. A partir de então foi vedada a entrada de protestantes na Colônia, algo que só foi revertido apenas com a vinda da família real portuguesa 1808. Mesmo assim, com a abertura dada com a chegada da família real, havia várias restrições para que os protestantes pudessem manifestar sua fé no Brasil, algo que perdurou mesmo após a Independência, embora a Constituição de 1824 concedesse maior liberdade religiosa (MATOS, 2008b).

Seguindo os princípios educacionais dos reformadores, a primeira escola confessional protestante é fundada em 1870, na casa do missionário presbiteriano George Whitehill Chamberlain, que passaria a ser denominada Escola Americana, em seguida, Mackenzie College, e atualmente Universidade Mackenzie. Posteriormente em 1881 é fundado o Colégio Piracicabano pelos metodistas tendo à sua frente a missionária Martha Hite Watts, sempre com o objetivo maior de evangelização, não é por acaso, inclusive, que essas escolas surgem do anseio de alfabetizar crianças e as camadas populares para que pudessem ter acesso ao texto bíblico a partir das escolas bíblicas dominicais (GARRIDO, 2005).

Influenciado pelas escolas confessionais norte-americanas - como o próprio nome “Escola Americana” sugere - a pedagogia confessional protestante no Brasil inovou ao admitir classes mistas de meninos e meninas, como também é responsável pelo surgimento do “Jardim de Infância” (GARRIDO, 2005). Vieira (2002, p. 13), ao falar das contribuições do protestantismo para educação pública no estado de São Paulo ressalta:

É inegável a contribuição dos colégios protestantes à educação pública paulista na renovação dos métodos pedagógicos, em detrimento da pedagogia essencialmente mnemônica e "monótona" das escolas públicas: na introdução da co-educação, contra a tradição católica de separação rigorosa de sexos; na dignidade na educação do sexo feminino, contra o preconceito à sua formação; na inovação curricular, com ênfase ao aspecto científico, contra um currículo essencialmente clássico, no qual as ciências físicas e naturais eram apresentadas quase sem o uso de laboratórios e experimentação; no princípio de liberdade de religião nas escolas e contra a obrigatoriedade do ensino religioso nas escolas públicas e no espírito de compreensão, ou mesmo de ternura, que permeava as relações entre professor-aluno.

Com a Proclamação da República (1889), que defendia um Estado laico (de acordo com a Constituição de 1891), vai crescendo cada vez mais o número de escolas confessionais protestantes no país (GARRIDO, 2005). No entanto, no decorrer da história o protestantismo e o catolicismo confrontam-se em vários momentos, no que diz respeito a influências de cada corrente no processo educacional e na sociedade (MATOS, 2008b).

4.5.3. Educação Cristã na atualidade

A discussão sobre o processo histórico da relação cristianismo-educação, nos permite entender como o cristianismo vem influenciando a sociedade e por que a expressão cristã é forte em nosso meio.

A preocupação do cristianismo quanto à educação, não permanece no passado, mas ainda reverbera na atualidade, um exemplo dessa situação são as escolas dominicais que surgiram a partir do princípio de estado laico, ou seja, a partir do momento que as escolas públicas não puderam mais favorecer qualquer religião, as Igrejas protestantes passaram a investir nas Escolas Bíblicas Dominicais para que os princípios cristãos fossem ensinados, fato semelhante parece ter acontecido com a Igreja Católica com a Catequese. Todavia, embora o Estado seja laico, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional ainda garante o direito de existência de escolas privadas confessionais, dentre outras, como podemos ver no inciso III do 20º Artigo:

Art. 20. As instituições privadas de ensino se enquadrarão nas seguintes categorias:

III - confessionais, assim entendidas as que são instituídas por grupos de pessoas físicas ou por uma ou mais pessoas jurídicas que atendem a orientação confessional e ideologia específicas e ao disposto no inciso anterior (BRASIL, 1996).

A atual existência de escolas confessionais cristãs revela que o cristianismo na atualidade não abandonou a sua preocupação e sua postura quanto à educação. A concepção, portanto, de educação cristã ainda configura o anseio de formar no ser humano a imagem de Cristo, visto como um modelo a ser seguido. Borges (2002, p. 176) define a educação cristã como “toda e qualquer prática educativa que considera o ser humano do ponto de vista do Evangelho”, assim sendo, na filosofia cristã da educação, não existe distinção entre educação cristã e vida cristã; todo cristão que deseja assemelhar-se a Cristo viverá em constantes situações de ensino e aprendizagem.

Em termos gerais, a educação cristã não rejeita os alvos comumente defendidos pela perspectiva secular sobre educação. Ela aceita aqueles valores que refletem a nobreza da atividade educacional e acrescenta a eles uma perspectiva mais holística do ser humano e do universo ao seu redor, pois busca interpretá-los à luz dos princípios do Criador, revelados nas Escrituras Sagradas. Neste sentido, a educação cristã parece combinar com as dimensões descritivas da educação secular e com as dimensões normativas fundamentais a uma cosmovisão cristã. O caráter distinto da educação cristã é que, em seu espectro, ela se compromete com a realização dos objetivos educacionais por meio de um currículo que integra as variadas áreas do conhecimento com a epistemologia bíblica e dispensa uma atenção integral ao ser humano sempre partindo de uma cosmovisão bíblica (SANTOS, 2008, p. 158).

Borges (2002), ainda ressalta que na atualidade, a Igreja tem sido bombardeada por valores que não condizem com os ensinamentos cristãos, assim as escolas cristãs são essenciais para manter esses valores. A proposta deste tipo de educação percebe a escola como uma extensão da família, onde aquela deve estar ao serviço desta, portanto, o envolvimento da família é essencial para o desenvolvimento desse modelo educacional.

A Associação de Escolas Cristãs de Educação por Princípios (AECEP) possui como método o ensino a partir de princípios gerais, assim, tudo que é ensinado passa-se sob o viés bíblico, embora não seja desconsiderada a pesquisa, o raciocínio e a investigação; cada descoberta deve não ser considerada como absoluta, o aluno precisa criticar e raciocinar sobre a própria descoberta, os pensamentos prontos e as respostas fechadas de terceiros não podem ser aceitos como definitivos (BORGES, 2002). Esse método de ensino gira em torno dos princípios da soberania, do trabalho, da mordomia, da liberdade, da individualidade, da aliança e da semeadura. Ao ensinar a letra “A”, por exemplo, leva a criança a associá-la a “Amor” (o amor de Deus), cada letra possui uma peculiaridade, um som diferente, assim utiliza-se o princípio da individualidade, onde cada ser é um ser ímpar e possui uma função, só que esse ser único precisa do outro diferente de si para formar uma aliança (o princípio da aliança), deste modo as letras da palavra “amor” são comparadas aos diferentes tipos de pessoas, e o conjunto das letras à necessidade destas pessoas viverem em comunhão, à aliança.

O princípio bíblico deve ser levado para a prática, onde o educando em suas vivências deve ser também um mestre, compartilhando humildemente os ensinamentos tanto acadêmicos como bíblicos com os demais. As Escolas de Educação por Princípios defendem um ensino construtivista, onde o teor confessional deve se conservar no diálogo professor-aluno e nas atividades extraclasses, no entanto, as demais atividades assemelham-se às escolas comuns (BORGES, 2002).

Meier (2006) traz uma abordagem sobre a busca da identidade do educador cristão, desfiados pelo pós-modernismo, e pelos valores capitalistas da sociedade. Para ele, a educação religiosa é aquela que deve assim “religar” todas as coisas, religar a humanidade, dividida e fragmentada, da mesma forma o conhecimento também se apresenta fragmentado, cabe ao educador cristão a transversalidade e a defesa da ética. Contudo, Santos (2008) distingui “Educação Cristã” e “Educação Religiosa”: a primeira consiste em uma educação relacionada aos princípios bíblicos, ou ao cristianismo; já a segunda está a serviço de um “sistema religioso”, que pode abordar os ensinamentos de qualquer religião.

A educação cristã é, em suma, uma filosofia da educação que vê o ser humano numa perspectiva holística, onde o relacionamento com Deus faz parte da necessidade de transcender, portanto, o homem, embora precise de conhecimento, cultura, de desenvolver valores e uma postura crítica, seu desenvolvimento é incompleto sem a fé em Deus. Diferentemente da postura de verdade relativa proposta pela educação “secular”, a educação cristã permanece considerando-se como verdade absoluta. Não ignora, entretanto, as descobertas científicas, mas busca fazer ligações entre essas descobertas e doutrina bíblica, embora defenda o criacionismo, pois discorda da teoria evolucionista: o homem não é apenas um ser animal, nem existe por existir, ele foi criado com responsabilidades e com um objetivo. Embora feito de barro, o que representa sua fragilidade, consiste na coroa da criação, destarte, a essência dos valores cristãos é representado como um tesouro em vasos de barro, onde a ética é um clamor constante, como também o valor dado ao papel da família. O pecado teria afastado o homem da natureza para que fora criado, assim sendo, cada indivíduo passa a construir seus próprios princípios morais. Para o cristianismo, entretanto, a satisfação pessoal do ser humano só pode ser encontrada através da busca do caráter de Deus.

Todo conhecimento é válido, e toda verdade não importando por qual meio foi descoberta, pertence a Deus. Quanto ao ambiente de ensino, a educação cristã pode se desenvolver em momentos variados: na leitura bíblica, na escola, na família, nas igrejas, nas obras sociais, nos momentos devocionais dos cristãos e etc.

O educador é também um educando e o principal método de ensino, ou seja, o educador deve ensinar através de sua própria prática de vida, seu anseio deve ser formar um educando-educador transcendente, livre da opressão e da escravidão dos seus próprios instintos, capaz de renunciar a sua própria vontade para um bem comum, pois ao adquirir uma natureza pecaminosa, o homem assume um instinto egoísta, vencer, pois, esse instinto, é uma tarefa básica do cristianismo.

5. ANÁLISE DOS PRECEITOS TEÓRICO-METODOLÓGICOS DE CRISTO

5.1. O MESTRE JESUS

A análise do processo histórico cristianismo-educação nos permite perceber, dentre outros aspectos, que o cristianismo passou por mudanças em suas abordagens, em alguns momentos afastara-se da proposta de Jesus Cristo, e hoje, ao se falar de cristianismo, o termo é referido à complexidade de subdivisões em que atualmente se encontram as igrejas, cujas principais divisões compreendem o protestantismo, o catolicismo, e a ortodoxia17 , e estas, por sua vez, possuem também divisões e diferentes abordagens do cristianismo dentre si (RAMPAZZO, 2004).

Entretanto, todas essas igrejas possuem a crença em Jesus Cristo, o homem cujo nome divide a história da humanidade, e que atualmente ainda levanta uma série de questionamentos a cerca de sua existência. As pesquisas sobre sua vida no decorrer da história são variadas, sejam elas de procedência confessional ou não. Muitas pesquisas, inclusive, questionam a própria existência histórica de Jesus (MACHOVEC, 1989).

O psiquiatra Augusto Cury (2006) fez uma análise interessante da inteligência Cristo, segundo ele é impossível que Jesus tenha sido uma criação da mente humana, pois não existe nenhum personagem com uma personalidade tão complexa quanto a de Cristo. Cury analisou os textos dos evangelhos procurando identificar o inconsciente dos seus escritores e concluiu que os escritores falavam de algo que por vezes nem eles mesmos compreendiam, relatavam coisas que viram e ouviram de acordo com suas percepções, o que resultou em algumas divergências nas diferentes biografias. Nos evangelhos seus autores falavam de seus defeitos abertamente, e questiona: “Que autor falaria mal de si mesmo?” (CURY, 2006, p. 33) Portanto, para Cury Jesus é uma pessoa que realmente existiu, e quanto aos fatos miraculosos, sua comprobabilidade está na área da fé, o que não compreende a área de pesquisa da ciência; afirma ainda que a ciência evitou estudar sobre o próprio Jesus por puro orgulho. Relatando seu estudo sobre a inteligência de Jesus explicita:

Penetrei nas quatro biografias de Jesus e procurei pesquisar até o que estava nas entrelinhas desses textos, tanto os mais diversos níveis de coerência intelectual neles contidos, como as intenções conscientes e inconscientes dos seus autores. [...] Se os autores dos evangelhos quisessem produzir conscientemente um herói religioso, ele, como seus discípulos, não desnudariam a vergonha que tiveram dele momentos antes de sua morte, pois isso deporia contra a adesão a esse suposto herói, ainda que fosse imaginário. Este fato representa um fenômeno inconsciente que confirma a intenção dos discípulos de descreverem um homem que realmente andou sobre a Terra. (CURY, 2006, p. 31-33)

Para Rampazzo (2004) o cristianismo não é uma doutrina, uma teoria, uma filosofia de mundo ou de vida, o “cristianismo é uma pessoa”, que é o início e o fim de todas as coisas para os seus seguidores, é o próprio Jesus. Sem ele, nenhum dos valores cristãos faria sentido, ele é a porta de entrada para a salvação e redenção da humanidade, ser cristão, desde modo, requer a aceitação de Jesus na própria vida do indivíduo.

Os cristãos defendem sua dupla natureza: homem e deus. Jesus, em outras palavras, é o Filho de Deus que se fez homem para morrer e expiar os pecados da humanidade através do seu sacrifício e assim restabelecer o relacionamento do homem com Deus perdido no Éden, esse é o anúncio fundamental do cristianismo (RAMPAZZO, 2004). Segundo o Apóstolo Paulo ele é o segundo Adão, o primeiro havia falhado em sua obediência a Deus, fazendo assim com que o pecado e a condenação “entrassem” no mundo, no entanto, Jesus, o segundo Adão (1 Coríntios 15:45), foi o servo obediente, pelo qual a salvação foi oferecida ao mundo condicionada pela fé, como defende algumas igrejas, em sua maioria protestante, onde a salvação provém da fé.

As diferentes correntes do cristianismo discu tem vários aspectos sobre a vida de Jesus e sua doutrina, uma dessas discussões é acerca da trindade. Segundo essa doutrina, Deus divide-se em três pessoas: o Pai, o Filho (Jesus) e o Espírito Santo; no entanto, existem algumas correntes que contestam a trindade de Deus. Também, para os cristãos, Jesus ressuscitou após o terceiro dia de sua morte, algo contestado por pesquisadores não cristãos; são-lhe atribuídos diversos milagres e atitudes, os quais são defendidos pelos cristãos como o cumprimento das diversas profecias do Antigo Testamento que anunciavam a chegada do Messias (RYRIE, 2004), o qual libertaria o povo de Israel da sua opressão.

As principais e mais populares fontes da biografia de Jesus são os Evangelhos, sendo eles: Mateus, Marcos e Lucas, classificados como sinóticos (por serem semelhantes), e o de João que possui uma abordagem diferenciada dos demais (MACHOVEC, 1989), existem ainda os chamados evangelhos apócrifos, que não são aceitos pela comunidade cristã, em geral por serem considerados de origem duvidosa e/ou não divinamente inspirados (ZILLES, 2004).

Jesus, mesmo possuindo uma personalidade intrigante e diante das polêmicas levantadas ao seu respeito, tinha uma visão de mundo bem definida e um projeto ambicioso para a humanidade, assim para alcançar tal objetivo designou aos seus discípulos à missão de pregar o evangelho no mundo inteiro, ensinando o que haviam aprendido dele, é o “ensinar tudo a todos” no qual se inspirou Comênio.

Tanto Jesus se identificava como mestre, como também os seus seguidores o chamavam de Rabi18 (PRINCE, 1980). Como afirma Cambi (1999), Jesus era um mestre-profeta; profeta porque se apresentava como um mensageiro do Pai, e mestre porque ensinava, e de uma maneira diferente das de então conhecidas, para isso, possuía uma didática de ensino, embora não teorizada, e utilizava-se de diversos métodos e recursos para ensinar sua doutrina (MATOS, 2008a), dignos de serem analisados, enquanto processo educativo.

5.2. INTENÇÕES E OBJETIVOS

Todo processo educativo possui intenções e objetivos. Para Castanho (2001, p. 57)

objetivos da educação são os resultados buscados pela ação educativa: comportamentos individuais e sociais [...] são mudanças esperadas como consequência da ação educativa nas outras pessoas, grupos sociais, nas instituições dedicadas ao ensino e nas organizações de âmbito mais largo responsáveis por política educacionais.

[...] Já as intenções educativas estão na ponta inicial do processo educativo e dizem respeito à relação entre os agentes deflagradores desse processo e os objetivos formulados.

O ensino de Jesus pode ser considerado em um tipo de educação, embora em sentido mais informal ou não-formal do que formal, uma vez que o foco do seu ensino não era algo sistematizado e estruturado; no entanto, mesmo assim, existiam ambos os aspectos, tanto os objetivos como as intenções, ainda que implicitamente.

Os textos bíblicos apontam em suas intenções o desejo de levar os homens a Deus, e a crerem em si como salvador, no entanto, não era simplesmente a crença que Jesus queria, mas visava à transformação interior drástica do ser humano (CAMBI, 1999), do seu caráter por completo. É o “nascer de novo” que está expresso no Evangelho de João, uma mudança de perspectiva de mundo e de realidade sem a qual era impossível entender os seus objetivos, “ou entrar no seu reino”.

O cristianismo é uma religião que concentra uma boa dose de atenção sobre a possibilidade e a necessidade de uma mudança radical. Isso é verdade em vários aspectos. Quase todos os tipos de cristianismo narram sua história como uma ruptura radical em relação ao judaísmo do qual nasceram. A encarnação de Jesus criou uma ruptura na continuidade da história e, assim, o cristianismo representa algo realmente novo no mundo [...]. Com a exigência de conversão, o cristianismo tende a exigir uma transformação na história pessoal de quem vive no presente. (ROBBINS, 2011, p.17.)

Como nos mostra Robbins (2011) o ensino de Jesus e a conversão requerem uma mudança radical que estabelece uma ruptura com a história pessoal do indivíduo, assim o “nascer de novo” figura a ideia de uma conversão completa do indivíduo, revendo seus valores, seus costumes e sua visão de mundo, e a partir de então construir uma nova história de vida. O novo nascimento supõe, deste modo, a necessidade posterior de um crescimento que não dispensa a aprendizagem, mas a enaltece, assim a Igreja servirá de espaço de continuidade para o ensino, algo que fica explícito quando Jesus comissiona os discípulos a ensinar as nações a guardarem todas as coisas, ou mesmo na afirmação do Apóstolo Paulo:

E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores, querendo o aperfeiçoamento dos santos, para a obra do ministério, para edificação do corpo de Cristo; até que todos cheguemos à unidade da fé, e ao conhecimento do Filho de Deus, a varão perfeito, à medida da estatura completa de Cristo  (Efésios 4:11-13).

Nas diversas concepções de educação em seu sentido amplo apresentadas por Libâneo (2010), existe em comum, segundo o próprio autor, a visão de que a educação consiste em um processo de desenvolvimento, onde o ser humano se transforma continuamente. Podemos perceber esse anseio de transformação contínua expressa na declaração de Paulo, ao dizer que ele (Jesus) designou apóstolos, profetas, evangelistas, pastores e doutores “para o aperfeiçoamento” dos santos (a igreja). Assim o “novo nascimento” refere-se à conversão, e a regeneração ou o aperfeiçoamento refere-se a um processo contínuo de transformação.

Cabe levar em consideração de que para o cristianismo todos os problemas existentes na humanidade eram primordialmente consequência do afastamento do homem de Deus, não bastava criar regras para o homem, a Lei de Moisés somente, por exemplo, não foi suficiente para essa transformação, pois somente Deus sabia o que o homem necessitava, a fé era a porta de entrada para salvação da alma, e para a regeneração, onde ele mesmo, Jesus, era o modelo a ser seguido. Essa fé levaria o homem à santidade pelo o cumprimento do maior mandamento que Jesus proclamava, no qual resume todo o conteúdo do seu ensino: “Amarás ao Senhor teu Deus de todo o teu coração, e de toda a tua alma, e de todas as tuas forças, e de todo o teu entendimento, e ao teu próximo como a ti mesmo” (Lucas 10: 27) (RYRIE, 2004).

Eis a verdade universal defendida pelo cristianismo: Jesus o filho de Deus veio ao mundo, não só morrer pela humanidade, mas ensiná-la a viver (e viver com abundância), a mostrar a verdade, afinal ele mesmo era a verdade, era a palavra de Deus encarnada (RYRIE, 2004).

Sua intenção era que a humanidade cresse nele, e seu objetivo era a transformação interior do ser humano, o que nos permite perceber a ambição do seu projeto. Em outras palavras, seu objetivo era “transformar as vidas de seus discípulos, e por meio deles, transformar outras vidas e regenerar a sociedade humana” (PRINCE, 1980, p. 28). Não vemos em Jesus, uma pessoa que queria enganar as pessoas a fim de tirar proveito disso, uma vez que se recusou a tornar-se rei, mantinha-se pobre, não gostava de se expor apenas para chamar atenção, suas ações objetivava sempre às necessidades do outro. Seu desejo era levar todo “o ser” dos seus discípulos para Deus, em pensamento, alma e sentimentos.

Segundo Prince (1980) Jesus não procurava quantidade, mas qualidade, visto que liberou os seus discípulos se quisessem deixá-lo, eram melhor poucos que entendessem bem do que muitos que o seguissem de modo superficial.

5.3. MOTIVAÇÃO E RELAÇÃO INTERPESSOAL

Segundo Bock et al. (1999, p. 121) a motivação é o “processo que mobiliza o organismo para a ação, a partir de uma relação estabelecida entre o ambiente, a necessidade e o objeto de satisfação”. Portanto, para que um indivíduo seja levado a uma ação é necessário que ele sinta um interesse, um desejo, uma predisposição para agir. No que concerne ao processo de ensino-aprendizagem Pillet (1986, p.33), assim esclarece “para que alguém aprenda é necessário que queira aprender”.

Bock et al.(1999) traz muitas considerações importantes sobre a motivação para o ensino, acrescentando às considerações de Pillet (1986), afirma que é preocupação do ensino a necessidade de criar condições que desperte a vontade do aluno aprender, o que não é nada fácil, uma vez que é preciso considerar as necessidades do aluno e o objeto oferecido.

No discurso de Jesus Cristo vemos implicações que apontam, de certo modo, para sua preocupação quanto à motivação: para chegar ao seu objetivo era necessário “querer seguir”, para tanto, falava às necessidades do povo nos seus conflitos existenciais. Seu ensino podia começar a partir de algum fato que acontecia, uma pergunta, uma parábola para prender a atenção dos seus ouvintes, tais como a parábola do semeador, a qual nos pode ajudar a refletir melhor sobre motivação no discurso de Jesus:

Eis que o semeador saiu a semear. E, quando semeava, uma parte da semente caiu ao pé do caminho, e vieram as aves, e comeram-na; e outra parte caiu em pedregais, onde não havia terra bastante, e logo nasceu, porque não tinha terra funda; mas, vindo o sol, queimou-se, e secou-se, porque não tinha raiz. E outra caiu entre espinhos, e os espinhos cresceram e sufocaram-na. E outra caiu em boa terra, e deu fruto: um a cem, outro a sessenta e outro a trinta. (Mateus 13:3-8)

Sendo o objetivo de Jesus algo que requeria renuncia, destaca nessa parábola o que poderia impedir ou desmotivar seus ouvintes de “dar ouvidos” à sua palavra. Os três primeiros solos seriam pessoas as quais permitiram que diversos fatores impedissem seus ensinamentos de chegarem ao seu objetivo, a primeira não deu se quer atenção, a segunda era superficial, a terceira deixou outras coisas sufocar o ensino, mas a última, a terra boa, representa a pessoa que realmente deu ouvidos ao seu ensino e rendeu frutos, ou seja, apresentou resultados (cf. Mateus 13: 19-23). Assim, para que alguém aprendesse o que falava, era necessário querer ouvi-lo, preparar bem “o terreno do coração”. Deste modo, seu alvo primordialmente era à vontade, ou seja, despertar o desejo de quem o ouvia, para enfim segui-lo (PRINCE, 1980).

A parábola nos permite refletir sobre outras considerações sobre motivação, Bock et al. (1999, p. 122), cita que para despertar o interesse em aprender é necessário “falar ao aluno sempre numa linguagem acessível, de fácil compreensão [...] somos sempre ‘a fim’ de aprender coisas que são úteis e têm sentido para nossa vida.” Jesus parecia atender esses critérios, uma vez que discorreu sobre os problemas vitais do ser humano: como a morte e o sofrimento e etc., e falava em uma linguagem acessível.

Os temas que circundavam seus ensinos interessavam ao povo de Israel, destarte, podemos apontar alguns motivos: sua história como nação, onde a busca pela transcendência sempre esteve presente de modo intenso; e as condições sociais que se encontrava - onde domínio do Império Romano era visto como consequência do desvio de Israel prenunciado pelos profetas, e por conta disso aguardavam o seu “Messias”; sem contar à busca pelo alívio dos conflitos individuais que cada um estava vulnerável a sofrer. Em todas essas situações Jesus oferecia esperança.

A parábola do semeador, como muitas outras, mostra também a linguagem simples de Jesus, utilizava-se daquilo que era cotidiano na vida de seus “alunos” para fazer sua explanação, nesse caso, o lavrar a terra; mas, dentre outros, podemos destacar situações do cotidiano que apareciam nas suas parábolas como as profissões, onde citava o pescador, o construtor, o alfaiate, o vigilante; os objetos, como as dracmas, as lâmpadas de óleo, os remendos dos vestidos; falava de aspectos da natureza e da geografia de Israel - a água, os animais, os solos, o fogo, os astros, os montes, os vales, a vegetação, a agricultura, e aspectos urbanos como as casas, os muros das cidades, o templo e etc. (PRINCE, 1980).

O incentivo quanto ao conhecimento também era constante, suas recomendações de buscar para encontrar, bater para ser aberto, pedir para receber, apontam para a formação de um individuo inquiridor da realidade, mandava sempre as pessoas verificarem as escrituras e a lerem o que estava escrito, tais recomendações assemelham-se à indicação de Bock et al. (1999, p. 122), onde o professor deve “desenvolver nos alunos uma atitude de investigação, uma atitude que garanta o desejo mais duradouro de saber”. No entanto, é interessante destacar, que o ensino de Jesus, não parecia ser simplesmente uma exposição de argumentos e pensamentos, mas tinha um forte apelo aos sentimentos humanos, à compaixão, o consolo, o amor, a humildade e a fé, dentre outros, era sentimentos constantes que cercava seus ensinos e serviam de certo modo de estímulo para pessoas carentes de tais sentimentos (PRINCE, 1980).

5.3.1. A Afetividade

Jesus era afetuoso com seus discípulos ou qualquer pessoa que se predispusesse a ouvi-lo, qualquer um podia fazer-lhe perguntas (cf. Mateus 19: 16), sentava-se para comer junto com eles (cf. Mateus 9: 10), condoia-se com seus sofrimentos (cf. Mateus 11: 28), não os acusava (cf. João 8: 3-11), embora os repreendesse muitas vezes com veemência (cf. Lucas 9:55), o que fazia principalmente aos fariseus (cf. Mateus 23), mas reconhecia também quando seus discípulos acertavam (cf. Mateus 16: 17). Jesus possuía, portanto, uma “vida social”; nos relatos bíblicos o encontramos misturado com o povo, em eventos sociais e religiosos, relacionava-se com as pessoas sem discriminação, ricos, pobres, estrangeiros, prostitutas, cobradores de impostos, religiosos, homens, mulheres, crianças, leprosos e etc. Não ensinava o conteúdo, mas “ensinava às pessoas” (PRINCE, 1980), sua mensagem oferecia consolo e esperança às pessoas, para instauração de um reino de justiça.

Na verdade, o ensino de Jesus era extremamente relacional (BORGES, 2002), os mandamentos: amar a Deus e o próximo como a si mesmo nos permitem chegar a essas conclusões, como também ao ordenar aos seus seguidores: “amais-vos uns aos outros”; e a própria instituição da igreja, como uma comunidade de pessoas que convivem e se relacionam por compartilharem a fé nele. A afetividade parecia estar presente no seu ensino de forma marcante, visto que o amor era a parte central de sua mensagem.

Essas considerações juntamente com a parábola do semeador nos permitem perceber que o alvo de Jesus era a afetividade de seus discípulos, atingindo suas emoções e sentimentos, o que está em consonância com o seu objetivo de transformar as pessoas, uma vez que necessitamos perceber os sujeitos na sua integralidade, não só com seres pensantes, mas também como seres que sentem.

Bock et al. (1999) distingue emoção e sentimento: a emoção é um estado agudo e transitório, já o sentimento é um estado mais atenuado e durável. Ambos abrangem ao que chamamos de vida afetiva do indivíduo.

É importante destacar que, atualmente, os estudos sobre a afetividade tem sido uma preocupação recente para educação, além de outras áreas, levando em consideração o descontentamento com a noção iluminista da razão, onde os sentimentos e as emoções são vistos como algo negativo (ARAÚJO, 2003).

Bock et al. (1999, p. 191) também concorda ao afirmar que:

O estudo da razão tem sido privilegiado no interesse dos homens, principalmente na ciência, pois os afetos têm sido vistos como deformadores do conhecimento objetivo. Mesmo na Psicologia, não são todas as teorias que consideram a importância da vida afetiva, tendo, muitas delas, priorizado apenas o estudo da cognição, das funções intelectivas.

No entanto, essa visão científica, que preza meramente a objetividade, tem sido rompida abrindo espaço para um conceito de racionalidade, onde as emoções e os sentimentos sejam considerados no seu papel funcional do raciocínio humano. Na educação, ao assumir a importância da afetividade, estaremos, com maior amplitude, trabalhando para formação integral do ser humano (ARAÚJO, 2003).

Araújo (2003, p. 158), embasando-se em Jean Piaget, expõe o papel da afetividade na construção de valores, afirmando que “os valores são construídos pela projeção de sentimentos positivos que o sujeito faz sobre objetos, e/ou pessoas, e/ou relações, e/ou sobre si mesmo”. Em outras palavras, ainda segundo Araújo (2003, p. 161),

cada ser humano constrói um sistema de valores, segundo as interações que estabelece com o mundo e consigo mesmo desde o nascimento, [...] tais valores são resultados da projeção de sentimentos positivos sobre objetos, pessoas, relações e sobre seus próprios pensamentos e ações.

Depois de construídos, os valores serão incorporados na identidade das pessoas. E “quanto maior a carga afetiva vinculada a determinado valor, mais centralmente ele se ‘posiciona’ na identidade” (ARAÚJO, 2003, p. 160)

Os afetos ajudam-nos a avaliar as situações, servem de critério de valoração positiva ou negativa para as situações de nossa vida; eles preparam nossas ações, ou seja, participam ativamente da percepção que temos das situações vividas e do planejamento de nossas reações ao meio (Bock et al. 1999, p. 193).

No que diz respeito ao ensino de Jesus, visto que o conhecimento por ele apresentado tipifica-se como conhecimento teológico e, portanto, valorativo, e sendo a fé de ordem intuitiva, a ênfase na afetividade para a construção de valores é essencial. Podemos refletir, por exemplo, no objetivo de ensinar a importância humildade, onde Jesus simplesmente não fala sobre a humildade, mas tem uma atitude humilde no seu ato de lavar os pés dos discípulos o que mexe com as emoções dos seus discípulos, levando Pedro, inclusive, a se recusar por não se achar digno de ser servido por seu mestre (cf. João 13: 4-17). Podemos ter certa noção da carga afetiva de tal ação ao imaginarmos uma situação semelhante em qualquer relação de poder. Sendo assim, embasando-nos no pensamento sobre a afetividade segundo Araújo (2003), podemos dizer que essa atitude de Jesus devido à intensidade afetiva, pode ter influenciado de maneira significativa na identidade daqueles discípulos, mantendo coerência com o seu objetivo geral de ensino.

5.4. MÉTODOS, RECURSOS E CONTEÚDOS

A palavra método provém do latim methodos, originada da junção das palavras gregas meta (meta) e hodos (caminho). Segundo Nérici (1992, p. 53) “didaticamente, método quer dizer caminho para se alcançar os objetivos estipulados em um planejamento de ensino, ou caminho para se chegar a um fim”.

Nérici (1992) afirma que um método de ensino deve ser fundamentado num ciclo de planejamento, execução e avaliação. Os textos bíblicos não deixam claro, se Jesus possuía um planejamento estruturalmente sistematizado, embora em determinado momento discorra sobre a importância das estratégias em sentido amplo (cf. Lucas 14: 27-35), no entanto, Cristo não teorizava como afirma Prince (1980), assim, é-nos permitido analisar suas implicações didático-pedagógicas mais profundamente apenas quanto à execução e à avaliação.

Primeiramente podemos dizer que Jesus defendia uma “pedagogia da exemplaridade”. Retomando o relato do momento em que lava os pés dos seus discípulos, em sua lição sobre humildade, afirma: “Ora, se eu, Senhor e Mestre, vos lavei os pés, vós deveis também lavar os pés uns aos outros. Porque eu vos dei o exemplo, para que, como eu vos fiz, façais vós também (João 13:14-15, grifo nosso), em outro momento, afirma ser o caminho (cf. João 8: 12), ou a luz do mundo (cf. João 8: 12). A afirmação de Jesus como verdade encarnada do Apóstolo João, também nos remete a essa ideia, João apresenta Jesus, de modo figurado, como aquele que cumpriu a vontade de Deus e a sua Palavra: “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós, e vimos a sua glória, como a glória do unigênito do Pai, cheio de graça e de verdade”  (João 1:14), portanto, ele é o exemplo, o caminho que todos seus discípulos devem seguir (PRINCE, 1980).

Jesus não só queria ser exemplo para os seus seguidores, mas estes também deveriam ser exemplo para o restante do mundo, de nada adiantava ouvi-lo e não fazer o que dizia (cf. Mateus 7: 24):

Vós sois a luz do mundo; não se pode esconder uma cidade edificada sobre um monte; nem se acende a candeia e se coloca debaixo do alqueire, mas no velador, e dá luz a todos que estão na casa. Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e glorifiquem a vosso Pai, que está nos céus (Mateus 5:14-16)

A exemplaridade defendida por Jesus Cristo nos remete ao conceito de aprendizagem por observação ou imitação, teoria defendida pelo pesquisador Albert Bandura, apresentado por Davidoff (2001, p. 130) que define este tipo aprendizagem como “A modificação de comportamento de forma relativamente permanente, em consequência da observação das ações de um terceiro”. Assim, relacionando o ensino de Jesus com a ótica da teoria de Bandura, podemos perceber que suas palavras apontavam para essa perspectiva de aprendizagem, onde Jesus colocava-se como o modelo a ser observado e imitado, e como também desejava que sua Igreja fosse modelar para o mundo.

Jesus também se utilizou de alguns recursos e técnicas em seu ensino, dentre elas, a exposição, principalmente para falar às multidões. Conhecida como a mais tradicional técnica de ensino na atualidade, onde muitas vezes os defensores das técnicas modernas se opõem à aula expositiva, no entanto, esta nunca saiu do quadro didático-pedagógico das escolas. Matos citado por Lopes (1991 p. 39) afirma que “o objetivo da aula expositiva é somente conseguir que os alunos adquiram uma compreensão inicial, indispensável para um novo assunto”. Nérici (1992, p. 92) define o método expositivo, como “a apresentação oral de um tema logicamente estruturado”. Um dos momentos que Jesus aplica esse método é o conhecido “Sermão do Monte” (Mateus 5-7), ao apresentar sua exposição de acordo com o que escreve o Evangelista Mateus, perceberemos alguns cuidados tomados por Jesus que são considerados por Nérici (1992) quanto ao método expositivo. Ao subir ao monte, por exemplo, podemos ver sua preocupação em tornar-se visível para toda a multidão, embora estivesse sentado, neste caso, Soares (2008) esclarece que ensinar sentado na antiguidade era símbolo de autoridade, uma vez que o discurso proferido “ex cathedra19 representava autoridade.

Mesmo que não se dispusesse dos recursos tecnológicos dos dias atuais, as multidões procuravam ouvi-lo com frequência, deste modo a linguagem oral é o principal instrumento utilizado, todavia, usa-se de uma linguagem informal, conhecida do seu auditório, o que já discorremos anteriormente, demonstra conhecer muito bem os escritos sagrados do povo hebraico, os quais são citados e analisados durante o sermão. Toda exposição possui um tom emocional - como vemos nas “Bem-Aventuranças” (cf. Mateus 5: 3-12); procurava manter os seus ouvintes em uma atitude reflexiva, com perguntas do tipo: “que recompensa tereis se amardes quem vos ama?” (cf. Mateus 5: 46) “Não é a vida mais do que o mantimento, e o corpo mais do que a vestimenta?” (cf. Mateus 5: 25). Seu discurso era direto e objetivo sem circunlóquios, mas com frases incisivas, ótimas para memorização e com termos imperativos como: “buscai”, “pedi”, “andai”, “fazei”, “guardai”, “amai”, dentre outros.

Ao encerrar apresenta uma “conclusão motivadora”:

Todo aquele, pois, que escuta estas minhas palavras, e as pratica, assemelhá-lo-ei ao homem prudente, que edificou a sua casa sobre a rocha; e desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e não caiu, porque estava edificada sobre a rocha. E aquele que ouve estas minhas palavras, e não as cumpre, compará-lo-ei ao homem insensato, que edificou a sua casa sobre a areia; e desceu a chuva, e correram rios, e assopraram ventos, e combateram aquela casa, e caiu, e foi grande a sua queda. (Mateus 7:24-27)

O “Sermão do Monte”, portanto, possui uma introdução – as “Bem-Aventuranças”, apresentada de maneira poética e figurativa; seguida pelo desenvolvimento – onde apresenta aconselhamentos práticos; e a conclusão – onde enfatiza a importância de não somente ouvir as suas palavras, mas colocá-las em prática. Assim, Mateus declara que a multidão o ouvia admirada, por que ensinava com autoridade e não como os escribas (Mateus 7: 29).

Existe também um princípio do método de arguição no ensino de Jesus. Nesse método, definido por Nérici (1992), o professor requer ao aluno que apresente oralmente um conhecimento estudado, existindo também uma variação do método, onde o professor é arguido pelo aluno. Este último caso parece acontecer em momentos que Jesus começa a ensinar em atenção a algumas perguntas feitas pelos discípulos, ou mesmo pelos fariseus que procuravam provocá-lo, como: “Quem é o maior no reino dos céus?” (Mateus 18:1) ou “é lícito ao homem repudiar sua mulher por qualquer motivo?” (Mateus 19:3) “Mestre, que farei para herdar a vida eterna?” (Lucas 10:25). No primeiro caso Jesus chama uma criança para exemplificar de modo dinâmico quem seria o maior no reino dos céus, nos dois últimos responde fazendo outras perguntas, a cerca da escritura, do tipo: “o que está escrito na lei? Como lês?” ou “não tendes lido...?” Mantendo assim um diálogo reflexivo até chegar às conclusões a respeito de um assunto.

É importante destacar o uso de figuras de linguagem em seus discursos: Soares (2008) destaca pelo menos doze tipos; epizeuxe, paromeose, homeoteluto, poliptoto, metáfora, símile, metonímia, sinédoque, catacrese, epíteto, hipérbole, e as famosas parábolas. Considera ainda Soares (2008) que as figuras de linguagem ornam o discurso ou o ensino, sendo utilizado por oradores e escritores para dar beleza, vivacidade e força expressiva àquilo que se deseja discorrer.

Jesus também se utilizou de “dramatizações”, como meio de ensino, como na ceia, uma “cerimônia”, onde compara o seu corpo ao pão e o seu sangue ao vinho, pedindo para que tal momento se repita entre seus discípulos para lembrá-los do seu sacrifício (cf. Lucas 22: 14-20). Segundo Nérici (1992, p. 267) “a técnica de dramatização consiste na representação teatralizada de situações reais da vida, com o propósito de dar e receber informações, alcançar melhor compreensão das situações e favorecer maior integração do grupo”. Embora a instituição da ceia, não seja exatamente uma dramatização estruturada de acordo com as orientações de Nérici (1992), possui, ao menos, a mesma estrutura de maneira simbólica e os mesmos objetivos de “dar informações”, uma vez que como fala Paulo aos Coríntios, a ceia consiste em um anuncio, “todas as vezes que comerdes este pão e beberdes este cálice anunciais a morte do Senhor” (1 Coríntios 11:26); “melhora a compreensão”, visto que compara o sacrifício de Cristo a um alimento, ou seja, explica que ele é essencial à vida espiritual (o qual consiste em um dado real para os cristãos); e de “favorecer a integração”, por ser uma cerimônia vivenciada pela Igreja em sua comunhão. Situação semelhante acontece no batismo, representação do novo nascimento e da nova vida, de um morrer para si e o renascer para Deus (cf. Romanos 6:4).

Como falamos inicialmente, o objetivo geral do ensino de Jesus não era somente transformar a vida dos seus discípulos, mas também fazer deles agentes de transformação e anunciadores do Evangelho, o papel dos discípulos, no reino pregado por Jesus, era comparado às vezes, com o trabalho dos servos ou operários, assim temos no ensino de Jesus uma preocupação com o pensamento, com o sentimento e com a experiência, ou seja, com o “como fazer”, esta última demonstrada no envio dos discípulos em dupla às cidades para anunciar o reino (cf. Lucas 10: 1-20) vemos aqui a utilização do método de estágio, o qual consiste em “um procedimento didático que tem por finalidade colocar o educando com uma atividade real da sociedade, para aquisição de experiência autêntica” (NÉRICI, 1992, p. 144), é o que acontece, uma vez que os discípulos depois de conviver com Jesus e o vendo pregar, agora são enviados à frente dele, às cidades que ele haveria de ir (Lucas 10:1), todavia, Jesus não havia ainda entregado aos discípulos a responsabilidade total de pregar o reino, mas tal medida é incentivadora para a autonomia dos discípulos. Podemos perceber nesse momento, Jesus trabalhando em seu ensino sob a Zona de Desenvolvimento Proximal (ZDP) dos seus alunos, conceito elaborado pelo psicólogo sociointeraconista Lev Semyonovich Vygotsky (1896-1934) que consiste na diferença entre o que uma pessoa pode fazer sozinha, e o que se torna capaz de fazer com o auxilio de outra pessoa mais experiente (BORGES, 2002).

O conteúdo do seu ensino girava em torno dos escritos sagrados do povo israelita, os quais Jesus demonstrava conhecer profundamente, contudo não apenas conhecia, mas dava um olhar crítico ao que conhecia (PRINCE, 1980), o que pode ter influenciado na formação do cristianismo como uma nova “roupagem” do judaísmo (JOHNSON, 2001). Para Prince (1980), provavelmente Jesus estudou nas sinagogas, o que era muito comum em sua época, quando não obrigatório. Para Pillet (1986, p. 67), o conteúdo não importa tanto em uma aula “o mais importante é o mestre estar apto a levantar a ideia central do conhecimento que deseja trabalhar”, assim sendo, “precisa ir do mais simples ao mais complexo, do mais concreto ao mais abstrato”, ainda afirma quanto ao conteúdo, que é o mais importante não é dar grande quantidade de informações, mas trabalhar pela sua formação integral. Vemos também esse cuidado no mestre Jesus quando diz: “ainda tenho muito que vos dizer, mas vós não o podeis suportar agora” (João 16:12).

Dadas assim, as características do ensino de Jesus, outro exemplo em que podemos analisar os princípios didático-pedagógicos do ensino de Jesus Cristo aplicados de modo geral, é o seu encontro com uma samaritana (cf. João 4:1-30). Nessa passagem bíblica Jesus quebra dois paradigmas sociais da época, primeiro conversava com uma mulher, o que era incomum visto o espanto dos discípulos; segundo, era uma samaritana, vinda de um povo que não se dava bem com os judeus. O que nos mostra que existia na pessoa de Jesus Cristo, demonstrado também em outros momentos, um comportamento que procurava não discriminar as pessoas, um acolhimento, extremamente necessário a qualquer educador.

Após o primeiro contato com a mulher, lançou-se de uma afirmação enigmática: “Se tu conheceras o dom de Deus, e quem é o que te diz: Dá-me de beber, tu lhe pedirias, e ele te daria água viva”, a passagem bíblica mostra a curiosidade da samaritana em querer entender o que ele queria dizer com tal afirmação, o que a manteve interessada na conversa fazendo-lhe também perguntas. Utilizou-se de alguns recursos do momento para se chegar à sua mensagem, onde a sede momentânea e a água serviram de comparação para chegar ao seu objetivo. Assim, no seu discurso direto e objetivo, partiu de algo concreto para o algo abstrato, do simples para o complexo, do mundo natural para o sobrenatural, mostrando a coerência da sua práxis.

5.5. PRINCÍPIOS AVALIATIVOS

Segundo Luckesi (2002, p. 33) avaliação consiste em “um juízo de valor sobre manifestações relevantes da realidade, tendo em vista uma tomada de decisão”, para aceitar ou transformar o objeto avaliado. No ensino de Jesus Cristo, não percebemos a avaliação enquanto um instrumento para verificação de maneira formalizada, mas podemos perceber uma postura avaliativa, onde incentiva através de seu ensino reflexivo um “juízo de valor sobre a realidade”, uma vez que o conhecimento religioso é valorativo e na medida em que procura desenvolver nos discípulos uma postura crítica em suas vidas e sobre as suas ações. Assim, não é Jesus somente quem avalia, seu ensino estimula uma autoavaliação, ou seja, procura desenvolver em seus “alunos” a capacidade de avaliar, não só a si mesmos, mas também a realidade que os cerca de acordo com a “vontade divina”. Portanto, a avaliação aparece na metodologia de Jesus não como um “instrumento”, mas como “princípio”. Se analisarmos a descrição de alguns instrumentos de avaliação demonstrados por Sant’Anna (1995), por exemplo, poderemos relacionar os princípios contidos nesses instrumentos e compará-los aos princípios avaliativos apresentados no ensino de Jesus.

As implicações avaliativas do ensino de Jesus Cristo podem ser percebidas em alguns momentos, por exemplo, na sua máxima “se conhece as árvores por seus frutos” (cf. Mateus 7: 15-16), Jesus aplica esse princípio ao resguardar seus discípulos dos falsos mestres, os quais deveriam ser reconhecidos por suas ações, portanto, ensina a avaliar a confiabilidade do ensino de alguém pela observação de suas atitudes. A observação enquanto processo mental, dentre as definições apresentadas por Sant’Anna (1999, p. 100), “é um ato de apreender as coisas e acontecimentos, comportamentos e atributos pessoais, e concretas inter-relações”. É justamente o que o ensino de Cristo incentiva, uma vez que procura perceber as ações de outrem e seu caráter, para então dar-lhe credibilidade.

Através da inquirição, onde podia verificar o que seus discípulos compreenderam do seu ensino e o que pensavam sobre ele, com perguntas (cf. Mateus 16: 15) e por meio dos relatos orais e espontâneos que os discípulos fizeram depois de serem enviados sozinhos para anunciarem o evangelho (cf. Lucas 10: 1-20). Inquirição “é perguntar e interrogar em busca de fatos relevantes (SANT’ANNA, 1999, p.116)”, dentre as formas de inquirição podemos citar as entrevistas as quais “possibilitam a obtenção de dados de natureza complexa e afetiva, além de outras informações, sobre comportamentos, julgamentos e opiniões etc. (SANT’ANNA, 1999, p.116)”. Deste modo, no texto bíblico, percebemos a avaliação por inquirição ao vermos Jesus indagando os discípulos quanto às suas opiniões e experiências.

A autocrítica ou autoavaliação também é presença perceptível no teor reflexivo de todo seu ensino, como exemplo podemos citar o momento em que o trazem uma mulher adúltera e o indagam se ele concorda que ela deve ser apedrejada, e sua resposta é “aquele que de entre vós está sem pecado seja o primeiro que atire pedra contra ela” (João 8:7). Assim, o Evangelista João dá mais alguns detalhes da reação dos acusadores: “Quando ouviram isto, saíram um a um, a começar pelos mais velhos até aos últimos” (João 8: 9), a situação nos mostra, que neste momento, diante da argumentação de Cristo, cada um se autoanalisou e desistiu de apedrejar àquela mulher por não se acharem dignos de condenar alguém sendo eles mesmos pecadores segundo a lei de Moisés. Podemos definir este acontecimento como autoavaliação, pois esta, por sua vez, permite ao indivíduo construir uma capacidade de analisar suas aptidões, atitudes e comportamentos a fim de que desenvolvam um sentimento de responsabilidade individual, levando-o a refletir sobre si mesmo e o que tem realizado (SANT’ANNA, 1995), é justamente o que acontece nesse relato bíblico.

Jesus também efetivava, em determinados momentos, um diagnóstico dos conhecimentos do seu interlocutor, para a partir de então começar sua explanação, ou levar a quem o ouvia a chegar às próprias conclusões. É o que acontece também quando ele responde ao doutor da lei diante da pergunta: “o que fazer para obter a vida eterna?”, sem lhe dar resposta inicialmente pergunta: “Que está escrito na lei? Como lês? (cf. Lucas 10: 25-26), depois de respondido, segue em sua explicação.

O ensino reflexivo de Jesus Cristo nos permite perceber que ele pugnava pela autonomia de quem lhe escutava, isso porque não impunha seu pensamento, mas levava as pessoas a chegarem às suas conclusões, ele foi um mestre hábil. Dentre os recursos que possuía usou-se deles com maestria e destreza. Sua forma de ensinar era cativante, pois ensinava com afeto e com simplicidade e numa linguagem acessível a quem o ouvia, o que não impedia nem os doutos ou os indoutos de aprenderem com ele. Era um ensino que não valorizava apenas competências conceituais ou procedimentais, mas principalmente atitudinais, visto que exigia sinceridade na transformação de cada indivíduo, visando à relação, o “ir” ao encontro dos menos favorecidos da sociedade. Qualquer um podia segui-lo, se assim desejasse. Perceberemos, posteriormente, o resultado do seu ensino nos seus discípulos em suas convicções de fé, nos martírios que a história nos conta, e, mesmo diante dos erros cometidos pelos cristãos, a persistência dos seus seguidores fará esse ensino perdurar e estar presente no cotidiano das pessoas em todo mundo, seja na cultura de modo geral, na arte, ou na própria espiritualidade daqueles que nele creem.

6. PERCURSO METODOLÓGICO

A necessidade de compreender a realidade é uma inquietação antiga do ser humano, para atender esta inquietação a humanidade utilizou-se no decorrer da história dos diferentes tipos de conhecimento, seja ele, popular (senso comum), filosófico, religioso ou científico, os quais ainda vigoram na atualidade, sendo assim, cada conhecimento utiliza-se de uma óptica diferente para a compreensão da realidade.

O conhecimento científico é um conhecimento factual, que procura conhecer a realidade através da verificação dos fenômenos, a fim de organizar os resultados obtidos de maneira sistemática, formulando as teorias. No entanto, é um conhecimento não definitivo, é falível e aproximadamente exato, pois está suscetível de reformulações (LAKATOS e MARCONI, 2001).

A pesquisa, por sua vez, no seu sentido mais amplo, é, segundo Pádua (2007, p. 31):

Toda atividade voltada para a solução de problemas; como atividade de busca, indagação, investigação, inquirição da realidade, é a atividade que nos vai permitir no âmbito da ciência, elaborar um conhecimento, ou um conjunto de conhecimentos, que nos auxiliem na compreensão dessa realidade e nos oriente em nossas ações.

Destarte, a pesquisa científica consiste em procedimentos necessários e que possuem grande valor para a transformação da sociedade, na medida em que procura solucionar os problemas da realidade humana no seu contexto histórico-sociológico (PÁDUA, 2007). Para tanto, “a pesquisa é desenvolvida mediante o concurso de conhecimentos disponíveis e a utilização cuidadosa de métodos, técnicas e outros procedimentos científicos” (GIL, 2002, p. 17).

Embora exista a possibilidade dos diferentes tipos de conhecimento possuírem o mesmo objeto de estudo, a diferença principal entre estes consiste no método que cada um se utiliza na compreensão da realidade (RUIZ, 1991). Desse modo, o presente trabalho procura analisar aspectos dos princípios do conhecimento religioso (ou teológico) na educação e na sociedade percorrendo uma metodologia científica.

Para o conhecimento científico, “método é o conjunto das atividades sistemáticas e racionais que, com maior segurança e economia, permite alcançar o objetivo - conhecimentos válidos e verdadeiros - traçando o caminho a ser seguido” (LAKATOS e MARCONI, 2001, p. 83), para Lakatos e Marconi (2001), inclusive, não existe ciência sem a utilização de métodos científicos, mas a ciência não se reduz aos métodos, como afirma Ruiz (1991), cabe ao cientista um espírito talentoso, o que é a atribuição primordial para a qualidade da pesquisa.

Inserida dentro das diversas etapas do método, está a técnica (RUIZ, 1991), a qual consiste em “um conjunto de preceitos ou processos de que se serve uma ciência, são também, a habilidade para usar esses preceitos ou normas, na obtenção de seus propósitos” (LAKATOS e MARCONI, 2001, p. 222).

De acordo com as características até então descritas da pesquisa científica, o presente trabalho possui caráter exploratório por se tratar de um tema pouco discutido, no anseio de proporcionar maior diálogo sobre a problemática em que se insurge. Posto que como afirma Gil (2002, p. 41), a pesquisa exploratória:

[...] Tem como objetivo proporcionar maior familiaridade com o problema, com vistas a torná-lo mais explícito ou a construir hipóteses. Pode-se dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o aprimoramento de ideias ou a descoberta de intuições.

Para tanto, este trabalho constitui-se exclusivamente em uma pesquisa a partir de fontes bibliográficas uma vez que esse tipo de pesquisa é típica do estudo exploratório, na análise de ideologias de forma não empírica, e indispensável em estudos históricos.

Segundo Ruiz (1991, p. 57) “qualquer espécie de pesquisa, em qualquer área, supõe e exige pesquisa bibliográfica prévia”. A pesquisa bibliográfica consiste no exame das produções humanas resguardadas em livros, para levantamento e análise do que já se produziu sobre determinado assunto (RUIZ, 1991). No entanto, a pesquisa puramente bibliográfica possui a vantagem de “permitir ao investigador a cobertura de uma gama de fenômenos muito mais ampla do que aquela que poderia pesquisar diretamente” (GIL, 2002, p. 43).

Após a delimitação do tema, o levantamento bibliográfico preliminar e a formulação do problema; para a consecução deste trabalho realizamos um plano provisório de assunto, no intuito de organizar e sistematizar as diversas partes do objeto de estudo, em seguida procuramos identificar fontes capazes de fornecer respostas para a solução do problema, utilizamo-nos de livros de leitura recorrente, obras de referências, periódicos científicos (GIL, 2002), além de leis, e demais materiais em fonte eletrônica, com vistas a identificar os momentos históricos, onde e como a educação esteve ligada ao cristianismo, destacando o pensamento de grandes educadores cristãos e fatos históricos dessa relação, bem como refletindo sobre seus princípios filosóficos, sua visão de mundo, suas concepções sobre a educação, métodos, recursos e sua herança cultural, além das críticas ao cristianismo e não se limitando a prática educativa institucionalizada, procuramos entender os princípios da fé cristã, bem como refletir sobre a complexidade do que abrange o termo cristianismo e suas contribuições sociais e educacionais atualmente.

A pesquisa bibliográfica foi procedida através de leitura exploratória, seletiva, analítica e interpretativa do material obtido, com a produção de fichas de apontamento (GIL, 2002). Tais medidas foram fundamentais para a e efetivação da pesquisa, uma vez que contribuíram grandemente para a retenção das ideias principais do texto e sua compreensão, produzindo comentários e notas com um olhar crítico, como também transcrevendo citações, o que permitiu melhor organização das ideias. Para essas medidas sempre foram considerados o problema e o objetivo da pesquisa.

No primeiro momento foi identificada a relevância e a contribuição de determinado material para a pesquisa, em seguida, o material fora selecionado e separado por temas, para então realizar a leitura analítica e interpretativa, com o objetivo de responder perguntas norteadoras da pesquisa: como, por que, qual o objetivo, quais as conexões com a atualidade, quais conteúdos preferidos e preteridos de determinada prática educativa do cristianismo, quais os recursos, métodos, intenções, visão de ser humano e de mundo, princípios, teorias próprios do ensino cristão, culminando na sua interpretação e inferências, suscitando novas discussões apresentadas no relatório final.

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O cristianismo enquanto segmento religioso da sociedade, que marca tão fortemente a história e a chamada cultura ocidental-cristã, possui uma vitalidade bem perceptível na atualidade, no entanto, sua relação com a educação pública vem diminuindo com o passar do tempo, embora não a deixe de influenciar, assim como não deixa de influenciar a sociedade como um todo. Todavia não se tem diminuído a sua relação com educação em seu sentido amplo, não é à toa que encontramos no cristianismo, a educação nas modalidades informal, não-formal e formal, esta última ainda presente nas escolas confessionais cristãs.

A laicidade do Estado, e seu desafio em manter o diálogo inter-religioso, mas sem “tomar partido”, permanece a fim de combater a intolerância principalmente dentro das próprias escolas e das universidades, nas quais todas as vezes que se propõem um debate sobre religião traz consigo grandes polêmicas, assim como demonstramos nesta pesquisa. No entanto, isso não justifica a reprodução de pensamentos enraizados e fechados como “religião não se discute”, o fenômeno religioso é algo presente e notável, assim sendo, as instituições religiosas influenciam grandemente a personalidade dos atores da sociedade, definindo princípios e valores que nortearam as suas ações, e que consequentemente influenciará as práticas educativas, no que concerne os princípios norteadores da educação, uma vez que esta objetiva a formação do ser humano segundo os princípios de uma sociedade e as igrejas estão inseridas no contexto da comunidade escolar.

A presente pesquisa nos permitiu perceber o cristianismo não meramente como uma religião que possui relação com a educação, mas como um processo educativo em si, porquanto possui uma concepção de ser humano, uma filosofia de vida, uma visão de mundo, e anseia pela transformação desse ser humano segundo os seus princípios, através dos seus “métodos” próprios. Uma vez que a concepção de educação modifica-se de acordo com o tipo de homem ou mulher que se quer formar.

A educação, enquanto pública e laica, não necessita ser anti-religiosa ou anticristã, como também o respeito à minoria ou à maioria não deve significar a deterioração do outro, assim com disposto na lei, a escola, neste sentido, deve garantir a liberdade de expressão e de escolha de cada indivíduo, sem que isso signifique uma ofensa à pessoa humana, onde discordar não signifique desrespeitar. Podendo o cristianismo fazer parte do cotidiano dos alunos, não pode ser ignorado, visto que o ensino deve considerar a cultura e a realidade do educando, o que não significa que a escola pública deva ser proselitista.

A tradição e a história do cristianismo tem legado a educação grandes contribuições que com o passar do tempo foram aperfeiçoados, portanto, a sociedade não precisa ver no cristianismo um inimigo, mas um aliado ao processo educativo, pois no interior das instituições religiosas existem políticas sociais, que favorecem a formação do individuo e seu engajamento social e não destoa dos objetivos educacionais, mas acrescenta à formação integral, assegurada na LDB, uma visão ainda mais holística onde o transcendente está inserido. Não é o cristianismo inimigo do conhecimento, ou mesmo da ciência, uma vez que reconhece seu valor, embora não a considere suficiente para apreensão da realidade.

O ensino de Jesus Cristo traz uma reflexão importante para a prática educativa: a exemplaridade. Não adianta um professor ensinar algo na escola, mas, no entanto, viver de maneira contrária ao que ensina, tal fato reforça uma concepção de “ensinar por ensinar” sem nenhum compromisso real com a prática educativa e com a aprendizagem. A análise do ensino Jesus, o qual busca desenvolver uma autoeducação dos seus seguidores, através de uma postura reflexiva, nos mostra e reafirma a discussão da separação dicotômica entre teoria e prática, assim, Jesus chama de hipocrisia o fato de ensinar algo e viver de outra maneira

No que diz respeito à afetividade vemos em Cristo uma preocupação bem à frente da sua época, uma vez que também é “recente” a quebra do paradigma racionalista dentro da educação, que abre espaço cada vez mais para contemplação do ser humano como um todo no processo de ensino-aprendizagem. Tal análise nos permitiu demonstrar que, sendo Cristo o centro da fé cristã ou o modelo a ser seguido pelos cristãos – como ele mesmo se descreve na Bíblia, não podemos considerar os cristãos em sua totalidade como seres alienados e não críticos. Ficando assim a provocação: será que por termos nascido no país que se autodetermina cristão, sabemos tudo sobre o cristianismo?

Quanto ao debate religioso fica o desafio próprio do jogo democrático da sociedade: a busca pelo diálogo e pelo respeito sem hipocrisia, uma vez que não deve ser pautado na imposição de opiniões ou de visões de mundo, mas que sendo o sujeito um ser autônomo, seja ele mesmo capaz de escolher sua filosofia de vida, incluindo, a concepção sobre a transcendência, embora não se reduzindo a esta.

8. REFERÊNCIAS

ARANHA, Maria Lúcia de Arruda. História da Educação e da Pedagogia: Geral e Brasil. São Paulo: Moderna, 2006.

ARAÚJO, Ulisses F. A dimensão afetiva da psique humana e a educação em valores. In: ARANTES, Valéria Amorim. Afetividade na Escola: Alternativa Teóricas e Práticas. São Paulo: Summus, 2003. p. 153-169.

BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida, Revista e Corrigida. São Paulo: SSB, 1995. 1408p.

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http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/pces118_09.pdf Acesso 12 Nov. 2012.

1 Na Redação da introdução optei por utilizar a linguagem na primeira pessoa do singular para situar o lugar de minha fala e a minha voz de pesquisador.

2 Evangelhos aceitos pela comunidade cristã como verdadeiros relatos sobre a vida de Jesus Cristo.

3Disponível em: ftp://ftp.ibge.gov.br/Censos/Censo_Demografico_2010/Caracteristicas_Gerais_Religiao_Deficiencia/tab1_4.pdfAcesso em 10 nov. 2012.

4 O termo “deus” será utilizado nessa pesquisa para se referir genericamente a qualquer divindade; será utilizado o termo “Deus”, para referir-se ao deus de Israel como um ser pessoal.

5 Compreende os primeiros cinco livros da Bíblia – livro sagrado dos cristãos. Refere-se também a tradição oral dos judeus.

6 Relação de Escolas Católicas, disponível em http://www.regiaose.org.br/forma/col.html. Acesso em 8 de set. 2012

7 O termo “evangélico” é utilizado geralmente em referência ao cristianismo protestante.

8 Informações sobre escolas associadas: http://www.acsibrasil.org/ e http://www.aecep.com.br/. Acesso em 8 de set. 2012.

9 As discussões sobre tais características do cristianismo serão apresentadas no próximo capítulo que trata do processo histórico estabelecido entre cristianismo e educação.

10 Embora saibamos que o conhecimento religioso ou teológico não se restringe a cosmovisão cristã, salientamos que no presente trabalho as discussões sobre esse tipo de conhecimento se restringirá ao cristianismo, porquanto este se constitui objeto de estudo da pesquisa.

11 Disponível em http://portal.mec.gov.br/dmdocuments/pces118_09.pdf. Acesso 12 Nov. 2012

12 Nome de Deus que, segundo a tradição judaico-cristã, Moisés teria recebido no Monte Horeb. Inicialmente na língua hebraica não havia notação de vogais; portanto, aparece no texto hebraico a grafia “YHWH”. Devido o temor que os hebreus possuíam pelo nome de seu deus, evitavam pronunciá-lo, substituindo pelo termo Adonai que significa Senhor, atualmente usa-se o “Jeová” ou “Javé” (Yahweh) como tradução (SABBAG, 2005).

13 Os textos bíblicos apresentados nesse trabalho foram extraídos de: BÍBLIA. Português. Bíblia Sagrada. Tradução de João Ferreira de Almeida, Revista e Corrigida. São Paulo: SSB, 1995. 1408p.

14 Alisaremos mais profundamente a os preceitos educativos de Jesus no próximo capítulo.

15 Proclamava que o Império Romano seria neutro a qualquer credo religioso, acabando oficialmente com a perseguição aos cristãos (JOHNSON, 2001).

16 No ano 800 surgiu o Sacro Império Romano Germânico, cujo principal imperador foi Carlos Magno (742-814), o qual se tornou um grande aliado da Igreja Católica, incentivou atividade intelectual nos mosteiros, propondo a reformulação do sistema de ensino, portanto esse período é conhecido como Renascimento Carolíngio (MOTA e BRAICK, 2002).

17 Compreende-se num grupo de Igrejas, surgidas após o Cisma do Oriente no século XI, quando as chamadas igrejas orientais separaram-se da Igreja Católica, as igrejas do oriente diferem do Catolicismo Romano primordialmente pelo reconhecimento da autoridade do Papa. Ademais, seus ritos e doutrinas são semelhantes (RAMPAZZO, 2004).

18 Variação de Raban, Raboni, ou Rabino, que significa “meu mestre” ou “professor” em hebraico (SABBAG, 2005).

19 Expressão latina que significa “da cadeira”.


Publicado por: JOSE EWERTON FEITOSA CRUZ

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