A Construção do Homem Rousseauniano - Educar para Regenerar

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1. RESUMO

Com uma vida conturbada desde a infância, o filósofo Jean-Jacques Rousseau desenvolve uma sensibilidade e abraça a causa da infância, fazendo valer os direitos que são inatos à infância. Talvez pela falta da mãe e descaso do pai, Rousseau dá extrema importância ao amparo infantil. Na Obra Emílio, Jean-Jacques Rousseau elabora um método educacional inovador para sua época, cuja metodologia é de se retirar da educação os conhecimentos que a criança ainda não é capaz de apreender. Para Rousseau, a criança, assim como o animal é instintiva, desejando apenas aquilo que lhe é necessário para sua conservação. Logo, deve-se fazer desenvolver seu instintos e seu corpo para fortalecer a criança e formar um homem forte e autônomo. Com o contato que teve com várias pessoas cultas e com os livros, Rousseau adquire gosto pelas letras, e busca nelas um refúgio para seus dilemas pessoais. Rousseau nos dois primeiros livros da obra Emílio trata da infância: como educar a criança, como reconhecer suas manhas, suas tentativas de dominar o adulto, revelar sua bondade e fala ainda de como a criança deve ter sua liberdade e felicidade garantidas em respeito à sua fase pueril que é tão especial e, em sua época, sofria pelo descaso. Aqui tenta-se esclarecer de forma simplificada os dois primeiros livros da obra Emílio e sua importância para a educação moderna.

2. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como objeto de estudo a Educação. Visto que muitos trabalhos acadêmicos tem caráter científico e, são voltados comumente para um público acadêmico e a comunidade em geral, tem- se aqui uma proposta diferenciada, que é de escrever para os pais e pedagogos que acreditam numa educação especial e que acredita que a pureza da alma é intrínseca nas crianças e que esta pureza deve ser valorizada. Escrito de forma clara e acessível para mães e pais de toda e qualquer classe social, pretende-se mostrar com bastante clareza os ideais do filósofo Jean-Jacques Rousseau para a educação.

A obra analisada como referencial para a execução desta foi o Emílio, um tratado pedagógico escrito e publicado no ano de 1762 que revolucionou a forma de como a pedagogia foi aplicada às crianças até os dias atuais. Considerado o pai da educação moderna por ser o primeiro teórico a valorizar a criança e conceber como especial a ideia de que esta é uma fase distinta da vida humana, Rousseau vai contra todo o sistema iluminista do século XVIII que valorizava a razão e a descrença, e toma partido na valorização do sentimento humano como base para a formação do homem justo, bom e que será o perfeito cidadão do seu Contrato Social, cujo pacto preza a liberdade natural e a felicidade do homem. É a educação natural que conservará o homem em sua bondade imanente e, consequentemente, regenerará o cidadão que corrompido pelos vícios sociais caminha para o estado de miséria.

Como salvar o homem que saindo com uma natureza bondosa das mãos do “autor das coisas”1 já é direcionado para a sociedade que o corromperá? Como preservar a bondade deste num meio em que a corrução se instaurou a tal ponto que o autor afirma que os homens no estado social se tornaram tão corruptíveis que não devem andar juntos pois, “quanto mais se juntam, mais se corrompem” (ROUSSEAU, 1973, p.38)? No século XVIII Rousseau observou com indiferença a educação racionalista que visava formar um adulto na criança. Para Rousseau, a educação tradicional de sua época que via a criança como uma folha em branco a ser preenchida com complexos conhecimentos não formava mais que imitadores, visto que a criança não tem capacidade racional de fazer abstrações. Uma educação deste tipo tendia mais a destruir que construir o homem. Uma educação autoritária baseada em punições não agregava amor ao conhecimento, mas temor e dissimulação. Nas obras de Rousseau é bastante clara a importância que se dá à liberdade. No Emílio não poderia ser diferente, aliás, tendo a infância como base, o homem deve conhecer e gozar desta liberdade desde seus primeiros anos de vida. O Emílio é um tratado pedagógico com características de um romance que tem o objetivo de educar a criança para torná-la um adulto bondoso.

Evitar que a maldade se instaure no coração da criança desde a mais tenra idade desenvolvendo para isso seus potencias e afastando-a dos males da sociedade é a solução para salvar o homem de suas mazelas morais adquiridas no estado social. À criança deve ser dada uma educação a passos lentos, que vise atender suas necessidades em cada etapa de sua vida. No início deve ser priorizada uma educação natural que vise o desenvolvimento dos órgãos, afinal, a primeira necessidade de uma criança é o desenvolvimento do seu corpo. Por não possuir capacidade de abstrair conhecimentos complexos, ela deve ser instruída contemplando e fazendo contato com as coisas e não com os livros. Uma criança que vive como criança, sem atribuições e expectativas dos adultos, não sente a necessidade de ter aquilo que está fora de seu alcance e que ela não necessita, assim, torna-se suficiente para si mesma, mantendo uma congruência entre aquilo que deseja e que é capaz. Desta forma, ela não pensa no futuro, o que a faria sair de si. Este é o processo da educação negativa de Rousseau que se dá até que a criança tenha a noção de sua relação com o corpo social e passe a partir daí a receber e educação positiva.

Pretende-se com este trabalho sugerir uma nova relação entre pais e filhos, pedagogos e alunos no âmbito familiar e escolar, respectivamente. Verificar os resultados obtidos a posteriori nas relação dos filhos com as mães que não dispensa os devidos cuidados para este, analisar e compreender a importância da figura paterna na criação dos filhos, comparar os cuidados dispensados à criança a fim de analisar sua utilidade na formação do caráter, compreender o comportamento da criança quando esta não sabe falar etc. Essas são algumas das questões a se investigar neste trabalho.

Este trabalho pretende servir como mais um instrumento de pesquisa para professores do ensino infantil e creches e, para pais leigos no que tange o processo da educação a fim de melhorar suas relações com as crianças e formá-las no processo da educação negativa como forma de desenvolver a moral humana e, consequentemente, formar futuros cidadãos de bem nesta sociedade em que os valores éticos e morais tem perdido seu espaço para uma educação cada vez mais técnica e mercantilista.

Este trabalho foi fundamentado em pesquisas bibliográficas e experiências do próprio autor com crianças do seu convívio e observações feitas em escolas do nível básico, mais especificamente na etapa do ensino infantil.

O trabalho foi dividido da seguinte forma: o segundo capítulo relata a vida do filósofo em seus momentos considerados aqui como relevantes; o terceiro capítulo trata de como foi a época vivida por Rousseau no contexto político, educacional e social para entender a complicada relação do filósofo com seus contemporâneos e entender os conflitos por ele vividos. O quarto capítulo explica a intenção de Rousseau com a obra Emílio; O quinto capítulo explica o que é a educação negativa rousseauniana e faz um apanhado das ideias do autor nesta obra; o sexta capítulo traz a proposta para uma educação negativa que forme novos cidadãos para uma nova sociedade.

3. BIOGRAFIA

Por considerar relevante para o entendimento de todo o contexto de vida deste filósofo, é apresentada inicialmente neste trabalho a biografia bastante sintetizada do mesmo. Este capítulo não dará informações necessárias para quem pretende estudar de forma aprofundada a vida de Rousseau. Porém, neste capítulo, foram colocadas informações pertinentes para que se possa imaginar a infância e a adolescência deste filósofo, e entender como este sofreu forte influência moral e intelectual nestas importantes fases da vida. Influências estas que vieram mais tarde a formar o pensamento romântico e dramático rousseauniano.

3.1. A infância conturbada

Foi no ano de 1712 em Genebra, Suíça, que nasceu o filósofo que anos mais tarde, viria a ser amado e odiado por tantos filósofos e religiosos:

Rousseau é o primeiro pensador que não somente questiona essa segurança, mas também a abala em seus alicerces. Ele nega e destrói na ética e na política, na religião, na literatura e na filosofia, as formas estabelecidas que encontra. (CASSIRER, 1997, p.38)

Essa dualidade de sentimentos atribuídos à sua pessoa se deu não apenas no seu tempo, mas também muitas gerações depois, como no século XXI.2

Órfão de mãe, senhora Susanne Bernard, Rousseau adquiriu, talvez, nas lembranças desta e, por influência do pai, senhor Isaac Rousseau, um amor pelas letras que é evidenciado num trecho de uma de suas obras intitulada Confissões:

Não sei como aprendi a ler; só me recordo das minhas primeiras leituras e do efeito que elas tiveram em mim: é desse tempo que eu dato, sem interrupção, a consciência de mim mesmo. Minha mãe tinha deixado alguns romances; pusemo-nos a lê-los, meu pai e eu, após a ceia. De princípio, tratava-se apenas de me treinar na leitura, com livros engraçados; mas dentro em breve o nosso interesse tornou- se tão vivo, que começámos a ler sem descanso alternadamente um e outro, passando as noites nesta ocupação. Nunca podíamos abandonar o volume senão no fim. Algumas vezes meu pai, ouvindo de manhã as andorinhas, dizia, cheio de vergonha: Vamos deitar-nos; ainda sou mais criança do que tu. (ROUSSEAU, 1968, p.17)

Rousseau sentiu cedo a solidão e muitos dissabores da vida. Além do fato de ter perdido sua mãe, logo no seu nascimento, foi abandonado pelo pai, um homem de fácil mudança de opinião e inseguro, que com seu ofício de relojoeiro, viajara para um harém em Constantinopla. Passados dez meses, volta do harém a pedido da esposa –que por amor implorava seu retorno- e contempla o nascimento de seu primeiro filho, Jean-Jacques Rousseau. Ao mesmo tempo em que ganhara o herdeiro de sua natureza romântica e impulsiva, perdera a mulher que o venerava amorosamente no trabalho de parto. Colecionadora de romances, Suzanne deixou muitos destes como lembrança para pai e filho que nutriam na saudade que sentiram desta através das leituras dos mesmos. Leram tantos romances que o espírito romântico impregnou-se na formação do caráter do menino.

3.2. A influência cultural

Até aqui pode-se dizer que tal espírito romancista não seria maléfico para um menino, se não fosse a interrupção desta educação por um homem instável como era o pai. De espírito aventureiro e impetuoso, numa ocasião desentendeu-se com o capitão Gauthier, e este desentendimento o levou à uma saída inesperada de sua pátria, abandonando o menino Rousseau. Foi este abandono paternal que o levou a ser cuidado pelo tio materno Bernard, e, este, enviando-o ao ministro e pastor Lambercier, faz com que o jovem Rousseau tenha os primeiros contatos com a natureza quando este faz uma contemplação de bosques e campos numa determinada frequência, oferecendo-lhe aí uma educação natural e lúdica – E aí está a forte influência que mais tarde o faz defender a Educação Negativa3 na obra Emílio -. Na adolescência, é levado para ser submetido aos cuidados de Madame de Warens. Esta que tinha o ofício de instruir e converter aqueles que eram protestantes4 em católicos. Como não seria diferente, também preparara e encaminhara o então jovem Rousseau para a conversão, envia-o então para Turim onde Jean-Jacques hospeda-se no Asilo do Espírito Santo, onde ali foi convertido. E foi por Madame de Warens que Rousseau nutriu um amor materno. A madame achara necessário que o jovem devia dedicar-se à alguma profissão, e assim ele acaba estudando música. A figura da Madame de Warens é muito relevante na história de Rousseau, pois foi ela quem o iniciou na vida culta através do incentivo à leitura, música, latim, história etc. Este foi o apoio que faltava para o lançamento deste que viria a ser um dos principais nomes da Filosofia.

No ano de 1749, em Paris, sem dispor de recurso financeiro suficiente ao menos para alugar uma carruagem, enquanto caminhava no auge de sua mocidade ao trinta e sete anos de idade, descobre que a Academia de Dijon promovia para o ano seguinte um concurso literário cujo tema foi “O progresso das ciências e das artes contribuiu para corromper ou apurar os costumes?”. Empolgando e ansioso em participar do concurso, o filósofo começa então a escrever de imediato, e de tão intenso amor que sentia pelas letras e pela força de suas convicções, escreve em lágrimas a sua primeira obra>5> que, assim como as demais, vieram posteriormente caracterizadas por um turbilhão de emoções.

3.3. O sentimento de inferioridade

Sabendo que sua mãe morrera logo após seu nascimento, Jean-Jacques Rousseau viveu um forte sentimento de culpa que fica claro quando diz (1970, p.17) “O meu nascimento custou a vida de minha mãe, e foi a minha primeira desgraça”. Impregnando ainda mais um espírito dramático, sensível e de tristeza num coração tão afetado por tamanha perda, havia a tristeza do pai que se manifestava em lágrimas a cada vez que se falava na Sr.ª Susanne. Nasceu tão fraco e doente que só viveu graças aos cuidados de uma tia, tia esta que aos oitenta anos de idade ainda cuidava de um marido que possuía o vício do álcool. Rousseau frustra-se agora por não poder pagar os cuidados para com quem lhe cuidou em sua infância.

As tristezas na vida do filósofo não findam por aí. Dos quinze filhos do Sr. Isaac Rousseau, um deles não recebia tanta atenção e cuidados como o pequeno e frágil Jean-Jacques, o que acabou fazendo com que este irmão seguisse o caminho da libertinagem, e sumisse no mundo sem ao menos escrever uma carta aos pais6. Isto foi suficiente para que o filósofo agregasse em sua vida mais um sentimento de culpa, desta vez, pela atenção que lhe era dispensada.

Proveniente de uma família e educação protestantes, Jean-Jacques desenvolve uma fé e tem o desejo de se tornar um pregador evangélico, mas como não dispunha de recursos financeiros suficientes para manter os estudos nesta área, tem seus sonhos limitados.

Na adolescência trabalhou como moço de recados7, mas a Filosofia, a música e o espírito crítico já estava intrínseco neste sujeito. Ser apenas um mensageiro era muito pouco para alguém de tamanha imaginação, senso crítico, inteligência e ideais, e por isso, acabou não realizando com maestria o serviço ao qual estava incumbido, acabando assim por deixar este emprego. Não bastasse a frustração de não poder ser pregador nem possuir apetecimento por ser moço de recados, tenta ainda outro ofício: gravador. Neste trabalho, o jovem deveria cunhar medalhas, mas é acusado de falsificar dinheiro, e tem assim sua autoestima destruída. Com tantas situações negativas na vida, ele regride moralmente e sente-se como um dissimulador e criminoso, além de traidor e cobiçador das mulheres alheias, como pode-se ver nas Confissões:

Desejaria afundar-me, asfixiar-me no centro da Terra; a vergonha invencível prevaleceu, só a vergonha causou a minha impudência; e quanto mais me tornava criminoso, mais o terror de o reconhecer me fazia intrépido. Só via o horror de, publicamente, e comigo presente, ser reconhecido, declarado ladrão, mentiroso, caluniador. Uma angústia universal arrebatava-me todo e qualquer outro sentimento. Se me tivessem deixado voltar a mim, teria infalivelmente declarado tudo. Se Monsieur de La Roque me tivesse chamado à parte, e me dissesse: Não deite esta rapariga a perder; se é culpado, confesse-mo, ter-me-ia arrojado imediatamente a seus pés, estou perfeitamente certo disso. Mas o que fizeram foi intimidar-me, quando seria necessário dar-me coragem. A idade é ainda merecedora de certas atenções; eu mal havia saído da infância, ou antes, ainda nela me encontrava. (ROUSSEAU, 1968, p.91)

Vale destacar que o então jovem Rousseau não perpetuou em suas mentiras pueris. O sentimento de remorso e, um espírito reto, parecia-lhe intrínseco, o que viria ser mais tarde -numa idade mais madura- ser suas próprias correções:

E julgo sentir que a minha repugnância pela mentira me vem em grande parte do desgosto de haver cometido uma tão feia. Se é um crime que se possa expiar, como me atrevo a crê-lo, deve, está-lo, graças a tantas infelicidades que me acabrunham no fim da vida, a quarenta anos de rectidão e de honra nas ocasiões difíceis, e a pobre Marion encontra tantos vingadores neste mundo, que, por muito grande que tenha sido a ofensa que eu lhe fiz, pouco temo de levar comigo a culpa dela. Eis o que tinha a dizer neste artigo. Seja-me permitido nunca mais voltar a falar nele. (ROUSSEAU, 1970, p.92)

A carência afetiva do nosso jovem Rousseau, dá-se também no aspecto amoroso. Lendo as Confissões, nota-se claramente que era comum que o filósofo se relacionasse com mulheres mais velhas que ele. Talvez isso se justifique pelo fato de ter perdido a mãe prematuramente. Parece uma compensação pela falta da figura materna, o que o faz buscar, inconscientemente, nas mulheres mais velhas, a figura daquela a quem não se encontrou carinho e afago. Essa busca, talvez, inconsciente, por um laço materno, o leva aos cuidados de Madame de Warens, a quem Rousseau chama de mãe:

Logo no primeiro dia se estabeleceu entre nós a mesma doce familiaridade que subsistiu até ao fim da sua vida. Deu-me o nome de filho; o seu era o de mamã; e ficámos sempre filho e mamã, mesmo quando o número de anos quase fez desaparecer a diferença que entre nós havia. Acho que estes dois nomes dão maravilhosamente a ideia do nosso tom, da simplicidade das nossas maneiras, e sobretudo da ligação dos nossos corações. Madame de Warens foi para mim a mais carinhosa das mães, sem jamais procurar o seu próprio prazer, mas sempre o meu bem; e se os sentidos contaram na minha dedicação. (ROUSSEAU,1968, p.110)

Que fique claro aqui que, apesar da admiração por mulheres mais velhas e por seu desejo exacerbado por mulheres – comum na adolescência-, Rousseau deixa claro que jamais sentiu mais que amor materno por Madame de Warens. Mas uma coisa é certa, a passagem desta mulher em sua vida foi bastante relevante e determinante para a formação de sua personalidade.

4. CONTEXTO HISTÓRICO

Embora tenha vivido no período conhecido na História como “século das luzes”, ou, Iluminismo, Rousseau tinha suas ressalvas em relação ao movimento iluminista, movimento este que defendia e enaltecia o conhecimento humano obtido pelas luzes da Razão.

Durante meados do século XVIII e início do século XIX ocorreram muitas mudanças. Essa mudanças ocorreram no comércio, no crescimento populacional e, dentre outros campos, também na educação. Após o domínio cultural do Antigo Regime8 que justificava os poderes dados a si próprios, os homens foram despertando uma nova visão sobre as coisas, uma nova forma de pensamento que visava iluminar o conhecimento que, até então, estava obscurecido por dogmas que impediam o desenvolvimento humano e o limitava à contemplação e o induzia à submissão. Era a racionalidade em substituição à fé para explicar o mundo.

É importante saber que a fé não é abandonada por completo, pois Deus ainda era visto como causa de todas as coisas. A questão era que os iluministas passaram a questionar o absolutismo monárquico que, por sua vez, censurava os escritos daqueles que colocavam em cheque o poder dos governantes, cuja justificativa para exercício de tal poder era de caráter supostamente divino. Ainda assim, os filósofos continuaram a escrever suas teses, mesmo sabendo dos riscos.

Muitos filósofos deste século objetivaram compreender o mundo e a sociedade através de uma nova ótica cuja essência baseava-se no uso da razão. A finalidade desta redescoberta do homem do mundo e da sociedade era uma reformulação, o instrumento principal para o desenvolvimento e uso desta razão é o Conhecimento. É através do conhecimento que o homem contextualiza neste século das luzes grandes mudanças históricas, a Revolução Francesa e a Revolução Industrial foram algumas destas. A essa nova forma de pensar deu-se o nome de Filosofia da Ilustração. Foi com esta nova forma de analisar o mundo que potencializou-se o exercício do uso da razão, esta razão permitiria o progresso do homem que agora iluminado, sairia da caverna platônica. Esta razão é que viria a libertar e conduzir o homem à felicidade social e política. É importante lembrar que as ideias iluministas influenciaram de forma significativa a Revolução Francesa de 1789.

No século das luzes a razão era venerada entre os intelectuais, sem ela não haveria o progresso da civilização. A educação reformada, livre do classicismo educacional que visava um inculcamento conteudista que não respeitava as particularidades de cada aluno foi a solução encontrada para atender estas novas perspectivas sociais e humanistas.

Num período como esse em que há uma supervalorização da cultura racional e científica, Rousseau visa a criação do novo homem (o homem perfeito que supera-se a si mesmo), faz-se necessário então a criação de um novo método educacional que vise preparar este homem desde sua infância. Mas este método pensado por Rousseau não é para formar o homem das Ciências, mas, antes de tudo, o homem da vida, o homem de si. A infância é visada como base educacional em especial, porque é esta a fase em que o ser humano ainda está livre dos vícios e da corrupção social e seu espírito ainda pode ser moldado: inculcamento de valores morais e éticos, ações para consigo mesmo e para com outros indivíduos, valoração da reflexão etc. Rousseau então propõe uma nova forma de educação através de sua obra >Emílio ou Da Educação>, lançado no ano de 1762. Esta obra tornou-se um paradigma da Educação no século XVIII. Nela, o filósofo tece críticas ao método educacional da época. Contrapondo-se à ideologia elitista que tinha a educação como um privilégio, Rousseau afirmara que esta é um direito de todos, e criticava a pedagogia jesuíta da época, a qual o filósofo considerava rígida, punitiva e de metodologia que fazia apenas o aluno memorizar conteúdo. Uma educação como essa que tratava as crianças como “pequenos adultos’’ foi o que impulsionou o filósofo a escrever, em defesa destas e de um novo quadro social e homem já corrompidos, um dos mais belos tratados da Filosofia da Educação como fora o >Emílio>. “O >Emílio> e a >Nova Heloísa> apontam o caminho para a reforma do indivíduo nas esferas da moralidade pessoal, das relações familiares e da educação;” (CASSIRER, 1997, p.23)

Para os pensadores do século XVIII só através da educação podia-se transformar o homem e, consequentemente, a sociedade. A educação é a ferramenta construtora deste homem capaz de solucionar os problemas gerados por uma sociedade dogmática e servil. É ela a ferramenta transformadora e regenerativa. E esta concepção sobre a educação vem de há muito tempo, desde Platão na obra a República –embora muitos a vejam como uma obra puramente política- é discutido o tema: “Quereis ter uma ideia de educação pública, lede a República de Platão" (ROUSSEAU, 1995, p. 14.).

Rousseau foi mal visto em seu tempo, talvez o vissem como um rebelde9 pelo fato de suas ideias irem numa corrente ideológica contrária ao senso comum. Acreditar que somente a razão poderia levar o homem à sua emancipação não era o que pensava o genebrino. Para ele, a educação deveria ser um processo no qual a sensibilidade humana deveria ser despertada e valorizada já na infância. Uma educação que não priorize apenas conteúdos, mas que antes de tudo, priorize a natureza humana –que para ele é boa- e a desenvolva com tudo o que ela pode oferecer de melhor para o próprio homem. Na educação rousseauniana a criança deve viver sua infância na plenitude, dentro de suas limitações cognitivas que são naturais desta fase da vida.

Vale ressaltar aqui que na idade média não existia o conceito de criança como temos hoje. A criança era vista como tal até ser desmamada, após este período da lactancia a criança vivia na companhia dos adultos fazendo as mesmas coisas que eles faziam. Não existia uma diferenciação entre adultos e crianças. As crianças eram consideradas como adultos pequenos e, por isso, não recebiam um tratamento distinto como é hoje. Não existiam escolas. Todos, crianças e adultos eram alfabetizados juntos nos locais dedicados a estas atividades –que não eram escolas como conhecemos hoje. A educação das meninas ficava a cargo dos pais. Como eram vistos como pequenos adultos, meninos e meninas tinham que aprender desde cedo ofícios dos pais, mestres ou qualquer outro que estivesse disposto a ensinar. O ofício dos meninos seria o trabalho manual, o das meninas era exclusivamente os afazeres do lar, a fim de prepara-las para um futuro casamento –casavam cedo de acordo com as tradições.

Analisando esta forma de cultura, não é preciso dizer aqui que o amor maternal, paternal e fraterno eram quase inexistentes para com as crianças. Para a sociedade da época, elas eram apenas adultos inexperientes que precisavam ser instruídos desde cedo para trabalharem, no que chamaríamos em nossa época de um verdadeiro trabalho escravo infantil, em toda plenitude do conceito.

É com Rousseau que essa fase infantil da vida torna-se especial e distinta, onde no seu Emílio, o autor divide as etapas da vida humana e dá início a um tratado pedagógico que revolucionara e causara a ódio de muitas instituições educativas clássicas da época.

Com o passar do tempo nasce uma preocupação social para com as crianças, parece uma espécie de consciência que é despertada e, então, criam-se as escolas, que até então não existiam, com métodos menos rígidos, e que classificavam as etapas do ensino de acordo com a faixa etária da criança. Com Rousseau a infância é dividida em faixas etárias, dando assim uma maior importância para esta fase humana que, até então, não tinha seu valor humano, não era distinta, não recebia dos adultos os cuidados que esta fase necessita. Muitas crianças por serem submetidas muito cedo nos trabalhos dos adultos morriam. Quando não pela força e perigos do trabalho precoce, outras crianças já nasciam destinadas à morte, como era o caso das que nasciam com deficiências: "Uma mulher de Berry havia dado à luz um filho entrevado, cego e mudo, mais um monstro que um ser humano. Ela confessava, chorando, que o concebera numa noite de domingo e não ousava matá-lo, como muitas mães costumam fazer nesses casos” (ARIÈS e DUBY, 2009). Não existia um apego10 para com os pequeninos nem um respeito a esta fase tão especial da vida humana.

Mas a solução para este descaso não finda aí, apesar desta nova forma de ver o homem, compreendendo que ele não é homem quando ainda é criança, ainda existia outros pontos a serem observados: o desenvolvimento cognitivo e o ritmo da aprendizagem é o mesmo entre todas as crianças e, entre adultos e crianças? Uma criança pode desenvolver plenamente seu caráter, sua sabedoria e constituir-se um bom cidadão apenas com absorção de conteúdos na escola? Um homem se faz apenas pelo conhecimento científico e acadêmico? Eis questões propulsoras que farão com que Rousseau escreva um dos mais belos tratados da pedagogia de forma romantizada da história: Emílio.

5. EMÍLIO: POR UMA FORMAÇÃO HUMANISTA

Na obra Emílio ou da Educação, Rousseau propõe uma nova forma de educar as crianças e, consequentemente, o homem. Nela, o filósofo estabelece um método educacional que tem por objetivo preservar no homem uma bondade que, para o filósofo, é intrínseca ao sujeito, este já nasce com o sentimento de bondade cuja origem é Deus, ao qual ele chama de autor de todas as coisas. O homem não nasce pronto para o mal, mas apenas com uma percepção de autoconservação. “Nenhum ser é tão tímido quanto o homem em estado de natureza, e que ele está sempre tremendo e pronto a fugir ao menor ruído que o alcance, ao menor movimento que o perceba” (ROUSSEAU, 2000, p.59).

A este estado de bondade natural chama-se estado de natureza, é um estado em que o homem vive por suas sensações instintivas, porém, sem atacar os outros homens, como pensou o filósofo Thomas Hobbes11.

Este estado natural foi pensado não só por Hobbes, mas também por Rousseau. Este estado de natureza antecede o estado social, que para estes filósofos é uma criação humana. O estado de natureza para Rousseau é o homem agindo por seu instinto de autopreservação, no qual suas maiores necessidades são naturais e não sociais, alimentar-se e acasalar-se é que basta a este homem natural. Logo, a necessidade da relação entre os homens seria mínima, seriam relações de curto prazo nas quais a dependência do outro não se estabeleceria. Portanto, esta bondade natural descrita por Rousseau é o estado em que o homem não tem estas potencialidades negativas: ódio, inveja, ressentimento etc. Estes sentimentos nascem e desenvolvem-se na sociedade, que agora inculca no homem uma competitividade desenfreada. Se antes suas necessidades eram apenas naturais, agora no estado social em que estes homens se encontram suas necessidades passam a ser ‘’ criadas’’ em nome do progresso. A proposta de Rousseau apresentada no Emílio não é fazer com que o homem retorne ao estado primitivo, mas sim fazer com que ele seja feliz, pois “desde o princípio, todo o seu pensar é movido pela questão da "felicidade": ele procura uma unidade, uma harmonia entre a virtude e a felicidade” (CASSIRER, 1997, p.69); fazer ainda com que preserve sua bondade que é natural e agora é corrompida pela sociedade e, instruí-lo a viver sob as leis desta inevitável sociedade, porém, tendo a consciência de que é sua liberdade é um direito natural que não pode ser dissipado.

Desde a mais tenra infância, ele deve conhecer a coação das coisas, e aprender a curvar-se diante dela, mas deve ser poupado da tirania dos homens. A partir desta ideia básica pode-se entender também inteiramente a tendência da doutrina de Rousseau do Estado e da sociedade. Pois na verdade, o seu objetivo essencial reside em colocar o indivíduo sob uma lei universalmente obrigató­ria para todos, mas também em formar esta mesma lei de tal modo que desapareça dela qualquer traço de capricho ou de arbitrarie­dade. Devemos aprender a curvar-nos diante da lei da comunidade tal como nos curvamos diante da lei da natureza; não devemos nos submeter através dela a um preceito autoritário alheio, mas obede­cê-la porque a entendemos em sua necessidade. Isto só é possível se compreendermos esta lei como uma lei com a qual precisamos estar interiormente de acordo, e se pudermos nos apropriar de seu sentido e acolher este sentido em nossa própria vontade. (CASSIRER, 1997, p.62)

Dentre as principais obras rousseaunianas pode-se dizer que o Emílio foi uma das principais12. Quando se pensa em obras polêmicas não se deve esquecer do Emílio. Numa época em que a educação era punitiva e as crianças eram tratadas como pequenos homens e mulheres, em que elas tinham a obrigação de se adaptarem às tarefas dos adultos e, que a liberdade natural e pueril era privada de ser usufruída em nome de um regime educacional que desconhecia tão sensível fase da vida humana, escrever um tratado que contraponha o senso comum e que confronte o poder das instituições de ensino vigentes à época, fora de tamanha ousadia que era quase um “suicídio literário” tal atitude. Além disso, o autor do Emílio acreditava que a educação era um direito de todos, e não apenas para um Príncipe ou outros membros elitizados. Para essa elite, Maquiavel escreveu O Príncipe, enquanto Rousseau com seu romance e ideal voltado para os menos favorecidos, escreveu Emílio.

Emílio foi o aluno imaginário de Rousseau, ao qual ele dedicara seus ensinamentos de forma lúdica –ao menos nos primeiros ano de vida- e fora da escola. Sim, para Rousseau a escola deveria vir ser apresentada mais tarde, especificamente na adolescência, a fim de preservar a bondade natural do ser, pois na infância devido à imaturidade da criança, esta poderia ser corrompida pelos vícios da sociedade:

Lembrai-vos sempre de que o espírito de minha instituição não é ensinar à criança muitas coisas e sim não deixar entrar em seu cérebro senão ideias justas e claras. Que não saiba nada, pouco me importa, conquanto não se engane, e só ponho verdades em sua cabeça para defendê-la dos erros que aprenderia em seu lugar. (ROUSSEAU, 1973, p.179)

Além de remar contra a maré do modelo educacional de seu tempo, Rousseau teve ideias divergentes em relação a outros filósofos e rivais na literatura como Voltaire e Diderot, como pode-se constatar:

A carta que Voltaire me escreveu a respeito da minha última obra deu-me azo a que insinuasse os meus receios na resposta (...) Talvez devesse ter ido fazer frente à tempestade, se me sentisse com talento para isso. Mas que faria eu, só, tímido e falando muito mal, contra um homem arrogante, opulento, apoiado pela consideração dos grandes, de uma facúndia brilhante, e já então o ídolo das mulheres e da mocidade? (ROUSSEAU, 1973, p.384)

Embora soubesse dos riscos, a obra Emílio foi escrita e publicada no ano de 1762. Nela, Rousseau propõe um novo olhar para com as crianças, busca uma significação especial para este período da vida humana e, propõe uma educação especial, que requer mais atenção, cuidado e uma nova metodologia. Para Rousseau, a educação deve começar sim muito cedo, desde a infância, porém, o que ele contraria é a forma de como se deve educar. O filósofo defendia a pureza, a inocência e entendia que uma criança precisa desenvolver-se em todos os aspectos: físico, intelectual e moral, mas para que este desenvolvimento ocorresse, antes de qualquer educação técnica e sistemática, deve-se preservar e aperfeiçoar esta pureza que é natural nesta etapa da vida do homem: sua infância. Afinal, para Rousseau, o homem nasce bom, é a sociedade que o degenera com suas instituições sociais e vida cosmopolita, alterando e tornando artificial tudo o que é natura, manipulando sua mente:

Tudo é certo em saindo das mãos do autor das coisas, tudo degenera nas mãos do homem. Ele obriga uma terra a nutrir as produções de outra, uma árvore a dar frutos de outra; mistura e confunde os climas, as estações; mutila seu cão, seu cavalo. Seu escravo; transtorna tudo, desfigura tudo; ama a deformidade (ROUSSEAU, 1973, p.9).

>Sabe-se que uma sociedade humana é composta de pessoas, logo, como melhorar a sociedade se não melhorarmos os homens que a compõe? Como conservar no homem sua virtude e sua autonomia quando este homem fora do seu estado natural está “sempre fora de si, só sabe viver baseando-se na opinião dos demais e chega ao sentimento de sua própria existência quase que somente pelo julgamento destes” (ROUSSEAU, 2000, p.115)? E como melhorar o homem se este não se conhece, não se desenvolvem nem no corpo e no espírito? O inculcamento precoce de conteúdo, o rigor e a severidade na educação não contribuem para o pleno desenvolvimento do homem, pois este nasce menino, e o homem necessita de autoconhecimento desde cedo para uma formação moral, ética e humanista que o deixará preparado para si e para a sociedade. É importante saber que para Rousseau o homem é o ser em si mesmo, que basta a si, já o cidadão é este homem em função de um coletivo.

“O homem natural é tudo para ele; é a unidade numérica, é o absoluto total, que não tem relação consigo mesmo ou com seu semelhante. O homem civil não passa de uma unidade fracionária presa ao denominador e cujo valor está em relação com o todo, que é o corpo social” (ROUSSEAU, 1973, p.13). Assim, há de ser formar primeiramente o homem, desde seu nascimento, até se formar o cidadão. É necessário fortalecer a sua formação na infância e adolescência, de maneira que, ao torna-se adulto, torne-se incorruptível e forte na razão, no físico e no intelecto.

Que se destine meu aluno À carreira militar, à eclesiástica ou à advocacia pouco me importa. Antes da vocação dos pais, a natureza chama-o para a vida humana. Viver é o foício que lhe quero ensinar. Saindo de minhas mãos, ele não será, concordo, nem magistrado, nem soldado, nem padre; será primeiramente um homem. (ROUSSEAU, 1973, p.15)

O homem que conhece a si mesmo e conhece os outros homens torna-se o cidadão completo, compreensivo, justo, de bem consigo e com seus semelhantes. É uma espécie de autoconhecimento quase semelhante ao proposto pelo filósofo Sócrates que, em sua época, ao invés de preocupar-se com a matéria formada no mundo - assim como os filósofos pré-socráticos-, preocupava-se com o estudo filosófico do homem e suas ações neste mundo material. Porém, enquanto para Sócrates o conhecimento era obtido através da razão, para Rousseau o conhecimento vem de uma busca interior que é impulsionada pelos sentimentos. O sentimento é a peça-chave necessária para que o homem faça uma busca de si no seu próprio interior; Esta operacionalização da razão convencionada pela sociedade faz com que o homem aliene-se e, saindo de si nesta alienação, não conheça a si nem ao “autor de todas as coisas”, entregando-se assim à corruptibilidade do seu ser, impedindo-o de desenvolver o verdadeiro raciocínio que é obtido através dos sentimentos. Essa reflexão acerca de si é que o levará ao exercício de sua boa natureza, reconhecendo a semelhança entre si e os demais homens. É nesta busca de si através de uma educação pautada nos sentimentos humanos e da natureza (metafísica) que o homem delicia-se consigo mesmo e passa a conhecer o amor de si, que o faz perceber o cuidado que deve ter para consigo levando-o à autopreservação, e o faz ter a consciência de que este amor de si difere-se do amor-próprio, já que este para o filósofo é a causa dos males humanos. O conhecimento precoce e inadequado conduz o homem ao amor-próprio, e o faz querer ser melhor que seus semelhantes num jogo de interesses:

(...) O que, pois, poderá tê-lo depravado a esse ponto senão as mudanças sobrevindas em sua constituição, os progressos que fez e os conhecimentos que adquiriu? Por mais que se admire a sociedade humana, não será menos verdadeiro que ela necessariamente leva os homens a se odiarem entre si à medida que seus interesses se cruzam, a aparentemente se prestarem serviços e a realmente se causarem todos os males imagináveis. (ROUSSEAU, 2000, p.127)

Rousseau acreditou que a educação é o caminho para salvar o homem que está degenerado pela sociedade. A educação é a base para se formar o novo homem, com ela, a criança é valorada e deixa de ser vista como um pequeno adulto que deve ser escravizado pelo trabalho e oprimido pelas instituições escolares vigentes na época. Preservando a alegria, inocência, liberdade e ritmo de aprendizagem individual da criança, estas tornam-se adultos fortes, física e espiritualmente. O adulto assim formado, terá discernimento para saber o que basta a si mesmo e o que é necessário para a vida, saberá a diferença entre o amor de si e o amor-próprio e, estará apto a conviver neste estado social que degenera e aliena a todo o tempo com uma cultura imposta através dos meios de comunicação que diz que para ser feliz, não é preciso ser, mas, ter.

O >Emílio> é o retrato do homem ideal que fará cumprir tudo aquilo que é proposto no Contrato Social, a fim de garantir sua liberdade natural:

Quando um povo é obrigado a obedecer e o faz, age acertadamente; assim que pode sacudir esse jugo e o faz, agem melhor ainda, porque, recuperando a liberdade pelo mesmo direito que lha arrebataram, ou tem ele o direito de retomá-la ou não o tinham de subtraí-la. A ordem social, porém, é um direito sagrado que serve de base a todos os outros. Tal direito, no entanto, não se origina da natureza: funda-se, portanto, em convenções. Trata-se, pois, de saber que convenções são essas>. (ROUSSEAU, 2000, p.53)

A educação é a ferramenta que tornará exequível este Emílio, este novo homem e esta nova sociedade que respeitará o homem em sua liberdade natural, mesmo estando nesta civilização antinatural13. Para Rousseau o homem primitivo teria condições de ser mais feliz porque no seu estado natural, este homem não ambicionaria mais que o necessário para sua sobrevivência. Fechado na floresta um homem em estado natural se satisfaria apenas tendo o que comer, beber e satisfazendo seus desejos sexuais. Assim, um homem neste estado não carecendo de muito, acaba não se angustiando em querer aquilo que não é necessário para sua vida e, consequentemente, não vê motivo para se matar, literalmente, para conquistar aquilo que lhe é inculcado através da sociedade e que supostamente lhe daria mais poder. É um ideal que para muitos críticos pode parecer ingênuo e difícil de ser alcançado, mas rico de uma esperança em um mundo moral e justo.

Uma vez que esta sociedade corruptível14 foi formada e não há como voltar ao estado natural pois, “os homens são maus – uma experiência triste e contínua dispensa provas; no entanto, o homem é naturalmente bom – creio tê-lo demonstrado” (ROUSSEAU, 2000, p.127), a proposta do filósofo agora é preservar o homem da maldade originada nesta sociedade e fazer com que ele tenha consciência de suas reais necessidades, evitando assim submeter-se e envolver-se nos vícios sociais. Essa consciência deve ser dada através de uma educação diferenciada, que não vise apenas o desenvolvimento intelectual e, precoce do aluno -afinal, para o genebrino, o homem não é dotado apenas de intelectualidade, mas também de sentimentos- mas visando ainda uma educação humanista e gradativa, respeitando as fases do desenvolvimento da criança. Os sentidos são importantes no processo de aprendizagem, o processo empírico pode agregar mais ao aluno que leituras abstratas que exigem um raciocínio lógico que a criança ainda não tem condições de fazer. O Emílio é o manual para se formar este homem que deve ser salvo da corrupção causada pela sociedade humana. Para Rousseau, a criança não nasce com uma razão adormecida, a priori, onde se educando com conteúdos de várias áreas do conhecimento ela fica pronta para se igualar a um adulto como se pensava naquela época. Para o filósofo, a razão é adquirida com o tempo, através de uma educação que fortaleça o homem em seu corpo e espírito. Embora tenha sido escrito com cunho filosófico, a obra transformou-se num tratado de pedagogia que abordou de forma tão diferenciada o método educacional da época, que fez com que Pestalozzi o colocasse em prática.

De cunho romancista, mas ao mesmo tempo com viés ideológico iluminista, a obra busca uma reforma na educação, reforma esta que possibilitará uma mudança radical na sociedade, garantindo ao homem a felicidade, liberdade e igualdade. Apesar da valorização dos sentimentos humanos no processo educacional do sujeito, Rousseau não despreza o uso da razão nem pretende um retorno do homem ao estado puramente sensitivo e animal, pelo contrário, uma vez que passando do estado de natureza para o estado social a razão do homem passa a se desenvolver gradativamente à medida que suas necessidades são geradas neste novo estado em que ele se encontra, as paixões e a racionalidade permanecem em paralelo. Apesar de defender estritamente o estado de natureza do homem, “(...) isso não significa que ele deva ser um animal ou um selvagem: razão e consciência são também partes da natureza humana” (CASSIRER, 1989, p.24). Nesta obra o autor pretende educar o menino Emílio para ser feliz consigo, com sua esposa Sofia, com os outros homens e ser modelo de virtude, tornando-o um homem completo numa sociedade livre e democrática. Emílio é a representação do homem ideal que fará cumprir o pacto social estabelecido no Contrato Social. Rousseau preza pela liberdade do homem, que para ele é inalienável pois “O homem nasce livre, e por toda a parte encontra-se a ferros” (ROUSSEAU, 2000, p.53). É importante saber que nesta citação contida no Contrato Social não se trata de uma liberdade individual, mas sim uma liberdade do cidadão coletivo, ou seja, a liberdade de juntamente com outros homens fazer valer a Vontade Geral do pacto estabelecido por convenção social. A pretensão de Rousseau com o Emílio é fazer com que o homem receba uma educação natural preservando-o dos vícios sociais. Abordando uma âmbito político, ético e pedagógico, Rousseau defende uma educação dada por etapas. Filho de um homem rico, Emílio é acompanhado por um preceptor que, educando-o através do contato com a natureza, protege-o dos vícios sociais que corrompem o homem desde sua infância. Ao contextualizarmos, podemos observar que este preceptor nos nossos dias pode ser representado pelo pedagogo da educação infantil. Notemos aqui o substantivo colocado no gênero masculino: pedagogo. Esta observação é interessante pois nos revela que na sua época Rousseau falava de homens como educadores, o que hoje passa a ser quase uma dicotomia, visto que grande parte dos formandos em pedagogia são mulheres15. Pode-se notar que o preceptor deve ser jovem, afinal, as crianças são dotadas de bastante energia física e para acompanhar o ritmo enérgico destas, faz-se necessário talvez tal jovialidade para que o preceptor possa se colocar no lugar destas crianças e entendê-las no processo educacional desenvolvido.

Pelo fato de entender que a criança não é um adulto miniaturizado, Rousseau define a infância como uma fase particular do homem, e visando a educação naturalista, acreditou que o aprendizado é obtido dentro do interesse do próprio aluno, de forma gradativa (progressiva), lúdica e que interagisse com a natureza, para assim atingir um desenvolvimento natural. Toda esta forma de valorização da criança tinha um objetivo: projetar o homem do futuro, a fim de torná-lo incorruptível e livre, já que “os preconceitos, a autoridade, a necessidade, o exemplo, todas as instituições sociais em que nos achamos submersos abafariam nele a natureza e nada poriam no lugar dela” (ROUSSEAU, 1973, p. 09). A liberdade é um tema reforçado na educação do Emílio e em outras obras rousseaunianas e a causa de tamanha importância dada a deste tema por Rousseau é explicada:

O próprio Rousseau conheceu todo o amargor da pobreza, mas sempre se armou de uma serenidade estóica contra todas as privações físicas. Por outro lado, o que ele jamais aprendeu a suportar foi a dependência da vontade dos preceitos e das arbitrariedades alheias. E neste ponto começa então o seu ideal de Estado, bem como o seu ideal de educação. A idéia fundamental do Emílio é de que não se deve eliminar nenhuma dificuldade física da aprendizagem do pupilo que se quer educar para a independência da vontade e do caráter -e que não se deve poupá-lo de nenhum sofrimento, esforço ou privação. A única coisa da qual se deve cuidadosamente protegê-lo é da imposição violenta de uma vontade alheia -de um preceito que ele não entende em sua necessidade. Desde a mais tenra infância, ele deve conhecer a coação das coisas, e aprender a curvar-se diante dela, mas deve ser poupado da tirania dos homens. (CASSIRER, 1979, p.62)

Rousseau faz claramente uma separação entre o homem natural e o homem civil. O primeiro deve ser valorizado, através de uma visão diferenciada na criança, compreendendo-a dentro de sua própria maneira de pensar e respeitando a ordem da natureza que conduz dentro de uma ordem natural a criança à maturidade. A infância é o estágio da vida em que o homem precisa ser livre dos constrangimentos sociais, pois corre o risco de alienar-se adquirindo os vícios de uma sociedade já corrompida. Rousseau defende a infância como uma fase especial da vida em que esta precisa de cuidados, visto que não se nasce pronto, e este cuidado é dado pela educação. Um homem que não foi bem educado16 na infância torna-se um homem perdido, um homem que não se desenvolveu física, moral e intelectualmente.

Seu porte e sua força seriam inúteis até que ele tivesse aprendido a deles servir-se. (...) E, abandonado a sim mesmo, ele morreria de miséria antes de ter conhecido suas necessidades. Deplora-se o estado da infância; não se vê que a raça humana teria perecido se o homem não começasse sendo criança. Nascemos fracos, precisamos de força; nascemos desprovidos de tudo, temos necessidade de assistência (ROUSSEAU, 1973, p. 10).

O desenvolvimento interno de nossas faculdades e de nossos órgãos é a educação pela natureza” (ROUSSEAU, 1973, p.11), logo, a educação natural defendida por Rousseau consiste em deixar a criança desenvolver-se com o tempo e de forma natural, brincando, exercitando e desenvolvendo seu corpo, seu espírito e intelecto. O pedagogo e os pais educando a criança desta forma natural acabam fazendo o papel da “educação dos homens” (ROUSSEAU, 1973, p.11) e, desta maneira, a criança vai adquirindo experiências através da “educação das coisas.” (ROUSSEAU, 1973, p.11)

5.1. Emílio: da teoria à prática

Apesar de seus adversários considerarem a obra uma utopia, um absurdo e desqualificarem-na a ponto de condenarem a obra à fogueira, houve quem acreditasse na tese de Rousseau de que a educação deve ser alcançada por todos e não apenas às classes mais favorecidas e, de maneira a respeitar as fases da criança e seus limites, criando um instituto de ensino, cuja metodologia rousseauniana descrita no Emílio foi aplicada e, com êxito: Pestalozzi.17 Construído na Suíça, o instituto de Pestalozzi nasce num convento abandonado abrigando crianças órfãs. Nesta oportunidade, Pestalozzi começa a pôr em prática os ensinamentos contidos no Emílio, educando as crianças com ensino lúdico, pintando e contando histórias. No Brasil podemos observar quem reconheça e valorize os ideais de Pestalozzi e, consequentemente, de Rousseau: a Associação Pestalozzi de Niterói18.

6. EDUCAÇÃO NEGATIVA: A BASE SÓLIDA

Socializar a criança precocemente como forma de moldar o homem para a sociedade na qual ela está inserida –lembrando aqui que o contexto histórico de Rousseau é a sociedade francesa no século XVIII– é um erro no qual Rousseau vira um grande dano, afinal, se o homem nasce bom, a origem do mau estaria nos vícios sociais humanos. Portanto, livrar desde cedo a criança destes males da sociedade é a solução apresentada por Rousseau para chegar-se ao estado anterior de felicidade, este estado pode-se imaginar como o homem estando em gozo de sua liberdade e vendo no próximo não mais que outro bom homem, desprovendo-o assim do sentimento da inveja, do espírito da competitividade que o leva a querer possuir mais que, e ser melhor que o próximo. Além disso, livre da educação tradicional que pune a criança e ensina o homem a possuir o que não precisa e ser melhor que seus semelhantes –originando a desigualdade- pois “(...) o que torna o homem essencialmente bom é ter poucas necessidades e se comparar pouco aos outros” (ROUSSEAU, 1973, p.234). Rousseau com a educação negativa, não visa exclusivamente formar virtudes, mas impedir vícios, desobrigando a criança das virtuosas tendências gregas que a levaria às virtudes. A educação negativa rousseauniana não pretende impor verdades, mas ensinar a evitar os erros. Que fique claro aqui que Rousseau não vai contra ao ensino da verdade à criança, mas o que se objetiva é que estas verdades sejam ensinadas numa idade em que o indivíduo tenha compreensão suficiente para tal. Esta idade ideal para o inculcamento do ensino das verdade e das complexidades da educação tradicional viria na adolescência. Para Rousseau, os livros não devem ser apresentados cedo às crianças pois para ele, quando criança, a razão do homem está adormecida, os livros não apresentam a realidade das coisas, apenas teorizam e exigem um grau de raciocínio que a criança ainda não desenvolveu.

Qualquer que seja o estudo, sem a ideia das coisas representadas, os sinais representantes nada são. Circunscrevemos portanto à criança esses sinais, sem nunca fazer com que compreenda as coisas que representam. Pensando ensinar-lhe a descrição da terra, não lhe ensinamos senão a conhecer mapas; ensinamos-lhe nomes de cidades, de países, de rios, que ela não concebe existirem senão no papel onde lhes mostram. Lembro-me de ter visto algures uma geografia que começava assim: Que é o mundo? Um globo de papelão. Eis precisamente a geografia das crianças. (...) Ouço dizer que convém ocupar as crianças em estudos em que só precise de olhos: poderia ser, se houvesse algum estudo em que só de olhos se precisasse; mas não conheço nenhum. (ROUSSEAU, 1973, p.101)

Pode-se ver claramente nesta citação que a educação negativa valoriza a aprendizagem empírica, ou seja, a criança precisa aprender na prática sobre a vida, e como foi dito anteriormente, os livros nem devem ser apresentados à criança nos seus anos iniciais da vida, é tempo perdido para o preceptor (educador) e fardo desnecessário para a criança que nada entende. O não entendimento neste caso se dá pelo fato de que a criança aprende mais pelos sentidos que pelo raciocínio. As lições devem ser dadas pela experiência com as coisas do mundo e não pelos livros. Segundo Rousseau (1973, p.109), tirando-se os deveres das crianças, automaticamente tira-se o instrumento de sua maior miséria: os livros. Os sentidos devem ser aguçados para propiciar um desenvolvimento natural da racionalidade. O filósofo não quer com isso afirmar que a criança deve ser vista e adestrada como um animal instintivo, mas que ela deve receber uma educação sem regras para construir sua própria autonomia. O aprendizado deve ser feito de dentro para fora. As regras da educação tradicional servem para limitar e punir a criança. Em uma aprendizagem mais lúdica e em contato com a natureza a criança vai aprendendo a raciocinar, analisando por meio de uma contemplação os processos que estão presentes nas coisas, não sendo necessário assim uma educação que tende a fazer usos de uma enorme lista de conteúdos como forma de formar um repertório de conhecimentos que definiria este sujeito como inteligente.

Confirmando a tese de Rousseau, o filósofo Immanuel Kant afirmou que a educação tradicional da época de Rousseau que via na criança um pequeno adulto e a ensinava a falar como estes de nada servia, e que isso não provava que a criança estaria fazendo uso da razão e inteligência, mas que estavam sendo meras imitadoras dos homens.

As crianças devem ser instruídas apenas naquelas coisas adaptadas À sua idade. Muitos pais se alegram vendo os filhos proferirem discursos de velhos; tais crianças a nada chegam. Uma criança não deve ter senão a prudência de uma criança; e não deve se transformar num imitador cego. Ora, uma criança que apresenta as máximas do senso próprio de homens feitos está fora do caminho traçado para a sua idade e não faz senão imitar. (KANT, 1999, p.83)

Rousseau classificou a vida do homem em cinco períodos: lactância, infância, adolescência, mocidade e adulta. Considerando a importância de uma base sólida para toda e qualquer construção, comecemos agora a construir nosso homem rousseauniano.

6.1. Educação na primeira infância: lactância

Este é o período inicial do ser humano. É a fase em que a criança necessita ainda mais de cuidados; é a fase em que a educação da natureza mais se faz presente. Esta é a educação que se dá através do “desenvolvimento interno de nossas faculdades e de nossos órgãos” (ROUSSEAU, 1973, p.10), e para Rousseau “esta educação não depende de nós” (ROUSSEAU, 1973, p.11). Neste período em que chamamos este pequeno ser de bebê, tendemo-nos a exacerbar em proteção a criança devido sua fragilidade, mas, achando que estamos protegendo-a, acabamos debilitando-a, impedindo o trabalho da natureza de fazer desenvolver-se por si só todos os órgãos de seu corpo e, consequentemente, enfraquecendo o corpo e o espírito deste ser que acaba de chegar ao mundo. Talvez o leitor queira aqui entender este enfraquecimento do espírito aqui citado e, a relação desta fraqueza com os demasiados cuidados dispensados pela mãe ao seu bebê; este enfraquecimento espiritual se dá a partir do momento em que considerando que somos seres sensíveis, tão sensíveis que nos berços é comum encontrar crianças com os olhos fixados em um ordenado movimento de vai-e-vem os penduricalhos presos nestes pequenos dormitórios, prendendo assim sua visão com tamanha força a ponto de fazê-la hipnotizada levando-a ao sono e, o barulho do chocalho que desperta uma surpresa tão grande a ponto de cessar seu choro...Visto essa sensibilidade sensitiva, o que não poderia sentir o espírito de uma criança que ao nascer já sai destinada à prisão social? A prisão já é percebida e sentida nas suas primeiras horas de vida fora do útero materno. Como disse Rousseau:

Mal a criança sai do seio da mãe, mal goza a liberdade de se mexer e distender seus membros, já lhe dão novas cadeias. Enrolam-na em faixas, deitam-na com a cabeça imóvel e as pernas alongadas, os braços pendentes ao lado do corpo; envolvem-na em toda espécie de panos e tiras que não lhe permitem mudar de posição. Que se deem por felizes se não se veem apertadas a ponto de não poderem respirar(...) (ROUSSEAU, 1973, p.17).

Essa ideia de prisão também está presente no Discurso Sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade Entre os Homens, pois a falta da autonomia acarreta na perda da liberdade, pois “Os povos, uma vez acostumados a possuírem senhores, não conseguem viver sem eles.” (ROUSSEAU, 2000, p.35), desde o nascimento sujeitamo-nos ao costumes não naturais da sociedade. Na fase da lactância a criança deve ser protegida, alimentada e ter suas necessidades atendidas, sobretudo pela mãe, sim, pela mãe e não pelo pai, pois para Rousseau a mãe é quem melhor sabe cuidar da criança, a natureza a fez destinada a isso; visto que “do seio das mulheres depende a primeira educação dos homens” (ROUSSEAU, 1973, p.423), pode-se observar a relevância da mãe como primeira educadora dos filhos. Essa educação materna auxiliará na construção da moral deste homem que será o futuro cidadão social: feliz, bem educado e justo com os demais homens.

Para Rousseau, ao nascer, a criança não necessitaria de tantos cuidados exacerbados e inúteis. As mães acham que com todo este zelo estão garantindo a vida do seu bebê, quando na verdade, estão condicionando-os aos costumes antinaturais; as mães abafando o corpo do bebê com seus panos apertados, gorros, luvas e calçados, inconscientemente acabam matando a natureza humana presente no ser que tirando-lhes desta forma desde seus primeiros minutos de vida a percepção de que a natureza é perfeita e dispensa certos cuidados. Prisões! Nada mais que prisões são estes hábitos da sociedade que condicionam o homem desde sua infância à perda de sua liberdade, fazendo com que ele, segundo Rousseau (1973, p.17) nasça, viva e morra na escravidão. Sendo envolto num cueiro ao nascer e preso num caixão ao morrer. Ou seja, o homem já nasce destinado aos grilhões da instituições sociais. O debater-se, o choro, a inquietação da criança ao nascer quando colocada em incubadoras ou enrolada em panos já apresenta o conflito da natureza humana que anseia liberdade contra o estado servil que é lhe é imposto:

Seus primeiros sons, dizei vós, são de choro? É evidente. Vós os contrariais desde o nascimento; o primeiro presente que recebem de vós são algemas; os primeiros tratos que experimentam são tormentos. Nada tendo de livre senão a voz, como não se servirem dela para se queixarem? Choram por causa do mal que vós lhe fazem. (ROUSSEAU, 1973, p.18)

6.1.1. Da negligência das mães e das amas

O esforço desta criança a fim de libertar seu corpo dessas cadeias faz com que seus órgãos não recebam a educação da natureza, que os fariam desenvolver-se naturalmente, prejudicando desta forma o desenvolvimento corporal da criança, tornando-a franzina e enfraquecendo o futuro homem. Essa privação de liberdade sofrida pelas crianças vem em grande parte daquelas as quais Rousseau define como “mulheres mercenárias” ou amas, é o que chamaríamos hoje de babás ou mesmo as mães de leite. Ora, vê-se por aí diversas mulheres que abandonam seus bebês recém-nascidos dentro de latas de lixo, orfanatos ou mesmo num ato de extrema covardia os matam, o que leva a um questionamento: será que toda mulher nasceu para ser mãe? Independente da opinião de cada um, para Rousseau a maternidade é um dever. Em sua época, Rousseau já observara mães negligentes e despreparadas para nobre dever e a elas dirigiu a causa de muitos maus-tratos sofridos por crianças por suas babás. O autor relata na obra Emílio o caso de mães que não querendo amamentar os filhos, entregam-nos aos cuidados das amas para assim entregarem-se às festas, o que é comum nos dias atuais. Essas mães entregando seus filhos a estas mulheres dão início aos primeiros sofrimentos destes, pois, que amor pode haver de uma mulher estranha para uma criança que, até então, nunca lhe fora apresentada? Que afeto pode haver entre uma ama e uma criança que nunca se viram e que a relação de negócio se faz presente –ao menos para a ama? Visto isso, há de se esperar que a ama não desenvolva amor e paciência para com os filhos de outras –salvo algumas exceções. Sabe-se que as crianças por não saberem se expressar nesta fase, demasiadamente choram, e se os choros de uma criança podem irritar até os próprios pais, na estranha ama que lhe cuida a irritação pode ser ainda maior devido à falta de afeto da relação. Além do choro, a criança no seu ato de engatinhar por todos os cômodos, muitas vezes irrita as amas que para poupar trabalho, amarram-na –e nos dias atuais prende-a num berço-, impedindo assim seu desenvolvimento natural. Essas amas para Rousseau não se sensibilizam com seu choro, não só pela falta de afeto, mas porque sabem que, não se machucando a criança apenas com o choro, as mães ao voltarem para suas casas não saberão do sofrimento desta, afinal, sem marcas ou ferimentos e, não sabendo falar, as amas utilizam-se de formas perversas de redução do trabalho para com a criança por elas cuidadas:

Foi preciso confiá-los a mulheres mercenárias que, vendo-se assim mãe de filhos estranhos e não sentindo o apelo da natureza, não se preocuparam senão com poupar trabalho. (...) Estando ela bem amarrada basta jogá-la num canto sem se incomodar com os gritos. Desde que não haja provas da negligência da ama, desde que o bebê não quebre o braço ou a perna, que importa afinal que morra aleijado para o resto da vida? (...) Essas ternas mães que, livres de seu filhos, se entregam alegremente aos divertimentos da cidade, sabem porventura que tratamento recebe a criança em suas faixas na aldeia? Ante o menor aborrecimento que venha a ocorrer suspendem-na a uma prego como um trapo; e enquanto, sem se apressar, a ama trata de seus afazeres, a infeliz fica crucificada. (ROUSSEAU, 1973, p.18)

A estas mães insensíveis que, sendo saudáveis e possuindo leite materno se negam ao dever de amamentar seus filhos seja por questões estéticas19 ou qualquer outra que não se justifique numa anormalidade, Rousseau afirma que melhor seria para os filhos destas desnaturadas serem amamentados por outras mulheres, evitando assim a maldade das mães de sangue para filhos: “Parece-me a mim, de resto, que mais vale a criança mamar o leite de uma ama saudável que o de uma mãe degenerada” (ROUSSEAU, 1973, p.20). Rousseau acredita que esta indiferença da mãe para com o filho pode fazer com que este seja tão ou mais ingrato que ela: “Ao invés de fazer um filho amoroso de um bebê desnaturado, ela o exercita na ingratidão; ensina-lhe a desprezar quem um dia lhe deu a vida, tal qual quem deu o leite.” (ROUSSEAU, 1973, p.20). Portanto, para Rousseau, a educação materna é fundamental para a formação do caráter, da moral e da consolidação da bondade natural do homem, sem esta educação primeira, a corrupção se instaura nos corações desde seus primeiros anos.

Tudo provém sucessivamente dessa primeira depravação: toda a ordem moral se altera; o natural se apaga em todos os corações; (...) Mas que as mães concordem em amamentar seus filhos e os costumes reformar-se-ão sozinhos, os sentimentos da natureza despertarão em todos os corações; o Estado se repovoará. (ROUSSEAU, 1973, p.20)

6.1.2. O papel do pai na educação

O pai é visto como o melhor educador para o filho, pois “assim como a verdadeira ama é a mãe, o verdadeiro preceptor é o pai” (ROUSSEAU, 1973, p.24). O autor deixa muito claro que a família é a base moral do homem e, consequentemente do cidadão justo e íntegro. Para ele, quando uma ou as duas partes não podem ou se omitem da criação amorosa para com seu filho, o resultado é um futuro homem sem sentimentos, frio, cujo amor não se estabeleceu na sua infância. Como não se pode dar aquilo que não se tem, o resultado não poderá ser diferente.

Não há quadro mais encantador que o da família: mas um só traço errado desfigura todos os demais. Se a mãe não tem bastante saúde para ser ama, o pai tem negócios demais para ser preceptor. Os filhos, afastados, espalhados por pensões ou conventos, ou colégios, levarão o hábito de não se apegarem a nada. Os irmãos e irmãs mal se conhecerão. (...) Quem será bastante estúpido para não ver o encadeamento disso tudo? (ROSSEAU, 1973, p.25)

Segundo Rousseau, o homem tem uma dívida com o Estado: formar bons cidadãos. Para tal, é necessário que um homem se tornando pai, assuma seus deveres, não apenas alimentando como é o pensamento de muitos nos dias atuais, mas, além disso, educando os filhos para a vida, com ensinamentos adquiridos a partir de suas próprias experiências e maturidade. Para Rousseau, alegar pobreza ou falta de tempo não são justificativas para um homem deixar de exercer seu dever de pai e verdadeiro preceptor para seu filho. Um homem que não tenha essa consciência “não tem o direito de ser pai.” (ROUSSEAU, 1973, p.25)

Visto que, embora não seja correto, mas um pai se ausentando de seu dever e, concedendo a outro homem um exercício que seria o seu, este outro homem se caracteriza na qualidade de preceptor. Mas como garantir a qualidade da educação de um homem que pode nem sequer saber ser pai? Rousseau ignora esta questão por considerar de difícil resolução e supõe que este perfeito educador seja ele próprio. Mas antes que um leitor julgue hipócrita um autor que abandona os cinco filhos no orfanato Enfants Trouvés escrever um tratado de educação como o Emílio, é importante notar que na obra parece haver um certo arrependimento de Rousseau para tal atitude quando diz: “Leitores, podeis acreditar em mim: predigo que quem quer que seja tenha entranhas e negligencie tão santos deveres derramará por sua causa lágrimas amargas e nunca se consolará.” (ROUSSEAU, 1973, p.25)

O autor do Emílio foi sincero ao reconhecer suas falhas como pai. Um trecho que evidencia bastante seu remorso em deixar os filhos está na obra Confissões:

Ao entregar os meus filhos à educação pública, por não poder educá-los ·eu próprio, ao destiná-los a serem operários ou camponeses, de preferência a serem aventureiros e caçadores de fortunas, julgava praticar um acto de cidadão e de pai; e considerava-me como um membro da república de Platão. De então para cá, os remorsos do coração mais de uma vez me ensinaram que me havia enganado. (ROUSSEAU, 1968, p.346)

Primeiramente recusou um convite feito para ser preceptor do filho de alguém de quem apenas ouvira falar, por medo de errar na educação ou, se acertando, poderia fazer com que o filho deste alguém cuja posição na sociedade era alta, deixasse o desejo de ser príncipe, uma vez que a educação dada por Rousseau seria de desapego material. Não podendo ser preceptor na prática, Rousseau ao menos o foi na teoria, escrevendo esta grandiosa obra aqui citada: “Na impossibilidade de cumprir a tarefa mais útil, ousarei, ao menos, tentar a mais fácil: a exemplo de tantos outros, não porei a mão na massa e sim na pena; e ao invés de fazer o que é preciso, esforçar-me-ei por dizê-lo” (ROUSSEAU, 1973, p.27). A partir daí, não tendo sido um bom pai na vida real, o filósofo toma para si um aluno imaginário cujo nome leva o título da obra e o educa para a vida, antes de formar o cidadão através da educação que se utiliza da razão como foi comum no Iluminismo, Rousseau o educa primeiramente com o uso dos sentimentos. Para o autor, um homem completo deve possuir não só a razão, mas também os sentimentos. Um homem se faz completo quando a razão deste administra –sem deixar desaparecer- seus sentimentos.

Para se ter um espírito bem formado, a criança deve saber o que e a quem obedecer. O filósofo ressalta que a educação deve ser dada por apenas uma pessoa pois “é impossível que uma criança que passa sucessivamente por tantas mãos diferentes, venha a ser bem educada” (ROUSSEAU, 1973, p.35). A criança que não tem um referencial de educador tem seus juízos confundidos, minimizando a autoridade daquele que a educou anteriormente e, consequentemente, não valorizando aquilo que foi aprendido. Os pais são primordiais na educação das crianças e, sendo os pais duas pessoas, devem entrar em comum acordo sobre o que ensinar para a criança a fim de um não ensinar diferente ou retirar a autoridade do outro. Havendo lições diferenciadas por parte de muitas pessoas, a criança pode não saber quais lições deve seguir criando assim uma espécie de rebeldia e leis próprias. Um exemplo muito real são os casos em que as avós cedendo às vontades dos netos, acabam concedendo-lhes permissões para as coisas em que os pais determinou-lhes proibições. Daí tornam-se crianças mimadas que não conhecem limites.

6.1.3. Dos cuidados desnecessários

Em sua época, Rousseau observara que ao nascer os bebês eram banhados com água morna e, achando desnecessário esse cuidado, exemplificou os casos dos povos que banhavam suas crianças com águas de rio. Esse excesso de cuidados fora visto como uma espécie de frescura para o filósofo, pois “nossos filhos, amolecidos antes de nascerem pela moleza dos pais e das mães, trazem, vindo ao mundo, um temperamento já corrompido (ROUSSEU, 1973, p. 39)”. Para ele, o bebê já deve ser acostumado à água fria desde seu primeiros momentos de vida, porém, essa transição da água morna para a fria deve ser gradativa. Desta forma se fortalece o corpo da criança para o banho frio em qualquer estação do ano. Assim também, crescendo um pouco mais, deve-se acostumar a criança a banhos cada vez mais quentes, até um ponto suportável. Com essas extremidades entre o frio e o quente, o corpo torna-se preparado para as variadas temperaturas.

O corpo deve ser fortalecido ao máximo. Além da resistência às temperaturas diversas, o corpo precisa ser fortalecido também em seus membros. Fortalecendo os membros, o corpo desenvolve-se e cresce. Pensando nisso, deve-se deixar a criança engatinhar para que este desenvolvimento aconteça. Fica claro aqui que uma criança que vive presa nos berços ou andadeiras teria seu desenvolvimento prejudicado. Aquele(a) que cuida do bebê, deve deixar as lições da natureza acontecerem naturalmente, não interferir, exceto quando for para se preservar a vida da criança, já que esta nasce dependente dos cuidados dos adultos. A interferência neste processo deve ser o mínimo possível, uma educação negativa. “Repito-o, a educação do homem começa com seu nascimento; antes de falar, antes de compreender, já ele se instrui. A experiência adianta-se às lições” (ROUSSEAU, 1973, p.42).

A exposição à luz e a escuridão devem ser feitas com a finalidade de se evitar olhos vesgos na falta da primeira e, evitar o medo do escuro na falta da segunda. Sendo as crianças “puramente afetivas” (ROUSSEAU, 1973, p.42) e considerando o fato de que “não percebem senão o prazer e a dor” ((ROUSSEAU, 1973, p.42), deve-se lhe apresentar todos os objetos possíveis, assim ela acostuma-se e evita-se o temor às coisas que lhe forem novas. Rousseau acredita que apresentar os insetos e os animais, por exemplo, desde cedo, combate-se o medo que viriam a ter mais tarde, visto que “não há objetos horríveis para quem os vê diariamente” (ROUSSEAU, 1973, p.42). Outra coisa que se deve fazer é deixar a criança conhecer através do tato os objetos. Esta é uma maneira de fazer com que ela experimente através de sensações empíricas a geometria no tamanho das coisas e as temperaturas agradáveis ou desagradáveis. Tocando em coisas que a machuquem, desde que não cause danos graves, elas aprendem o que pode ou não causar danos a si. Não é fácil, sobretudo para as mães sendo seres mais sensíveis que os pais deixar um filho passar por esta experiência para formar o aprendizado, o sentimento de pena, a sensação do cuidado devido ao seu filho talvez a impediria de tal experimento, mas Rousseau justifica esta necessidade dizendo que “o destino do homem é sofrer em qualquer época. (...)o próprio cuidado de sua conservação está ligado à dor. (...)temos dó da sorte da infância mas é da nossa que deveríamos ter. Nossos maiores males vêm de nós mesmos” (ROUSSEAU, 1973, p.23). Desenvolver os sentidos é fundamental na educação da criança.

6.1.4. Do choro

Ao nascer, uma criança grita; sua primeira infância passa a chorar. Sacodem-na às vezes ou a acariciam para acalmá-la; ameaçam-na também e batem-na para que se cale. Ou fazemos o que lhe agrada, ou dela exigimos o que nos agrada. Ou nos submetemos a suas fantasias ou a submetemos às nossas: não há meio termo, é preciso que nos dê ordens ou que as receba. (ROUSSEAU, 1973, p.23)

Por não saberem se expressar as crianças nesta fase exprimem suas necessidades através de sinais e do choro. É no choro que elas tem seus anseios atendidos. Ao chorarem, deve-se averiguar sua real necessidade ou mal-estar, acalmando-a, saciando sua fome, retirando seu soluço ou mesmo acabando com o frio ou calor que a venha incomodar. O filósofo genebrino citando Boerhaave20 diz que as crianças nascem com a cabeça grande, com isso, possuem mais terminações nervosas, o que as fazem comumente mais irritadiças. Rousseau acreditava que as crianças devem ser poupadas de irritação, para que não se tornem emburradas ou temperamentais. Cita ainda que as crianças que são criadas de forma livre são mais saudáveis e felizes. Que não se pense com isso que Rousseau defende uma servidão do adulto para com a criança, mas sim evitar aborrecê-la, e não obedecê-la. Para o genebrino, os choros posteriores à fase da necessidade não passam de caprichos. A criança ao saber que tem suas necessidades atendidas ao chorar, começa a utilizar-se deste recurso para coisas que não lhe são necessárias, por simples rebeldia ou mimo dado pelas mães que, pensando em proteger o filho com cuidados excessivos acabam estragando-o, fazendo-o desconhecer os limites. Desta forma, a criança utiliza-se do choro para se apoderar do adulto, que se compadecendo com suas falsas lágrimas, acaba entrando num enfadonho exercício de cuidados desnecessários que nunca tem fim. Rousseau adverte que “assim, de sua própria fraqueza, de que provém inicialmente o sentimento de sua dependência, nasce a seguir a ideia de império, de domínio” (ROUSSEAU, 1973, p.47). Por isso, Rousseau recomenda que se a criança tentar alcançar um objeto e ficar calada enquanto faz este esforço, significa que ela realmente quer o objeto desejado, embora não consiga pegá-lo, e, neste caso, deve-se leva-la “ao objeto devagar e a passos miúdos” (ROUSSEAU, 1973, p.48), mas, se ao estender as mãos em direção ao objeto de desejo e, ao mesmo tempo gritar e chorar, ela está tentando dominar o adulto, fazendo com que ele pegue e atenda sua vontade. Neste segundo caso, esta é a recomendação de Rousseau (1973, p.48), que se finja não entendê-la e quanto mais gritos ela der, mais se ignore-a, acostumando-a a não querer dominar os homens nem os objetos. Se a criança deseja algo, a melhor forma de instruí-la é fazendo-a ir por conta própria ao que deseja possuir, combatendo assim desde cedo o vício.

O choro de uma criança alimentada e que goza de boa saúde não é natural, é um mal hábito desenvolvido a partir do momento em que, para se ver livre de seu choro, o adulto atende suas vontades. Pensando causar-lhe um bem, o adulto faz um mal ainda maior, pois “fazendo a criança calar hoje e excita a chorar mais amanhã” (ROUSSEAU, 1973, p.51). Ignorando seu choro imperial, faz-se com que ela canse e passe a chorar apenas no momento de dor. Além da indiferença ao seu choro, outra forma de fazê-la parar com seus prantos não naturais, é dando-lhes objetos que a distraiam, porém, esta técnica deve ser bem realizada, pois, percebendo a intenção do adulto, a técnica pode não ter sucesso.

Segundo Rousseau, as dores da corpo são menores que as dores da alma. Isso para dizer que é melhor cair e se levantar, aprendendo desde a infância a tornar-se forte para vida que nunca ter conhecido a dor e conhecê-la na fase adulta, onde as dores sofridas pela alma serão ainda maiores.

6.2. Educação na segunda infância

Saindo da fase lactante, a criança entra numa fase em que aprende a falar. Sabendo falar, não se torna mais necessário o choro quando há necessidades naturais. A criança que ainda chora por qualquer coisa e desnecessariamente nesta idade é porque foi mal-educada pelos pais ou preceptores, tornando-se fraca às adversidades e despreparada para a vida. Se chorar mesmo nesta fase em que deveria já estar fortalecida pelas experiências anteriores da lactância, deve-se continuar a ignorá-la a fim de combater este vício. Rousseau acredita que o choro é mais presente quando se tem alguém para ouvi-lo: “por mais que se machuque, é muito raro que a criança chore estando sozinha, a menos de ter a esperança de ser ouvida” (ROUSSEAU, 1973, p.58). Ao se machucar, não se deve correr como fazem as mães numa intensa agonia enchendo a criança de perguntas, acariciando-lhe a cabeça e enchendo-a de paparicos, pelo contrário, deve-se manter a calma pois a dor logo passa. O filósofo genebrino acredita que nesta fase se desenvolve a coragem, onde “experimentando sem pavor dores ligeiras, se aprende gradualmente a suportar as grandes” (ROUSSEAU, 1973, p.59). A coragem é desenvolvida quando se conhece a dor. O homem que nunca conheceu a dor na infância, torna-se demasiado sensível e fraco.

Sofrer é a primeira coisa que deve aprender e a que terá mais necessidade de saber. (...) Se a criança cair naturalmente, não quebrará as perna; se se chocar contra um pedaço de pau não se quebrará o braço;(...) Nunca soube de alguém ter visto uma criança em liberdade se matar, se estropiar, nem se machucar demasiado, a menos que a tenham absurdamente colocado em lugar elevado, ou sozinha perto do fogo, ou deixado instrumentos perigosos a seu alcance. (ROUSSEAU, 1973, p.59)

Segundo Rousseau, o sofrimento faz parte da vida humana, ele nos fortalece, nos prepara para a vida. Para ele, a felicidade consiste em sofrer o menos possível. É preciso fazer a criança entender o que lhe é necessário naturalmente, pois desejar aquilo que lhe é dispensável é tornar-se miserável, “a miséria não consiste na privação das coisas e sim na necessidade que delas se faz sentir” (ROUSSEAU, 1973, p.63). Portanto, a fraqueza consiste em não dominar suas paixões. O homem que pretende ser mais do que ele pode ser, que almeja coisas que vão além de suas necessidades básicas, que acredita ser melhor que os demais quando se considera mais sábio em conhecimentos e mais poderoso em bens materiais é o mais fraco, pois à medida em que seu orgulho cresce, este sentimento mesquinho vence sua verdadeira razão que é bastar a si mesmo no amor de si, e não no amor próprio. Que se eduque a criança desde a infância nestes ensinamentos. Que se ensine a ela que quanto mais se busca a felicidade nas coisas e nas pessoas mais se distancia dela, pois querendo conquistar cada vez mais coisas e pessoas, esquece-se de viver. E o que é viver? Segundo Edgar Morin na obra Ensinar a Viver, viver é: “Viver como indivíduo, enfrentando os problemas de sua vida pessoal, é viver como cidadão de sua nação, é viver também em seu pertencimento ao gênero humano” (MORIN, 2015, p.15). Inserir a criança na sociedade antes do tempo é inculcar-lhe necessidades que não são próprias de sua idade. Ela deve ser educada sem imposições, as únicas atribuições dadas a ela devem ser aquelas que lhe sejam úteis, não aquelas que lhe tirem a liberdade de ser criança. Os deveres da vida social dos adultos como falar bem, vestir-se adequadamente, fazer honrarias e todas estas coisas que eram comuns em sua época, para Rousseau eram detestáveis quando direcionadas como um dever para as crianças.

Que não se confunda a liberdade defendida por Rousseau com um estado de liberalidade total da criança. Rousseau nos ensina que embora deva gozar da liberdade que lhe é necessária para seu desenvolvimento físico e imaginativo, à criança deve ser imposto limites a fim de não torná-la soberba e evitando-lhe os vícios dos homens em querer ter tudo aquilo que suas paixões os faz pensar serem donos.

Sabeis qual o meio mais seguro de tornar vosso filho desgraçado? Acostumá-lo a tudo conseguir; pois, crescendo incessantemente seus desejos com a facilidade de satisfazê-los, mais cedo ou mais tarde a impossibilidade de atende-lo vos forçará à recusa; e essa recusa, não habitual, lhe dará mais aborrecimento do que a própria privação do que ele deseja. Primeiramente ele desejará vossa bengala; depois irá querer vosso relógio; a seguir o pássaro voando; mais tarde a estrela brilhando; e desejará tudo o que vir. (ROUSSEAU, 1973, p.71)

A criança que não conhece estes limites, torna-se enraivada quando lhe contrariam, angustiando-se por não conseguir o que se quer, e, sendo assim, não conhecerá a felicidade –que é sofrer o mínimo possível. Sim, serão infelizes, pois ao crescerem e se transformarem em homens, conhecerão a sociedade que lhes resistirá aos desejos. À criança só se deve dar aquilo que é necessário, e não o que ela pede, evita-se com isso o domínio. O adulto deve ter em mente que a criança é dependente de nós, visto que não nascem prontas e que nossa educação é sua formadora. Portanto, ela deve obedecer aos adultos e não estes a ela. Vale ressaltar que Rousseau adverte que essa autoridade do adulto não deve ser percebida pela criança, pois ela não deve conhecer o significado de autoridade, mas que ela deve obediência pelo fato de sua fraqueza e dependência que a faz necessitada de quem a educa e cuida.

Por não conhecer ainda o senso da moralidade, a criança pode mesmo com todas as lições do preceptor ser desobediente, quando isto acontece, Rousseau diz que não se deve castigar, ser severo ou esbravejar, pois não sabendo o que é moral, ela tornará a fazer peraltices fora das vistas do adulto, o grito pela liberdade será dado quando ela estiver sozinha ou com outras crianças. Para Rousseau a “educação primeira deve portanto ser puramente negativa. Ela consiste não em ensinar a virtude ou a verdade, mas em preservar o coração do vício e o espírito do erro” (ROUSSEAU, 1973, p.80). O acúmulo de estudos dado à criança antes dos doze anos é inútil, pois antes desta idade ela não faz o uso da razão, o máximo que poderá fazer com estes ensinamentos de várias disciplinas como Geografia, Ciências etc, é memorizar para repetir quando lhe for conveniente, porém, sem nada entender. “Exercitai seu corpo, seus órgãos, seus sentidos, suas forças, mas deixai sua alma ociosa enquanto for possível” (ROUSSEAU, 1973, p.80). Valorizar os sentidos e o conhecimento empírico das coisas e de si e, extirpar os conhecimentos escolares oriundos de livros antes dos doze anos é a tarefa do bom preceptor. Uma vez que a razão dorme na primeira e segunda infância, é inútil apresentar-lhe os livros, já que para o filósofo a primeira educação é dada pela natureza, que desenvolve naturalmente nossos órgãos dos sentidos. Esta educação primeira deve ser negativa, não acrescentando saberes, mas sim preservando e fortalecendo as qualidades imanentes na criança, preservando-a dos vícios. Antes dos doze anos a criança está mais suscetível ao erro, por isso, o preceptor deve preservá-la ao máximo da sociedade, valorizando seus sentimentos e sensibilidade ao invés de impor novos conhecimentos acadêmicos. É não fazer o que era feito nas instituições de sua época, daí a educação rousseauniana é chamada de “negativa”. Para Rousseau não se deve ensinar para a criança ideias abstratas do conhecimento antes dos doze anos, pois como já foi dito aqui, nesta fase a razão não se manifesta. Nestes primeiros anos da vida a educação deve ser voltada para o corpo e os sentidos. Brincar, conhecer a natureza ludicamente e não através de livros é fundamental neste período. A natureza e as coisas são os primeiros mestres na vida da criança. “O espírito de minha instituição não é ensinar à criança muitas coisas e sim não deixar entrar em seu cérebro senão ideias justas e claras. (ROUSSEAU, 1973, p.179).

É certo que uma educação como esta não é fácil de ser conseguida, e o próprio Rousseau reconhece dizendo:

Sinto tais dificuldades, confesso: talvez sejam insuperáveis, mas o fato é que, procurando aplicadamente preveni-las, até certo ponto as prevenimos. Mostro a meta que é preciso atingir, não digo que se possa consegui-lo; mas digo que quem dela mais se aproximar terá tido o maior êxito. (ROUSSEAU, 1973, p.81)

7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O tratado pedagógico rousseauniano foi escrito sem pretensões de querer mudar o padrão imposto em seu tempo, mas surgiu como uma análise até então pensada e posteriormente registrada como uma obra voltada apenas para quem se interessasse pelo assunto, como diz o próprio Rousseau:

Falarei pouco da importância de uma boa educação; nem me deterei tampouco em provar que a que se pratica é má; mil outros o fizeram antes de mim, e não me agrada encher um livro com coisas que todo mundo sabe. (...) Não é sobre ideias de outros que escrevo; é sobre as minhas. (...) E se por vezes adoto o tom afirmativo, não é para influir no espírito do leitor e sim para lhe falar como penso. (...) embora não queira obstinar-me em defender minhas ideias, não me creio por isso menos obrigado a propô-las.(ROUSSEAU, 1973, p.5)

Rousseau afirmara que o homem passa a ser mau devido ao males sociais, e, acreditando que o homem nasce bom, ele pretendeu preservar esta bondade desde a infância, pois é nesta fase da vida que o homem, ainda sendo criança, depende dos ensinamentos dos homens, das coisas e da natureza. O ensinamento dos homens é que insere a maldade na cabeça da criança, pois, acreditando que as crianças são imitadoras, tendem a repetir aquilo que aprendem, se o que aprendem é tornar-se homens antes de se tornarem cidadãos, conserva-se e se reforça sua bondade natural, mas se o que se aprende são coisas que lhe são dispensáveis, forma-se apenas cidadãos e servos de um sistema social que retira o homem de sim em prol das opiniões alheias. Rousseau pretende formar um homem justo, livre, autônomo, feliz e que não se construa a partir das opiniões de projeções alheias. Rousseau não busca transformar o homem em um animal irracional selvagem, mas fazer com que o homem tenha consciência de que é um ser bom e não se afete com os males dos outros homens já corrompidos.

Não é fazer com que Emílio seja torne-se antissociável, mas fazê-lo dono de si e prepara-lo com um corpo e um espírito forte para convivência com aqueles que possam tentar degenerar seu ser. Cabe ao preceptor a tarefa de construir este homem perfeito e incorruptível e este deve ser escolhido com muito senso crítico para não fazer de seu Emílio um homem comum vazio de si e preenchido de vícios e opiniões. Mas como se chega a este projeto em que o próprio filósofo chega a especular que seja fantasioso quando diz: “Eis o estudo que mais me dediquei a fim de que, ainda que seja meu método quimérico e falso, possam aproveitar minhas observações.” ? (ROUSSEAU, 1973, p.6). Primeiramente é preciso que o a criança seja autônoma, autonomia aqui está no sentido da ética, livre para escolher sempre o bem; o preceptor deve retirar de si a autoridade que inculca conceitos complexos para instruir a criança dentro daquilo que convém aprender dentro de suas limitações em cada etapa da vida. Deve-se deixar no início da infância a natureza educar naturalmente, a interferência do preceptor deve ser a mínimo possível. Ele deve observar as potencialidades da criança para a partir daí desenvolvê-las, retirando de perto do aluno tudo que possa deturpar sua pura natureza humana. O preceptor se possível, deve ser jovem o suficiente para compreender a mente infantil e, além disso, acompanhar a criança em suas brincadeiras. Tornar-se amigo é fundamental para o preceptor. Numa amizade verdadeira a autoridade do preceptor é vista como ensinamentos de amor, de preparo, e a construção desta amizade e a consolidação destes ensinamentos do preceptor, da natureza e das coisas da vida é feita com o passar do tempo, de forma gradativa. A autoridade do preceptor é um ato de condução, não de imposição. A liberdade oferecida pelo preceptor fará com que a criança seja sempre sincera e autêntica, permitindo assim com que o preceptor a conheça melhor e compreenda suas necessidades para conduzi-la ao melhor caminho. Numa relação desta natureza, o aluno respeitará o mestre não por temor, mas por amor.

Visto que a primeira educação da criança deve tomar como primazia os sentidos da mesma, é importante que a criança contemple a natureza, as coisas e desta forma aguce seus sentidos e forme sua ideias que serão corrigidas e esclarecidas na idade da razão. Para Rousseau, a liberdade é imprescindível desde a infância, mas ela não pode ser desregrada, sem limites, pois a criança não fazendo ainda o uso da razão, não saberia usar desta liberdade em prol de suas necessidades. A educação lúdica, nos campos, em contato com a natureza é a chave para o desenvolvimento dos sentidos. Nada livros que representam as coisas, mas sim a natureza viva, real para o aluno.

8. REFERÊNCIAS

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Emílio ou Da educação. Tradução: Sérgio Milliet. São Paulo: Difusão Europeia do livro, 1973.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Contrato Social. Tradução: Lourdes Santos Machado, São Paulo: Nova Cultural, Coleção Os Pensadores, vol. I, 2000.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Ensaio sobre a Origem das Línguas. Tradução: Lourdes Santos Machado, São Paulo: Nova Cultural, Coleção Os Pensadores, vol. I, 2000.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso Sobre a Origem e os Fundamentos da Desigualdade Entre os Homens. Tradução: Lourdes Santos Machado, São Paulo: Nova Cultural, Coleção Os Pensadores, vol. II, 2000.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Discurso Sobre as Ciências e as Artes. Tradução: Lourdes Santos Machado, São Paulo: Nova Cultural, Coleção Os Pensadores, vol. II, 2000.

ROUSSEAU, Jean-Jacques. Confissões. Tradução: Fernando Lopes Graça: Portugália, 1968. 653p.

LADURIE, Emmanuel Le Roy. Introdução – A Monarquia Clássica. In: O Estado Monárquico – França 1460-1610. São Paulo: Companhia das Letras, 1994. pp. 9-14.

SERIACOPI, Gislane Campos Azevedo; SERIACOPI, Reinaldo. A Revolução Francesa. In: História: volume único. São Paulo: Ática, 2005. pp. 252-257

MORIN, Edgar>. Ensinar a Viver: Manifesto Para Mudar a Educação. Tradução: Edgard de A. Carvalho e Mariza P. Bosco, RS: Sulina, 2015. 183p.

CASSIRER, Ernst.A questão Jean-Jacques Rousseau. Tradução: Erlon José Paschoal, Jézio Gutierre e Isabel Maria Loureiro, São Paulo: Unesp, 1997.

BEZERRA, Gustavo Cunha. Natureza e Retorno à Transparência em Rousseau. Colloquium Humanarum, Vol. 9, No 1 (2012). Disponível em:  http://revistas.unoeste.br/revistas/ojs/index.php/ch/article/viewArticle/504. Acesso em: 17 de outubro de 2017.

OLIVEIRA, Fernando Bonadia de. O Emílio de Rousseau: Uma obra de pedagogia? Filosofia e Educação (2012). Disponível em: https://periodicos.sbu.unicamp.br/ojs/index.php/rfe/article/view/8635422/3215. Acesso em: 02 de novembro de 2017.

Filósofos e a Educação Rousseau. Disponível em: <https://www.youtube.com/watch?v=s8T30sDm3uw>. Acesso em: 15 de novembro de 2017.

VILLAS-BÔAS, Marcos de Aguiar. Pestalozzi e a revolução da educação brasileira. Vanguardas do Conhecimento (2017). Disponível em: <https://www.cartacapital.com.br/blogs/vanguardas-do-conhecimento/pestalozzi-e-a-revolucao-da-educacao-brasileira>. Acesso em: 05 de novembro de 2017.

FERRARI, Márcio. Pestalozzi, o teórico que incorporou o afeto à sala de aula. Nova Escola (2008). Disponível em: < https://novaescola.org.br/conteudo/1941/pestalozzi-o-teorico-que-incorporou-o-afeto-a-sala-de-aula>. Acesso em: 05 de novembro de 2017.

1 Para Rousseau, Deus é este autor.

2 O filósofo Luiz Felipe Pondé, doutor em Filosofia da USP, influenciado pelas ideias do filósofo Edmund Burke, compara Rousseau a um ‘’ filósofo da vaidade” e um ‘’ teórico de gabinete” que pretende salvar o mundo com seus ideais que ele considera pueris. Já os pedagogos – sobretudo estes - de nossa geração concordaram com várias de suas teses, inclusive no que tange a Educação.

3 Este conceito de educação defendido por Rousseau consistia em preservar a criança. A educação negativa rousseauniana deveria colocar-se em lugar da educação positiva, que visava acumular estudos na criança. Segundo Rousseau, deve-se educar e desenvolver primeiramente o corpo e o caráter da criança, e não seu intelecto, visto que este se desenvolverá mais tarde na adolescência.

4 Sua educação religiosa é obtida através de sua família protestante.

5 Discurso Sobre as Ciências e as Artes. Nesta obra o próprio autor considera uma ousadia desafiar as Ciências perante uma das mais sábias companhias da Europa que foi a Academia de Dijon.

6 É importante saber que este irmão não sentia raiva ou ciúmes de Jean-Jacques, como o afirma o próprio filósofo (1970, p. 19) “Quase que não o via, e mal posso dizer tê-lo conhecido; contudo, não deixava de o amar com ternura, e ele amava-me tanto quanto um valdevinos pode amar qualquer coisa”.

7 O que hoje chamamos de office-boy.

8 Modo de governo monárquico francês em que o rei é considerado sagrado. O rei era detentor de uma justiça imortal e objetivava alcançar uma religião semelhante para os súditos.

9 “O meu espírito, rebelde a toda espécie de jugo, não pode sujeitar-se à lei do momento;” (ROUSSEAU, 1970, p.122)

10 Este desapego era pela falta de expectativa de vida das crianças que morriam precocemente, fosse devido ao trabalho ou às doenças:

11 (...) Demonstro primeiramente que o estado dos homens sem a sociedade civil (ao qual podemos corretamente chamar de Estado de Natureza), nada mais é que uma guerra de todos contra todos, e nesta guerra, todos os homens tem direitos iguais sobre todas as coisas; e em sequência, que todos os homens assim que entendem esta condição odiosa (até porque a natureza os compele a isto) desejam livrar-se desta miséria. Mas isto não pode ser feito a menos que, através de um pacto, abdiquem do direito pelo qual todos são possuidores de todas as coisas. (HOBBES, 2006, p.15)

12 “Nunca houve obra que recebesse tantos elogios particulares, nem tão pouca apro­vação pública. O que me disseram, o que me escreveram as pes­soas mais capazes de a julgar trouxe-me a confirmação de que se tratava do melhor e do mais importante dos meus escritos” (ROUSSEAU, 1970, p.13).

13 Por considerar o homem primitivo com uma bondade inata, Rousseau acreditava que a civilização e sua cultura desconstrói a moralidade intrínseca. Para ele, o homem agora educado e polido pelas regras sociais, esconde sob suas máscaras os sentimentos de egoísmo, orgulho e vaidade que são nutridos por esta cultura que gera a competitividade humana.

14 Faz-se necessário saber que a salvação para o estado de corrupção social não é acabar com a sociedade, pois ela pode contribuir com o rápido desenvolvimento humano, mas despertar a consciência e evitar a alienação, o egoísmo e a perda do amor próprio para a admiração demasiada do próximo que ostenta poder e autoridade. Rousseau crítica, mas não quer acabar com as Ciências, mas limitá-la às fases em que as mesmas podem ser aprendidas pelas crianças.

15 “Das pessoas matriculadas em pedagogia, 93% são mulheres” (https://g1.globo.com/educacao/guia-de-carreiras/noticia/dia-das-professoras-nove-em-cada-dez-estudantes-de-pedagogia-sao-mulheres-e-maioria-faz-curso-a-distancia.ghtml ) Mais informações vide referências bibliográficas.

16 Segundo Rousseau, o homem que foi mal educado é aquele no qual não houve uma congruência nos ensinamentos dos 3 mestres da vida: a natureza, os homens e as coisas.

17 Nenhuma obra de Pestalozzi ou de Rivail sobre educação foi traduzida para o português até hoje, exceto por uma ação do Ministério da Educação, na gestão de Fernando Haddad, que traduziu algumas cartas da obra clássica de Pestalozzi intitulada Como Gertrudes ensina seus filhos. Considerando a dificuldade brasileira com línguas estrangeiras e a escassez de material em português, pode-se imaginar quanto se conhece das propostas desses dois grandes educadores por aqui. (Citação extraída do site https://www.cartacapital.com.br/blogs/vanguardas-do-conhecimento/pestalozzi-e-a-revolucao-da-educacao-brasileira). Mais informações vide referências bibliográficas.

18 A Associação Pestalozzi de Niterói foi fundada em 3 de dezembro de 1948. É uma instituição civil sem fins lucrativos e econômicos, reconhecida de Utilidade Pública nos três níveis de governo: municipal, estadual e federal. Dentre os vários serviços oferecidos pela instituição, podemos encontrar o atendimento para crianças e adolescentes com distúrbio de aprendizagem e comportamento.

19 Muitas mulheres se negam a amamentar os bebês sob a alegação de que ficariam feias com os seios grandes e caídos e, não o fazendo, o leite seca e os seios voltam ao tamanho anterior à gestação.

20 Segundo o Dicionário Universal de História e Geografia disponível em: https://books.google.com.br/books?id=uUmKRJF-lo4C&pg=PA428&lpg=PA428&dq=Dicion%C3%A1rio+universal+de+hist%C3%B3ria+e+geografia+boerhaave&source=bl&ots=WgwDVzsbmQ&sig=rHGkriogfa0kOAltaZmLdY5MQt4&hl=pt-BR&sa=X&ved=0ahUKEwjz3Pjx0O7XAhUEjpAKHYkWA_wQ6AEIVzAK#v=onepage&q=Dicion%C3%A1rio%20universal%20de%20hist%C3%B3ria%20e%20geografia%20boerhaave&f=false, Herman Boerhaave nasceu em 1668 e morreu em 1738. É considerado o fundador do ensino clínico e do hospital acadêmico moderno. Sua principal realização foi demonstrar a relação dos sintomas com as lesões.


Publicado por: Anderson Silva Oliveira

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