ESCOTISMO E EDUCAÇÃO NÃO FORMAL: O Projeto Educativo do Movimento Escoteiro e a formação dos jovens.

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1. RESUMO

O Movimento Escoteiro, criado pelo Lord Baden-Powell em 1907 na Inglaterra, é um movimento de educação não-formal, cujo foco educativo está na educação integral e permanente dos seus membros, possibilitada pela autoeducação, pelo exemplo do adulto escotista e pelas experiências grupais. Nesta pesquisa, buscamos apresentar os aspectos do Método Escoteiro que por meio de um projeto educativo coloca em prática o “Programa Para Jovens”, pautado em um esquema de progressão que pretende desafiar crianças e adolescentes a tornarem-se autônomos, solidários e responsáveis. Todo esse aparato suscitou questionamentos a respeito do que é a educação, levando-nos a expô-la em sua face formal e não-formal. Na pesquisa, apresentamos uma comparação entre esses dois tipos de educação a fim de situar o escotismo no universo educativo e suas múltiplas possibilidades, dentre elas a educação informal, que, bem como os demais tipos citados, apresenta entrecruzamentos com a proposta do Movimento Escoteiro. Através da pesquisa de campo feita nas sedes de grupos escoteiros de Belo Horizonte-MG, motivamos os próprios praticantes do escotismo a realizarem o mesmo exercício nosso: comparar educação formal e não-formal, a partir de reflexões sobre o que o Movimento Escoteiro representa na vida desses jovens. Partimos da hipótese de que os escoteiros adquirem uma formação diferenciada, cujos efeitos positivos manifestam-se nas atitudes, no cognitivo e na socialização dessas pessoas, impactando inclusive as questões escolares. A abordagem explorativa da pesquisa foi possibilitada principalmente pela pesquisa bibliográfica, cujos pressupostos teóricos recorrentes foram os de J. Gimeno Sacristán, José Carlos Libâneo e Cipriano Luckesi, nas questões inerentes à educação formal; Maria da Glória Gohn e Valéria Aroeira Garcia enriqueceram nossa reflexão sobre a educação não-formal; Carlos Rodrigo Brandão auxiliou-nos a problematizar o que é a educação; e a bibliografia elaborada pela União dos Escoteiros do Brasil tornou possível o nosso objetivo de definir o que é o Método Educativo do Movimento Escoteiro.

Palavras-chave: Movimento Escoteiro. Educação não-formal. Educação formal.

2. INTRODUÇÃO

O presente trabalho inicialmente busca, por meio de referências bibliográficas, contextualizar historicamente o escotismo no mundo, no Brasil e em Minas Gerais, apresentando as condições que levaram Baden-Powell a criá-lo no início do século passado. Identificamos o evento que trouxe o Movimento para o Brasil e a relação estreita que o escotismo estabeleceu com a educação formal em Minas Gerais na década de 1920, com a inclusão da prática no programa de governo de Antonio Carlos, e no projeto pedagógico do tradicional centro de ensino Gymnásio Mineiro.

No capítulo dois, nos esforçamos para definir a educação formal por meio das peculiaridades da escola. A partir das categorias de análise: currículo, conteúdos, avaliação, relação professor-aluno, rituais, tecnologia, espaços-tempo e estrutura física ‒ eixos estruturais das instituições escolares; mas que também foram utilizados para entender a educação não-formal e o escotismo ‒ procuramos caracterizar a educação formal, ponderando para que as críticas dos especialistas lidos às limitações e à rigidez do sistema de ensino escolar, não transparecessem demasiadamente no texto, tendo em vista o nosso objetivo de conceituar este tipo de educação para compará-lo aos outros, e não de avaliá-lo.

Na terceira parte do texto demarcamos a posição da educação não-formal nas situações, relações e nos espaços que a conformam, esses, caracterizados pela sociabilidade e adaptação das propostas aos sujeitos educandos, e pela flexibilidade nos tempos e no currículo, voltados especialmente para a problematização e prática da cidadania. Diferentes teses de mestrado e de doutorado elaboradas na última década, abordando a educação não-formal, foram de grande importância para esta pesquisa, na medida em que nos apresentaram estudos de caso que permitiram-nos enxergar as ações da educação não-formal para além do escotismo.

Elaboramos um panorama comparativo entre os três modelos de educação: o escolar, o não-formal generalizado e o escotismo, para, posteriormente, voltar este panorama para alguns dos praticantes desse último: os pioneiros do Movimento Escoteiro. Estes jovens, durante a nossa pesquisa de campo e a partir da aplicação de questionários, exporam diferentes pontos de vista sobre as reais vivências experimentadas nos grupos escoteiros e a relação dessas com os conhecimentos escolares desses jovens.

3. O MOVIMENTO ESCOTEIRO: HISTÓRIA E CONCEITO

3.1. Um Breve Panorama Histórico

Fundado pelo general inglês Lord Robert Stephenson Smyth Baden-Powell (B.-P.) em 1907, o escotismo é descrito pela União dos Escoteiros do Brasil (UEB) como um “movimento mundial, educacional, voluntariado, apartidário, sem fins lucrativos. A sua proposta é o desenvolvimento do jovem, por meio de um sistema de valores e através da prática do trabalho em equipe” (2010).

Herói da guerra do Transvaal (Segunda Guerra Boêr) na África do Sul, B.-P., então tenente-general do Exército Britânico, viu que seu livro “Aids to Scouting” ‒ publicação de 1899, que continha dicas e técnicas de exploração para militares ‒ estava sendo usado como fonte de inspiração para atividades nas escolas londrinas.

B.-P. decide então realizar uma experiência com alguns jovens ingleses, reunindo rapazes de todas as classes e origens para viver uma aventura: dias de exploração e aprendizado na natureza. O Acampamento de Brownsea, onde ocorreu essa experiência, ficou conhecido como o primeiro acampamento de escoteiros da história1.

Após o acampamento, B.-P. começa a publicar, na forma de fascículos nos jornais, o que hoje é o livro “Escotismo Para Rapazes”, referência mundial na formação dos jovens e leitura esclarecedora para os estudiosos sobre o Movimento. Começam a surgir de forma espontânea tropas e patrulhas escoteiras por toda a Inglaterra, formadas por jovens que utilizavam os fascículos do Escotismo Para Rapazes como guia de suas atividades.

B.-P. aposenta-se do exército para se dedicar à construção da fraternidade escoteira, liderando escoteiros de todos os cantos do mundo unidos pelos mesmos princípios. O fundador do movimento visita vários países ajudando a estruturar as associações escoteiras nacionais disseminadas mundo afora.

3.2. O Escotismo no Brasil

Na época do Acampamento de Brownsea havia na Inglaterra oficiais da Marinha brasileira acompanhando a construção de navios de guerra. Estes oficiais tomaram conhecimento do movimento que estava surgindo e o trouxeram para o Brasil, foi no navio Encouraçado Minas Gerais que as primeiras notícias e uniformes para a prática do escotismo chegaram ao País.

Junto com esses oficiais da Marinha, encontravam-se também na Inglaterra pessoas a serviço do governo brasileiro, como Mario Sergio Cardim, um dos entusiastas da prática no Brasil. O mesmo teve a oportunidade de conhecer e estudar com B.-P. Retornando ao Brasil, Cardim se esforçou em implantar aqui o escotismo, tendo sido, inclusive, o responsável por, em 1914, iniciar o movimento para “crianças do escotismo feminino”, no estado de São Paulo. Este movimento deveria seguir caminho paralelo e independente ao Movimento Escoteiro do sexo masculino (SUFFERT, 2008, s/p). Em 1915, instalou-se em São Paulo a primeira “Escola de Chefes Escoteiras no Brasil”, que oferecia cursos como os de prendas domésticas, costura, cozinha, enfermagem, puericultura, educação física e manutenção do lar (Ibidem). A primeira demonstração externa das escoteiras, também no ano de 1914, ocorreu com uma quermesse promovida pela Cruz Vermelha Brasileira em benefício dos feridos e mutilados belgas e dos flagelados do nordeste. Toda esta movimentação em torno das ações do escotismo no Brasil fizeram com que o Movimento se expandisse em sintonia com os princípios estipulados por B.-P., cujo “dever para com o próximo” configura-se como um deles.

A União dos Escoteiros do Brasil (UEB) ‒ órgão regulador do escotismo nacional ‒ reconhece como data oficial do início das atividades do Movimento no País o dia 29 de novembro de 1914, quando foi instituída a Associação Brasileira de Escoteiros (ABE), com sede em São Paulo (UEB, s/d, s/p).

Entre 1910 e 1924 o escotismo expandiu-se por quase todo território nacional. Neste período, diversificou o público, admitindo também membros do sexo feminino e incrementando suas bases com diferentes modalidades, já estabelecidas internacionalmente.

As aspirações do escotismo foram apropriadas por diferentes instituições no Brasil, dentre elas as entidades religiosas, como a que em 15 de novembro de 1917, por iniciativa do Monsenhor André Arcoverde, criou a primeira tropa de Escoteiros Católicos do Brasil (Ibidem). Dois congressos realizados nos anos de 1922 e 1923 no Rio de Janeiro, pela Associação de Escoteiros Católicos do Brasil, são considerados, pela Associação, como o 1° e o 2° desse tipo no País.

O primeiro estatuto da UEB foi aprovado em dezembro de 1924 e previa que o presidente da entidade fosse indicado pelo Presidente da República, à época, Artur Bernardes (1922-1926), que nomeou o ministro da justiça, Affonso Penna Júnior, para o posto. Em 1928, atendendo a um apelo por escrito de Baden-Powell, a Associação Brasileira de Escoteiros se integrou à UEB, conformando uma unidade nacional em prol do escotismo no País (SUFFERT, 2008, s/p).

A extensão da atuação da UEB País afora consolidou-se na década de 1950, a partir de mudanças estruturais e administrativas, incluindo a primeira reratificação do estatuto da entidade em 1928 e a alteração da sede do Rio de Janeiro para a atual, em Curitiba, no ano de 1997.

3.2.1. Números Atuais no Brasil e no Mundo

De acordo com o Relatório Anual 2014 (UEB, 2015) o efetivo associado à União dos Escoteiros do Brasil é de 77.741 membros, sendo 25% deles adultos e 75% jovens de 7 a 21 anos. O Escotismo está presente em todos os estados da federação brasileira. No mundo, são mais de 40 milhões de escoteiros, distribuídos por 216 países e territórios.

3.3. O Escotismo em Minas Gerais

O mestre em história pela UFMG, Adalson de Oliveira Nascimento, teve o seu artigo “Educação e civismo: Movimento Escoteiro em Minas Gerais ‒ 1926-1930”, publicado em 2004 na Revista Brasileira de História da Educação. Nele, o autor traz informações importantes a respeito da consolidação do escotismo no estado mineiro, no início do século XX. De acordo com Nascimento (2004), a prática do escotismo em grupos organizados surgiu a partir da segunda metade da década de 1920. No entanto, em 2014, os mineiros comemoraram o centenário do Movimento, ou seja, havia no Estado adeptos do escotismo mesmo antes do reconhecimento por parte da Federação Mineira de Escoteiros (FME), filiada à UEB. O centenário do escotismo em Minas Gerais celebrou a criação do primeiro grupo, em 1914, sendo a data lembrada em cerimônia comemorativa na Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais. O site do órgão, cobrindo o evento, referencia a história Movimento em Minas:

A título de conhecimento histórico, o escotismo se iniciou em terras mineiras com a pró-atividade do professor, literato, deputado e membro da Academia Mineira de Letras, Olímpio de Araújo, que, incentivado por seu companheiro, o escritor Olavo Bilac, fundou, em 23 de dezembro de 1914, na sua pequena cidade natal de Rio Novo, na Zona da Mata, o Grêmio de Bandeirantes Mineiros. Bandeirantes foi sua opção ao traduzir scouts - escoteiros -, embasado não apenas na origem da palavra, mas no seu significado prático, em analogia às atividades de exploração das estradas e bandeiras que delimitam o nosso Brasil (ALMG, 2014).

Em 1926, ao assumir o governo de Minas Gerais, o governador Antônio Carlos Andrada dedicou esforços para difundir o escotismo no Estado:

Graças à reforma educacional proposta por Francisco Luiz Campos, secretário do interior responsável pela área da educação do governo de Antônio Carlos, o escotismo foi reconhecido em toda Minas Gerais a partir de 1920. Campos reformou o ensino público mineiro e determinou a criação de grupos escoteiros vinculados aos grupos escolares, destinados à difusão do escotismo através da participação dos alunos matriculados nas escolas. Durante o governo de Antônio Carlos o escotismo se fortaleceu não apenas em Belo Horizonte, mas em toda Minas Gerais (NASCIMENTO, 2004, p. 30).

Nascimento (Ibidem) apurou que o escotismo fazia parte da plataforma de governo de Antônio Carlos. Ainda como candidato, o governador eleito fazia discursos de apologia ao Movimento. Num trecho da revista Anaúê, publicada em 1928, citada por Nascimento (2004, p. 30), um desses discursos foi transcrito. Ele data de 1926, quando o governador afirmou que “Pela instituição do escoteirismo tenho a mais decidida sympathia, convencido de que nela se encontra o complemento natural e a cooperação eficaz para a obra da escola primaria” (Ibidem). A reforma educacional do governo de Antonia Carlos, levada a cabo por Francisco Campos, aprovava o regulamento do ensino primário, que previa em seu Art. 94:

“A Inspectoria da educação physica terá por fim: [...]

h) incentivar e orientar a organização do escoteirismo nas escolas publicas, formando e preparando o necessário corpo de instructores”.

[Das instituições escolares e das instituições complementares da escola] VI – determina a criação de “instituições escolares complementares da escola”, sendo o escotismo uma destas instituições.

Art. 207 – será instituído entre os alumnos das escolas primarias, com caracter facultativo e como instrumento de educação physica, moral e cívica, o pequeno escoteirismo.

Parag. 1º – a instrucção será ministrada por instructores escoteiros, fóra dos dias de funccionamento escolar, de accordo com as instrucções organizadas pela inspectoria de educação physica (NASCIMENTO, 2004, p. 59).

A reforma Francisco Campos “contribuiu para que verbas do governo fossem destinadas ao Movimento Escoteiro”. Segundo Nascimento (2004), para custear as despesas advindas do apoio governamental à expansão da prática em Minas Gerais:

O governo de Antônio Carlos previu em seu primeiro ano de mandato uma verba destinada a subvenção do escotismo [...] que fixou a despesa e orçou a receita para o exercício de 1928, garantindo o auxílio ao escoteirismo no valor de 100:000$000 (cem contos de réis) (NASCIMENTO, 2004, p.60).

Nascimento (2004) afirma que “nas escolas estaduais mineiras, a princípio, somente os meninos participavam das atividades escoteiras. O sucesso do movimento levou à criação de grupos femininos, em julho de 1927”.

O autor identificou que a partir de 1929 houve uma desmobilização das tropas escoteiras em Belo Horizonte:

Já nos primeiros anos da década de 1930, não mais existiam os grupos de escoteiros vinculados aos grupos escolares esse processo de enfraquecimento do movimento foi gradual e acredito ter relação com dois fatores: o decréscimo do apoio dado pelo governo de Antônio Carlos Andrada e, em 1930, a ascensão de Olegário Maciel, novo governador de Minas, que não previa em seu programa um incentivo tão grande ao escotismo como o dado por Andrada. Em setembro de 1930, o governo de Antônio Carlos chega ao fim e com ele esta “era” de desenvolvimento e apoio ao escotismo. (NASCIMENTO, 2004, p.67).

O artigo de Nascimento conclui que com o fim dos grupos escoteiros atrelados às instituições de ensino regular surgiram outros, independentes. Esses, não contavam com os aportes financeiros de órgãos públicos. Para o autor, “O impulso dado ao escotismo durante a presidência de Antônio Carlos foi essencial”, ele entende que a partir da reforma Francisco Campos em Minas, a escola de B.-P. se tornou conhecida em todo o Estado.

3.4. O Escotismo em Belo Horizonte

No mesmo artigo, Nascimento (2004) afirma que o escotismo chegou a Belo Horizonte (BH) através do Gymnásio Mineiro ‒ instituição educativa constituída por um externato em BH e um internato em Barbacena. Na capital mineira, foi criado em 30 de maio de 1926 o grupo escoteiro previsto no regulamento do próprio Gymnásio, ou seja, a prática do escotismo fazia parte do projeto pedagógico desta escola regular belorinzontina. A criação do grupo escoteiro dentro desta escola ocorreu sob a orientação do professor de educação física Antônio Pereira da Silva, o chefe Pereira2. Em 1926, foi fundada, por iniciativa do professor Antonio Pereira, um grupo de escoteiros populares, independente do Gymnásio Mineiro, o que levando-nos inferir que esse grupo foi um dos primeiros nos moldes como os conhecemos atualmente.

3.5. Missão, Visão e Princípios

O projeto educativo do Movimento Escoteiro é todo estruturado. Este sistema tem como preceitos teóricos ‒ que servem para dar suporte à formação dos jovens e para justificar as ações difundidas multinacionalmente há mais de um século ‒ uma missão, uma visão e uma tríade de princípios, cujas noções nortearão esta pesquisa. Por enquanto, apresentaremos os aspectos gerais da essência do escotismo:

Missão: “contribuir para a educação do jovem através de um sistema de valores baseados na Promessa e na Lei Escoteira e contribuir com a construção de um mundo melhor, valorizando a realização individual e a participação construtiva em sociedade” (UEB, s/d, s/p).

Visão: o Movimento Escoteiro é um movimento global que produz uma real contribuição na criação de um mundo melhor (Ibidem).

Os três princípios estão sintetizados no quadro seguinte:

Princípios Escoteiros

Relação com Deus →

Espiritualidade →

Crenças pessoais

Relação com o próximo →

Cidadania →

Vida em sociedade e respeito ao meio ambiente

Relação consigo mesmo →

Autonomia →

Liberdade e responsabilidade

Quadro 1: Princípios escoteiros

Fonte: UEB

3.6. Linha do Tempo

Voltamos o nosso panorama sobre o escotismo no Brasil e no mundo para as datas que situam alguns dos marcos históricos do ME desde o seu princípio. Vejamos:

Quadro 2: Linha do tempo (UEB)

4. A EDUCAÇÃO FORMAL

4.1. Os Conceitos

Esta pesquisa tem como um dos objetivos específicos caracterizar os aspectos gerais da educação escolar, para com isso conceituar o que é a educação formal, tipo de educação cuja escola é a principal representante. O interesse pelos aspectos componentes da educação escolar se dá porque, ao elegermos o Método Educativo do Movimento Escoteiro (exemplo de educação não-formal) como nosso objeto de pesquisa, queremos comparar os dois tipos de educação: a formal e a não-formal. Para entender a educação formal, recorremos bastante às obras de José Carlos Libâneo (2002a, 2002b, 2011) que descrevem e analisam o sistema educacional brasileiro, com destaque para a escola pública, a pedagogia, os professores e os saberes escolares. Em seu livro “Pedagogia e pedagogos, para quê?” (2002), o autor define a educação formal:

Formal refere-se a tudo o que implica uma forma, isto é, algo inteligível, estruturado, o modo como algo se configura. Educação Formal seria, pois, aquela estruturada, organizada, planejada intencionalmente, sistemática. Nesse sentido, a educação escolar convencional é tipicamente formal. Mas isso não significa dizer que não ocorra educação formal em outros tipos de educação intencional (vamos chamá-las de não-convencionais) (LIBÂNEO, 2002, p. 88).

Após expandir o caráter de formalidade para outros ambientes além da escola, Libâneo explica o seu ponto de vista:

É preciso ver as modalidades de educação informal, não-formal e formal, em sua interpenetração. A escola não pode eximir-se de seus vínculos com a educação informal e não formal; por outro lado, uma postura consciente, criativa e crítica ante os mecanismos da educação informal e não-formal depende, cada vez mais, dos suportes da escolarização (Ibidem, p. 89).

Este intercâmbio entre as três modalidades de educação precisa ocorrer porque o sujeito ao qual elas são destinadas não é apenas aluno, mas participante de várias esferas da vida social (LIBÂNEO, 2002, p. 95).

A escola é descrita por Saviani (2007) como sendo, na contemporaneidade, a “forma principal e dominante de educação”. O autor também coloca a escola como o “parâmetro e referência para aferir todas as demais formas de educação”. Silva (2003) a define como o “lócus privilegiado da educação” (p. 28); além disso, é também o “lugar de produção de saberes científicos e não científicos” (LIBÂNEO, 2002, p. 11); sendo que as suas características se confundem com as da educação formal como um todo, pois ambas apresentam: objetivos explícitos, conteúdos predeterminados, métodos de ensino e procedimentos didáticos planejados sistematicamente.

Dentre os objetivos da escolarização, destacam-se: “a dedicação a aspectos acadêmicos; direta ou indiretamente a preparação para o desempenho de uma atividade profissional e a atenção aos aspectos de educação moral, cívica e social” (SACRISTÁN, 2000, p. 126), além da formação de capacidades intelectuais por meio dos conteúdos. Segundo Libâneo, um objetivo primordial desta instituição é o “ensino e a aprendizagem, que se cumprem pelas atividades pedagógicas, curriculares e docentes” (2011, p. 11). Para que todas estas expectativas se realizem, Saviani destaca a atuação dos “diferentes setores que participam mais diretamente na educação [professores/as, pais e alunos/as]” (2007, p. 126).

Diante dos objetivos expostos, espera-se da pessoa escolarizada competências que lhe auxiliarão na convivência e sobrevivência nas sociedades contemporâneas: “autonomia para buscar informações, receber instruções, compreender e produzir comunicação escrita de certa complexidade, conseguir melhores empregos, usufruir de benefícios culturais, participar da vida política, etc.” (LIBÂNEO, 2011, p. 5). Estas exigências fazem com que a escolarização seja vista como o elemento que “contribui para definir a cultura de um povo e condiciona o seu futuro econômico” (SACRISTÁN, 2000, p. 247).

Assim como Libâneo (2002, p. 20), reconhecemos que a instituição escolar não possui exclusividade na formação integral dos indivíduos, contudo, o autor nos lembra sobre a importância do domínio dos conteúdos escolares por parte das crianças, jovens e adultos para atender a “uma necessidade social”, pois, “há um nível de desempenho escolar e social imposto pela sociedade presente”, que reclama o tratamento de questões inerentes à educação social, moral, estética, sanitária, ambiental e para cidadania, cujo responsável pela transmissão é a escola, em parceria com as ações desempenhadas pela educação não-formal.

A custódia de crianças e jovens, os ciclos de escolarização (como alternativa à seriação), a escola de tempo integral, a progressão continuada, o afrouxamento da avaliação da aprendizagem e a integração de alunos com necessidades especiais em classes do ensino regular, são as adaptações pelas quais a escola pública tem se submetido nos últimos vinte anos para atender a algumas das atuais necessidades sociais (LIBÂNEO, 2002, 2011).

É importante explicitarmos que as definições e conceitos que já foram expostos e que surgirão neste trabalho têm como referência a escola pública, pois a maioria das obras lidas analisa a escola a partir deste tipo de instituição. A sua hegemonia no Brasil em relação às demais instituições de educação formal é justificada por Libâneo assim: “há muitas razões para sustentar a causa da escola pública. A principal delas é que a escolarização é um direito inalienável da pessoa humana, e assegurá-lo é responsabilidade do estado e da sociedade” (2011, p. 11).

4.2. O Currículo

Um dos componentes da educação escolar ― o currículo ― normalmente é descrito como um detonador de disputa de poderes: o que a escola ensinará? O que a escola não ensinará? Sacristán (2000, p. 167) questiona se existem fórmulas técnicas que determinem o que será transmitido pela escola, e chega à conclusão que “as decisões básicas que se tomam no currículo são, fundamentalmente, sociais e morais com um significado político: que cultura dar e a quem distribuí-la”. Para o autor, o currículo traduz, através dos conteúdos de ensino, a filosofia pedagógica de uma escola e contribui para formatá-la tal como a conhecemos hoje:

O fato de que o sistema escolar tenha se criado e expandido enquanto esteve vigente a ideia de que o currículo deveria estar composto pelo saber parcializado em disciplinas, teve sua influência não só no que se selecionou como saber essencial, mas também nas práticas, nas estruturas organizativas e na mentalidade dos professores/as (SACRISTÁN, 2000, p. 170-185).

O autor da citação acima chama a atenção para a amplitude variável do significado de currículo e para a conexão desse com o projeto educativo proposto pelas instituições escolares:

Se por currículo se entende um projeto global e integral de cultura e de educação, no qual se deve observar não apenas objetivos relacionados com conteúdos de matérias escolares, mas também outros que são comuns a todas elas ou que ficam à margem das mesmas, o conceito de projeto educativo é a mesma coisa que projeto curricular para a escola. Diferenciar ambos suporia dar ao currículo a concepção restrita que o torna equivalente a compêndio-resumo de matérias ou de conteúdos de conhecimento. Significaria manter uma separação artificial entre ensino e educação (Ibidem, p. 245).

Em seu aspecto normativo, o currículo tem nos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCNs) ‒ publicados entre 1997 e 1998 ‒ “um referencial de qualidade para a educação básica brasileira”, definição cunhada pelo Ministério da Educação3 (MEC). Um dos objetivos postos quando da elaboração desses documentos foi “socializar discussões, pesquisas e recomendações sobre a produção pedagógica”, a fim de consolidar e ampliar “o dever do poder público para com a educação em geral” (BRASIL, 1997, p. 14). O MEC justifica que os parâmetros não configuram um “modelo curricular homogêneo e impositivo”, pois permiti aos sistemas de ensino regionais diretrizes curriculares próprias (Ibidem, p. 13). Os PCNs se integram em um sistema normativo cujo um dos marcos legais é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, Lei nº 9.394/96 (LDB):

Vê-se no art. 22 dessa lei que a educação básica, deve assegurar a todos a formação comum indispensável para o exercício da cidadania [...] reforçando a necessidade de se propiciar a todos a formação básica comum, o que pressupõe a formulação de um conjunto de diretrizes capaz de nortear os currículos e seus conteúdos mínimos, incumbência que, nos termos do art. 9o, inciso IV, é remetida para a União. Para dar conta desse amplo objetivo, a LDB consolida a organização curricular, reafirmando desse modo o princípio da base nacional comum (Parâmetros Curriculares Nacionais) (BRASIL, 1997, p. 14).

No processo de elaboração dos PCNs foram considerados aspectos múltiplos da educação difundida através da escola, englobando campos conceituais que a definem, tais como: a relação entre educação e cidadania; o problema do analfabetismo; o desempenho de alunos nas avaliações sistêmicas; a formação dos professores; as concepções sobre a fase da adolescência e juventude; a influência da mídia e as potencialidades educacionais dos meios eletrônicos; dentre outros componentes de um currículo escolar.

4.2.1. As Disciplinas

Trazemos agora a discussão para um dos componentes do currículo: as disciplinas, os conteúdos de ensino. Ao que eles correspondem na educação formal? Gómez (2000, p. 170) responde que: “quanto aos conteúdos do currículo, o ensino será pensado como uma oferta cultural válida para todos, a base de uma cultura geral da qual todos possam tirar proveito”. Essa cultura geral válida para todas as pessoas escolarizadas abrange: a leitura e sua interpretação, a escrita legível, o domínio das operações matemáticas, dentre outras habilidades, atitudes e competências que atendem à boa parte das nossas necessidades intelectuais e sociais.

Pensando sobre como se dá a seleção dos conteúdos escolares – o porquê ensinar o que se ensina, deixando de lado muitas outras coisas, Gómez e Sacristán (2000, p. 124) observaram que na educação formal, esta seleção pode dar mais peso a fatores que deveriam ser secundários, em detrimento de aspectos também importantes para o processo de aprendizagem, tais como a criatividade, a ludicidade e os interesses dos aprendizes:

É muito comum que a literatura, a arte, a música, o esporte, a ciência, a tecnologia, a história, o conhecimento do meio, os problemas sociais, o pensamento em geral, o cinema, o mundo do trabalho, todos os temas candentes de atualidade e até a simples leitura recreativa e interessante fiquem fora da cultura curricular enlatada em matérias, livros-texto, classes, cadernos de trabalho dados por professores/as para se avaliar depois (SACRISTÁN, 2000, p. 249).

Um aspecto que impacta diretamente no percurso que os conteúdos escolares fazem entre o currículo legitimado pelos mecanismos de gerência da educação (MEC, secretarias e conselhos regionais de ensino e PPP escolar) até o caderno dos alunos, é a maneira como os educadores ensinam. O caráter não neutro na abordagem do conhecimento sistematizado, a correção ideológica, a filtragem intencional ou inconsciente dos conteúdos feita pelo professor, configura-se um fator decisivo para o processo de ensino-aprendizagem, onde trabalho docente, concepções pedagógicas múltiplas e interações humanas influenciam os conteúdos trabalhados na escola:

Um professor, em plena ação com seus alunos em sala de aula, elabora estratégias e esquemas cognitivos, simbólicos, que o ajudam a transformar a matéria em função de condicionantes como o tempo, o programa, o projeto pedagógico da escola, a velocidade de assimilação dos alunos, os limites impostos pela avaliação, a motivação dos alunos, etc. (...) Conhecer bem a matéria que se deve ensinar é apenas uma condição necessária, e não uma condição suficiente, do trabalho pedagógico. Noutras palavras, o conteúdo ensinado em sala de aula nunca é transmitido simplesmente tal e qual: ele é “interatuado”, transformado, ou seja, encenado para um público, adaptado, selecionado em função da compreensão do grupo de alunos (TARDIF, 2002, p. 120).

Em sua função de estabelecer parâmetros conteudistas comuns às instituições da educação básica brasileira, os PCNs indicam: “Em linha de síntese, pode-se afirmar que o currículo, tanto para o ensino fundamental quanto para o ensino médio, deve obrigatoriamente propiciar oportunidades para o estudo da língua portuguesa, da matemática, do mundo físico e natural e da realidade social e política [especialmente a brasileira]” (BRASIL, 1997, p. 14). Os conteúdos de Artes e Educação Física também são áreas curriculares obrigatórias, bem como o de uma língua estrangeira moderna, a partir da quinta série do ensino fundamental (LDB, art. 26, § 5o). O ensino religioso, de matrícula facultativa, constitui disciplina dos horários normais das escolas públicas de ensino fundamental (LEI FEDERAL nº 9.394/96, art. 33).

Os Parâmetros estabelecem também que os currículos contemplarão os chamados “temas transversais” ao longo da educação básica, são eles: ética, meio ambiente e saúde, pluralidade cultural, orientação sexual, trabalho e consumo.

Para orientar os sistemas de ensino na elaboração dos currículos, os PCNs (BRASIL, 1997) proporam três pesos a serem observados na sistematização dos conteúdos: a natureza conceitual destes, que “envolve a abordagem de conceitos”; a procedimental, ou seja, o “como fazer”; e os conteúdos de natureza atitudinal, que “incluem normas, valores e atitudes, que permeiam todo o conhecimento escolar” (Ibidem).

4.3. Os Rituais

“O meio em que se vive é mensagem educativa”. Esta frase de Sacristán (2000, p. 250), escrita quando ele analisou a escola como fonte de experiências educativas proporcionadas pelos seus ambientes, espaços, tempos, mensagens e projetos, servem para ajudar-nos a entender o alcance dos rituais da escola. Vejamos como o autor analisa esta dinâmica:

As escolas, como organizações, definem um ethos de conduta nas mais variadas facetas do comportamento: como se comportar fisicamente, uso da linguagem, hábitos de limpeza, utilização das instalações e materiais, opção-obrigatoriedade de determinadas atividades, normas de comportamento social com diretores, professores/as e companheiros, relações entre sexos, com minorias étnicas ou religiosas, regulação das saídas ao exterior e comunicação com o mundo externo, tempos de folga e de trabalho, ponderação desigual de diferentes momentos do dia, a semana, etc. (SACRISTÁN, 2000, p. 250).

Nem sempre é perceptível para a comunidade escolar – alunos, famílias, vizinhos do entorno das instituições, profissionais da educação, dentre outros agentes – o poder pedagógico implícito neste ambiente e nas relações que decorrem dele: a escolha das palavras para estabelecer diálogo com as famílias; as placas de trânsito exclusivas para as ruas paralelas às instituições; as celebrações de formaturas; a subordinação aos órgãos oficiais de ensino, enfim, uma dinâmica dentro e fora da escola, que educa e regula a convivência. Especialmente dentro das instituições, esses rituais de convivência estabelecem parâmetros não oficiais, numa rotina passível de ser mascarada por ela própria. Pereira (1967) percebeu isso:

Funções do mesmo tipo das desempenhadas pelas atividades docentes são também realizadas na área escolar por agências não escolares e pelas relações interpessoais dos membros do corpo docente-administrativo com os alunos e demais moradores. Ressaltemos, ainda, que nem todas as funções consequentes da transmissão cultural efetuada pelos professores são reconhecidas por eles. Nesse sentido, não caberia considerar a escola como uma agência de socialização inteiramente formal, pois muitas das suas influências socializadoras não resultam de uma ação intencional do pessoal docente administrativo (PEREIRA, 1967, p. 132).

O ambiente escolar possibilita aos alunos a convivência com uma diversidade de adultos cujas posturas serão apreendidas pelos mais jovens como exemplos. Nem sempre os agentes escolares captarão as oportunidades de inspirar uma criança ou um adolescente através da sua função na escola. Esta passividade dos trabalhadores escolares ocorre quando suas práticas se convertem em rituais:

Na verdade, este [equipe docente e administrativa] tende a perceber apenas a função endoculturativa4 [da escola], valorizando-a como um fim em si mesmo. Daí conceberem o ensino simplesmente em termos da promoção ou repetência escolares dos alunos. A falta de reconhecimento e valorização de outras funções escolares, pelos professores, faz com que as suas atividades docentes se aproximem de um estado de ritualismo, na qual se perdem de vista os objetivos da ação, mas se conservam e praticam os meios para atingi-los (PEREIRA, 1967, p. 132).

Para exemplificar rituais presentes implícita ou explicitamente na maioria das instituições escolares podemos citar: os turnos das aulas, que preestabelecem um horário fixo de entrada e saída dos estabelecimentos, com um controle do acesso nos portões; a vestimenta padrão: o uniforme escolar; o uso de materiais típicos como a mochila, ao invés das bolsas ou sacolas; além de outras intervenções espaciais como a fila feita no pátio para reunir as turmas, normalmente a configuração desta levará em conta o sexo dos alunos na sua organização. Dentro da sala de aula, a mão erguida permitirá ao aluno interromper o protagonismo do professor, tomando-lhe a palavra; fora dela, a igualdade é retomada através do prato único da merenda escolar nas escolas públicas, servida quase sempre em um horário fixo. Toda esta ritualística no espaço escolar é perpetuada pelos sujeitos que diariamente o ocupam, a fim de manter a hierarquização e os limites que incidem nas relações entre eles.

4.4. A Avaliação

A avaliação faz parte da identidade da escola. Para Sacristán (2000, p. 322) avaliar “é uma missão historicamente atribuída à escola e concretamente aos professores/as”. Para definir esta prática inerente ao cotidiano escolar, o autor escreveu:

Avaliar se refere a qualquer processo por meio do qual alguma ou várias características de um aluno/a, de um grupo de estudantes, de um ambiente educativo, de objetivos educativos, de materiais, professores/as, programas, etc., recebem a atenção de quem avalia, analisam-se e valorizam-se suas características e condições em função de alguns critérios ou pontos de referência para emitir um julgamento que seja relevante para a educação (SACRISTÁN, 2000, p. 298).

Testes e provas são aplicados e a partir deles ocorre a medição do aproveitamento escolar, esta medida é transformada em nota ou conceito e os resultados servem à escola e também à família do estudante, que será beneficiado ou prejudicado conforme o seu desempenho (LUCKESI, 2003). Esta sequência do processo avaliativo escolar foi criticada por Sacristán (2000, p. 185), por causa dos limites que impõe à escola: “o exame será o rito que valida a posse concreta do saber, mas não a capacidade para utilizá-lo ou, simplesmente, entendê-lo”. Luckesi afirma que “A aferição da aprendizagem escolar é utilizada na quase totalidade das vezes, para classificar os alunos em aprovados ou reprovados”. O Brasil vem tentando ultrapassar essa máxima, facultando aos sistemas de ensino alternativas que diminuam ou posterguem a repetência escolar, como é o caso dos ciclos de aprendizagem no ensino fundamental.

Sobre as funções da avaliação na prática, Luckesi (2000, p. 324) vê que os resultados das provas permitem a construção de categorias do tipo: rendimento educativo, êxito e fracasso escolar do aluno/a, bons e maus escolares, qualidade do ensino, progresso escolar, bom-mau professor/a e boa escola.

Uma das críticas feitas pelo autor ao processo de avaliação da aprendizagem escolar é direcionada às instituições, quando estas posicionam-se autoritariamente por meio das relações pedagógicas (LUCKESI, 2003, p. 10) . Uma situação possível de ser verificada nas escolas é o uso autoritário da avaliação, quando essa serve ao professor como ferramenta para “motivar negativamente” o aluno; que acaba impelido a apropriar-se dos conteúdos não porque se interessa por eles, mas por causa das pressões para obter boas notas (Ibidem, p. 19). O autor denuncia a desvirtuação da avaliação escolar, quando, por exemplo, a prática se converte em “treinamento sistemático para resolução de provas”, e devido ao papel central muitas vezes atribuído à mesma pela escola:

A característica que de imediato se evidencia na nossa prática educativa é de que a avaliação da aprendizagem ganhou um espaço tão amplo nos processos de ensino que nossa prática educativa escolar passou a ser direcionada por uma “pedagogia do exame” (LUCKESI, 2003, p. 17).

O ambiente escolar pode ser prejudicado, principalmente no que tange a relação entre professores e alunos, quando a avaliação é utilizada pelos primeiros para realizar o disciplinamento social desses últimos (Ibidem). Este uso controverso da avaliação foi descrito por Sacristán assim: “nada do que acontece nos ambientes da sala de aula e da escola é alheio ao fato de que todas as atividades escolares têm condição de ser potencialmente avaliáveis” (2000, p. 327).

4.5. A Relação Professor-Aluno

Ao abordarmos a questão do relacionamento entre professores e alunos, observaremos uma convivência compulsória e dialética em que ambos os sujeitos ensinam e aprendem, numa configuração descrita por Fontana (1996) da seguinte forma:

Há que se considerar as características de que se reveste a interação adulto/criança. Ela é uma relação de ensino, cuja finalidade imediata – ensinar/aprender – é explícita para seus participantes, que ocupam lugares sociais diferenciados e hierarquicamente organizados (FONTANA, 1996, p. 21).

Sobre esta hierarquia presente no ambiente escolar, o autor – que apesar de ter elaborado suas ideias a partir de observações realizadas em uma escola primária paulista (antiga 1ª a 4ª séries do 1º grau, atual ensino fundamental da educação básica brasileira), na década de 1950 – consegue dimensionar uma realidade atual, enraizada nos séculos passados:

Afigura-se-nos insustentável admitir que pudesse ser toda burocratizada a dominação dos professores sobre os alunos, isso também implica que se baseia na diferença de idade entre eles existente; ou seja, a dominação de mestres sobre discípulos de escola primária consistirá sempre numa dominação de adultos sobre crianças (PEREIRA, 1967, p. 88-89).

Esta dominação a qual se refere Pereira, extrapola a sala de aula e se estende aos demais agentes escolares, em relação aos alunos:

Para os membros adultos da escola, o “bom” aluno, além de “aplicado” e assíduo é, sobretudo, bem disciplinado. Por disciplina entendem um tipo de submissão das crianças aos adultos, principalmente aos professores e diretor, onde se conglomeram padrões de comportamento, valores e atitudes típicos de organizações tradicionalistas: “respeito” diante dos adultos, acatamento total de suas decisões, tratamento reverencial e mesmo temeroso, “reconhecimento” para com o professor (PEREIRA, 1967, p. 91).

As relações pessoais entre professores e alunos têm como objetivo “criar condições que possibilitem a aprendizagem de conhecimentos pelos alunos, num contexto de interação” (TARDIF, 2002, p. 120). Sobre esta interação, o autor acrescenta que:

Os objetivos do ensino exigem a ação coletiva de uma multidão de indivíduos (os professores), mais ou menos coordenados entre si, que agem sobre uma grande massa de pessoas (os alunos) durante vários anos (em torno de doze, ou seja, 15.000 horas nos países industrializados), a fim de obter resultados incertos e remotos que nenhum deles pode atingir sozinho e que a maioria deles não verá realizar completamente (Ibidem, p. 126).

Ao analisar a individualidade versus a heterogeneidade no cotidiano escolar, Tardif (2002) entendeu que “embora ensinem a grupos, os professores não podem deixar de levar em conta as diferenças individuais, pois são os indivíduos que aprendem, e não os grupos”. Outro aspecto a ser ressaltado sobre esta convivência é a ponderação entre controle e liberdade nas escolas, respectivamente estes termos fazem alusão a professor e aluno.

E é porque eles são forçados a ir à escola que essa dimensão de atividade ou de liberdade dos alunos se torna importante: a escola não é escolhida livremente, ela é imposta, e isso, inevitavelmente, suscita resistências importantes em certos alunos. Os professores devem desenvolver nos alunos essa “sujeição voluntária”, ou seja, devem inculcar-lhes a convicção de ir à escola por vontade própria e de lá estar “para o seu próprio bem”: a obrigação relativa à escola deve transformar-se em interesse pela escola (TARDIF, 2002, p. 131).

Esta necessidade de cooperação a qual o autor se refere, é importante na medida em que “uma das atividades dos professores”, talvez a principal para Tardif (2002, p. 130), “consiste em fazer com que as ações dos alunos se harmonizem com as suas, ao invés de se oporem a elas”. Este aspecto da atividade docente corresponde a uma das tecnologias escolares e possui três dimensões que norteiam a relação professor-aluno: a coerção, a autoridade e a persuasão, elas incidem nas interações e influenciam o processo de desenvolvimento do ensino-aprendizagem.

A coerção consiste nos comportamentos punitivos reais e simbólicos desenvolvidos pelos professores em interação com os alunos na sala de aula [...] consistem em sinais pragmáticos reguladores da ação dos alunos como: olhar ameaçador, trejeitos, ironia, apontar com o dedo, etc. A autoridade, no tocante ao professor, reside no “respeito” que ele é capaz de impor aos seus alunos, sem coerção. Ela está ligada ao seu papel e à missão que a escola lhe confere, bem como à sua personalidade, ao seu carisma pessoal. O professor que é capaz de se impor a partir daquilo que é como pessoa que os alunos respeitam, já venceu a mais temível e dolorosa experiência de seu ofício, pois é aceito pelos alunos e pode, a partir de então, avançar com a colaboração deles. A persuasão reside na arte de convencer o outro a fazer algo ou a acreditar em algo e baseia-se no fato de que os seres humanos (e em particular as crianças e os adolescentes) são seres da paixão, susceptíveis de serem impressionados, iludidos, dobrados, convencidos por uma palavra dirigida às suas paixões: temor, desejo, inveja, cólera, etc. (TARDIF, 2002, p. 137-140).

Todas estas forças atuando em conjunto geram um dilema ético para os docentes: a equidade de tratamento no trabalho com grupos (TARDIF). O autor salienta que, por um lado, por ter de fazer investimentos afetivos e cognitivos nas relações humanas com os alunos, dificilmente o professor conseguirá fazê-lo num nível superficial, pois essas relações exigem que ele se envolva pessoalmente nas interações; caso ignore esta condição, o docente poderá ver seus esforços anulados, pela indisciplina em sala de aula, por exemplo.

Enfim, o problema principal, para os professores, consiste em: “interagir com alunos que são todos diferentes uns dos outros e, ao mesmo tempo, atingir objetivos próprios a uma organização de massa baseada em padrões gerais; agir sobre grupos, atingindo os indivíduos que os compõem” (TARDIF, 2002, p. 145). A solução parece nebulosa:

É impossível resolver esse problema de maneira satisfatória do ponto de vista ético. Esse é um limite intransponível dessa atividade [docente] em sua forma atual: os professores nunca podem atender às necessidades singulares de todos os alunos assumindo padrões gerais de uma organização de massa (TARDIF, 2002, p. 145).

4.6. As Tecnologias

O aspecto “tecnologias” no ambiente escolar normalmente é associado aos suportes, mídias, conteúdos ou softwares educativos disponíveis no mercado de materiais didático-pedagógicos. No sistema educacional a tecnologia servirá à “gestão educacional, ao processo de ensino-aprendizagem, à formação dos profissionais da educação, à educação inclusiva e aos portais educacionais” (MEC, s/d)5. Os órgãos governamentais que gerenciam e organizam a prestação de serviço público de ensino são responsáveis por equipar com materiais e tecnologias as escolas públicas brasileiras – o programa de governo, o ProInfo, foi pensado em 1997 para assumir esta função, implementada em 20076 – ficando a cargo das instituições a responsabilidade pelo uso pedagógico dos equipamentos tecnológicos, buscando métodos para aliar as mídias e os suportes aos métodos tradicionais de escolarização, para promover a formação acadêmica, cultural e humana da comunidade escolar.

Mas não há simplicidade na integração das tecnologias digitais nas escolas, pois “em se tratando da educação formal, a supervalorização dos novos materiais disponíveis pode significar uma espécie de deslize metonímico, priorizando os meios em detrimento das mediações de ensino” (FONTANA, 1996, p. 82). Kenski (2003) analisa as potenciais possibilidades de mediação pedagógica destas tecnologias:

O ambiente digital não substitui as formas orais e impressas com as quais tradicionalmente os professores ensinam. Ele simplesmente transforma o modo como essas mesmas formas de expressão e comunicação são usadas para finalidades educacionais (KENSKI, 2003, p. 80-81).

Há uma década, a mesma autora constatou que as instituições escolares públicas tinham, em relação às tecnologias da informação digitais, um dilema ao invés de uma ferramenta:

Em termos de realidade brasileira, o grande desafio da escola é a formação de professores capazes de lidar com alunos e situações extremas: os que já possuem conhecimentos tecnologicamente avançados e acesso pleno ao universo de informações disponíveis nos múltiplos espaços virtuais, e os que se encontram em plena exclusão tecnológica, sem oportunidade para vivenciar e aprender nesta nova realidade; além de instituições de ensino equipadas com as mais modernas tecnologia digitais e por outro lado, espaços educacionais precários e com recursos mínimos para se trabalhar (KENSKI, 2003, p. 74).

Diante das atuais formas de conhecer e aprender, ainda não existe a possibilidade da extinção da figura do professor, mas “o seu novo papel será o de validar, mais do que o de anunciar, a informação” (Ibidem), auxiliando o aluno a sincronizar o que ele assimila da cultura escolar, com o que aprende jogando online, interagindo nas redes sociais e acessando outros conteúdos digitais. Kenski, observou ainda que “para que possa realizar essas e outras transformações esperadas no ensino”, é preciso que a escola, e especialmente o professor, saibam “lidar criticamente com as tecnologias contemporâneas de informação e comunicação, que saibam utilizá-las pedagogicamente” (2003, p. 75).

Refletindo sobre os sentidos da multimídia em sala de aula, Barreto (2002) defende a importância de a escola, ao adotar as TICs (Tecnologias da Informação e Comunicação), remeter suas intenções sempre para além dos materiais, ou seja, para os sentidos da sua utilização, evitando assim armadilhas como restringir os equipamentos e conteúdos a passatempo ou divertimento (p. 72). A mediação que as TICs podem proporcionar ao ambiente escolar leva a “uma educação crítica sobre os media, colocando-os em seus devidos lugares, como equipamentos, ferramentas e espaços – neste caso, educacionais – que podem revolucionar o ensino e auxiliar professores e alunos” (KENSKI, 2003, p. 76).

A conclusão é que em se tratando de educação formal, “com mais ou menos tecnologias, ainda cabe aos professores a liderança dos processos educativos”, ele ainda é o mais desafiado diante das novas possibilidades que as TICs trouxeram para as escolas. O consenso é que à escola cabe criticar “o privilégio dos meios, em detrimento das mediações” (BARRETO, 2002, p. 20-22). As tecnologias que incidem em sala de aula vieram para mudar as propostas pedagógicas das instituições, implicando em continuidades e rupturas nos seus projetos (Ibidem, p. 66).

4.7. Os Espaços

Ao abordarmos os espaços escolares, provavelmente o ambiente mais lembrado por alunos e professores, e que ostenta o posto de um dos mais pesquisados por diversas áreas do conhecimento, é a sala de aula.

Se perguntarmos sobre a configuração de uma sala de aula, é muito provável que cheguemos a uma imagem sem grandes variações. Um espaço delimitado por quatro paredes, com uma porta, janelas, quadro de giz, certo número de carteiras para os alunos e uma mesa com cadeira para o professor (BARRETO, 2002, p. 63).

Com essa caracterização de uma sala de aula convencional e típica nas escolas do Brasil e do mundo, Barreto mostra que as tradições escolares vão além dos rituais e conteúdos sistematizados, nos espaços elas também incidem, engessando modelos e até padronizando projetos de arquitetura. Apesar de alguns exemplos diferenciados, como as propostas paisagísticas e arquitetônicas criadas há mais de 10 anos para as Unidades Municipais de Educação Infantil ‒ UMEIs ‒ em Belo Horizonte, onde se vê uma preocupação em equipar com hortas, playgrounds, arenas, e salas multimeios as escolas que atendem as crianças de zero a cinco anos, esta preocupação é atenuada quando observamos os prédios e salas de aula das escolas dos níveis fundamental e médio, com seus alunos pré-adolescentes confinados em espaços projetados ainda no século XIX.

Após delimitar o espaço sala de aula, Barreto analisa a sua disposição clássica nas escolas:

Um espaço que tende a apresentar poucas variações no seu arranjo, com carteiras enfileiradas, uma atrás das outras, de modo que os alunos fiquem de costas para alguns colegas e ao lado de outros, na maioria das vezes com um intervalo entre as fileiras, todos podendo ver e ser vistos pelo professor, posicionado de frente, junto ao quadro de giz, como o centro das atenções (BARRETO, 2002, p. 63).

A autora conclui que a configuração clássica de uma sala de aula apresenta um “arranjo [que] parece tão sedimentado que acaba sendo reproduzido mesmo quando as condições mínimas estão ausentes” (Ibidem).

4.8. Os Tempos

As divisões dos tempos escolares – a saber: carga horária, períodos, turnos, recreio, férias, dentre outros articulados pelos sistemas de ensino – interferem na vida dos estudantes, de suas famílias e na de funcionários escolares, de modo que a centralidade que este aspecto possui na conjuntura da educação formal já proporcionou diversas pesquisas abordando: a sua problematização (CASAGRANDE, 2007), a gestão e percepção dos alunos sobre ele (SILVA, 2009) e a sua construção (PARENTE, 2006).

O trabalho realizado por Parente (2006) sobre a construção dos tempos escolares e suas possibilidades, aponta que a legislação educacional é o fator condicionante dos tempos escolares no Brasil. Para ilustrar este fato, trazemos o critério da seriação, que quantifica o tempo que o estudante tem de permanecer na escola para obter seus certificados (dentre outras finalidades).

A Lei Federal nº 9.394/96 permitiu a flexibilização temporal da seriação. Se antes ela condicionava o curso de determinadas disciplinas a aspectos como o ano letivo vigente e a idade dos alunos, agora o processo de ensino-aprendizagem é flexibilizado em períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos, grupos não seriados, etc. (PARENTE, 2006, p. 54). Apesar dessa diversidade de opções, o modelo seriado é o que predomina na educação brasileira, e sua lógica é a da compartimentação do tempo e das sequências (Ibidem, p. 76). O desdobramento deste modelo de divisão do tempo escolar é entendido por Parente (2006, p. 76) assim:

A seriação é sustentada por processos de avaliação cujo objetivo é a verificação do aproveitamento adequado dos tempos de estudos, o que indicará a possibilidade de seguir adiante no processo de escolarização ou repetir o tempo que não foi bem aproveitado.

Sobre o tempo que é ou não “bem aproveitado na escola”, a autora encontrou em Sacristán a explicação para os diagnósticos que o sistema educacional realiza, ao relacionar tempo e aprendizagem: “se o tempo do sujeito-aluno” ‒ o ritmo de aprendizagem que ele precisa imprimir para executar as atividades escolares ‒ “não se acomoda ao tempo regulado escolar e ao estabelecido para desenvolver o currículo; por ser mais lento, este aluno será tachado de atrasado”. Constata-se então, pelas avaliações, uma anomalia na sincronia entre o tempo pessoal e o escolar. A recíproca também é verdadeira: “se o aluno for mais rápido, então será qualificado como adiantado ou será considerado que o ritmo de desenvolvimento do ensino o faz ‘perder tempo’” (SACRISTÁN7 apud PARENTE, 2005, p. 77).

Como alternativa à seriação e em consonância com a legislação atual, temos o tempo de aprendizagem escolar organizado em ciclos. Parente (2006) sintetiza esta novidade recentemente implementada nas instituições brasileiras:

Os ciclos escolares compreendem períodos de escolarização que ultrapassam as séries anuais, organizados em blocos cuja duração varia, podendo atingir até a totalidade de anos prevista para um determinado nível de ensino. Eles representam uma tentativa de superar a excessiva fragmentação do currículo que decorre do regime seriado durante o processo de escolarização (PARENTE, 2006, p. 81).

De acordo com a autora, esta forma de organização é resultado da produção de novos tempos dentro da escolarização (Ibidem).

Ainda sobre a legislação nacional, e a respeito da organização temporal escolar, destacamos alguns parâmetros presentes na LDB e no Plano Nacional da Educação (PNE) que visam padronizar e racionalizar o funcionamento das instituições de ensino: a organização do calendário escolar com 800 horas anuais e 200 dias letivos, considerando-se as peculiaridades locais, inclusive climáticas e econômicas (LDB, Art. 23, § 2o; Art. 24, inciso I). A jornada escolar de no mínimo quatro horas diárias para todos os anos da educação básica, com opção, por parte dos sistemas de ensino, pelo período de tempo integral, com pelo menos sete horas diárias (LDB, Art. 34; PNE). A exigência, para o aluno, de frequência escolar mínima, equivalente a 75% das horas letivas estabelecidas (LDB, Art. 24, inciso VI). E a diretriz-meta colocada pelo PNE: “na Educação Infantil, adotar progressivamente o atendimento em tempo integral para as crianças de 0 a 6 anos” (PARENTE, 2006, p. 114-115).

Concordamos com Parente (2006) que reuniu em sua pesquisa todos os aspectos temporais e legais acima citados, sobre o impacto desses no direcionamento do trabalho pedagógico no cotidiano da escola, tais como: os horários de entrada e saída da escola, um calendário anual próprio, o tempo dos módulos-aula, o tempo dos intervalos de descanso diários e o período de férias, dentre outras exigências impostas pela legislação e racionalização do tempo na educação formal (PARENTE, 2006, p. 116).

Silva (2009, p. 18) elencou várias funções que podem ser atribuídas ao tempo escolar, dentre elas, o seu caráter de “regulador social”. A autora percebeu que nas escolas o conceito de tempo pressupõe a existência da semana como unidade temporal para distribuição dos conteúdos e das atividades. E ainda que nas instituições os tempos são marcados pela longa duração (como a obrigatoriedade escolar) e pelo tempo de curta duração (ano letivo e horários das aulas). A autora concluiu que: “[...] a função social do tempo [ocorre] na medida em que toda a estrutura de horários provoca uma homogeneidade entre os modos de actuar dos alunos” (p. 19); e ainda que: “uma mudança neste sistema implicaria mudanças nas vidas e rotinas das famílias e poderia provocar desordem social” (p. 20).

Trazendo esta discussão para o nosso contexto belorizontino, a autora destaca o conceito de “tempos pedagógicos”, adotado pelas Diretrizes Educacionais elaboradas pelo município de Belo horizonte; nele, tempo pedagógico é “todo o tempo dos alunos e dos profissionais da educação, no período que compreende a permanência desses sujeitos na escola, ou até mesmo fora dela, quando realizam atividades próprias ao processo educativo escolar” (BELO HORIZONTE, 1999 apud PAPRENTE, 2006, p. 121).

De acordo com Parente (2006), em todo o mundo, as crianças iniciam a escola em algum ponto entre os cinco e os sete anos de idade. As consequências dos tempos escolares na vida dos alunos chegam a ser objeto de estudo em diversas áreas do conhecimento além da Pedagogia. Um dos exemplos é a Cronobiologia, responsável por pesquisar sobre as características temporais dos organismos em sua relação temporal com o meio, a exemplo da oscilação dos ritmos biológicos em função do tempo (Ibidem). Uma das mais importantes contribuições que a Cronobiologia nos fornece em relação aos tempos escolares, é a ideia de “armadilha temporal” que equivale à forma como são elaborados os horários escolares. Segundo a autora, os esquemas de temporização biológicos fazem com que as crianças entre os dez e onze anos necessitem de ciclos de sono mais tardios, enquanto que os turnos matutinos escolares exigem que este ciclo seja interrompido. A privação do sono traz consequências para o humor, a concentração, a memória e a aprendizagem das crianças. Na medida em que a escolarização se torna compulsória para a grande parte da população, “verifica-se um nivelamento dos ritmos individuais de cada uma conforme a faixa etária, pois os seus ciclos de sono começam a ser de acordo com os horários escolares” (PARENTE, 2006, p. 49-51).

O tempo é uma das categorias que utilizamos para pensar a escola, onde ele é organizado de maneira convencional entre todas: tempo determinado para cada aula, tempo para o lanche, tempo de perguntar, tempo de responder e tempo de aprender. A duração de cada um desses tempos pode variar conforme a instituição, mas serão sempre tempos fixos em sua finalidade (CASAGRANDE, 2012, p. 104-105). O quesito tempo escolar tem um peso tão grande na organização dessas instituições que a eficácia das mesmas acaba sendo condicionada por ele (Op. cit., p. 48).

4.9. A Estrutura Física

Geralmente, as escolas públicas e urbanas dispõem de ambientes e equipamentos comuns a todas elas. Os órgãos públicos de ensino se articulam para estabelecer os padrões mínimos de funcionamento das instituições, para que os projetos pedagógicos possam ser desenvolvidos. O governo federal, por exemplo, disponibiliza o Levantamento da Situação Escolar – LSE – que é “um instrumento de coleta de informações sobre a situação da infraestrutura das escolas públicas, e que objetiva auxiliar o planejamento da educação nos estados e municípios” (BRASIL, 2008). Neste modelo de gestão, os alvos da avaliação são as condições físicas dos prédios escolares, a disponibilidade do mobiliário, equipamento e material didático existentes (Ibidem).

Buscando ilustrar a estrutura física e as instalações, identificamos as dependências típicas das escolas brasileiras, que abrangem um conjunto de salas, com suas funções específicas. Para fins pedagógicos temos: as salas de aula, de multimeios, a biblioteca, os laboratórios de ciências e de informática, além das quadras poliesportivas. Para fins de gestão escolar: a sala da direção, da coordenação pedagógica, dos professores e da secretaria. Para a manutenção do espaço: as salas para os arquivos, o depósito, o almoxarifado, a despensa, a cantina, e em muitas escolas públicas já temos até mesmo hortas. E para fins de socialização os ambientes são: o auditório, a sala de reuniões, os refeitórios de funcionários e dos alunos, o pátio e às vezes até jardins. Compondo toda esta estrutura, teremos mesas, estantes, carteiras, bancos, armários, quadro de giz, murais, dentre outros objetos e mobiliários dispostos de modo a dar condições para que o processo de ensino-aprendizagem ocorra.

4.10. A EDUCAÇÃO NÃO-FORMAL

A autora Valéria Aroeira Garcia, em seu texto “Um sobrevôo: o conceito de educação não formal”, escreveu sobre a tarefa complexa que é definir a educação não-formal e sobre a quase impossibilidade de usar os aspectos inerentes à educação formal como parâmetros para expor com precisão a não-formal. Como que prevendo as pesquisas futuras sobre o tema, a autora auxilia-nos no trabalho de entender esse tipo de educação problematizando o significado de conceito. Este, necessita de um meio para acontecer, e na visão deleuziana8 de Garcia, esse meio do qual um conceito emerge é o plano de imanência.

Os conceitos são acontecimentos, mas o plano é o horizonte dos acontecimentos, o reservatório ou a reserva de acontecimentos puramente conceituais (...). Assim, o plano de imanência é o lugar do pensamento, de todos os pensamentos, dos já pensados e de todos os possíveis de serem pensados. Isto é, o plano de imanência é essencialmente um campo onde se produzem, circulam, e se entrechocam os conceitos. Dessa forma, o conceito de educação não-formal, assim como outros que têm com ele ligação direta, habita um plano de imanência que não é o mesmo que habita o conceito de educação formal, apesar de poder haver pontes, cruzamentos, entrechoques entre ambos e outros mais (GARCIA, 2005, p. 29-31).

Para a autora, as especificidades da educação não-formal vão desde um território próprio até a sua organização. Partindo da hipótese de que “o plano de imanência da educação não-formal seja outro que o da educação formal”, Garcia levanta outra: a não-formal tem um plano de imanência próprio, ou seja, ela não é um desdobramento da educação formal. Diante dessa possibilidade, a autora alerta:

Não confundamos, pois, a compreensão desses campos conceituais/esses lugares de acontecimento, caso contrário corre-se o risco de, ao pensarmos a educação não-formal, termos como parâmetro elementos que comumente circulam no plano da educação formal, tendendo compreender aquela a partir desta, de maneira dependente e irreal (GARCIA, 2005, p. 31).

O texto de Garcia propõe ainda que nós, pesquisadores da educação não-formal, busquemos o que é específico deste tipo de educação, nos “elementos que a definem e a diferenciam” (Ibidem). Mas, para esta pesquisa, que quer explorar o projeto educativo do Movimento Escoteiro, que é um representante da educação não-formal, optamos por comparar os dois tipos de educação, e por isso, teremos sim que partir dos parâmetros da educação formal para explicar a não-formal. Isso não significa que ignoramos as conclusões de Garcia sobre esta última ̶ “A educação não-formal possui um plano de imanência que lhe é próprio” (2005, p. 33) ̶ mas sim, que reconhecemos a importância da escola perante as demais práticas de ensino e aprendizagem.

4.11. Os Conceitos

Na tentativa de definir e conceituar a educação não-formal, recorremos (dentre outras) às obras de Maria da Glória Gohn (2006a, 2006b), que em seus livros e textos analisa a temática. Para a autora, a aprendizagem oferecida pela educação não-formal se dá “no mundo da vida, via processos de compartilhamento de experiências” e “em espaços e ações coletivos cotidianos” (2006a, s/p). As ações coletivas as quais Gohn se refere, conjugam-se com a prática social, um dos pressupostos básicos da educação não-formal. Esta prática é revestida de intencionalidade, inclusive por parte dos educadores (sociais), que precisam ter consciência quanto aos objetivos e tarefas propostas neste tipo de educação. Neste contexto de aprendizagem teremos ainda “métodos, técnicas, lugares e condições específicas, previamente criadas para suscitar ideias, conhecimentos, valores, atitudes e comportamentos” (LIBÂNEO, 1994, p.18). Todo esse quadro vai ao encontro do projeto educativo do Movimento Escoteiro, objeto desta pesquisa, que por se tratar de instituição destinada a educação extra-escolar9, exige que aprofundemos o estudo sobre o conceito.

A experiência pessoal em trabalhos coletivos gerando aprendizados é uma das formas de sintetizar o modelo educacional em questão (SILVA, 2010, s/p). Uma das definições para este tipo de educação foi feita por Libâneo:

A educação não-formal, por sua vez, são aquelas atividades com caráter de intencionalidade, porém com baixo grau de estruturação e sistematização, implicando certamente relações pedagógicas, mas não formalizadas. Tal é o caso dos movimentos sociais, os trabalhos comunitários, atividades de animação cultural, os meios de comunicação social, os equipamentos urbanos culturais e de lazer (museus, cinemas, praças, áreas de recreação) etc. Na escola são práticas não formais as atividades extra-escolares que proveem conhecimentos complementares, em conexão com a educação formal (feiras, visitas, etc.). O exemplo da escola mostra que, frequentemente, haverá um intercâmbio entre o formal e o não-formal (LIBÂNEO, 2002, p. 89).

Matias (2013, s/p) entende que a educação não-formal “abrange o processo da aprendizagem que se dá ao longo da vida”, possibilitando “conhecimentos e habilidades adquiridos com ou sem certificados institucionalizados”, pois, apesar da denominação, a educação não escolar possui certo grau de formalidade (Ibidem).

Felício (2011) descreve que o diferencial desta modalidade educativa está nas ações e instituições que a realizam. Estas apresentam um leque amplo de objetivos e trabalhos desenvolvidos, algo que, de acordo com o autor, torna difícil a sua nomeação comum. Dois exemplos desse leque são o terceiro setor10 e o próprio ME.

De acordo com Pinto (2005, p. 4), “É importante que a educação não-formal possua formatos diferenciados” e que essa distinção impacte no formato dos currículos, das estruturas do processo de aprendizagem, das avaliações, das atividades implementadas e na qualificação dos educadores.

Concordamos com Morais (2012, p. 6) sobre a importância do processo de ensino-aprendizagem que a educação não-formal proporciona, pois, compreendendo que “o ser humano se constitui a partir das relações que estabelece”, a autora percebe esta modalidade favorecendo a socialização, através do convívio de diferentes sujeitos, dos contextos distintos propostos e do compartilhamento de experiências, que culminam com a formação humana indispensável a qualquer aprendiz.

Outra descrição para a educação não-formal foi feita por Pinto:

Um processo de aprendizagem social, centrado no educando, formando através de atividades que têm lugar fora dos sistemas de ensino formal e sendo complementar deste. Baseia-se na motivação intrínseca do formando, e é voluntária e não hierárquica por natureza (2005, p. 4).

4.12. As Características

Os trabalhos de Garcia (2005, 2009) são referência em pesquisas sobre educação não-formal (OLIVEIRA, 2008; ALMEIDA, 2011; SIMÃO, 2012). Para a autora, o campo da educação não-formal provém de “iniciativas com o propósito de atuar com públicos específicos, tendo como pano de fundo a educação”. Principalmente em relação ao terceiro setor, Garcia vê que esta modalidade educacional delega “para a sociedade o que antes era responsabilidade do Estado: as ações no setor educativo” (2005, p. 35).

Ainda com a visão de Garcia (Ibidem), temos a “irreverência” como uma característica da educação não-formal, pois “ao lidar com questões do contexto educacional e das relações inerentes a ele” (avaliação, currículo, relação educador-educando, etc.) o faz de maneira distinta, buscando favorecer o “processo criativo”:

A educação não formal não é estática, é uma atividade aberta que ainda está em construção, portanto não tem uma identidade pronta e acabada. É uma área bastante diversa, e esse aspecto é muito interessante, pois permite, além de contribuições de várias áreas, a composição de diferentes bagagens culturais, tendo a diversidade como uma de suas características (GARCIA, 2005, p. 35).

Além do Movimento Escoteiro, outras ações destinadas a jovens compõem a esfera da educação não-formal. Aqui destacamos as que ocorrem no contraturno escolar, e que são oferecidas por diferentes setores sociais: organizações não governamentais, poder público, parcerias público-privadas e iniciativas de responsabilidade social de empresas (OLIVEIRA, 2008 p. 41). Dependendo de cada uma dessas possibilidades, as denominações para a educação não-formal terá variações: educação complementar, educação social, educação para cidadania, apoio sócio-educativo em meio aberto, jornada ampliada, contraturno escolar, educação não-formal, dentre outros11. Diante dessa variedade, vale resgatar a observação feita por Garcia em sua tese:

Restritamente, o termo diz respeito às instituições, associações, organizações, fundações (quando consideramos os espaços nos quais ocorrem à prática da educação não-formal) que trabalham tendo a educação como mediadora nos processos de construção do conhecimento, independente do público, objetivo, conteúdo, durabilidade, espaço e lugar onde se desenvolve a proposta (GARCIA, 2009, p. 44).

Ao contrário da educação formal, que normalmente é definida através dos seus aspectos objetivos e amplamente pesquisados, a educação não-formal, no tocante a sua caracterização, exige, nesta nossa pesquisa, a inclusão de explicações e justificativas que auxiliem na compreensão da sua diversidade, complexidade e relação com o Movimento Escoteiro. Garcia (2009), fez uma ampla relação das características mais frequentemente localizadas neste modelo educacional. A autora salienta que não é comum as práticas não-formais serem identificadas como ‘educação’. Usualmente essas dizem respeito a compromissos imediatos e práticos, normalmente ocorrem fora das escolas, admitem que situações que proporcionem experiências apropriadas sejam empregadas como aprendizagem, seus participantes fazem atividades em meio período, recebem instrução raramente classificada por graus e raramente sequencial. Usualmente, estas aprendizagens têm um custo menor que a educação formal, não envolvem (habitualmente) critérios de admissão, e na seleção dos mestres é comum a consideração das habilidades demonstradas ao invés das credenciais, sendo os líderes voluntários frequentemente envolvidos12.

A diversidade de métodos e procedimentos, os sistemas individualizados ou coletivos, presenciais e a distância, o uso das tecnologias (sofisticadas, artesanais ou rudimentares) e a programação das atividades (GHANEM, 2008, p. 68) também fazem parte dos projetos de ensino da educação não-formal. Estes aspectos aliam-se às já citadas irreverência e criatividade, inerentes a este tipo de educação, resultando em metodologias que “operadas no processo de aprendizagem, partem da cultura dos indivíduos e dos grupos” e nascem a partir da problematização da vida cotidiana, “supondo a existência da motivação das pessoas que participam” (GOHN, 2006b). Portanto, temos a educação não-formal simultaneamente preocupada em realizar processos de ensino-aprendizagem diversos dos convencionais e considerar os gostos e preferências dos educandos. Por isso, Gohn (2006b) caracteriza os ambientes e as situações da educação não-formal como interativos, “construídos coletivamente e segundo diretrizes de dados grupos” (s/p). A autora frisa um aspecto muito caro a estas propostas educativas: a dimensão optativa da participação, pois os educandos poderão recorrer a esses espaços “por forças de certas circunstâncias da vivência histórica” de cada um, mas, a exemplo do que ocorre no escotismo, a participação irá depender da forma como as famílias e os jovens enxergam e legitimam outros agentes educativos além da escola (GOHN, 2006a, s/p).

Se precisássemos resumir as características dessa modalidade educativa, recorreríamos a Gohn (2005) que fez a seguinte elaboração: apresenta um caráter voluntário, promove a socialização e a solidariedade, visa o desenvolvimento, procura a mudança social, é incipientemente hierarquizada, favorece e descentraliza suas formas de participação (p. 103).

4.12.1. Os Objetivos

Para um tipo de educação que tem dentre as suas características desde a diversidade até o caráter voluntário de participação por parte dos seus educandos, a gama de objetivos tende a ser também extensa e variada. Garcia (2009) fez uma relação dos objetivos mais frequentes nas ações realizadas no âmbito da educação não-formal, além daqueles já elencados por Gohn (2005): suscitar nos educandos consciência humanitária, ecológica e socioafetiva (GARCIA, 2009, p. 55). Todas essas intenções têm justificativa na medida em que pretende-se, seja com a educação não-formal, formal ou informal, transformar os indivíduos para que estes sejam capazes de transformar a sua realidade quando essa se mostra prejudicial ao desenvolvimento social, econômico, cultural ou histórico. Vejamos como a autora defende os objetivos mencionados:

Não assumimos com isso [vivência de processos criativos através da educação não-formal] que a educação não-formal tenha o papel de ensinar a criação, de ensinar a pensar, mas, se tem a intenção de transformar, ela tem o compromisso de favorecer e oferecer diferentes possibilidades de exercício e vivência de diálogos, nessa perspectiva de criação de pensamentos divergentes, opostos, contraditórios, diferentes, criativos, ousados, etc. (GARCIA, 2005, p. 40).

A noção de participação social em ações coletivas traduz os processos de ensino-aprendizagem que ocorrem na educação não-formal. Esses processos variam de acordo com os objetivos específicos de cada uma das instituições, mas o mote é normalmente problematizar a cidadania. Nesta direção, Gohn (2005, p. 101-102), assevera que a cidadania é objetivo principal da educação não-formal quando “pensada em termos coletivos”.

4.13. O Currículo e os Conteúdos

Assumindo que “currículos não são conteúdos prontos”, mas “uma construção e seleção de conhecimentos e práticas produzidas em contextos concretos e em dinâmicas políticas, culturais, intelectuais, pedagógicas e sociais” (MEC, 2007, p. 9) e reiterando que as práticas sociais são pressupostos da educação não-formal, reunimos as categorias de análise da educação: currículo e conteúdos, para explicar como eles são conjugados na lógica da educação não-formal.

Matias (2013), em seu relatório de mestrado, cita Pinto13, para explicar que o currículo da educação não-formal reflete o objetivo das instituições que a oferecem, de desenvolver “saberes e competências” voltados para “um vasto conjunto de valores sociais e éticos, tais como os direitos humanos, a tolerância, a promoção da paz, a solidariedade e a justiça social” (p. 19).

No tocante aos conteúdos, a educação não-formal possui um diferencial em relação aos demais tipos de educação, que é a relevância que os interesses e preferências dos educandos assumem nos programas educativos. Segundo Gohn (2006, s/p), nessa modalidade os conteúdos “emergem a partir dos temas que se colocam como necessidades, carências, desafios, obstáculos ou ações empreendedoras a serem realizadas”. Para a autora a abrangência dos conteúdos refere-se aos seguintes campos e dimensões:

O primeiro envolve a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos enquanto cidadãos, isto é, o processo que gera a conscientização (...) para a compreensão de seus interesses e do meio social e da natureza que o cerca, por meio da participação em atividades grupais. O segundo, a capacitação dos indivíduos para o trabalho, por meio da aprendizagem de habilidades e/ou desenvolvimento de potencialidades. O terceiro, a aprendizagem e exercício de práticas que capacitam os indivíduos a se organizarem com objetivos comunitários, voltadas para a solução de problemas coletivos cotidianos. O quarto é a aprendizagem dos conteúdos da escolarização formal, escolar, em formas e espaços diferenciados. Aqui, o ato de ensinar se realiza de forma mais espontânea, e as forças sociais organizadas de uma comunidade têm o poder de interferir na delimitação do conteúdo didático ministrado bem como estabelecer as finalidades a que se destinam àquelas práticas. O quinto é a educação desenvolvida na e pela mídia, em especial a eletrônica. Finalmente, deve-se registrar ainda o campo da educação para a vida ou para a arte de bem viver. Em tempos de globalização, devemos traduzir isto em: como viver ou conviver com o stress: cursos de autoconhecimento, das filosofias e técnicas orientais de relaxamento, meditação, alongamentos, etc. (GOHN, 2005, p. 98-99).

Partindo da diversidade do público que a educação não-formal consegue atingir por meio das áreas de conhecimento acima citadas, entendemos a importância dada às inclinações dos educandos na elaboração dos conteúdos programáticos das ações de ensino na educação não-formal. Os posicionamentos dos aprendizes envolvidos tendem a serem ouvidos, sendo ainda responsáveis por alavancar ou estagnar as propostas educativas das instituições. E esse processo participativo de escolhas, que resulta em currículos flexíveis na educação não-formal, acaba influenciando a formação de referências e preferências nos educandos, dois aspectos que, de acordo com Gohn, não são herdados, mas, principalmente, aprendidos (2005, p. 54).

Tomando como exemplo o espaço de educação não-formal “Crianças e Jovens da Zona Norte” ‒ Organização Não Governamental (ONG) localizada nesta região da capital paulista, lócus da pesquisa realizada para a tese de doutorado de Selma Machado Simão (2012) ‒ podemos, a partir do relato e das análises da autora, identificar uma variedade de atividades de cunho pedagógico oferecidas por esta instituição de educação não-formal e replicado por outros espaços semelhantes. A autora destaca que as atividades (sociais) oferecidas pela ONG encontram-se sistematizadas em um “projeto-sócio-político-pedagógico” (p. 38), documento provavelmente inspirado no PPP escolar ‒ item obrigatório nas instituições de ensino regular. O “PSPP” da ONG em questão, demonstra a face pedagógica e sistematizada da educação não-formal, ou seja, o planejamento por trás das ações. Vejamos algumas atividades típicas, identificadas por Simão (2012, p. 40), presentes nos “currículos” desses espaços:

  • Acompanhamento escolar na realização das lições de casa – ação que visa estimular a frequência e a participação do estudante na escola, e também oferecer reforço aos que necessitam de melhoria na aprendizagem.

  • Cultivo de valores como a não-violência, a cooperação e o respeito ao próximo, visando contribuir com a compreensão, prevenção e assistência às consequências geradas por ciclos de violência familiar e comunitária.

  • Atividades de artes – desenho, pintura, dramatizações, visando o desenvolvimento dos aspectos cognitivos e perceptivos.

  • Jogos que estimulem a percepção, o raciocínio, a memória e a coordenação motora.

Gohn (2005) esclareceu sobre a importância de espaços como o da ONG citada:

Numa sociedade cada vez mais competitiva, individualista e violenta, as demandas sobre a educação são múltiplas. De reciclagem, aperfeiçoamento, atualização, especialização, etc. E muitas delas não se situam na área da educação formal (p. 97).

Somam-se às ações citadas, outras propostas de conteúdos para a educação não-formal, como, por exemplo, a educação artística desenvolvida por meio do artesanato e práticas de: “lazer, trabalhos para a comunidade, recreações, atividades de natureza política”, dentre outras (CAMPOS, 1985, p. 25).

Para que currículo e conteúdos convirjam com os objetivos da educação não-formal, uma condição posta é a flexibilização de dois aspectos cruciais a todos os tipos de educação:

As categorias de espaço e tempo também têm novos elementos na educação não-formal, porque o tempo de aprendizagem, usualmente, não é fixado a priori, e se respeita as diferenças existentes para a absorção e reelaboração dos conteúdos implícitos ou explícitos no processo ensino-aprendizagem. Como existe a flexibilidade no estabelecimento dos conteúdos, segundo os objetivos do grupo, a forma de operacionalizar estes conteúdos também tem diferentes dimensões (GOHN, 2005, p. 101).

Essa flexibilidade das categorias tempo-espaço e dos conteúdos a qual Gohn se refere, também foi percebida por Garcia (2009). Para a autora, esse diferencial tem a ver com a proposta da educação não-formal que: “Emprega os apoios que julga necessários à atividade educativa, pois tem liberdade para definir a natureza das mensagens, escolher os temas geradores e determinar quais as suas intenções no ato de educar” (SIMSON; PARK; FERNANDES, 200114 apud GARCIA, 2009, p. 44).

4.14. A Avaliação

Dentre as características da educação não-formal está a desobrigação de avaliar, certificar ou controlar a frequência dos educandos (GARCIA, 2009, p. 77). No entanto, os agentes deste tipo de educação podem optar por formas de verificação da aprendizagem diante das variadas propostas pedagógicas e sociais oferecidas a jovens e adultos. Tal verificação, poderá ser distinta da que a educação formal adota, e distinta entre os projetos educativos das diferentes ações de educação não-formal. Garcia, por exemplo, pesquisou ONGs brasileiras, que atendem a jovens de baixa renda no contraturno escolar, e identificou que uma delas lançava mão da avaliação diagnóstica (um teste escrito), para conhecer as demandas dos novatos e para o planejamento das ações, no sentido de orientar o trabalho de reforço escolar oferecido pela instituição (GARCIA, 2009, p. 107).

Simão (2012), em sua pesquisa participante na já citada ONG paulista “Crianças e Jovens da Zona Norte”, verificou que a coordenação do espaço considera o desempenho e o comportamento escolar das crianças e adolescentes que frequentam o local para avaliá-los. Os resultados obtidos por estes jovens na escola, poderão resultar em sanções no âmbito da educação não-formal, como por exemplo, a suspensão da participação nas atividades da ONG, se for constatado comportamento indisciplinado recorrente na escola. A autora identificou, a partir dessa realidade, “um aspecto de subserviência das atividades não-formais à lógica formal da escola”, indicando a “avaliação pouco valorativa” que a ONG faz de suas próprias atividades educacionais, e demonstrando “falhas na proposta pedagógica não-formal desenvolvida pela instituição” (p. 292). Ou seja, o projeto de educação não-formal da ONG em questão, abre mão de avaliar (ou não) seus educandos a partir das atividades extra-escolares que propõe aos jovens, para utilizar os parâmetros avaliativos da escola como determinantes das vivências que as crianças e os adolescentes terão no ambiente não-formal de educação. Simão aponta que o cerne deste problema, advém da falta de um coordenador com formação pedagógica atuando na entidade.

Apresentamos um exemplo em que a avaliação na educação não-formal obteve o apoio dos educandos. Ocorreu na pesquisa que Matias (2013) realizou em Salas de Estudos, que são espaços de educação extra-escolar, regidos por lei, em Lisboa-Portugal. De acordo com a autora, as Salas são responsáveis por atender às necessidades e interesses educacionais individuais de alunos, no contraturno da escola, e têm como objetivo oferecer reforço escolar, visando combater os elevados números de “insucesso” (p. 24). Interessada na opinião dos educandos que frequentam estes espaços, e considerando que a proposta pedagógica das Salas inclui uma avaliação aplicada semestralmente, Matias questionou aos alunos, qual o grau de importância que atribuíam à referida avaliação, e pediu-lhes que, nas respostas, refletissem sobre o impacto da prova aplicada pela Sala de Estudos, no rendimento escolar dos mesmos (p. 48). Em 94% das respostas, os alunos constataram que a avaliação feita pela Sala de Estudos foi importante para a melhora nos seus desempenhos escolares (Ibidem), ou seja, esses alunos corroboram para que o espaço de educação não-formal português valorize, bem como no exemplo anterior da ONG brasileira, um dos aspectos mais marcantes da educação formal (a avaliação) em sua própria proposta pedagógica.

Continuando nossa ilustração da avaliação na educação não-formal através de exemplos reais, temos uma experiência em que a proposta não-formal convergiu com a formal e vice-versa: uma aula para alunos da escola regular, ocorrendo num espaço não-formal: o Museu Nacional da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Em sua tese de doutoramento em educação, Valéria da Silva Vieira (2005), observou uma excursão escolar ao referido museu, e fez as seguintes inferências sobre como avaliar uma atividade escolar, realizada num espaço não-formal: ao assumir esta atividade extra-classe, é importante que o professor saiba que ambientes como museus “são espaços abertos ao público em geral e que, devido a esta característica, se tornam ambientes, muitas vezes, não avaliativos” (FALK, KORAM e DIERKING, 198615 apud VIEIRA, 2005, p. 15). “A avaliação dessas aulas, quando ocorre, deve ser realizada de maneira diferenciada daquela que ocorre no ensino formal”, sem exigências do tipo “capacidade de memorização dos estudantes”, pontua a autora (Ibidem).

“Como as aulas não-formais acontecem de maneira lúdica e em ambientes agradáveis ao aluno, é importante que a avaliação siga a mesma diretriz da aula, sendo agradável e lúdica para o avaliado”16. A avaliação de atividades como a visita a espaços de educação não-formais pode ser do tipo quantitativa ou qualitativa, “mas sempre deve buscar uma harmonia com a sensibilização provocada pelas aulas não-formais” (p. 16). Finalizando, Vieira alerta para um aspecto das proposições avaliativas descritas, que extrapola o exemplo citado aqui, servindo também para as demais ações deste tipo de educação:

Devemos ter em mente que esses espaços [de educação não-formal] são mutáveis e devem ser constantemente avaliados. (...) Avaliar um local não é, portanto, uma tarefa simples. De qualquer forma, é importante que se faça uma avaliação de espaços de ensino não-formal, do que oferecem, de como ocorrem as aulas e como os mesmos são explorados pelos alunos e professores que os visitam (VIEIRA, 2005, p. 16).

Como vimos, a opção pela avaliação na educação não-formal apresenta pontos prós e contras, respectivamente: proporcionar ao educando a oportunidade de se autoavaliar e avaliar o projeto educativo das ações não-formais de ensino; restringir legitimidade ao desempenho escolar do educando, em detrimento das vivências proporcionadas pelos espaços de educação não-formal.

4.15. Os Espaços

Escrevendo sobre cultura política no Brasil e sobre os novos espaços de associativismos nos anos de 1980, Gohn (2005, p. 72) conseguiu identificar um contexto favorável às ações voltadas para as práticas de educação não-formal: a chamada terceira via – forma de parcerias entre o público estatal e o terceiro setor. A autora observa que “um dos eixos principais de ação da terceira via é o setor da educação” (Ibidem); sendo que por trás das ações desse setor os objetivos variam: empresas buscando benefícios fiscais concedidos pelos governos, difusão de fundações gestoras de universidades, organizações de caridade e filantropia, mecenato (apoio às artes), além das Organizações Não Governamentais, que investem em grandes campanhas educativas, a exemplo do Geenpeace17. Um exemplo do terceiro setor articulado com o governo (Estado) para as questões educacionais é a UNESCO18. Para Gohn, todos estes agentes têm como características a positividade, as ações propositivas e afirmativas. Suas ações consolidaram-se entre as décadas de 1980 e 1990 como espaços para a educação não-formal (Ibidem, p. 74-79).

“Os espaços de educação não-formal constroem suas trajetórias de acordo com as necessidades de suas comunidades, assim, de uma maneira geral, organizam suas rotinas seguindo as ações a que se propõem” (SIMÃO, 2012, p. 25). E são essas necessidades, ou seja, as demandas do público atendido, que acabam requerendo um recurso útil às instituições que oferecem este tipo de educação: a adaptação dos espaços. Simão explica que tal recurso ora pode ser um complicador, porque a adaptação pode decorrer da deficiência ou falta de estrutura física dos espaços onde as atividades são propostas; ora poderá configurar-se numa “arquitetura educacional baseada no aproveitamento das áreas”, onde, por exemplo, cantos viram armários, varandas viram pequenos palcos, garagens se tornam espaços de lazer e parques se tornam sedes de grupos (Ibidem, p. 38). Problema ou solução, o aspecto espacial é um diferencial importante na educação não-formal. Quanto a ele, Gohn19 escreveu que:

A educação não formal comporta todos os contextos em que as pessoas se agrupam espontaneamente (sem a mesma obrigatoriedade da escola) com a intenção de criar ou buscar determinadas qualidades e/ou objetivos, acabando por construir um conhecimento coletivo (OLIVEIRA, 2008, p. 43).

Com relação ao público que se reúne em cursos, oficinas e grupos para aprender e ensinar sobre variadas áreas do conhecimento, Garcia observou: “Encaramos as práticas da educação não-formal como passíveis de ser aplicadas a todos os grupos etários, de todas as classes sociais e em contextos socioculturais diversos” (SIMSON, PARK e FERNANDES, 2007, p. 3720 apud GARCIA, 2009, p. 63). Como exemplo, temos a própria prática do escotismo. O público que adere ao Movimento Escoteiro apresenta uma diversidade social, econômica e cultural, (apresentaremos o seu perfil mais adiante neste trabalho), que auxilia-nos na compreensão da educação não-formal para além das ações voltadas para “atender a crianças e jovens das classes populares em situação de risco social21” (GARCIA, 2009, p. 67), apesar desse ser um dos objetivos de diversas ações desse tipo de educação.

Definindo as especificidades da educação não-formal, Silva (2010) classificou como “alternativos” os espaços onde ela é desenvolvida. Por contar com “metodologias e sequências cronológicas diferenciadas e com conteúdos curriculares flexíveis e adaptados segundo a realidade do grupo social atendido”, os espaços de educação não-formal:

Localizam-se em territórios que acompanham as trajetórias de vida dos grupos de indivíduos fora das escolas. São locais onde há processos interativos. "Há intencionalidade no ato de participar, de aprender e de transmitir” (GOHN, 2006a, s/p).

4.16. A Relação Professor-Aluno

A relação entre mestres e aprendizes, configurada hierarquicamente nas instituições de educação formal, tem outros formatos na educação não-formal. Nela, existe um consenso entre quem aprende e quem ensina: a diferença em relação à escola é a postura de quem assume o lugar de mediador da aprendizagem, pois este terá que compartilhar o seu protagonismo com os próprios aprendizes, com os interesses desses e até mesmo com o ambiente onde ocorrem as ações.

Está posto um desafio para quem se dispõe a ser educador (social, no caso): não incorporar o papel do professor. Sobre o trato entre ambos os sujeitos em questão, Garcia (2009) escreveu que: “Considerando as relações de ensino-aprendizagem, tanto os educandos, quanto os educadores experimentam essas relações de uma maneira diferente, inclusive em papéis sociais que não são os de alunos e professores” (p. 62).

Já nos referimos ao público diversificado que frequenta a educação não-formal, que abrange desde alunos aos quais é oferecida uma opção de atividades no contraturno das escolas, passando por cidadãos em busca de qualificação profissional, indo até jovens, adultos e idosos a procura de lazer, cultura ou ativismo social. Quanto aos educadores na educação não-formal, Almeida chama-os de coordenadores de atividades (2011, p. 72), tal função é uma realidade no escotismo, onde temos monitores e auxiliares responsáveis pelos escoteiros mais jovens, que zelam para que as atividades ocorram conforme o programado. O trabalho dos agentes responsáveis por colocar em prática as propostas de ensino na educação não-formal tem na escola se não um referencial, pelo menos uma inspiração. Percebemos esta estratégia, por exemplo, no ato de planejar as atividades, algo corriqueiro no trabalho dos docentes.

Apesar de alguns pontos de interseção, a relação “professor-aluno” na educação não-formal apresenta um mínimo de hierarquização e de formalização. Podemos inferir que a subordinação a qual o educando é submetido na escola, se torna incipiente nos espaços de educação não-formal. Sobre os “professores” da educação não-formal, Garcia descreveu-os assim:

Vale a pena pontuar que o animador sócio-cultural não é compreendido como um educador, uma vez que seu papel não é ensinar, e sim intervir. São programas de intervenção, visando a transformação. O animador sócio-cultural tem a função de dar vida e pôr em movimento. Muitas pessoas que optam por essa atividade profissional têm inclusive uma atuação militante, uma vez que escolhem atuar com grupos específicos e viabilizar através de sua atuação pequenas transformações no grupo determinado, na comunidade ou mesmo em coletivos maiores (GARCIA, 2009, p. 47).

Seja coordenador, animador ou monitor, os profissionais e voluntários que encontraremos nos espaços não-formais serão os líderes comunitários, os artesãos, os artistas, os líderes religiosos, os ambientalistas, alguns políticos, profissionais da saúde e da educação, dentre tantos outros, que, como expôs a autora, militarão pela cidadania.

4.17. Educação Formal, Não-Formal e Informal

Neste exercício de comparar educação formal e não-formal, partindo de categorias de análise que se aplicam a ambos os tipos de educação, traremos para esta pesquisa um terceiro conceito, que poderá ter alguns de seus aspectos entrecruzados com os que já expomos, a educação informal. Sobre esta, Brandão (2007, p. 20) considerou que o ato de educar e aprender encontra-se diluído no dia-a-dia de todas as pessoas. O autor entende a educação informal como “situações pedagógicas interpessoais”. Seja na família ou na comunidade, tais situações ocorrem sistematicamente, provocando uma dinâmica onde “os que sabem: fazem, ensinam, vigiam, incentivam, demonstram, corrigem, punem e premiam”. E os que não sabem, normalmente os mais jovens: espiam o cotidiano, observam o fazer, “imitam, são instruídos com o exemplo, incentivados, treinados, corrigidos, punidos e premiados” (Ibidem).

As trocas entre esses três tipos de educação foram sintetizadas por Libâneo assim:

Colocamos num extremo a educação informal, no outro a educação formal e, no meio, a educação não-formal. Por ser esta um tipo intermediário, tem conexões muito próximas com as outras duas, porém distinguindo-se da primeira por implicar ações educativas intencionais e deliberadas e com um grau mínimo de organização, e da segunda, por realizar-se fora do âmbito do escolar convencional, ainda que nem por isso escape de certa “formalidade” (LIBÂNEO, 2002, p. 95).

Para Gohn, “a educação informal decorre de processos espontâneos ou naturais, ainda que seja carregada de valores e representações, como é o caso da educação familiar” (2005, p. 99). Para diferenciar educação não-formal e informal a autora pontua dois aspectos: primeiro, a educação informal tem “caráter permanente”, porque “ocorre nos espaços de possibilidades educativas no decurso da vida dos indivíduos, como a família”. Segundo, porque “o termo informal não abrange as práticas coletivas organizadas em movimentos, organizações e associações sociais22” ‒ isso é feito pela educação não-formal, como no escotismo, por exemplo. Em síntese, para Gohn (2005), os únicos elementos diferenciadores entre a educação não-formal e a educação informal seriam a organização e a estrutura do processo de ensino-aprendizagem.

Voltando à oposição formal versus não-formal, temos Oliveira (2008, p. 42), destacando que dentre as divergências entre os dois tipos de educação, a não fixação de tempos, espaços, além da flexibilidade na adaptação dos conteúdos” são os principais diferenciais entre ambas modalidades.

Temos ainda mais uma terminologia que aproxima os seus conceitos dos da educação não-formal, sem, no entanto, tratar-se de um sinônimo da mesma, nos referimos à educação social, problematizada por Petrus (2003):

Até hoje, por motivos que não vêm ao caso citar aqui, definíamos a educação social em contraposição à escola. Educação formal, não-formal e informal tem sido uma terminologia que serviu para separar conceitualmente espaços educativos. Mas, atualmente, resulta de todo incorreto recorrer a essa classificação, principalmente por ser imprecisa e criar confusão. Além do mais, não-formal e educação escolar não são duas realidades opostas ou separadas (p. 63).

A articulação entre a educação formal e a não-formal é algo contemporâneo. Gohn menciona em seu livro “Educação Não-Formal e Cultura Política” (2005) dois exemplos deste entrecruzamento em Belo Horizonte: a abertura física da escola como espaço alternativo de lazer e associativismo à comunidade23, e o Orçamento Participativo24 ‒ definido pela autora como política social de cunho participativo. Neste último exemplo, Gohn identifica “momentos pedagógicos” típicos da educação não-formal ‒ participação cidadã da comunidade “combinada com programas público-governamentais voltados para áreas sociais” (GOHN, 2005, p. 14; 105).

4.18. O Histórico

Pensando em pioneirismo acerca do debate sobre educação não-formal, Garcia (2009, p. 45) destaca a contribuição do americano Philip Coombs25. A autora analisou a obra “A Crise Mundial da Educação” (1986), onde Coombs reflete sobre a questão, candente naquele contexto, o que o levou a identificar na educação não-formal uma possibilidade para auxiliar as soluções dos problemas do campo educacional mais amplo.

No Brasil, múltiplos fatores contribuíram para que a educação não-formal se estabelecesse. Entre 1960 e 1990 destacam-se: a adesão do Estado a uma orientação neoliberal, o desmantelamento de políticas sociais e a alteração nas relações de trabalho, (OLIVEIRA, 2008, p. 37), estes três fatos mobilizaram a sociedade civil, impelida a “dividir com os governos a responsabilidade sobre a garantia dos direitos universais da população” (Ibidem), dentre eles a oferta de educação, no caso, educação não-formal.

Para Oliveira (2008), este ativismo social de setores da sociedade civil pretendia “responder às necessidades da população, que, afetada pelas mudanças na realidade econômico-social do país, encontrava-se num processo de marginalização e exclusão” (p. 37). Devido o perfil do público ao qual as ações educacionais não-formais eram direcionadas, esta mobilização social em prol do ensino era frequentemente identificada como educação popular (Ibidem).

Em sua dissertação de mestrado, Maria Rita Oriolo de Almeida (2011) elaborou uma síntese do contexto histórico em que as discussões sobre educação não-formal estavam mais agitadas, sendo que a autora também recorre ao termo educação popular:

A partir do levantamento histórico de Trilla-Bernet26, pode-se dizer que a discussão sobre educação não-formal surge primeiramente nos Estados Unidos, Europa e somente mais tarde no Brasil. É na década de 1980 que começa a ganhar força e representatividade no país, a partir das campanhas de alfabetização, educação de jovens e adultos, educação para o trabalho e projetos de educação popular. Neste período, as obras de Paulo Freire são de extrema importância para a disseminação de outras formas de se fazer educação no Brasil. Suas contribuições com “Educação como prática da liberdade” (1974) e “Pedagogia do Oprimido” (1975) mostram a importância da educação popular neste processo (ALMEIDA, 2011, p. 69).

A autora cita outros marcos nas discussões e pesquisas sobre educação não-formal no Brasil, dentre eles a “institucionalização da disciplina de educação não formal no curso de Pedagogia da Faculdade de Educação da Unicamp” em 1989, e

[...] a primeira publicação que menciona a educação não-formal, considerando-a como um conceito já em uso, é o livro de Carlos Alberto Torres – A Política da educação não-formal na América Latina, publicado no Brasil em 1992, traduzido do inglês (The Politics of nonformal education in Latin America, 1990) (GARCIA27, 2009, p. 127 apud ALMEIDA, 2011, p. 70).

Contextualizando a ascensão do terceiro setor no Brasil, Gohn (2005) destaca que a partir dos anos 1990, por causa de mudanças na economia, na sociedade e no mundo do trabalho, somadas aos “apelos da mídia”, ocorreu uma valorização “dos processos de aprendizagem em grupos”, ao mesmo tempo, surge a necessidade, por parte da sociedade, de “aprendizagem de habilidades extra-excolares”, favorecendo o campo da educação não-formal, percebida como uma novidade (em relação à escola) (p. 92). Um exemplo da importância creditada à educação extra-escolar, foi a sua inserção nas discussões realizadas na Conferência Mundial sobre Educação Para Todos, realizada em Jomtien, na Tailândia, em 1990. Os documentos “Declaração mundial sobre educação para todos” e “Plano de ação para satisfazer necessidades básicas da aprendizagem”, resultantes das discussões na Conferência, reconheceram as experiências de ONGs em programas de educação, indicando, com isso, “novas possibilidades de trabalho” na área educacional, e definiram dentre as “necessidades básicas da aprendizagem”, conteúdos normalmente propostos pelos programas de educação não-formal, como “valores e atitudes para viver e sobreviver” (GOHN, 2005, p.92).

Um dos desdobramentos de Jomtien, foi a definição de “parâmetros de educação básica de qualidade”, ratificados por todos os países signatários dos documentos citados, dentre eles o Brasil, que, de acordo com Oliveira (2008, p. 36), se inspirou nas noções provenientes do encontro, para a elaboração da LDB, Lei nº 9.394/96. A autora observa que, a partir da Declaração Mundial sobre Educação Para Todos e do Plano de Ação Para Satisfazer Necessidades Básicas da Aprendizagem, foi atribuído “um significado mais amplo à educação”, reforçando o entendimento desta como “um processo que acontece em diversas esferas de vida e instituições sociais, embora tenha a escola fundamental como seu agente principal” (Ibidem).

4.19. Os Tempos

A abrangência temporal nas ações da educação não-formal, permite que elas atinjam educandos nas diferentes fases da vida, como observou Gohn:

(...) a educação [não-formal, associada ao conceito de cultura] é abordada enquanto forma de ensino-aprendizagem adquirida ao longo da vida; pela leitura, interpretação e assimilação dos fatos, eventos e acontecimentos que os indivíduos fazem, de forma isolada ou em contato com grupos e organizações (GOHN. 2005, p.97).

Partindo da visão de Gohn, podemos inferir que o aspecto temporal nos processos de ensino-aprendizagem na educação não-formal serão influenciados pelo espaço onde as ações são desenvolvidas. Seja no lar, através de leituras ou rodas de conversa; na rua, visitando instalações culturais, como exposições ou apresentações artísticas, e mesmo em espaços virtuais, onde, para além da educação a distância, ocorrem processos de ensino-aprendizagem não-formais por meio das interações interpessoais entre especialistas e aprendizes ou entre estes sujeitos e a sociedade organizada em comunidades virtuais, engajadas em diferentes frentes, para atender a diversas demandas. Em todas estas situações, percebe-se que o tempo para a assimilação dos conceitos e ideias socializados, está subordinado ao interesse e à disponibilidade do educando.

O tempo para a aprendizagem na educação extra-escolar poderá subordinar-se aos tempos da educação formal. A exemplo das ONGs e demais espaços que oferecem suas atividades considerando o contraturno escolar de crianças, jovens e adultos; outras que programarão suas ações somente para os fins de semana, visando atingir o público que possui vínculos empregatícios; além das ações que se organizarão para desenvolver suas propostas no período das férias escolares.

Não tendo como finalidade principal diplomar ou promover seus participantes a partir das atividades desenvolvidas, como já expomos, ainda assim os programas educativos na educação não-formal poderão estabelecer cronogramas, visando manter ou reprogramar propostas, e com isso, a questão temporal ou a duração do processo, poderá demandar uma decisão democrática entre os participantes. Sobre esse aspecto Gohn destacou que:

As categorias de espaço e tempo também têm novos elementos na educação não-formal, porque o tempo de aprendizagem, usualmente, não é fixado a priori, e se respeita as diferenças existentes para a absorção e reelaboração dos conteúdos implícitos ou explícitos no processo ensino-aprendizagem (GOHN, 2005, p. 101).

Lembramos que os projetos de educação não-formal não se esgotam em cursos e oficinas. O tempo dedicado às atividades pode ser convertido em apresentações e encontros pontuais e esporádicos; campanhas educativas com duração predeterminada ou indefinida; excursões ou temporadas, flexibilizando o tempo de aprendizagem em função das situações vivenciadas.

4.20. Os Rituais

Um ritual ‒ aqui entendido como um conjunto de gestos, palavras e formalidades imbuídos de um valor simbólico e que ocorre em concomitância de sujeitos, tempos e espaços28 ‒ no âmbito da educação não-formal, reflete-se nas práticas de socialização, sendo que delas decorrem conceitos como capital social e capital humano29.

Estas práticas de socialização realizadas nas ações da educação não-formal, constituem um processo global de aprendizagem, no qual saberes e habilidades são despertados (BRANDÃO, 2007, p. 23). Somados, estes dois conceitos contribuem para a formação de identidades, ideologias e modos de vida de grupos sociais (Ibidem), a exemplo dos que reúnem-se em torno das ações da educação não-formal. Portanto, as situações de aprendizagem, aliadas aos discursos, corroboram para que, por exemplo, artistas, ambientalistas ou escoteiros sejam formados e incentivados a se reconhecerem como tais. Este processo, entendido aqui como um ritual, está diretamente ligado às vivências e à socialização que, juntas, realizam “as necessidades e projetos da sociedade, e realiza em cada um de seus membros, grande parte daquilo que eles precisam para serem reconhecidos como ‘seus’ e para existirem dentro dela” (BRANDÃO, 2007, p. 23).

Retomando os conceitos de capital social e capital humano, entendemos que esses fazem parte do ritual de socialização da educação não-formal enquanto valores simbólicos. A noção de capital social30 implica na sociabilidade de um grupo humano, por meio de redes sociais, por exemplo. Esta noção vai ao encontro de um dos objetivos da educação não-formal, a socialização de conhecimentos e aprendizagens. Quanto ao conceito de capital humano (normalmente associado ao mundo do trabalho e da economia 31), envolve um conjunto de conhecimentos, competências e atributos adquiridos por meio da educação, perícia e experiência. Sua relação com o ritual de socialização da educação não-formal se dá na medida em que viabiliza, por meio dos três fatores citados, inclusão social, capacitação para o próprio sustento econômico, acesso aos bens culturais e à cidadania, que é a finalidade última da educação não-formal. Deste modo, seja com ações do tipo arte-educação, valorização da oralidade e da memória, cooperativas de trabalho ou salas de estudo, ocorrerão rituais de admissão, iniciação e construção de cidadãos. Sobre esses processos de aprendizagem Gohn escreveu:

Mesmo onde ainda não criaram a escola, ou nos intervalos dos lugares onde ela existe, cada tipo de grupo humano cria e desenvolve situações, recursos e métodos empregados para ensinar às crianças, aos adolescentes, e também aos jovens e mesmo aos adultos, o saber, a crença e os gestos que os tornarão um dia o modelo de homem ou de mulher que o imaginário de cada sociedade idealiza (GOHN, 2005, p. 22).

4.21. Pedagogia Social e Educação Social – Vínculos Com a Educação Não-Formal

O autor espanhol Jaume Trilla-Bernet, é referência nas pesquisas sobre educação não-formal e Pedagogia Social. Esta última trata de um “universo educativo” no qual a educação não-formal está incluída, pois ambas as áreas possuem um núcleo em comum como referência: os contextos educativos não-escolares (TRILLA, 2003, p. 16-21).

Admitindo que os âmbitos de atuação da pedagogia social são preferencialmente não-formais, é necessário acrescentar a seguir que o uso de ambas as expressões logo adverte que, nem o que chamamos pedagogia social se esgota no que chamamos educação não-formal, nem vice-versa (Ibidem, p. 22).

Quanto à educação social ‒ conceito que também entrecruza seus aspectos com os da educação não-formal ‒, Antoni Petrus (2003) considera que ela se refere aos âmbitos educativos, dentre eles as instituições formais e não-formais de ensino. Para Petrus, os discursos políticos, as leis, as cidades e a economia educam os cidadãos, seja ampliando ou limitando a atuação destes (p. 52). Tais contextos educativos têm, para o autor, “mais influência pedagógica que a própria escola ou as políticas sociais” (Ibidem). Somam-se aos âmbitos educativos supracitados, os meios de comunicação, que “incidem em qualquer um de nossos educandos tanto ou mais que o sistema escolar” (PETRUS, 2003, p. 52).

4.22. A Tecnologia

Um espaço contemporâneo e evidentemente propício às ações e situações de educação não-formal é o ciberespaço ̶ composto pelos suportes que dão acesso à comunicação digital, juntamente com o universo aparentemente ilimitado de informação abrigada em servidores localizados na Terra e nas “nuvens”, cujos manipuladores são seres humanos ou robôs que alimentam este universo com mais informação e acessos (LEVY, 1999, p. 17)32. Nele, profissionais da área educacional, ativistas sociais, comunidades científicas, crianças e jovens assumem papéis antes restritos às instituições de ensino reconhecidas. Esses internautas comunicam, debatem, apresentam suas criações e invenções, difundem as atualizações das diversas ciências, produzem e reproduzem uma gama de atividades artísticas e culturais, e ensinam, por meio de dicas, consultorias, macetes, atalhos ou expondo comportamentos, os chamados “estilos de vidas”.

Em qualquer lugar do mundo onde se esteja conectado à rede mundial de computadores, teremos potenciais divulgadores dos saberes historicamente produzidos e acumulados. Através dos vídeos e hipertextos que disponibilizam à audiência da web uma infinidade de informação, com potencial para transformar-se em conhecimento, talvez por meio da educação não-formal:

A criação de sites na rede é hoje um fato comum e cada vez mais praticado. Eles exibem uma gama de produtos caracterizados por mercadorias como: estudos, pesquisas e curiosidades gerais que se mostram atrativos e chegam ao usuário quase sempre de forma agradável em circunstâncias favoráveis de apropriação, que podem se reverter em instrumentos de educação a distância selecionados pelo próprio educando (SOARES, 2001, p. 82).

4.23. O Que é Educação?

Buscamos até aqui definir o que é a educação não-formal comparando-a com os demais tipos de educação. Neste ponto, indagamo-nos sobre “o que é a educação?”. Para responder a essa pergunta recorremos a Carlos Rodrigo Brandão (2007), que em seu livro (que apresenta o mesmo título da questão colocada), faz a seguinte reflexão:

Ninguém escapa da educação. Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um modo ou de muitos todos nós envolvemos pedaços da vida com ela: para aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação (BRANDÃO, 2007, p. 07).

A ideia de que a “educação existe difusa em todos os mundos sociais” ‒ esses, abrangendo desde sociedades tribais até países industrializados ‒ resulta em “incontáveis práticas” educativas, que realizam-se seja de forma rudimentar ‒ sem classes de alunos, sem livros e sem professores especialistas ‒ ou por meio das escolas, levando Brandão a concluir que: “A educação é, como outras, uma fração do modo de vida dos grupos sociais” (2007, p. 10). Temos aqui a primeira resposta para o nosso questionamento.

Para exemplificar esses mundos sociais aos quais Brandão se refere, onde as educações formal e não-formal não são explicitamente referidas, mas ocorrem subentendidas, o autor relata no livro33 uma pesquisa realizada por antropólogos no início do século XX, transcorrida no habitat de sociedades tribais das Américas, da Ásia, da África e da Oceania. Os pesquisadores que analisavam as “culturas primitivas”, descreveram com rigor, segundo Brandão, o cotidiano dessas comunidades, mas, quase nenhum deles usou a palavra educação, embora quase todos, de algum modo, tenham relatado algo sobre as “relações cotidianas ou cerimônias rituais em que crianças aprendem e jovens são solenemente admitidos no mundo dos adultos” (2007, p. 16), fazendo com que Brandão decifrasse nesta rotina o teor da nossa questão.

Quando os antropólogos pouco falam em educação, eles pouco querem falar de processos formalizados de ensino. Porque, onde os andamaneses, os maori, os apaches ou os xavantes praticam, e os antropólogos identificam processos sociais de aprendizagem, não existe ainda nenhuma situação propriamente escolar de transferência do saber tribal que vai do fabrico do arco e flecha à recitação das rezas sagradas dos deuses da tribo. Ali, a sabedoria acumulada do grupo social não “dá aulas” e os alunos, que são todos os que aprendem, “não aprendem na escola”. Tudo o que se sabe aos poucos se adquire por viver muitas e diferente situações de trocas entre pessoas, com o corpo, com a consciência (...) (BRANDÃO, 2007, p. 17-18).

Para elucidar a questão, o conceito de endoculturação34 ‒ o qual já usamos para explicar a educação formal ‒ é retomado pelo autor, pois ajuda a explicar o que é a educação (generalizada), entendida como “uma fração da experiência endoculturativa”, que

aparece sempre que há relações entre pessoas e intenções de ensinar-e-aprender”. Intenções, por exemplo, de aos poucos “modelar” a criança, para conduzi-la a ser o “modelo” social de adolescente e, ao adolescente, para torná-lo mais adiante um jovem e, depois adulto (BRANDÃO, 2007, p. 24).

Na elaboração da resposta para a questão colocada, Brandão (2007), busca referências nos pedagogos, mestres-escola e nos sofistas da Grécia Antiga para ilustrar um contexto em que, mesmo sem escolas, as práticas de ensinar e aprender eram valorizadas tanto quanto hoje. O autor afirma que quando os gregos pensavam em educação, pensavam na verdade “no próprio ideal da cultura grega” (2007, p. 37).

A primeira educação que houve em Atenas e Esparta foi praticada entre todos, nos exercícios coletivos da vida, em todos os cantos onde as pessoas conviviam na comunidade. Quando a riqueza da polis grega criou na sociedade estruturas de oposição entre livres e escravos, entre nobres e plebeus, aos meninos nobres da elite guerreira e, mais tarde, da elite togada é que a educação foi dirigida. Por alguns séculos, mesmo para eles, ainda não havia escola (Ibidem).

Seja nas relações familiares ou na convivência entre os jovens, os gregos já conservavam entre grupos de meninos educandos e velhos educadores, a ideia de que todo o saber que se transfere pela educação circula através das trocas interpessoais, das relações físicas e simbolicamente afetivas entre as pessoas (BRANDÃO, 2007, p. 38). Ideal comungado pela educação não-formal, inclusive tendo em vista a relação minimamente hierarquizada entre educador e o educando defendida por esta.

A figura do pedagogo (nossa), remontando o tempo em que a relação entre educadores e educandos era uma relação entre homens livres e homens escravizados, foi descrita por Brandão assim:

Diferenças curiosas entre os tipos de educadores da Grécia antiga (...). De um lado, desprezíveis mestres-escola e artesãos-professores; de outro, escravos pedagogos e educadores nobres, ou de nobres. (...) de todos estes adultos transmissores do saber vale a pena falar do pedagogo: velhos escravos, quase sempre cativos estrangeiros, conduzindo crianças a caminho da escola de primeiras letras. (...) eles conviviam com a criança e o adolescente e, mais do que os pais, faziam a educação dos preceitos e das crenças da cultura da polis (BRANDÃO, 2007, p. 42).

Esse retorno a épocas remotas, dentro desta nossa busca pelos significados da educação e, em especial, da educação não-formal, mostrou como é possível perceber a natureza múltipla dessa última, recorrendo a momentos históricos distintos. Brandão, lembra-nos que “a civilização clássica não conservou sempre um único modelo ou estilo de saber, logo, de educação” (2007, p. 43), pois oscilava entre “duas formas de algum modo antagônicos: a filosofia, cujo tipo dominante [era] Platão, e a oratória (retórica), cujo tipo dominante [era] Isócrates”. A conclusão a qual o autor chega, após buscar na antiga Grécia respostas para a pergunta inicial, não poderia ser mais adequada ao tema desta nossa pesquisa:

Finalmente, os gregos ensinam o que hoje esquecemos. A educação do homem existe por toda parte e, muito mais do que a escola, é o resultado da ação de todo o meio sociocultural sobre os seus participantes. É o exercício de viver e conviver o que educa (Ibidem, p. 47).

Para encerrar, relacionamos a esse ponto de vista de Brandão, a definição de Gohn, que estende os processos de ensino-aprendizagem para além das salas de aula formais:

Observa-se uma ampliação do conceito de Educação, que não se restringe mais aos processos de ensino-aprendizagem no interior de unidades escolares formais, transpondo os muros da escola para os espaços da casa, do trabalho, do lazer, do associativismo, etc. Com isto um novo campo da Educação se estrutura: o da educação não-formal. Ela aborda processos educativos que ocorrem fora das escolas, em processos organizativos da sociedade civil, ao redor de ações coletivas do chamado terceiro setor da sociedade, abrangendo movimentos sociais, organizações não governamentais e outras entidades sem fins lucrativos que atuam na área social; ou nos processos educacionais (GOHN, 2005, p. 7).

5. O MOVIMENTO ESCOTEIRO

O objeto desta pesquisa, o projeto educativo do Movimento Escoteiro (ME), terá seus conceitos apresentados neste capítulo a partir das mesmas categorias de análise usadas para investigar a estrutura da educação formal e da não-formal, nos capítulos anteriores. Cumprindo com um dos objetivos específicos nosso – comparar as três possibilidades de ensino-aprendizagem citadas – exploraremos o método educativo do ME, e com isso esperamos identificar as diferentes concepções pedagógicas nas múltiplas manifestações da educação.

Tendo inicialmente discorrido a respeito da macro dimensão da educação – a formal, representada pela escola – responsável por formar parte relevante da sociedade contemporânea; e, posteriormente sobre a educação não-formal, tratada como um desdobramento da primeira mas diferenciando-se principalmente pela flexibilidade de suas ações socioeducativas e pelo seu foco na problematização da cidadania; chegamos à nossa dimensão micro da educação: o escotismo, que com o seu projeto educativo apresenta objetivos que fazem intercessão com os da educação formal, da não-formal (da qual é um dos representantes) e também com os da educação informal. Com sua proposta de contribuir com a educação e o desenvolvimento de valores nos jovens, o ME se apresenta da seguinte forma:

Somos um movimento de jovens e para jovens, com a colaboração de adultos, unidos por um compromisso livre e voluntário. Somos um movimento de educação não formal, que se preocupa com o desenvolvimento integral e com a educação permanente dos jovens, complementando o esforço da família, da escola e de outras instituições (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 4).

5.1. Os Objetivos

O Estatuto do ME brasileiro apresenta todos os objetivos da proposta educativa da entidade, dentre eles, o de “contribuir para que os jovens assumam seu próprio desenvolvimento” (ESTATUTO, 2011, p. 8), pois o escotismo acredita que os seus praticantes, à medida que acumulam diferentes graus de maturidade, conseguem se autoeducar para as diferentes demandas da vida. Para atingir a esse e a outros objetivos, o Movimento tem, como uma de suas estratégias, o intercambio junto às instituições com potencial incidência na vida dos jovens: “O Escotismo, como força educativa, propõe-se a complementar a formação que cada criança ou jovem recebe de sua família, de sua escola e de seu credo religioso, e de nenhum modo deve substituir essas instituições” (Ibidem).

Com o objetivo de munir os jovens de autonomia e de responsabilidades, a autoeducação é um dos fins do escotismo: “Nosso propósito é contribuir para que os jovens assumam seu próprio desenvolvimento, especialmente do caráter, ajudando-os a realizar suas plenas potencialidades físicas, intelectuais, sociais, afetivas e espirituais” (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 6).

Outro objetivo presente no projeto do ME é o desenvolvimento nos jovens da “capacidade de pensar criativamente” (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 4); objetivo esse que vai ao encontro do que escreveram Garcia (2005, p. 35) e Gohn (2005, p. 104) ao definirem a educação não-formal, respectivamente: “É interessante que a educação não-formal facilite o processo criativo, como também, em suas propostas, saiba provocar esse processo e lidar com ele”; “A maior importância da educação não-formal está na possibilidade de criação de novos conhecimentos, ou seja, a criatividade humana passa pela educação não-formal”.

O ME posiciona-se acerca de eventuais distorções ou “falsas interpretações” em torno do seu projeto educativo, esclarecendo quais são seus reais objetivos finais:

A União dos Escoteiros do Brasil não apoia, nem permite falsas interpretações, falsas apresentações e falsas aplicações do Escotismo, quer como escola de combate ao analfabetismo ou de ensino regular, quer como forma de organização interna em escolas, orfanatos, internatos ou asilos, quer como instituição de caridade para crianças pobres, quer como solução para problemas de menores abandonados, desvalidos ou delinquentes, quer como instituição pré-militar, paramilitar ou militarizada. Reconhece, no entanto, que o Método Escoteiro é um elemento auxiliar de educação que pode ser útil às instituições acima mencionadas (P.O.R., 2011, p. 17).

5.2. As Características

O Movimento Escoteiro é uma entidade com currículo, metodologia e regimento próprios. O órgão máximo responsável por controlar a estrutura da entidade nacionalmente é a União dos Escoteiros do Brasil (UEB). O estatuto da entidade, em sua versão de 2011, esclarece sobre as condições para o estabelecimento de grupos escoteiros no País:

Art. 1º - A União dos Escoteiros do Brasil, “UEB”, fundada em 04 de novembro de 1924, é uma associação de âmbito nacional, de direito privado e sem fins lucrativos, de caráter educacional, cultural, ambiental, beneficente e filantrópico, e reconhecida de utilidade pública, que congrega todos quantos pratiquem o Escotismo no Brasil.

§ 1º - O Escotismo só pode ser praticado no Brasil por pessoas físicas ou jurídicas autorizadas pela UEB (...)

Art. 2º - São fins da UEB:

I - organizar, fiscalizar e desenvolver o Escotismo no Brasil, sob a supervisão dos órgãos do nível nacional;

II - representar o Escotismo Brasileiro junto aos poderes públicos, setores da atividade nacional e organizações internacionais; III - propiciar a educação não-formal, valorizando o equilíbrio ambiental e o desenvolvimento do propósito do Escotismo, junto às crianças e jovens do Brasil, na forma estabelecida pelo P.O.R. - Princípios, Organização e Regras e pelo “Projeto Educativo” da UEB.

§ 1º - Entre as atividades da UEB está a de suprir os seus órgãos, os praticantes do Escotismo e o público em geral de literatura específica, bem como de distintivos, materiais e equipamentos necessários e convenientes para a prática escoteira (ESTATUTO, 2011, p. 5-6).

A literatura específica a qual a UEB refere-se na citação acima, constituiu as nossas fontes primárias nesta pesquisa. Tratam-se de apostilas, manuais, guias e do portal na web destinados à formação das crianças e dos jovens, iniciantes e veteranos no ME, além de servirem à instrução dos integrantes adultos do Movimento ‒ dirigentes, escotistas e chefes, como são conhecidos os adultos que apoiam e auxiliam o desenvolvimento dos mais novos.

A apostila “Curso Preliminar Linhas: Dirigente Institucional e Escotista” (2012) ‒ a qual referenciaremos apenas como Curso Preliminar ‒ é uma das publicações da UEB. Dela extraímos as orientações direcionadas aos adultos que lidam com a rotina dos jovens escoteiros. Como o titulo indica, trata-se de uma apostila destinada aos cursos de formação desse pessoal. O “Estatuto 2011” (2011) é outra de nossas fontes, apresentado como um texto legislativo, com títulos, capítulos, artigos e parágrafos, ele prescreve os parâmetros que devem reger a prática do escotismo no Brasil. A publicação “Princípios, Organização e Regras 2013” (utilizamos a versão publicada pela UEB em 2014), como indica o próprio título, é um manual que descreve as regras que perpassam todos os aspectos educativos e estruturais do ME (ao longo do texto, trataremos esta publicação como P.O.R., tal como é conhecida pelos membros do escotismo). As demais fontes, que também são guias ou manuais, que ora interpretam, ora formulam as diretrizes do escotismo são: “Programa de Jovens: objetivos finais e intermediários” (s/d) ‒ título reduzido por nós: “Programa de Jovens” ‒ , “Escotismo e Valores: uma contribuição na educação para a vida e na construção de um mundo melhor” (s/d) ‒ ou apenas “Escotismo e Valores” nas referências de nossas citações. Outra fonte é o “Projeto Educativo do Movimento Escoteiro” (s/d), ou só “Projeto Educativo”, uma compilação das atualizações que a Projeto Educativo35 do ME sofreu, de modo especial na década de 1990, período em que a entidade sentiu a necessidade de se reafirmar como programa de formação para os jovens, realizando, em âmbito mundial, discussões acerca dos objetivos institucionais:

Também foi nesse mesmo período [entre 1998 e 1993] que surgiram, no nível mundial, os primeiros documentos onde se apontava a necessidade de desenvolver e implantar uma Política Mundial de programa de Jovens (Youth Programme), enfatizando o papel do Movimento Escoteiro como o mais antigo e o mais difundido movimento destinado à educação não formal de crianças e jovens (s/d, p. 3).

As publicações feitas pela UEB têm como referência os parâmetros internacionais do escotismo. São documentos que trazem textos traduzidos de compêndios editados e impressos na Europa, Canadá, Estados Unidos e na América Latina. Configuram-se tipicamente em tutoriais, apresentam tanto uma linguagem inteligível, quanto uma série de termos que somente quem está inserido no escotismo assimilará com facilidade. Chama a atenção para nós, estudantes de Pedagogia, em relação a tais publicações, as referências que embasam teoricamente o Movimento. Além das já citadas obras estrangeiras, o escotismo delimita em seu Projeto Educativo períodos e fases do desenvolvimento evolutivo de crianças e adolescentes, que orientam a proposta pedagógica de trabalho com esses jovens. Com isso, percebemos imbricações da ideologia do ME com a área da psicologia infanto-juvenil. No entanto, nossas fontes primárias, não fazem menção sobre as teorias do desenvolvimento cognitivo e da aprendizagem, problematizadas por várias áreas do conhecimento.

A UEB, na apresentação do guia Escotismo e Valores, reconhece os limites da responsabilidade que suas publicações têm na instrução dos seus membros:

O Método Escoteiro prega a necessidade de aceitação dos valores expressos na Lei pelos membros do Movimento. Isso, entretanto, é extremamente subjetivo e não traduz a forma como a questão deve ser trabalhada e, por outro lado, também não explica de que forma os resultados são alcançados. É isso que, modestamente, se pretende explicar nesta pequena cartilha (ESCOTIMO E VALORES, s.d, p. 3).

Esta mesma edição traz outra passagem importante a respeito da visão que o escotismo tem de si próprio. Trata-se da reprodução do discurso ocorrido em 1997, na 29ª Conferência Geral da UNESCO, em Paris, quando Dr. Jacques Moreillon – Secretário Geral da Organização Mundial do Movimento Escoteiro à época – que disse:

“Déficit entre educação e ensino! Déficit entre independência e autonomia! Déficit entre preços e valores! É enorme o desafio enfrentado por nossa sociedade. Mas é um desafio que pode ser vencido pela educação não formal oferecida pelos movimentos de juventude, particularmente por aqueles que propõem padrões sociais e atitudes baseados em um sistema estruturado de valores. Esses movimentos partilham as características de participação voluntária, aprendizagem progressiva pela experiência, amizade e estreito relacionamento entre jovens e adultos - todas intimamente ligadas com a estruturação da personalidade, ao estabelecimento de uma escala de valores e à noção de cidadania, que os levará a serem os atores principais do mundo de amanhã” (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 28).

Uma das características do Movimento Escoteiro é ter o seu projeto norteado por princípios. Estes são comunicados a todos os seus participantes já de início e consistem no tripé apresentado no início deste trabalho: dever para com Deus, dever para com o próximo e dever para consigo mesmo; estes três princípios são a expressão dos valores que regem o escotismo (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 16).

O princípio “dever para com Deus” é interpretado pela instituição como um convite direcionado aos jovens, para que esses assumam “a mensagem de sua fé” e vivenciem-na em suas comunidades de confissão religiosa (Ibidem). O ME orienta que esses jovens sejam “fiéis a suas convicções, seus símbolos e suas celebrações” (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 8). Estas orientações são direcionadas aos jovens com algum tipo de fé religiosa, mas o escotismo prega um ideal de respeito ao outro, não fazendo restrições aos membros fora desse perfil.

Quanto ao princípio “dever para com o próximo”, o escotismo o concebe como uma das formas de exercer o patriotismo, sem ufanismo, a orientação é voltada para que os escoteiros assumam uma postura definida como “lealdade ao País”. Além disso, o ME instrui seus membros a cooperarem com as comunidades em que estão inseridos e para além dela, formando uma corrente entendida como “Fraternidade Escoteira” (P.O.R., 2014, p. 12). Outro entendimento relacionado ao princípio em questão é o estímulo para que os jovens participem do “desenvolvimento da sociedade”, o que inclui o respeito à dignidade do ser humano e a preservação do meio ambiente (Ibidem).

O terceiro e último princípio, “dever para consigo mesmo”, tem a ver tanto com a autoeducação, quanto com o que o ME descreve para os jovens como: “usar progressivamente sua liberdade, assumir-se com responsabilidade, aprender a discernir e decidir, enfrentando as consequências de suas decisões e de seus atos” (Ibidem, p. 11).

O Movimento Escoteiro organiza a formação das crianças, pré-adolescentes e demais jovens a partir dos chamados “ramos”. Esses agregam o público-alvo do Movimento em faixas pré-definidas por recortes etários. Por analogia, podemos entender os ramos escoteiros como os anos dos ciclos de ensino da escola regular brasileira, mas a flexibilidade e os objetivos que perpassam o escotismo não deixam dúvidas a respeito da peculiaridade de cada uma dessas formas de agrupamento.

Descritos como marcos simbólicos, cada um dos ramos apresenta ênfases educativas distintas nas atividades propostas aos praticantes do escotismo. O ME tem a seguinte explicação para a fixação dos ramos escoteiros: “Definidas as áreas de atuação, levou-se em consideração as características gerais do desenvolvimento evolutivo da criança e do jovem e ratificou-se a divisão das faixas etárias entre os quatros ramos do Movimento Escoteiro” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 9). A tabela 1, a seguir, sintetiza os ramos escoteiros:

O DESENVOLVIMENTO EVOLUTIVO SEGUNDO O ESCOTISMO

IDADES PERÍODOS E FASES RAMOS

21


 


 


 


 

Adolescência


 

Juventude


 

Ramo Pioneiro

20

19

18

17

Primeira adolescência


 

Ramo Sênior

16

15

14


 

Pré-adolescência

Puberdade


 

Ramo Escoteiro

13

12

Pré-puberdade

11

10


 

Infância Intermediária

Infância Tardia


 

Ramo Lobinho

09

08

Infância Média

0736

Tabela 1: Os quatro ramos do Movimento Escoteiro37

Como se observa na tabela acima, no escotismo, “A Infância Intermediária é o período de desenvolvimento compreendido entre os 7 e os 10/11 anos de idade, aproximadamente” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 9), e os aspectos mais relevantes desta fase, na visão do Movimento, são: o abrandamento do crescimento corporal, a abertura das crianças para o mundo exterior e a intensa atividade de recreação e socialização entre os companheiros” (Ibidem). No projeto educativo do ME, esse público será inserido no “Ramo Lobinho”, para o qual foi estabelecido um programa que “concentra sua ênfase no processo de socialização da criança” (Curso Preliminar, 2012, p. 10). O ramo “Lobinho”, conhecido também como “Lobismo”, é inspirado na obra “O Livro da Jângal”, de Rudyard Kipling, e foi resumido em Mogli, o Menino-Lobo38.

A pré-adolescência e seus períodos (pré-puberdade e puberdade) situam os jovens entre 10/11 a 14/15 anos no “Ramo Escoteiro”. O escotismo entende este estágio da vida como: peculiar para a quebra da harmonia alcançada anteriormente, na infância (Ibidem, p. 11). Para o Movimento, tal rompimento comportamental na fase da pré-adolescência decorre do grande desenvolvimento físico vivenciado pelo jovem. A ênfase do projeto educativo para o ramo Escoteiro, onde os pré-adolescentes estão inseridos, é a criação e a ampliação da autonomia oferecida a esses membros, além do incentivo à vida em equipe (Ibidem).

Os membros juvenis na faixa etária entre 14/15 à 20/21 anos, se encaixam em um período descrito pelo ME como: “marcado por um processo de maturação biológica que transcende à área psicossocial, durante o qual se constroem e se aperfeiçoam a personalidade e o sentido de identidade” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 11). Outras características dessa fase são: o desenvolvimento da autonomia e a consciência moral. Para estes jovens o escotismo subdividiu-se em dois ramos: o “Ramo Sênior”, reservado para os adolescentes entre os 15 e 17 anos, cuja ênfase educativa é no “processo de autoconhecimento, aceitação e aprimoramento das características pessoais” (Ibidem).

O último ramo no escotismo é o “Pioneiro”. Agrupando jovens de 18 a 21 anos incompletos, suas recomendações são para que as atividades escoteiras para esse público, favoreçam o “processo de integração do jovem ao mundo adulto” e o incentivo à prestação de serviços à comunidade (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 11). Os jovens do ramo Pioneiro tiveram um significado especial neste trabalho, pois contribuíram respondendo aos questionários aplicados durante a nossa pesquisa de campo (os resultados serão apresentados mais a frente).

O lema “servir” representa os jovens do ramo Pioneiro (P.O.R., 2011, p. 64). Para esse ramo foi estabelecido um marco simbólico, algo típico no escotismo, representado pela expressão “tenho um projeto para minha vida”, uma reflexão proposta a todos os jovens que chegam ao ramo Pioneiro. Ao aceitarem o convite do ME para servirem ao próximo e ao próprio Movimento, os pioneiros precisam voltar sua atenção para áreas prioritárias definidas especialmente para eles:

No Ramo Pioneiro existem determinadas áreas que habitualmente atraem as iniciativas dos jovens, denominados de campos de atuação. Sem menosprezar a liberdade de opção [concedida aos jovens no escotismo], quatro campos de atuação são considerados como prioritários no Ramo Pioneiro: serviço, natureza, trabalho e viagem. Deve haver uma cuidadosa seleção das atividades e projetos, levando-se em conta que sejam realmente apropriadas para adultos e que estejam dentro das necessidades e possibilidades dos Pioneiros e do Clã39 (Ibidem).

Além dos ramos, o Movimento também caracteriza-se pelo seu programa educativo, componente do conjunto do escotismo, conforme o Curso Preliminar:

O Programa Educativo é um dos elementos de um sistema, ou seja, não pode ser analisado fora do conjunto – Propósito, Princípios e Método Escoteiro. O Propósito define o nosso objetivo, os Princípios definem nossa base moral, os valores que defendemos; o Programa atrai os jovens e desenvolve atividades, e o Método Escoteiro é a forma como o Programa é aplicado (2012, p.11).

O Programa e o projeto educativo do escotismo formam um currículo para o escotismo. Esse, por sua vez, apoia-se em um sistema de avaliação da progressão dos jovens realizada a partir de um conjunto de atividades específicas para cada ramo escoteiro. O programa educativo também oferece aos participantes oportunidades de se autoavaliarem, esta opção se insere nas atividades programadas. A partir da autoavaliação o escotismo pretende conscientizar seus membros sobre o “impacto das atividades escoteiras” em cada um deles (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 12).

Além da autoavaliação e da progressão entre os ramos, o programa educativo do ME estabeleceu também um “perfil de saída” para os jovens. O Curso Preliminar descreve este perfil como: as condutas apresentadas por alguém que vivenciou um bom período como “escoteiro” e que revelam-se quando, aos 21 anos, o jovem conclui todas as etapas do programa (2012, p. 12). Antes de apresentarem o perfil de saída desejado, os jovens terão que alcançar os “objetivos intermediários” do programa, distribuídos ao longo dos quatro ramos escoteiros, além de observarem as “condutas apropriadas” estabelecidas, essas, baseiam-se nos princípios e valores da organização (Ibidem, p. 13).

Percebe-se que a diferença mais visível em relação ao nível de exigência das condutas esperadas dos jovens, é em relação ao grau de autonomia estabelecido de acordo com a idade do integrante. Na lógica do escotismo, estes jovens terão inicialmente (proporcionalmente ao ramo em que se encontram) suas condutas condicionadas ao ponto de vista dos adultos que os cercam, e, posteriormente (a partir da adolescência), a demanda do escotismo passa a ser por sujeitos autônomos e capazes, formados pelo Movimento para dar conta do seu projeto educativo. Vejamos alguns exemplos de como tais exigências são colocadas:

OBJETIVOS EDUCACIONAIS DOS RAMOS

Áreas de desenvolvimento

Condutas esperadas/ objetivos intermediários do programa educativo para jovens

Exigências de acordo com o ramo Escoteiro

Ramos Lobinho (7 – 11 anos de idade)

Ramo Pioneiro (18 – 21 anos de idade)

Físico

Respeitar os horários das refeições.

Manter uma alimentação saudável e adequada.

Intelectual

Ler o material impresso apropriado à sua idade que lhe seja oferecido ou sugerido pelos pais, professores e Velhos Lobos.

Atualizar continuamente seus conhecimentos, mediante o autodesenvolvimento e a aprendizagem sistemática.

Social

Demonstrar boa vontade no

cumprimento de tarefas rotineiras em seu lar.

Participar ativamente da vida das

comunidades em que está inserido,

contribuindo para criar uma sociedade justa, participativa e fraterna.

Afetivo

Aceitar com tranquilidade separar-se de seus pais por curtos períodos, por ocasião de acantonamentos e outras atividades.

Alcançar e manter um estado interior de liberdade, equilíbrio e naturalidade emocional.

Espiritual

Participar das celebrações religiosas juntamente com sua família.

Aderir a princípios espirituais, vivenciando ou buscando uma religião que os expresse e aceitando os deveres que decorrem dessa

adesão.

Do caráter

Aceitar as sugestões de pais, professores e Velhos Lobos destinadas a corrigir seus erros.

Ser o principal responsável pelo seu

desenvolvimento, assumindo a vida

como um processo permanente de

aperfeiçoamento.

Quadro 3: Amostra dos objetivos intermediários (UEB, s/d, p. 14-29).

Em termos de organização e estrutura, os escoteiros são mais facilmente localizados nas UEL’s – Unidades Escoteiras Locais, que são os espaços onde as turmas reúnem-se para a prática do escotismo. Estas unidades são conhecidas de duas formas, cada uma com condições específicas de funcionamento. A primeira é a “Seção Escoteira Autônoma” ou apenas Seção. Identificada como a menor unidade local de escoteiros, ela congrega membros de um mesmo ramo e precisa ter um efetivo mínimo de oito crianças, adolescentes ou jovens, sob a responsabilidade de pelo menos dois escotistas. Precisa também contar com um conselho de pais, constituído como “órgão de apoio familiar” (Ibidem). Esse apoio foi pensado para os membros da seção que têm entre sete e dezessete anos, e consiste na participação dos pais ou responsáveis legais no planejamento, execução e avaliação das atividades que os jovens vivenciam no escotismo (P.O.R., 2011, p. 26).

A segunda forma de organização são os chamados “grupos escoteiros” devem comportar um efetivo de no mínimo vinte associados, e congregar pelo menos duas seções, precisam constituir uma diretoria, além de uma comissão fiscal. Esses critérios são estabelecidos para que o grupo seja reconhecido e registrado pela UEB. O objetivo de um grupo escoteiro é alcançar uma formação completa, ou seja, atender a todos os ramos escoteiros, de modo a oferecer um programa educativo integral, progressivo e contínuo (P.O.R., 2011, p. 26).

Os grupos e as seções escoteiras desdobram-se em outras formações, são as equipes, previstas para terem formações ora com grupos somente masculinos, ora com grupos apenas femininos, sendo que há também as formações mistas. As equipes são designadas da seguinte forma: o ramo Lobinho divide-se em três seções, Alcateia de Lobinhos (formada só por meninos), Lobinhas (formada só por meninas) ou Alcateia mista (ambos os sexos). O ramo Escoteiro gera também três formações: Tropa de Escoteiros, Tropa de Escoteiras ou Tropa Escoteira Mista. Da mesma forma que o ramo Sênior congrega as Tropas de Seniores (homens) ou a Tropa de Guias (só mulheres) ou Tropa Sênior Mista (ambos os sexos). Apenas o ramo Pioneiro, com escotistas com mais de dezoito anos, tem uma única identificação para as suas formações, os integrantes desse ramo, integram um “Clã Pioneiro”, para ambos os sexos (P.O.R., 2011, p. 26).

Um grupo escoteiro é considerado completo desde que composto por pelo menos uma seção (equipe) de cada ramo, com a seguinte configuração: uma seção de lobinhos com até 24 crianças; outra do ramo Escoteiro, com no máximo 32 adolescentes entre 11 e 14 anos; uma seção do ramo Sênior composta pelo efetivo de até 24 jovens de 15 a 17 anos e uma seção de pioneiros, com idades entre 18 e 21 anos, sem limite de integrantes (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 26).

5.3. O Currículo

O Programa Educativo do Movimento Escoteiro é um documento que expressa, assim como o currículo escolar, o percurso pelo qual os membros do escotismo têm a opção traçar (diferencial da educação não-formal) até serem considerados pioneiros pelo Movimento. A síntese das ações educativas desse roteiro é: os jovens precisam realizar atividades progressivas, sendo que a ênfase é dada às que envolvem a coletividade, acampamentos, excursões, reuniões nas sedes dos grupos, jogos e cerimônias (dentre outras). Estas atividades são programadas e contam com a participação dos jovens na avaliação das mesmas, para que novos rumos sejam traçados de acordo com os interesses dos educandos, em comum acordo os chefes de seção (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 12).

Outro aspecto previsto no Programa Educativo é a progressão entre os ramos escoteiros. A intenção do ME é delimitar os interesses educativos de cada uma das etapas de desenvolvimento estipuladas pelo escotismo. Nesta dinâmica, uma sucessão de atividades variadas, cujo nível de complexidade e exigência é crescente, culmina nas progressões. Com elas, o ME presume o estímulo à aprendizagem de “conhecimentos e habilidades”, principalmente nas técnicas e especialidades escoteiras – as chamadas pioneirias: construções estruturadas com bambus e que envolvem a técnica da aplicação de diferentes tipos de nós (Ibidem).

Existe por parte do ME a preocupação de que o Programa Educativo seja atualizado periodicamente para atender aos “interesses dos jovens de cada época e de cada lugar, assim como adequar-se aos interesses da sociedade” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 12). Este tipo de proposta é típico do “currículo” da educação não-formal, pois leva em conta “um processo de aprendizagem social, centrado no educando, formando através de atividades que têm lugar fora dos sistema de ensino formal [e que] se baseia na motivação intrínseca do formando (SILVA, 2010, s/p). Mesmo estando atento à necessidade de atualizar seu Programa Educativo para continuar atraindo crianças e jovens, paralelamente o ME conserva princípios e valores presentes desde a criação do Movimento, conservando também a intenção de perpetuá-los: “(...) escoteiros de diferentes épocas ou de diferentes ambientes fazem coisas diferentes, desenvolvendo, entretanto, o mesmo escotismo” (Op. cit., 2012, p. 13).

O programa para jovens do Movimento Escoteiro adapta para cada etapa do desenvolvimento ̶ estipulada pelo próprio ME ̶ ações e conteúdos distintos, com o propósito de desenvolver gradualmente, e em níveis de complexidade distintos, as seis áreas consideradas prioritárias pelo escotismo: o físico, o intelectual, o social, o afetivo, o espiritual e o caráter. Com isso, o currículo do ME mira o “desenvolvimento total do ser humano” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p.13).

O Projeto Educativo do Movimento foi elaborado para atender aos propósitos, princípios e ao método próprios do escotismo. Parece óbvio, mas essa trinca, considerada como o pilar do programa para jovens, é também o produto de uma reflexão constante sobre as práticas educativas adotadas (UEB). O projeto em questão, é orientado para “considerar as características culturais, sociais, políticas e econômicas da sociedade” e o “ protagonismo juvenil” na elaboração das suas ações (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 42):

[O Projeto Educativo] coloca o jovem como sujeito central do processo educativo. É um programa “de” jovens e não “para” os jovens. Isso significa que a implementação do programa se realiza a partir das necessidades e interesses dos jovens em geral (não somente os jovens integrantes do Movimento Escoteiro) e conta com sua participação ativa, por considerar que eles são os principais agentes de seu próprio desenvolvimento (P.O.R., 2011, p. 42).

Este protagonismo juvenil ao qual o P.O.R. se refere, reflete no que o escotismo delega aos seus membros como “autonomia progressiva”. Essa,consiste em: “dar a oportunidade para que os jovens participem nos processos de tomada de decisão, tanto em âmbito local, institucional e de sua comunidade, fazendo com que sejam protagonistas das decisões que afetam suas vidas” (Ibidem).

O currículo do escotismo prevê ainda ‒ considerando o protagonismo juvenil e o sistema de progressão ‒ o desenvolvimento de competências40. O estabelecimento dessas é feito a partir do desdobramento de quatro regras básicas que incidem no Médoto escoteiro:

Objetivos educativos e competências: a malha de objetivos educativos do Movimento Escoteiro confere coerência, continuidade e complexidade crescente ao processo educativo. Para efeitos de aplicação e avaliação desse processo, eles se apresentam sob a forma de competências;

Instâncias democráticas de tomada de decisão: objetiva dar possibilidades reais para que os jovens participem nos processos de tomada de decisão em cada Ramo, considerando o crescente grau de desenvolvimento da autonomia;

Planejamento participativo de atividades: por meio do qual as crianças, adolescentes e jovens participam junto com os adultos educadores do processo de planejamento, execução e avaliação da vida em grupo de suas Seções;

Atividades educativas: são aquelas que oferecem aos jovens a possibilidade de adquirir conhecimento, habilidades e atitudes correspondentes aos objetivos educativos (P.O.R., 2011, p. 43).

5.4. Os Conteúdos

O escotismo apresenta uma malha de conteúdos expressos em seu Programa Educativo. Recorrentes na literatura escoteira e aspectos importantes da identidade do escotismo, o compromisso com o meio ambiente e a vida ao ar livre são dois dos conteúdos que permeiam a teoria e a prática do ME.

As seguintes áreas são consideradas prioritárias no desenvolvimento dos conteúdos do escotismo: o físico, o intelectual, o afetivo, o social, o espiritual e o caráter; todas elas são beneficiadas com a prática de um dos principais conteúdos do escotismo: os jogos. Ao lançar mão desses no processo de ensino-aprendizagem, o ME atinge vários dos seus objetivos.

Do ponto de vista educativo, o jogo lhes permite [aos jovens] descobrir sua própria identidade, facilitando o conhecimento dos demais e a exploração do mundo. A importância dos jogos no Escotismo é bem ilustrada pela citação de Baden Powell, quando diz: “O Escotismo é um grande jogo” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 17).

Em outro trecho do Curso Preliminar, o ME explica que a utilização de jogos ocorre porque esses “fazem parte da vida das crianças e jovens, e o Escotismo trabalha com os interesses e necessidades de seus membros juvenis”. Além da preocupação em conciliar os objetivos educacionais do escotismo com o interesse dos jovens, há também mais uma razão para fazer da prática de jogos uma atividade constante no Movimento: “O jogo se presta para a aplicação e/ou avaliação de etapas e conquistas de objetivos educacionais, de uma maneira divertida e agradável” (Ibidem).

Os demais conteúdos contemplados no projeto educativo do ME são: as canções, danças, dramatizações, trabalhos manuais, serviço comunitário, atividades culturais, reflexões, espiritualidade, pioneirias e atividades físicas (Ibidem, p. 19). Tudo isso acontece nos encontros semanais (normalmente aos fins de semana), quando as equipes reúnem-se nas sedes dos grupos ou em qualquer outro espaço onde tais conteúdos possam ser aprendidos e colocados em prática.

Para o ME, é importante diferenciar as atividades propostas nestes encontros, das experiências mesmas proporcionadas aos jovens ao praticá-las. As atividades são entendidas como algo que ocorre externamente, uma ação e instrumento para diferentes situações no contexto do Movimento. As experiências são entendidas como fator subjetivo, o resultado das atividades propostas. Para o escotismo: “o que é verdadeiramente educativo é a experiência” (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 13).

As questões decorrentes da moral e da ética também são problematizadas nas atividades escoteiras. Os manuais da UEB orientam os dirigentes e escotistas para que entendam o que são estes conceitos e os socializem com os mais jovens, procurando dar ênfase à diversidade dos contextos sociais pelos quais estes jovens circulam. O ME usa bastante os termos fraternidade, valores e princípios, sendo que implícitos nesses “conteúdos” estão a ética e a moral, suscitando questões como preconceito, tolerância e política, temas importantes na formação de todo jovem. Em Escotismo e Valores o ME pondera que:

Como a formação de valores dos indivíduos é que determinará a concepção moral da sociedade, é indispensável que os agentes de educação, principalmente a [educação informal]41, a escola [educação formal] e as instituições em que as crianças e jovens frequentam, como o escotismo [educação não formal], assumam o papel de contribuir na aquisição progressiva de valores positivos (s/d, p. 6).

Os valores do escotismo são também conteúdos dentro do programa educativo do ME, pois amparam o processo de ensino-aprendizagem realizado, na medida em que são apresentados, discutidos e avaliados pelos membros do Movimento. Esses valores podem ser resumidos da seguinte forma:

  • Palavra, honra e confiança,

  • Lealdade (às causas e aos vínculos),

  • Solidariedade e serviço,

  • Fraternidade, companheirismo e serviço,

  • Cortesia e amabilidade,

  • Respeito à natureza e proteção ao meio ambiente,

  • Organização, disciplina e compromisso,

  • Alegria, otimismo e bom humor,

  • Valorização do esforço, do trabalho e respeito ao que é dos outros,

  • Pureza de corpo e de espírito ̶ descrito no manual como a negação ao egoísmo, à cobiça e à sordidez (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 19-23).

Para o escotismo, esses valores expressam-se na “Promessa” e na “Lei” escoteiras, componentes fundamentais do Método Educativo (Ibidem, p. 16).

5.5. As Tecnologias

O escotismo inclui os campos da ciência e da tecnologia dentro do seu programa de conteúdos. Ambas as áreas desdobram-se numa lista de temas possíveis, que o escotismo lança mão para instruir e praticar. Alguns dos saberes da ciência e da tecnologia abordados no programa educativo do ME são: aeromodelismo, arqueologia, astronáutica e astronomia; comunicações, eletrônica, informática e metereologia; oceanologia, robótica e web design, dentre outros de uma lista enorme para essas duas áreas (UEB, s/d, s/p).

Além de configurar-se como conteúdo do programa educativo do ME, a tecnologia também exerce a função de mediadora no processo de ensino-aprendizagem escoteiro. O site da UEB, por exemplo, comporta todo um material instrucional e bibliográfico especializado, que atende desde os interessados em pesquisar o escotismo aos membros do Movimento, que ao acessarem a página encontram um painel informativo amplo e atualizado com a agenda dos eventos nacionais e internacionais, menu amplo categorizando os vários aspectos do Movimento no Brasil, orientações para os interessados em formar grupos escoteiros, além de opções de interatividade, como os links para as contas da instituição no YouTube, Twitter e Facebook.

O ME estimula o contato dos escoteiros com o aparato tecnológico digital, promovendo ações do tipo concursos de vídeos na web ‒ incentivando o trabalho dos videomakers escoteiros ‒, concurso de fotografias e torneios internacionais, cujos competidores realizam gincanas no espaço virtual.

A apostila do Curso Preliminar (2012), na parte que descreve as possibilidades de experiências para os jovens no escotismo, menciona a integração da tecnologia digital ao projeto educativo do ME:

Há a opção de substituição de itens [atividades] por quaisquer outros que julgarmos interessantes, considerando a realidade de cada jovem. Montar um blog pode ser muito fácil para um deles, enquanto para outro exigirá um esforço de disciplina tremendo. Este aspecto permite que jovens com alguma deficiência desfrutem de todo o potencial que o Movimento Escoteiro lhes possa oferecer (p. 14).

5.6. O Método Educativo

Os processos de ensino-aprendizagem na educação não-formal podem ocorrer através de situações tão distintas quanto uma oficina de artesanato oferecida por uma associação de bairro ou um evento organizado por grupos de ativismo ambiental, sendo que, antes de ambas as situações ocorrerem, existirá uma programação, um planejamento, baseados em objetivos e metodologias específicas das práticas de educação não-formal. No escotismo, esta dinâmica está posta com o “Método Educativo”. Expresso no Programa Educativo (s/d, p. 12), o método tem como premissa a adesão dos jovens à Promessa Escoteira: “Prometo pela minha honra fazer o melhor possível para: cumprir meus deveres para com Deus e minha Pátria; ajudar o próximo em toda e qualquer ocasião; obedecer à Lei escoteira” (Projeto Educativo, s/d, p. 17). Além do compromisso com os entes citados na Promessa, o escoteiro, ao aderi-la, precisa observar os seguintes artigos previstos na “Lei Escoteira”:

I. O escoteiro tem uma só palavra, sua honra vale mais que sua própria vida;

II. O escoteiro é leal;

III. O escoteiro está sempre alerta para ajudar o próximo e pratica diariamente uma boa ação;

IV. O escoteiro é amigo de todos e irmão dos demais Escoteiros;

V. O escoteiro é cortês;

VI. O escoteiro é bom para os animais e as plantas;

VII. O escoteiro é obediente e disciplinado;

VIII. O escoteiro é alegre e sorri nas dificuldades;

IX. O escoteiro é econômico e respeita o bem alheio;

X. O escoteiro é limpo de corpo e alma (P.O.R., 2011, p. 13).

A Promessa escoteira é definida pelo Movimento como: “um oferecimento voluntário, e não um juramento” (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 17). A relação entre a Promessa Escoteira e o método se dá quando os educadores do Movimento, juntamente com os jovens, usam-na como um “apoio educativo”. Nesta situação, a Promessa converte-se em um recurso, se pensarmos no lema escoteiro, podemos entender melhor a função do mesmo: “sempre alerta!”. Significa que a Promessa Escoteira tende a relembrar as crianças e os jovens sobre os direitos e deveres dos mesmos para com o escotismo. Entretanto, o Método Educativo adverte para que a Promessa não seja evocada “a qualquer pretexto”, pois:

[...] a banalização [da Promessa] pode reduzir sua força. Além disso, se os escotistas se sentem obrigados a fazê-lo com frequência, pode-se estar diante de um sinal de que existe algum ponto falho na aplicação do sistema, fazendo com que a cada instante se torne necessário lembrar a todos o compromisso assumido (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 17).

O Método Educativo do escotismo tem como principal elemento o “convite pessoal” feito a cada jovem para que realize a sua adesão à Promessa Escoteira, quando do ingresso no Movimento e na progressão entre os ramos (Ibidem). Os integrantes do ME têm a opção de frequentar os grupos e apenas aderir à Promessa quando se sentirem preparados para realizar semelhante “oferecimento voluntário” (no entendimento do ME). Os jovens terão direito a um período de adaptação e descobrimento do Movimento. O Projeto Educativo esclarece que quando um jovem é convidado pelo seu chefe ou seus pares a fazer a Promessa deve aceitar “livremente, diante do seu grupo de companheiros”, assumindo com ela a fidelidade à palavra empenhada, fazendo o melhor possível para viver de acordo com a Lei escoteira (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 12). Após aceita, a Promessa Escoteira irá se converter em um “ponto de referência em cuja direção se projetará toda a vida de um jovem” (Ibidem).

A “aprendizagem pelo serviço” é um dos principais pontos do método educativo do escotismo. Ela está relacionada com outra aprendizagem, igualmente importante para o Método, a “aprendizagem pela ação” (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 12). Ambas consistem na realização de ações concretas durante os encontros e reuniões dos escoteiros, e estão relacionadas com a ideia do “aprender fazendo” e com a aliança entre a teoria e a prática previstas no Projeto Educativo do ME.

Um dos objetivos do Método Educativo com a aprendizagem pelo serviço é fazer com que os integrantes do Movimento sejam reconhecidos pela comunidade onde os grupos estão inseridos. O ideal do escotismo é que esses grupos se integrem às comunidades e as ajudem a se desenvolverem (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 12). Isso será possível através das campanhas educativas, dos eventos e com o engajamento social dos escoteiros em diversas frentes.

Além da aprendizagem em serviço e da aprendizagem pela ação, outro componente do Método é definido pelo escotismo como “educação ativa” (Ibidem, p. 13). Através dela, espera-se que os jovens aprendam por meio da observação, do descobrimento, da elaboração, da inovação e da experimentação. Na explicação sobre o que é a educação ativa, o ME faz uma crítica velada à escola:

Esta aprendizagem não formal permite viver experiências pessoais que interiorizam e consolidam o conhecimento, as atitudes e as habilidades. Desta maneira, e do ponto de vista cognitivo, se substitui a simples recepção de informação pela efetiva aquisição de conhecimento, no domínio da afetividade, se substitui a norma imposta pela norma descoberta e a disciplina exterior pela interior; e, no campo motriz, a passividade receptiva do destinatário cede lugar à criatividade efetiva do realizador (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p.13).

O Método Escoteiro pode ainda ser caracterizado por vários atributos, dentre eles: a promoção do trabalho em equipe; a divisão de tarefas; a aprendizagem pelo jogo; o exercício das habilidades e técnicas úteis para os escoteiros; a distribuição meritocrática de distintivos; o sistema de progressão; a programação de atividades ao ar livre; os cerimoniais; o compartilhamento de um mesmo código de valores; a política de orientação espiritual; o desenvolvimento pessoal com orientação individual (CURSO PRELIMINAR, s/d, p. 7-8); além dos chamados “marcos simbólicos” ou “símbolos motivadores”. Esses, têm a função de estimular a imaginação dos membros. A intenção é que tais símbolos ajudem a “promover a coesão em torno dos objetivos compartilhados, assegurando o senso de pertencer a um grupo de iguais” (PROJETO EDUCATIVO, s/d, p. 16).

A apostila do Curso Preliminar (2012) interpreta o Método Escoteiro, com suas regras e concessões, da seguinte forma: “O Escotismo é um movimento voluntário. Ninguém é obrigado a participar dele, mas quem deseja fazer parte, deve seguir seus preceitos” (p. 9). O próprio fundador do escotismo, Baden-Powell, deixou uma mensagem bem humorada para explicar o conceito implícito no movimento iniciado por ele no início século XIX:

O plano estava baseado no princípio do jogo educativo, numa recreação que levava o rapaz à autoeducação. Como chamar o movimento? O nome influi muito. Se tivéssemos adotado a denominação de “Sociedade para a Propagação das Qualidades Morais (que era de fato), os rapazes não teriam se precipitado para entrar nela... Mas chamá-lo de Escotismo e dar-lhes a oportunidade de se tornar escoteiros em potencial era outra coisa. Seu desejo inato de pertencer a um bando era atendido fazendo-os ingressar numa “tropa” e numa “patrulha” (BADEN-POWELL42 apud UEB, s.d., p. 12).

5.7. A Avaliação

Para que as crianças e os adolescentes pudessem ser avaliados com base nas expectativas de aprendizagens previstas no Projeto Educativo, os objetivos do programa escoteiro foram transformados em competências – conhecimentos, habilidades e atitudes valorizados pelo Movimento, mas que manifestam-se em vários aspectos da vida dos jovens (CURSO PRELIMINAR, 2012 p. 13). O desempenho juvenil diante dos conhecimentos teóricos, das práticas e habilidades escoteiras e das atitudes socializadas pelo grupo, revela se os aprendizes incorporaram os valores do escotismo, e é este o porquê da avaliação no ME.

Dois outros aspectos, atitudinais, aparecem como itens a serem avaliados nos jovens: o “dever de ser” e o “dever de fazer”. Espera-se que os escoteiros apresentem estas atitudes dentro e fora do Movimento, presumindo com isso, que esses desenvolvam a autocrítica e a autocorreção. Baden-Powell refletiu sobre estas duas exigências, ao interpretar a Lei Escoteira que ele mesmo formulou:

Quando alguém tem como lei de vida que deve ser ou fazer alguma coisa, para que possa cumpri com a sua lei deverá buscar as oportunidades sem que possa ser ou possa fazer. Isso o leva, necessariamente, a uma ação. Por outro lado, quando alguém tem como lei de vida que não deve ser e não deve fazer alguma coisa, para que possa cumpri sua lei não precisa fazer nada. Basta ficar parado (ESCOTISMO E VALORES, s.d., p. 18).

Existe a expectativa para que os jovens adquiram competências que possibilitem o desenvolvimento das seis áreas supracitadas as quais o ME foca o seu Projeto Educativo. Tais competências apresentam-se pré-definidas em conjuntos de atividades que variam conforme o ramo escoteiro. Elas representam diversas capacidades que o escotismo presume que os jovens adquirirão a partir do processo de ensino-aprendizagem do escotismo.

Por exemplo, para o ramo Escoteiro (jovens de 11 a 14 anos) foram estabelecidas 72 competências, distribuídas em uma escala de complexidades, as chamadas “etapas”, nomeadas de acordo com o nível de dificuldade que apresentam aos educandos. Tal escala, especificamente no ramo Escoteiro, começa com a etapa “Pistas”, passa pela etapa “Trilha”, depois a etapa “Rumo” e por último a etapa “Travessia”, cada uma dessas etapas apresentam um conjunto de atividades, portanto, de competências, sendo a culminância dessa sucessão de etapas a progressão para o próximo ramo, o Sênior.

Dessa forma, teremos dois critérios incidindo na progressão dos jovens: a idade, que situará a criança ou o adolescente em determinado ramo escoteiro, e a avaliação, que definirá seu percurso pelas etapas a partir de um conjunto de atividades e reflexões proposto, definido pelo ME como: “indicadores de aquisição das competências” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 14).

5.8. A Progressão

A progressão dentro do escotismo não é um objetivo fim das avaliações realizadas. Como já mencionado, uma das formas de progressão entre os ramos é a idade:

A passagem de um Ramo para o seguinte será feita quando:

a) O Lobinho ou a Lobinha possuírem entre 10 e 11 anos;

b) O Escoteiro ou a Escoteira possuírem entre 14 e 15 anos;

c) O Sênior ou a Guia possuírem entre 17 e 18 anos43

(P.O.R., 2013, p. 17):

A transição entre os ramos escoteiros recebe atenção especial por parte do Movimento, envolvendo cuidados previstos nos Princípios, Organização e Regras (2013, p. 31). Um desses cuidados é a preparação da cerimônia de passagem, ritual que celebra a progressão de um membro do seu ramo atual para o próximo. Semelhante progresso no percurso de um jovem dentro do escotismo, a passagem é também um temor para o ME, devido a possibilidade de que ocorra a “evasão por dificuldades de adaptação ao novo ambiente” (Ibidem). Por este motivo, a regra 43 do P.O.R. orienta os grupos escoteiros para que a preparação para a transição do jovem entre os ramos seja iniciada com antecedência, alguns meses antes da data efetiva da passagem.

Uma vez tendo progredido, o jovem dará continuidade à formação que recebeu no ramo anterior, e para que ocorra uma sequência, a coordenação do ME orienta aos adultos do Movimento para que planejem uma espécie de antecipação das vivências que o aprendiz terá no ramo futuro, pois há também a preocupação com o estado psicológico desse membro que irá progredir, em relação às reações como a inquietação e a impaciência devido às mudanças e os desafios que se aproximam (P.O.R., 2011, p. 31).

É função dos chefes e monitores – um dos mediadores no processo de ensino-aprendizagem do escotismo – planejar o período transitório, acolher, mesmo antes da progressão, o futuro membro na nova seção escoteira, apresentando-o aos seus futuros companheiros, por exemplo; além de disponibilizarem ao novato conhecimentos sobre a história, as características e as atividades do novo ramo.

Os zelos do Movimento Escoteiro para com a criança e o adolescente em processo de transição incluem medidas que demonstram a integração entre o cuidar e o educar no escotismo:

São terminantemente proibidos no Movimento Escoteiro os “trotes” ou quaisquer outras ações constrangedoras aos jovens, seja durante o período de transição, seja na cerimônia de passagem, sendo estas ações passíveis de aplicação de processo disciplinar aos escotistas e/ou dirigentes da Unidade Escoteira Local onde estes abusos ocorram. Cabe à Diretoria Regional a orientação e a adoção de práticas que eliminem ações desta natureza (P.O.R., 2011, p. 31).

5.9. A Relação Professor-Aluno

Os adultos que possuem postos de liderança no ME ‒ dirigentes, escotistas, chefes, dentre outros ‒ precisam atender a exigências para que possam conduzir o Projeto Educativo junto às crianças e aos adolescentes. Programas de formação específicos são elaborados pela UEB para estes “educadores sociais” (TRILLA, 2003) ou “monitores de atividades” (ALMEIDA, 2011). Alguns desses preceptores serão nomeados após assembleias ou reuniões de conselho realizadas pelos grupos escoteiros, outros serão aclamados pelos seus pares para assumir um papel de liderança e de representante dos inexperientes, mas, de toda forma, há um processo democrático envolvido na definição dos educadores dentro do ME e esses serão instruídos para o trabalho de mediar a aprendizagem junto aos demais.

A apostila do Curso Preliminar para Dirigentes e Escotistas (2012), uma de nossas fontes, é referências na formação desses adultos. Nela, encontramos exigências que os candidatos aos postos de comando terão de atender antes, durante e depois de assumirem, dentre elas: assumir acordo de trabalho voluntário, ter um orientador que o acompanhe e o avalie durante a sua formação (um assessor pessoal de formação - APF), elaborar um plano pessoal dentro do escotismo, buscar se autodesenvolver, aperfeiçoar-se continuamente em níveis variados dentro do escotismo (preliminar, básico, avançado), observar a bibliografia básica indicada pela UEB e, por fim, aderir ou reafirmar a Promessa Escoteira (Ibidem, p. 31).

De acordo com o Movimento, o “Perfil Básico do Adulto” o qual o Projeto Educativo necessita para a liderança e ensino dos mais jovens, será um escotista que além de atender às exigências acima citadas, seja e tenha também: responsabilidade voluntária, otimismo, atitude construtivista, atitude adequada com cada jovem-educando, objetividade, empatia, observação e reflexão constantes (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 31).

A opção por formar seus próprios educadores e lideranças com um perfil pré-definido ̶ algo que na educação não-formal mostra-se flexível, pois, apesar da intencionalidade e do planejamento presentes nas ações educativas realizadas em suas ações, o papel do educador poderá ser atribuído tanto a um animador cultural, quanto a um filantropo, sendo que ambos poderão prescindir de uma formação pedagógica formal ̶ tem por objetivo que os educadores do Movimento, uma vez qualificados, facilitem a caminhada dos mais jovens no escotismo e contribuam para desmitificá-lo perante aqueles que desconhecem seu projeto educativo:

Muitas vezes o escotismo é caracterizado, pela sociedade em geral, como uma atividade para formar crianças disciplinadas (...). Essa visão estereotipada, recebe uma contribuição das próprias lideranças adultas que atuam em nosso Movimento, quando usam a Lei Escoteira justamente com este fim, pregando seus artigos como forma de limitar a ação de crianças e jovens (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 3).

Dentre as reflexões de Baden-Powell sobre o Movimento criado por ele em 1907, um trecho faz o mesmo alerta da citação acima, deixando subentendido nas palavras do fundador que, crianças e jovens devem encontrar no escotismo o estímulo à autonomia, e para isso o papel dos líderes/educadores, não poderia ser o de um tirano: “A Lei Escoteira foi organizada como um guia para suas ações [dos chefes] e não como um código de repressão às suas faltas ou deficiências. Ela, simplesmente, indica a boa direção e o que se espera de um escoteiro” (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 3).

A autonomia do educando no processo de ensino-aprendizagem do projeto educativo do ME é sempre lembrada. Reiteradamente, as orientações da UEB direcionadas aos educadores buscam lembrá-los de que os jovens precisam assumir responsabilidades, em especial pelo próprio desenvolvimento. Este diferencial da educação não-formal, que é dividir entre educando e educador a responsabilidade pela formação, independente do conteúdo posto, é valorizada pelo ME desde o início do Movimento:

A autoeducação, ou seja, o que o jovem aprende por si mesmo, é o que permanecerá nele e o orientará mais tarde em sua vida, em um grau muito maior que qualquer coisa que lhe tenha sido imposta por um professor na escola (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 6).

A relação professor-aluno, transposta para a realidade do escotismo, recebe um tratamento peculiar. Para Baden-Powell (1951 apud UEB, s/d, p. 10) o papel do escotista [educador] é similar ao do irmão mais velho. Este ideal de fraternidade nas relações de ensino-aprendizagem foi expresso pelo fundador com a seguinte frase: “É difícil encontrar uma imagem melhor do que a do ‘irmão mais velho’ para sintetizar o papel educativo de um escotista” (Ibidem). Para o Movimento, o irmão mais velho representará para os mais novos, aquele que irá motivar as aventuras, dar testemunho dos valores e acompanhar o crescimento desses. Sobre essa interpretação do escotismo para as relações implicadas no processo de ensino-aprendizagem, B-P pontuou que:

Havia eu especificado que a posição de chefe escoteiro não seria nem de professor, nem de oficial comandante, mas antes de irmão mais velho, entre os rapazes. Não deveria se colocar de fora ou de cima, mas participar de suas atividades, compartilhando seu entusiasmo e assim, por conhecê-los individualmente, inspirar e sugerir novas diversões, tomando-lhes bem o pulso para saber quando uma atividade qualquer estivesse perdendo sua atração44 (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 10).

O escotismo orienta os educadores em processo de formação sobre os fenômenos possíveis nas situações que envolvem a convivência entre pessoas jovens, e que podem incidir positiva ou negativamente para o andamento do trabalho nos grupos e equipes escoteiras ‒ situações estas, passíveis de ocorrer seja na educação não-formal ou na formal. O ME considera que na socialização juvenil os fenômenos mais poderosos são: a identificação ‒ os jovens se unem porque precisam ser aceitos no grupo, querem se sentir parecidos uns com os outros e não excluídos. Para o Movimento esse é um processo inconsciente. O contágio, outro processo inconsciente segundo o ME, ocorre quando crianças e adolescentes imitam ou adotam comportamentos semelhantes aos de seus pares. Por fim, o fenômeno da sugestão: processo inconsciente, onde os valores dos mais poderosos ou dos líderes dos grupos são aceitos como norma pelos demais. O chefe ou monitor, líderes mais próximos dos demais escoteiros, precisam atentar para estes três fenômenos, para melhor conduzirem uma relação que, se não é comparável à de um professor com seus alunos, mas sim a que ocorre entre irmãos, não deixa de apresentar algum traço de hierarquia. Independente dos fenômenos estabelecidos, o educador social, neste caso os chefes escoteiros, terão de privilegiar os acordos, em detrimento das sanções.

Na relação entre educador e educando no escotismo, as trocas entre os pares, a coeducação, justifica a imposição de relações minimamente hierarquizadas, inerentes à educação não-formal como um todo.

A coeducação é um processo pelo qual meninos e meninas, rapazes e moças, vivenciam um mesmo plano educacional para um melhor e mais harmônico desenvolvimento da personalidade, favorecendo a educação recíproca e levando em consideração as realidades locais e pessoais, tendo presentes os Princípios, o Propósito e o Método Escoteiro (P.O.R., 2011, p. 30).

5.10. Os Rituais

O projeto educativo do Movimento Escoteiro é marcado por rituais. Eles ora configuram-se concretamente, como é o caso das cerimônias, ora abstratamente, como nos lemas escoteiros.

O uniforme e o vestuário escoteiros, a demarcação dos ramos, além do próprio Projeto Educativo do Movimento, abarcam um conjunto de atividades que, cumulativamente, podem dar a seus praticantes retornos em forma de insígnias e distintivos, ou seja, rituais materializados e simbólicos incidindo na formação dos jovens.

O vestuário escoteiro é um ritual típico. Identificamos e diferenciamos a figura de um escoteiro através dele. Mais que um estereótipo, ele é uma marca escoteira, da qual os membros se orgulham. A regra 44 do P.O.R. descreve as seguintes considerações gerais sobre vestuário e uniforme escoteiro:

I - Os participantes do Movimento Escoteiro devem caracterizar-se, entre outros aspectos, pelo senso estético no uso e pela apresentação impecável do seu vestuário ou uniforme escoteiro.

II - Quando em atividade, os membros do Movimento Escoteiro serão identificados, entre outros aspectos, pelo uso do vestuário ou do uniforme escoteiro (P.O.R., 2011, p. 34).

Um momento ritual marcante nos encontros escoteiros é a Cerimônia da Bandeira. Nela, os participantes reverenciam a Pátria (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 15). A cerimônia ocorre quando o grupo se reúne para hastear, arriar ou saudar a Bandeira Nacional. Esta recebe um tratamento especial, pois, no escotismo há também um procedimento padronizado até para manuseá-la. Os objetivos desse ritual é motivar o respeito para com os símbolos nacionais, reforçar nos escoteiros o sentimento de patriotismo e de cidadania ‒ imbricado no princípio escoteiro “dever para com o próximo”, aqui, representado pela Nação (Ibidem). O ME detalha como este momento cívico deve decorrer:

Dois jovens se dirigem para o mastro e se posicionam conforme a figura, formando sempre um triângulo retângulo. Aquele que está com a bandeira, após verificar se a bandeira esta certa e bem presa, diz: “Bandeira pronta” e é feito o hasteamento, sob a coordenação do Adulto Escoteiro. Antes de retornarem aos seus lugares na formação, esses dois jovens fazem a saudação à bandeira. No arriamento, antes de soltar a bandeira do mastro, os dois jovens responsáveis pela cerimônia fazem a saudação (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 15).

O ritual descrito acima, além de apresentar características típicas deste tipo de situação no escotismo ‒ ser simples, marcante e rápida ‒ guarda também seu devido grau de formalismo. Outro ritual pelo qual crianças e adolescentes passarão é o recebimento de distintivos e cordões que têm como função valorizar seus desempenhos. Essas condecorações têm a função de estimular as conquistas e o esforço para obter mais distintivos (2012, p. 15). O ME recomenda que os diretores-presidentes dos grupos, bem como os familiares dos jovens estejam presentes nas cerimônias de condecoração.

Outra cerimônia, a “de Integração” é celebrada pelo grupo quando do acolhimento a um novo membro. Nela, o jovem recebe o lenço ‒ que é um dos símbolos mais emblemáticos da figura do escoteiro ‒ das mãos do diretor-presidente. Este lenço identifica o grupo escoteiro ao qual o jovem será integrado. Semelhante comoção é causada pela “Cerimônia de Promessa”, nela, o jovem “assume para si livremente o compromisso de cumprir a Lei Escoteira com o testemunho dos outros e de Deus” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 15).

As transições pelas quais passam os escoteiros ao longo do percurso dentro do Movimento resultarão na renovação ou aceitação de uma promessa escoteira. Por exemplo, para que a criança entre sete e onze anos de idade seja considerada um lobinho, designação própria para este membro juvenil, ela precisará fazer a “promessa do Lobinho”: “Prometo fazer o melhor possível para:/ Cumprir meus deveres para com Deus e minha Pátria;/ Obedecer à lei do Lobinho;/ e Fazer todos os dias uma boa ação” (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 16). Os demais ramos fazem declaração parecida: “Prometo pela minha honra fazer o melhor possível para:/ Cumprir meus deveres para com Deus e minha Pátria;/ Ajudar o próximo em toda e qualquer ocasião;/ Obedecer à Lei Escoteira” (Ibidem).

Os rituais do escotismo vão além das solenidades, e incluem também algumas “manifestações corporais”, regidas pelo Projeto Educativo do Movimento. É o caso dos “uivos”, como por exemplo o “uivo dos lobos”. Um uivo no escotismo tem a função principal de reunir os integrantes de um grupo de jovens lobinhos, nas situações em que esses se dispersam durante as atividades ao ar livre. Algumas das funções dos uivos escoteiros são reafirmar a identidade escoteira e o senso de participação nos jovens.

Ainda tendo como exemplo o ramo Lobinho, que é o primeiro na escala dos ramos, encontramos o ritual do “Grande Uivo”. Nele,

os “lobinhos e lobinhas se agrupam, se reconhecem como iguais e, por meio de uma série de gestos e gritos cerimoniais, assim como os lobos, manifestam sua alegria por estar juntos. A forma como se realiza o Grande Uivo varia segundo as tradições da Alcatéia. Essa cerimônia se faz no início de uma atividade, após o hasteamento e no final da atividade após o arriamento. Essa prática também é realizada na passagem do Lobinho/da Lobinha para o Ramo Escoteiro (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 16).

Outra peculiaridade do Movimento Escoteiro são os seus símbolos. A logomarca do Movimento no Brasil traz além do logotipo da UEB, faces juvenis projetadas em uma flor de lis, nas cores da bandeira nacional brasileira, com a constelação Cruzeiro do Sul destacada. De acordo com o Movimento, este símbolo representa “o perfil da sociedade brasileira” (P.O.R., 2011, p. 86). Outros símbolos de destaque são: as bandeiras próprias do escotismo, os hinos e os gestos, como por exemplo os das mãos e braços – conforme a posição desses, teremos diferentes sinais e uma variedade de sentidos. Além das saudações, dos gritos e até dos apertos de mão (dados com a mão esquerda45) configuram-se em rituais escoteiros os distintivos, as insígnias e os brevês próprios da instituição.

5.11. Tempos e Espaços

A dimensão temporal e espacial no escotismo passa pelas demarcações do lugar de cada jovem dentro do Movimento, de acordo com o seu desenvolvimento:

Independentemente da origem, todos os que ingressam na Tropa [equipe] têm um PERÍODO INTRODUTÓRIO46, que terá uma duração média de 3 meses. Os jovens que vieram do Ramo Lobinho terão mais facilidade nesse momento e por certo viverão esse período em tempo mais curto. Para considerarmos concluído o Período Introdutório, o jovem deverá passar por um conjunto de itens que validarão sua integração na Tropa (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 14)

Esse tempo indispensável de formação pelo qual passam os iniciantes na prática do escotismo, é parte de uma dinâmica que tem sua lógica nos rituais já descritos pois,

ao final do Período Introdutório o jovem passará pela Cerimônia de Integração, na qual receberá o Lenço do Grupo Escoteiro e o seu primeiro distintivo de Progressão. Neste momento o jovem também poderá fazer sua Cerimônia de Promessa, recebendo seu distintivo de Promessa. Caso isso não aconteça, por decisão do jovem, os Escotistas deverão atuar para que ele faça sua Promessa em período futuro, que recomenda-se que não seja superior a dois meses (Ibidem).

A progressão, naturalmente relaciona-se com o fator temporal no escotismo. Ao ingressar no ME, o jovem, seja ele criança ou adolescente, poderá ingressar em um grupo por meio duas alternativas: na primeira, o novato terá um “acesso linear” – independente da fase de desenvolvimento estabelecida pelo ME ou da maturidade apresentada pelo jovem, este ingressará na etapa (nível) inicial do ramo equivalente a sua idade – e sua formação terá atividades específicas para impulsionar sua progressão (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 14).

Na segunda alternativa, os novatos terão um “acesso direto”: ao aproximarem-se do fim do período introdutório pelo qual todos os escoteiros passam, o líder do grupo no qual o novato será integrado, juntamente com os futuros pares desse novato, avaliarão em qual etapa encaixá-lo. A este altura, o chefe já teve oportunidades e mesmo a obrigação de observar o calouro durante o período introdutório, e por isso terá condições de decidir pelo posicionamento desse no grupo composto por outros membros. Vale relembrar que, a autoavaliação faz parte da metodologia do escotismo, e poderá contribuir também com esta etapa do processo.

O ME considera os diferentes ritmos de aprendizagem dos seus membros, mas nem por isso deixa de estabelecer desafios para os jovens. Por exemplo, um membro da Tropa que se encontra na etapa Pistas, poderá progredir para a etapa Trilha (que é a próxima) se realizar metade das atividades propostas na sua atual etapa. Uma vez na Trilha, passará para a próxima etapa, a Rumo, se realizar a totalidade das atividades propostas para as duas etapas anteriores, e assim sucedem desafios que condicionam além da progressão, também a conquista de distintivos, a exemplo do “Lis de Ouro”, para obtê-lo, todas as atividades da etapa Travessia (a ultimado ramo Escoteiro) precisam ser realizadas (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 14).

Referenciadas indiretamente no parágrafo anterior, o conjunto das atividades inerentes a cada ramo não variam em seu formato, mas sim, no grau de exigência e de complexidade, sendo que poderá haver também alguma variação na quantidade de atividades conforme o ramo e a etapas desse. Vejamos algumas das tarefas detalhadas no “fluxograma de progressão47”:

[A criança ou jovem precisa ter] participado de, no mínimo, de três acampamentos ou acantonamentos;

• Tenha conquistado uma das quatro Insígnias de Interesse Especial do Ramo Lobinho: Insígnia Mundial Escoteira de Meio Ambiente, ou a Insígnia da Lusofonia, Insígnia Boa Ação ou Insígnia do Cone Sul.

• Ser recomendado pelos Velhos Lobos e pela Roca de Conselho por ser um Lobinho dedicado, frequente às atividades da Alcateia e cumpridor da Lei e Promessa do Lobinho.

• Possuir o Cordão Vermelho e Branco;

• Possuir pelo menos 10 noites de acampamento com sua Patrulha ou Tropa Escoteira.

• Ter realizado 100% das atividades do Guia do Projeto Pioneiro.

• Revisar o seu Plano de Desenvolvimento Pessoal (Projeto de Vida).

• Elaborar e executar um projeto pessoal, com duração de no mínimo 4 meses, de sua livre escolha, cujo conteúdo seja aprovado pela Comissão Administrativa do Clã, que deverá cobrir os seguintes aspectos: cujo conteúdo atenda uma das áreas prioritárias: serviço, natureza, trabalho ou viagem; escolha da ideia; planejamento e programação; organização; coordenação; execução; avaliação; relatório.

Esta proposta educativa desafiadora para os jovens demanda além de tempo, também voluntarismo e persistência diante das avaliações por parte dos jovens, que no escotismo ganham uma dimensão humanizada, em relação à pressão exercida pelo sistema escolar por exemplo. Esta comparação ocorre porque no escotismo é possível considerar as individualidades para estabelecer o tempo de desenvolvimento das atividades planejadas:

É importante destacar o que se entende por “realizar a metade/totalidade dos itens”. Em nenhum momento espera-se que um adulto impeça a Progressão de um jovem pela falta de uma ou duas atividades. Oferecemos experiências e avaliamos – em conjunto com o jovem – o desenvolvimento demonstrado. Também não se deve entender que apenas a realização de um conjunto de atividades (...) garante sua conquista. Se o jovem, no momento de avaliação de sua Progressão não se sentir seguro acerca da aquisição de um conhecimento, habilidade ou atitude, deve ser estimulado a realizar outras atividades que o levem neste caminho. O contrário também vale: um jovem que já demonstre uma competência pode ser “liberado” de determinada atividade que julgue inócua ou entediante, desde que acordado com o Escotista. Tampouco se espera que todos façam exatamente as mesmas atividades. Há a opção de substituição de itens por quaisquer outros que julgarmos interessantes, considerando a realidade de cada jovem. Montar um blog pode ser muito fácil para um deles, enquanto para outro exigirá um esforço de disciplina tremendo. Este aspecto permite que jovens com alguma deficiência desfrutem de todo o potencial que o Movimento Escoteiro lhes possa oferecer (CURSO PRELIMINAR, 2012, p. 14).

Atividades de campo, acampamentos e viagens, são sugestões recorrentes de vivências fora das sedes dos grupos e seções escoteiras, ou seja, os espaços possíveis para o desenvolvimento da proposta educativa do ME vai ao encontro de um dos objetivos da educação não-formal, que é estabelecer “espaços alternativos” para as diversas propostas de ensino-aprendizagem.

No escotismo, a noção de espaço de aprendizagem associa-se também ao conceito de ramo escoteiro, pois a localização de um membro do ME se dá pelo ramo, seção ou etapa momentânea na qual o integrante está inserido. Para os pioneiros, por exemplo, o espaço de convivência é o Clã Pioneiro, um espaço de encontro dos jovens de 18 a 21 anos incompletos. Um Clã é o lugar no qual os pioneiros compartilham suas vivências, projetos, valores, ideias, sonhos, atividades e preocupações, a participação deve acontecer de forma ativa, pois os jovens são incentivados a serem protagonistas e não meros espectadores (ESCOTISTAS EM AÇÃO, 2015, p. 78).

5.12. Estrutura Física

A prática do escotismo não necessita de um lugar especifico. Todo e qualquer lugar (parques, praças, museu, escolas e até shopping) tem potencial para abrigar uma boa atividade escoteira, dada a diversidade do projeto educativo do Movimento. A sede do grupo é mais uma base de apoio (guardar materiais, cantina, banheiros, parte administrativa do grupo) do que um local exclusivo para a prática do escotismo. Na sede de um grupo conta-se com espaço para guardar materiais de uso coletivo e individual, lojinha, secretaria e atendimento aos pais, e também serve para mostrar a quem chega um pouco da história do escotismo e do próprio grupo, exibindo fotos, cartazes, troféus e premiações de atividades, entre outros.

Comparado à educação formal, o escotismo explicita os aspectos inerentes à educação não-formal, da qual é um exemplo. Os principais contrastes entre ambos os de educação são os espaços-tempos flexíveis e o currículo que abre espaço para os interesses e preferências dos educandos no escotismo. Vejamos no quadro a seguir um comparativo entre as três propostas educativas.

COMPARATIVO DAS EDUCAÇÕES

Categorias de Análise

Formal

Não-formal

Escotismo

Conceito

A educação formal é estruturada, organizada, planejada intencionalmente e sistemática. A escola é o seu mais amplo exemplo.

Suas atividades e ações têm intencionalidade, porém, com baixo grau de estruturação e sistematização, o que implica em relações pedagógicas não formalizadas.

Movimento de educação não formal, que se preocupa com o desenvolvimento integral e com a educação permanente dos jovens, complementando o esforço da família, da escola e de outras instituições.

Currículo

No sistema escolar o currículo tradicionalmente composto por saberes parcializados em disciplinas foi recentemente superado, porém deixou marcas na seleção dos saberes essenciais, nas práticas, nas estruturas organizativas e na docência.

Tem como objetivo desenvolver nos educandos saberes e competências voltados para os valores sociais e éticos, tais como: direitos humanos, tolerância, promoção da paz, solidariedade e justiça social.

A ideia de currículo no escotismo é ilustrada pelo Projeto Educativo, documento que enfatiza uma malha de atividades que dão suporte ao sistema de progressão, fundamental ao Método Escoteiro.

Disciplinas

A língua portuguesa, a matemática, o mundo físico e natural são as principais áreas contempladas. Os temas transversais às disciplinas são os mais recentes parâmetros da educação escolar.

Os conteúdos emergem a partir dos temas que se colocam como necessidades, carências, desafios ou obstáculos para uma comunidade de aprendizes.

Os valores e os princípios escoteiros norteiam os conteúdos que possibilitam o desenvolvimento do programa educativo. Alguns dos temas mais recorrentes são: o meio ambiente e a prestação de serviço comunitário, sendo a prática de jogos uma das principais formas de ensino-aprendizagem no Movimento.

Rituais

Interferem nos padrões de conduta e na apresentação pessoal da comunidade escolar. Os espaços-tempos, e as relações interpessoais são um os mais afetados pelos rituais da escola.

Manifesta-se nas práticas de socialização e contribuem para a formação de identidades e modos de vida de grupos sociais distintos. Visam instigar os educandos a se reconhecem como cidadãos.

Estão presentes nas cerimônias que marcam variados tipos de passagens, de modo especial as progressões e as condecorações. Os rituais no escotismo são representados pela adesão a diferentes tipos de promessas, pelos distintivos e insígnias, e até mesmo pelos gestos corporais dos participantes.

Avaliação

Processo historicamente atribuído à escola e aos professores. Avalia-se os estudante, o ambiente, os objetivos educativos, os materiais, os professores e os programas, e, posteriormente, a partir de critérios e referências, pretensamente relevantes para a educação, julgamentos são emitidos.

Não é um pressuposto deste tipo de educação, porém, quando ocorre, pode ser do tipo quantitativa ou qualitativa. Há uma preocupação para que a sensibilização provocada pelas ações deste tipo de educação tenha reflexos no modelo de avaliação proposto.

Para que os jovens possam ser avaliados com base nas expectativas de aprendizagens previstas no Projeto Educativo, os objetivos do programa escoteiro são transformados em competências passíveis de serem avaliadas.

Relação Professor-Aluno

Tem como objetivo criar condições que possibilitem a aprendizagem de conhecimentos pelos alunos, num contexto de interação. Coerção, autoridade e persuasão são os recursos do professor; resistência ou sujeição voluntária são as reações do aluno.

Os que aprendem e os que ensinam experimentam “papéis sociais” que não são o de professor e aluno. Quem ensina é um mediador, animador ou coordenador das atividades. Os que aprendem têm a opção de manifestar suas preferências e interessem, que direcionarão o processo de ensino.

A posição dos chefes escoteiros, enquanto principal mediador do processo de ensino-apredizagem, não se iguala com a do professor, nem com a de um comandante, o ideal é que esses líderes atuem como irmãos mais velhos dos aprendizes.

Tecnologias

O ambiente digital não substitui as formas orais e impressas com as quais tradicionalmente os professores ensinam. O problema da exclusão digital atinge os alunos e as escolas. O uso pedagógico dos suportes e conteúdos digitais é um dos dilemas contemporâneos da educação formal.

Devido à diversidade de métodos, procedimentos, e de público, o uso das tecnologias pode variar entre as sofisticadas, as artesanais e as rudimentares, sendo o ciberespaço um ambiente favorável a este tipo de educação.

Os jovens escoteiros são tão tecnológicos quanto os demais da mesma faixa etária. Utilizam-se da web para programar atividades e para interagir com escoteiros do mundo inteiro. Em consonância com a educação não-formal generalizada, o escotismo valoriza tanto as tecnologias rudimentares quanto as digitais.

Espaços

Tem na sala de aula seu ambiente mais lembrado e problematizado. O arranjo desse espaço é tão sedimentado que se reproduz mesmo quando as condições mínimas estão ausentes.

Comporta todos os contextos em que as pessoas se agrupam espontaneamente. Os denominados “espaços alternativos” possibilitam à educação não-formal realizar adaptações que visam converter ambientes e situações em espaços educativos.

Os grupos e seções escoteiras, com seus ramos e etapas, representam os espaços para o desenvolvimento da proposta do ME. As sedes guardam a história dos grupos. Os escoteiros ocupam ainda parques, praças e demais áreas abertas para colocarem em prática seu rol de atividades, a exemplo dos seus típicos acampamentos.

Tempos

São compartimentados em função de fatores diversos: seriação, ciclos, sequencias didáticas, férias e planos de ensino. Influenciam na categorização de alunos: “atrasados” ou “adiantados”. Possuem uma função social, pois é capaz de homogeneizar os modos de atuar dos alunos e nivelar os ritmos individuais. Mudanças na organização dos tempos escolares pode provocar desordem social.

O tempo de aprendizagem, usualmente, não é fixado a priori, e se respeita as diferenças existentes para a absorção e reelaboração dos conteúdos implícitos ou explícitos no processo ensino-aprendizagem.

A progressão entre os ramos e etapas, condicionada pela aquisição de um conjunto de competências e pela realização de uma malha de atividades, demarca implicitamente o tempo no Escotismo. Dos 6 aos 21 anos, os escoteiros farão um percurso cuja flexibilidade, típica da educação não-formal, manifesta-se através do respeito aos diferentes ritmos de aprendizagem e às preferências dos jovens.

Estrutura Física

Os prédios, ambientes e mobiliário padronizados nas escolas públicas, ajudam a preservar as características clássicas deste tipo de educação.

Por meio da adaptação ou “arquitetura educacional baseada no aproveitamento das áreas”, cantos viram armários, varandas viram salas de aula e parques se tornam sedes de grupos variados.

A sede de um grupo escoteiro é uma base de apoio: possui guardas-volumes, cantina, banheiros, secretaria e é importante para armazenar os acervos de um grupo.

Quadro 4: Comparativo das educações

6. METODOLOGIA

A metodologia científica das técnicas de pesquisa são definidas por Thiollent (2007, p. 29) como o conhecimento geral e as habilidades necessários aos pesquisadores para a orientação do processo de investigação, tomada de decisões, seleção dos conceitos, técnicas e dados. A metodologia do presente trabalho procurou atender às expectativas costuradas em nosso projeto de pesquisa.

Em nosso percurso definimos categorias para a análise qualitativa e quantitativa dos dados. A exposição e a comparação dos conceitos sobre educação formal, não-formal e sobre o escotismo, se deram a partir da pesquisa bibliográfica. A falta de bibliografia especializada ao nosso alcance, sobre a educação não-formal, não foi suficiente para limitar a elaboração de um texto extenso e sistematizado, baseado na comparação entre os três tipos de projetos educativos, a partir de variáveis de intercessão entre os mesmos.

A nossa pesquisa bibliográfica foi ao encontro do que Cruz e Ribeiro (2004, p. 17) ressaltaram: “Uma pesquisa bibliográfica pode visar um levantamento dos trabalhos realizados anteriormente sobre o mesmo tema estudado no momento, (...). Em suma, uma pesquisa bibliográfica leva ao aprendizado sobre uma determinada área”.

Nossas fontes primárias foram os manuais, guias e apostilas editados pela UEB, os quais permitiram a definição e caracterização do projeto educativo e metodológico do Movimento Escoteiro. Além delas, tivemos como fontes secundárias os livros e artigos dos autores48 que já publicaram, nos formatos impresso ou digital, obras e pesquisas sobre a educação formal e a não-formal.

Os dados que basearam nossas descrições e análises foram diversificados: além das fontes anteriormente citadas, esses procederam também da transcrição dos questionários aplicados, das observações participantes realizadas na pesquisa de campo e de páginas na internet49.

De acordo com Goldenberg (2001, p. 62), quando se uni na pesquisa diferentes pontos de vista e maneiras de coletar e analisar dados, os aspectos qualitativo e quantitativo se tornam interdependentes. Nesta pesquisa, a análise qualitativa foi necessária para tratar as informações obtidas com a bibliografia, e para a interpretar as respostas às questões abertas da entrevista aplicada aos escoteiros. Já a análise quantitativa, ocorreu quando, estatisticamente lemos os dados obtidos por meio do questionário socioeconômico-cultural aplicado. Goldenberg explica que a integração entre esses dois métodos “permite uma ideia mais ampla e inteligível da complexidade de um problema”, pois:

Enquanto os métodos quantitativos pressupõem uma população de objetos de estudo comparáveis, que fornecerá dados que podem ser generalizáveis, os métodos qualitativos poderão observar, diretamente, como cada indivíduo, grupo ou instituição experimenta, concretamente, a realidade pesquisada (GOLDENBERG, 2001, p. 63).

Os objetos de estudo comparáveis os quais a autora se refere, são representados pelas categorias de análise que elegemos para definir os paradigmas educacionais tratados neste trabalho: o conceito, o currículo, os conteúdos, a avaliação, os tempos, os espaços, os rituais, a relação professor-aluno e o uso da tecnologia.

Os dados quantitativos levantados através do questionário socioeconômico-cultural, foram lidos a partir da “Pesquisa de opinião pública: Agenda Juventude Brasil 2013”. Em nossa interpretação, permitimo-nos inferir, a partir da nossa amostra formada por jovens escoteiros, que esses, comparados aos demais jovens brasileiros, apresentam diferenças consideráveis quanto ao perfil sociocultural. Tal constatação potencializa novos problemas de pesquisa, para os que, como nós, interessam-se pelo escotismo e pelos efeitos da educação na sociedade.

De acordo com Cruz e Ribeiro (2004, p. 17), a nossa pesquisa, por meio dos objetivos colocados ‒ conceituar, definir e caracterizar diferentes tipos de educação ‒ classifica-se como pesquisa exploratória. Ao tecermos uma malha de informações a respeito do nosso objeto (o método educativo do Movimento Escoteiro), nos aproximamos da confirmação da nossa hipótese inicial: o escotismo influencia, em alguma medida, o comportamento dos seus praticantes dentro e fora da escola.

6.1. A Coleta de Dados

A técnica da observação simples e espontânea, ocorreu com a nossa visita aos grupos escoteiros em Belo Horizonte. Na oportunidade, aplicamos o questionário socioeconômico-cultural e a entrevista. Tivemos a oportunidade de observar quando, onde, como e para quê ocorrem os encontros de escoteiros, e observamos as atividades desenvolvidas durante esses encontros. O comportamento dos jovens escoteiros também foi alvo de nossas observações. Os pioneiros estavam cientes desse fato, e nos receberam com cordialidade e naturalidade. Tais observações foram planejadas, e tinham como objetivo entender as vivências escoteiras in loco, além da aplicação dos questionários.

A observação realizada nas sedes dos escoteiros está inserida no conceito de pesquisa de campo, definido por Cruz e Ribeiro (2004, p. 28):

A pesquisa de campo consiste na observação atenta de um objeto (ou fenômeno) de interesse do pesquisador. Envolve técnicas de coleta e apresentação dos dados e uma discussão qualitativa dos resultados. (...), o conhecimento é adquirido sem que o pesquisador possa interferir no objeto de estudo.

Nossos instrumentos de coleta de dados foram o questionário socioeconômico-cultural, extraído de um outro trabalho de pesquisa acadêmica, devidamente referenciado neste. Tal instrumento atendeu exatamente o nosso objetivo de elaborar um perfil social, econômico e cultural de integrantes de grupos escoteiros. O segundo questionário, com perguntas abertas, foi elaborado pelo nosso trio de pesquisadores com a colaboração do orientador desta pesquisa, sendo aplicado durante a pesquisa de campo.

Nossos questionários (anexos I e II) apresentaram, respectivamente, questões de múltipla escolha e perguntas abertas, que aferiram a opinião dos jovens escoteiros a respeito do método educativo do Movimento. Os respondentes tiveram orientação prévia sobre o preenchimento, além de contar com a nossa presença no local da aplicação. Houve ainda um terceiro documento (anexo III), o “Termo de Consentimento Livre e Esclarecido”, que apresentou aos jovens o propósito da nossa pesquisa, solicitando-lhes autorização para que os dados de ambos questionários fossem utilizados pelo nosso grupo.

O questionário com perguntas abertas obedeceu a duas das recomendações presentes no livro de Cruz e Ribeiro (2004, p. 29): foi elaborado em blocos temáticos, envolvendo questões sobre a educação formal e o escotismo, e teve como foco das questões os oito aspectos que usamos ao longo deste trabalho para comparar ambas as educações.

Concluímos que as reflexões presentes nesta pesquisa situam-se na forma de raciocínio e argumentação definida como dedutiva:

(...) o método dedutivo leva o pesquisador do conhecido ao desconhecido com pouca margem de erro, mas por outro lado é de alcance limitado, pois a conclusão não pode exceder as premissas. (...) Através de um fato geral conhecido, podemos dividi-lo e conhecer as suas partes (CRUZ e RIBEIRO, 2004, p. 49).

Através da dedução, sintetizamos questões que julgamos imprescindíveis para a compreensão dos conceitos de educação formal, não-formal, informal e sobre o Projeto Educativo do escotismo. Dessa forma, conseguimos expor alguns desdobramentos desses diferentes tipos de educação. Estamos cientes das limitações, devido à abrangência que o Método Educativo do escotismo apresenta, impossível de ser esgotada neste trabalho.

PERFIL SOCIOECONÔMICO-CULTURAL

O questionário socioeconômico-cultural foi respondido por 15 jovens escotistas. Entre 25 de maio e 26 de setembro de 2015 ele foi aplicado a nove homens e a seis mulheres, com idades entre 18 e 21 anos. Este recorte etário dos entrevistados – integrantes do ME com mais de 18 anos – foi definido pelo nosso grupo com a intenção inicial de abordar escotistas dispensados da anuência de pais ou responsável legal para colaborar com nossa pesquisa. Acreditamos que esta estratégia otimizou os nossos resultados na medida em que evitou um conflito entre as agendas dos pais dos jovens e das nossas, pois os questionários foram respondidos durante as reuniões dos escoteiros, que ocorrem normalmente aos fins de semana; esses encontros são direcionados aos jovens, com a presença esporádica de seus familiares.

Como consequência do recorte etário escolhido, obtivemos uma amostra cujo tempo médio de frequência no escotismo foi de oito anos – dentre os jovens que responderam o questionário, tivemos os que praticam o escotismo há um ano e os que já fazem parte de grupos escoteiros há pelo menos treze anos. Por causa da faixa etária em que se encontram, todos os entrevistados já são considerados pioneiros. A faixa etária delimitada resultou em respostas para os nossos questionários, cujas reflexões implícitas atestam a propriedade desses jovens para analisarem o Movimento Escoteiro.

O grupo de pioneiros que respondeu o questionário socioeconômico faz parte dos 47% da população brasileira, formada por pessoas com idades entre 18 e 24 anos – dados do levantamento mais recente, realizado pela Secretaria Nacional de Juventude, através da pesquisa de opinião pública, realizada em todo o Brasil, intitulada Agenda Juventude Brasil 2013 (AJB/2013), a qual recorremos para ler os dados socioeconômicos-culturais dos escoteiros.

Entre os pioneiros, 47% declararam-se pardos, 40% brancos e 13% pretos. O percentual maior vai ao encontro do apurado pela pesquisa nacional, onde 45% dos jovens brasileiros se autodeclararam pardos.

A AJB/2013 mostrou que 79% da população jovem reside em áreas urbanas no País. No nosso caso, tanto os escotistas, quanto as sedes dos grupos localizam-se majoritariamente na capital de Minas Gerais – Belo Horizonte (BH). Na região centro-sul da capital temos o Grupo Escoteiro Mangabeiras - 21/MG. Na região oeste o Grupo Escoteiro Alferes Tiradentes - 149/MG. Na região noroeste temos os grupos: Escoteiro do Ar Padre Eustáquio - 7/MG e Escoteiro Sérgio Vieira de Mello - 109/MG. De Sete Lagoas, cidade vizinha a BH, tivemos a participação de um integrante do Grupo Chuí Oiapoque - 144º/MG. O acesso dos entrevistados às sedes citadas é relativamente tranquilo, pois apuramos que 47% deles residem na região central de BH, área com abrangente rede de transporte público. Outros 40% dos pioneiros declarou residir na periferia da cidade e 13% em Sabará, cidade da região metropolitana de BH.

Ao longo desta pesquisa buscamos relacionar os universos da educação não-formal e formal, e por isso perguntamos sobre o tipo de instituição na qual os pioneiros cursaram a educação básica: 60% respondeu ter cursado o ensino médio em instituições públicas e o restante na rede particular de ensino. Já o ensino fundamental, 67% cursou na rede pública e 33% na particular, desses, 7% o fizeram com bolsa de estudos. Os dados da AJB/2013 mostraram que até aquele ano, 38% da população jovem brasileira já apresentava escolaridade entre o nível médio concluído e o ensino superior ou pós-graduação.

Aprofundando no perfil socioeconômico dos jovens escotistas, perguntamos: com quem os jovens residiam. A maior parte dos pioneiros ainda reside com os pais (67%), no Brasil esse índice é de 61% (AJB/2013). Vinte por cento dos escoteiros responderam que moram com os amigos, 7% com parentes e a mesma percentagem reside sozinha. Em termos de ocupação, dos quinze entrevistados, oito trabalham e estudam, seis apenas estudam e um apenas trabalha remuneradamente. A pesquisa nacional mostra que em 2013, 53% dos jovens entre 15 e 29 anos exerciam algum trabalho remunerado, inserindo-se nos 74% da população economicamente ativa brasileira à época.

A renda domiciliar dos entrevistados variou entre R$788,00 e mais de R$15.000,00. Quarenta por cento dos escoteiros tem renda familiar de três a cinco salários mínimos50, 27% têm renda entre um a dois salários mínimos, 13% renda de seis a oito mínimos, outros 13% de nove a quinze salários e 7% tem renda acima de vinte salários mínimos. No Brasil, 50% dos domicílios com jovens têm renda per capita, que os inserem nos estratos médios econômicos – entre as classes baixa e média alta51.

Quanto ao perfil sociocultural dos jovens escotistas mineiros, pedimos ao nosso grupo de entrevistados informações sobre a participação dos mesmos em outras atividades sociais além do Movimento Escoteiro (ver cenário de respostas possíveis no anexo I). Cinquenta e três por cento dos jovens responderam que restringem seu engajamento social ao Movimento Escoteiro. Outros 33%, declararam fazer parte de grêmios esportivos, como os times de futebol e clubes que praticam outras modalidades esportivas. A participação em ONG’s, associação de bairro, grupos de dança/música/ teatro e em atividades organizadas por centros espíritas Kardecistas, foi selecionada por 7% dos escoteiros (cada atividade). A Secretaria Nacional de Juventude levantou em 2013 que 46% dos jovens brasileiros entre 15 e 29 anos fazia parte ou já havia feito de associações, entidades ou grupos (AJB/2013).

Continuando com o levantamento do perfil cultural dos pioneiros, perguntamos ao grupo sobre a frequência com que acessavam diferentes meios de informação. As respostas foram agrupadas na tabela a seguir.

Frequência de Acesso a Meios de Informação52 (%)

Meio

Diário

Quase diário

Às Vezes

Raramente

Nunca

Internet

100%

-

-

-

-

Jornais

60%

13%

20%

7%

-

Livros

67%

20%

7%

7%

-

Rádio AM/FM

47%

20%

27%

7%

-

Revistas

40%

7%

20%

20%

13%

Televisão

60%

27%

7%

7%

-

Tabela 2: Percentual de Frequência de Acesso a Meios de Informação

Na média nacional, em 2013, a televisão aberta predominava como meio de comunicação através do qual os jovens obtinham informações a respeito do Brasil e do mundo, sendo que 83% dessa população apontava a TV como a mídia mais acessada para tal finalidade. Há dois anos, a internet representava para 53% da população jovem um meio de acesso à informação. Realidade diferente da que recentemente foi objeto de pesquisa Datafolha53, encomendada pelo jornal Folha de São Paulo e realizada em âmbito nacional. O objetivo da pesquisa foi entender os hábitos de utilização das mídias digitais por parte de uma geração de pessoas que cresceu conectada à rede mundial de computadores. Os dados revelaram que:

Dos brasileiros que têm entre 16 e 24 anos, 78% têm o próprio smartphone ou moram em uma casa com um desses aparelhos. Nenhum dos outros aparelhos pesquisados ‒ computador de mesa, notebook, tablet, smart TV e videogame ‒ alcança esse percentual, e nenhum deles ultrapassa 50%. (...) E há jovens que nem sentem falta do resto desses produtos, desde que tenham seu companheiro smartphone (SOUZA, 2015, s/p).

A última tabela mostrou que os jovens pioneiros fazem parte desta geração conectada, visto que 100% respondeu acessar diariamente a internet. Vale também ressaltar o interesse desses jovens pela leitura, pois um percentual alto (87%) declarou ler livros todos os dias ou quase todos os dias.

Dentro do perfil sociocultural dos jovens escoteiros aqui construído, vimos que, frequentemente, eles estão presentes nos mesmos ambientes e atividades dos demais jovens não escoteiros. Com essa constatação inferimos que o estereótipo do escotista enquanto criança ou jovem extremamente disciplinado, “bonzinho” e “obediente” seja repensado (UEB, s/d). Questionamos ao nosso grupo de entrevistados sobre a frequência com que circulavam por espaços não-formais, não necessariamente espaços educativos, mas lugares onde, assim como nos grupos escoteiros, ocorrem atividades que promovem socialização e cultura, se considerada a realidade boa parte da população jovem brasileira. Os resultados estão na seguinte tabela.

Com que frequência você vai a/ao (%):

 

ESPAÇOS

Semanalmente/

Ao menos 1 vez por mês

Ao menos 1 vez por ano

Nunca

Escoteiros

Média Nacional54

Escoteiros

Média Nacional

Escoteiros

Média Nacional

Cinema

37%

19%

20%

25%

7%

28%

Teatro

7%

4%

80%

7%

13%

65%

Estádio esportivo

10%

9%

33%

11%

47%

58%

Museu

10%

3%

60%

6%

20%

71%

Shopping

43%

40%

13%

22%

-

18%

Parque

37%

61%

27%

22%

-

5%

Shows/concertos

33%

8%

67%

12%

-

61%

Bares/danceterias

43%

35%

7%

21%

7%

26%

Tabela 3: Percentual de Frequência a Espaços Não-Formais.

Algumas frequências de acesso a espaços culturais apresentaram discrepâncias consideráveis entre os pioneiros e a média nacional, mesmo considerando o gap de pelo menos três anos entre o levantamento de dados da AJP/2013 e o nosso. Os que mais chamam a atenção são: a frequência praticamente semanal em shows ou concertos (33% entre os pioneiros, 8% média nacional); a ida ao teatro pelo menos uma vez ao ano, com média entre os escoteiros onze vezes maior que a média nacional, assim como o percentual triplicado entre os pioneiros que frequentam estádios esportivos pelo menos uma vez ao ano. A frequência anual em museus, na média jovem nacional, representou 10% da média entre os escoteiros. Destacamos também o percentual de jovens brasileiros que nunca tiveram acesso a determinados equipamentos culturais comuns na rotina dos escotistas: 28% nunca foi ao cinema, 65% nunca frequentou um teatro e 71% nunca entraram em um museu.

7. ANÁLISES E DISCUSSÕES SOBRE OS RESULTADOS

Para analisar as questões do questionário de perguntas abertas (anexo II) aplicado durante a pesquisa de campo a catorze pioneiros55 ‒ integrantes de grupos escoteiros distintos ‒, elaboramos oito questões relacionadas às categorias que nortearam todo o nosso processo de descrição da educação formal, não-formal e do escotismo: os conceitos, os conteúdos, a relação entre educador e educando, a tecnologia, a avaliação, as especificidades e a comparação.

Iniciamos, perguntando aos jovens se os princípios postulados pelo escotismo (dever para com Deus, para com o próximo e para consigo mesmo) refletiam-se no ambiente escolar por meio dos próprios escoteiros (primeira pergunta do anexo II). Percebemos que para os pioneiros entrevistados, a noção de princípios escoteiros está diretamente associada aos valores do Movimento ‒ tais como: lealdade, honra, solidariedade, dentre outros ‒ pois, foram esses que subsidiaram a interpretação da questão, bem como as respostas dos jovens.

A explicação para a imbricação entre princípios e valores escoteiros, realizada pelos jovens, é que os “Valores [do escotismo] são baseados nos Princípios [escoteiros], e se constituem no conjunto de crenças incorporadas por cada um, e que se refletem em suas condutas” (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 5). Além disso, o manual do escotismo destinado ao ramo Pioneiro esclarece que: “Todas as atividades oferecidas pelo Escotismo, de acordo com o Programa Educativo, se realizadas considerando o Método Escoteiro, contribuem para que as crianças e jovens adquiram valores” (Ibidem, p. 14). Portanto, a recorrência aos valores escoteiros na rotina de formação dos jovens, impacta nas reflexões realizadas pelos jovens e que transpareceram nas respostas para a nossa questão sobre como os princípios do escotismo manifestavam-se na escola:

̲ “Percebo pela dedicação, o respeito com os mais velhos, as responsabilidades com que você usa suas atitudes com seus colegas e professores” (P2).

̲ “A noção de ter responsabilidade foi percebida por mim no Escotismo e na escola; sendo que, no escotismo aprendi antes a ter responsabilidade e isso serviu para a escola e mais ainda na faculdade” (P6).

̲ “Aprendizagem da vivência das leis [escoteira] em qualquer cotidiano” (P9).

̲ “Princípios como lealdade, persistência, respeito são oriundos do escotismo, mas também são aplicados nas escolas” (P13).

̲ “O Escotismo tem como base os princípios, a ordem e a socialização. O escoteiro absorve estes ensinamentos e quando vão para a escola há uma visível melhora em seu comportamento perante os professores e colegas. Afiro com base em minha vivência” (P 14).

Recorrente nas respostas, a noção de responsabilidade, respeito e equipe, interage com outros aspectos os quais o ME lança mão no seu programa para jovens, tais como: a organização, a disciplina e o compromisso. Sobre esses aspectos, o Movimento apresenta a postura esperada dos jovens que compartilham da mesma formação escoteira:

Para o escoteiro, ser obediente e disciplinado significa se organizar e não fazer nada pela metade. É um convite e um desafio à capacidade de assumir compromisso. Quem se compromete, organiza seu tempo para alcançar o objetivo proposto, respeita a necessidade dos outros (...) Em várias situações, para executar algo, alguém deve coordenar e dirigir a ação de todos. Para cooperar, de modo que nada fique pela metade, é preciso saber trabalhar em equipe: (...) delegar responsabilidades, dirigir o trabalho, mas também aceitar executar as tarefas que lhe forem confiadas (ESCOTISMO E VALORES, s/d, p. 14).

Ainda sobre a questão dos princípios escoteiros, alguns jovens os relacionaram com a liderança exercida por eles na escola:

̲ “Os escoteiros exercem no colégio um nítido comportamento de liderança e facilidade em trabalhar em equipe” (P1).

̲ “Eu percebi logo que entrei no movimento e me foram passados os primeiros princípios. Desde então eu me destaquei por isso, fazendo com que os próximos a mim também mudassem. Desde sua maneira de pensar até suas ações com terceiros” (P7).

Outros dois entrevistados afirmaram que os valores que regem o escotismo não convergem com o ambiente escolar:

̲ “não vi os princípios na escola, ajudar o próximo, lealdade, valores não estão presentes na escola” (P5).

̲ “Eu acredito que a escola tem se distanciado dos princípios do escotismo, uma vez que ela tem que lidar com outros desafios relacionados à realidade dos alunos (...) Na medida em que a escola se tornou mais inclusiva, recebendo um grande contingente de alunos, seus desafios aumentaram, e a parte ética/moral foi, involuntariamente, sendo deixada de lado”(P8).

Perguntados sobre os reflexos do escotismo nas aprendizagens escolares dos pioneiros. Setenta e nove por cento dos jovens responderam positivamente, ou seja, eles perceberam influências das práticas desenvolvidas no contexto do ME incidindo nos seus desempenhos na educação formal:

̲ “Sim, desde alteração em meus padrões de comportamento a maior desenvoltura na apresentação de trabalhos. As especialidades escoteiras foram ímpares no meu aprendizado, visto que por meio delas eu aprendia a estudar sozinha e me interessar mais pelo que me era passado no colégio” (P1).

̲ “Sim, pois, ajuda a melhorar a concentração e o foco” (P4).

̲ “Pela facilidade, responsabilidade, cumprir horários e prazos, disciplina” (P5).

̲ “Com certeza, no escotismo tem seis áreas de desenvolvimento, que são, físico, espiritual, caráter, afetivo, social e intelectual. São áreas que são desenvolvidas a partir de jogos e brincadeiras. Ao passar do tempo este aprendizado é incorporado em todos os lugares que o escoteiro está inserido” (P14).

A dedução dos jovens sobre o impacto positivo da prática do escotismo na aprendizagem escolar, pode ser reflexo do que o Programa de Jovens do ME estabeleceu como um de seus objetivos educacionais: o desenvolvimento intelectual:

1-Ampliar continuamente seus conhecimentos, mediante o autodesenvolvimento e a aprendizagem sistemática. 2-Atuar com agilidade mental diante de situações as mais diversas, desenvolvendo sua capacidade de pensar, inovar e avaliar riscos, sem medo de enfrentá-los. (...) 6-Reconhecer o saber científico como um importante caminho para compreender o homem, a sociedade e o mundo, e utilizar a tecnologia como um meio a serviço do homem (PROGRAMA DE JOVENS, s/d, p. 8).

Duas respostas, contradizendo as anteriores, não atribuíram ao escotismo influências na aprendizagem escolar:

̲ “Acredito que não, é muito diferente o que nós vemos aqui e o que vemos na escola e na faculdade” (P6).

̲ “No aprendizado em si talvez não, porém ele me mantém focado no caminho que escolhi e me fez evoluir de acordo com o que eu precisava em cada faixa etária” (P7).

Para um dos pioneiros, a questão proporcionou uma autoavaliação que confrontou suas aprendizagens na educação formal e na não-formal:

̲ “Eu acho que quando eu estudava em um colégio católico muito tradicional, o escotismo teve uma contribuição na minha formação humanística. No que diz respeito ao aprendizado propriamente dito, eu acho que a contribuição foi menor, mas ainda importante, pois abarcou áreas/temas que a escola não consegue abranger” (P8).

Interessamo-nos também pela rotina dos escoteiros durante os encontros semanais dos grupos (Diga-me o que você costuma fazer no grupo escoteiro, desde o momento que chega até o final do encontro ‒ terceira pergunta do anexo II). Percebemos uma divisão das respostas entre dois grupos: o primeiro, de jovens responsáveis por capitanear as ações, realizando o planejamento e organizando os espaços e os tempos a fim de disponibilizá-los para os demais:

̲ “Na chegada, cumprimento a todos que conheço e vou separar o material da reunião. Participo como expectadora na cerimônia de abertura, auxilio o chefe da tropa nos jogos e adestramentos durante a tarde, conduzo a cerimônia de encerramento e, quando há reuniões com a diretoria, participo, quando não, vou para a casa ao findar da cerimônia de encerramento” (P1).

̲ “Hoje vivo uma situação dupla no meu grupo. Sou membro juvenil (Pioneiro) e diretor administrativo, então preciso conciliar essas suas obrigações num espaço de duas horas e meia. Minhas tarefas como diretor atualmente estão ligadas a arte financeira, como abrir e fechar os caixas e trabalhar na cantina. Já como pioneiro tenho que ajudar os outros membros com os projetos que vão desde cunho social a financeiro” (P7).

̲ “Elaborar a reunião de minha tropa escoteira na qual eu atuo ou participar da reunião do clã posteriormente do hasteamento, elaborando discussões e atividades de progressão pessoal voltado ao grupo ou comunidade” (P12).

No segundo grupo de respostas, temos relatos de jovens que realizam tarefas demarcadas pela recreação, nas quais os pioneiros comportam-se como aprendizes ou ajudantes. Este grupo tende a ficar à disposição para as atividades e discussões propostas pelos seus pares:

̲ “Ao chegar cumprimentamos aos chefes, amigos (...) decidimos qual será a atividade do sábado (...) Discutimos sobre os objetivos e porquês de fazer tais caridades e como isso é bom” (P2).

̲ “ajudar no que é necessário: cantina, lojinha, outras seções” (P5).

̲ “Nós nos reunimos, (...) discutimos os projetos em andamento. Discutimos sobre nossas ideias” (P6)

̲ “Me encaminho para a cerimônia de abertura. Após a cerimônia de abertura, atualmente eu ajudo os chefes da alcateia na "reunião" que é oferecida aos lobinhos” (P8).

̲ “Realização de rituais na chegada e, posteriormente, realização de atividades” (P10).

̲ “Participo das atividades propostas” (P13).

As relações estabelecidas, a socialização decorrente dessas e as trocas entre sujeitos provenientes de diferentes contextos, aliadas a um projeto que inclui entretenimento, instrução e cooperação entre os educandos, corrobora para a constituição do jovem escoteiro. Essa dinâmica pode culminar com o que Pinto (2005) definiu como “aprendizagem social”, que é uma das formas de atribuir importância ao processo de ensino-aprendizagem que a educação não-formal proporciona (MORAIS, 2012).

A relação entre educadores e educandos, como já expomos, seja na educação não-formal generalizada ou no escotismo, guarda importantes diferenças em relação à educação formal, principalmente no que tange à hierarquização entre as partes e a autonomia concedida ao educando. Diferentes pontos de vista surgiram nas respostas à questão do questionário sobre essa relação. O fato dos mestres ou mestras pioneiros ‒ como são chamados os chefes de seção neste ramo ‒ e de seus assistentes terem normalmente a mesma idade ou uma diferença mínima em relação aos demais integrantes do grupo, fizeram transparecer nas respostas as conturbações e conflitos possíveis:

̲“É um pouco confusa. Como o pioneiro não é chefe mas também não é visto como membro juvenil pelos jovens, há por parte da chefia uma relação de ‘professor e aluno’ e um respeito muito grande dos jovens por eu ser alguém que tem muito a ensiná-los” (P1).

̲“É interessante quando consigo, através dos conflitos, aprender a respeitar chefes e monitores que muitas vezes têm a minha idade, é uma interação construtiva” (P6).

̲ “Meio conturbada com os chefes, pois sempre fui monitor, e quis expor os pontos dos mais jovens56 (P7).

No escotismo, as posições de liderança se apoiam na competência do integrante e “os papeis e tarefas internas se determinam em função dos diferentes aspectos da atividade a realizar e das capacidades pessoais” de cada membro (ESCOTISTAS EM AÇÃO, 2015, p. 78).

A flexibilidade não apenas na proposta educativa, mas também na relação entre os aprendizes e os mais experientes do ME, gerou respostas para a questão sobre o relacionamento educador-educando, em que os jovens ressaltaram a importância do respeito ao mais velho e ao que sabe mais, sem, no entanto, deixar de observar a independência de ideias e a autonomia, que são aspectos valorizados pelo escotismo:

̲“Muito boa [a relação], apesar de não concordarmos em tudo, respeitamos e tentamos entender” (P2).

̲“De independência, em que os escoteiros tomam as decisões, e o monitor apenas orienta para evitar decisões erradas” (P9).

̲“Eu os respeito, escuto e sigo suas considerações, mas se achar necessário questiono e me imponho” (P13).

Metade dos jovens avaliaram a relação “professor-aluno” no escotismo com um conceito otimista, ressaltando o aspecto colaborativo, familiar, além do companheirismo no trato entre as ambas as partes:

̲“Boa e de amizade, já que não procuro ter divergências com eles” (P4).

̲“Acredito que, no geral, é boa, principalmente pelo fato de muitos dos chefes terem sido meus companheiros nas seções. Ou seja, crescemos juntos dentro do escotismo” (P8).

̲“É uma relação pessoal, apesar da hierarquia” (P11).

̲“A melhor possível, convivemos com respeito mútuo como se fossemos uma família” (P12).

Perguntamos aos pioneiros se a dinâmica dos encontros incluía o uso de tecnologias e quais delas poderiam ser citadas por eles (quinta pergunta do anexo II). Nas respostas, 15% referiram-se aos livros como uma tecnologia presente na formação dos escoteiros. Em 69% das respostas os jovens mencionaram algum aspecto ligado à web, utilizada pelos escoteiros para fins variados: dialogar, planejar as reuniões, pesquisar ou jogar on-line. Desse total, 42% citou o uso das redes sociais ‒ como o Facebook e Whatsapp ‒ para fins de interações relativas ao escotismo:

̲“Aplicações como Dropbox e o Google Drive são muito utilizados no compartilhamento de informações. A tecnologia está presente em todas as dinâmicas das reuniões” (P1).

As comunidades escoteiras no espaço virtual, inclusive fazendo desse o único ambiente, já são uma realidade57. As respostas dos pioneiros destacaram as facilidades que os aplicativos digitais proporcionam ao desenvolvimento de algumas propostas do ME. Por outro lado, a realidade de alguns grupos limitada o acesso a essas ferramentas a determinados membros durante os encontros:

̲ “Nós utilizamos do celular para fazer alguma pesquisa ou consulta na internet. Nós podemos ainda abrir algum arquivo digital como música ou história que são repassadas aos meninos. Já os meninos não devem fazer uso de equipamentos eletrônicos durante os encontros” (P8).

O uso das tecnologias digitais na dinâmica das reuniões escoteiras é uma questão que gera controvérsias entre os participantes. Um deles foi enfático ao afirmar que “Não se utiliza tecnologia” durante os encontros (P11), provavelmente subentendendo que nossa pergunta restringia o termo tecnologia à esfera digital. Conseguimos verificar que a opção por incluir ou não as tecnologias digitais nos compromissos escoteiros, é uma escolha que varia de acordo com o grupo, pois nos referenciais teóricos que orientam a prática do Movimento ainda são raras as menções quanto à liberação ou restrição a estas ferramentas.

O percentual de jovens (29%) que assimila bem a diversificação do uso de tecnologias, incluindo além da digital também as tradicionalmente utilizadas na prática das pioneirias escoteiras, representa uma minoria, que mesmo fazendo parte da Geração Z58, vê benefícios em manter-se desconectado ao menos durante os encontros:

̲“Redes sociais em geral, mas, são utilizados durante a semana. Na dinâmica dos encontros é mais pessoal” (P4).

̲“Ao contrário da escola e da faculdade quando a utilização da internet para pesquisas é constante, aqui no escotismo nós privilegiamos outro tipo de interação, inclusive evitando o uso de celular, nós conversamos mais e fazemos as pioneirias” (P6).

Indagamos aos pioneiros a respeito do esquema de progressão ‒ um dos parâmetros do Movimento. A questão foi elaborada de modo que os jovens pudessem exprimir suas concepções sobre o conceito de progressão no escotismo. Reiteramos que a ascensão do jovem no ME passa por diferentes formas de avaliação. Como visto, os membros do escotismo se autoavaliam e são analisados pelos adultos do Movimento e pelos seus pares. No manual Escotistas em Ação Ramo Pioneiro (2015, p. 42), a avaliação é descrita como:

Um instrumento motivador do autodesenvolvimento [que] se constitui ao redor de etapas de progressão, que considera a individualidade e que abrange todas as dimensões do ser humano em seis áreas de desenvolvimento: físico, intelectual, social, afetivo, espiritual e caráter (ESCOTISTAS EM AÇÃO, 2015, p. 42).

Este conceito de avaliação, imbricado nas questões inerentes à progressão, ecoou em 50% das respostas à nossa pergunta sobre a noção dos jovens em relação à progressão. Dentro do percentual citado, 36% dos pioneiros usou o termo “etapas” para explicar a sucessão de atividades e avaliações que levam à progressão. Outros 14% das respostas, em sintonia com a definição oficial, referiu-se às seis áreas de desenvolvimento focadas pelo escotismo para explicar o sistema de progressão:

̲“Contém progressões tipo físico, intelectual, espiritual e outras. Tentamos vivenciar pelo menos algumas delas todos os sábados variando-as” (P2).

̲ “Sempre busquei minhas etapas em todos os ramos” (P7).

̲ “Através de etapas, nas quais se deve atingir objetivos em cada uma” (P 9).

Outro critério avaliativo o qual os jovens pioneiros precisam observar dentro do escotismo, é a elaboração de um “plano de desenvolvimento pessoal”, descrito como a principal estratégia educativa para este ramo (ESCOTISTAS EM AÇÃO, 2015, p. 53). Tal tarefa consiste no planejamento, acompanhamento e aperfeiçoamento de um plano de desenvolvimento individual, que tenha como características a flexibilidade e a possibilidade de ser reelaborado no decorrer da formação dos jovens. O projeto pessoal tem dentre suas funções antecipar o futuro desejado pelo pioneiro, possibilitar que esse faça escolhas (ainda que virtuais) e familiarizá-lo com possíveis frustrações. Para 21% dos entrevistados, o projeto pessoal define a progressão dentro do Movimento:

̲ “São apresentadas aos jovens inúmeras possibilidades e ele é quem decide quais destas são compatíveis com sua personalidade e perspectiva de futuro e traça sua progressão pautada nisto, tendo o adulto como um orientador e avaliador” (P1).

O critério “idade” foi lembrado por 29% dos entrevistados como condição para a progressão no escotismo, sendo que 15% restringiu-se a ela como regra e 14% ressaltou-a juntamente com outros fatores que incidem na progressão:

̲ “Aqui a idade é só um dos parâmetros de progressão, a iniciativa conta muito mais. Ao contrário da escola, onde o professor te manda fazer uma atividade, aqui é o escoteiro, seja criança ou adolescente, é que se dispõe a progredir. Isso contribui para o futuro, no trabalho [...] A nossa vantagem é que nós desenvolvemos esta característica bem antes” (P6).

̲ “A progressão ocorre por idade entre as seções, em que os membros são separados por faixas etárias. Já dentro de determinada idade, há uma progressão adequada à realidade do membro e que tenta englobar várias áreas da vida do jovem [...] desenvolvendo todas as suas potencialidades próprias da sua idade e preparando-o para a próxima etapa dentro do escotismo” (P8).

Para 14% dos pioneiros, a marca da progressão e da aferição da aprendizagem na educação oferecida pelo Movimento Escoteiro, é o caráter coletivo de ambos:

̲ “A progressão é individual e/ou coletiva através de jogos e das etapas (...)” (P15).

̲ “É feita em conjunto, embora a progressão seja uma conquista individual” (P13).

Ao longo desta pesquisa confrontamos a educação formal e a não-formal a partir de categorias de análise que ora as aproximavam (não equiparando), ora as distinguiam objetivamente. Delegamos esse exercício de comparação também aos jovens do ME perguntado-lhes: “Na sua opinião quais são as principais diferenças entre a escola e o movimento escoteiro?” (anexo II).

Entre a oportunidade de o educando fazer suas próprias escolhas ‒ possibilitadas por um programa de ensino que oferece variedade e flexibilidade de acesso e de conteúdos ‒, além da autonomia decorrente dessa oportunidade, versus, as limitações impostas por um padrão de funcionamento que impacta desde os espaços-tempos até as relações entre educador e educando, a comparação entre escotismo e escola, motivou uma crítica negativa a essa última por parte de 64% dos jovens.

Dentro das diferenças entre ambas as propostas educacionais, a ausência do cultivo de valores (por parte da escola), tidos pelos pioneiros como essenciais para as situações de convivência e que são promovidos pelo escotismo, pesou para que em 14% das respostas o escotismo fosse mais apreciado que a proposta educativa da escola.

A oposição entre a teoria ‒ latente na escola ‒ e a prática ‒ ponto forte do escotismo, segundo os pioneiros ‒ foi ressaltada em 21% das respostas. Os jovens argumentam que a rotina de aplicar durante as atividades o que é aprendido teoricamente durante os encontros no ME, facilita a aprendizagem, cria um senso de utilidade dos conteúdos propostos e provoca nos membros do clã a sensação de estarem fazendo o que se gosta (P5). Sobre o embate entre teoria e prática, o entrevistado P6 ponderou que:

̲ “A construção do conhecimento, na escola, o professor manda fazer uma atividade que não tem utilidade, pelo menos imediata, na vida do aluno. Aqui nós também temos um chefe, mas ele dá a ideia e nós desenvolvemos, não é só teoria, nós nos reunimos, fazemos as pioneirias e, mesmo que isso não sirva para a nossa vida fora do escotismo, é possível aliar teoria e prática durante os encontros, fazer é um diferencial em nossa aprendizagem”.

Para 29% dos jovens o caráter opcional do escotismo em comparação com a obrigatoriedade da escola é a maior diferença entre ambos os sistemas.

Para 36% dos pioneiros, a proposta pedagógica do escotismo é mais atraente que a oferecida pelos estabelecimentos de ensino regular:

̲ “A escola parece formar pessoas para trabalhar, enquanto o escotismo busca formar cidadãos mais preparados para os desafios da vida em sociedade, o que inclui o trabalho” (P8).

̲ “A instituição de ensino genérica desenvolve apenas o lado intelectual, enquanto o escotismo busca o desenvolvimento físico, espiritual, social, além do intelectual” (P13).

Cabe ressaltar que tanto o Movimento Escoteiro afirma a sua função de complementaridade das ações da educação formal, quanto as teorias sobre a educação não-formal ressaltam o papel da escola como imprescindível para a compreensão, prática e crítica das ações desempenhadas pelas instituições que, assim como o escotismo, oferecem educação não-formal (LIBÂNEO, 2002). Apuramos que 21% dos jovens reconhecem que a soma entre ambas as propostas pedagógicas é importante para a sua formação:

̲ “Existem diferenças no modo de agir dos membros e principalmente nos objetivos dos dois. A escola hoje em dia não tem como maior foco a formação humana, que no caso do escotismo é o principal” (P15).

̲ “O movimento escoteiro você participa pela sua vontade, a escola é obrigado. Ambos tem como base a formação do indivíduo, porém com metodologia diferentes” (P14).

̲ “O Movimento escoteiro é algo que escolhemos participar, onde desenvolvemos tarefas mais dinâmicas e desenvolvemos mais a parte social, já a escola desenvolve as áreas científicas. Porém um se desenvolve com o outro” (P12).

Por último, perguntamos aos jovens, de que forma a prática do escotismo influenciou a formação pessoal de cada um. Na elaboração das respostas eles realçaram os aspectos individuais e coletivos, as felicidades e as advertências que resultaram em aprendizagens.

Mais uma vez, os valores inerentes ao Movimento foram sublinhados, bem como aspectos variados: o altruísmo, as habilidades e técnicas escoteiras, o trato nos relacionamentos pessoais (coeducação), a progressão do caráter e a valorização das dificuldades pelas quais os pioneiros passam durante todo o percurso: o ingresso, a adaptação e o desenvolvimento proporcionados pelas experiências no ME:

̲ “O escotismo influenciou bastante a minha formação como pessoa, formando as bases dos meus padrões de ética, solidariedade e responsabilidade. Estes são temas foco do escotismo e que são sistematicamente trabalhados no movimento, embora nem todo mundo aproveite dessa oportunidade para melhorar como pessoa” (P8).

Uma das respostas (P15) atribuiu ao escotismo a “formação de novos gostos e interesses” em sua vida. Esta fala vai ao encontro do que Gohn (2005) concluiu a respeito da formação de referências e preferências em cada ser humano, pois, de acordo com a autora, mais do que herdados, esses aspectos são passíveis de serem aprendidos, sendo a educação não-formal um agente importante para este fim.

A “interação social”, frisada por “P12”, foi apontada por 63% dos pioneiros como a principal influência do ME na personalidade dos mesmos durante o processo de ensino-aprendizagem no escotismo:

̲ “Muito importante é enfatizar o papel das amizades na vida do membro do escotismo, que, em geral, o marcam para sempre” (P8).

̲ “A minha vida foi diretamente influenciada pelo escotismo, desenvolvendo meu caráter por meio de disciplina e interação social” (P12).

̲ “O escotismo me ensina a amar o próximo e os animais, a ser caridoso e sempre ajudar todos que necessitam. Fez de mim uma pessoa melhor, deixar-me menos tímido e mais sociável. No momento, fiz amigos fiéis e sei que posso contar” (P14).

Brandão (2007) apontou que os modos de vida de um grupo social, constituído a partir da prática da educação não-formal, contribui para a formação da identidade dos sujeitos integrantes desse grupo, além de despertar saberes e habilidades. Essa afirmação, juntamente com os depoimentos dos jovens a repeito da importância dos seus pares para a sua formação no escotismo, corroboram com uma das finalidades do método educativo do Movimento, que é provocar nos membros o “senso de pertencimento a um grupo de iguais” (PROJETO EDUCATIVO, s/d), ao mesmo tempo oferecendo a esses a aquisição de autonomia progressiva, conjugada com responsabilidades, conquistadas por cada um dos jovens ao seu tempo.

8. CONCLUSÃO

Ao compararmos a educação formal, a não-formal e o escotismo, buscamos expor as especificidades do projeto educativo de cada um desses modelos educacionais. Nos eximimos das análises e julgamentos de valor, detemo-nos à exposição de ideias e aos discursos oficiais ‒ no caso do escotismo. Mesmo quando nos deparamos com argumentos legítimos, correspondentes à realidade educativa brasileira ‒ nos referimos às críticas à educação formal ‒ propositalmente selecionamos os trechos explicativos explícitos nos pontos de vista, os que evidenciavam conceitos, a fim de elaborar um panorama histórico, contemporâneo e sucinto dos diferentes tipos de educação.

Um dos pontos positivos percebidos após as comparações, foi a valorização ‒ por parte da educação não-formal e do escotismo ‒ da instituição escolar , que, mesmo com as suas deficiências, a exemplo da subserviência às classificações impostas pela avaliação e a fragmentação dos saberes parcializados em disciplinas ‒ questão que aos poucos vem sendo problematizada e repensada, a exemplo das propostas de integração entre os saberes docentes presentes na formação dos professores ‒ é indiscutivelmente imprescindível aos sujeitos que visam ter acesso aos demais tipos de educação, como a não-formal e o escotismo.

Outro ponto, não necessariamente negativo, mas que a cada aspecto utilizado para expor os conceitos, suscitou reflexões a respeito, é a predominante ausência do profissional pedagogo nos espaços de educação não-formal, a exemplo do escotismo. Seriam os saberes desse agente dispensáveis às propostas educativas desses programas educacionais? Além das atividades de docência, orientação, supervisão, administração e pesquisa desempenhados pelo pedagogo nas escolas, empresas, hospitais, educação a distância e repartições públicas, não seriam os espaços de educação não-formal propícios à atuação do pedagogo, esses contribuindo com seus saberes sobre as disciplinas consagradas pela escola, sobre a psicologia infantil, a sociologia e a história da educação?

O ciclo desta pesquisa foi iniciado com a seleção de ideias entre alguns dos escritores expoentes da Pedagogia e entre os nossos pares, os pesquisadores (pós-graduados). Esses tornaram possível nosso objetivo de definir o que é a educação, nas suas formas formal e não-formal. Nos detemos aos princípios e normas do escotismo por meio do discurso oficial da União dos Escoteiros do Brasil, que há mais de noventa anos regula a prática no País. Fechamos o ciclo com o conhecimento empírico dos jovens escoteiros. Esses, sintonizados com as demandas inerentes também aos jovens não-escoteiros, foram instigados pela nossa pesquisa a refletirem sobre educação formal e a não-formal a partir do escotismo, e exporam seus pontos de vista mais que favoráveis ao Movimento Escoteiro, numa legítima assimilação dos valores apregoados por Baden-Powell desde 1907.

O exercício de comparação permitiu-nos identificar as peculiaridades e os entrecruzamentos entre os três tipos de educação supracitados, como a presença de rituais em todas elas, sejam os que regulam as relações e os tempos na educação formal, os que através da socialização buscam a formação de identidades grupais na educação não-formal ou os que por meio das cerimônias de iniciação e distintivos, celebram os escoteiros novatos e os veteranos promovidos. Entre todas as diferenças desses três tipos de educação, a mais perceptível é a relação entre educador e educando. Na escola os papéis estão hierarquicamente definidos, apesar da interdependência entre ambos, cuja falta de parceria, praticamente desmorona o processo de ensino aprendizagem ou pelo menos o enfraquece sobremaneira. Na educação não-formal tal relação é praticamente indefinida, os educadores ora são os próprios espaços, ora um ideal ativista ou o próprio educando através de situações cotidianas como o acesso às mídias de comunicação e a prática de atividades que o levam ao autoconhecimento. No escotismo, o chefe escoteiro, irá mediar as situações de ensino-aprendizagem não como um professor, nem como um comandante, mas terá de encarnar o papel de irmão mais velho para dos aprendizes do Movimento, concorrendo ainda com o protagonismo do próprio aprendiz através da autoeducação e da coeducação entre os inexperientes.

Nosso grupo de pesquisa, familiarizado em parte ao universo do escotismo, por meio das vivências nesse meio por parte de um dos integrantes do trio, teve a oportunidade de estabelecer trocas, discussões e entrar em contato com jovens escoteiros que mostraram-se positivos e realmente merecedores de representarem o Movimento nesta pesquisa, através de uma postura responsável de colaboração para com o nosso grupo e com as questões propostas pela pesquisa.

As sugestões e propostas características das conclusões deste tipo de trabalho, aqui seriam redundantes tendo em vista a solidez de cada uma das propostas educativas estudadas. A escola tem sua função social inquestionável, sendo uma das principais responsáveis pela emancipação dos sujeitos jovens e maduros através da socialização dos conhecimentos sistematizados, ainda que esses advenham dos discursos oficiais parciais, que desconsideram todo um contigente de saberes populares e empíricos. A educação formal tem sua consolidação incontestável, tendo em vista o engajamento notoriamente valorizado socialmente, a exemplo do trabalho realizado pelas ONGs e pela terceira via, que suprem de forma interessada e solidária as demandas das mais diversas frentes de luta e de ativismo. Enfim, o escotismo mostrou-se como realmente capaz de desenvolver a educação integral aspirada pelo seu fundador. Para além de relacionar aqui argumentos que sustentam a confirmação da nossa hipótese inicial, justificamos a nossa fé no Movimento simplesmente reconhecendo que o discurso presente no Projeto Educativo, no Programa Para Jovens e no Método Educativo do escotismo, foi posto em prática pelos grupos escoteiros belorizontino que nos auxiliaram a finalizar este processo extenso e inconcluso, na medida em que os resultados obtidos possibilitam diversos outros desdobramentos para os nossos objetivos.

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ANEXO I

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS

CAMPUS BELO HORIZONTE

FACULDADE DE EDUCAÇÃO

CURSO DE PEDAGOGIA

TRABALHO DE CONCLUSÃO DE CURSO

TEMA PESQUISADO: O ESCOTISMO

Este questionário socioeconômico cultural tem como objetivo colher dados que ajudarão o grupo de TCC a entender o perfil sóciocultural do grupo de Escoteiros que estão colaborando com a nossa pesquisa.

Qual a sua idade? ___________

Qual o seu sexo? ( ) F ( ) M

Qual a sua cor? ( ) Preta / ( ) Parda / ( ) Branca / ( ) Amarela / ( ) Indígena

Em que localidade da cidade seu domicílio se encontra?

( ) Bairro na periferia da cidade

( ) Bairro na região central da cidade

( ) Condomínio residencial fechado

( ) Conjunto habitacional

( ) Favela / Cortiço

( ) Região rural (chácara, sítio, fazenda, aldeia, etc.)

( ) Outro: ____________

Com quem você mora? (múltipla escolha)

( ) Pais

( ) Cônjuge

( ) Companheiro (a)

( ) Filhos

( ) Sogros

( ) Parentes

( ) Amigos

( ) Empregados domésticos

( ) Outros

( ) (ou) Sozinho (a)

Marque com um X a frente do tipo de instituição de ensino na qual você cursou a maior parte do:

Ensino fundamental

Ensino médio

Escola pública

 

Escola pública

 

Escola particular

 

Escola particular

 

Escola particular com bolsa parcial

 

Escola particular com bolsa parcial

 

Escola particular com bolsa integral

 

Escola particular com bolsa integral

 


Atualmente você:

( ) Apenas estuda

( ) Trabalha e estuda

( ) Apenas trabalha

( ) Está desempregado (a)

( ) Está de licença ou incapacitado de estudar / trabalhar

( ) Está aposentado (a)

( ) Não trabalha nem estuda

Qual o valor da sua renda familiar mensal (somatório da renda de todos que moram com você) ?

( ) Até um salário mínimo (até R$788)

( ) De um a dois salários mínimos (entre R$788 e R$1.576)

( ) De três a cinco salários mínimos (entre R$2.364 e R$3.940)

( ) De seis a oito salários mínimos (entre R$4.728 e R$6.304)

( ) De nove a quinze salários mínimos (entre R$7.092 e R$11.820)

( ) Mais de vinte salários mínimos (Acima de R$15.760)

( ) Prefiro não declarar

Além do ESCOTISMO, Você participa de alguma outra entidade ou associação? (múltipla escolha)

( ) Associação de bairro ou de moradores

( ) Associação ou movimento ligado à luta de minorias (assinalar):

( ) Negros

( ) Mulheres

( ) Homossexuais

( ) Meninos de rua

( ) Outra. Qual? ________________________

( ) Associação pastoral ou eclesial

( ) Associação de pais e mestres

( ) Sindicato de trabalhadores ou patronal

( ) Partido ou associação política

( ) Organização não governamental

( ) Time de futebol ou clube esportivo

( ) Escola de samba

( ) Grupo de dança, música ou teatro

( ) Atividades de (assinalar):

( ) Igrejas católicas

( ) Igrejas evangélicas

( ) Cultos afro-brasileiros (umbanda, candomblé)

( ) Centros espíritas kardecistas

( ) Outro grupo religioso. Qual?_______________

( ) Outros tipos de associações ou entidades. Quais? _______________________

( ) Não participo.

Com que frequência você tem acesso a estes meios de informação (selecione com um X)?

Meio

Diariamente

Quase diariamente

Às vezes

Raramente

Nunca

Jornais

 

 

 

 

 

Revistas

 

 

 

 

 

Televisão

 

 

 

 

 

Internet

 

 

 

 

 

Livros

 

 

 

 

 

Rádio AM / FM

 

 

 

 

 


Com que frequência você (selecione com um X):

 

Semanalmente

Ao menos 1 vez por mês

Ao menos 1 vez por ano

Menos que 1 vez por ano

Nunca

Vai ao cinema

 

 

 

 

 

Vai ao teatro

 

 

 

 

 

Vai ao estádio

 

 

 

 

 

Vai ao museu

 

 

 

 

 

Vai ao shopping

 

 

 

 

 

Vai ao parque

 

 

 

 

 

Assiste a shows/

concertos

 

 

 

 

 

Pratica esportes

 

 

 

 

 

Vai a bares/ danceterias

 

 

 

 

 


ANEXO II

GRUPO ESCOTEIRO: _____________________________________

HÁQUANTO TEMPO VOCÊ PARTICIPA DO MOVIMENTO ESCOTEIRO? ____________

  1. COMO VOCÊ PERCEBE A INSERÇÃO DOS PRINCÍPIOS DO MOVIMENTO ESCOTEIRO NA ESCOLA?

  2. O ESCOTISMO GEROU REFLEXOS NO SEU APRENDIZADO NA ESCOLA?

  3. DIGA-ME O QUE VOCÊ COSTUMA FAZER NO GRUPO ESCOTEIRO, DESDE O MOMENTO QUE CHEGA ATÉ O FINAL DO ENCONTRO.

  4. COMO É A SUA RELAÇÃO COM OS CHEFES E MONITORES?

  5. QUAIS SÃO AS TECNOLOGIAS OU MEIOS DE COMUNICAÇÃO E INFORMAÇÃO QUE VOCÊ UTILIZA NOS ENCONTROS? ELAS FAZEM PARTE DA DINÂMICA DOS ENCONTROS?

  6. COMO É FEITA A PROGRESSÃO NO ESCOTISMO?

  7. NA SUA OPINIÃO, QUAIS SÃO AS PRINCIPAIS DIFERENÇAS ENTRE A ESCOLA E O MOVIMENTO ESCOTEIRO?

  8. DE QUE FORMA O ESCOTISMO INFLUENCIOU A SUA FORMAÇÃO COMO PESSOA?

ANEXO III

UNIVERSIDADE DO ESTADO DE MINAS GERAIS
Faculdade de Educação
Campus Belo Horizonte

Autorização e Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Universidade do Estado de Minas Gerais – Faculdade de Educação - CBH

Os alunos do Curso de Pedagogia da UEMG estão elaborando um Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) sobre o Escotismo e a educação. Para isso, estamos realizando um levantamento de dados com o objetivo de analisar a influência do Escotismo na formação e educação dos jovens.

Gostaríamos de convidá-lo a participar deste estudo. A sua participação consiste em responder a um questionário com perguntas sobre sua participação no movimento escoteiro.

A sua participação é voluntária, ou seja, você só participa se quiser. Não haverá nenhum prejuízo caso você não queira participar. Também não tem problema nenhum se você começar a responder o questionário e pular algumas perguntas ou parar de respondê-las.

O professor responsável pela orientação de TCC é o Dr. Mauro Giffoni de Carvalho, que pode ser encontrado na Faculdade de Educação da UEMG, nos seus horários de trabalho ou pelo telefone (31)32395900.

As informações obtidas nesta entrevista serão analisadas em conjunto com outras, não sendo divulgada a identificação de nenhum entrevistado.
• Você não receberá qualquer pagamento para responder a esse questionário. A sua participação não vai lhe trazer nenhum benefício pessoal, a não ser a satisfação de poder contribuir com este trabalho.
• O seu nome jamais aparecerá na divulgação dos resultados do TCC.
Desde já, agradecemos sua colaboração.
Prof. Mauro Giffoni de Carvalho (orientador)
Cristiano dos Santos Barsante

Luciene Francisca Rocha

Lydia Heluany Coste Neta
_____________________________,________ de _______________de 2015.
Eu li e entendi as informações acima, e quero responder o questionário.
_______________________________________ __________________________________
Nome Completo Assinatura do Participante

1 POWELL, Baden-. Lições da Escola da Vida, 1986.

2 Antônio Pereira da Silva, o chefe Pereira, foi o responsável, em 1927, pela criação da AME (Associação Mineira do Escotismo) , futura Federação Mineira de Escoteiros – FME. Fazendo uma analogia com os dias atuais, o chefe Pereira, seria um secretário do governo (mineiro), e sua pasta seria a do escotismo, à época.

3 Portal.mec.gov.br.

4 A endoculturação consiste na transmissão, neste caso por parte da escola, das “técnicas elementares da cultura”. Ver conceito detalhado em PEREIRA, 1967, p. 128.

5 Portal.mec.gov.br.

6 ProInfo Apresentação. BRASIL. MEC, 1997.

7 Op. cit.

8 Advém da filosofia do francês Gilles Deleuze (1925-1995).

9 BRASIL. Decreto-Lei nº 8.828, de 24 de janeiro de 1946. Diário Oficial da União - Seção 1- 28/1/1946, Página 1385.

10 O terceiro setor é formado por associações e entidades sem fins lucrativos, e sua classificação advém da sociologia. A sociedade civil é dividida em três setores, primeiro, segundo e terceiro. O primeiro setor é formado pelo Governo, o segundo setor é formado pelas empresas privadas, e o terceiro setor são as associações sem fins lucrativos. O terceiro setor contribui com locais onde o Estado não conseguiu instalar serviços, equipamentos e ações organizadas e solidárias. Portanto, possui um papel fundamental na sociedade. Dentro das organizações que fazem parte do Terceiro Setor, estão as ONGs (Organizações Não Governamentais), entidades filantrópicas, OSCIP (Organização da Sociedade Civil de Interesse Público), organizações e associações civis sem fins lucrativos. Disponível em: http://www.significados.com.br/terceiro-setor; https://pt.wikipedia.org/wiki/Terceiro_setor. Adaptado.

11 Fernandes (2001); Park & Fernades (2005); Simson; Park; Fernandes (2001); Vecchiato (1997); Chagas (2006); Pedro (2005); ECA apud OLIVEIRA, 2008, p. 41.

12 Estudos em Educação Não-Formal da Michigan State University (1974, p. 6,7) apud Garcia, 2009, p. 56.

13 Pinto, L. (2005). Sobre educação não–formal. Cadernos D’Inducar apud Matias, 2013, p. 82.

14 SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes von; TEIXEIRA, Carmem de Miranda Yeks; CHISTE, Lissandra Silva & GONÇALVES, Renata Mateus. A valorização da diferenciação sociocultural como fator de integração de estudantes em situação de risco: discussão de uma experiência concreta – O Projeto Sol de Paulínia (SP), in: SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes; PARK, Margareth Brandini e FERNANDES, Renata Sieiro (orgs). Educação não-formal: cenários da criação, Campinas, SP: Editora da Unicamp e Centro de Memória 2001, p. 59 - 78.

15 FALK, J.; KORAM, J JR. e DIERKING, L. (1986) ‘The things of Science: Assessing the Learning Potential of Science Museums’, Science Education, 70 (5), 503 – 508.

16 Ibidem.

17 O Greenpeace é uma Organização Não Governamental que atual em âmbito mundial e atua sobre problemas ambientais realizando campanhas sobre as temáticas: mudanças climáticas, proteção às florestas, oceanos, agricultura sustentável, poluição e energia nuclear. No Brasil, as principais frentes de trabalho são a proteção à Amazônia e campanhas sobre clima e energia. Fonte: http://www.greenpeace.org/brasil/pt/quemsomos.

18 A Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO - acrônimo de United Nations Educational, Scientific and Cultural Organization) é uma organização francesa fundada em 1946 com o objetivo de contribuir para a paz e segurança no mundo mediante a educação, a ciência, a cultura e as comunicações. Fonte: https://pt.wikipedia.org.

19 Gohn, 1997, p. 6 apud Oliveira, 2008, p. 43.

20 SIMSON, Olga Rodrigues de Moraes von; PARK, Margareth Brandini e FERNANDES, Renata Sieiro (orgs). Educação não-formal: um conceito em movimento. In: Rumos Educação Cultura e Arte. 3. Visões singulares, conversas plurais. Textos de Olga Rodrigues de Moraes von Simson, Margareth Brandini Park, Renata Sieiro Fernandes, Mario Sergio Cortella, Rita Amaral, Ecio de Salles, Sebastião Soares, Carlos Rodrigues Brandão; ilustrações de Andrés Sandoval e Mariana Zanetti. – São Paulo: Itaú Cultural, 2007, p. 13 - 41.

21 Sobre esse público, Garcia (2009, p. 67) o descreveu como: “População-alvo das intervenções que têm um aspecto preventivo predominante, ou seja, aquelas que desenvolvem ações com base no componente protetivo da legislação. (...) o adjetivo social especifica o risco como oriundo ou detonado pelas circunstâncias sociais e econômicas insuficientes para acesso e garantia de condições dignas de sobrevivência”.

22 Gohn, 2005, p. 100.

23 O programa Escola Aberta, realizado pela prefeitura de Belo Horizonte-MG, oferece lazer, esporte, formação e cultura para a comunidade dentro da escola. O programa mantém na cidade 120 escolas abertas nos finais de semana, recebendo cerca de 58 mil pessoas (todo mês).

Fonte: http://portalpbh.pbh.gov.br.

24 Programa onde a população decide em reuniões presenciais sobre parte dos recursos de investimentos do orçamento municipal por meio da escolha de obras a serem realizadas na cidade. O programa é regulamentado pelos arts. 182 e 183 do Estatuto das Cidades.

Fontes: http://portaldeservicos.pbh.gov.br/portalservicos/view/paginas/linhaVidaTemas.jsf.

http://jus.com.br/artigos/17559/a-obrigatoriedade-do-orcamento-participativo-no-municipio/2.

25 O autor popularizou o termo educação não-formal durante a Conferência Internacional sobre a Crise Mundial na Educação, que aconteceu na Virginia, Estados Unidos, em 1967. TRILLA BERNET, Jaume. La educación fuera de la escuela – Âmbitos no formales y educaión social. Barcelona: Ariel, 1993 apud, ALMEIDA, 2011, p. 67.

26 Op. cit.

27 Op. cit.

28 Fonte: https://pt.wikipedia.org/wiki/Rituais

29 Conceitos cunhados por Eduard Angelo em sua tese de doutorado sobre a educação não-formal.

Cf.: BENDRATH, Eduard Angelo. A Educação Não-Formal a partir dos relatórios da UNESCO. Tese de doutorado (Ciências e Tecnologia). Universidade Estadual Paulista. Presidente Prudente, 2014.

30Fonte: http://conceito.de/capital-social.

31Fonte:https://www.google.com.br/webhp?sourceid=chrome-instant&rlz=1C1AVNG_enBR617BR617&ion=1&espv=2&ie=UTF-8#q=capital+humano.

32 LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo: Editora 34, 1999.

Fonte: http://www.cafecomsociologia.com.

33 Op. cit.

34 Tudo o que existe disponível e criado em uma cultura como conhecimento e que se adquire através da experiência pessoal com o mundo ou com o outro; tudo o que se aprende de um modo ou de outro faz parte do processo de endoculturação (BRANDÃO, 2007, p. 25).

35 Projeto Educativo trata-se não apenas do título de uma de nossas fontes primárias como também designa a proposta curricular do escotismo. Desta forma, este termo aparecerá no texto ora como substantivo próprio, ora como substantivo comum, bem como outros termos como: Método Educativo, Promessa Escoteira, Lei Escoteira, Programa Educativo e Programa Para Jovens.

36 Crianças com 6 anos e meio de idade serão admitidas no escotismo com a condição de já tenham sido alfabetizadas. UEB. Princípios, Organização e Regras, 2013, p. 17.

37 Reprodução da tabela apresentada na apostila do Curso Preliminar. UEB, s/d, p. 9.

38 A trama de “Mogli - O Menino Lobo” gira em torno do jovem Mogli, garoto de origem indiana que foi criado por lobos em plena selva, contando apenas com a companhia de um urso e uma pantera negra. Sinopse e detalhes da versão cinematográfica da obra. Disponível em: . Acesso em 23 set 2015.

39 Identificação própria para os membros desse ramo.

40 Por COMPETÊNCIA define-se a união de CONHECIMENTO, HABILIDADE e ATITUDE em relação a algum tema específico. O aspecto educativo da Competência é que ela reúne não só o SABER algo (Conhecimento), mas também o SABER FAZER (Habilidade) para aplicação do conhecimento e, mais ainda, SABER SER (Atitude) em relação ao que sabe e faz, ou seja, uma conduta que revela a incorporação de valores. (Grifos do autor). Curso Preliminar, UNIÃO DOS ESCOTEIROS DO BRASIL, 2012, p. 13.

41 Chaves inseridas pelo próprio manual.

42 Op. cit.

43 Esta regra pode ser flexível para os casos de deficiência cognitiva.

44 POWELL, Baden. Lições da Escola da Vida, 1933.

45 Baden-Powell ensinou este gesto aos escoteiros, o qual ele mesmo aprendeu com guerreiros de tribos africanas, durante sua estada no continente como militar a serviço da Inglaterra. Os guerreiros, para não baixarem a guarda, cumprimentavam-se sempre com a mão esquerda, enquanto a direita segurava um escudo.

46 Grifo do autor.

47 Programa Educativo. Disponível em: . Acesso em 08 out 2015.

48 BOOTH, Wayme C.; COLOMB, George G.; WILLIAMS, Joseph M.; tradução MONTEIRO, Henrique A. Rego. A arte de pesquisar. São Paulo: Martins Fontes, 2005, p. 92.

49 GIBBS, Graham. Análise de dados qualitativos. Porto Alegre: Artmed, 2009.

50 O salário mínimo vigente é de R$788,00 (setecentos e oitenta e oito reais), de acordo com decreto Nº 8.381/2014 de 23 de dezembro de 2014. Fonte: http://minimosalario.com.br.

51 Ver estratificação detalhada no slide 14 da Agenda Juventude Brasil 2013. Secretaria Nacional de Juventude. Brasil, 2013.

52 Para os meios de informação jornal, livros, revistas e rádio, não disponibilizamos aos entrevistados a distinção entre suporte impresso ou eletrônico, ou seja, não consideramos as diferentes versões nas quais estes meios encontram-se hoje.

53 Nativos Digitais. Publicada em 08/07/2015.

54 Agenda Juventude Brasil 2013. Secretaria Nacional de Juventude. Brasil, 2013.
 

55 Por convenção, identificamos todos os jovens que responderam ao questionário como: “P1”, “P2”, “P4”, “P5”, “P6”, “P7”, “P8”, “P9”, “P10”, “P11”, “P12”, “P13”, “P14”, “P15”. Observação: o participante “P3”, respondeu apenas o questionário socioeconômico-cultural.

56 Esse ponto de vista mostra um jovem que, antes de frequentar o ramo pioneiro, assumia, em seu ramo anterior, o posto de monitor, levando para o ramo dos pioneiros uma postura diferenciada por já ter ocupado uma posição de liderança.

57Escoteiras comemoram centenário de olho no futuro. Disponível em: . Acesso em 01 nov 2015. A tecnologia e o escotismo: Disponível em: . Acesso em 01 nov 2015.

58 Geração que corresponde à idealização e nascimento da World Wide Web, criada em 1990 por Tim Berners-Lee (nascidos a partir de 1991) e no "boom" da criação de aparelhos tecnológicos (nascidos entre o fim de 1992 a 2010). A grande nuance dessa geração é zapear, tendo várias opções, entre canais de televisão, internet, vídeo game, telefone e MP3 players. Geração Z. Disponível em: . Acesso em 01 out 2015.  


Publicado por: LUCIENE FRANCISCA ROCHA

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