O LOUCO: BREVE LEITURA FILOSÓFICA DO INCONSCIENTE JUNGUIANO E DO TAROT

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1. RESUMO

Esta pesquisa propõe uma análise sobre o Louco do Tarot, figura arquetípica que sobreviveu ao tempo. O trabalho faz uma revisão bibliográfica a partir das interpretações que são feitas sobre o Louco em sua base como arquétipo. Esta pesquisa baseia-se na psicologia analítica criado pelo psiquiatra Carl Gustav Jung, sobre os arquétipos do inconsciente coletivo, que segundo o autor suíço denomina os arquétipos como forma de conhecimento. Dessa forma, busca-se compreender a importância do conhecer a Si-mesmo (Self), estabelecendo um diálogo filosófico entre a ciência esotérica do Tarot e o pensamento junguiano.

Palavras-chave:  Jung; Tarot; O Louco; Inconsciente Coletivo; Arquétipos; Self

THE FOOL: BRIEF PHILOSOPHICAL READING OF THE JUNGIAN UNCONSCIOUS AND TAROT

ABSTRACT

This research proposes an analysis of The Fool of the Tarot, an archetypal figure who has survived time. The work makes a bibliographic review from the interpretations that are made about The Fool in its base as an archetype. This research is based on analytical psychology created by the psychiatrist Carl Gustav Jung, on the archetypes of the collective unconscious, which according to the Swiss author calls archetypes as a form of knowledge. Thus, it seeks to understand the importance of knowing the Self, establishing a philosophical dialogue between the esoteric science of Tarot and Jungian thought.

Keywords: Jung; Tarot; The Fool; Collective Unconscious; Archetypes; Self

2. INTRODUÇÃO

Carl Gustav Jung pesquisou as camadas submersas e profundas da psique humana buscando determinar os arquétipos presentes nos sonhos, na mitologia, nos contos, nas lendas e nas artes visuais até chegar ao inconsciente coletivo e ao consciente pessoal. Nesse sentido, essa pesquisa intenta investigar a linguagem simbólica presente nas cartas do Tarot, na perspectiva de estabelecer relações possíveis do simbolismo estético (figuras) de suas Cartas com os simbolismos dos arquétipos junguianos.

Com esse propósito, optou-se pela escolha de um de seus principais Arcanos maiores, o qual não possui numeração no sistema numérico das Cartas do Tarot. São dois zeros , principio e fim ,que juntos formam  infinitamente a Carta  O Louco. Pretendemos, por assim dizer, ensaiar algumas reflexões filosóficas acerca da figura arquetípica d’O Louco. Analisaremos, portanto, o conceito d’O Louco em função das características antropológicas que essa Carta evoca, a saber, o pensar diferente, a coragem de arriscar-se lançar ao desconhecido, por questionar valores, por resistir à alienação, por recusar padrões impostos pela sociedade etc.

Tencionamos investigar ainda a correlação existente entre o arquétipo d’O Louco e o arquétipo do Trickster, os quais compõem uma das figuras psicológicas de Jung. O “trickster”, ao que parece, está presente na cultura de alguns povos desde os primórdios, como também na mitologia, na religião, e em personagens da literatura, nos desenhos animados, na TV e no cinema. Por causa de suas tolices  e travessuras  , é muitas vezes apresentado como herói, às vezes como vilão. Mas um Trickster pode ser um poltergeist:espirito zombeteiro, um deus ou uma deusa, homem ou mulher, metade humano e metade animal. Ele pode iludir por simples brincadeira, pode assustar, quebrar regras morais com o espírito brincalhão, pode influenciar no comportamento e na personalidade das pessoas etc. Como vemos, ele é uma representação puramente arquetípica das múltiplas máscaras (persona) da psique humana.

Diante do tema apresentado, O Louco: Breve Leitura Filosófica do Inconsciente Junguiano e do Tarot , buscaremos verificar qual é a função do Tarot como ferramenta que assume, dentre outros propósitos, o papel de conduzir ao autoconhecimento. Por isso, afirmam os praticantes dessa arte divinatória, o Tarot pode converter-se em ferramenta auxiliar para o conhecimento psicoemocional do consulente, pois ajuda na busca do autoconhecimento e na individuação, a qual leva o sujeito ao processo de desenvolvimento pessoal.

Para cumprir seu propósito, esse trabalho apresentará uma breve história da origem do Tarot, culminando na importância de uma das suas mais famosas e tradicionais versões, a saber, o Tarot Marselha. Em seguida, investigaremos os arquétipos junguianos, bem como os conceitos de inconsciente individual e coletivo.

Dessa forma, pretendemos problematizar e investigar filosoficamente a possibilidade de se estabelecer um vínculo entre a linguagem simbólica do Tarot e a linguagem psicanalítica dos conceitos junguianos aqui indicados. Além disso, buscaremos entender e demonstrar o conteúdo antropológico presente nas simbologias ocultas (arcanos) das Cartas do Tarot, visto que a arte empregada na leitura dessa simbologia, bem como a técnica para tal, permitem compreender o comportamento humano. De fato, a procura pelo Tarot começa através da curiosidade. Na maioria dos casos, as pessoas que o procuram desejam entender os conflitos pessoais, sanar dúvidas sobre a própria vida e existência, ou pelo simples fato de sentirem a necessidade de serem ouvidas. Assim, buscam possíveis respostas para suas perguntas.

É muito comum as pessoas buscarem o Tarot para realização de perguntas simples, ignorando completamente a sua própria razão. Por exemplo, a pessoa que amo, também me ama? Irei me casar e ser feliz? Encontrarei um emprego? Ora, estas perguntas sempre buscam por uma possível verdade oculta.

Nesse ponto, é importante salientar que as cartas do Tarot  como outros oráculos , são ferramentas de auxilio para esclarecer dúvidas ,que  funcionam  com base no pricipio da aleatoriedade. Isso segnifica que as cartas são escolhidas  como espécie de sorteio .É por isso ,que as cartas do Tarot  despertam tanto fascínio e admiração.

Vale destacar que o Tarot de Marselha, por exemplo, idealizado por Nicolas Conver, tem sido um instrumento muito usado por tarólogos e por estudiosos do mundo inteiro, com a finalidade tanto para fins divinatórios como psicoterapêutico, e levando o sujeito a uma análise de sua construção subjetiva a partir das vivências no cotidiano de sua vida pessoal. Essa construção passa pelos arquetípicos, conforme indica Carl Gustav Jung.

Por fim, a realização desta pesquisa tem o intuito metodológico de confrontar filosoficamente a “psicanálise junguiana” e o Tarot, com objetivo de compreender como os símbolos podem expressar um suposto saber que se encontra ao nível do inconsciente

3. Jung: o inconsciente pessoal e o inconsciente coletivo

Segundo Jung (2008), no inconsciente, se escondem experiências que foram reprimidas e desconsideradas pelo eu. São experiências dolorosas que trazem desconforto, conflitos morais e lembranças que se quer esquecer. Todas essas experiências são reprimidas, mas não eliminadas.

No inconsciente pessoal ou individual estão ocultos inúmeros traços da personalidade, traços esses que desagradam e, por isso, são ignorados. O inconsciente pessoal abrange um aglomerado de sentimentos e pensamentos carregados de forte potencial afetivo, os quais são incompatíveis com as atitudes conscientes. Se confundem com o espaço da consciência porque suas fronteiras são muito tênues.

O inconsciente é exclusivamente de natureza pessoal, muito embora tenha chegado a distinguir formas de pensamento arcaico e mitológico do inconsciente.Segundo o olhar de Jung,

uma camada mais ou menos superficial do inconsciente é indubitavelmente pessoal. Nós a denominamos inconsciente pessoal. Este porém repousa sobre uma camada mais profunda, que já não tem sua origem em experiências ou aquisições pessoais, sendo inata. Esta camada mais profunda é o que chamamos inconsciente coletivo (JUNG, 2000, p. 15).

No inconsciente pessoal, esses conteúdos são “complexos[1] ”de tonalidade emocional e constituem algo de muito pessoal, algo da intimidade da vida anímica, tornando-se, por isso, a fonte de todos os bons ou maus pensamentos. Segundo o autor, pode-se comparar o inconsciente pessoal a um reservatório no qual é guardado todo material que um dia já foi consciente.

Todavia, quando o Ego[2] não suporta essa carga, ele a transfere da esfera consciente para a inconsciente, onde entra em nível da “psique” que é comparado a uma espécie de receptor, o qual tem a função de receber todos aqueles conteúdos que não são capazes de se harmonizar com o processo de individuação[3].

Por outro lado, como já foi mencionado, Jung (2015) afirma que existem no inconsciente duas camadas. Uma “mais rasa”, que é o inconsciente pessoal, e outra “camada mais profunda”, chamada “inconsciente coletivo”. Com o termo coletivo, o teórico refere-se ao “universal”. Esse possui conteúdos e modos de comportamentos idênticos para todos seres humanos, ou seja, refere-se a “arquétipos” de uma natureza comum a todos os indivíduos.

Os “arquétipos”, por sua natureza, dizem respeito ao conteúdo psíquico que é capaz de ser conscientizado por todos os homens. Portanto, para o autor, apenas se pode falar de um inconsciente se apresentarmos provas de seus conteúdos. O conteúdo do inconsciente pessoal, segundo Jung (2008), são os complexos de acúmulos emocionais, que expressam a intimidade pessoal, a personalidade da vida anímica. Como diz o teórico,

o inconsciente contém, não só componentes de ordem pessoal, mas também impessoal, coletiva, sob a forma de categorias herdadas ou arquétipos. Já propus antes a hipótese de que o inconsciente, em seus níveis mais profundos, possui conteúdos coletivos em estado relativamente ativo; por isso o designei inconsciente coletivo (JUNG, 2008, p.24)

O “inconsciente coletivo “é uma parte da psique que se deve distinguir do inconsciente pessoal, justamente por não haver uma experiência pessoal nela contida. De fato, para esse teórico, os arquétipos dizem respeito ao que não foi adquirido individualmente, ou seja, pela experiência pessoal. Os “arquétipos”, nesse sentido, são inatos. No entanto, o inconsciente pessoal constitui-se em sua maior parte de complexos, o inconsciente coletivo é essencialmente constituído de arquétipos, assunto sobre o qual falaremos a seguir.

3.1. Os arquétipos junguianos

Desde os tempos de Platão, o termo “arquétipo” vem sendo utilizado para designar o primeiro modelo de antigas impressões sobre algo que já é intrínseco ao ser humano. Segundo Medeiros (2010, p. 135), o termo “Arquétipo” foi usado pelo filósofo Plotino para designar o modelo de todas as coisas existentes. Etimologicamente, a palavra se origina do grego (arché- = posição superior; princípio; -tipos = marca ou tipo). Na verdade, a apropriação e o uso do termo arquétipos se devem ao teórico suíço Carl Gustav Jung.

Ele redimensionou o conceito associando-o aos conjuntos de imagens primordiais que trazem o sentido das histórias construídas entre gerações, formando o conhecimento e o imaginário do inconsciente coletivo.Em suas pesquisas ,Jung afirma (1972.p.60),tais elementos não são de origem heriditaria ,e também não são adquiridos pelo individuo ,são proprias do ser humano ,e de natureza coletiva.

Segundo Jung(2000,p.16), o termo arquétipo não  chega a ser  usado por Santo Agostinho ,no entanto , sua idéia está presente na obra ''De divers is quaestionibus ",(idéias... que não são formadas,mas estão contidas na inteligência divina).  Valendo -se desses padroes ,Jung (1972,p.60) deu o nome arquétipos ,que segundo o autor ,trata-se de “um agrupamento de caracteres arcaicos que, em forma e significado, encerra motivos mitológicos” (JUNG, 1972, p. 60).

Nessa perspectiva, Jung entende que tudo aquilo que nos ocupa se refere ao conteúdo do inconsciente coletivo, por tratar-se de arquétipos arcaicos, primordiais e de imagens universais que existem desde o início dos tempos. Quanto às objeções apresentadas contra sua opinião, qualificando-a de "mística e fantástica", o próprio Jung (2000, p.16) se defende afirmando que tais acusações não têm razão de ser, pois, segundo ele,

o termo représentations collectives, usado por LÉVY-BRUHL [4]para designar as figuras simbólicas da cosmovisão primitiva, poderia também ser aplicado aos conteúdos inconscientes, uma vez que ambos têm praticamente o mesmo significado. Os ensinamentos tribais primitivos tratam de arquétipos de um modo peculiar. Na realidade, eles não são mais conteúdo do inconsciente, pois já se transformaram em fórmulas conscientes, transmitidas segundo a tradição, geralmente sob forma de ensinamentos esotéricos[5]. Estes são uma expressão típica para a transmissão de conteúdos coletivos, originariamente provindos do inconsciente (JUNG, 2000, p.16).

As expressões dos arquétipos também podem ser encontradas nos Contos de Joseph Campbell [6],“O Herói de Mil Faces”. Essas narrativas populares são repassadas de geração a geração ao longo dos anos. O conceito de arquétipo, todavia, só é aplicável a representações simbólicas com intuito de representar conteúdos psíquicos que ainda não foram elaboradas de maneira consciente. Dessa forma, Jung (2000, p.15) afirma que, “o arquétipo representa essencialmente um conteúdo inconsciente, o qual se modifica através de sua conscientização e percepção, assumindo matizes que variam de acordo com a consciência individual na qual se manifesta”.

O teórico, baseado em suas pesquisas, afirma que os arquétipos existem e que não dependem de uma fonte externa para se apresentarem. Segundo ele, os arquétipos estão presentes de forma viva, ainda que inconsciente, em toda psique. Por ser inconsciente, não significa que atue de forma menos ativa na vida pessoal, visto que instintivamente influenciam na maneira de pensar, sentir e agir  do indivíduo.

Segundo Jung (2000), alguns arquétipos permeiam o desenvolvimento da personalidade e estão muito próximos de cada um de nós, no nosso cotidiano. Eles são impulsionados pela psique quando uma situação típica aparece. Ao longo dos anos, a consciência desenvolve-se e o ser humano, que é um ser dependente de outros por natureza, precisa desenvolver habilidades para melhor adaptação social. O arquétipo desta adaptação, o teórico chama de persona. Sobre isso trataremos na próxima subseção.

Persona

A “persona”, palavra de origem grega, remete à palavra máscara, a qual, por sua vez, refere-se aquele conhecido adereço usada pelos atores no teatro grego. Para Jung (2008, p. 43), persona é a máscara ou o personagem que indivíduo cria para facilitar sua vivência em sociedade e a comunicação com o mundo externo, possibilitando desempenhar papeis exigidos pela sociedade. Enfim, em cada ambiente ou grupo social, os homens representam personagens. A persona também serve para esconder defeitos, ou características desagradáveis que possam vir a desapontar os outros.

No uso da persona, arquétipo de adaptação ou convivência, existe um lado positivo e outro negativo. No caso de um policial, por exemplo, este assume a persona de cumpridor das leis, passa segurança, isso é positivo, o lado negativo seria quando o mesmo sujeito assume essa máscara no seio familiar. Neste aspecto, ele deixa de desempenhar o papel de chefe de família, para agir como autoridade policial.

A persona também serve para proteger o indivíduo do si-mesmo, ou seja, de características internas que o incomodam, faces que o desapontam, por isso, muitas vezes escolhe se esconder, se ocultar, seja de si-mesmo, seja dos outros. Segundo Jung (2008, p. 165), como a persona expressa a face externa da psique, a mesma forma equilíbrio com face interna, as quais são os arquétipos da anima e animus, assunto a ser discutido.

Anima e Animus

O arquétipo “anima” é o lado feminino do homem, e o animus, por sua vez,  é o lado masculino da mulher. Segundo Jung (1964, p. 177), o homem, ao nascer, traz consigo a personificação feminina em seu inconsciente; como herança, suscita a imagem da mulher. Não é a imagem contendo uma aparência específica, mas é sim, uma imagem arquetípica, formada durante toda a existência humana, trazida por meio das experiências com o sexo oposto. O anima, sendo personificação psicológica feminina no homem, apresenta o seu lado sensível, amoroso e intuitivo. A mulher, por sua vez, possui a personificação masculina, carregando consigo o arquétipo animus, que influencia diretamente o seu comportamento, mostrando força, coragem e determinação.

No entanto, distante de seu âmbito psíquico, tanto o anima quanto animus se apresentam em forma de projeções. Segundo Jung (1964, p. 194), enquanto fenômenos inconscientes, estes arquétipos são responsáveis pelas relações íntimas com pessoas do sexo oposto, como, por exemplo, as paixões. Quando um homem se apaixona por uma mulher, ele está simplesmente buscando projetar a imagem de mulher perfeita que ele tem internalizado. Isso acontece também com a mulher quando se apaixona. Ela pode estar projetando o arquétipo do herói, a imagem do homem que ela tem internalizada. A pessoa que recebe a projeção, se a aceita, torna-se o portador. E quando a paixão acaba e o casal se separa, isso significa que nunca existiu a paixão, porque tanto o homem quanto a mulher foram apenas portadores de projeções de seus conteúdos internos.

Segundo Jung (2000, p. 101), para o homem, a mãe é a primeira a receber a projeção anima. Ainda quando criança, essa projeção se dá inconscientemente. E com o passar do tempo, a criança, ao se tornar adulta, transfere essa projeção para outras mulheres. Para o autor, a projeção é um processo inconsciente e automático, pelo qual um conteúdo inconsciente do sujeito é transferido para um objeto, fazendo parecer pertencer ao objeto. Neste caso, a projeção termina quando a pessoa se torna consciente de todo conteúdo ou de toda imagem arquetípica pertencente ao sujeito. No entanto, enquanto o animus ou anima projetam-se no sexo oposto, influenciando diretamente nas reações entres os sexos, o arquétipo sombra será responsável pelas reações com pessoas do mesmo sexo.  

Outro “arquétipo” que merece ser discutido aqui é o da sombra, a face negativa da personalidade. Sobre esse ponto, veja a seguir.

Sombra

O arquétipo da sombra é considerado por Jung, o lado “sombrio “da personalidade do indivíduo. Segundo Jung (2000), a sombra projetada pela mente consciente contém os aspectos ocultos, reprimidos e desfavoráveis da sua personalidade. O autor descobriu, a partir de suas pesquisas, que a sombra é concebida como a sede do mal, sendo imprescindível para o processo de individuação, pelo fato de conter no seu interior funções fundamentais para a vida. Nesse sentido, o reconhecimento da sombra, a sua importância e o seu confronto com ego, merecem todo apreço na busca do desenvolvimento da consciência.

Ele empregou o termo “sombra” para designar parte do inconsciente da personalidade porque ela quase sempre aparece em forma personificada no sonho do indivíduo. Para Jung (1964, p. 173), ela não é o todo da personalidade inconsciente: representa qualidades desconhecidas do ego, aspectos que pertencem a esfera pessoal e poderão vir a ser conscientes.

Por outro lado, a sombra também pode consistir em fatores coletivos que são gerados a partir da vida pessoal do indivíduo. Em outras palavras, o arquétipo da sombra não habita apenas o interior de cada indivíduo. Ela também está presente em determinados “grupos de pessoas”, como grupos religiosos, seitas ou até mesmo partidos políticos. Dessa forma, Jung (1964) explica o que lança a sombra sobre a luz, no sentido de permitir compreender o que justifica os atos de maldade e violência praticados entre os homens. Por isso, justifica que quando uma pessoa toma consciência de sua própria sombra, ela, muitas vezes, torna-se envergonhada de suas próprias tendências e impulsos, os quais muitas vezes nega existir em si mesma, mas que consegue perfeitamente ver nos outros. Coisas do tipo como o egoísmo, avareza, negligência, covardia, em resumo todos aqueles ditos pecados que já foram um dia confessado, dizendo: “não tem importância, todo mundo faz” (JUNG,1964, p.168).

Quando acontece de alguém ser tomado pela raiva, quando um amigo aponta uma falha, por exemplo, é provável que se encontre uma parte da sombra da qual não temos consciência. É natural, portanto, que ao descobrir suas sombras, o indivíduo se torne irritado com as pessoas que ele considera que "não são melhores do que [ele]".

Jung (1964) compreende que a sombra não consiste apenas no desprezo. Também se apresenta em atos impulsivos ou inconsiderados. Falam-se coisas sem pensar, despejando-se a maldade, magoando pessoas com palavras, com julgamentos precitados, gerando observações maldosas, levando outros indivíduos à má ação. Nesse sentido, as atitudes erradas, que são tomadas de maneira inesperada, podem colocar os indivíduos em situações que não criariam se eles estivessem conscientes das faltas cometidas por suas próprias sombras. Segundo o teórico,

o homem que está só, por exemplo, encontra-se relativamente bem; mas assim que vê "os outros" comporta-se de maneira primitiva e maldosa, começa a ter medo de o considerarem tolo se não fizer o mesmo. Entrega- se então a impulsos que na verdade não lhe pertencem (JUNG, 1964, p.169).

No entanto, ao se aproximarem de pessoas do mesmo sexo, os indivíduos podem tropeçar tanto na sua própria sombra, como também na delas. Embora perceba-se facilmente a sombra da pessoa do sexo oposto, ela não nos incomoda e pedimos desculpas com facilidade. Por isso, que nos sonhos e nos mitos, as sombras, na maioria das vezes, se apresentam como uma pessoa do mesmo sexo que o sonhador. Assim, ao observar os sonhos e as fantasias presentes no inconsciente, Jung (1964) percebeu que determinados aspectos dos indivíduos eram frequentes, e que cada um dependia de sua própria experiência pessoal na elaboração de suas sombras. Por isso, quando pesquisou a mitologia, descobriu que o mito é uma projeção do inconsciente coletivo e percebeu que isto é uma forma de expressão do inconsciente.

Jung (1964, p. 166) entendeu que a psique trilha o objetivo de ir de encontro ao seu próprio centro, tratando-se do retorno do ego as suas origens. Jung (ibidem, p.160) deu o nome a esse objetivo de individuação, fenômeno esse que não é repentino, mas um processo. A individuação é inata, porém, o processo depende do confronto do consciente com inconsciente. Deste confronto resulta o amadurecimento de componentes da personalidade e da união destes com a realização de um indivíduo único e inteiro. Por meio do processo de individuação, pode ocorrer o autoconhecimento ao se retirar as máscaras e as projeções lançadas ao mundo externo, as quais, na verdade, estão integrandos a si mesmos.

Esse processo não acontece de maneira simples e não acontece de forma direta, todavia ocorre através de um movimento circunvoluntório direcionado a um novo centro psíquico, o centro de toda personalidade: o Self. Sobre esse arquétipo, discorreremos.

3.2. O Self

O Self é o si-mesmo é o centro de toda personalidade. É dele que emana todo potencial enérgitico que a psique dispõe. Ele é responsável por organizar os processos psíquicos. Segundo Jung (2000, p. 303), o si-mesmo representa o objetivo do homem interior, o saber, a realização de sua totalidade e de sua individuação. O Self se apresenta como o principal arquétipo do inconsciente coletivo. Ele é responsável por ordenar, organizar, unificar e harmonizar os demais arquétipos, atuando nos complexos e na consciência.

Jung (1964, p. 196) considera que o núcleo mais profundo da psique é o Self e que ele aparece de forma simbólica quando o inconsciente deixa de ser dominante, levando o indivíduo a uma identificação parcial com seu anima ou animus, por meio dos sonhos. No sonho, este núcleo em geral se personifica e, caso se trate de um homem, surge a personificação da figura de um guardião, ou de um velho sábio, ou um mago. Caso seja uma mulher, manifesta-se então a figura feminina superior, uma deusa, uma sacerdotisa ou feiticeira.

O principal objetivo da personalidade é conhecer o Self. Trata-se, portanto, da busca pelo autoconhecimento. O teórico, em sua obra, diz que

o Self representa o objetivo do homem inteiro, a saber, a realização de sua totalidade e de sua individualidade, com ou contra sua vontade. A dinâmica desse processo é o instinto, que vigia para que tudo o que pertence a uma vida individual, figure ali, exatamente, com ou sem a concordância do sujeito, quer tenha consciência do que acontece, quer não (JUNG, 1983, p.116).

O Self vem de dentro para fora e baseia-se em escolhas conscientes. A escolha feita pela vontade não é escolhida porque será bem aceita ou porque agrada a sociedade. A escolha verdadeira é aquela cuja fonte é a própria vontade do indivíduo, pois, se não for dessa forma, então isso significa que é o ego quem está atuando para agradar, simplesmente por seguir regras morais estabelecidas.

Mas para se chegar a essa liberdade de escolha, é preciso alcançar o autoconhecimento. Quanto maior for o conhecimento do si-mesmo, maior é a consciência da vontade. Dessa forma, se dá a autoconsciência e, portanto, o exercício da individuação torna-se em liberdade.

O Self pode ser definido como um “amigo interior”, uma imagem que se guarda no íntimo (1964, p. 167). A imagem desse amigo, ou deus interior, pode produzir sentimentos de temor e respeito. Essa imagem é projetada em divindades externas, analogamente à maneira como acontece em algumas religiões, casos esses que o autor chama de “numinoso[7]”, ou seja, ocorrem quando o indivíduo, independentemente de sua vontade, é impulsionado a buscar a totalidade do si- mesmo, de uma maneira peculiar e particular.

por "função transcendente" não se deve entender algo de misterioso e por assim dizer suprassensível ou metafísico, mas uma função que, por sua natureza, pode-se comparar com uma função matemática de igual denominação, e é uma função de números reais e imaginários. A função psicológica e "transcendente" resulta da união dos conteúdos conscientes e inconscientes (JUNG, 2000, p.4).

Jung (ibdem, p.149) considera que, antes da formação do ego consciente, uma criança já possui o sentido de totalidade inato. E ao chegar na fase adulta, esse sentimento precisa se manifestar através da união do consciente aos conteúdos inconscientes presentes na mente. Esse processo ocorre mediante a função transcendente que caracteriza o próprio Self. O autor esclarece que

No entanto, cada indivíduo carrega consigo a imagem de uma divindade em seu íntimo, uma imagem particular influenciada pelo meio em que vive. O encontro dessa imagem arquetípica leva ao processo de individuação, sendo de extrema importância para o seu desempenho em sociedade. A interação entre o ego e o Self é um processo contínuo podendo expressar a individualidade da vida do indivíduo.

4. O que é o Tarot?

O Tarot é um jogo divinatório composto por 78 cartas, chamadas Arcanos. O termo “Arcanos” do latim arcanus, que significa “misterioso, enigmático”. Essas cartas são divididas em dois conjuntos distintos: o primeiro composto por 22 Arcanos maiores representa o caminho espiritual; o segundo, que tem 56 Arcanos menores, representa o caminho material. O primeiro conjunto abrange o mundo subjetivo e idealizado; o segundo, o universo concreto e formativo. Os Arcanos menores têm a finalidade de se reportarem à mente racional, ao mundo material e estão relacionados com a manifestação da forma da vida que se individualiza em um sujeito (microcosmo[8]). Já os Arcanos maiores se reportam àquilo que é ontologicamente universal. Eles representam forças da natureza que atuam sobre a mente subjetiva e todos os seres existentes. Representam potências que impulsionam todos os seres conforme o princípio de Autocriação da Vida. Os Arcanos maiores, portanto, representam um potencial (Energia) ou tendência de equilíbrio e unidade da Vida (macrocosmo).

Percebe-se claramente que há uma diferença estrutural entre esses Arcanos. Como afirma Nei Naiff (2009, p. 24), “a metodologia de estudo é diferente entre os dois e a construção está baseada no princípio do macrocosmo1 (arcanos maiores) e microcosmo2 (arcanos menores)”. Nesse sentido, os 56 arcanos menores são constituídos por quatro conjuntos denominados: ouros, espadas, copas e paus. Esses são popularmente chamados de “naipes” e, por sua vez, cada um deles contém 14 cartas. Destas, dez são enumeradas de 1 a 10, enquanto as quatro restantes são denominadas: pajem, cavaleiro, rainha e rei.

Os arcanos maiores abrangem 22 cartas, cada uma delas possui nome distinto e significado diferente e, portanto, são todas estruturadas com símbolos evolutivos, caracterizados simbolicamente por sua complexidade ornamental. Esses símbolos se voltam à mente abstrata, ao subjetivo e estão relacionados à criação e à constante dinâmica da vida. É nesse sentido que o Tarot, segundo Naiff (2009, p. 24), é uma ferramenta que pode ser usado para orientação pessoal (jogos, oráculos) ou busca do autoconhecimento (estudo, filosofia, meditação).

Ressalta-se que o tarot, assim como outras ciências esotéricas, a exemplo da astrologia e da numerologia, não está apta a responder qualquer tipo de assunto relativo ao futuro, uma vez que têm um campo de atuação espiritual específico . Por outro lado, o Tarot pode, em alguns casos, sugerir reflexões, indagações e possíveis respostas, mas é necessário que estas estejam situadas dentro no âmbito do razoável, isto é, que contemplem objetos ou objetivos possíveis e coerentes com existência individualizada.

O Tarot pode ser classificado como um alfabeto simbólico, transcendental, uma mensagem do inconsciente, uma ponte que interliga a alma e o espírito. Naiff (ibdem p. 324), assegura que o Tarot é um oráculo baseado na estrutura mental do ser humano e fatos da vida. Seus símbolos são transposições arquetípicas do comportamento humano e refere-se diretamente à existência do ser humano. Para Naiff (ibdem, id), o Tarot pode ser a arte mais diversificada existente em nossa era, sendo capaz de reunir todas as filosofias das ciências ocultas: a alquimia, o hermetismo, o gnosticismo, a astrologia, a numerologia, a cabala, a teosofia e a magia; sem, no entanto, formar qualquer vínculo direto com elas, tampouco dogmas ou doutrinas. De fato, o prelúdio das ciências ocultas consiste em uma certa confusão simbólica sobre o tarô, pois a maioria dos pesquisadores busca estabelecer ligações diretas quando só há conexões indiretas, um elo contínuo e jamais didático.

4.1. Tarot: jogo ou oráculo?

Há uma natureza sistemática por trás do Tarot, por esta razão, alguns estudiosos ressaltam que ele não pode ser reduzido a um simples passatempo, um entretenimento, uma simples brincadeira ou um mero jogo. Por exemplo, Jodorowsky e Costa (2016, p. 35) salienta que não se deve analisar uma carta individualmente. Na verdade, é preciso imaginar, quer dizer, estudar as relações simbólicas das cartas entre si. Devemos estudar a sistemática do baralho como um todo, como uma unidade dinâmica. O estudo deve acontecer de uma maneira coerente, ordenando as 78 cartas. De fato, os múltiplos símbolos contidos no Tarot, vistos como um símbolo final, formam uma mandala.

De acordo com Jodorowsky e Costa, Jung afirma que

a mandaIa é uma representação da psique, cuja essência nos é desconhecida: as formas redondas simbolizam, em geral, a integridade natural, enquanto as formas quadrangulares representam a tomada de consciência dessa integridade. Para a tradição hindu, a mandala, símbolo do espaço sagrado central, altar e templo, é ao mesmo tempo uma imagem do mundo e a representação do poder divino. Uma imagem capaz de conduzir quem a contempla a iluminação (JODOROWSKY; COSTA, 2016, p.35).

Na concepção dos autores, o Tarot deve ser ordenado como se estivesse construindo um templo, uma vez que, seguindo a tradição, um templo é uma unidade divina. E sua leitura não necessita de livreto para ser interpretada. Para isso, precisa ser contemplada, como se contempla uma obra de arte. Segundo eles, o Tarot compõe uma figura, uma mandala, que pode ser abrangida com um único olhar.

Figura 1: A MANDALA

Devemos ressaltar que o Tarot não é apenas uma ferramenta para videntes revelarem futuros hipotéticos, mas, segundo Jodorowsky e Costa (2016), está a serviço do autoconhecimento, como uma espécie de psicanálise na sua forma tradicional como tarologia. Semanticamente, o termo tarologia significa ciência do mistério, conhecimento do que está oculto.

Em conformidade com Bartlett (2015), o Tarot contém símbolos dotados de significados específicos. Usando uma variação mais simples, o Tarot possui uma linguagem simbólica que se expressa através de uma variação de símbolos arquétípicos. Baseando-se nisso, estudiosos acreditam que o estudo sistemático e, portanto, o conhecimento do significado implícito entre um símbolo e a relação deste com os demais símbolos em suas múltiplas características melhora o desenvolvimento pessoal do indivíduo, bem como a sua relação com os outros e com o mundo. A autora diz que

os símbolos e os arquétipos têm uma significação profunda, contemplando diferentes camadas e níveis de sentido: fazem-nos conhecer aquelas facetas mais secretas e subterrâneas que inconscientemente podemos decidir negar, reprimir ou afastar. Esta linguagem universal torna o Tarot uma ferramenta insubstituível para o autoconhecimento e para fazer escolhas no que toca ao futuro (BARLETT, 2015, p.13).

Para o autor, o Tarot contém uma forma objetiva de compreender os padrões e ações dos indivíduos no mundo. Misteriosamente, ele parece ter a  capacidade de “prever” acontecimentos que estão preste a acontecer, porque são na verdade possíveis. Para Bartlett (2015), talvez se trate da nossa reação inconsciente embasada nas imagens do Tarot no momento da leitura. Parece comum que o homem deseje orientação para decidir algo, ou apenas busque a confirmação para suas dúvidas ou convicções relativas a algum assunto ou questão. O Tarot, diz-se, pode ajudar a desenvolver a autoconsciência para que se possa realizar escolhas conscientes, quando se percebe as causas que estejam em andamento. Com efeito, ele pode orientar no que fazer, como fazer, ou não fazer. O fato é que os símbolos parecem poder indicar os caminhos possíveis que surgiram em determinada etapa do percurso da vida e, assim, aponta o melhor a seguir.

Bartlett (2015) indica ainda que o Tarot carrega muito poder e que é muito leitura dos símbolos, possibilitando a percepção do si próprio, preparando psiquicamente o interessado para se colocar receptivo às possíveis escolhas e, sobretudo, à autodescoberta.útil para orientar, pois ele estimula as sensações intuitivas do “saber” oculto e mostra o como agir na vida de acordo com o conhecimento obtido. As cartas costumam revelar a energia e o estado de espírito envolvente no momento da leitura dos simbolos,possibiltando a percepção do si próprio ,preparando psiquicamente o interessado para se colocar receptivo às possiveis escolhas e,sobre ,à autodescoberta.

Curiosamente, existem alguns mitos sobre o Tarot, e sobre estes, Bartlett (2015, p.14) esclarece que ele não é mau, tampouco diabólico.  Ela diz que o Tarot

está para além da nossa projeção do bem e do mal e limita-se a refletira energia do momentoe a pessoa que faz a leitura, mas   também podemos projetar nele  a nossa bondade e maldade. A utilização do Tarot é uma forma de nos tornarmos recetivos à sabedoria interior e ao conhecimento secreto. (BARLETT, 2015, p.14).

Nesse sentido, não é o Tarot que manifesta o bem ou o mal, mas sim a energia psíquica pessoal projetada é quem manifesta a bondade ou a maldade humana.  No entanto , devido à perseguição, por parte da Igreja Catolica, Bartlett (2015, p. 15), assegura que tudo que era considerado esotérico estava relacionado ao ocultismo,o Tarot passou a ser correlacionado às artes misticas e  por ignorancia e falta de informação era frequente as pessoas terem medo do seu poder. Foi nesse contexto, que o Tarot tornanou-se  alvo de desconfiança e muito preconceito. E, diga-se de passagem, que esse imaginário cultural ainda permanece na pisque individual e coletiva até os dias presentes.

É preciso, tornar claro, pois, que a prática do Tarot não está relacionada a nenhuma religião ou a credo. Ela é somente uma ferramenta que ajuda a revelar a  realidade acerca do saber interior e, por isso, inconsciente. É nesse sentido que Bartlett (2015, p. 15) entende que o Tarot é “o espelho da alma que reflete a sua imagem no momento que o observa”. Considera-se uma via simbólica que pode  ser percorrido a qualquer momento da vida para se descobrir verdades sobre o si- mesmo, revelando degraus ou percursos em direção da autodescoberta.

Por fim, as cartas do Tarot representam, de forma simbólica, espelhos das emoções da alma e das experiências escondidas no reduto inconsciente do ser. Como imagens na água, esses espelhos parecem vibrar com as ondulações provocadas por energias naturais (acontecimentos) como a do vento. O Tarot parece acompanhar esse movimento interno (inconsciente) da vida, reproduzindo essa imagem oculta no momento em que se decide contemplar o reflexo desse mistério.

4.2. A história do Tarot

Segundos os pesquisadores Jodorowsky e Costa (2016,p.22),não é possivel  afirmar precisamente quando ocorreu a criação do Tarot, tampouco seu local de origem. Não se sabe o que a palavra Tarot significa, e a qual idioma pertence.Também não se pode afirmar se ele sempre teve a forma atual, ou se foi o resultado do que teria começado na forma de um jogo árabe chamado naibbe (naipes: cartas), ao qual se agregaram, no decorrer dos tempos, os arcanos maiores e os arcanos menores chamados de “Trunfos”. Segundo Jodorowsky e Costa,

se quisermos imaginar a origem do Tarot (já em 1337, nos estatutos da Abadia de Saint-Victor de Marselha, se proibia aos religiosos os jogos de cartas), deveríamos retroceder pelo menos até o ano 1000. Naquela época, no sul da França e da Espanha, era possível ver, em santa Paz, erigidas muito próximas umas das outras, uma igreja, uma sinagoga e uma mesquita. As três religiões se respeitavam e os sábios de cada uma delas não hesitavam em discutir e se enriquecer do contato com membros das outras (JODOROWSKY; COSTA, 2016, p.23).

Há muitas teorias criadas sobre a origem do Tarot. Segundo Bartlett (2015), existem relatos que remetem para os ciganos, uma vez que, ao saírem do Estremo Oriente, trouxeram o Tarot para a Europa ainda na Idade Média. No entanto, segundo Hajo Banzhaf (1997), os primeiros registros sobre as cartas do  Tarot datam do século XIV, mencionadas por um monge dominicano, Irmão João, que viveu nas proximidades de Basileia e que citou o jogo em seu tractatus de morbus et disciplina humanae conversations (tratamento da doença e a formação de recursos humanos).

Muitos desses testemunhos antigos sobre a existência das cartas do Tarot se devem graças à Igreja Romana e às proibições de seu uso no decorrer dos séculos. Mas permanece um mistério em torno delas, se eram usadas para fins divinatório ou apenas lúdico. Para Banzhaf (1997), é possível afirmar que existiu, de fato, um jogo com quatro naipes que são a base das cartas atuais, as quais são justamente chamadas de Arcanos menores do Tarot, e que essas chegaram à Europa proveniente do mundo islâmico no século XVI, com o propósito de servir como um jogo de “passatempo”.

Para esse pesquisador, há muitas suposições sobre a origem das 22 cartas dos Arcanos maiores do Tarot. No entanto, a única certeza de que se tem é a existência de cartas antiquíssimas. Banzhaf (ibdem, id.), por exemplo, diz que

os conhecimentos dizem que elas refletem o Caminho da Iniciação ou as estações da jornada do herói, tal como são conhecidos, nos mitos e nos contos de fadas. Assim sendo, elas são a expressão das imagens arquetípicas da nossa alma, às quais C. G. Jung deu o nome de "arquétipos". A questão relativa à idade das cartas perde a importância quando nos tornamos conscientes de que as imagens que elas nos mostram remontam aos primórdios da consciência humana (BANZHAF, 1997, p.9).

Segundo Naiff (2015), no que diz respeito à utilização das cartas, registros mostram que, durante séculos, o Tarot foi utilizado, de modo simultâneo, tanto de forma oracular quanto lúdica, pois, na Europa, as cartas do Tarot eram utilizadas em torneios de jogatina. Na França, para distinguir a forma de utilização, se diz até hoje: tarot a jouer (tarô para jogar) ou tarot divinatoir (tarô para adivinhar).[9]   

Enquanto os primeiros jogos de Tarot mais antigos apresentavam uma grande variedade de cartas, no final do século XV, Banzhaf (1997, p. 10) diz que se formou um baralho, ainda usado atualmente, composto de 78 cartas. Este baralho logo foi chamado de "Tarô Veneziano” ou, de Tarot de Marselha. Os nomes se devem pelo fato de que ora se atribuía à cidade de Veneza, ora à Marselha.

Segundo Banzhaf (ibdem, id.), no final do século XVIII, o grande ocultista Etteilla (que, seguindo uma prática comum na época entre os ocultistas, escrevia seu nome de trás para a frente, Alliette) criou um Tarot, que se popularizou  rapidamente.

Tanto ele, quanto seu mestre, Coutt de Gébelin, achavam que as cartas procediam de uma época egípcia muito antiga. Em seu novo Tarot, Etteilla conseguiu corrigir falhas que, na sua opinião, tinham sido inseridas no jogo ao passar dos séculos. Porém, seu trabalho não foi visto com bons olhos pelo grande Éliphas Lévi e rejeitado por outros ocultistas e, assim, todas as atenções se voltam para o Tarot de Marselha.

Na década de 1930, Segundo Jodorowsky e Costa (2016, p. 25), o restaurador Paul Marteauo reproduziu o Tarot mais próximo do autêntico, traduzindo com imenso rigor toda a simbologia do Tarot de Marselha, fixando as tonalidades definitivas das cores e valorizando os moldes do Tarot de Nicolas Conver de 1760. O Tarot de Marselha deve sua consagração mundial, tanto a seu editor, quanto a habilidade de Marteauo como “restaurador".

Leonardo Chioda (2009), em seu artigo publicado no Site Clube do Tarô, destaca que o último trabalho de restauração e de grande apreciação foi realizado por Philippe Camoin, descendente direto e herdeiro da casa Nicolas Conver de Marselha, que imprimia desde 1760. Philippe Camoin uniu-se ao teatrólogo,cineastra ,poeta  e pesquisador do Tarot e do esoterismo, o chileno Alejandro Jodorowsky. Ambos realizaram uma grande pesquisa, até encontrarem no México um exemplar antigo do Tarot de Marselha.

Em 1998, concluiu-se o trabalho de restauração do Tarot de Marselha, recuperando as gravuras do clássico Tarot. Como os símbolos originais foram perdendo a autenticidade com tanto outras cópias, esse trabalho resgatou os símbolos e a estrutura do Tarot tradicional.

5. O Louco: o arquétipo não numerado do Tarot

Geralmente, as cartas do Tarot chamam atenção não apenas por sua beleza, mas também pela singularidade de suas imagens enigmáticas. Estas, para nós, são portadoras de uma simbologia que traduz a linguagem do inconsciente. Nesse sentido, pode-se pensar que o Tarot, através da sincronicidade[10] sistemática de suas imagens arquetípicas, possibilitam ao consciente lançar luz sobre aquilo que está no inconsciente. Por isso, faz sentido pensar que as imagens simbólicas do Tarot remetem aos arquétipos afirmados pela teoria junguiana. Tais arquétipos, portanto, são mistérios, ou, melhor dizendo, são respostas às perguntas que o Self precisa se apropriar ao nível do consciente.

Nesse sentido, o mistério sobre o inconsciente e seus arquétipos sempre foi o maior objeto de estudo de Jung (2000), o qual pesquisou a cabala, a astrologia, as obras de arte, as religiões e os símbolos impressos em oráculos com o objetivo de compreender a mente humana. Por isso, qualquer tipo de manifestação do inconsciente era de seu interesse. De fato, segundo Nichols (2006, p.16),

o Tarô tinha sua origem e antecipação nos padrões profundos do inconsciente coletivo, com acesso a potenciais de maior percepção à disposição desses padrões. Era outra ponte não-racional sobre o aparente divisor de águas entre o inconsciente e a consciência, para carrear noite e dia o que deve ser o crescente fluxo de movimento entre a escuridão e a luz (NICHOLS, 2006, p.16).

Os arquétipos se expressam do mundo interior para a realidade em forma de projeções de imagens e não acontecem de maneira espontânea. Na verdade, por acontecerem de maneira inconsciente, é muito natural que não se percebe sua importância. Todavia, sempre prestar mais atenção a essas projeções, elas servem de ferramentas para o autoconhecimento. Como diz Nichols (2006, p. 26),

contemplando as imagens que atiramos na realidade exterior, como reflexos de espelho da realidade interior, chegamos a conhecer-nos. Em nossa viagem através dos Trunfos do Taro utilizaremos as cartas como detentores da projeção (NICHOLS, 2006, p.26).

Seguindo a sugestão da autora, vejamos brevemente como essas projeções são significadas através do Tarot de Marselha14. As figuras representadas nesse Tarot, como já se sabe, são representações simbólicas. No entanto, como os arcanos retratam imagens arquetípicas, escolheremos apenas uma carta específica, a saber, O Louco.  

Figura 2: O LOUCO

Segundo Michael Foucault (1996, p. 11), nas sociedades existem um princípio de exclusão que cria o sentido e o sentimento de rejeição e interdição. Isso, para ele, refere-se à oposição entre razão e loucura. Foucault narra que, desde a alta Idade Média, ser considerado louco era ser excluído, visto que determinados discursos não poderiam circular em meio aos outros. Por isso, quando algum indivíduo era considerado louco, isso acarretava a anulação da sua palavra para que não ocorresse a invalidade da verdade, visto que o discurso de um insensato (louco) não condiz com o testemunho da justiça, a qual deve ser juiz na validade de um contrato.

Em contrapartida, muitas vezes, se atribuía ao louco certa oposição simplesmente por ele falar a verdade em oposição a determinados assuntos;  também lhe imputavam poderes sobrenaturais por falar sobre coisas escondidas, ou por prever o futuro, ou simplesmente por enxergar através de sua ingenuidade aquilo que outros não podiam perceber. Foucault (1970, p.11) diz que “através de suas palavras que se reconhecia a loucura do louco; elas eram o lugar onde se exercia a separação; mas não eram nunca recolhidas nem escutadas”.

Todavia, para o teórico, tudo isso hoje acabou e a palavra do louco não é mais ignorada. Ela é aceita, pois leva à busca do sentindo das ruínas de uma obra; a palavra do louco hoje articula-se naquilo que se diz e escapa. O louco, que parece viver sempre isolado em seu próprio mundo, tem muito a dizer.

O Louco, no conjunto das Cartas de Tarot, situa-se entre os chamados arcanos maiores, os quais, já foi dito, somam um total de 22 peças. Mas logo de início, há um fato curioso sobre esta carta. Ela não é numerada. O Louco, no sistema numérico do Tarot, possui a liberdade de transitar entre todas as demais, podendo inclusive interromper a qualquer momento uma sequência qualquer das intenções presentes na dinâmica em desenvolvimento. Essa interrupção repentina, ou perda do sentido, dá o significado arquétipico, portanto, da carta em questão: O Louco.

No Tarot de Marselha, o louco é figurado como uma espécie de andarilho acompanhado por um cachorro. Ele carrega um cajado e uma pequena trouxa. Aparentemente despojado, desatento e feliz, ele segue sua jornada. Esse personagem tão comum, representa um aspecto inconsciente da natureza humana, o qual parece sempre ignorar o sentindo da vida adotado pelo senso comum, no que diz respeito à felicidade.

Esse arquétipo expressa liberdade simplesmente por isolar-se e ignorar os valores sociais. Ele parece recusar uma vida de conforto cheia de regras, pois, sua única regra é ser livre. Sobre essa figura, Nichols (2006, p.28) diz que,

através do exame de outras possibilidades, [O Louco] terá escolhido o seu estilo de vida mais conscientemente; e, tendo feito as pazes com o seu impulso oculto de bancar o louco, pode encontrar maneiras de expressar essa necessidade no contexto de sua vida atual (NICHOLS, 2006, p.28).

O Louco é, portanto, um andarilho, enérgico, ubíquo e imortal. É o mais poderoso de todos os Arcanos do Tarô, segundo Nichols (2006, p.39). Por não ter um número fixo, é livre e, por esta razão, ele incomoda e perturba a ordem com suas estripulias. Com esse vigor, esse arquétipo atravessou séculos e segue mais vivo do que nunca como uma espécie de coringa nas cartas populares de baralho. De acordo com a autora,

o Coringa liga dois mundos - o mundo contemporâneo de todos os dias, onde quase todos nós vivemos a maior parte do tempo, e a terra não- verbal da imaginação habitada pelos personagens do Tarô, que visitamos de quando em quando (NICHOLS, 2006, p.39).

É da natureza humana manifestar essa força inconsciente, esse louco interior que impulsiona para a vida para além dos limites da ordem social. Sem o arquétipo do louco, a vida pareceria monótona, sem graça, sem aventura. O Louco é corajoso e não tem medo de seguir seus impulsos e nisso está velada uma sabedoria. Tal pesquisadora destaca que o Louco

é o símbolo do fogo prometeico, o Louco arquetípico personifica o poder transformador que criou a civilização - e que também pode destrui-la. O seu potencial para a criação e a destruição, para a ordem e a anarquia reflete-se no modo com que é apresentado no velho Taro de Marselha, onde o retratam seguindo à vontade, liberto de todos os estorvos da sociedade, sem ter sequer um caminho para guiá-lo; não obstante, enverga o traje convencional do bobo da corte, a indicar que ocupa um lugar aceito dentro da ordem reinante (NICHOLS, 2006, p.42).

Esse mesmo Louco, com seu bom humor, representa o bobo da corte, extrovertido e fofoqueiro, porém os reis os mantinham para alegrar e afastar o mal por acreditarem que bobo trazia sorte para corte. De forma semelhante, o Louco nos lembra o palhaço de circo, aquele sujeito completamente desajeitado, de sapatos grandes e rosto pintado. Nichols diz que, dessa maneira, o Louco funciona como ponte que liga dois mundos: o mundo desordenado do inconsciente e o mundo ordenado da consciência. Por essas características, O Louco muitas  vezes é ligado ao arquétipo do Embusteiro[11] e ao arquétipo do Trickster[12], do qual   falaremos mais à frente.

O momento em que o arquétipo d’O Louco mais se evidência na vida social é na juventude, quando o espírito se manifesta sempre jovial, livre de compromissos e responsabilidade[13]. Ainda de acordo com a teórica,

e porventura em reconhecimento, e reconhecimento tardio do potencial heroico da juventude, que a sociedade hoje tolera os trajes e o comportamento não-convencionais e até a ilegalidade nos jovens. O fato de que muita gente mais idosa também está adotando as roupas e os hábitos dos moços talvez indique uma tentativa inconsciente de estabelecer contato, em si mesmos, com um potencial heroico não realizado (NICHOLS, 2006, p.48).

Assim, parece sensato admitir esse arquétipo como uma força oculta da vida: reconhecer a loucura e admiti-la sem culpa é necessário em determinadas situações. Segundo Nichols (2006), se permitimos as boas-vindas d’O Louco ao nosso mundo, então podemos aprender com ele a voar. Nos permitimos oferecendo salvo-conduto a viagens; nos convidando para o mundo que nos comprometemos em ajudar.

No Tarot de Marselha, a carta O Louco, não numerada, é considerada o número zero, o que significa dizer o mesmo que o Nada. É interessante notar, que o conceito de zero não existia no mundo antigo, só apareceu na Europa no século XII. De acordo com os estudos de Nichols (2006, p. 53), a descoberta desse  “nada” despertou a capacidade do homem de pensar. A partir dessa  descoberta, criou-se o sistema decimal e, filosoficamente, concretizou-se o paradoxo de que o nada é alguma coisa, ocupa espaço e contém poder.

Por outro lado, o zero possui a forma circular, e a jornada da vida também é considerada como circular. Parte-se da intuição inconsciente da infância até a sabedoria na velhice. No entanto, a ideia de círculo como início e fim da jornada, sugere Nichols (2006, p. 57), significa (...) que o Louco do Tarô é o eu como prefiguração inconsciente do ego”. O Louco, portanto, represente algo interno, uma força, um instinto um impulso à individuação. O louco é a jornada inconsciente na busca do conhecimento.

Jung (2000, p. 279), por seu turno, define arquétipos como “uma tendência inata para gerar imagens com intensa carga emocional que expressam a primazia relacional da vida humana”. Uma espécie de registro que todos carregamos e permanece submerso no inconsciente. Os arquétipos carregam ou revelam características particulares de cada indivíduo, por isso, a partir da análise de símbolos e mitos, o teórico estabeleceu alguns arquétipos da personalidade. Uma espécie padrão de comportamento, imagens registradas no inconsciente coletivo, arquétipos que estão presentes na vida individuada: e um desses é o arquétipo do Tolo, do Trickster, do Coringa, do Palhaço, ou como é conhecido no Tarot, O Louco.

O Louco é, portanto, o simbolo da liberdade ,a  simbologia paradoxal que carrega o dom de se fazer rir até de si-mesmo. Não usa máscaras, mas ajuda outros a livrar quem está condenado a ter. O melhor jeito de aproveitar a vida, dizem os sábios, é não se levando a sério.

5.1. O Arquétipo do Trickster

Paul Radin, no livro Deus e o homem no mundo primitivo [1953], segundo Jung (2000, p. 253), estabelece uma literatura antropológica e psicológica, na qual apresenta o significado de trickster para designar uma figura ambígua e contraditória. A palavra deriva de trick que significa brincadeira e truque.

Radin (2000, p. 256) afirma que há provas óbvias sobre a natureza do Trickster na cultura dos Winnebagos[14], os quais são considerados os mais autênticos portadores do ciclo do trickster. Para os Winnebagos, esse mito não significa apenas um resíduo, pois é “demasiadamente divertido” e considerado um objeto de prazer não compartilhado. Na vida cultural deles, o mito trickster está sempre presente e "funciona” de fato se não sofrer nenhum tipo de alteração causada pelo contato com a civilização. Portanto, não há motivo para se questionar sobre o seu sentido e sua finalidade. Note-se que Jung estudou o trabalho de Radin sobre o processo civilizatório, o qual inicia seu ciclo com o arquétipo do trickster.

Figura 3: REYNARD: A RAPOSA

Para Jung (2000), expressar uma conclusão a respeito da figura do Trickster não é nada fácil. Em suas reflexões, o teórico assume ficar fascinado com o carnaval europeu na era da Igreja medieval e a inversão da ordem hierárquica, a qual se mantém nas festas carnavalesca ”até os dias de hoje. Os simbolismos deste tipo de festa sugerem a perseguição do diabo, como um simia dei (macaco de Deus), nesse sentido, ele aparece folcloricamente caracterizado como um diabo "logrado", como um "bobo". Isso, para Jung (2000, p. 251), expressa uma típica combinação tricksteriana que remete

(...) [à] figura alquímica de Mercúrio; por exemplo, sua tendência às travessuras astutas, em parte divertidas, em parte malignas (veneno!), sua mutabilidade, sua dupla natureza animal-divina, sua vulnerabilidade a todo tipo de tortura e - last buthot least - sua proximidade da figura de um salvador. Graças a essas propriedades, Mercúrio aparece como um daemonium ressuscitado dos tempos primordiais, até mesmo mais antigo do que o Hermes Grego.

Os traços tricksterianos de Mercúrio, por outro lado, podem ser comparados com as figuras folclóricas bem conhecidas, como, por exemplo, Dunga, João Bobo e o Coringa. Esses, sabe-se, aparecem como heróis negativos que conseguem pela estupidez o que outros não conseguem com rapidez e desenvoltura. Como são figuras míticas, não surpreendem que também ocorram fenômenos no campo do sobrenatural que apresentem traços tricksterianos, a exemplo das manifestações poltergeist que parecem acontecer em todas as culturas. E tal é muito comum onde haja crianças na pré-adolescência, por isso, Jung (2000, p. 251) assegura que “as travessuras engraçadas ou maliciosas deste espírito são tão conhecidas quanto seu baixo nível de inteligência, isto é, a tolice notória de suas comunicações”.

Para este teórico, quem pertence a um determinado círculo cultural e busca alguma “experiência” em algum lugar do passado, se sentirá tocado pela figura do trickster, considerado o salvador: este deus, meio homem, meio animal. Também é um ser teriomórfico [15]e divino, cuja características permanecem tão impressionantes quanto a inconsciência. No entanto, a figura do trickster aparece sempre como alguém abandonado e rejeitado pela comunidade que abdica do estado de consciência. Nesse sentido, Jung (2000, p. 259) ressalta que,

o "trickster" é um ser originário "cósmico", de natureza divino-animal, por um lado, superior ao homem, graças à sua qualidade sobre-humana e, por outro, inferior a ele, devido à sua insensatez inconsciente. Nem está à altura do animal devido à sua notável falta de instinto e desajeitamento. Estes defeitos caracterizam sua natureza humana, a qual se adapta às condições do ambiente mais dificilmente do que um animal. Em compensação, porém, se candidata a um desenvolvimento da consciência muito superior, isto é, possui um desejo considerável de aprender, o qual também é devidamente ressaltado pelo mito.

Todavia, Jung (2000) destaca que o trickster continua sendo uma grande fonte de inspiração e divertimento que atravessa o tempo através das civilizações, estando presente, como se demonstra, nas permanentes figuras carnavalescas e  palhaços de circo .

O autor afirma que o trickster é uma figura da sombra coletiva que une todos os traços de caráter inferior, uma vez que a sombra individual se torna peça que nunca se ausenta da personalidade, sendo novamente gerada a figura coletiva a partir dela.

Mas nem sempre ocorre de maneira mitológica. Nos tempos recentes, é recorrente a repressão crescente dos materiais míticos, os quais são projetados   sobre outros grupos sociais e mesmo a outros povos.

 Segundo Jung (2000), se estabelecermos um paralelo entre o "trickster" e a sombra individual, descobriremos que a sombra, por mais que seja uma figura negativa, deixa avistar muitos traços ou associações positivas, os quais apontam para um outro tipo de cenário. É como se ocultasse conteúdos significativos sob um revestimento inferior.  Jung, afirma que, por meio da experiência é possível confirmar a hipótese; que visivelmente as coisas ocultas em geral consistem em figuras cada vez mais numinosas.   

5.2. As funções psicológicas do Trickster

Em seus estudos, Hynes e Doty (1993, p. 14) contextualizam a palavra trickster no âmbito antropológico de sua criação, século XIX, e creditaram a palavra ao etimologista Daniel Brinton [16]que a inseriu no livro The Myths of the New World, em 1868. Hyde (1998, p. 355), afirma que  esse termo foi apresentado no sentido antropológico por Franz Boas[17], em 1898, no livro Traditions of the Thompson River Indianism. No século XIX, segundo Hynes e Doty (1993, p.14),  Benjamin Disraeli  usou o termo trickster para descrever opositores políticos mentirosos do partido. Hynes e Doty (ibidem), nos diz que o uso do termo em inglês reporta-se ao século XVIII e, de acordo com o Oxford English Dictionary, a palavra aparece não mais no sentido antropológico e cultural, mas designando pessoas que costumam trapacear e enganar.

Figura 4: O CORINGA

Na  contemporaneidade,  que  o  termo  tornou-se  muito  popular.  De fato, escritores e teatrólogos voltam a usar a figura do trickster, assim como Aristófanes utilizou em suas comédias, como também aparece na era renascentista e na literatura em geral. Hoje, pode-se ver o alcance do Trickster até no cinema.

No entanto, por sua riqueza diversa e múltipla, não é fácil determinar o Trickster como um fenômeno único. Segundo Hynes e Doty (ibdem, p. 14), muitos teóricos de diversas áreas, como a antropologia, a filosofia e a literatura, passaram a realizar inúmeros estudos sobre tal arquétipo.

Os estudiosos como Radin, Jung e Kerényi determinam o Trickster como uma representação arquetípica da psique humana. O Trickster, nesse sentido, remete a um estágio “primitivo” de consciência, ou seja, como outros arquétipos, ele refere-se a um segredo, um mistério oculto no inconsciente coletivo.

Outros cientistas sociais procuraram identificar a figura do Trickster comparando-o a fatos míticos presentes em diferentes culturas. Estes buscaram associar características de diferentes sociedades através de uma análise comparativa de funções sociais, de métodos psicológicos, de religiões e ritos.

Como está claro, por sua natureza complexa e por sua diversidade e adaptabilidade a muitas culturas ao longo da história das civilizações, torna-se impossível uma definição conceitual da figura do Trickster. É nesse sentido que Hynes e Doty (1993) afirmam ser o Trickster um ser contraditório quando comparado a tantos outros personagens presentes em muitas narrativas. No entanto, os autores dizem que o Trickster pode

ser um deus, deusa, espírito, homem, mulher ou animal antropomórfico que prega peças ou de outro modo, desobedece às regras normais e ao comportamento convencional. Aparece como o herói cultural, a anti-herói, o demiurgo, o mensageiro, personagem-animal, o clown, o outsider, o tolo,o piadista, o bufão egoísta, o pícaro, o enganador, o iniciado e transmorfo (HYNES e DOTY, 1993, p.24)

O fato é que, para esses teóricos, há muitos personagens com características tricksterianas, em que esse termo pode ser aplicado. Ora, personagens como o Coelho Brer, o Coyote, a Wakdjunkaga (da cultura norte- americana); o Exu (da cultura Yoruba), A Legba (da cultura africana); Hermes e Mercúrio, Prometeus, Dionísio ( da Mitologia grega) , Loki ,(da Mitologia Nórdica), Curupira e o Saci-Pererê(do folclore brasileira) ,realmente parecem apresentar características tricksterianas. Figuras contemporâneas  presentes nos quadrinhos, nos animes, nas animações, em jogos eletrônicos, no cinema e na literatura também podem ser classificados como personagens tricksterianos. Por exemplo, Sancho Pança ,sempre a adivertir  o amo aos perigos e “romenizando ”as ideias de  nobreza de Quixote  quanto ao perigo próprio ; Don Juan , João Grilo ,Cancão de fogo dos livros de cordel., Jack Sparrow, o Coringa  e Alerquina da DC Comics ,o Coelho Pernalonga, o Coyote e o Papa-léguas, e o Pica-Pau,pricipalmente os desenhos mais antigos.

Figura 5: O PICA -PAU

O papel do Trickster parece consistir em desenvolver a criatividade humana através de experiências, de viagens e aventuras pelo mundo desconhecido. E tais aventuras e experiências, outra coisa não o são, do que o processo de individuação junguiano; experiências pelas quais a criatividade e a percepção sejam ativadas proporcionando transformações e mudanças.

O Trickster, ou O Louco, carrega particularidades também de destruição e conflito, as quais, por vezes, impedem o indivíduo e a sociedade em geral de avançar e progredirem, permanecendo ocasionalmente paralisada e imóvel diante de desafios.

Em contrapartida, isso lhe confere também papel de herói salvador, revolucionário, uma vez que O Louco assume a posição de quem quebra regras e mistura várias categorias criando combinações, desvios e possibilidades. Todas as ideias combinam, tornando-se uma grande potência de criatividade que contribui para uma nova revolução do indivíduo e da sociedade. Na aparente loucura d’O Louco, portanto, existem, por assim dizer, funções que funcionam como alívio para frustrações sociais impostas, pois, às vezes, em seu processo de individuação, o  indivíduo é obrigado a tornar-se um mártir que quebra regras para beneficiar o si- mesmo e a própria humanidade.

De modo contrário, segundo Hynes e Doty (1993, p.33), o Louco é levado a transgredir limites, cruzar fronteiras e todos os limites físicos e sociais. Ele torna o indivíduo um andarilho que frequentemente quebra regras sociais, enfrenta autoridades e chega mesmo a refletir sobre suas ações e sobre a alienação. O Louco, ou Trickster, portanto, é um herói, ou anti-herói, que segue confundindo as distinções possibilitando ao indivíduo repensar os velhos conceitos de certo e errado, os tradicionais padrões de beleza e feiura, o sagrado e o profano, o limpo e o sujo, o masculino e o feminino, o jovem e o velho, a vida e a morte.

6. CONCLUSÃO

Ao longo da pesquisa, percebe-se que o significado arquétipo d'O Louco no Tarot se encontra referido filosoficamente ao cotidiano, assim como Jung também remete seus arquétipos à vida cotidiana. Nesse sentido, é que O Louco também se encontra representado tanto nas Cartas do Tarot como também nas manifestações dos sonhos, dos mitos, das lendas e dos contos e na figura do Trickster. O autor Sueco considera que tais manifestações são arquétipos representados por conteúdo do inconsciente, os quais passaram por modificações por meio de sua conscientização e percepção, assumindo nuances que irão variar dependendo da consciência individual na qual será manifestada.

O Louco surge como uma espécie de herói que representa a liberdade. Ele não tem medo de arriscar, em momentos difíceis da vida, os seus sonhos mais improváveis. Ele representa a ruptura com a sociedade padronizada e alienada. Ele age pela emoção, sempre seguindo seus instintos, efetivando assim a sua individuação.

Portanto, o arquétipo d'O Louco, como qualquer outro, na visão de Jung, constitui uma correlação indispensável da ideia do inconsciente coletivo, indicando a existência de determinadas formas na psique, que estão presentes em todo tempo e em todos os lugares.

O Louco no Tarot simboliza a transformação e a renovação ao personificar a essência central da psique, a força condutora que Jung denominou “eu”, ou seja, o si-mesmo: o Self. Por isso, muitas pessoas quando se encontram indecisas, buscam respostas no Tarot, porque por meio da projeção arquetípica do consulente, feita através das Cartas, acredita-se ser possível a conexão entre o consciente e o inconsciente, fazendo assim emergir os símbolos arquétipos como respostas.

Portanto, procurar respostas para a existência, considerando-se os problemas da vida, ao usar meios não racionais e métodos para alcançar satisfação de forma rápida, na verdade, é um hábito antigo. Ainda hoje, é prática comum consultar divindades, realizar rituais, consultar um oráculo etc. Parece, portanto, que a maior parte da humanidade ainda não possui a capacidade de pensar por si-mesmo e buscar respostas racionais com base na autonomia do pensar. Isso parece revelar que ainda é bastante difícil a atividade de pensar e criar soluções e novos conceitos para se explicar a vida individual.

Nesse sentido, nossa pesquisa constatou que, segundo Jung, o homem carrega suas próprias respostas, mas tem dificuldade de acessar essas informações, porque elas não estão à disposição imediatas no consciente, mas, sim no inconsciente. Dessa forma, ao longo dos anos foram elaboradas linguagens simbólicas, as quais somente podem ser decodificadas por intérpretes capacitados. A estrutura da linguagem simbólica é vista através de arquétipos.

Esses arquétipos estão representados em diversas culturas através de arquétipos do inconsciente coletivo, e isso geralmente na forma de símbolos. E esses símbolos, demonstrou Jung, estão, por exemplo, presentes nos sonhos e nos símbolos religiosos e, conforme nossa pesquisa sugere, também nas Cartas do Tarot.

De fato, a obra de Jung no campo da psicologia analítica deixou uma vasta contribuição para autoconhecimento. Para lidar melhor com nossos conflitos internos, precisamos tomar consciência deles, dando condições para que se manifeste a potencialidade. Foi com esse objetivo que recorremos ao trabalho de Jung, para entender como os arquétipos auxiliam na compreensão de acontecimentos possíveis na vida pessoal de sujeitos, os quais estão impreterivelmente vinculados ao inconsciente coletivo.

Nesse contexto, a utilização da linguagem estético-simbólica presente no Tarot pode ser compreendida como um instrumento que pode auxiliar na verbalização/interpretação dos mistérios ocultos (Arcanos) no inconsciente. Assim, a técnica do jogo divinatório do Tarot consiste na projeção intuitiva do inconsciente para responder questionamentos ou mesmo formular perguntas sugeridas pela escolha simbólica de uma imagem.

Há dificuldades para que um sujeito possa expressar com palavras determinadas emoções, sentimentos, desejos, medos etc. e, por isso, as Cartas se tornam eficientes. Elas oferecem a oportunidade para se realizar a conexão entre as imagens simbólico-estéticas e os arquétipos simbólicos do inconsciente, possibilitando, assim, a verbalização.

Por fim, destacamos filosoficamente que esta pesquisa traz contribuições para estudos das ciências esotéricas despertando o interesse daqueles que desejem compreender a essência do Tarot, razão pela qual futuramente pretendemos dar continuidade a essa pesquisa.

7. REFERÊNCIAS

BANZHAF, Hajo. As Chaves do Tarô. São Paulo: Editora Pensamento Lida,1997.

BARTLETT, Sarah. A Bíblia do Tarot: Amadora. Portugal: Editora Nascente, 2015.

CALLEJA, Maria Antônia Álvarez de. La Figura del Tistckter en Paisaje Lierario Norte Americano, Odisea In: Revista de Estúdios Ingleses, Vol.8. Almería: Editora Universidad de Almería, 2007.

CHIODA, Leonardo. A restauração do Tarô de Marselha por Philippe Camoin e Alejandro Jodorowsky. 2009.

Disponível em: http://www.clubedotaro.com.br/site/h2317_Marseille-Camoin.asp

FOUCAULT, Michel. A Ordem do Discurso. São Paulo: Edições Loyola, 1996.

HUMBERT, Elie. Jung. São Paulo: Editora Summus,1985.

HYDE, Lewis. Trickster Makes This World: Mischief, Myth, and Art. Nova York: Farrar, Straus and Giroux, 1998.

HYNES, William; DOTY, William. Mythical Trickster Figures: Contours, Contexts, and Criticisms . Tuscaloosa: University Alabama Press,1993.

JODOROWSKY, Alejandro; COSTA, Mariane. O Caminho do Tarot. São Paulo: Editora Campos, 2016.

JUNG, Carl Gustav. A Natureza da Psique. Petrópolis: Editora Vozes, 2000.

_____.  Fundamentos de Psicologia Analítica. Petrópolis: Vozes, 1972

_____.  O Homem e seus Símbolos. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira,1964.

_____.  Os Arquétipos e ο inconsciente Coletivo. Petrópolis: Vozes, 2000.

_____.  Psicologia e Religião. Petrópolis: Vozes,1978.

_____. Espiritualidade e transcendência. Petrópolis: Editora Vozes, 2015.

_____. O Eu e o Inconsciente. Petrópolis: Editora Vozes, 2008.

MEDEIROS, Fernando da Silva. Um Mar de Possibilidades. São Paulo: Editora Biblioteca 24horas, 2010.

NAIFF, Nei. Curso completo de tarô / Nei Naiff.  Rio de Janeiro: BestBolso, 2015.

NICHOLS, Sallie. Jung e o Tarô: uma jornada arquetípica. São Paulo: Editora Cultrix, 2007.

SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. São Paulo: Matese, 1965.

SPONVILLE André Comte. São Paulo: Editora: WMF Martins Fontes, 2003.

TAMBIAH, Stanley. Múltiplos Ordenamentos de Realidade: o debate iniciado por Lévy-Bruhl. São Paulo: Cadernos de Campo, 1991.

REFERÊNCIAS DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 – A Mandala :Disponível em: Acesso em 10 dez. 2019

Figura 2 – O Louco. Disponível em: Disponível em:   Acesso em 04 nov. 2019

Figura 3 – Reynard: a Raposa. Disponível em: Disponível em: /> Acesso em 12 dez. 2019

Figura 4 – O Coringa. Disponível em: Acesso em 12 dez. 2019.

Figura 4 – O Pica-Pau. Disponível em: http://www.anos80.com.br/desenhos/pica_pau.html > Acesso em 29 dez. 2020.


[1] Ao questionar o que são realmente os complexos concebidos por Jung (2000), o Prof. Walter Boechat entende que o autor suíço quis designar com o termo complexo afetivo um grupamento de representações mentais mantidas juntas por emoção. Os complexos se organizam a partir de experiências emocionais significativas do indivíduo. Conf. Walter Boechat, A teoria dos complexos de C. G. Jung aplicados ao estudo da cultura. Disponível em: . Acesso em 11 jan. 2019.

[2] Sobre o ego, Jung (2000, p. 29) esclarece que ele é um dado complexo, formado primeiramente por uma percepção geral do nosso corpo e existência, e a seguir, pelos registros da nossa memória. Esses dois fatores são os principais componentes do Ego, que nos possibilitam considerá-lo como um complexo de fatos psíquicos. A força de atração desse complexo é poderosa como a de um ímã: é ele que atrai os conteúdos do inconsciente, daquela região obscura sobre a qual nada se conhece. Ele também chama a si as impressões do exterior que se tornam conscientes do seu contato. O Ego é o centro de nossas atenções e de nossos desejos, sendo o cerne indispensável da consciência”.

[3] Para Jung (2008, p. 60), individuação é processo pelo qual o homem torna-se um ser único. Podemos, pois, afirmar a "individuação" junguiana como um "tornar- se si-mesmo" ou "o realizar-se do si-mesmo”.

[4] Segundo Tambiah (2013, p. 22), Lucien Lévy-Bruhl (1857-1939) foi um filósofo nomeado à cátedra de história da filosofia moderna na Sorbonne em 1904. Teve seus primeiros trabalhos publicados na área de filosofia, e o mais importante deles tratava sobre o “positivismo cético e esclarecido”, intitulado: A moral e a ciência dos costumes, de 1903, sucedido por outros seis volumes acerca do tema da “mentalidade primitiva”. A grande contribuição de Lévy-Bruhl foi ter permitido uma compreensão dos fatores irracionais no pensamento e nas religiões primitivas.

[5] Esotérico e Exotérico. De esô, em grego dentro, daí esotérico significar o que pertence a um círculo íntimo ou a iniciados. Nas antigas religiões e nas antigas seitas, fala-se em conhecimentos esotéricos, que são os pertencentes apenas aos iniciados. E conhecimentos exotéricos, que são proclamados em público. A Filosofia, na Grécia, é exotérica, tendendo a se tornar pública. A imprensa facilitou, entre nós, que se tornasse o conhecimento cada vez mais exotérico, e a característica da nossa cultura está em grande parte nesse tornar público o conhecimento, isto é, em seu exoterismo, em oposição à característica do saber egípcio e do grego, em seus primórdios que eram acentuadamente esotéricos. Conf. SANTOS, M. F. dos. Dicionário de Filosofia e Ciências Culturais. 3. ed. São Paulo: Matese, 1965. Esotérico é o que é reservado aos iniciados ou especialistas. A palavra, tomada em si, não é pejorativa. Mas passa a ser, legitimamente, se a iniciação mesma for reservada a alguns, especialmente se supõe uma fé previa. É submeter o universal ao particular, a escola à seita e o espírito ao guru. Conf. COMTE-SPONVILLE, André. Dicionário Filosófico. Tradução de Eduardo Brandão. São Paulo: Martins Fontes, 2003.

[6] Joseph John Campbell (White Plains, 26 de março de 1904 — Honolulu, 30 de outubro de 1987) foi um mitologista, escritor, conferencista e professor universitário norte-americano, famoso por seus estudos de mitologia e religião, e autor da obra O Herói de Mil Faces, publicado originalmente em 1949. Disponível em:< https://pt.wikipedia.org/wiki/Joseph_Campbell> Acesso em 28 jan. 2020.

[7] Rudolf Otto julga o "numinoso" um efeito dinâmico não causado por um ato arbitrário. Pelo contrário, o efeito se apodera e domina o sujeito humano, o qual de criador, passa a vítima. Qualquer que seja a sua causa, o numinoso constitui uma condição do sujeito que é independente de sua vontade. (...) Grande número de práticas rituais são executadas unicamente com a finalidade de provocar deliberadamente o efeito do numinoso, mediante certos artifícios mágicos como, por exemplo, a invocação, a encantação, o sacrifício, a meditação, a prática da ioga, mortificações voluntárias de diversos tipos etc. (Jung, p. 1978).

[8] O microcosmo é o animal e por vezes o homem e o macrocosmo é o mundo, esse tema filosófico é antigo, que nasceu da tendência a interpretar todo o universo com fundamento no universo menor, que é o homem para si mesmo. Disponível em :< http://www.filosofia.com.br/vi_dic.php?pg=2&palvr=M> Acesso em 28 jan. 2020.

[9] Nesse contexto, há um fato curioso que diz respeito à confecção das cartas: somente homens poderiam ilustrar e fabricar as cartas. As mulheres as usavam de forma oracular. Lembrando que (é antiga a tradição da mulher como sibila). Segundo Naiff (2015, p. 14), o primeiro homem a usar de formar oracular foi o francês Etteilla, por volta de 1780, e a primeira mulher a desenhar um Tarot foi Pamela Smith em 1910

[10] Para Jung (1964, p. 291), a sincronicidade é um Princípio de Relação causal. Esse conceito parte da hipótese de um conhecimento interior inconsciente ligado a um acontecimento físico, esse último, portanto, é o resultado de uma condição psíquica. Desse modo, compreende-se que um determinado acontecimento que parece "acidental" ou "coincidente " pode, na verdade, possuir significado psíquico bastante expressivo, cujo significado é, muitas vezes, indicado simbolicamente através de sonhos que coincidem com o acontecimento.

[11] Na cultura nordestina , o Cancão de Fogo é um herói popular dos contos, versos e anedotas pitorescas ,é visto como um triskter nos livros de cordel e na literatura brasileira.Segundo Mª Antonia Álvarez de Calleja (2007, p. 36), a tradução do termo Trickster remete a palavra embusteiro, cuja conotação parece negativa. Tais personagens, na verdade, muitas vezes são apresentados como fonte de entretenimento ou um símbolo cultural, os nativos americanos, por exemplo, usam o coiote porque  esse é considerado um animal sagrado, um símbolo de continuidade e resistência cultural, num momento de fragmentação que exige humor e ironia.

[12] O Trickster é um ser originário “cósmico” e de natureza divina-animal, por um lado, superior ao homem, graças à sua qualidade sobre-humana superior ao homem, graças à sua qualidade sobre-humana e, por outro, inferior a ele, devido à sua insensatez inconsciente (JUNG, 2000, p. 259).

[13] Quem um dia, não colocou uma mochila nas costas e foi viajar? Ou que esteve cansado e procurou viajar para um lugar desconhecido? Muitas vezes, chega-se a pensar que se trata de uma fuga, mas na verdade, o ser precisa vivenciar o arquétipo do louco.

[14] Segundo Jung (1964, p.112), os winnebagos são uma tribo de índios norte-americana.

[15] Significado de teriomórfico: que tem forma de animal. Disponível em: Acesso   em 12 dez. 2019.

[16] Daniel Garrison Brenton (1837 -1899) foi um arqueólogo e etnólogo dos Estados Unidos. Disponível   em:< https://pt.wikipedia.org/wiki/Daniel_Garrison_Brinton> Acesso em 10 jan. 2020  

[17] Franz Boas (1858-1942) foi um antropólogo Alemão naturalizado norte-americano e considerado um dos pais da antropologia moderna, instaurou uma forma mais científica de estudar a antropologia, por meio da obrigação de fazer trabalhos de campo extensos. Ele reagiu contra o evolucionismo e estabeleceu o relativismo cultural. Sua obra se estende a todos os âmbitos da antropologia, desde o biológico até o social, passando também pelo linguístico. Disponível em: Acesso em 10 out. 2020. 


Publicado por: Genival de Souza Pontes

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