PRECONCEITO SOCIAL E LINGUÍSTICO NO ENSINO DA LÍNGUA MATERNA: Um Olhar Sociolinguístico e da Análise do Discurso

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1. RESUMO

O presente trabalho tem como tema: Preconceito Social e Linguístico no Ensino da Língua Materna: Um olhar Sociolinguístico e da Análise do Discurso. Foi desenvolvido buscando saber se os alunos das escolas públicas são vitimas de preconceitos relacionados à variedade linguística que já trazem do seu ambiente social e familiar e se o preconceito exercido sobre esses alunos trazem em seu bojo, outros preconceitos que se caracterizam por relegar esses alunos à uma educação sem qualidade e manipulado de tal forma que haja um domínio das elites não só na questão linguística, mas também na vida social desses alunos. É nesse sentido que este estudo tem por objetivo principal analisar se há preconceito social e linguístico no ensino da língua materna. Optou-se por uma abordagem qualitativa com pesquisa descritiva sendo desenvolvida com revisão bibliográfica e depois com uma pesquisa de campo com aplicação de questionário a dez alunos de ensino médio de uma escola estadual da cidade de Novo Gama-GO e duas professoras de português que lecionam no Ensino Médio nessa mesma escola. Com o proposito de compreender e responder aos questionamentos surgidos antes e durante o processo de investigação, possibilitando através de seus resultados se há realmente este preconceito social e linguístico no ensino da língua materna. Em suma pode-se dizer que de fato há o preconceito linguístico e que este advém de um preconceito social disfarçado em um discurso que não se torna palpável em melhorias para a escola. É necessário, portanto, que se busque diminuir as diferenças entre quem fala a língua padrão e os que falam as demais variações linguísticas trazendo-os para o convívio escolar e oferecendo qualidade de ensino para que não se sintam a margem da sociedade, mostrando-lhes que também são importantes no processo educativo.

Palavras-chave: Preconceito linguístico. Análise do Discurso. Ideologia.

ABSTRACT

The present work has the theme Social and Linguistic Prejudice in the Teaching of Mother Tongue: A look at sociolinguistic and discourse analysis. It was developed seeking to know whether public school students are victims of prejudice related to the linguistic variety that already have their social and family environment and the bias exerted on these students bring in their wake, other prejudices that are characterized by relegating these to the students an education without quality and manipulated so that there is an elite domination not only in the language issue, but also in social life of students. In this sense, this study aims at analyzing whether there are social and linguistic bias in the teaching of mother tongue. We opted for a qualitative descriptive approach was developed with a literature review and then a field survey with a questionnaire to ten high school students from a state school in the city of New Gamma-GO and two Portuguese teachers who teach in high school in the same school. With the purpose to understand and answer the questions that arise before and during the research process, providing through its results if there really is this social and linguistic bias in the teaching of mother tongue. In short we can say that there is indeed bias and that this language comes from a social prejudice disguised in a speech that was not palpable in improvements to the school. It is necessary, therefore, to seek to reduce the differences between those who speak the standard language and who speak the other language variations bringing them to school life and providing quality education so they do not feel the margin of society, showing them which are also important in the educational process.

Key-words: Prejudice linguistic. Analysis of Discourse. Ideology.

2. INTRODUÇÃO

O preconceito linguístico é uma realidade na sociedade brasileira e isso reflete nas escolas onde o indivíduo inicia o seu aprendizado para a vida. Portanto, buscou-se por meio do tema escolhido mostrar que há entre os falantes de língua portuguesa o preconceito linguístico e que esse preconceito, que favorece a língua padrão, permanece perniciosamente ativo por meio das ideologias das elites e que se processa utilizando um discurso às vezes claro e compreensível e outras vezes velado e discreto, mas sempre com a intenção de subjugar as demais variações linguísticas como se saber a norma culta fosse sinônimo de superioridade e não sabe-la fizesse do outro um indivíduo desprezível como afirma Bagno (2009, p. 29):

É esse o discurso, muitas vezes não explicitado, oculto na atitude quem se vale de seu conhecimento da gramática normativa como um instrumento de distinção, como se saber a regência “correta” do verbo implicar implicasse em algum tipo de vantagem, de superioridade intelectual, de senha secreta para o ingresso num círculo de privilegiados. (grifos do autor).

Percebe-se também que por trás desse preconceito as outras variações linguísticas há um preconceito social que abrange a raça, a cor, a sexualidade e que considera a questão financeira como um atributo para um alto grau de relevância na sociedade, ou seja, são preconceitos “materializados pela linguagem” Leite (2008, p. 17). Procura-se, portanto, ao longo deste trabalho, retratar como o preconceito é um fato bastante vivenciado dentro das instituições de ensino de todo o Brasil por estas refletirem o que ocorre na sociedade. A escola deve ter o papel de socializar o indivíduo, possibilitando que as variações linguísticas de cada indivíduo não tenham uma interferência nas práticas sociais de cada um. No entanto, na prática , não é o que ocorre, pois sempre tem-se os que dominam a língua padrão e a educação direcionando os alunos das escolas públicas para chegarem em status sociais previamente selecionados.

O tema trago à baila engloba a questão do preconceito linguístico observado sob uma ótica da sociolinguística e da análise do discurso, pois entende-se que: “Tudo que é ideológico possui um significado e remete a algo situado fora de si mesmo. Em outros termos, tudo que é ideológico é um signo. Sem signos não existe ideologia.” (grifos do autor) Bakhtin (2010, p.31). Portanto usa-se da palavra para convencer e criar uma ideia de que tudo vai bem ou de que a qualidade existe, mas a constatação é bem diferente do discurso. A delimitação desse estudo foi motivada pelo intuito de se verificar se há ou não preconceito das elites para com as camadas sociais desfavorecidas que frequentam as escolas públicas, se esse preconceito se concretiza por meio da linguagem e se por meio da atuação dos que controlam a educação procura-se manter esses indivíduos à margem de um crescimento real de qualidade no país.

A educação no Brasil sempre primou pela língua padrão, pois esta é a língua exigida em concursos ou como critério para se tenha uma acessibilidade social no país. Quanto a isso não há questionamentos tendo em vista que é um fator que se tornou comum ao longo dos anos e que faz com que haja um estudo sistematizado da língua portuguesa nas escolas. O que se questiona é a intolerância e o preconceito com as demais variações não considerando inclusive que “todas as línguas mudam, que toda língua é um grande corpo em movimento, em formação e transformação, nunca definitivamente pronto.” Bagno (2002, p. 10). Além disso o preconceito se concentra com mais amplitude e profundidade nas classes mais desfavorecidas economicamente e, no caso escolar, nas que frequentam as escolas públicas as quais, abarrotadas de alunos não possuem a qualidade muitas vezes apregoadas pelo governo e por indivíduos que são responsáveis pela educação no país, pois estes são grupos hegemônicos e como tal manipulam a educação. Dessa forma se o “grupo social hegemônico entender que a educação deve ser fundamentalmente um processo de domestificação e de reprodução cultural, a forma de discursividade exercerá pressão sobre o modo de enunciação no sentido de que o enunciado se apresente dogmático e autoritário.” Voese (2004, p.54). Isso implica em manipulação constante dos que frequentam o ensino público.

O presente trabalho tem como objetivo geral: Identificar se há preconceito linguístico nas escolas, fazendo uma análise por meio da sociolinguística e da análise do discurso. E como objetivos específicos analisar se o preconceito linguístico é a materialização do preconceito social em suas diversas vertentes, se esse preconceito linguístico ocorre principalmente pelo fator econômico tendo em vista que os que frequentam as escolas públicas são em sua maioria de classes desfavorecidas economicamente e se há um discurso de qualidade nas escolas praticado pelos que estão à frente da educação contrariado pelas práticas educativas.

As metodologias usadas para a realização da pesquisa foram: pesquisa bibliográfica e pesquisa de campo com aplicação de questionário para os sujeitos colaboradores. A metodologia utilizada para a análise de dados foi quantitativa.

Foram várias as contribuições autorais para o enriquecimento e qualidade do trabalho, dentre eles: Bagno (2009), Brandão (2004), Bakhtin (2010), Castro (2007), Calvet (2012), Carvalho (2012), Fiorim (2006), Luft (2004), Leite (2008), Vandijk (2008), Voese (2004), sendo que destes, os principais autores utilizados para embasar o estudo foram: Bakhtin (2010), Bagno (2009), Voese (2004).

Quanto a estrutura, o trabalho foi dividido em três capítulo ficando o capítulo I, intitulado preconceito social e linguístico no ensino da língua materna: um olhar sociolinguístico e da análise do discurso em que se aborda a questão do preconceito linguístico e a sociolinguística em seu diversos âmbitos inclusive tratando da questão dos mitos linguísticos. O capítulo II aborda o discurso como forma ideológica de dominação e poder considerando que todo discurso é ideológico e tendencioso, consistindo o discurso dos que manejam a língua padrão em manipular e se sobrepor aos que se atêm às demais variações linguísticas e o capítulo III, que apresenta a metodologia usada para a pesquisa e analise dos dados fornecidos por professores e alunos de uma escola pública.

A pesquisa do tema deste trabalho nos leva a refletir sobre a possibilidade de uma maior tolerância linguística com quem não domina a língua padrão, mas utiliza outra variação linguística e obtém êxito em sua comunicação tornando-se, ao chegar a escola, tão somente um indivíduo dominado pela classe dominante que impõe uma língua padrão e manipula a educação de forma a não ter em seu meio social uma classe desfavorecida economicamente.

3. CAPÍTULO I

4. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

Não há como negar que é de suma importância o ensino da língua padrão aos que buscam o ensino em nossas escolas, pois é por meio da língua padrão que serão avaliados no mundo profissional e até mesmo na vida cotidiana. É por esse motivo também que há nas faculdades e universidades uma preocupação com o ensino da Língua Portuguesa nos moldes em que é exigida no meio oficial. No entanto o que realmente preocupa não é a exigência de que se aprenda o português oficial, mas que se discriminem as demais variedades. Que se releguem as demais formas de falar à marginalização tão somente por serem diferentes se assemelha e é tão cruel quanto qualquer tipo de discriminação ou preconceito criado pelo ser humano como forma de manter afastados os diferentes. É essa, no entanto, a forma cruel e muitas vezes velada com que a elite da sociedade exerce seu poder simbólico controlando mentes e ações. Para isso exerce todo um discurso positivo que nem sempre se traduz em beneficio para as camadas mais pobres e sem recursos da sociedade. Todo esse sistema é reproduzido na escola que também é vitima e faz vitimas em seu processo de ensinar.

Considerando que todo fenômeno em uma língua é legitimo e que se processa pelo fato da língua ser dinâmica e própria de cada povo que a molda de acordo com suas intuições linguísticas é que questiona-se, nesse trabalho, a imposição de uma língua padrão desconsiderando soberbamente as demais variações. Como afirma Gomes (2007, p. 76):

Esse preconceito é fruto de uma história de prescrição da gramática normativa, que nos acostumou a achar que toda forma diferente das regras gramaticais contidas nos livros que estudamos são “erradas”. É fruto de uma tradição de tratamento da língua como um sistema rígido de leis a serem cumpridas, e aquele que não cumpre é “julgado e condenado” por isso. (grifos da autora)

Dessa forma como nos demais preconceitos e intolerâncias que povoam o país também o preconceito linguístico deve ser considerado sempre levando em conta uma análise metódica e imparcial mostrando toda sua falta de lógica e fundamentação.

4.1. Preconceito

Considerando o Brasil podemos afirmar que há o preconceito devido à cor, à religião, a questões sexuais e a classes sociais. Embora isso não seja aceitável essa é a verdadeira questão social no Brasil. Esses são os verdadeiros motivos da exclusão social no país. É palpável a falta de interesse da classe dominante em resolver esses problemas e quando o fazem é de forma escassa e a conta gotas. Por isso quando um aluno que possui todos ou algum dos problemas (grifo meu) acima chega à escola é discriminado. Do preconceito, que surge sem nenhuma formalização, sem nenhuma base cientifica em que se apoiar, é que se chega à discriminação do indivíduo que, vitima de tal processo, se recolhe permanecendo à margem da sociedade ou, no caso da escola, não participa de maneira efetiva a ponto de adquirir ou considerar o conhecimento e o aprendizado como algo sem importância ou inatingível de forma que pouco ou nada contribuirá para o seu crescimento social e profissional. A escola já o relegou à incapacidade, já o sentenciou à incompetência.

No entanto cabe realçar que além do preconceito existe a intolerância e ambos sempre estiveram presentes na sociedade e no meio escolar. A intolerância sempre passa como se não existisse, mas existe e é perniciosa. Conforme Leite, (2008, p. 13) afirma: “Como a intolerância linguística passa quase despercebida pela opinião pública e não provoca sérios abalos sociais, da mesma forma que aqueles provenientes da intolerância religiosa ou política, parece nem existir.” Portanto fica claro que dentre as intolerâncias, segundo a autora, a de maior gravidade é a linguística, pois nem sempre é percebida. Claro que todos os tipos de intolerâncias são de gravidades inaceitáveis, mas a linguística tem a característica de passar despercebida na sociedade e por isso mesmo é perversa, como em outro ponto continua afirmando a escritora, Leite (2008, p. 13):

Contudo, a intolerância linguística existe e é tão agressiva quanto outra qualquer, pois atinge o cerne das individualidades. A linguagem é o que o homem tem de mais intimo e o que representa a sua subjetividade. Não é exagero, portanto, dizer que uma crítica à linguagem do outro é uma arma que fere tanto quanto todas as armas.

É sempre bom, também, não perder de vista o foco de que a linguagem sempre esconde outros tipos de preconceitos ou intolerâncias que estão disseminadas na sociedade tais como a intolerância religiosa, social, política, racial passando o discurso linguístico-discursivo despercebido, pois se aloja nas entranhas do discurso e para ser notado é necessário, muitas vezes que se observe entre as linhas e com lente de aumento. Leite, (2008, p. 14).

Como o preconceito e intolerância contra o indivíduo vêm sempre disfarçados entre os diversos tipos de discurso é bom que se tenha em mente que embora pareçam sinônimos o preconceito é algo que existe sem parâmetros, sem pesquisa e às cegas enquanto a intolerância “é uma reação explicita a uma ideia ou opinião contra a qual se pode objetar”, Leite, (2008, p. 20). A intolerância não é simplesmente uma discordância que existe por existir como o preconceito que muitas vezes surge sem fundamentos.

4.2. Preconceito linguístico

Por estar inserida no seio da sociedade e ser inerente ao ser humano a língua possui um caráter social e como tal não ficou imune ao preconceito devido às suas variantes. A discussão a respeito da língua é inevitável e, às vezes, parece também infindável. São indivíduos que falam uma variante considerada padrão e não aceitam as demais. Acusam aqueles que não falam a língua padrão de arruinar o português. Segundo Bagno (2010, p. 16):

Acusações de que as pessoas estão “matando” a língua aparecem em textos publicados há séculos, mas a língua, estranhamente, nunca termina de morrer. Segundo essa linha de pensamento, o português, desde que se firmou como língua de um povo soberano, há quase mil anos, é um idioma permanentemente moribundo... (Grifo do autor)

Acusações existem e a comunicação entre os cidadãos que falam português permanece em todas as suas variações. A elite esquece que a língua é inerente ao ser humano e que por esse motivo, muitas vezes, passa a adquirir características próprias ao indivíduo que a usa. Essas características podem vir do próprio indivíduo ou da sociedade que o cerca tornando-se uma constante no meio. Questão social e não somente estrutural como afirma Calvet (2002, p. 17), “Surge assim, desde o nascimento da linguística moderna, em face de um discurso de caráter estrutural e insistindo essencialmente na forma da língua, outro discurso que insiste em suas funções.” Esse mesmo discurso social que foge ao estruturalismo saussuriano é o que pretendemos mostrar que faz parte da vida cotidiana dos que se aventuram no mundo escolar. Não há como considerar a língua pela língua, tão somente. A língua, como o mundo em que vivemos, se transforma, sofre mudanças constantes e esta entrelaçada ao viver humano. Não é estática e não deve de forma alguma ser mumificada. Os que a querem nesse último estágio se contradizem, pois não raramente fala uma língua não padrão. Ato falho, inconsciente, logo se apressam em dizer que sabem o correto e que apenas falaram de maneira descontraída. É exatamente isso o que afirma Bagno (2003, p. 29):

Na fala de um membro da elite letrada, esses erros são algo assim como “descuidos” ou “lapsos”, justificados por aquele chavão mais do que batido de que “essas pessoas podem até permitir errar porque sabem a forma certa”- que é como alguns professores tentam (sem sucesso) explicar a seus alunos as ocorrências de regras não-nominativas na obra de grandes escritores ou na fala de pessoas “importantes”. Essa mesma condescendência, no entanto, não é usada para classificar a fala dos cidadãos menos letrados: o mesmo fenômeno, agora, é tachado de “erro crasso” e ponto final.

A população sem instrução escolar, portanto não pode usar essa mesma variação linguística para se comunicar embora entre eles haja uma perfeita comunicação em que se entendem de forma harmoniosa e sem transtornos. É certo que essa variação não padrão existe e já não deve permanecer à margem da sociedade como se nada representasse. Deve ser respeitada no cidadão que almeja conhecimentos escolares, pois não há intenção de desrespeito ou menosprezo do cidadão que usa a língua não padrão para com os ditos conhecedores da língua. O que há é o direito universal dos seres humanos em se comunicar e essa comunicação tem funcionado muito bem até então. Somente quando lhes é impingido a língua padrão é que se sentem diminuídos, pois junto com essa nova língua vem justamente a crítica pela maneira como falam. Mas o importante é comunicar e essa comunicação é eficiente nos que usam as demais variações por que há por parte da elite tamanha crítica a ela? Mais uma vez nos deparamos com nada mais nada menos do que fatores sociais que explicam perfeitamente o porquê de tanta aversão. Se assim não fora poderíamos todos, inclusive os ases do português, aceitar tranquilamente o fato de que outras variações servem perfeitamente ao seu propósito e afirmar como Luft (2004, p. 15-16) comentando o trecho de uma crônica que lera em um jornal:

[...] a linguagem, qualquer linguagem, é um meio de comunicação e deve ser julgada exclusivamente como tal.

Eis um óbvio frequentemente esquecido pelos que transformam o estudo da língua em estudo de Gramática. Crítica indireta do cronista à escola tradicional, onde é tão raro que se estude a língua como meio de comunicação – atual, vivo, eficiente.

Também a linguagem dos alunos, suas composições, deveriam ser julgadas, exclusivamente, como atos de comunicação, e não como campo de purismo gramatical ou exercícios de ortografia.

Ver a língua e tratá-la como instrumento – de comunicação – será desrespeitá-la?

Por essa ótica é que não pode haver julgamentos prévios a respeito do falar do outro, pois a maneira de se comunicar que ele usa é adquirida no meio em que vive ou foi criado de maneira intuitiva que lhe parece lógica. Não há como considerar apenas o falar padrão como “correto” (grifo meu) e ignorar os demais. No entanto o preconceito linguístico existe e a língua não padrão recebe diversos “rótulos pejorativos: gíria, jargão, caçanje, calão, geringonça, ingresia, charabiá, pretoguês, algaravia entre outros.” (Bagno, 2010, p. 16), ou seja, para estes, não existe nesse caso uma língua que tenha algum valor. Existe algo parecido com uma língua, mas não efetivamente uma língua considerável.

Desfazendo-se das variações a elite impõe como única língua correta a que se encontra na gramática normativa e dessa forma exerce o seu poder sobre as demais classes sociais. É a língua como forma de poder. Um poder que substitui o poder da religião, Bagno (2010, p.16). Dessa forma a escola que deveria ser um lugar democrático torna-se um local de dicotomia e marginalização social, pois reflete exatamente o que é exposto de maneira macro em nossa sociedade que é o preconceito e a intolerância “materializados pela linguagem” (Leite, 2008, p. 16).

4.3. Conceito de linguística

Preocupados com as mudanças por que passavam as línguas os linguistas do século XIX resolveram tentar explicar esses fenômenos considerando em seus estudos a diacronia ou a Linguística histórica para chegar às suas conclusões, pois o que havia antes era tão somente um estudo “assistemático e irregular dos fatos da linguagem, de caráter puramente normativo ou prescritivo, ou ainda, retrocedendo à antiguidade grega, especulações filosóficas sobre a origem da linguagem mescladas com estudos de Filologia.” Carvalho (2002, p. 17).

Em uma abordagem sobre a linguagem verbal faz-se mister esclarecer ou lembrar algumas informações sobre a Linguística pois é por meio desta que se faz uma explicação cientifica, crítica e bem fundamentada da língua. Conforme Fiorin, (2007, p. 17):

[...] a Linguística detém-se somente na investigação cientifica da linguagem verbal humana. No entanto, é de se notar que todas as linguagens (grifo do autor), (verbais ou não verbais) compartilham uma característica importante – são sistemas de signos usados para a comunicação. Esse aspecto comum tornou possível conceber-se uma ciência que estuda todo e qualquer sistema de signos. Saussure a denominou Semiologia; Peirce a chamou de Semiótica. A Linguística é, portanto, uma parte dessa ciência geral; estuda a principal modalidade dos sistemas sígnicos, as línguas naturais,(grifo do autor) que são a forma de comunicação mais altamente desenvolvida e de maior uso.

Observando o texto acima verifica-se que houve necessidade de delinear a Linguística praticamente como uma ciência a parte tendo em vista que as linguagens são múltiplas e todas utilizam-se de “signos usados para a comunicação”. Embora existam e constantemente sejam usadas para a comunicação linguagens como a dança, pintura e outras não são capazes de transmitir, como as línguas naturais, toda a expressividade humana tornando-se esta um fator de maior relevância na comunicação. Fiorim (2007, p. 17).

A Linguística não pode ser confundida com o aprendizado de muitas línguas, pois normalmente quem adquire essa competência torna-se um poliglota com capacidade de comunicação ampliada. No entanto essa mesma pessoa, muitas vezes, não é capaz de descrever ou explicar as ocorrências linguísticas verificadas na língua materna ou nas demais línguas que fala por não ser essa sua preocupação. Dentro de um contexto cientifico a metodologia cientifica da Linguística leva em consideração primeiro a fala para depois analisar a escrita tendo em vista que a gramática tradicional sempre se preocupou com a língua literária tomando como modelo os escritores de grande repercussão literária notadamente os clássicos. Fiorim (2007, p. 18).

É importante considerar que a Linguística divide-se em Linguística geral e Linguística descritiva e que ambas são importantes para uma análise mais detalhada das línguas ficando a Linguística geral com os conceitos e modelos que irão trazer fundamentos à análise das línguas e a Linguística descritiva encarregada de obter dados que confirmarão ou não as teorias sugeridas pela Linguística geral. Fiorim (2007, p. 18). Com Saussure surgiu o conceito de sincronia em que o rompimento com a tradição de estudar as línguas utilizando a maneira diacrônica ocorre. Saussure privilegia o estudo sincrônico, ou seja, descritivo não significando com isso que Saussure não veja importância na analise diacrônica, mas tão somente que, segundo seu ponto de vista, era necessário estudar as línguas levando em consideração o seu momento atual para que se chegasse a uma conclusão mais verossímil. Nos dias atuais a “Linguística sincrônica vem sendo denominada Linguística teórica, preocupada mais com a construção de modelos teóricos do que com a descrição de estados de língua.” Fiorin (2007, p. 19).

4.4. Sociolinguística

As análises feitas pelos linguistas em torno da língua não consideravam a questão social o que parece ser uma lacuna no estudo das manifestações linguísticas considerando que a língua tem um caráter social, ou seja, é um fato social. Entre a sociedade e a língua não existe um mero relacionamento casual, mas ocorre sempre a intencionalidade. O nascimento da Sociolinguística ou teoria da variação tem seu ponto de discussão culminante em 1964, pois nos dias “11 a 13 de maio de 1964, por iniciativa de William Bright, 25 pesquisadores se reuniram em LosAngeles para uma conferência sobre a sociolinguística.” Calvert (2002, p. 28). Nesse congresso fizeram-se presentes muitas figuras importantes para a sociolinguística da época e os estudos recaíram sobre as diversidades da língua e seu uso na estrutura social.

Um dos pontos básicos considerados pela sociolinguística é que a língua sofre variações e que essas variações linguísticas ocorrem na fala das pessoas e são perceptíveis ao se analisar a língua no tempo não havendo como ignorar esse fato. Não deve, portanto haver discriminação no estudo das línguas e devem ser consideradas para estudo todas as variantes que por ventura houver considerando inclusive os fenômenos culturais os quais são influenciados por fatores linguísticos e extralinguísticos de várias ordens.

Nesta concepção, a língua é de natureza variável, orientando e sustentando a observação, a descrição e a interpretação do comportamento linguístico das pessoas. Segundo Alkimim (2007, p. 43), a “Sociolinguística dos anos 1960 pode ser vista como o ponto de partida de novas correntes e orientações de pesquisas, centradas no trato do fenômeno linguístico relacionado ao contexto social e cultural, que se distinguem de forma mais evidente, pela vinculação explicita a algum campo das ciências humanas”.

Um exemplo de que a língua esta fortemente envolvida com os fatos que nos cercam é a questão da ascensão da burguesia que vai surgir com a queda da monarquia feudal. Juntamente com essa ascensão surge a língua romântica no lugar da língua clássica. Calvet (2002, p.18). Os burgueses buscando uma identidade própria fazem com que toda uma literatura surja para seu uso mudando com isso o uso da língua que surge nos moldes burgueses, pois precisavam de uma identidade e “e por meio da língua que o homem expressa suas ideias, as ideias de sua geração, as ideias da comunidade a que pertence, as ideias de seu tempo.” Brandão (1991, p. 5). Com os estudos que se fez das línguas até os dias atuais é possível verificar também traços de preconceito, racismo ou eurocentrismo, pois não poucas vezes, é colocada como língua mais importante as línguas européias em detrimento das demais. Outras vezes buscou-se mostrar que todas as línguas vieram de uma única língua, ou seja, tiveram uma origem comum e em outras vai-se tentar mostrar que ela marca a divisão da sociedade em classes e sempre foi instrumento de poder como foi esboçado por muitos estudos Marxistas. Calvet (2002, p. 18-19).

Portanto a variação oral que é uma realidade e se relacionam com a vida social do indivíduo sendo que “uma das funções da sociolinguística é correlacionar as variações existentes na expressão verbal a diferenças de natureza social, compreendendo cada domínio o linguístico e o social, como fenômenos estruturados e regulares”. Camacho (2007, p. 50).

A Sociolinguística mostra as variações na expressão oral e compreender que existem esses fatores e que a língua é usada como manipulação é necessário para que se vença a imposição de uma língua padrão sobre as demais variações e a Sociolinguística como ciência voltada para a língua observando-a sem preconceitos pode alavancar essas questões mostrando que todas as línguas têm a sua importância e não existem línguas melhores ou piores, mas variações diferentes que cumprem perfeitamente os seus objetivos. Por não haver possibilidades de arrancar a força o modo de falar de um indivíduo parece claro que a melhor maneira de torná-lo produtivo é inserindo-o no meio social em que vive procurando torná-lo competente tanto no falar padrão como nas demais variantes. Isso, no entanto, muitas vezes lhe é negado ou quando lhe é possibilitado o ensino de uma outra variante, ou seja, da língua padrão, isso ocorre de maneira deficiente.

4.5. Preconceito linguístico: uma questão de mito

Diante dos fatos já mencionados o que seria de fato falar uma língua correta no Brasil e em qual local realmente podemos afirmar que isso ocorre? Sim porque considerando a leva de cidadãos que afirmam ser possível falar a língua exatamente como na época de Camões deve haver nos recônditos desse país algumas pessoas que impecavelmente falam o português padrão sem qualquer variação em todos os momentos. Não cometem erros jamais, são perfeitos. Será que de fato é assim nesse país continental? Sabe-se que não e sabe-se também que quando se fala em língua se fala em seres humanos e, portanto em seres com capacidade política e ideológica. A partir daí é possível perceber que o embate entre o falar considerado correto e o falar não padrão esta associado a uma boa gama de preconceito e para explicar ou dar um motivo positivo a esses preconceitos criou-se alguns mitos que são considerados pela classe dominante e até mesmo por muitos da sociedade como verdades e são a explicação dada por eles para afirmarem que é possível haver somente uma língua, uma forma de falar o português.

Considerando o preconceito linguístico e abordando a temática dos mitos é que Marcos Bagno faz uma análise mais detalhada desses equívocos mostrando que são “afirmações falaciosas que qualquer análise mais rigorosa não demora a derrubar”. Bagno (2003, p. 14). O autor toma oito afirmações para análise e discorre sobre o porquê de serem consideradas mito. Inicia com a velha e conhecida frase que diz ser a língua portuguesa falada no Brasil de uma unidade que surpreende. Bagno (2003, p. 15). Enquanto sabe-se que pela territoriedade do Brasil, ou seja, suas dimensões continentais, isso é quase impossível e não ocorre no Brasil. Afirma Bagno em seu livro (2003, p. 15):

Esse mito é muito prejudicial à educação porque, ao não reconhecer a verdadeira diversidade do português falado no Brasil, a escola tenta impor sua norma linguística como se ela fosse, de fato, a língua comum de todos os 160 milhões de brasileiros, independentemente de sua idade, de sua origem geográfica, de sua situação socioeconômica, de seu grau de escolarização etc.

São questões que devem ser levadas em consideração ao se fazer tal afirmação. Se a língua sofre transformações como mantê-la igual e sem variações entre os milhões de brasileiros que povoam o país? Isso não ocorre e por haver uma leva de economicamente desfavorável no país isso se torna ainda mais gritante. É fácil perceber este fato nas escolas. Quando as crianças chegam para as primeiras séries iniciais da vida escolar percebe-se as características linguísticas que trazem de casa, do seio familiar e se são filhas de uma elite se portam de uma maneira. Se são filhos de famílias desprovidas de recursos se portaram de outra forma e isso inclusive na fala. Junte-se a isso a educação privilegiada da elite e os brasileiros sem língua, pois estão em condições de não acesso à norma culta empregada pelos literatos. Bagno (2003, p.16). Diante disso não há como afirmar ser a língua portuguesa falada no Brasil de uma unidade surpreendente.

Falamos uma língua diferente da língua falada em Portugal. Isso é fato. Mas afirmar que só em Portugal se fala bem português e que o brasileiro não sabe português revela não uma constatação, mas um complexo de inferioridade típica de um país que fora colônia e que mantém a mente de colônia. Bagno (2003, p. 20). Também não somos alcançados pelo segundo mito que afirma ser o brasileiro incapaz de falar o português de acordo com as normas que lhe são convenientes. Esquece-se mais uma vez que o brasileiro não esta preocupado em guardar regras criadas há séculos e que cada povo cria e molda seu estilo de vida. A diversidade é inerente ao ser humano. Tentar impor a língua de um povo a outro povo exigindo que não haja variação é impossível, pois com o passar do tempo essas variações serão identificadas por mais que os puristas protestem contra isso e afirmem que ocorre uma ruína da língua portuguesa ou que ela esta fadada a deixar de existir. Bagno (2003, p. 23).

Também nesse mesmo tópico é possível falar em invasão das línguas estrangeiras no país. E é possível afirmar que nem esse fenômeno tirou o brilho e nem a existência da língua portuguesa que continua sendo “falada e escrita por cada vez mais gente, produziu uma literatura reconhecida mundialmente, é propagada também em nível internacional pelo grande prestígio de que goza a música popular brasileira.” Bagno (2003, p. 23). Sendo assim também este mito não passa, obviamente, de uma falácia.

Continuando sua exposição Bagno cita o mito de número três que é dito e afirmado por muitos de que o português é muito difícil. Não é levado em consideração, no entanto, que esse português dito difícil é o português falado em Portugal e que há muito o Brasil tem uma língua diferente da de Portugal. Portanto essa língua que querem nos impingir a falar não é uma língua conhecida e praticada pelos brasileiros, mas uma língua totalmente diferente. É como se tivesse que aprender uma língua nova como o inglês ou francês. Ademais tenta-se impor uma gramática que nada tem a ver com a gramática intuitiva do falante. Bagno (2003, p. 36). São questões que nada tem a ver com a realidade brasileira, mas que, infelizmente, são tratadas como caso de vida ou morte pelos puristas que querem porque querem que se fale uma língua já há muito esquecida no passado, pelo menos na prática.

Então tratar o português como muito difícil é querer fazer acreditar que só uns poucos são capazes de aprendê-lo, de perscrutar os seus mais profundos recônditos como se fossem uns iluminados acima de tudo e de todos. É no dizer de Bagno (2003, p. 38):

Se tantas pessoas inteligentes e cultas continuam achando “que português é muito difícil” é porque esta disciplina fascinante foi transformada numa “ciência esotérica”, numa “doutrina cabalística” que somente alguns “iluminados” (os gramáticos tradicionalistas!) conseguem dominar completamente. (grifos do autor).

Dessa forma o português não estaria acessível de forma alguma aos demais indivíduos que povoam a sociedade, mas somente a alguns que tiveram o privilégio de serem de uma camada especial.

Considerando a questão da instrução, e aí não podemos falar em pouca gente, temos mais um mito criado, o de número 4, que é o de que as pessoas sem instrução falam tudo errado, Bagno (2003, p.40) em que afirma-se não ser correta nenhuma outra manifestação linguística. No entanto o que ocorre é nada mais do que um preconceito social tendo em vista que as pessoas que falam, por exemplo, Cráudia ou praca são pessoas das classes mais humildes que não tiveram acesso à “educação formal e aos bens culturais da elite.” Bagno (2003, p. 42).

No mito número cinco é considera a questão do Maranhão onde, diz-se, que melhor se fala o português. Não se observa que, por exemplo, o pronome tu usado no maranhão já a muito foi substituído por você e que esse falar acrescentando o s ao final não significa de forma alguma que no Maranhão é onde melhor se fala o português. Mais uma falácia, mais um mito. Se falam tu fazes, também falam “esse é um livro para ti ler.”(grifo do autor), Bagno (2003, p. 46), o que caracteriza um erro segundo os gramáticos. Considerar que o Maranhão é o lugar que melhor se fala o Português tão somente por causa de um simples ato de fala é totalmente sem nexo. No dizer de Bagno (2003, p. 46):“Não sei quem foi a primeira pessoa que proferiu essa grande bobagem, mas a realidade é que até hoje ela continua sendo repetida por muita gente por aí, inclusive gente culta, que não sabe que isso é apenas um mito sem nenhuma fundamentação cientifica.”.

Continuando sua exposição Bagno se refere ao mito de número seis que é a tentativa de afirmar que determinado jeito de falar é correto porque também é escrito do referido jeito. Também um mito sem sustentação, pois nesse momento não se considera a variação linguística tendo em vista que nenhuma língua é falada da mesma maneira por todos os falantes da sociedade.

Não há tolerância com a língua natural, mas considera-se a língua artificial e imposta como correta. Seria a língua que realmente deve ser considerada e utilizada em textos escritos. Afirmar de alguma forma que não se deve ensinar gramática seria catastrófico para a vida de qualquer estudante, pois sabe-se que é parte essencial em concursos e provas em geral. É necessário que se aprenda a ortografia oficial. Quanto a isso não resta dúvida. O que se torna inconcebível é a imposição e “não se pode fazer isso tentando criar uma língua falada artificialmente e reprovando como ‘erradas’ as pronuncias que são resultado natural das forças internas que governam o idioma.” Bagno (2003, p. 53). Temos que considerar acima de tudo que a língua não deve carregar o estigma de língua certa ou errada, mas adequada e por isso deve haver um respeito com os diferentes.

A gramática como forma de se padronizar a língua também é comentada na questão dos mitos quando se afirma que é necessário saber gramática para falar e escrever bem. Nessa questão já surge a dúvida se de fato é assim considerando que “os escritores são os primeiros a dizer que gramática não é com eles!” Bagno (2003, p. 63). É certo que há uma necessidade de orientação para que haja uma boa escrita, pois a defesa do caos linguístico não é, com certeza, o objetivo dos conhecedores e pesquisadores da língua, mas tão somente que seja quebrada a barreira que mantém separados os preconceituosos que falam e dominam (não completamente, pois não há se quer concordância entre eles) a língua padrão e as outras variáveis. E aí somos confrontados pelos que sendo alguma coisa e possuindo grande reconhecimento linguístico possuem a simplicidade latente que aflora em alguns momentos de suas vidas, para nos alertar que a gramática normativa mesmo para eles, não é fácil como nos faz lembrar Bagno (2003, p. 63):

Carlos Drummond de Andrade (preciso de adjetivos para qualifica-lo?), no poema “Aula de Português” também dá testemunho de sua perturbação diante do “mistério” das “figuras de gramática, esquipáticas”, que compõe “o amazonas de minha ignorância”. Drummond ignorante? (Grifos do autor).

E a pergunta feita por Bagno se sustenta era por acaso Drummond ignorante? Com certeza não. No entanto, juntamente com outro poço de conhecimentos, Machado de Assis, que diz não entender uma gramática de um sobrinho deixa claro que dizer ser necessário saber gramática para falar e escrever bem é um mito. A norma culta é algo estilizado, pronto e existe por existir não estando em transição em “movimento” (grifo meu) como a língua falada. No entanto essa mesma língua que sofre transformações constantes serve aos seus propósitos e os seus falantes se entendem perfeitamente.

Apenas surgem pessoas ditas cultas que oferecem resistência a essa variação e tentam impor sua norma aos demais mortais.

Outra questão relevante em relação aos diversos mitos criados está ligada a questão do domínio da norma culta que muitos têm como um princípio definidor de status social. Diante disso não são poucos os que procuram decorar a língua padrão para repeti-la constantemente como forma de infiltra-se entre os que pertencem à elite. No entanto não é difícil encontrar entre a elite da sociedade pessoas que sem saber falar o português padrão se encontram entre os que vivem bem financeiramente como é o caso de comerciantes em geral. Ademais se assim fosse não seria difícil encontrar professores entre os que estão no topo da pirâmide social. Aliás, os professores de português seriam a nata da sociedade. Bagno (2003, p. 69).

Fica claro, portanto, que saber a norma culta e dominá-la de nada vai adiantar se algum outro fator de ascensão que seja considerado como essencial pela sociedade faltar. Existe todo um sistema que envolve o fato de uma pessoa ser desfavorecida ou não. A questão econômica não será resolvida tão somente com o aprendizado da norma culta sem que seja considerada também os direitos do cidadão, por exemplo. O que deve ocorrer na sociedade é o reconhecimento de todos sem que seja focado um grupo em detrimento de outro. Todos devem ter seus direitos preservados e devem ser respeitados como cidadãos. A partir desse contexto fica fácil perceber porque um aluno que entra em uma escola no ensino fundamental acredita em pouco tempo que não conseguirá aprender o português padrão e o porquê dele crer sem reservas que a sua maneira de falar nada é. Nada significa. Não tem valor algum e o meio em que viveu até então nada mais é do que um problema que deve ser lançado o mais longe possível do restante da sociedade, ou seja, são os marginalizados. Completamente marginalizados.

Mas no âmago de todas essas falácias e mitos há todo um discurso de dominação ideológica como nos esclarece Mikhail Bakhtin o qual será analisado no próximo item, pois sabe-se que a educação também sofre todo esse processo e que isso a torna dualista e selecionadora.

5. CAPÍTULO II

6. O DISCURSO COMO MATERIALIDADE IDEOLÓGICA DE DOMINAÇÃO E PODER

A questão do discurso é importante para que se compreenda como a classe dominante tem usado a linguagem para manipular e se impor à massa sem que, muitas vezes, esse ato de dominação seja se quer percebido. O domínio ideológico é um fato e se esconde por trás dos símbolos. Num sentido amplo, sem entrar no mérito da dominação, podemos constatar os símbolos presentes na sociedade em todos os seus recônditos e aí poderíamos citar como exemplo o pão e o vinho para os cristãos simbolizando a morte de Cristo, as armas simbolizando o exercito ou uma mulher com uma venda e uma balança simbolizando a justiça. Esses símbolos per si nada dizem, mas utilizados pelo homem forma consciência, pois a ideologia surge no meio e dos signos, "da interação semiótica de um grupo social" Bakhtin, (2010, p. 36).

No entanto se formos analisar com um olhar mais detalhado perceberemos que todos os símbolos ideológicos o de maior destaque é com certeza a palavra. Ela é o fator condicionante por excelência e tem seu poder de forma supra no homem. É por meio dela que gira todo o universo humano todas as peripécias da qual faz parte. Então parece clara a afirmação de Bakhtin quando diz: Bakhtín, (2010, p. 36);

Mas esse aspecto semiótico e esse papel contínuo da comunicação social como fator condicionante não aparecem em nenhum lugar de maneira clara e completa do que na linguagem. A palavra é o fenômeno ideológico por excelência. A realidade toda da palavra é absorvida por sua função de signo. A palavra não comporta nada que não esteja ligado a essa função, nada que não tenha sido gerado por ela. A palavra é o modo mais puro e sensível de relação social. (grifo do autor)

Então para Bakhtin, tudo é ideologia, somos cercados todos os dias por questões que no fundo tem motivações ideológicas e a palavra que é o fenômeno ideológico por excelência, mas essa comunicação pautada na ideologia se processa também no cotidiano sendo a palavra e a conversação uma constante, pois quando se interagi se faz por meio de signos. Essa seleção se dá na tentativa de imposição de fatos ideológicos e aí percebe-se que, de fato, a consciência não pode derivar diretamente da natureza como afirma Bakhtin, (2010, p. 35):

A consciência pode derivar diretamente da natureza, como tentaram e ainda tentam mostrar o materialismo mecanicista ingênuo e a psicologia contemporânea (sob suas diferentes formas: biológica, behaviorista, etc.). A ideologia não pode derivar da consciência, como pretendem o idealismo e positivismo psicologista. A consciência adquire forma e existência nos signos criados por um grupo organizado no curso de relações sociais

Isso deixa claro que em sociedade de forma alguma as idéias e conclusões surgem por acaso, mas é, isto sim, fruto de outras idéias e pensamentos já existentes. Daí a palavra como fator predominante nessa interação. Quando o indivíduo introspectivo expõe suas idéias ele o faz alcançando o meio de forma a utilizar o signo do meio interior para o exterior e isso também segue uma lógica ideológica, pois os signos se explicam e surgem por meio de outros signos já existentes. Portanto as afirmações ou negações geradas a partir dessas idéias introspectivas serão de ordem ideológica e estará contaminada com conceitos sociais. Bakthin (2010, p. 62). Tudo interage para a comunicação incluindo aí os signos interiores e exteriores. E importante, portanto que se perceba que a lógica da consciência é a lógica da comunicação ideológica. Não há como delimitar o estudo da linguagem. Tem-se que estuda-Ia no conjunto considerando o indivíduo e o meio além de todas as nuances que envolvem sua natureza semiótica e ideológica.

Quanto á sociedade que é necessária para que haja comunicação sabe-se que não existe apenas uma sociedade, mas sociedades (grifo meu) e que estas produzem seu próprio conceito de ideologia, por outra, sua própria ideologia, por conseguinte cria e recria sua própria linguagem por ser a língua dinâmica e viva que cada época assume formas e significados diferentes. Analisando a língua sob um olhar histórico, percebemos este fato e fica claro que não se pode deter a fala. Esta muda com o passar do tempo e este fenômeno nem sempre é notado pelo indivíduo, só sendo percebido mais tarde em outro momento. É a chamada sincronia e diacronia há muito estudada por Saussure. Este se prendeu ao estudo sincrônico abrindo mão das questões diacrônicas. No entanto é bom lembrar que nem por isso descartou-as como sem valor. Apenas priorizou a língua à fala e a sincronia à diacronia. Citando essa escolha de Saussure, Bakhtin comenta: "Destaquemos esta tese fundamental de Saussure: a língua se opõe à fala como o social ao individual. A fala é, assim, absolutamente individual." (2010, p. 88). Portanto uma observação incisiva e pontual que confirma o que é observável às claras na obra de Saussure. Porém é bom lembrar que "a fala, com seu caráter individual e acidental, é soberana; razão pela qual é regida por leis completamente diferentes das que regem o sistema da língua." Bakhtin (2010, p. 90). Não se pode, portanto querer a língua imutável, parada no tempo, pois toda norma, todo sistema está sempre em transformação. Um sistema de escrita já não é o que era em algum tempo que passou e quando escrevo, o que escrevo já se encontra em transformação. Ao chegar às mãos de outro para leitura se transformará mais ainda e quanto mais o tempo decorrer mais estará transformado estes escritos. Conforme Bakhtin (2010, p. 94):

Todo sistema de normas sociais encontra-se numa posição análoga; somente existe relacionado à consciência subjetiva dos indivíduos que participam da coletividade regi da por essas normas. São assim os sistemas de normas morais, jurídicas, estéticas (tais normas realmente existem), etc. Certamente, essas normas variam.

Aqui Bakhtin se refere às normas em geral afirmando que variam para logo em seguida citar o locutor para o qual o signo lingüístico enquanto sinal estável tem pouco valor, valendo, isto sim, a forma linguística que será usada em dado contexto e se ela de fato será eficiente.

Da mesma forma o receptor que deve pertencer à mesma comunidade linguística do locutor deverá entender o signo como algo imutável, pois este estará sendo identificado, mas não estará sendo ainda descodificado, ou seja, compreendido. A compreensão vem logo em seguida será feita pelo receptor de uma maneira a entender "a forma linguística utilizada como variável e flexível." Bakhtin (2010, p. 96).

Não adianta, portanto uma imposição de uma língua padrão onde já se percebe que há confrontos ideológicos dentro de uma mesma sociedade sendo que nessa sociedade percebe-se uma divisão de classes que criam o seu mundo, seus gostos e sua linguagem. Diante de uma imposição de uma classe sobre outra há automaticamente uma reação contrária o que é absolutamente normal em todas as esferas humanas, pois toda ação gera uma reação.

6.1. O discurso como forma de dominação e poder

Considerando que a língua, na visão de Bakthin, é um fato social e que sua existência ocorre devido à necessidade de comunicação, vamos considerar a questão da dominação e poder que é exercido por uma determinada classe da sociedade que cria todo um sistema ideológico visando esse controle e a cria porque a palavra é o signo ideológico por natureza "por isso é o lugar privilegiado para a manifestação da ideologia; retrata as diferentes formas de significar a realidade, segundo vozes e pontos de vista daqueles que a empregam." Brandão (2011, p. 9). Então torna-se possível à elite exercer seu poder sobre as demais classes sociais. Por meio da língua há uma imposição de status que ocorre por meio da gramática normativa, pois esta é tida como única fonte do bem falar. Dessa forma a elite exerce toda a sua coerção sobre os que vivem à margem da sociedade. E isso, como já dito reflete na escola. Ademais quando uma ideologia é imposta a uma classe social por meio de um discurso falso e autoritário verifica-se a desumanização do ser humano que é tratado como objeto tornando-se usado como se coisas fossem colaborando obviamente para uma crescente desumanização também das relações sociais. Passa-se a não considerar o outro e impera mais uma vez o interesse capitalista que dita as normas econômicas e de poder. Tudo que for possível será feito para que se alcance o maior e mais amplo espaço de dominação e o poder simbólico é peça fundamental nesse intento. E é por não querer perder o poder de dominação que a classe dominante usa todas as possibilidades possíveis oferecidas pela língua como por exemplo a polifonia como afirma Voese:

[...] Pode-se também entender a polifonia como o reflexo de uma das dimensões da estrutura social e que diz respeito ao conflito que leva os indivíduos a manterem a integridade do grupo, zelando e reforçando as características de um modo de enunciar através não só da reprodução de um ethos, como também da incorporação estratégica de enunciados de segmentos sociais conflitantes, atividade em que a realidade social, de um certo modo, orientará as escolhas do indivíduo quanto aositens lexicais, modalizações, operações argumentativas, gêneros, estilo etc. Voese (2004, p. 49).

Dessa forma, o grupo dominante, por não querer perder o status que ocupa não permitira que o restante da sociedade faça parte do seu ciclo, nem mesmo na linguagem.

A liberdade de expressão tão aclamada entre os indivíduos de uma sociedade democrática é perdida de maneira substancial quando percebemos o quanto a classe dominada pelas elites se atém às semióticas dominantes a ponto de perder, muito cedo, toda e qualquer verdadeira liberdade de expressão. Tudo que é produzido pelo mundo capitalista quer nos chegue pela família, pelos equipamentos culturais que nos rodeiam ou pela linguagem esta diretamente ligada entre as grandes máquinas de dominação mundial e propagandas corporativistas que buscam o domínio por meio das ideias, das ideologias.

A classe dominante, então expressa-se por meio de discursos que permeiam a massa todos os dias e de diversas maneiras para que haja um convencimento geral de que o que se faz é o melhor para a classe desfavorecida economicamente inclusive no meio educacional . Para engedrar por esse caminho pernicioso e maquiavélico das elites se faz necessário então a Análise do Discurso que tem como definição na concepção de Orlandi (2012, p. 15):

A Análise de Discurso, como seu próprio nome indica, não trata da língua, não trata da gramática, embora todas essas coisas lhe interessem. Ela trata do discurso. E a palavra discurso, etimologicamente, tem em si a ideia de curso, de percurso, de movimento, prática de linguagem: com o estudo do discurso observa-se o homem falando.

Ou seja observar o homem falando para saber suas intenções e o seu percurso. Entender o que há de oculto por trás de suas práticas e isso se processa também na educação, pois para um melhor entendimento desse domínio faz-se mister uma abordagem considerando que sãovários os fatores pelos quais o domínio é exercido. Como afirma VanDijk (2008, p. 9):

Em outras palavras, interessa-nos investigar, por exemplo, de que modo uma entonação especifica, um pronome, uma manchete jornalística, um tópico, um item lexical, uma metáfora, uma cor, um ângulo de câmera, entre uma gama de outras propriedades semióticas do discurso, se relacionam a algo tão abstrato e geral como as relações de poder na sociedade.

Vê-se que na sociedade nada é inocente uma tomada de câmera não é feita sem que vise a algum interesse e isso não ocorre diferente no mundo da educação. Desde financiamentos até o aparelhamento das escolas passando pelo aperfeiçoamento dos professores percebe-se uma gama de interesses que visa promover alguém ou a um governo. "De certo modo falam a respeito de uma educação idealizada, ou falam da educação através de uma ideologia." Brandão (2004, p. 55). E os investimentos se tornam pontuais, mas o discurso o mais global possível. Por meio dos discursos e toda uma técnica procura-se convencer a sociedade que o melhor estar sendo feito a seu favor. Um estudo mais aprofundado, no entanto, mostra o contrário. Há abuso de poder e é nesse abuso de poder, que causa as injustiças sociais que se detém os ECD. VanDijk (2008, p. 10)

O discurso não é analisado apenas como um objeto "verbal" autônomo, mas também como uma interação situada, como uma prática social ou como um tipo de comunicação numa situação social, cultural, histórica ou política. (grifo do autor)

Obviamente, para uma analise textual, e uma tentativa de se chegar às verdadeiras intenções do grupo ou indivíduo que produz o discurso é necessário que se use todos os mecanismos possíveis à disposição como frisa Fiorin (2006, p. 10):

O texto pode ser abordado de dois pontos de vista complementares. De um lado, podem-se analisar os mecanismos sintáxicos e semânticos responsáveis pela produção do sentido; de outro, pode-se compreender o discurso como objeto cultural produzindo a partir de certas condicionantes históricas, em relação dialógica com outros textos.

O autor cita os dois referidos pontos, mas ainda podemos incluir as possibilidades ideológicas citadas neste trabalho e que é motivo relevante na Análise do Discurso.

Também não estamos falando de qualquer discurso, mas do discurso crítico que bem poderia ser tendencioso. Tendencioso porque se poria, propositalmente, a favor de uma determinada classe. Isso levaria a supor que perderia o rigor como afirma de maneira categórica VanDijk: "Estudos críticos devem ser adequados teórica e metodologicamente, porque, de outra forma, não seriam capazes de contribuir para suas metas sociopolíticas.” (2008, p. 17). Portanto há aí uma relação de dependência e entrelaçamento entre os ECD e a metodologia cientifica.

Na educação pode-se notar que o poder exercido se processa de várias maneiras e que as imposições dos que decidem seus rumos nem sempre se processam em melhorias para os que frequentam as salas de aulas notadamente nas escolas públicas. Verbas são liberadas nos vários governos que se sucedem, mas pouco contribui-se para a qualidade na educação. O discurso, no entanto, é amplo e as poucas melhorias, melhorias pontuais são aclamadas como grandes trunfos. Muitas vezes também o governo que sucede o anterior não dá continuidade ao que já foi iniciado ficando as melhorias pela metade e o investimento perdido.

São práticas abusivas e dissonantes que em nada contribui para a qualidade da educação e se processam no meio da elite que domina as massas com palavras e atos. Tudo é preparado e engendrado para este fim. Nada acontece por acaso, mas tem a finalidade única de dominação ideológica. Afirma Brandão (2011, p. 11):

A linguagem enquanto discurso não constitui um universo de signos que serve apenas como instrumento de comunicação ou suporte de pensamento; a linguagem enquanto discurso é interação, e um modo de produção social; ela não é neutra, inocente e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestação da ideologia.

A linguagem como meio de manifestação da ideologia é usada pelas elites para dominação das massas e como a escola reflete o que se processa na sociedade também ela não foge a essa dominação. É importante lembrar que a própria escola é vitima de dominação, mas que essa dominação ocorre de cima para baixo e muitas vezes nem é percebida pelos estudantes, professores e demais funcionários. Contribui para essa forma de educação o sistema liberal de governo que prende-se totalmente a questões financeira e visa o lucro em um país capitalista. Dessa forma o discurso por uma educação de qualidade mais uma vez é anunciado, mas a necessidade de controlar as massas selecionando os melhores permanece o que inviabiliza a qualidade como um todo. E para que essa ideologia seja aceita como algo normal é necessário que a ideia das elites se torne lugar comum entre as massas, pois do contrário poderia haver manifestações contrárias. Chega-se então às concepções marxista de que a ideologia nada mais é do que "um instrumento de dominação de classe porque a classe dominante faz com que suas ideias passem a ser ideias de todos." Brandão (2011, p. 11).

Mais uma vez, portanto, a escola pública é vitima de um sistema carrasco e pernicioso, pois o seu público torna-se composto por pessoas que são colocadas à margem da sociedade. São as vitimas de um sistema dicotômico que necessitam das escolas públicas por não terem condições de pagar por uma educação de qualidade. São as vitimas de um discurso envolvente, mas que não se concretiza que, sem outra alternativa, veem-se envolvidas por uma questão de necessidade e de sobrevivência a um sistema que visa tão somente o lucro a qualquer preço tendo em vista que a lógica é o lucro com o menor investimento possível. Dessa forma atinge-se o direito que devia ser inalienável do cidadão de ser "bem ensinado e educado, de ser bem-informado etc."VanDijk (2008, p. 29).

Portanto é necessário que se leve o sujeito a pensar o que ocorre em seu meio a questionar e verificar o que lhe parece claro a “perceber que não podemos não estar sujeitos à linguagem, a seus equívocos, sua opacidade. Saber que não há neutralidade nem mesmo no uso mais aparentemente cotidiano dos signos.” Orlandi (2012, p. 9). Por trás de todo discurso há uma intenção à qual, não poucas vezes o indivíduo se sujeita se perceber, pois trata-se de um discurso velado ou então já caiu no cotidiano, no uso comum tornando-se inquestionável.

Deve-se, portanto, utilizando a Análise do Discurso Critica, considerar até que ponto o discurso esta sendo abusivo ou não e conscientizar os alunos de tal forma que possam identificar e analisar criticamente a fala e a escrita. Dessa forma perceberam que há um preconceito envolvendo o meio estudantil e social que considera como de maior valor, por exemplo, a língua padrão desfazendo-se das demais variações. Considera também apropriado investir em escolas particulares por questões econômicas, pois visam o lucro e tratam a população como massa de manobra. Pode-se então afirmar com VanDijk:"Quer dizer, na universidade nossas metas são claras: ensinar alunos como analisar criticamente a escrita e a fala, como ensinar isso para outros e como desenvolver novas teorias para melhorar essas danalises." (2008, p.35). Torna claro o quanto a conscientização se torna essencial nessa luta de poderes ideológicos como forma de resistência ao abuso de poder.

6.2. O discurso de preconceito nos livros didáticos

O ser humano possui a capacidade incrível da palavra que é ainda mais fantástica quando associamos a isso a habilidade de ler e escrever que toma "possível a ligação entre tempos, espaços e relacionamentos". Gomes (2007, p. 17). No entanto algo que acontece naturalmente e serve para a convivência e interação humana e que deveria ser respeitada, não poucas vezes é usada como arma para com o próprio ser humano, que descobrindo o poder do discurso e as possibilidades infindáveis possibilitadas pela língua a usa como meio de manobra e dominação.

Também é necessário para a classe que exerce o poder dominar a mente e as vontades dos dominados além do domínio social. Clara esta, portanto, que nos referimos às "condições cognitivas [...] tais como desejos, planos e crenças." VanDijk (2008, p. 41), que podem ser exercidos com mais altivez pela classe dominante se houver o controle por meio do poder simbólico. De acordo com VanDijk (2008, p. 47):

Dado que elites simbólicas detêm um grande controle sobre o modo de influência exerci da por meio dos gêneros, dos tópicos, das argumentações, dos estilos, da retórica ou da apresentação da escrita e da/ala públicas, o poder simbólico delas considerável, embora exercido dentro de um conjunto de limitações. (grifos meus)

A fala e a escrita não são exceções nesse emaranhado de domínio e poder, mas são elementos essenciais para o controle simbólico do qual não quer abrir mão as elites. E o inicio desse domínio se da na escola. A elite procura fazer no meio escolar o mesmo que faz no meio social não educacional que é manter o controle do ensino e, consequentemente, dos estudantes que na escola entram. Utilizam-se dos livros didáticos, dos materiais de ensino e de toda estrutura possível da escola para dominar chegando mesmo aos professores que às vezes inconscientemente reproduzem os discursos da elite colaborando para um controle mais eficiente.

Claro que o discurso de quem domina é o da melhoria e o constrangimento global força no sentido de que se pense a educação em termos de qualidade, mas na prática não é o que acontece e os investimentos não alcançam seus objetivos. O discurso é incoerente com a prática. E os que frequentam as escolas, principalmente as escolas públicas, não veem as tão desejadas qualidades chegarem. O que há de fato são investimentos maciços no sentido de ludibriar com propagandas e farto material que tratam do sistema de ensino, da pedagogia, da língua padrão. Sempre no intuito de convencer o público e os que atuam na área de que o percurso feito e por fazer da educação esta correto e têm trago bons frutos. Conforme VanDijk (2008, p. 51):

No setor educacional, o constrangimento global no sentido de evitar questões "polêmicas" (grifo do autor) censura as opiniões sociais e politicas mais radicais, inconsistentes com as ideologias sociopolíticas dominantes. Mais concretamente, as organizações oficiais ou as empresas podem fornecer materiais educacionais gratuitos, peças de propaganda em revistas sobre pedagogia, ou dispor de outras formas para influenciar os professores e o conteúdo dos textos didáticos.

Dessa forma mantem-se um controle já no inicio da vida estudantil do aluno por meio daqueles que deveriam ser exatamente o oposto de pessoas dominadas. Pelo fato da fala e escrita serem poderosas para um controle mais eficiente a questão do controle por meio do discurso torna-se atuante em toda sua inteireza no meio educacional.

Mas para compreender essas sutilezas do controle ideológico das massas pela elite é necessário que se entenda também conforme VanDijk (2008, p. 57):

A análise da reapresentação participativa, das estratégias de interação, da troca de turno, da seleção de tópicos e códigos, dos registros estilístico, das operações retóricas e também uma análise dos palpeis, das relações, das regras, das normas e de outras restrições sociais que governam a interação dos participantes na qualidade de membros de um grupo social. Dessa forma, aprendemos tanto as propriedades quanto os processos de escrita e fala, e os micromecanismos da interações social e da estrutura societal.

Embora existam vários tipos de discurso que proliferam em meio a sociedade é importante para essa exposição que se refira ao discurso educacional que surge por meio dos livros didáticos que, por ter uma enorme capacidade de penetração atinge uma capacidade muito grande de exercer o poder, pois todos os cidadãos ou pelo menos a maioria sofre um processo de educação formal. De acordo com VanDijk "O conhecimento e as atitudes manifestados e transmitidos por esse material pedagógico, mais uma vez, refletem o consenso dominante, quando não interesses dos grupos e instituições mais poderosos da sociedade." Ou seja, é mais uma vez o poder das elites que é manifestado nos livros didáticos para que, dessa forma, dominem o público estudantil moldando-os à sua imagem e semelhança e mantendo-os de acordo com sua vontade. Quanto ao debate ou critica que poderiam advir em sala de aula é minimizada ou censurada de uma vez.

É bem verdade que o que se deseja com o ensino de língua portuguesa é que haja uma boa comunicação entre quem fala e quem ouve, ou seja, há uma boa intenção em quem ensina o português. Aquele que ensina, no entanto, segue os ditames organizados em livros didáticos e estes nem sempre são organizados de maneira a que o aluno consiga ter uma ideia do todo. Mas por que, embora tenha-se debatido tanto o assunto concernente à melhor forma de ensinar língua portuguesa, não se adota os resultados positivos concluídos nas academias é uma incógnita. Prova irrefutável de que as pesquisas nas academias tomam-se acúmulos de conhecimentos que na prática não chegam àqueles que poderiam se beneficiar com elas.

Há, de fato, uma "distância que se verifica entre o que se produz na academia e a sua aplicação no ensino de Língua Portuguesa" Voese (2005, p. 14).

Não há como negar, no entanto, que mentes estão em formação em uma sala de aula e que o que for ensinado e debatido nas escolas contribuirá de forma irrefutável para o futuro do estudante "porque, afinal, diz respeito à estruturação, modelagem e orientação de consciências que deverão ter condições para atuar frente aos inúmeros problemas que desafiam o homem com graus de complexidade cada vez maiores.” Voese (2005, p. 19). Nesse ponto não poderia deixar de lembrar que a língua é fator preponderante nessa jornada de absorção da realidade e da cultura que envolve a sociedade.

Considerando que a língua não é um código como pensado por muitos, ou seja, usando-se um léxico tem se um significado, usando outro léxico tem-se outro significado rígido que de forma alguma sofre alteração. Não é assim que funciona, pois sabemos perfeitamente que para entender em sua completude o significado de um texto oral ou escrito faz-se necessário toda uma gama de conhecimentos enciclopédicos e contextuais. Considerando o quanto pode ser complexa a linguagem humana. Voese (2005, p. 31), afirma que “o fato, pois, de uma mesma palavra poder nomear diferentes coisas, e de uma mesma coisa poder ser nomeada por diferentes expressões, dá a primeira noção das dificuldades para se manter a noção de código, além de apontar para a complexidade da linguagem humana.”

Compreende-se, portanto, que a linguagem humana se faz acompanhar de muito mais do que código para expressar todo o seu significado expressando muito mais do que comunicação, ela vai além sendo capaz de mudar concepções e infundir ideologias. A importância da língua que excede a capacidade objetiva da comunicação é exposta por Voese quando ele afirma que:

Já não se pode, portanto, reduzir o uso da língua à função comunicativa: a interação verbal, embora se apóie na informatividade das expressões lingüísticas, inclui a observação de determinadas regras e acordos sociais, o que deve ser considerado como um conjunto de elementos extralinguísticos que parece acoplar-se aos sentidos do enunciado contribui de modo decisivo com o processo de significação. Voese (2005, p. 34)

Dessa forma, segundo o autor, há todo um conjunto de fatores que contribuem para que se chegue à informação desejada tanto pelo que comunica um enunciado quanto pelo que traduz esse enunciado.

Considerando a língua portuguesa e a educação como foco principal da pesquisa hora direcionada não poderia relegar a segundo plano ou à margem de discussão o fato pertinente que envolve o discurso e o poder que é a capacidade que este tem de domínio sobre a educação em todos os seus meandros. Desde a construção de escolas á qualidade dos livros didáticos passando inclusive pela capacitação dos professores há um discurso que tenta de todas as formas envolver a sociedade de maneira positiva como se houvesse uma ascensão da qualidade da educação no Brasil em todos os seus níveis o que não reflete a realidade quando se tem em mãos pesquisas nacionais e internacionais que mostram o contrário.

São discursos governamentais e de grandes corporações que tentam impingir à educação a sua maneira técnica, mas não atuante de melhorá-la. Não são pessoas envolvidas na educação, mas que possuem o poder de decisão. Foi assim quando pensou-se a educação tecnicista reducionista que investigava módulos instrucionais ou materiais didáticos sem um mínimo de preocupação com pesquisa ou análise. No entanto verificou-se posteriormente que a qualidade dos alunos brasileiros deixava a desejar no cenário mundial buscando-se com isso novas perspectivas. No contexto nacional tivemos influência da industrialização e do regime militar na educação. Tivemos uma educação de qualidade, mas infelizmente celetista e elitista, pois procurava formar lideres, tendo em vista que lideranças eram necessárias. A educação vinha como um prêmio aos melhores. Havendo necessidade explicita de mão de obra no mercado buscou-se colocar a massa populacional nas escolas para que aprendesse de maneira pontual o que seria necessário fazer nas indústrias. A escola, no entanto, era limitada. Era a escola como fábrica, não havia uma noção de todo, mas de partes. A elite buscava de qualquer forma mostrar que o país avançava e muito se fazia pela educação. O discurso era um e a prática era outra. O que se escondia na verdade era o interesse financeiro como nunca deixou de ser até os dias atuais. Como afirma Maria Helena G. Frem Dias-da-Silva em seu artigo intitulado Política de formação de professores no Brasil: as ciladas da reestruturação das licenciaturas: "Substituem-se assim, os argumentos de natureza filosófica, sociológica ou psicológica por planilhas e bancos de dados voltados ao conceito ora hegemônico de 'custo-benefício'”.

Então, o que parece inacreditável faz parte da própria lógica do modo como a educação existe na sociedade desigual. Quando pensada como uma "filosofia" ou uma "política de educação", ela se apresenta juridicamente como um bem de todos, de que o estado assume a responsabilidade de distribuição em nome de todos. Mas sequer as pessoas a quem a educação serve, em principio, são de algum modo consultadas sobre como ela deveria ser. A educação que chega à favela, chega pronta na escola, no livro didático e na lição.

Não são consultadas porque isso não interessa às elites que pretendem que o seu poder de manipulação seja duradouro. Ademais é com essa enorme capacidade de penetração (no meio educacional) que é adquirido por meio de um discurso imposto, já que é feito por meio dos diálogos instrucionais, os livros didáticos, por exemplo, que já no inicio a elite e os grandes poderes constituídos podem manter e fazer prevalecer o seu poder.

É observando essas questões que procuramos observar nos livros didáticos as manifestações eventuais de preconceito e de discurso valorativo de uma determinada classe em detrimento de outra tendo em vista que o controle dos meios educacionais e culturais são exercidos pela classe dominante que dita regras e saberes.

Claro que não se pode subjugar os livros didáticos como se eles fossem de todo ruim, como se nada houvesse de proveitoso nos livros didáticos. Sabe-se que há importância em se adotá-los tendo em vista que norteiam as aulas administradas pelos professores e o conteúdo assimilado pelos alunos, ou seja, é perfeitamente viável como coadjuvante. No entanto o que se questiona é a superficialidade do livro didático, o que já diz muito sobre uma situação tendenciosa de não se discutir, não se questionar, textos fechados e resumidos para análises e pouca interação com a realidade do aluno. No entanto a muito que já deveria ser considerada a questão de que a leitura é capaz de trazer realizações ao ser humano e fazê-lo ampliar seus horizontes tornando-o uma pessoa crítica e capaz de discernir a sociedade em que vive. Esse contato com as letras poderia se dar já no inicio da educação do indivíduo com o estudo mais abrangente da língua portuguesa nos livros didático.

Ademais não se pode envolver os alunos que frequentam as escolas em textos para que verifiquem tão somente códigos e não percebem os demais elementos que estão presentes na informação que esta sendo transmitida pelo texto. Não se considera como já exposto acima que a língua é muito mais do que o código e representação. Conforme Voese (2005, p. 30).

Ora, quando se defende a concepção de que a função da língua é exclusivamente representativa, adota-se a noção de código. Se a língua, porém, fosse algo como um código os enunciados deveriam remeter sempre a um mesmo significado, mesmo alterando-se por exemplo, os contextos em que fossem produzidos.

Ou seja, o significado seria sempre o mesmo em qualquer momento e espaço. Não haveria possibilidades de novas interpretações. Não haveria novas possibilidades. No entanto sabe-se que uma leitura de um texto, por exemplo, traz em seu bojo diversas possibilidades de interpretação que vão desde os conhecimentos de mundo do leitor às intenções do autor. E esse contato não se dá tão somente pelos códigos, mas há toda uma gama de informações a serem consideradas.

Sendo assim um livro didático de Língua Portuguesa deveria considerar o texto em toda sua plenitude e não transformar a informação em algo simplista e reducionista como é o caso, apenas a titulo de exemplo, de um exercício contido no livro Português: linguagens, 8ª série (9º ano) que pede ao aluno o seguinte:

1) Complete o sentido dos enunciados abaixo, criando para cada um deles uma oração adjetiva. Veja o exemplo:

A cidade é maravilhosa.
A cidade onde moro é maravilhosa.

a) Quando foi até o pátio, viu um garoto_____________

b) A menina retirou da bolsa algo __________________

c) Os professores esperavam alunos ________________

d) Muitas são as novidades _______________________

Como pode ser observado no exemplo acima, as orações cumprem o seu papel de direcionar o aluno a que transforme os enunciados em orações adjetivas, mas trariam mais conteúdo se fizessem parte de um texto atraente e com toda uma gama de informações as quais instigasse o aluno a pensar alem do enunciado. Por meio de um simples exercício em um livro didático poder-se-ia fazer com que o aluno pensasse os valores sociais, políticos, familiares e é claro da própria língua mostrando-lhe que a sua diversidade no falar também é vista em toda a sociedade em focos diversos e que isso não é para ser criticado, menosprezado ou marginalizado, mas respeitado.

Ademais há a necessidade de se considerar o mundo do leitor que frequenta as salas de aula, pois há pessoas portadoras de vários níveis de conhecimento e crenças. Fazer constar em um livro didático somente informações atinentes à classe média não seria, portanto envolvente para a classe suburbana que não teria como interpretar as informações passadas, pois seriam totalmente estranhas ao seu mundo.

Dessa forma percebe-se que o mundo de conhecimentos adquiridos pelo aluno poderia ter seu campo aumentado de maneira substancial se fossem considerados nos livros didáticos questões como as frisadas por Voese e que as cito aqui a título de uma melhor compreensão de como o ensino da Língua Portuguesa poderia ficar mais possível se fossem adotadas tais medidas.

De acordo com Voese, após mostrar que a "noção de código utilizada para definir a língua e, sobremodo, fragilizar a ideia de que o processo de comunicação é algo simples e que não há dificuldades, em especial, para comunicar o que Fregue chamou de representação" Voese (2005, p. 32), há alguns fatores que devem ser considerados para interpretação das enunciações os quais são: o ato de fala, pois no "uso da língua na interação, o enunciante faz e age, em geral, motivado por intenções, interesses pessoais que nem sempre são explícitos, mas subtendidos, cuja compreensão, porém, depende não só do que diz o enunciante, mas também das regras que orientam os atos de fala." (Grifos do autor). Voese (2005, p. 33). Assim sendo é necessário que se busque conhecer, em um texto contido em um livro didático, quais seriam as intenções do autor e quais as regras utilizadas por ele para chegar às informações contidas no texto; o evento cultural tendo em vista que as pessoas, em sua comunicação diária, fazem uso "não só da língua, mas também de regras de uso." Voese (2005, p. 35). Mas somente esse ato interativo não é, muitas vezes suficiente sendo observada a questão das "determinações culturais" Voese (2005, p. 35); o lugar social da enunciação é também algo de suma importância e no caso dos livros didáticos de português é de suma importância que se observe essa condição, ou seja, o que é comum no grupo em que se processa o enunciado; o acontecimento que é o tempo em que se processa a informação para que não haja uma informação que, pelo tempo de sua ocorrência, já não traga nenhum significado ao estudante que a lê, isso quer dizer que o enunciado, enquanto texto, tem uma estrutura interna própria e uma discursividade, entendida como determinação exterior que fixa o horizonte de possibilidades de seu acontecimento e de suas leituras: se, por exemplo, o enunciado, devido ao tempo decorrido, perde as cores do contexto histórico em que foi produzido, haverá enormes dificuldades, até mesmo um impedimento total de ele se fazer acontecimento, porque o receptor não terá como inferir determinados sentidos sem uma recontextualização [...] Voese (2005, p. 42). Em seguida é citada pelo autor a dialogia e a polifonia que deveriam sem dúvidas serem compreendidas pelos estudantes para que houvesse uma interpretação mais efetiva nos livros didáticos. A dialogia surge por não ser possível "um enunciado surgir do nada, mas da relação que o enunciante construiu com outros enunciados" Voese (2005, p. 47).

Dessa forma ocorre a polifonia que são as várias possibilidades do discurso. Para uma análise em livros didáticos que tratem do ensino da língua portuguesa ainda poderia-se considerar a questão exposta pelo autor referente à ideologia que, descoberta em toda sua inteireza no texto, poderia esclarecer muito aos que buscam o conhecimento em escolas que utilizam como material principal para o ensino o livro didático. As possibilidades citadas podem contribuir para um avanço do cidadão que não mais fará a leitura de um texto observando somente os códigos, mas estará pronto a perceber todos os fatores inerentes e fazer um julgamento mais critico da sociedade em que vive.

6.3. O discurso de preconceito nos parâmetros curriculares nacional

Os Parâmetros Curriculares são orientações que existem por força de lei tendo em vista que surgiram para "atender ao disposto na Constituição Federal de 1988, que estabelece a criação de um 'currículo mínimo nacional' (grifo da autora) (Marinho (2007, p. 77).

Logo no inicio do PCN destinado à Língua Portuguesa, na apresentação, somos informados que "o respeito à diversidade é o principal eixo da proposta e, para a área, não poderia ser diferente: as indicações deste documento procurarão ser coerentes com os princípios legais" PCN (2010, p. 4). O que já podemos entender como um respeito ao direito do outro de ser diferente. Dessa forma é que entendemos a linguagem e a consideramos como a principal fonte de comunicação, de interação humana. Tentar diminuir isso é causar um ato de violência contra o ser humano é tirar-lhe a principal fonte de expressão. Considerando esse ponto de vista que não é consenso na sociedade, pois temos uma classe dominante que não considera as demais variantes linguísticas, é que torna-se louvável a absorção nos PCN de informações que afirmam ser a linguagem um importante fator de interação como neste tópico: "Não há linguagem no vazio, seu grande objetivo é a interação, a comunicação com o outro, dentro de um espaço social, como, por exemplo, a língua, produto humano e social [...]. PCN (2010, p.5). Portanto, uma afirmação que solidifica o fato de ser a língua um importante meio de interação humana. Também deve-se considerara que a sociedade igualitária é um mito e que essa desigualdade social é refletida nas escolas e absorvidas por quem a frequenta.

Fica, porém evidente, ao analisar os PCN, que estes avançaram em sua abordagem referente à linguagem e que o campo de atuação dos professores nas escolas se tornaram mais abrangentes com possibilidades de discussão das demais variações linguísticas, questões sociais, politicas e familiares. A realidade social de quem estuda passou a ser levada em conta não ficando os PCN presos tão somente a questões atinentes à esfera elitista da sociedade. Os PCN alertam, por exemplo, para o fato de que o homem transforma os espaços em que vive e afirma que a linguagem é um reduto de possibilidades:

Nas práticas sociais, o homem cria a linguagem verbal, a fala. Na e com a linguagem, o homem reproduz e transforma espaços produtivos. A linguagem verbal é um sementeiro infinito de possibilidades de seleção e confrontos entre os agentes sociais coletivos. A linguagem verbal é um dos meios que homem possui para representar, organizar e transmitir de forma específica o pensamento. PCN (2010, p. 5).

Nada mais coerente com a realidade em que se vive no momento, tendo em vista que, querendo ou não a criação verbal das massas ai esta para provar que existe a diversidade e que ela deve ser aceita e não ignorada. Ademais isso indica uma mudança de postura dos órgãos oficiais envolvidos com a educação que "se deram conta da necessidade de mudar os conceitos de língua vigentes nas nossas escolas e na nossa cultura." Bagno (2002, p. 25).

Então o que podemos perceber é que há um novo tratamento para o ensino de língua portuguesa estando os PCN buscando uma sintonização mais adequada e propondo conteúdos mais antenados com os estudos linguísticos quer seja oferecendo conteúdo mais de acordo com a realidade local e da escola, quer seja oferecendo uma linguagem mais de acordo com a realidade social do aluno. Não há, no entanto, uma fuga do ensino da língua padrão que deve ser considerada, pois é a que molda e norte ia qualquer pretensão de ascensão além de ser o padrão oficializado no país.

No entanto é sempre bom que se alerte para o que é desejável e o que é praticável no país, pois o que ocorre é bem diferente na prática. Percebe-se, por exemplo, uma dificuldade dos professores em colocar todas essas questões em prática ficando toda essa retórica somente no papel. A escola pública, principalmente ela, fica relegada a segundo plano e constata-se, sem grandes esforços, um fracasso demasiado na educação. Tem-se boas leis, bons planos didáticos, mas quando chega o momento de colocá-los em prática os objetivos qualitativos não são alcançados e com os PCNS não é diferente, pois os resultado obtidos em sala de aula não correspondem à qualidade desejável na educação. Questiona-se então o fato do porque os PCNS estarem tão interessados na diversidade e no pluralismo linguístico. Que fatores levaram os gestores da educação perceberem que mais do que gramática é necessário imbuir o aluno, usando o ensino de língua portuguesa, de uma conscientização do mundo em que vive e da sociedade que o rodeia De acordo com Marinho:

É importante interrogar, por exemplo, neste momento da história da educação no Brasil, que razões explicariam um maior interesse tanto pelo estabelecimento e controle do currículo formal, por parte dos gestores da educação, quanto pelo crescimento dos estudos nesse campo. E esse interesse reaparece, particularmente, num momento em que se volta também para o estudo das disciplinas escolares enquanto práticas culturais e em que se reivindicam a diversidade, o respeito e o favorecimento das diferenças. Marinho (2007, p. 81).

Num momento em que o mundo globalizado reivindica a igualdade e uma maior justiça entre os povos não podemos deixar de observar que essa tendência também é forte no Brasil em que a classe dominada tem reivindicado os seus direitos, ainda que de uma maneira tímida para os padrões mundiais. Dessa forma também a questão linguística tem sido considerada pelos estudiosos, embora não poucos intelectuais fechem a cara para essa realidade. Parece, portanto que uma força invisível, ou não tão invisível assim, torna importante, para os gestores, que se preocupem com a diversidade e a incluam nos PCN.

Com qual interesse esses textos são produzidos torna-se latente quando verificamos que há uma verdadeira propaganda em torno deles inclusive entre os acadêmicos que precisam ser conquistado pelo meio governamental, tendo em vista que a aprovação não decorre das massas, mas da elite. Sendo assim o governo e o MEC não dispensam sua divulgação como um achado e um avanço na educação, deixando dessa forma toda uma intenção política por traz dos PCNs como foi o caso da participação do Brasil, como convidado de honra, no 10° Salão do Livro, realizado em Paris e comentado por Marinho em seu artigo:

Por ocasião do 10° Salão do livro, realizado em Paris, em março de 1998, em fase de elaboração, do qual o Brasil foi o convidado de honra, os PCNs, embora ainda em fase de elaboração, me pareceram ter sido o mais importante cartão de visita apresentado pelo governo brasileiro. Isso nos leva a contextualizar esse discurso oficial, também num campo de estratégias de circulação que, segundo Bourdieu, (1996, p.234), faz com que o texto passe diretamente à prática 'sem que haja necessariamente mediação de uma decifração', o que reforça os condicionantes políticos do seu processo de produção e de recepção. Marinho (2007, p. 192).

O que fica claro na citação acima é que o governo brasileiro já visualizava interesses quanto ao uso que poderia ser feito pelos PCNs e pelas novas abordagens propostas para o ensino no Brasil. A partir daí o que poderia ser apenas uma intenção passou a ser um objetivo político com vistas a ser bem visto no exterior, pelo menos no discurso, pois na prática, repito os resultados não são tão qualitativos assim.

Outra questão que lança dúvidas sobre as boas intenções que podem ser lidas nos PCNs é que o MEC lança as propostas fundamentadas nos estudos científicos feitos nas Academias, ou seja, os conhecimentos acadêmicos são utilizados, quem se sobressai é o MEC enquanto sujeito jurídico na empreitada. Isso deixa como que um ar de algo armado em que o próprio MEC não acredita e que aparecerá nos textos apenas como algo direcionado pelos que, de fato, estudam, mas que na prática se tomará inviável em todas as suas nuances. Assim, mais uma vez toma-se oportuna as palavras de Marinho quando afirma que "Os autores (se considerados enquanto os sujeitos que escrevem o texto) não tem o estatuo jurídico dessa categoria - apenas produzem o discurso para a instituição que representam: o MEC, autor jurídico." Marinho (2007, p. 192). Vê-se assim que há um uso dos conhecimentos dos autores, mas não uma garantia de que de fato seu uso não se dará mais intensivamente como algo político e adequado ao momento. Não foge à regra, portanto, de qualquer outro aparato que o estado usa para controlar as massas de forma ideológica utilizando para isso a escola. A diferença é que agora os meios são mais sofisticados pois tomou-se o cuidado de manter os pesquisadores ao lado do estado utilizando-os a partir dos seus trabalhos científicos sem, no entanto, fazê-los ativamente conhecidos. É bem verdade que no final das obras que tratam dos PCNs há uma bibliografia dos autores que foram referências para a pesquisa e conclusão do trabalho, mas é certo que o envolvimento dos professores das escolas públicas nessa questão é pequena, pois o próprio tempo para pesquisa que lhes resta não permite tal atitude. Portanto o questionamento por meio da leitura das obras citadas é muito baixo. As críticas, portanto resumem-se aos conhecimentos enciclopédicos que o professor eventualmente tenha e sua ressonância, com certeza, será bem limitada. Quanto aos questionamentos que poderiam advir dos leitores não especializados são praticamente nulos, pois, "aponta o seu papel de 'formigueiro laborioso e agressivo', para o especialista, e de 'sistema fixo e intangível', para o leitor não especializado." Marinho (2007, p. 196-97).

O que faz pensar e questionar os PCNs portanto, não é o seu avanço na maneira de perceber a diversidade e até mesmo o seu respeito por ela como fica claro, por exemplo, nos PCNs direcionados ao Ensino Médio quando se refere ao ensino da Língua Portuguesa questionando o ensino até então adotado: "Quando deixamos o aluno falar, a surpresa é grande, as respostas quase sempre surpreendentes. Assim pode ser caracterizado, em geral, o ensino de Língua Portuguesa no Ensino Médio: aula de expressão em que os alunos não podem se expressar." PCNs (2002, p. 138). Essa afirmação é uma evolução em termos de educação. O que é questionável de fato é a quem interessa tal posicionamento já que quando se expressam dessa maneira nos PCNs responsáveis pela educação em nosso país deveriam pensar no professor como participante assíduo dessa evolução. No entanto condições não lhes são dadas para um maio envolvimento nas questões atinente e a própria escola não é chamada a debater até a exaustão tais procedimentos. Dessa forma mais uma vez o discurso é um, mas a pratica é outra. Esquece-se que o professor é que esta em sala de aula e é ele que poderia fomentar tal discussão. Os PCNs dizem que:

A Língua situada no emaranhado das relações humanas, nas quais o aluno está presente e mergulhado. Não a língua divorciada do contexto social vivido. Sendo ela dialógica por princípio, não há como separá-Ia de sua própria natureza, mesmo em situação escolar. PCNS (2002, p. 13)

No entanto por uma falta de orientação mais contundente um professor entra em sala de aula e aplica a gramática em toda sua plenitude, fora do contexto, com textos soltos e sem nenhum nexo, tão somente porque esqueceu ou não conhecer o que seja dialógico em toda sua inteireza ou como aplicar isso em sala de aula. Como discutir com o infante questões atinentes ao contexto social em que vive, inclusive considerando a variação lingüística em que se expressa esse estudante se não há tempo em nossas escolas se quer para passar as matérias necessárias e exigidas oficialmente? Ademais deve-se considerar cada característica regional para que os Parâmetros Curriculares Nacionais sejam aplicados tendo em vista que cada região tem suas peculiaridades. Também deve-se considerar toda uma gama de investimentos nas escolas para que a educação realmente funcionasse iniciando pelo professor que desestimulado e sem condições de ampliar seus conhecimentos também não tem possibilidades de repassar aos alunos saberes mais atuais e afinados com a época que hora nos encontramos. Enquanto não se considerar o professor como extremamente necessário à educação o discurso até bem planejado dos PCNs permaneceram muito bem colocados no papel, mas sua prática será lenta, permanecendo um ensino de Língua Portuguesa voltado para a discriminação das demais variantes e exaltação da língua padrão. Dessa forma negasse a diversidade na prática, subestima o professor e faz-se uma propaganda positiva do governo que não tem respaldo qualitativo na educação. Conforme Marinho:

Combinando procedimentos do discurso acadêmico e da divulgação para construir um referencial conceitual, a sua natureza também política nos permite compreender as razões pelas quais esse texto é produzido por "várias mãos" se destina a "vários olhares" ou leitores, dificultando, então, o alcance do seu suposto ou desejável alvo principal: o professor. Isso significa que as decisões sobre os modos e processos de produção de um currículo são escolhas políticas e não meramente científicas ou da ordem do conhecimento pedagógico. Marinho (2007, p. 197).

Mais uma vez tem-se, como já dito um discurso que não corresponde à realidade da educação no país e que de maneira velada esconde toda uma discriminação, pois mostra uma realidade de igualdade, diversidade e compreensão que não é manifesta na prática e que não há interesse nenhum dos dirigentes políticos, governamentais e gestores da educação fazer cumprir. E não faz cumprir porque não há interesse nas opiniões da classe marginalizada do país. É lhes dado escola e enche-se as salas de aula de alunos, mas não se leva em conta a qualidade do ensino. O importante é que o Brasil esta quantitativamente com muitos alunos na escola, a qualidade discuti-se depois, já esta no papel e isso é um grande passo aos olhos dos gestores da educação.

7. CAPÍTULO III

8. ANÁLISE DOS DADOS DA PESQUISA DE CAMPO

8.1. Metodologia da pesquisa

Diante do anteriormente exposto sobre o preconceito linguístico fica evidente que no Brasil não há como fugir à realidade de que há uma diversidade linguística e uma língua padrão imposta pelas elites que mantém afastada as demais variações criando obstáculos ao seu uso. No entanto a noção de certo ou errado no que diz respeito à língua não é algo já definido, intransponível e acabado. É portanto mais viável considerar que há inadequação ou adequação e não erro. O que possui um aspecto mais denotativo nesse caso é que a questão do preconceito linguístico é usada como forma de endossar os demais preconceitos existentes na sociedade. Dessa forma, como meio de endossar o que foi pesquisado de forma bibliográfica, buscou-se a realização da pesquisa campo incluindo para esse fim professores e alunos tendo em vista a comparação entre o teórico e o prático.

8.1.1. Abordagem da pesquisa

Com vistas a constatações mais precisas a respeito dos fatos bibliográficos já expostos faz-se mister buscar em campo dados qualitativos para uma fundamentação mais consubstanciada dentro da realidade em que se encontra o público alvo, quais sejam, alunos do ensino básico que segundo a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei nº 9.394/96) faz parte também o ensino médio. Utilizando-se do método cientifico para a pesquisa buscou-se o “conjunto das diversas etapas ou passos que devem ser dados para a realização da pesquisa” Amado & Bervian (2002, p.26). Nesse sentido é que chegou-se à analise da pesquisa campo tendo em vista tratar-se de uma pesquisa qualitativa.

A importância desse ato esta em analisar os dados em ambiente natural e não, tão somente, chegar ao resultado da pesquisa mas vivenciá-lo compreendendo o indivíduo ou grupo de indivíduos em sem próprio meio. Foram ultilizados questionários e as questões são do tipo abertas e fechadas para que, por meio daquelas, o entrevistado tenha maior liberdade em detalhar a resposta e estas para que se obtenha um resultado mais preciso.

8.1.2. Tipo de pesquisa

A pesquisa que envolveu o campo de estudo é a descritiva, pois esta “observa, registra, analisa correlaciona fatos ou fenômenos (variáveis) sem manipulá-los.” Cervo & Bervian (2002, p.66). Ademais em busca de uma investigação sobre os fatos sociais e do comportamento humano considerou-se adequada a pesquisa descritiva que também busca “conhecer as diversas situações e relações que ocorrem na vida social, política, econômica e demais aspectos do comportamento humano, tanto do indivíduo isoladamente como de grupos e comunidades mais complexas.” Amado & Bervian (2002, p.66). Por tratar-se de um assunto de cunho social buscou-se por meio desse tipo de pesquisa a formulação e a tentativa de solução.

8.1.3. Universo da pesquisa

A pesquisa foi realizada na Escola Estadual do Novo Gama que tem a sua atuação na Avenida Perimetral s/nº. Trata-se de uma escola pública mantida pelo Governo do Estado de Goiás e que atende uma clientela de alunos que se encontram no Ensino Fundamental e Ensino Médio, nos turnos matutino, vespertino e noturno.

8.1.4. Participantes da pesquisa

A pesquisa foi realizada com duas professoras de língua portuguesa e alunos do Ensino Médio, os quais compõe a turma “D” da Escola Estadual de Novo Gama. Os alunos encontram-se em idades que estão entre 15 e 17 anos. Foram 10 alunos que deveriam responder 14 questões objetivas e subjetivas e 2 professoras que deveriam responder 10 questões mistas (objetivas e subjetivas). As professoras participantes dessa pesquisa são licenciadas em Letras e exercem a docência há mais de cinco anos. Ambas possuem especialização e atuam como docentes do Ensino Médio na Escola Estadual do Novo Gama.

8.1.5. Instrumentos

Por tratar-se de uma forma simples e prática para a obtenção de dados e por não haver necessidade de identificação foi utilizado o questionário, pois “o questionário é a forma mais usada para coletar dados, pois possibilita medir com exatidão o que se deseja.” Cervo & Bervian (2005, p. 48). O questionário oferecia possibilidades de justificativas para as questões fechadas e havia também algumas questões abertas para uma maior possibilidade de esclarecimento do pesquisado.

8.2. Análise da pesquisa de campo

Para a obtenção de dados na pesquisa foi utilizado o método quantitativo, utilizando-se para isso questionários com questões mistas, ou seja, objetivas e subjetivas, as quais foram distribuídas para alunos e professores. A análise dos resultados é a interpretação dos dados coletados durante a pesquisa.

8.2.1. Análise dos questionários dos discentes

A primeira questão da pesquisa buscou responder a escolaridade dos pais do pesquisado ficando exposta uma condição, como é perceptível no Gráfico 1 e 2, de somente 40% com o ensino médio completo entre os homens e o mesmo valor entre as mulheres o que relega os demais a uma condição de alfabetizados 10%, ensino fundamental 20%, ensino médio incompleto 10% somando 40% entre os genitores e se sobressaindo as genitoras em 20% no ensino médio incompleto. É possível perceber, no entanto que entre as mães dos alunos o número que possui ensino superior incompleto é de 20% o que denota, juntamente com os 20% do ensino médio incompleto, uma maior frequência das mulheres nas escolas. No entanto, embora não haja, no universo da pesquisa, analfabetos declarados ainda pode-se perceber que a escolaridade dos pais dos entrevistados é baixa somente 10% com ensino superior completo entre os pais e 10% entre as mulheres. Isso só confirmar os dados catalogados de diversos autores que afirmam que o aluno, ao chegar na escola, já traz em seu bojo todo um conjunto de práticas já herdadas de sua convivência familiar e que essa práticas são as únicas que ele conhece. Então a linguagem é uma identidade social do indivíduo como afirma Brandão “Ao falar, um indivíduo transmite, além da mensagem contida em seu discurso, uma série de dados que permite a um interlocutor atento não só depreender seu estilo pessoal-seu idioleto-, mas também filiá-lo a um determinado grupo.” Brandão (1991, p. 6). Aqui, no caso, trata-se de um grupo de indivíduos com pouca escolaridade que transmite aos filhos um conhecimento limitado no que diz respeito à linguagem, pois no seio familiar a comunicação se processa sem exigências ou formalismos então não cabe à Questão 1


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

Na questão 3, buscou-se informação a respeito do interesse dos alunos em frequentar as aulas de lingua portuguesa e o resultado mostrou que há um interesse de 70% dos alunos em frequentar essa disciplina o que mostra que embora haja uma dificuldade em dominar a lingua padrão há um interesse em entender suas nuances para que se tenha sucesso na vida social. O que esta de acordo com Bakhtin quando afirma que “Ali onde o signo se encontra, encontra-se também o ideológico. Tudo que é ideológico possui um valor semiótico.” (grifo do autor) Bakhtin (2010, p. 33). O que se pretende mostra com isso é que já se encontra consolidado na mente do indivíduo que a lingua padrão é a única correta e que para ter ascensão social, saber de fato, é necessário dominá-la. A propaganda ideológica perversa e discriminadora da elite conseguiu êxito nesse intento como afirma Bagno:

Porque o verdadeiro problema, a verdadeira questão social implicada nisso tudo não tem a ver com o fato de se usar a regra A ou a regra B. Tem a ver, isso sim, com o uso social perverso que se faz do dominio desse suposto saber: “Eu sei empregar a passiva sintética, eu sei quando empregar o acento indicador de crase, eu sei usar os pronomes oblíquos, mas você não...Por isso eu sou mais inteligente, estou mais preparado para exercer o comando, pertenço a uma casta superior.” (grifo do autor) Bagno (2009, p. 29)


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

Já na questão 4, podemos observar que os entrevistados não veem relevância nos investimentos feitos pelo estado na educação, ou seja há um discurso de investimentos para uma qualidade na educação, mas o que se vê é tão somente quantidade excessiva de alunos em sala de aula e não qualidade. O que mais uma vez não contradiz Brandão quando afirma que “a classe dominante gera mecanismos de perpetuação ou de reprodução das condições materiais, ideológicas e políticas de exploração” (2004, p. 23) e isso se encontra materializado em uma escola perpetuamente sem qualidade para a classe desfavorecida.


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

A questão 5, correspondente ao gráfico 5 perguntava se o aluno já fora em algum momento discriminado pela sua forma de falar ou escrever obtendo como resposta 60% sim e 40% não mostrando que ainda é a maioria que sofre com a discriminação nas escolas. No entanto é necessário que se considere o fato de que quando perguntados na questão 12, o que entendem por preconceito 100% dos alunos não responderam a questão indicando uma falta de compreensão sobre o assunto. O fato de um aluno “X” fazer um comentário dizendo que por “falar muitas gírias” já se sentiu discriminado pode indicar a crença de que somente o falar gírias seria uma variação condenável, pois não se conhece as sutilezas do preconceito como preconiza Quadro (2008, p.20): “Um preconceito, ao contrário, pode existir sem jamais se revelar e, por isso, existe antes da crítica.”


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

A questão 6, perguntava ao discente se ao ler os diversos textos que lhe são apresentados na escola tem facilidade em interpretá-los mostrando que 40% respondeu que sim, 40% respondeu que não e 20% outros em que um aluno “X” comentou da seguinte maneira: “mais ou menos”. Ao verificarmos que somente 40% dos alunos são capazes de entender os textos apresentados na escola podemos entender, também, porque há uma facilidade de uma dominação por meio do discurso das elites tendo em vista que estes costumam ser mais rebuscados e é necessário que se faça a sua leitura mais detalhada e pormenorizada, pois como afirma Brandão (2004, p. 11):

A linguagem enquanto discurso não constitui um universo de signos que serve apenas como instrumento de comunicação ou suporte de pensamento; a linguagem enquanto discurso é interação, e um modo de produção social; ela não é neutra, inocente e nem natural, por isso o lugar privilegiado de manifestações ideológicas [...]


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

Quanto a questão 7, a pergunta era se o entrevistado concordava em que o ensino público possui a mesma qualidade que o ensino particular ficando o gráfico referente com 80% de alunos afirmando que não o que mostra mais uma vez que não há preocupação com a escola pública denotando assim um preconceito social, pois para a elite é mantida uma escola de qualidade enquanto a classe desfavorecida permanece à margem dessa educação e isso não passa despercebido entre os alunos. Não investir em um ensino público de qualidade também denotam um preconceito como afirma Leite o “preconceito ou a intolerância não são somente linguísticos, são também de outra ordem (social, política, religiosa, racial etc).” (2008, p. 14).


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

Ao observarmos a questão 8 atinente ao gráfico 8, que inqueria dos alunos se concordavam que para haver uma ascensão social era necessário haver um bom domínio da língua portuguesa, percebemos nitidamente que a propaganda de que a língua padrão é sinônimo de sucesso prevalece pois obteve-se 90% dos entrevistados concordando com essa afirmação. Permanecendo a ideologia das elites que de acordo com Bagno (2009, p. 29)

Tem a ver, isso sim, com o uso social perverso que se faz do domínio desse suposto saber: “Eu sei empregar a passiva sintética, eu sei quando empregar o acento indicador de crase, eu sei usar os pronomes oblíquos, mas você não...Por isso eu sou mais inteligente, estou mais preparado para exercer o comando, pertenço a uma casta superior”. Por este tipo de propaganda é que essa ideia permanece. (grifo do autor).


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

Buscamos na questão 9, gráfico 9, saber se os métodos utilizados pelos professores para o ensino da língua portuguesa eram suficientes para o aprendizado e obteve-se 80% de respostas afirmativas o que indica que os métodos são bem aceitos. Um aluno “Y” observou que “depende do professor”, mas no geral foi bem aceito indicando uma compatibilização entre professores e alunos que parecem estar mais interativos tendo em vista que há uma tendência a algumas discussões em sala de aula e o uso de “aulas de redação e de interpretação de textos” Fiorin (2006, p. 9) para motivar essas discussões.


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

Na questão 10, gráfico 10, inquiriu-se do discente se os métodos propostos nos livros didáticos consideravam a realidade social em que vive e obteve-se 80% de alunos afirmando que sim. Ou seja, a educação pronta nos livros didáticos consegue a sua finalidade que é envolver os alunos em discussões já planejadas e direcionadas. Como afirma Maria Helena G. Frem Dias-da-Silva em seu artigo intitulado Política de formação de professores no Brasil:

Então, o que parece inacreditável faz parte da própria lógica do modo como a educação existe na sociedade desigual. Quando pensada como uma "filosofia" ou uma "política de educação", ela se apresenta juridicamente como um bem de todos, de que o estado assume a responsabilidade de distribuição em nome de todos. Mas sequer as pessoas a quem a educação serve, em principio, são de algum modo consultadas sobre como ela deveria ser. A educação que chega à favela, chega pronta na escola, no livro didático e na lição.


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

A questão 11, referente ao gráfico 11, a pergunta era se na opinião dos alunos há preconceito no Brasil em relação a quem não fala a língua padrão obtendo-se 50% afirmando que há preconceito 30% que não e 20% que não responderam. Dessa forma verifica-se que o preconceito é preponderante e

Infelizmente, ao contrário de tantas outras superstições infundadas que foram desmascaradas pela ciência, rejeitadas pelo convívio democrático e abandonadas pela maioria das pessoas instruídas, as superstições linguísticas permanecem vivas e fortes na nossa cultura [...] Bagno (2009, p. 15)


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

A questão 14, referente ao gráfico 12, procurou saber dos discentes com a pergunta: “Você possui o hábito da leitura?” se entre os alunos da rede pública é comum a leitura de livros diversos e por conta própria ou se só liam os livros exigidos na escola verificando que 60% têm o hábito da leitura e que 30% não leem restando 10% que só leem os livros propostos nas escola. O objetivo dessa questão é mais uma vez saber se os investimentos e discursos feito pelos governantes de que há uma busca de qualidade na escola pública seria notado em um simples ato de motivação a leitura. Embora 60% não seja um número tão relevante assim mostrou que há uma melhora pelo menos nessa questão e mostrando que não é por falta de alguma leitura ou por serem ignorantes e fadados ao fracasso que não se fala a língua padrão entre os menos favorecidos, mas tão somente por uma questão de costume advinda do meio em que vivem e que já se encontram arraigadas “ao português brasileiro, falado e escrito, por todos os falantes, de todas as regiões do país, de todas as classes sociais, de todos os níveis de renda e graus de escolarização, e até mesmo na melhor literatura.” Bagno (2009, p. 22).


Fonte: ROCHA, Edson Victor Pereira da. Pesquisa de campo, 2012.

Não houve, por parte dos alunos que responderam o questionário resposta às questões de número 12 que inquiria sobre o que o aluno entende por preconceito e nem da questão número 13 que desejava saber se o aluno ou alguém da família já sofrera algum tipo de preconceito em sala de aula. Essas questões eram discursivas e tinham como finalidade esclarecer de forma mais objetiva e fiel as respostas anteriores.

8.2.2. Analise dos questionários dos docentes

No questionário feito para os professores, foram abordados duas professores da Escola Estadual do Novo Gama as quais serão aqui chamadas de Raquel e Clarice1. A professora Clarice tem 35 anos é formada em letras e possui pós-graduação possuindo especialização em língua portuguesa. Atua como professora a 13 anos e no ano corrente leciona na Escola Estadual do Novo Gama no segundo e terceiro ano do Ensino Médio. A professora Raquel tem 34 anos, possui curso superior completo, possui especialização em Português/Literatura, esta há 4 anos atuando como professora e atualmente leciona português para o Ensino Médio na Escola Estadual do Novo Gama.

A par de elucidar alguns fatos referentes ao preconceito linguístico nas escolas públicas e entre as classes desfavorecidas e discriminadas foi perguntado às referidas professoras se além do livro didático costumavam utilizar outro material para a complementação e enriquecimento do ensino, acrescentando que se usassem qual ou quais matérias usavam. A resposta da professora Raquel foi afirmativa citando vídeos, data-show e xerox. A professora Clarice informou que sim, mas não especificou quais. A resposta das referidas professoras vai ao encontro da resposta fornecida pelos discentes quando afirmaram que os métodos apresentados pelos professores para o ensino da língua portuguesa são suficientes para o seu aprendizado. Mostra esta inquirição, juntamente com a resposta obtida que há um empenho por parte dos docentes faltando tão somente um maior empenho dos governantes que muito se atém tão somente ao discurso. Ao discurso ludibriante pois a “palavra é o signo ideológico por excelência, pois, produto da interação social, ela se caracteriza pela plurivalência. Por isso é o lugar privilegiado para a manifestação da ideologia [...]” Brandão (2004, p. 9). Dessa forma a um discurso por parte do governo e responsáveis pela educação que não trás qualidade a esta e um corpo docente usando os meios possíveis para que isso ocorra.

A questão 2, que perguntava se as professoras percebiam, no exercício da profissão de professor investimentos governamentais relevantes na área da educação, a resposta foi “não” pela professora Raquel e outros pela professora Clarice, o que nos levou a entender que os investimentos não são relevantes e no máximo podem ser considerados pontuais. Coaduna as respostas para endossar mais uma vez a falta de qualidade e investimentos na área da educação pública no Brasil. Mais uma vez é comprovada o preconceito marginalizante das elites para com os desfavorecidos que tornam suas ideologias concretas por meio de ações concretas não investindo na educação conforme Brandão (2004, p. 25):

A existência da ideologia é, portanto, material, porque as relações vividas, nela representadas, envolvem a participação individual em determinadas práticas rituais no interior de aparelhos ideológicos concretos. Em outros termos, a ideologia se materializa nos atos concretos, assumindo com essa objetivação um caráter moldado das ações.

Na questão 3, a pergunta foi: Verificando que no Brasil não é comum o ato da leitura de que forma tem incentivado seus alunos a adquirirem o gosto pela leitura?

A professora Raquel respondeu que o faz por meio de conversas e debates incentivando-os e reforçando sobre a importância deste hábito para o seu futuro profissional e intelectual. Além disso, informou que trabalha com autores da literatura para chamar a atenção dos alunos através de sua história e importância na contribuição literária do país.

Já a professora Clarice, disse que mostra uma variedade de livros, e o aluno tem a possibilidade de ver e ler obras importantes.

A importância dessa pergunta se deve ao fato de buscar saber se a importância dada aos clássicos se sobressaia às demais literaturas o que indicaria uma busca ainda que indireta pelo falar e escrever padrão, ou seja, pela língua padrão em detrimento das demais variações o que não fugiu muito às expectativas tendo em vista que a professora Raquel somente citou “autores da literatura” acrescentando que é para “chamar a atenção dos alunos através de sua história e importância na contribuição literária do país.” O que se entende por boa literatura ou importância na contribuição literária no país seriam os clássicos por defenderem a língua padrão? Busca-se, portanto a pureza, a boa literatura “aquela que defende a ‘pureza’ da língua contra todas as formas inovadoras, que são sempre consideradas como sinais de ‘decadência’, ‘corrupção’ e ‘ruína’, não só da língua como também, muitas vezes, dos valores morais da sociedade” (grifos do autor) Bagno (2009, p. 30).

Na questão de número 4, foi perguntado se as demais variações linguísticas são comentadas em sala de aula e a resposta de ambas as professoras foi “sim” o que denota que já não há espaço para preconceitos a respeito da língua e que os docentes estão cientes disso embora ainda prevaleça a sobrepujança da língua padrão. Tem-se, portanto uma consciência de que o preconceito existe, pois “As pessoas que têm acesso à escolarização formal, à cultura escrita, à literatura prestigiada também têm acesso a diversos mitos sobre a língua, superstições linguísticas que circulam na cultura ocidental há muitos século.” Bagno (2009, p. 19).

Perguntadas, na questão 5, se os responsáveis pela educação (governo, gestores) tem possibilitado a renovação, aprimoramento e condições de especialização em sua área de atuação, a professora Clarice e a professora Raquel responderam que sim, mas não comentaram o que leva a uma mudança pontual em relação aos investimentos do governo que agora recaem sobre o professor no sentido de alcançar um maior nível de conhecimento restando ainda assim um maior investimento na escola como um todo para que estes conhecimentos tenham possibilidades de expansão e consiga-se obter sucesso em alcançar a finalidade fim quais sejam um elevado índice de qualidade educacional na escola pública não se tornando o professor “um instrumento de dominação de classe porque a classe dominante faz com que suas ideias passem a ser ideias de todos.” Brandão ( 2004, p. 21).

Em relação aos PCNs perguntou-se na questão 6: Se as professoras consideravam que houve uma abordagem mais social e realista das condições em que vive os alunos da escola pública nos PCNs e a resposta da professora Clarice foi outros, porém sem comentários enquanto a professora Raquel foi categórica em afirmar que não comentando que: “Eles tem tentado avançar, porém, ainda falta um caminho longo a trilhar.” Sendo assim embora tenha havido uma conscientização por parte dos órgãos oficiais envolvidos com a educação que “se deram conta da necessidade de mudar os conceitos de língua vigentes nas nossas escolas e na nossa cultura.” Bagno (2002, p. 25), ainda restam muitas arestas a serem aparadas.

Buscou-se junto as professoras uma resposta na questão 7 que envolvia o seguinte teor: “Considera que as abordagens da língua padrão feitas no livro didático, atualmente, tem facilitado o aprendizado dos alunos? A resposta da professora Clarice foi “sim” e a da professora Raquel foi não comentando que “os métodos por eles utilizados ainda precisam avançar em direção à realidade de cada comunidade escolar” mostrando que não se deve ter a língua padrão como algo acessível somente para alguns privilegiados conforme afirma Bagno (2002, p. 29):

É esse discurso, muitas vezes não explicitado, oculto na atitude de que se vale de seu conhecimento da gramática normativa como um instrumento de distinção, como se saber a regência “correta” do verbo implicar implicasse em algum tipo de vantagem, de superioridade intelectual, de senha secreta para o ingresso num circulo de privilegiados.

Ou seja é necessário que se perceba a realidade de cada grupo sem preconceito ou distinção.

Na questão 8, a pergunta feita foi se no que diz respeito a leitura, concorda que os livros didáticos tem provocado um maior interesse dos alunos pela leitura, obtendo da professora Clarice a resposta “sim” e da professora Raquel a resposta “outros” com o comentário de que “as vezes sim, outras não”. Buscou-se estas respostas tendo em vista que, por tratar-se de uma língua muitas vezes estranha ao convívio familiar e social do aluno, que conhece outra realidade linguística poderia ser tratada com alguma resistência ao seu aprendizado pois sabe-se dos comentários que se faz a respeito da dificuldade de aprender português como afirma Bagno (2002, p. 19) ao comentar algumas ideias falaciosas sobre aprender português: “No caso brasileiro algumas dessas ideias são: ‘o português é uma das línguas mais difíceis do mundo’(grifos do autor). No entanto, pelas respostas dadas, no que se refere ao livro didático tem-se caminhado para uma melhor aceitação do estudo da língua portuguesa.

A questão 9 perguntava se o professor considera o fato de a gramática normativa se ater exclusivamente à língua padrão e não fazer esclarecimentos sobre as demais variações ser uma forma de preconceito? A professora Clarice afirmou que não e a professora Raquel respondeu outros comentando que “Há livros (gramáticas) que já fazem esse tipo de esclarecimento.” Dessa forma fica claro que, embora haja uma elite tendenciosa, que tenta se impor com ideias retrógradas “já é possível encontrar um grande número de exemplos de usos não normatizados [...]” Bagno (2009, p. 52) o que contribui para uma aceitação maior das demais variações linguísticas.

Na questão 10, procurou-se saber dos docentes a resposta a seguinte questão: “Sendo professor, portanto parte atuante na fomentação da cultura e do saber, sente-se parte atuante nas decisões relativas às melhorias da educação ou considera que tem sido mantido à margem dessas decisões”?

A professora Clarice respondeu que: “Não, como professora procuro atuar e ajudar os alunos no que for necessário.” E a professora Raquel respondeu que: “Considero-me ainda à margem dessas decisões”. Sendo assim, pelas respostas dadas percebe-se que, mais uma vez o discurso que se processa na educação em que o professor deveria ser chamado à discussão para dessa forma fomentar melhorias não ocorre ficando mais uma vez o discurso aquém das expectativas pois” cada época e cada grupo social têm seu repertório de formas de discurso na comunicação socioideológica.” Bakhtin (2010, p. 44), ou seja o discurso das elites e dos gestores da educação mantém os professores longe das decisões do qual deveriam fazer parte como indivíduos essenciais à melhoria da educação pública.

9. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A realização desta pesquisa demonstra que os alunos que frequentam o ensino público não advêm de famílias abastadas e nem de nível de escolaridade alto como ficou claro na questão 1, gráfico 1 e questão 2, gráfico 2, o que não propicia uma constante formalização linguística familiar recaindo, portanto a conversação em algo de somenos importância sendo suficiente somente a interação. O que se verifica é que a variação adquirida esta arraigada já no meio familiar não podendo a escola agir com preconceito linguístico com os alunos que a ela se achega por necessidade de aprender a língua padrão com o intuito de adquirir uma melhor condição social. Que há o preconceito e que ele esta presente nas escolas públicas fica caracterizada nas respostas fornecidas pelos discentes quando afirmam na questão 4, gráfico 4 que não veem relevância de investimentos na educação feita pelo governo. Ou seja, se o governo não investe é porque não julga necessária uma educação de qualidade nas escolas públicas discriminando estes alunos por julgá-los desnecessários ou um excesso que tão somente devem ser controlados. Esta questão envolve inclusive o fator discurso em que há um discurso pela qualidade na educação que não se consolida pois a educação de qualidade tão almejada nunca se concretiza.

Também de acordo com o gráfico 5 é possível perceber que há discriminação na escola pela forma de falar considerada errada dos alunos que se manifestam com outra variação linguística, pois 60% dos alunos afirmaram já ter sofrido tal discriminação o que denota o preconceito latente.

É necessário, portanto que se busque uma educação de qualidade no ensino público, pois se assim não fora estará o ensino sempre fadado ao fracasso, pois governo e as classes dominantes não chamam se quer os professores para uma discussão e melhoria do ensino como ficou caracterizada na resposta dos professores na questão 10. Não adianta, portanto, um discurso de qualidade quando os que ensinam são envolvidos em melhorias pontuais, mas não se investe na educação como um todo. Aí se encontra o preconceito e a marginalização da classe desfavorecida. Aí se dá o controle ideológico das classes dominantes sobre a massa desfavorecida que infestam as escolas públicas sem outra opção de busca de qualidade.

A importância desse trabalho se dá devido a constatação de que o preconceito existe e por trás deste preconceito se esconde o preconceito social manifestado em uma duplicidade de ações que desfavorece uma classe em virtude de outra e por meio dos discursos que se propagam diariamente essa discriminação muitas vezes passa sem ser percebida.

10. REFERÊNCIAS

BAGNO, Marcos. A norma oculta: língua e poder na sociedade brasileira. São Paulo: Parábola, 2003.

_________. Não é errado falar assim! em defesa do português brasileiro. São Paulo: Parábola, 2010.

_________. Português brasileiro? um convite à pesquisa. São Paulo: Parábola, 2002.

_________. Preconceito linguístico: o que é, como se faz. São Paulo: Loyola, 2003.

BAKHTIN, Mikhail. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 2010.

BRANDÃO, Helena H. Nagamine. Introdução à análise do discurso. Campinas, SP: Unicamp, 2004.

CAL VET, Louis-Jean. Sociolinguística: uma introdução crítica. São Paulo: Parábola, 2012.

CAMACHO, R. G. ALKMIN, T. Sociolingüística. In: MUSSALIM, Fernanda; BENTES, Anna Christina. Introdução à lingüística. 4.ed. São Paulo: Cortez, 2004, p. 21-76.

CARVALHO, Castelar de. Para compreender Saussure. Rio de Janeiro: Vozes, 2012.

CASTRO, Maria Lúcia de. Metodologia do ensino de língua portuguesa. Curitiba: Ibpex, 2007.

CERVO, Amado L.; Bervian Pedro A. Metodologia cientifica. São Paulo: Prentice Hall, 2004.

FIORIN, José Luiz. Elementos de análise do discurso. São Paulo: Contexto, 2006.

_________. Introdução à linguística. São Paulo: Contexto, 2007.

LEITE, Marli Quadros. Preconceito e intolerância na linguagem. São Paulo: Contexto, 2008.

LUFT, Celso Pedra. Língua e liberdade. São Paulo: Editora Ática, 2004.

MATTE, Ana Cristina Fricke (Org.). Língua (gem), texto, discurso entre a reflexão e a prática. Belo Horizonte-MG: Lucerna, 2007.

NICOLA, José de; INFANTE, Ulisses. Gramática contemporânea da língua portuguesa. São Paulo: Scipione, 1997.

ORLANDI, Eni Puccinelli. Análise de discurso: princípios e procedimentos. Campinas, SP: Pontes Editores, 2012.

PARAMETROS CURRICULARES NACIONAIS: ensino médio / Ministério da Educação, Secretaria de Educação Média e Tecnológica - Brasília: 2002.

V ANDIJK, Teun A. Discurso e poder. São Paulo: Contexto, 2008.

VOESE, Ingo. Análise do discurso e o ensino de língua portuguesa. São Paulo: Cortez, 2004.

11. ANEXO ATermo de Consentimento Livre-Esclarecimento


TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE-ESCLARECIMENTO

Título do Projeto: PRECONCEITO SOCIAL E LINGUÍSTICO NO ENSINO DA LÍNGUA MATERNA: Um Olhar Sociolinguístico e da Análise do Discurso

Pesquisador Responsável: Prof. Mestrando Fábio Pereira Couto

Pesquisador participante: Edson Victor Pereira da Rocha

Telefones para contato: 95115172

O objetivo desta pesquisa é analisar é verificar o preconceito linguístico nas escolas.

Para melhor compreensão e conhecimento sobre o preconceito linguístico dos alunos das escolas públicas, esta pesquisa necessita de uma vivência em um ambiente escolar que será desenvolvida na Escola Estadual do Novo Gama-GO. A pesquisa contará com questionamentos aplicáveis aos professores e alunos, Para uma melhor interação serão feitas. No decorrer desta pesquisa será aplicado questionários, elaboração de gráficos para melhor compreensão dos dados analisados.

Como pesquisador/educador tenho um compromisso com a formação do cidadão crítico, exigindo uma prática educacional voltada à compreensão da realidade social, dos direitos e das realidades em relação à sua vida pessoal e comunitária. Nesse sentido assumimos todos os riscos e benefícios que possam nos causar bem como aos sujeitos dessa pesquisa.

Dessa forma assumimos os riscos e compromissos de garantir o resguardo de informações pessoais e sigilosas e o uso de todos os tipos de registros fotográficas que possam ser usadas nessa pesquisa.

Brasília,____de_______________de 20__.

Pesquisador responsável.

___________________________________

Professor Mestrando Fábio Pereira Couto.

12. ANEXO BConsentimento da Participação da Pessoa como Sujeito


CONSENTIMENTO DA PARTICIPAÇÃO DA PESSOA COMO SUJEITO

Título do Projeto: PRECONCEITO SOCIAL E LINGUÍSTICO NO ENSINO DA LÍNGUA MATERNA: Um Olhar Sociolinguístico e da Análise do Discurso

Pesquisador Responsável: Prof. Mestrando Fábio Pereira Couto

Pesquisador participante: Edson Victor Pereira da Rocha

Telefones para contato: 95115172

Eu, _____________________________________, RG: _______________, abaixo assinado, concordo voluntariamente em participar do estudo acima descrito, como sujeito. Declaro ter sido devidamente informado e esclarecido pelo pesquisador ___________________________ sobre os objetivos da pesquisa, os procedimentos nela envolvidos, assim como os possíveis riscos e benefícios envolvidos na minha participação. Foi me dada à oportunidade de fazer perguntas e recebi telefones para entrar em contato, a cobrar, caso tenha dúvidas. Fui orientado para entrar em contato com a Coordenação e Direção da Faculdade Fortium (fone_______________), caso me sinta lesado ou prejudicado. Foi-me garantido que não sou obrigado a participar. Recebi uma cópia deste documento.

Brasília,____de________________de 20__.

_________________________________________

Presenciamos a solicitação de consentimento, esclarecimentos sobre a pesquisa e aceite do sujeito em participar.

Testemunhas:

Nome: ________________________________ Assinatura: _________________________

Nome: ________________________________ Assinatura: _________________________

13. APÊNDICE AQuestionário para Professores

Questionário para Professores

I- Da Identificação

Nome:

Idade:

Sexo: F [  ]      M [  ]

Formação:

Qual especialização possui?

Série (ano) que leciona em 2012?

Tempo de atuação como professor (a):

II- Das Perguntas

1- Além do livro didático costuma utilizar outro material para complementação e enriquecimento do ensino? Em caso afirmativo, qual(is)?

R:

2- Tem percebido no exercício da profissão de professor investimentos governamentais relevantes na área da educação?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

3- Verificando que no Brasil não é comum o ato da leitura de que forma tem incentivado seus alunos a adquirirem o gosto pela leitura?

R:

4- As demais variações linguísticas são comentadas em suas aulas?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

5- Os responsáveis pela educação (governo, gestores) têm possibilitado a renovação, aprimoramento e condições de especialização em sua área de atuação?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

6- Considera que houve uma abordagem mais social e realista das condições em que vive os alunos da escola pública nos pcns?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

7- Considera que as abordagens da língua padrão feitas no livro didático, atualmente, tem facilitado o aprendizado dos alunos?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

8- E no que diz respeito à leitura e a análise sintática concorda que os livros didáticos têm provocado um maior interesse dos alunos por essas atividades?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

9- Considera o fato de a gramática normativa se ater exclusivamente à língua padrão e não fazer esclarecimentos sobre as demais variações uma forma de preconceito?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

10- Sendo professor, portanto parte atuante na fomentação da cultura e do saber, sente-se parte atuante nas decisões relativas às melhorias da educação ou considera que tem sido mantido à margem dessas decisões?

R:

14. APÊNDICE BQuestionário para Alunos

Questionário para Aluno

Nome:

Idade:

Sexo : M [ ] F [ ]

1- Qual o nível de escolaridade do seu pai?

[ ] Analfabeto

[ ] Alfabetizado

[ ] Ensino fundamental completo

[ ] Ensino Médio

[ ] Ensino Médio incompleto

[ ] Ensino Superior incompleto

[ ] Ensino Superior completo

[ ] Outros

2- Qual o nível de escolaridade da sua mãe?

[ ] Analfabeto

[ ] Alfabetizado

[ ] Ensino fundamental completo

[ ] Ensino Médio

[ ] Ensino Médio incompleto

[ ] Ensino Superior incompleto

[ ] Ensino Superior completo

[ ] Outros

3- Você tem algum interesse em frequentar a disciplina de Língua Portuguesa na sua escola?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

4- Em sua opinião os investimentos feitos pelo Estado na educação são relevantes?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

5- Em algum momento já se sentiu discriminado pela forma de falar ou escrever?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

6- Ao ler os diversos textos que lhe são apresentados na escola tem facilidade em interpretá-los?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

7- Você concorda que o ensino público possui a mesma qualidade que o ensino particular?

[ ] sim

[ ] não

[ ] outros

Comentário:

8- Você concorda que para haver uma ascensão social é necessário que haja um bom domínio da língua portuguesa?

[ ] sim

[ ] não

Por quê?

9- Em sua opinião os métodos apresentados pelos professores para o ensino da língua portuguesa são suficientes para o seu aprendizado?

[ ] sim

[ ] não

Justifique sua resposta:

10- Os métodos propostos nos livros didáticos têm considerado a sua realidade social?

[ ] sim

[ ] não

Comentário:

11- Em sua opinião há preconceito no Brasil em relação a quem não fala a língua padrão?

[ ] sim

[ ] não

Justifique:

12- O que você entende por preconceito?

R:

13- Você ou alguém da sua família já sofreu algum tipo de preconceito em sala de aula?

R:

14- Você possui o hábito da leitura?

[ ] sim

[ ] não

[ ] Lê só os livros exigidos na escola

1 Nomes fictícios usados para preservar a identidade das professoras pesquisadas.


Publicado por: Edson Victor

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