O Processo de Descolonização Boliviano, ao nível de acesso ao Ensino Superior

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1. RESUMO

Os novos modelos de educação superior têm por finalidade reparar as injustiças históricas em relação aos grupos sociais excluídos e marginalizados pelos processos de colonização e neocolonização. Com base nesse cenário, propõe-se nesse projeto uma análise dos documentos institucionais da Universidad Andina Simón Bolívar (UASB), visando encontrar nesses documentos, indícios de adoção de novas formas de conhecimento e novas formas de autonomia do processo de geração do conhecimento científico local. Justifica-se, pela necessidade de estabelecer uma análise em torno dos processos de redemocratização dos países da América Latina, e assim retratar uma nova perspectiva social de natureza educativa.  Este projeto é parte integrante do programa de Iniciação Científica da Universidade Nove de Julho, vinculado à pesquisa mais ampla intitulada “Fundamentos e horizontes epistemológicos dos processos de internacionalização e inclusão da diversidade cultural e epistemológica ao nível da educação superior no Brasil e outros países da América Latina: Argentina, Brasil, Bolívia, Equador e Venezuela.”

PALAVRAS-CHAVE: Bolívia. Descolonização. Ensino Superior. Universalização.

2. INTRODUÇÃO

Durante séculos, a Bolívia se viu presa às amarras coloniais tais como os demais países da América Latina, amarras essas que lhes impuseram políticas das quais, muitas vezes, os levaram à pobreza e à falta de perspectivas de ascensão social e intelectual. Com o poder elitizado e os desmandos de uma classe cujos interesses sempre foram à manutenção de seus privilégios, esses países se viram sempre envoltos em condições de submissão aos interesses dos demais países hegemônicos, e inertes mediante a grande expansão neoliberal na América Latina. Os novos modelos de educação superior têm por finalidade reparar as injustiças históricas em relação aos grupos sociais excluídos e marginalizados pelos processos de colonização e neocolonização. Com o início do governo Morales, a Bolívia passou a adotar uma política de governo denominada de “política de descolonização” cujo foco central é romper com essas amarras que perduram por mais de cinco séculos, e propor um governo com mais participação dos movimentos sociais, rurais e indígenas.  A partir deste cenário a proposta desse projeto é analisar os documentos e levantar informações necessárias à elaboração de um panorama, acerca dos processos de inclusão da diversidade cultural e epistemológica, e uma análise geral, sobre como essa “descolonização” vem se desenvolvendo na educação superior boliviana (Objetivos, internacionalização, infraestruturas, políticas de acesso e inclusão e permanência).

Neste artigo temos como objetivos analisar os processos de descolonização do ensino superior na Bolívia, no tocante as propostas de inclusão da diversidade cultural e epistemológica e permanência dos estudantes. Identificar, a partir dos documentos (Projeto político pedagógico, Estatuto, Normas de funcionamento entre outros.) os mecanismos de acesso à educação superior na Universidad Andina Simóm Bolívar; Conhecer as estratégias utilizadas pela Universidad Andina Simón Bolívar para a inclusão da diversidade cultural e epistemológica; analisar a política da Universidade Andina Simón Bolívar relativamente aos processos de acesso, inclusão e permanência dos alunos. Analisar os documentos institucionais tendo em vista a compreensão dos processos de operacionalização dos princípios epistemológicos fundantes e das hegemonias e contra hegemonias em diálogo ou conflito.

Este trabalho se justifica, pela necessidade de estabelecer uma análise em torno dos processos de redemocratização dos países da América Latina, e assim retratar uma nova perspectiva social de natureza educativa, que emergiu no fim do século XX e início do XXI.  Este processo fomentou a inclusão de saberes populares e culturais, e assim tornou possível a inclusão e a manutenção das classes oprimidas pelas políticas neoliberais, a níveis de educação superior.    

Por primera vez en la história de Bolivia, podemos ver una serie de intelectuales indígenas, quechuas y aymaras, y también de la Amazonía, que están ejerciendo funciones de gobierno. Tradicionalmente, el desempeño de las actividades de gobierno, al menos durante los 180 años de vida republicana, fue un privilegio exclusivo de la casta mestizo criolla, blancoide, con muy raras excepciones; por supuesto que, alguna vez, hubo un ministro indígena, pero en cargos absolutamente marginales (como el de “asuntos campesinos”). Y es en el contexto actual en el que podemos ver indígenas en posiciones de mando, de alta responsabilidad, entre otros, em la Cancillería, en el Ministerio de Educación, en el de Justicia etc., y es a esto a lo que llamamos una política de igualdad de oportunidades. (SAAVEDRA, 2006, p.111).[2]

Mejía (2003), afirma que com a educação popular na América Latina abriu espaço e visibilidade política aos povos excluídos.  Neste sentido as políticas descolonizadoras em países como a Bolívia nos aguçam a tendência exploratória, rumo a uma análise de como essa nova realidade descolonizante rompe com as amarras coloniais e utilizam esses novos saberes para a inclusão social na Educação Superior. A “Invasão cultural” segundo Freire (1987), que por séculos reinou no contexto cultural latino-americano, inibiu a expansão cultural e social em prol de uma educação na qual se adotasse um paralelo com os saberes locais, e uma política emancipadora, que resgatasse a cultura nativa. As instituições educativas por anos se classificaram como agências formadoras de futuros “invasores”. O que somente com a conscientização neste sentido, vem tornando possíveis mudanças nesse cenário. Freire (1987) dizia que, “para que os oprimidos se unam entre si, é preciso que cortem o cordão umbilical ligados ao mundo de opressão.”

A liderança revolucionária, comprometida com as massas oprimidas, "tem um compromisso com a liberdade. E, precisamente porque o seu compromisso é com as massas oprimidas para que se libertem, não pode pretender conquistá-las, mas conseguir sua adesão para a libertação. (FREIRE, 1987, p.104) 

Tal mudança vem se desenhando desde os primórdios do século XXI, quando os governos latino-americanos de orientação popular e de esquerda com a pressão e o apoio dos movimentos sociais, chegaram ao poder nos principais países do eixo. A Bolívia desde 2006 tem vivenciado uma mudança no cenário antes submisso às políticas colonizadoras por mais de três séculos.  Segundo Saavedra (2006), ex-viceministro de Educação Superior da Bolívia, “o país vivencia um momento inédito, onde pela primeira vez na história se tem um presidente indígena (Evo Morales) em mais de dois séculos de vida republicana.”   

El reconocimiento constitucional de la diversidad democrática comunitaria rompe con el monopolio de la democracia liberal y plantea muchos desafíos de convivencia y contradicciones que deberán estudio del nuevo modelo de derecho constitucional boliviano difícilmente pueda ser adaptado a teorías generales abstractas. (PRONER, 2011, p.62)[3]  

Neste sentido as políticas descolonizadoras no âmbito da educação superior se deram na adoção de saberes locais aos instrumentos educativos;

A nivel de política educativa también se está gestando lo que se podría denominar la universalización de los saberes y conocimientos indígenas. Y aquí quiero hacer una aclaración: no solo se trata de incorporar o incluir contenidos indígenas en El currículo existente – esto es lo que ya intentó la reforma educativa neoliberal– sino más bien se trata de articular una propuesta curricular y una política educativa desde un horizonte indígena y eso cambia totalmente el asunto. (SAAVEDRA, 2006, p.111) [4]

Vargas (2007)[5], afirma que: “a descolonização é a construção contrária do que ocorre na colonização ela não é a receita de um intelectual brilhante mais a síntese da resistência política dos povos indígenas.” 

La descolonización es también, una forma táctica en la producción de conocimiento propio; una forma táctica en la forma de pensar y sentir, de hacer gestión publica en lo estatal desde la experiencia organizativa de nuestras organizaciones sociales y gobiernos indígenas (VARGAS, 2007) [6] 

Para Santos e Tavares (2016), “a diversidade cultural e sua inclusão em todos os graus de ensino e educação constitui uma fonte de criatividade e inovação, além de ser, obviamente, uma questão de direitos humanos.” E é sobre essa expectativa que as mudanças na educação boliviana devem ser analisadas. 

Cabe buscar modelos novos que estejam enraizados no local e no regional, sem exclusão do que se põe (ou se “vende”) como global, para que possam responder aos anseios e exigências das populações, não só para propor a solução de problemas imediatos da cidadania, mas para ensejar a preparação do futuro de outros territórios e de suas populações. (SANTOS; TAVARES, 2016, p.7).

Partindo destes pressupostos, é possível analisarmos os processos revolucionários que regem as mudanças no cenário latino-americano, e criar um panorama das políticas emancipadoras e descolonizadoras no âmbito da educação superior mais precisamente no Estado Plurinacional Boliviano. A metodologia adotada nesse projeto se dará a partir de um estudo bibliográfico e dos documentos institucionais da Universidade Andina Simón Bolívar. É, por isso, um estudo de natureza qualitativa. Nosso estudo se baseia nesta instituição, por ela pertencer a uma comunidade de países Andinos cuja visão principal é a construção de uma política de desenvolvimento mais equilibrada mediante a integração latino-americana através da chamada Comunidade Andina (CAN) composta por Bolívia, Colômbia, Equador e Peru. 

3. CARACTERIZAÇÃO DA INSTITUIÇÃO

A Universidad Andina Simón Bolívar (UASB) surgiu em meados dos anos 70 mais pela necessidade de estabelecer uma instituição de ensino superior que atendesse e estivesse expressamente a serviço dos países pertencentes ao Acordo de Cartagena[7]: Bolívia, Equador, Peru e Venezuela. A universidade surgiu das necessidades reais sentidas pelos povos e interpretadas pelos dirigentes de cada país com grande destaque para as suas origens históricas, sociais e culturais. A Universidad Andina Simón Bolívar (UASB) se caracteriza pela sua natureza interdisciplinar com seu enfoque e programas de ação baseados na autonomia, na liberdade e na descentralização de seu funcionamento acadêmico e sua visão multinacional. Sua sede permanente se encontra em Sucre na Bolívia, e possui sedes nacionais em Quito no Equador, uma sede local em La Paz, na Bolívia e escritórios em Lima, no Peru e Bogotá, na Colômbia.  De acordo com as informações constantes página da internet[8] da instituição, a Comunidade Andina (CAN) é composta por órgãos e instituições que se articulam no Sistema Andino de Integração, mais conhecida como a UPS. Este sistema faz com que o (CAN) funcione quase como faz um Estado. Isto é, cada um destes corpos tem o seu papel e as funções específicas, por exemplo: O Conselho Presidencial Andino, composto pelos presidentes da Bolívia, Colômbia, Equador e Peru, está a cargo da liderança política do (CAN). O Conselho Andino de Ministros das Relações Exteriores formula a política exterior dos países andinos em questões relacionadas com a integração e, se necessário, coordenar posições comuns em fóruns e negociações internacionais. A Comissão é composta por plenipotenciários ou delegados com plenos poderes, que é responsável pela formulação, implementação e avaliação das políticas de integração no comércio e investimento e gerar regras que são vinculativas para os quatro países. A (CAN) tem um Secretariado-Geral, que administra e coordena o processo de integração e do Tribunal Andino de Justiça é a entidade que controla a legalidade dos atos de todos os órgãos e instituições e invalida as disputas existentes entre os países, entre os cidadãos ou entre países e os cidadãos, quando os acordos alcançados no âmbito da Comunidade Andina não são cumpridos.  O Parlamento Andino, é composto por 20 deputados eleitos por voto popular (5 por cada país membro), é o órgão que representa o povo; cidadãos, ou seja, andinos em geral.  Eles também fazem parte das UPS órgãos consultivos da sociedade civil, como os povos indígenas, trabalhadores e empregadores. Assim a Universidad Andina Simon Bolívar (UASB), com vários locais na região, é a instituição de ensino oficial do bloco. Em seus documentos institucionais[9] é possível encontrar o discurso de internacionalização dos saberes com uma proposta de integração dos países Andinos a fim de criar uma projeção maior aos saberes e a cultura local dessa região, e criando assim um elo com outros saberes científicos.

(...) La Universidad Andina Simón Bolívar es una institución de derecho público internacional, creada por el Parlamento Andino. Forma parte del Sistema Andino de Integración y sus actividades cubren todos los países de la Comunidad Andina con proyección a otros sistemas de integración. (...).

(ESTATUTO UASB, 2008)[10]  

Um dos objetivos da UASB visa à atualização dos conhecimentos científicos originários da Comunidade Andina, a fim de adaptá-los aos conhecimentos de centros de excelência mundial. 

(...) Promover en la Comunidad Andina la actualización de conocimientos científicos y tecnológicos. Para este efecto, acopiar el conocimiento de frontera de centros de excelencia mundial para ser transferido a instituciones y universidades de la subregión y realizar el seguimiento sistemático y selectivo de temas de información de actualidad de acuerdo a sus requerimientos y necesidades; (...) (ESTATUTO UASB, 2008)[11] 

Estes pressupostos seguem as diretrizes constantes no documento Modelo Academico del Sistema de la Universidad Boliviana (BOLIVIA, 2011) produzido pelo COMITÉ EJECUTIVO DE LA UNIVERSIDAD BOLIVIANA, que diz:

En este contexto, la Universidad del Estado Plurinacional de Bolívia ratifica su compromiso de integración con la sociedad, constituyéndose en el motor del desarrollo productivo, económico y social, basado en sólidos cimientos de la investigación científica, el desarrollo tecnológico y la innovación. Todo ello con la finalidad de contribuir a la mejora de las condiciones de vida, calidad del desarrollo humano y el desarrollo sostenible, formulando un modelo académico viable, sostenible y medible en función a las características de la realidad nacional, regional y local. (BOLIVIA, 2011 p.17)[12]

Como parte integrante da (CAN) a UASB tem como objetivo ajudar a Comunidade Andina a promover um desenvolvimento equilibrado e harmonioso dos Países Membros em condições de equidade por meio da integração e da cooperação econômica e social. 

  • Acelerar o crescimento e trabalho de geração de emprego para as pessoas dos países membros. 
  • Facilitar a participação dos países membros no processo de integração regional, com vista à formação progressiva de um mercado comum latino-americano.
  • Reduzir a vulnerabilidade externa e melhorar a posição dos países membros no contexto econômico internacional.   
  • Reforçar a solidariedade sub-regional e reduzir as diferenças de desenvolvimento entre os países membros para buscar uma melhoria duradoura do nível de vida dos habitantes da sub-região.

4. O SISTEMA BOLIVIANO

Segundo Ostria e Vargas (2006), o acesso ao Ensino Superior boliviano é pouco seletivo seu acesso é livre para o calouro que tenha completado o nível médio da educação básica. 

(...) El sistema de Educación Superior boliviano es poco selectivo, el único requisito de ingreso es haber vencido el cuarto curso de secundaria en cualquiera de las modalidades del sistema educativo, con lo que se otorga el título de bachiller en humanidades; grado mínimo de escolarización que habilita para acceder a la Educación Superior universitaria. (...) (OSTRIA; VARGAS, 2006, p.47)[13]

Não existe um Exame Nacional de ingresso na Bolívia, somente um exame para bacharéis que não é condicionante ao acesso, mais sim um referencial de qualidade individual.

(...)No existe una prueba nacional de ingreso o Examen de Estado, y el Ministerio de Educación no interviene en este sentido. Simplemente, a partir de 1999 y de manera experimental toma una prueba nacional a bachilleres (Prueba de Aptitud Académica), cuyos resultados no son condicionantes para el ingreso a la Educación Superior, sino simplemente referenciales de la calidad de los bachilleres. (...) (OSTRIA; VARGAS, 2006, p.49)[14]

O sistema de acesso ao Ensino Superior público em geral pode ter quatro mecanismos: prova de suficiência acadêmica, ingresso por excelência, curso propedêutico e acesso livre.

(...) En el sector público, el marco general de modalidades de ingreso reconoce cuatro mecanismos: Prueba de suficiencia académica, curso propedéutico, ingreso por excelencia e ingreso libre. (...)La prueba de suficiencia académica consiste en una evaluación escrita que es diseñada y aplicada en forma diversa de acuerdo a los criterios de cada universidad y cada carrera.(...) El ingreso por excelencia se aplica de manera heterogénea en el sistema, en algunos casos se acepta el ingreso directo a un grupo de “mejores alumnos” de los bachilleres del año, o se define un promedio de calificaciones que el estudiante debe tener para acceder a la universidad por esta vía.(...) El curso propedéutico es un curso de complementación y refuerzo vigente en algunas unidades académicas, a los que acceden aquellos que no han aprobado la prueba de suficiencia académica y tiene una duración que va entre 3 y 6 meses. Para ingresar al primer nivel de la carrera a la que se postula es necesario aprobar dicho curso. Esta modalidad há ido perdiendo vigencia poco a poco, siendo la más aplicada la prueba de suficiencia académica. (...) El Ingreso libre se aplica en carreras de escasa demanda. Según informe de funcionarios del CEUB, esta se encuentra vigente únicamente en las carreras de filosofía de la UMSA y en la carrera de Ingeniería de minas en la UTO. (...) (OSTRIA; VARGAS, 2006, p.4748)

Segundo Weise e Laguna (2008) o índice de acesso ao Ensino Superior na Bolívia é muito alto, (estima-se que seja entre 75% e 80%), em 90 o acesso da faixa etária entre (17 a 24 anos) era de 12,68% já em 2007 essa taxa passou para 41% taxa superior à média da América Latina. Não se tem dados precisos sobre o tempo de conclusão dos cursos, mas calcula-se que mais de 50% que ingressam acaba por não concluir o curso.

(...) el acceso a la educación universitaria es la principal aspiración de los jóvenes y familias de los diferentes estratos sociales, por lo que la demanda de ingreso en ella es muy alta (estimado entre un 75 y un 80% del total de bachilleres). Sin duda esta situación, junto al crecimiento demográfico y el incremento de la cobertura escolar, explique por qué el porcentaje de estudiantes ha ido aumentando progresivamente, pese a la implementación de modalidades de ingreso. En 1990, la cobertura en relación al grupo de edad (17-24) era del 12,68%. Em 1992 ya alcanzaba el 13.72% y en el 2000 llegó al 20,51%. En el 2007 era de un 41%. Tasa de cobertura superior a la media latinoamericana, pese a que en Bolivia, en los niveles primario y secundario, la cobertura es muy inferior a la de los otros países de la región. El sistema público en el 2002 acogía a 197.120 estudiantes universitarios (76%) y a 74.286 (23,75%) el privado, haciendo un total de 312.769. El sistema boliviano se considera de tamaño medio y con un nivel bajo de privatización. (García Guadilla, 2002) No se cuenta con datos precisos sobre el tiempo promedio que toma um estudiante para graduarse, pero se calcula que más del 50% de los estudiantes que ingresan terminarían desertando. (World Bank; 1999, CEUB;1998 cit en Rodríguez y Weise,2007; CINDA, 2007) Se calcula asimismo, que el tiempo promedio de estudio – entre 4 y 10 años en los 80s y los 90s - ha disminuido en los últimos años, como consecuencia de la flexibilización de las modalidades de graduación y en algunos casos de los planes de estudio. (...) (WEISE; LAGUNA, 2008, p.7-8)[15]

Com base nesse cenário, a propósito de nosso trabalho será uma análise dos documentos institucionais da Universidad Andina Simón Bolívar (UASB), visando encontrar nesses documentos, indícios de adoção de novas formas de conhecimento e novas formas de autonomia do processo de geração do conhecimento científico local.  A política de descolonização boliviana propôs uma abertura aos saberes locais, possibilitando assim uma ênfase de democratização do conhecimento. Santos e Tavares (2016) afirmam que “A universidade constituir-se-á como popular se promover práticas de libertação dos povos e dos grupos sociais que foram historicamente invisibilizados e oprimidos. Mas será também popular na medida em que seja capaz de incorporar todos os saberes que foram submersos pelo saber”. É nesse princípio que pretendemos quando da conclusão deste trabalho, identificar na proposta da Instituição de Ensino Superior (IES) aqui pesquisada.

5. DA INCLUSÃO À UNIVERSALIZAÇÃO DO SABER

O acesso à universidade torna-se cada vez mais necessário, a fim de reparar uma ferida social imposta pelas classes hegemônicas, às classes historicamente excluídas. Resgatar a cidadania e instigar a auto-afirmação intelectual desses povos através da popularização dos saberes é o desafio a ser vivido nos nossos dias. Para Santos e Tavares (2016), a universidade constituir-se-á como popular se promover práticas de libertação dos povos e dos grupos sociais que foram historicamente invisibilizados e oprimidos.  Freire (1987) afirma que “quanto mais às massas populares desvelam a realidade objetiva e desafiadora sobre a qual elas devem incidir sua ação transformadora, tanto mais se “inserem” nela criticamente.” E nesta expectativa que a classes sociais menos favorecidas tendem a ascender nos espaços hegemônicos donde não tivera até outrora. A UASB, classifica-se em seus documentos como uma instituição de novo tipo centrada nos desafios do nosso século.

La Universidad Andina Simón Bolívar es una institución académica de nuevo tipo, creada con una perspectiva renovada para afrontar los desafíos que se presentan en el siglo XXI.  (UNIVERSIDAD ANDINA SIMÓN BOLÍVAR, 2015-2016, p.14)[16]

A integração dos conhecimentos produzidos pela cultura andina e a propagação deste conhecimento cultural com a América Latina e o mundo, encontra-se como meta da UASB, deixando claro o intuito de internacionalizar os saberes locais.

La Universidad es un centro académico destinado a la cooperación internacional. Eje fundamental de su trabajo es la reflexión sobre América Andina, su cultura, desarrollo científico y tecnológico, y su proceso de integración. Otro de sus objetivos es estudiar la experiencia andina en el pasado y el presente, y el papel de la Subregión en América Latina y el mundo. (UNIVERSIDAD ANDINA SIMÓN BOLÍVAR, 2015-2016, p.14)[17] 

Reconhecer os valores culturais a fim de integrá-los a universidade, propondo novas formas de propagação de saberes, é uma forma de reparar o mal causado a esses povos pelos paradigmas epistemológicos eurocêntricos que segundo Tavares (2013) oprimiu e silenciou todas as formas de conhecimento irredutíveis aos seus princípios e propósitos epistemológicos e ocultou uma interculturalidade que está na sua origem.  Abrir o diálogo com instituições acadêmicas da região Andina e de fora é uma das principais metas da UASB, em um mundo tão globalizado onde os saberes extrapolam as fronteiras nada mais adequado é a universalização dos saberes.

La Universidad ha privilegiado su relación con las demás universidades del espacio andino y con centros académicos de todo el mundo. Por ello há establecido vínculos con organismos internacionales, universidades e instituciones de cooperación. (UNIVERSIDAD ANDINA SIMÓN BOLÍVAR, 2015-2016, p.15-16) [18]

Santos e Tavares (2016) afirmam que a produção do conhecimento não é algo que possa realizar-se à margem desse novo contexto e dessa pluridiversidade de sujeitos e culturas.  A universidade é uma instituição hegemônica que por séculos serviu apenas para a reprodução da cultura dominante. Mudar o conceito desta instituição é romper com as práticas coloniais e conservadoras que ainda insistem em resistir às novas tendências de universalizar o saber.

6. CONSIDERAÇÔES FINAIS

Neste trabalho, retratamos um pouco as mudanças que as políticas bolivianas vêm realizando nos últimos anos, mais precisamente no âmbito da educação superior. As políticas de descolonização bolivianas criaram um fato inédito para o país: a abertura do cenário político e cultural aos povos originários indígenas e camponeses, povos estes que sempre foram vítimas das políticas colonizadoras e neocolonizadoras, impostas pelas classes hegemônicas por séculos em toda a América Latina. A ruptura com as políticas colonizadoras foi o primeiro passo que o país deu através de um referendo, que confirmou Evo Morales (o primeiro presidente indígena em mais de cinco séculos) como presidente boliviano. A partir de então em termos de educação, a nova política propôs uma pluridiversidade de saberes, possibilitando, assim, uma ênfase de democratização do conhecimento, e propôs uma universalização de conhecimentos, mesclando os saberes locais aos conhecimentos adquiridos através dos estudos das maiores universidades do mundo. Analisando todo esse processo é possível crer que a democratização dos cenários políticos, a universalização e a inclusão de povos por intermédio de saberes e culturas locais à universidade que, historicamente, é um lugar de manutenção do status colonizador e hegemônico, foi o primeiro passo para uma possível ruptura com as políticas hegemônicas.  Tal rompimento, embora muito longe de ocorrer por completo, devido há anos de exploração e às respectivas sequelas econômicas e culturais, que ainda fazem parte do dia a dia, constitui um enorme desafio a seguir.

7. REFERÊNCIAS

Educación Como Acción Cultural Para La Libertad. In: KOROL, Claudia. Caleidoscópios de Rebeldias. Buenos Aires, Ediciones America Libre, 2006

FREIRE, Paulo. Pedagogia do oprimido. 17. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1987

LEITE, George de Cerqueira. A guerra da identidade: raça e mestiçagem no pensamento latino-americano. São Paulo: FLACSO, 2009, p. 3.

MEJÍA, Marco Raúl. Transformação Social. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2003

OSTRIA, Gustavo Rodriguez, VARGAS, Crista Weise. Educacion Superior Universitaria en Bolivia: Estudio Nacional. Cochabamba: UNESCO, 2006.

PRONER, Carol (2011). El Estado Plurinacional y la nueva Constitución boliviana: contribuciones de la experiencia boliviana al debate de los límites al modelo democrático liberal. In: Crítica y emancipación: Revista latinoamericana de Ciencias Sociales, n. 6, p. 5164.

SAAVEDRA, José Luis. Horizontes y desafios de descolonizacíon en Bolívia. Comentário Internacional, 7, 2006, p 108-116. 

SANTOS Eduardo; TAVARES, Manuel. (2016). Desafios históricos da inclusão: Características institucionais de duas novas universidades federais brasileiras. Arquivos Analíticos de Políticas Educativas, 24(62). Disponível em: http://dx.doi.org/10.14507/epaa.v24.2260 Acesso em 06 set 2016.

TAVARES, Manuel. A Filosofia Andina 1: Uma interpelação ao pensamento ocidental. Colonialismo, colonialidade e descolonização para uma interdiversidade de saberes

(J. Estermann). EccoS Revista Científica, núm. 32, septiembre-diciembre, 2013, pp. 197-252.

UNIVERSIDAD ANDINA SÍMON BOLÍVAR, Missión y Visión. Disponível em: Acesso em: 02 set 2016. 

VARGAS, Idón M Chivi - Constitucionalismo: máscara del colonialismo. en Prensa Indígena, La Paz, 2007. Disponível em: Acesso em: 17out 2016.

WALLERSTEIN, I. 2007. O universalismo europeu: a retórica do poder. São Paulo, Boitempo, 141 p.

WHALSH, Catherine. Interculturalidad y (des)colonialidad: Perspectivas críticas y políticas. Visão Global, Joaçaba, v. 15, n. 1-2, 2012, p. 61-74.

Danilo José Noronha[1] 


[1] Especialista em Educação a Distância (UNIP) e em Formação de docentes para o Ensino Superior (UNINOVE). Licenciado em Ciências Sociais (UNINOVE) e em História pela (UNISA). É professor na Secretaria de Educação do Estado de São Paulo.

[2] Pela primeira vez na história da Bolívia, podemos ver uma série de intelectuais indígenas Quéchuas, Aymaras e da Amazônia, exercendo funções no governo. Tradicionalmente essas atividades ao longo desses 180 anos de vida republicana, era privilégio de uma casta de imigrantes brancas, salvo em raras exceções se teve um ministro indígena em cargos menores (como o de “assuntos camponeses”). É no contexto atual que podemos ver indígenas em posições de comando e de alta responsabilidade, como na chancelaria, no Ministério da Educação, da Justiça etc. É isto que chamamos de política de igualdade de oportunidades. (SAAVEDRA, 2006, p.111 tradução nossa).

[3] O reconhecimento constitucional da diversidade democratica comunitaria, rompe com o monopólio da democracia liberal e cria muitos desafios de convivência e contradições, que deverão estudar o novo modelo de direito constitucional boliviano o que dificilmente poderá ser adaptado a teorias gerais abstratas. (PRONER, 2011, p.62, tradução nossa.)

[4] No nível de política educacional, está se criando o que poderíamos chamar de universalização dos saberes e conhecimentos indígenas. Quero esclarecer que não se trata de incorporar ou incluir conteúdos indígenas ao currículo existente – isto é o que já se tentou na reforma educacional neoliberal – mas sim articular uma proposta curricular e uma política educacional desde um horizonte indígena, e isto muda totalmente o assunto. (SAAVEDRA, 2006, p.111 tradução nossa).

[5] Idón M Chivi Vargas, foi representante do governo Evo Morales na assembleia constituinte boliviana.

[6] A descolonização é também uma forma tática de conhecimento próprio. Uma forma tática de pensar, sentir e fazer gestão pública no estatal desde as experiências organizativas das nossas organizações sociais e governos indígenas (VARGAS, 2007 tradução nossa.)

[7] É o nome oficial do pacto que foi estabelecido em 1969 na cidade colombiana de Cartagena das Índias e que ficou conhecido como Pacto andino e que visava acelerar o desenvolvimento dos países membros através da integração econômica e social. Também é conhecido por Grupo Andino.

[8] http://lapaz.uasb.edu.bo/lauasbylacomunidadandina/ Acesso em 31ago 2016.

[9] ESTATUTO e NORMAS DE FUNCIONAMIENTO ACADÉMICO PARA PROGRAMAS DE MAESTRÍA, DIPLOMA SUPERIOR Y ESPECIALIZACIÓN SUPERIOR (BOLIVIA).

[10] (...) A Universidade Andina Simón Bolívar, é uma instituição de direito público internacional criada pelo Parlamento Andino. Faz parte do Sistema de Integração e suas atividades abrangem todos os países da Comunidade Andina e com projeção a outros sistemas de integração(...) (ESTATUTO UASB,2008 tradução nossa).

[11] (...)Promover na Comunidade Andina a atualização dos conhecimentos científicos e tecnológicos. Para tanto é necessário acoplar os conhecimentos de fronteiras de centros de excelencia mundial para ser transferido a instituições e universidades da sub-região e promover o segmento sistemático dos temas de informação atuais de acordo com seus requerimentos e necessidades. (...) (ESTATUTO, 2008 tradução nossa).

[12] Neste contexto, a Universidade do Estado Plurinacional da Bolívia ratifica seu compromisso de integração com a sociedade, constituindo-se no motor de desenvolvimento produtivo, econômico e social baseado em elementos sólidos da investigação cientifica e no desenvolvimento tecnológico e na inovação. Criando um elo com finalidade de contribuir com a melhora das condições de vida, qualidade de desenvolvimento humano com o desenvolvimento sustentável, na medida das funções características da realidade nacional, regional e local. (BOLÍVIA, 2011 tradução nossa).

[13] (...) o sistema de Educação Superior boliviano é pouco seletivo, o único requisito para o ingresso é ter concluído o curso secundário em qualquer uma das modalidades do sistema de ensino. com o que lhe garante a o título de bacharel em humanidades; graduação escolar mínima, que habilita o estudante a acender para a Educação Superior(...) (OSTRIA; VARGAS, 2006, P 47, tradução nossa).

[14] (...) não existe uma prova nacional de ingresso ou um Exame de Estado, nem o Ministério da Educação não intervém neste sentido. Simplesmente, a partir de 1999 e de maneira experimental ocorre uma prova nacional de bacharéis (Prova de Aptude Acadêmica), cujos resultados não são condicionantes para o ingresso na Educação Superior, sendo apenas um referencial de qualidade para os bacharéis, (...) (OSTRIA; VARGAS, 2006 p.49, tradução nossa).

[15] (...) No setor público, o marco geral de modalidades de ingresso reconhece quatro mecanismos: Prova de suficiência acadêmica, curso propedêutico, ingresso por excelência e ingresso livre. (...) A prova de suficiência acadêmica consiste em uma avaliação escrita que é elaborada e aplicada em forma diversa de acordo com os critérios de cada universidade e cada curso. (...)O ingresso por excelência se aplica de maneira heterogenia no sistema, em alguns casos é aceito o ingresso direto de um grupo de "melhores alunos" e dos bacharéis do ano, é definido uma média de classificação a qual o estudante deve ter para ascender à universidade por este modo. (...) O curso propedêutico é um curso de complementação e reforço vigente em algumas unidades acadêmicas, os que ascendem por essa via são aqueles que não são aprovados na prova de suficiência acadêmica e tem uma duração de 3 a 6 meses. Para ingressar no primeiro nível do curso, é necessária a aprovação deste curso. Esta modalidade está perdendo vigência pouco a pouco, sendo substituída pela prova de suficiência acadêmica. (...) O ingresso livre aplica-se em carreiras de pouca procura. Segundo informativo dos funcionários da CEUB, está se encontra vigente unicamente em carreiras de filosofia da UMSA e na carreira de engenharia de minas na UTO. (...) (OSTRIA; VARGAS, 2006, p.4748, tradução nossa).

[16] A Universidad Andina Simón Bolívar, é uma instituição acadêmica de novo tipo, criada com uma perspectiva renovada para enfrentar os desafios que se apresentam no século XXI. (UNIVERSIDAD ANDINA SIMÓN BOLÍVAR, 2015-2016, p.14 tradução nossa.)

[17] A universidade é um centro acadêmico destinado a cooperação internacional. O intuito fundamental de seu trabalho é reflexão sobre a América Andina, sua cultura, desenvolvimento científico e tecnológico assim como seu processo de integração. Outro objetivo seu, é estudar o papel da comunidade Andina com o passado, o presente e o papel da sub-região com a América Latina e o mundo. (UNIVERSIDAD ANDINA SIMÓN BOLÍVAR, 2015-2016, p.14 tradução nossa.)

[18] A universidade privilegia sua relação com as demais universidades do espaço Andino e com os centros acadêmicos de todo o mundo. Para tanto, estabeleceu-se vínculos com organismos internacionais e instituições para cooperação. (UNIVERSIDAD ANDINA SIMÓN BOLÍVAR, 20152016, p.15-16 tradução nossa.) 


Publicado por: Danilo Jose Noronha

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