Desafios e Possibilidades dos Processos Educativos Desenvolvidos No Programa de medidas Sócio -Educativas Liberdade Assistida de Governador Valadares
índice
- 1. RESUMO
- 2. INTRODUÇÃO
- 3. ADOLESCÊNCIAS E AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
- 4. A EDUCAÇÃO SOCIAL COMO PERSPECTIVA DO TRABALHO DO ORIENTADOR NO ACOMPANHAMENTO DA MEDIDA DE LIBERDADE ASSISTIDA
- 5. A LIBERDADE ASSISTIDA NO CREAS GV: COMPREENDENDO E ANALISANDO ASPECTOS EDUCATIVOS DO PROGRAMA
- 6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
- 7. REFERÊNCIAS
- 8. ANEXOS
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1. RESUMO
O presente trabalho tem como objetivo analisar os processos educativos desenvolvidos junto a adolescentes autores de ato infracional que cumprem Liberdade Assistida, no Programa Medidas Sócio-educativas do CREAS-GV, buscando evidenciar os desafios e as possibilidades destes processos. Para tal, realizamos entrevistas com profissionais e adolescentes, bem como, fizemos uma leitura de aspectos da proposta do Programa, a fim de coletar informações a respeito do mesmo, referenciando nossa análise em questões relativas à adolescência e a uma perspectiva sócio-educativa emancipadora, retomando o sentido educacional da medida de liberdade assistida. Compreendemos o quão importante se faz a produção de estudos acadêmicos que afirmem a natureza sócio-educativa do trabalho com adolescentes infratores em ações efetivas que (re) afirmem sua cidadania.
Palavras chave: Adolescente; Educação Social; Liberdade Assistida.
2. INTRODUÇÃO
Este trabalho é fruto das vivências de ambas as pesquisadoras. Vivemos, no período da infância, em um contexto de alta vulnerabilidade pessoal e social. A partir de situações que observamos, como o abandono e a violência de crianças e adolescentes moradores de nossas comunidades, pôde-se perceber que esses são fatores que não contribuem para a construção de um projeto de vida digno para si.
Outro ponto que serviu para fortalecer nosso empenho em desenvolver estudos nesta área, parte também de nossas experiências em estágios, por intenção de atuar em projetos sócioeducativos e de nossos estudos no âmbito da sala de aula. Mas, sobretudo do desejo de atuar nesta área, o campo da pedagogia social, especificamente com adolescentes infratores.
Sabemos que tais adolescentes são objetos de discriminação da sociedade e, portanto, das escolas. Contudo, pouco se explana nos meios acadêmicos sobre o atendimento prestado a esses adolescentes no âmbito do cumprimento das medidas sócio-educativas. Segundo Souza (2006, p. 55), “a questão não é defender ou atacar [este adolescente]. A questão real é que pouco se sabe sobre o infrator e o que se deve fazer com ele”. O adolescente é um indivíduo que ainda está em processo de construção de sua personalidade, comete ato infracional por algum ensejo, porém, há imensa probabilidade de reinseri-lo dignamente na sociedade.
Há 22 anos o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) está em vigência, com o propósito de garantir os direitos e deveres dos adolescentes. Porém, percebemos em nossas experiências, especialmente o Estágio Curricular em Espaços não Escolares, que muitos educadores que trabalham com esses adolescentes o desconhecem. Esses educadores provem de diversas áreas como: psicologia, educação física, pedagogia e assistência social. Há até educadores sem formação no Ensino Superior, pois esta não é uma exigência para a atuação profissional no Brasil (Correa, 2008). Ou seja, educadores sociais que se relacionam diariamente com crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade, muitas vezes não tem um conhecimento desta fase de vida – adolescência - e do próprio ECA, para desenvolver atividades sócio-educativas junto aos adolescentes em questão.
Para compor a questão central desta pesquisa nos perguntamos quais dificuldades e as possibilidades que os processos socioeducativos trazem para estes adolescentes e quais as possibilidades que tais processos trazem para os adolescentes infratores que participam deste programa.
Tendo em vista auxiliar no enfrentamento destas dificuldades já percebidas, realizamos o presente estudo, buscando conhecer o trabalho desenvolvido pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social - CREAS - GV no programa Medidas Sócio-educativas, mais especificamente, na Liberdade Assistida, visando analisar as possibilidades e os desafios dos processos educativos desenvolvidos junto a adolescentes autores de ato infracional que cumprem medida de liberdade assistida no CREAS - GV.
Assim, nos propusemos a conhecer como se estrutura e se estabelece a Liberdade Assistida no Programa; identificar as propostas sócio-educativas dos educadores; perceber como os adolescentes participam e qual o sentido do Programa para eles.
São oito adolescentes que participam dessa pesquisa do programa Medidas Sócio-educativas do Centro de Referência Especializado de Assistência Social de Governador Valadares - CREAS/ GV e seus educadores. Desenvolvemos, em abordagem qualitativa, pesquisa de campo com realização de entrevistas e análise da proposta do CREAS.
Segundo o Plano Nacional de Assistência Social (2004, p.32), o Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS integra o Sistema Único de Assistência Social – SUAS. O CREAS constitui-se numa unidade pública estatal, coordenadora e articuladora da proteção social especial, ou seja, responsável pela oferta de orientação e apoio especializados e continuados a indivíduos e famílias com direitos violados, na perspectiva de potencializar e fortalecer sua função protetiva. Tem como objetivo ofertar ações de orientação, proteção e acompanhamento psicossocial individualizado e sistemático a crianças, adolescentes e suas famílias em situação de risco ou violação de direitos e a adolescentes autores de ato infracional.
Portanto, deverá organizar atividades e desenvolver procedimentos e metodologias que contribuam para a efetividade da ação protetiva da família, inclusive no que tange a orientação jurídico-social nos casos de ameaça e violação de direitos individuais e coletivos. Ou seja, trabalhar no sentido educacional ou socioeducacional com crianças, adolescentes e famílias.
Observamos que a este sentido dado ao trabalho do CREAS alia-se a visão de Freire (1982), de que a educação qualifique para a tomada de decisões, para a responsabilidade social e política.
Partindo de nossas vivências, observamos a importância da Pedagogia a serviço do desenvolvimento pessoal e social do ser humano. Tendo em vista, que o pedagogo é um profissional capacitado para desenvolver atividades condizentes a cada faixa etária.
Tendo em vista, a escassez de trabalhos de conclusão de curso no campo da Educação Social, especificamente com adolescentes infratores, dentro do espaço acadêmico há somente dois trabalhos, sendo que tais trabalhos são da área de Serviço Social. Portanto, percebemos a necessidade e a importância de tal pesquisa para maiores conhecimentos dos processos educativos desenvolvidos pelo programa.
Essa pesquisa é composta por três capítulos. No primeiro capítulo intitulado Adolescências e as Medidas Sócio-educativas, aborda a questão do ser adolescente e suas especificidades, relatando também quais medidas sócio-educativas podem ser aplicadas para cada situação. No segundo capítulo, A educação social como perspectiva do trabalho do orientador no acompanhamento da medida de liberdade assistida, define o que é educação social sob o olhar de diversos autores, e qual o papel do educador social dentro de tais medidas. No capítulo três, A liberdade assistida no CREAS-GV: compreendendo e analisando aspectos educativos do programa, abordamos a nossa compreensão dentro da nossa pesquisa de campo dos processos educativos desenvolvidos pelo programa.
O presente trabalho é uma forma de mostrar para a sociedade que não existe um adolescente padrão, e sim, que alguns não tiveram a mesma oportunidade que outras. Mas que isto não os torna nem melhores e nem piores, são adolescentes que necessitam de apoio para se integrar, dignamente, nesta sociedade em que vivemos.
3. ADOLESCÊNCIAS E AS MEDIDAS SÓCIO-EDUCATIVAS
3.1. Adolescências
Neste trabalho, o referencial para a idade do adolescente será o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, 1990), que define a faixa etária dos doze aos dezoito anos de idade.
Contudo, apesar do ECA considerar que a adolescência inicia aos 12 e termina aos 18 anos, é preciso lembrar que em nossa sociedade é cada vez mais comum que crianças e jovens apresentem características próprias da adolescência.
O senso comum compreende a adolescência como uma fase do desenvolvimento humano que faz uma ponte entre a infância e a idade adulta. Nessa perspectiva de ligação, a adolescência é compreendida como um período atravessado por crises, que encaminham o jovem na construção de sua subjetividade.
Segundo o Sinase (2006), atualmente o entendimento sobre a adolescência é, sem dúvida, determinante na construção do ser humano, conforme aprendizado decorrente das experiências vividas nessa fase da vida. Portanto, deve ser pensada para além da idade cronológica, da puberdade e transformações físicas que ela acarreta, dos ritos de passagem, ou de elementos determinados aprioristicamente ou de modo natural. A adolescência deve ser pensada como uma categoria que se constrói, se exercita e se reconstrói dentro de uma história e tempo específicos.
Para Dayrell (2003), a adolescência se define por uma fase especial de intensas transformações e de afirmação da autonomia. Fase em que a pessoa se apropria do reconhecimento de si como sujeitos de direitos, de capacidades e potencialidades. É neste período que a maturidade biológica e sexual é atingida, definindo a identidade sexual e, potencialmente, é onde se define o espaço social de homem ou mulher. Portanto, é um período que a busca pela liberdade se mostra mais acentuada, contribuindo na construção de sua identidade.
Refletindo sobre a concepção de Dayrell (2003), entendemos que não existe o adolescente padrão, mas seres humanos concretos, que buscam caminhos de crescimento e equilíbrio.
Portanto, este autor indica existirem “adolescências”, ou seja, não apenas um modo de ser adolescente. É necessário buscar uma interlocução autêntica com esses jovens, compreender sua “cultura” e ter empatia por sua forma específica de lidar com a realidade, devendo ser valorizada com suas características específicas importantes para o desenvolvimento humano.
Portanto, percebemos que é na construção/reconstrução, apropriação de valores culturais e na interação dos processos cotidianos que se definem os diversos modos de vida e de ser adolescentes.
Para Dayrell, apud Charlot (2000, p.33 e 55), “o adolescente é um sujeito, é um ser humano aberto a um mundo que possui uma historicidade, é portador de desejos e é movido por eles.
Ao mesmo tempo, é um ser social, com uma determinada origem familiar, que ocupa um determinado lugar social e se encontra inserido em relações sociais. É também um ser singular, que tem uma história, que interpreta o mundo e dá sentido à posição que ocupa nele, às suas relações com os outros, à sua própria história e à sua singularidade”. Para o autor, o sujeito é ativo, age no e sobre o mundo, e nessa ação se produz e, ao mesmo tempo, é produzido no conjunto das relações sociais no qual se insere.
Charlot (2000) afirma que todo ser humano é sujeito. Mas temos de levar em consideração que existem várias maneiras de se construir como sujeito, e uma delas se refere aos contextos de desumanização, nos quais o ser humano é “proibido de ser”, privado de desenvolver as suas potencialidades, de viver plenamente a sua condição humana.
Percebemos nos últimos anos, de acordo com os noticiários, que a adolescência tem sido objeto de preocupação de organizações nacionais e internacionais. A adolescência vem ocupando, nas últimas duas décadas, um lugar de significativa relevância no contexto das grandes inquietações que assolam a comunidade mundial, tanto no campo da educação quanto no da saúde e questões relacionadas aos jovens de todo o planeta.
Nesse sentido, o Estado compromete-se com o desenvolvimento de ações que permitam os adolescentes constituir seus projetos de vida e desenvolver as condições para o exercício da autonomia. A tarefa é oferecer os direitos necessários à afirmação de sujeitos capazes de construir a cidadania e consolidar a democracia em bases mais justas e participativas em nosso País.
A inclusão de adolescentes nas políticas públicas requer novas perguntas sobre a realidade destes sujeitos. Requer, ainda, que tais perguntas sejam feitas a estes sujeitos, respeitando e considerando seus olhares, opiniões e propostas. A capacidade criativa e o potencial de participação social devem ser resguardados e promovidos nas políticas sociais.
A participação dos adolescentes nas decisões relativas aos seus deveres e direitos, com a efetiva participação, envolvendo-os com as questões da própria adolescência, assim como as questões sociais da comunidade em que estão inseridos, assegurando seus direitos e contribuindo na resolução dos problemas da sua comunidade.
Quando se fala em protagonismo juvenil, faz-se menção a uma “proposta na qual o adolescente assume um papel central na comunidade e/ou em um determinado projeto e em um desejado processo de mudança social” (Dayrell, 2007, p.12). Ainda segundo Costa (1999), na ação protagônica no momento de sua execução, o educando é o ator principal no processo de seu desenvolvimento.
Partindo dos pressupostos contidos no ECA (1990), crianças e adolescentes são entendidos como "sujeitos de direitos", ou seja, devem estar no centro das políticas, com participação ativa, auxiliando na construção do exercício da cidadania contribuindo assim, para uma sociedade mais justa (Carrano, 2006). Pensando sobre protagonismo juvenil, nos remetemos ao termo resiliência como significação da capacidade dos adolescentes resistirem as diversidades que se encontram, construindo novas habilidades e comportamentos, sobrepondo-se às condições adversas e alcançando uma melhor qualidade de vida.
3.2. As medidas sócio-educativas
Segundo Passettti (2002), a Justiça de Menores teve sua origem nas críticas humanitárias quanto à aplicação da justiça criminal as crianças e aos adolescentes autores de ato infracional, a partir de meados dos anos 70. No final dos anos 80, com a promulgação da Constituição Federal, os adolescentes passam ser inimputáveis penalmente, ou seja, irresponsáveis penalmente.
O Estatuto da Criança e do Adolescente - Lei Federal de 8069/90 – é resultante de um movimento social que veio contra o Código de Menores e reafirma a perspectiva dos direitos humanos no trato de crianças e adolescentes e a importância da educação na orientação aos atos infracionais. Dentre as diversas inovações trazidas pelo ECA, na concepção e reconhecimento da criança e do adolescente como sujeitos de direitos, destaca-se a construção de um sistema específico para o adolescente autor de ato infracional e, neste sistema, está previsto o cumprimento de medidas sócio-educativas aos adolescentes que cometeram atos infracionais.
Na perspectiva sócio-educativa, desenvolve-se a compreensão de que se deve atribuir aos infratores menores de 18 anos medidas diferenciadas da pena aplicada ao adulto. Segundo Neto (1998, p.33), “a necessidade de um atendimento especial - e educacional - para este público funda-se pela sua condição peculiar”, ou seja, de pessoas em desenvolvimento. Portanto, crianças e adolescentes autores de ato infracional não podem ser responsabilizados e respondem pelos atos infracionais praticados através de medidas protetivas (para atos infracionais cometidos por crianças) e sócio-educativas (para atos infracionais cometidos por adolescentes), respectivamente, dentro de um processo legal e de ampla defesa.
As medidas sócio-educativas estão previstas no artigo 112 do ECA. São elas: advertência; obrigação de reparar o dano; prestação de serviços à comunidade; liberdade assistida; inserção em regime de semiliberdade e internação em estabelecimento educacional.
Para que se faça jus às medidas sócio-educativas, é necessário que o adolescente compreenda a finalidade de tal medida, recebendo um esclarecimento como sendo parte de um processo de convivência e respeito, não perpetuando condutas infracionais semelhantes.
A Advertência - art. 115 do ECA - constitui uma medida mais amena, aplicada a ato infracional considerado leve. Consiste em admoestação verbal e somente a autoridade judiciária pode fazêla, sendo importante a realização de uma audiência para tal. A Obrigação de Reparar o Dano - art. 115 (ECA) - enfatiza que o adolescente infrator promova a compensação do dano causado ao patrimônio. A Prestação de Serviços à Comunidade - art. 116 (ECA) - possibilita ao adolescente sentimento de responsabilidade e valorização da vida social e comunitária. A Liberdade Assistida - art. 118 e 119 (ECA) - é considerada uma medida bastante eficaz quando o adolescente em conflito com a lei não é considerado perigoso. A Semiliberdade - art. 120 (ECA) - consiste na intervenção no direito de ir e vir do adolescente, podendo ser aplicada também como forma de transição para o meio aberto. A Internação - art. 121, 122, 123, 124 e 125 (ECA) - é uma medida de caráter excepcional, reservada aos atos graves, cometidos sob graves ameaça ou violência à pessoa. É aplicada também, no caso de reincidência de infrações graves e descumprimento de medida anteriormente imposta, de no máximo 3 meses.
Segundo o Sinase (2006), as medidas sócio-educativas são distinguidas em razão da especificidade de cada situação em que elas podem ser aplicadas. A aplicação dessas medidas representa a intervenção estatal, focada na problemática da conduta desviante e antissocial, sem deixar de observar os direitos que lhe são garantidos. E, de acordo com o art. 112 do ECA, "na medida aplicada ao adolescente deverá ser levada em conta a sua capacidade de cumpri-la, as circunstâncias e a gravidade da infração". Cabe dizer, ainda, que os procedimentos para apuração de ato infracional correm em segredo de justiça, visando assegurar a inviolabilidade física e moral do adolescente (art. 17 e 143 do ECA).
A medida de liberdade assistida que vamos focar neste estudo, está estabelecida nos artigos 118 e 119 do ECA, constitui-se numa medida coercitiva, que deve estar estruturada com ênfase na vida social do adolescente, possibilitando assim, o estabelecimento de relações positivas, sendo embasado no processo de inclusão social qual se objetiva. O adolescente é mantido em seu meio familiar e comunitário, acompanhado por orientadores. O orientador acompanha a vida social do adolescente (escola, trabalho e família), que faz com que ele tenha que prestar contas dos seus atos diante desses lugares por onde circula. A intervenção é educativa e se manifesta no acompanhamento individualizado, procurando garantir os aspectos de proteção, inserção comunitária, cotidiano, manutenção de vínculos familiares, frequência escolar e inserção no mercado de trabalho, além de cursos profissionalizantes e formativos. A liberdade assistida tem envolvimento com abordagens grupais e com suas respectivas famílias. O adolescente autor do ato infracional participa de oficinas ofertadas pelo município. Portanto, as instituições devem ofertar oficinas com caráter educativo e pedagógico, que tem como valia não retornar ao ato infracional.
Consideramos que o orientador da medida configura-se um educador social que, segundo Costa (1999, p. 53), “deve procurar se articular entre educador-educando, as dimensões de aprendizagem, propiciando, ao final, que cada participante incorpore novas maneiras de entender e agir”. Lembrando, ainda, que sobre o trabalho do educador recaem as falhas da família, da sociedade, do Estado e dele mesmo, cabe a ele orientar com consciência ética e política, auxiliando a desenvolver no educando a capacidade de aprender com os erros e contribuir no aperfeiçoamento de suas potencialidades.
Para compreendermos melhor a perspectiva da educação social na orientação da medida de liberdade assistida, no próximo capítulo apresentaremos esta perspectiva e caracterizaremos o profissional que a assume, o educador social.
4. A EDUCAÇÃO SOCIAL COMO PERSPECTIVA DO TRABALHO DO ORIENTADOR NO ACOMPANHAMENTO DA MEDIDA DE LIBERDADE ASSISTIDA
4.1. A perspectiva da educação social
Como relatado no capítulo 1, o Estatuto da Criança e do Adolescente prevê através da abordagem socioeducativa, a intervenção não punitiva do Sistema de Justiça, mas propõe um modelo de intervenção sistemática que preconiza apreciar a amplitude da problemática vivenciada pelo adolescente em conflito com a lei e possibilita a este refletir sobre seus atos e buscar novas formas de se relacionar no mundo. Portanto, o ECA vem com o objetivo de prevenção e de reinserção deste adolescente na sociedade, por meio de processos educativos.
Para entendermos onde se situam estes processos educativos, remetemos a Gohn (2004) que considera necessário distinguir a diferença entre os três conceitos de educação como a educação formal, educação informal e educação não formal.
A educação formal é aquela desenvolvida nas escolas, com conteúdos previamente demarcados; a informal como aquela que os indivíduos aprendem durante seu processo de socialização- na família, bairro, clube, amigos etc., carregada de valores e culturas próprias, de pertencimento e sentimentos herdados: e a educação não formal é aquela que se aprende “no mundo da vida”, via os processos de compartilhamento de experiências, principalmente em espaços e ações coletivos cotidianos (GOHN, 2004, p.39)
Segundo Carvalho e Carvalho (2006, p.2) “toda e qualquer forma de educação é, essencialmente social”.
Neves (2001) traz a concepção de:
Educação Social é a educação que tem por base a luta coletiva contra as injustiças sociais. Tem como compromisso a emancipação das camadas populares e forja suas práticas educativas em atos, atitudes e gestos que fazem uso da ética, da indignação, da esperança e do ideal de liberdade. É a busca pedagógica pelo direito à vida, à cidadania plena, à realização de cada um de nós como sujeitos históricos livres e solidários.
Para Neves, a Educação Social tem que, necessariamente, ser um processo coletivo. Seja nos partidos políticos, seja nas escolas, nos movimentos populares, nos centros de formação, nos movimentos sindicais e até em governos democráticos. O processo educativo deve sempre buscar a construção de identidades que trabalhem juntas, que se articulem enquanto sujeitos históricos, que criem parcerias e que fortaleçam as lutas em comum. (NEVES, 2001, p. 1 e 2)
Correa (2008) afirma que a educação social no Brasil surge pouco antes dos movimentos de crítica ao Código de Menores, no período ditatorial, entre as décadas de 60 e 70. Porém, segundo a autora, foi entre as décadas de 80 e 90, período de construção do ECA, que houve uma forte mobilização por parte da sociedade civil para a garantia dos direitos humanos das classes populares.
Em consonância com Graciani (2006), a educação social é capaz de amenizar as desigualdades sociais, ao oferecer oportunidade para o desenvolvimento das habilidades e competências necessárias para a vida em sociedade. Dessa forma, a respeito das contribuições da educação social a autora cita que:
As contribuições positivas da educação para a sociedade destacam-se duas: a reorganização da cidadania, pela criação de ordem mais justa, fraterna e o desenvolvimento das habilidades, competências para a vida, que permitam menos exclusão e desigualdades sociais e econômicas, levando-se em conta a diversidade e o multiculturalismo, com valorização de valores cívicos, culturais, sociais e morais, com ênfase no meio ambiente e na ética, além da pluralidade cultural balizadas pelo conhecimento científico, técnico e humanista na formação dos aprendizes. A educação é uma atividade para vida, que ocorre na família, na rua, na igreja, no trabalho, na escola e em todos os espaços sociais. (GRACIANI, 2006, p.3)
Carvalho e Carvalho (2006) também ressaltam em seus estudos o repensar em uma educação social libertadora, onde ocorra realmente uma transformação social do sujeito. Para isso, a participação da sociedade civil é essencial, uma vez que contribui para a abrangência da democracia e participação popular na política nacional.
Segundo Silva e Sales (2009), são inúmeros os motivos que levam o jovem ao abandono dos estudos e a cometer atos infracionais, a saber: dinheiro fácil, influência de amigos, conflitos familiares, uso de drogas, residir em locais onde o trafico é frequente entre outros. Quando se encontram em liberdade assistida a educação social se faz na forma de medida socioeducativa, sendo aplicada com o objetivo de “possibilitar a reinserção ou inclusão dessa parcela de indivíduos na sociedade, minimizando, dessa maneira, as tensões e a crescente desigualdade social” (RIBEIRO, 2004, apud CARVALHO, 2006, p.5).
Devemos lembrar, todavia, que tais medidas incidem dentro das escolas, sendo estas muitas vezes colaboradoras da discriminação sofrida pelos adolescentes assistidos, segundo relatos de Silva e Sales (2009). As próprias instituições educativas rejeitam este aluno e vetam sua participação ativa na comunidade escolar. Como exemplifica Charlot (1996), adolescentes internos reconhecem a importância dos estudos, mesmo em uma visão utilitarista, mas diante da exclusão escolhem a não permanência na escola.
Os desafios que levam a formação de um cidadão consciente, ético, ativo e responsável por seus direitos e deveres ganham força na ousadia da participação acoplada da sociedade civil e da escola. Para Gohn (2004) é dentro de uma gestão compartilhada escola/comunidade educativa, que ocorre a mutação das culturas políticas arraigadas para as políticas emancipatórias. A importância da educação não formal se dá assim, em um processo de construção de uma sociedade justa e democrática em um caráter sociopolítico de transformar as escolas em centros de referências civilizatórias.
Contudo, percebe-se que os autores estudados apresentam diferentes visões sobre a educação social, porém, nenhuma se encontra isolada, ao contrário, interagem para a construção de uma sociedade igualitária. Considera-se que a educação social faz parte de um conjunto de aprendizagens e atividades indispensáveis à formação integral de um cidadão, sendo que estas práticas sucedem também fora do sistema formal da educação tradicional.
As reflexões devem permear as relações do indivíduo com o mundo, numa perspectiva em que o mesmo é inconcluso, no entanto um ser consciente de si e de sua atividade no mundo. Por meio deste olhar ele se torna agente de práxis, um ser que cria e transforma a sociedade na qual está inserido, sendo esta experiência o atuante do diálogo, da problematização e da investigação dos interesses comuns, em busca da conscientização de todos na condição de grupo.
A educação social, portanto, parte do principio da igualdade, onde todos os sujeitos possuem direito, oportunidade, capacidade, o compromisso e responsabilidade no desenvolvimento da sua realização, valorização pessoal e social. A responsabilidade maior deste educador é fazer com que o sujeito recupere o seu vinculo com a sociedade.
4.2. O orientador da medida como educador social
Segundo FERMOSO (1998, p. 93),
O educador social é um profissional que pode agir e interagir na prevenção e resolução dos problemas relativos à violência social. Como "profissional híbrido", pode atuar de diferentes formas, designadamente com a família, com as crianças ou jovens, no meio onde se registrem focos de violência e mesmo na escola como elemento mediador.
A tarefa do educador social é, portanto, prevenir e intervir em situações de risco, de forma a criar mudanças qualitativas. Deverá exercer influências positivas nos indivíduos. A educação social atua com outros trabalhadores sociais de modo interdisciplinar na proteção e promoção social. A educação deve antes de mais nada ajudar a ser e a conviver com os outros, aprender ser com os outros e a viver juntos em comunidade.
Portanto, os objetivos da educação social poderiam se concretizar no contributo para que o indivíduo se integre no meio social que o envolve, mas com capacidade critica para melhorá-lo e transformá-lo.
Para Gohn, em cada campo de educação há um agente do processo de construção do saber. “Na educação formal sabemos que são os professores. Na não formal, o grande educador é o outro, aquele com quem interagimos ou nos integramos. Na educação informal, os agentes educadores são os pais, a família em geral, os amigos, os vizinhos, colegas de escola, a igreja paroquial, os meios de comunicação de massa, etc.” Gohn (2005, p. 29).
Margareth (apud Correia, s/d) pontua que o educador social é um sujeito capaz de ser povo, e este trabalho é político, é trabalho de mudança, de transformação social. O educador social deve agir diretamente no cerne da questão para intervir na realidade do sujeito.
Neves diz que “o educador social tem que ser um indivíduo autônomo, que sabe estar atento para aprender, sabe ouvir, extrair, compreender as verdades e os limites de cada um para ajudálo e ajudar-se a transcender”. Neves (2001, p. 2).
Compreendemos, então, que, para além da formação do educador social em uma graduação, faz-se fundamental ele “ser povo”, de proporcionar o movimento dialético de ação-reflexãoação para a reconstrução da realidade do povo.
Para Freire (1985), o papel do educador também se faz no apoio intencional as pessoas em seu desenvolvimento, potencializando as habilidades de cada um, com o intuito que as mesmas decidam por si, possuidoras da capacidade de solucionar os seus próprios problemas, sejam eles individuais ou grupais. Em outras palavras, diríamos que o importante é em ponderar a pessoa para que ela seja capaz de entender e atuar dentro de sua comunidade, através de suas próprias perspectivas, conhecimentos e habilidades.
Compreendemos que, os seres humanos com suas possibilidades e carências, seus desejos e sonhos, sujeitos produtores de cultura e capazes de intervenções individuais e coletivas, é que devem estar no centro das práticas escolares e, assim, do conjunto das práticas sociais (como na definição das políticas econômicas e socioculturais do país).
Na educação social, o ensino-aprendizagem ocorre, portanto, de maneira que o educador e o educando são responsáveis pela produção de conhecimento no ato educacional, porém não despreza as características e a importância das ações práticas, dos saberes e vivências cotidianos, ou seja, o conhecimento é construído a partir de traços vivenciados por cada sujeito.
Para Freire (1985) é notório que educação vai além de conteúdos sistematizados, o educador deve ser humano em sua plenitude, é impossível educar sem assimilar o contexto social do sujeito, ou seja, levar em conta a sua realidade, acreditando ser possível uma transformação de caráter pessoal e político. Compreendemos, assim, que a prática da pedagogia social está além da informação, pois, acredita no ser humano como ser incompleto, ser inacabado em constante desenvolvimento, por isso não se limita a educação social a determinada classe social ou à criança, nem aos chamados excluídos pela sociedade, mas esta é para todos de maneira presente durante toda a vida.
Para Costa (1999) os educadores que trabalham com adolescentes com sérios problemas de conduta têm três abordagens a escolher para realizar seu trabalho: amputação, reposição e submissão. Na abordagem de amputação, é onde se cria adolescentes rebeldes ou submissos.
Os rebeldes são aqueles que são agressivos consigo mesmo e com os outros criando uma dificuldade de se relacionar com o outro. Os submissos são frágeis e são manipulados a todo instante, não tem domínio próprio sobre si. Na abordagem de reposição, se identifica o que esses adolescentes não tiveram e não tem na sua vida, para então introduzir de forma mecânica, dentro dos programas existentes para esses adolescentes. Na de aquisição, se parte do conhecimento do adolescente, do que sabem e do que são capazes, para então buscar alternativas e maiores aprendizagem para que esse adolescente se reinsira na sociedade com o que ele tem de melhor em termos pessoais e sociais. Uma abordagem para trazer para esse adolescente tudo o que ele tem de melhor em si. Essa terceira abordagem seria a mais adequada segundo Costa, pois possibilita aos adolescentes, uma vida de respeito diante da sociedade.
Trazendo o que ele tem de melhor dentro de si próprio para uma vida. Vivemos hoje em uma sociedade capitalista, empregada pela cultura individual e determinada muitas vezes pela globalização, onde neste processo, modificam-se as relações culturais, conseguintemente posturas, valores, princípios, os quais têm refletido no âmbito familiar, escolar e social. Encontramos desafios para educar na atualidade.
Acreditamos que o educador social sendo o profissional que trabalha com sujeitos em situações de vulnerabilidade social, os quais são participantes de programas e projetos sociais, tem que ter domínio quanto ao saber teórico ou boa intenção. Suas ações não são unicamente pedagógicas, mas também politicas e ideológicas. Ele deve apoiar esses sujeitos para alcançarem e satisfazerem seus objetivos e ter competência para avaliar o seu desempenho e tal tarefa.
5. A LIBERDADE ASSISTIDA NO CREAS GV: COMPREENDENDO E ANALISANDO ASPECTOS EDUCATIVOS DO PROGRAMA
5.1. CAMINHOS METODOLÓGICOS
No período de 14/05/12 a 25/05/12, estivemos no CREAS de Governador Valadares, para darmos inicio à coleta de dados para a nossa pesquisa que teve como objeto o programa de medida socioeducativa de liberdade assistida. Entretanto, antes desse primeiro contato no dia 14/05, houve diversas outras tentativas, via telefone, para que pudéssemos conversar com as técnicas de referência do programa de L. A.. Entretanto, estas tentativas não tiveram sucesso, pois as mesmas alegavam que estavam envolvidas com o II Seminário Regional das Medidas Sócio-educativas em Meio Aberto, o que impossibilitava a nossa entrada na instituição, por todos estarem envolvidos e não haver nenhum técnico ou profissional responsável para que pudesse orientar nossa visita.
Este fato atrasou nosso cronograma, por este motivo, não conseguimos realizar a observação do atendimento, mas conseguimos ter acesso à proposta de trabalho do programa de liberdade assistida; realizar entrevista semiestruturada com uma das técnicas de referência da L.A. (apenas uma se disponibilizou a dar entrevista); uma entrevista estruturada em grupo com oito dos doze adolescentes que cumprem medida de liberdade assistida (com a presença de uma psicóloga que trabalha com atividades do grupo de reflexão) e entrevista individual, em uma sala reservada, com dois adolescentes que se prontificaram para tal. As questões relativas às entrevistas se encontram em Anexo.
Para compor a análise, articularemos informações presentes nos documentos da instituição aos autores por nós estudados, que relatam sobre o tema. Estabelecendo uma relação entre os documentos da instituição, a realidade do trabalho desenvolvido e as leituras.
5.2. UMA LEITURA SOBRE A LIBERDADE ASSISTIDA NO CREAS GV
Em Governador Valadares, o CREAS realiza o programa de medidas sócio-educativas, promovendo acompanhamento das medidas de liberdade assistida e prestação de serviços à comunidade.
No caso da L. A., a determinação para o cumprimento da medida é encaminhada pela Vara da Infância e da Juventude para o CREAS, que também faz o acompanhamento. De acordo com o documento analisado, a programa de L.A., o objetivo do programa é promover uma liberdade assistida de proteção integral, onde a ação propiciará ao adolescente, condição para que ele estabeleça um padrão de conduta e um projeto de vida de ruptura com práticas de delitos, salientando a importância de se considerar as diferenças e individualidade de cada um.
Para o programa de L. A., o CREAS, conta com uma equipe técnica composta por 01 assistente social e 01 psicóloga (técnicas de referência ou orientadoras da medida) e uma psicóloga que atua como educadora da oficina de “reflexão”. Também contam com apoio com outros profissionais do CREAS, como 02 secretárias, 01 motorista e 01 auxiliar de serviços gerais.
No documento ainda, encontramos como se estabelece a dinâmica de acompanhamento da medida. No primeiro momento, a assistente social faz a interpretação da sentença junto ao adolescente e seu responsável, no intuito de esclarecer as responsabilidades cabíveis aos mesmos. Inicia-se a partir desse momento a coleta de dados psicossociais sobre o adolescente e sua família, pela assistente social e psicóloga, que atuam em grupos de vivência (adolescente e família), visita domiciliar e no atendimento individual. O atendimento a família é realizado através de 08 encontros e é chamado de Família Ativa, com o objetivo de perceber como o adolescente se porta em casa, conhecer a realidade do sujeito, garantindo assim, o fortalecimento da relação familiar.
As visitas domiciliares têm caráter de aproximação e interação com a família, a fim de orientálas para a rede de serviços do município. Estas visitas, segundo o documento, possibilitam a compreensão da dinâmica familiar, visando contribuir para a realização do projeto e o melhor atendimento do adolescente, e também evitar a exclusão do adolescente em sua própria família, desenvolvendo laços de solidariedade e ajuda mutua.
A equipe realiza avaliação rotineira com o adolescente, família e responsável a fim de diagnosticar seus percursos no cumprimento da medida e, ainda, possíveis mudanças, expectativas e interesse pessoal do adolescente relativo às atividades desenvolvidas. O documento relata que é necessário o apoio da família, tanto para os técnicos como para os adolescentes, na execução desta medida, possibilitando uma não reincidência no ato infracional.
Semanalmente, ocorre uma reunião entre as orientadoras e a educadora com o objetivo de avaliar o programa, realizar capacitação para enfrentar as diversas situações e rever possibilidades de mudanças. Segundo a orientadora entrevistada, o seu trabalho “é desenvolvido de modo a propiciar aos adolescentes o seu acompanhamento, tendo em vista, promover o desenvolvimento integral, dando subsidio para exercer conscientemente sua cidadania”.
Segundo o documento, ainda, são realizadas parcerias para o encaminhamento de atividades que atendam o cumprimento da medida, tais como: escolarização, atividades esportivas e culturais oferecidas em parceria com a Praça de Esportes, cursos profissionalizantes, terapias em grupos de vivência e individual e orientação para o mercado de trabalho.
Segundo a orientadora, o programa desenvolve internamente duas atividades: grupo de reflexão e oficina de artesanato. No grupo de reflexão, a educadora conversa com eles sobre drogas, família, o ato infracional cometido e outros assuntos. A oficina de artesanato está temporariamente desativada, por falta de oficineiro.
O CREAS possui no momento deste trabalho 12 adolescentes em medida socioeducativa de liberdade assistida, sendo que no dia da pesquisa estavam presentes 08 adolescentes, entre 15 e 19 anos. Os adolescentes são encaminhados a 12 encontros do grupo de reflexão, com carga horária 1 hora para cada encontro, uma vez por semana. No que nos perguntamos: somente esses encontros de 1 hora são suficientes?
As atividades desenvolvidas pela educadora, neste grupo, “se caracterizam como processo pedagógico e de exercício da cidadania, tendo como objetivo acompanhar, auxiliar e orientar os adolescentes a fim de possibilitar um futuro mais promissor”, segundo a orientadora.
Costa (1999) identifica as medidas sócio-educativas como meio de propiciar possibilidades de socialização que concretizem um caminho mais digno e humano para a vida destes adolescentes, no modo como a relação educador-educando se estabelece no processo de cumprimento da medida. Traz a possibilidade de reinserir o jovem em dificuldade, a partir de uma postura que não o rotula, nem classifica em categorias baseadas apenas em suas vivências pessoais.
Percebemos que as atividades desenvolvidas não tem uma organização pedagógica, pois, as mesmas, por exemplo, não são direcionadas para cada adolescente compatíveis com a idade.
Para Dayrell (2003) não existe o adolescente padrão, mas seres humanos concretos, que buscam caminhos de crescimento e equilíbrio. Portanto, este autor indica existirem “adolescências”, ou seja, não apenas um modo de ser adolescente. É necessário buscar uma interlocução autêntica com esses jovens, compreender sua “cultura” e ter empatia por sua forma específica de lidar com a realidade, devendo ser valorizada com suas características específicas importantes para o desenvolvimento humano. Portanto, percebemos que na construção/ reconstrução, apropriação de valores culturais e na interação dos processos cotidianos, que se definem os diversos modos de vida e de ser adolescentes.
Um dos adolescentes entrevistados alegou: “Amanhã terá uma atividade na Praça dos Pioneiros com pula-pula, pipoca e algodão doce. O que isso é bom pra mim?” L., 19 anos. Talvez fosse necessária a presença de um pedagogo no programa, para auxiliar neste aspecto.
Entre os 08 adolescentes entrevistados, 01 não estuda, entretanto, o projeto do CREAS e no ECA Art. 119, inciso II indicam que é atribuição do orientador: “supervisionar a frequência e o aproveitamento escolar do adolescente, promovendo, inclusive, sua matrícula”.
Podemos perceber que 07 adolescentes veem a escola como um lugar de “ensinar educação”, “ensinar aprendizagem”, mas também 04 relatam que “não gostam de estudar”, alegando que são excluídos pelo grupo escolar. Segundo a técnica de referência os adolescentes tem dificuldade em permanecer na escola devido à impossibilidade de transitar em alguns espaços.
Entre os entrevistados, 07 moram com seus familiares, e 01 mora sozinho. Todos falam que a família “é algo importante”, “minha base, meu tudo”, “união”. Uma fala que chama atenção é do adolescente que mora sozinho: “família é a melhor coisa do mundo”. Tanto o documento, quanto a orientadora indicam a importância da família no cumprimento da medida e observamos a família é algo importante para esses adolescentes, porém podemos também perceber, que nem todos tem um amparo familiar, mas desejando que essa seja unida. Vemos que a busca/ aproximação dos familiares desse adolescente se dá apenas uma vez ao mês nos encontros com a orientadora. Pensamos que este trabalho com a família deveria ser mais sistemático e mais amplo.
Quando perguntados sobre seu cotidiano, observamos que os adolescentes as respostas muito parecidas umas com as outras. A maioria tem como atividade dormir, jogar bola, ficar na internet. Um dos adolescentes disse: “não vou mentir, não faço nada”. Percebe-se no dia-a-dia, uma ausência de atividades educacionais. O programa poderia disponibilizar diferentes atividades durante os dias que esses adolescentes não estão no grupo de reflexão, assim, possibilitando um tempo produtivo para com esses adolescentes. Mais uma vez, ressaltamos a falta de um pedagogo para organizar o trabalho pedagógico, pois apenas as orientadoras tem um excesso de atividades a cumprir.
Para Dayrell (2003) a adolescência se define por uma fase especial de intensas transformações e de afirmação da autonomia. Fase em que a pessoa se apropria do reconhecimento de si como sujeitos de direitos, de capacidades e potencialidades. É neste período que a maturidade biológica e sexual é atingida, definindo a identidade sexual e, potencialmente, é onde se define o espaço social de homem ou mulher. Portanto, é um período de busca pela liberdade, onde essa se mostra mais acentuada, contribuindo na descoberta de sua identidade.
Nas falas dos adolescentes percebemos que as atividades desenvolvidas auxiliam a, “não usar droga e cocaína”, “não fazer coisas erradas”, “refletir sobre a vida da gente”. Porém, na conversa individual com os dois adolescentes, sem a presença da orientadora, tiveram falas contrárias como “não ajuda, não ajuda em nada, perca [sic] de tempo. Se é para parar de fazer o que fazia antes, tinha de ser algo voltado para o trabalho (profissionalização)”; “o trabalho desenvolvido aqui não basta, tem que haver força de vontade e querer”. Em outras falas essa mesma ideia é repetida: “não considero que o trabalho desenvolvido vai mudar minha vida”.
O art. 119, inciso III do Eca afirma “diligenciar no sentido da profissionalização do adolescente e de sua inserção no mercado de trabalho”, isso também esta relatado no projeto de medidas sócio-educativas de L. A., porém não encontramos relatos de uma aposta em atividades de profissionalização para estes adolescentes, um direito a ser cumprido. Na entrevista com a orientadora uma das ações sócio-educativas previstas é encaminhar esses adolescentes para serviços da rede municipal.
Anteriormente, neste texto, perguntamos: “somente esses encontros [do grupo de reflexão] de 1 hora são suficientes?”. Um dos adolescentes nos relata que cometeu o primeiro ato infracional aos 17 anos, é a 6ª vez que cumpre medida socioeducativa e que está no programa há 03 meses.
Pensamos que esta é uma situação, por exemplo, que exige um investimento mais alto por parte do Estado não só no programa de medidas sócio-educativas, mas nas políticas básicas, especialmente, sendo um dos objetivos do atendimento o desenvolvimento integral deste adolescente.
O art. 118 do ECA afirma “a liberdade assistida será adotada sempre que se afigurar a medida mais adequada para o fim de acompanhar, auxiliar e orientar o adolescente” (grifo nosso).
Segundo Costa (1999, p.53) o trabalho socioeducativo com adolescentes em dificuldade procura articular as dimensões de aprendizagem, de modo a propiciar que, ao seu final, cada participante incorpore novas maneiras de entender e agir. É necessário um trabalho com esses adolescentes para que os mesmos vejam possibilidades para uma vida social melhor.
Durante toda entrevista os adolescente deixaram bem claro o desejo de ter uma vida melhor, produtiva, com qualidade e a grande vontade de constituir uma família como podemos observar nas falas de alguns adolescentes, “a vida para mim é tudo, desejo crescer e evoluir na vida”; “muito importante”; “quero terminar meus estudos e fazer outros cursos e arrumar um serviço fichado”.
Percebemos, assim como Freire (1982), que a grande preocupação da pedagogia atualmente é promover uma educação que qualifique para a tomada de decisão e para a responsabilidade social e política. Partindo de nossas vivências, observamos a grande importância da Pedagogia a serviço do desenvolvimento pessoal e social do ser humano. Com desejo de mudança e uma perspectiva de futuro melhor.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Este trabalho nos ofereceu informações valiosas na busca por respostas, diante de nossas inquietações sobre os processos educativos desenvolvidos no programa de medidas sócioeducativas liberdade assistida de Governador Valadares.
Através da aproximação com o trabalho desenvolvido pelo CREAS – GV nos deparamos com problemas e desafios presentes na medida sócio-educativa de liberdade assistida. Destarte, buscamos analisar tal problemática e pontuar as dificuldades e as possibilidades encontradas nesse processo, a partir das informações narradas pelos documentos e entrevistas, consideramos que o objetivo central deste foi alcançado como exposto a partir do referencial teórico constituído nos capítulos 1 e 2 deste trabalho.
Inicialmente observamos ao longo da entrevista que os adolescentes são matriculados no início do ano letivo na instituição de ensino, porém a dificuldade está em mantê-los assíduos a vida escolar. A evasão escolar pode estar vinculada a discriminação que estes adolescentes sofrem por parte de outros alunos, que os impedem de participar e transitar em alguns espaços da própria instituição. Pensamos que esta situação pode ser contornada, com ajuda de profissionais preparados que promovam atividades de entrosamento entre todos os alunos para que tenham oportunidades iguais.
Outro ponto relevante que se adéqua como dificuldade se refere ao espaço CREAS, a deficiência no aspecto estrutural, não sendo uma instituição munida de espaço físico adequado e de apoio educacional voltado ao adolescente que está inserido no processo de medida socioeducativa. Consideramos que para melhor atender a estes adolescentes, cabe ao programa criar espaços alternativos para o desenvolvimento de atividades destinadas à expressão de habilidades, exteriorização de sentimentos, criatividade e potencialidades desses. Destacamos também a falta de profissionais com formação adequada, em especial um pedagogo, para um acompanhamento que acolha os adolescentes e atenda as suas necessidades educacionais, bem como propor atividades que sejam condizentes com este grupo etário.
Outro problema que identificamos diz respeito à falta de apoio do Estado que deveria ter maior preocupação pensando no adolescente como cidadão, sujeito de direitos e deveres.
Podemos perceber através do ECA, que o resguardo pelos direitos e deveres do adolescente é responsabilidade não só do educador social, mas
“A política de atendimento dos direitos da criança e do adolescente far-se-á através de um conjunto articulado de ações governamentais e não governamentais, da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios". (Art. 86, ECA, 2006, p.22)
A política de Estado ainda é bastante perversa, pois não se julga como colaborador da produção de exclusão social. Segundo Rosa (2007, p.65), a constante ideologia que associa a pobreza à criminalidade sustenta uma prática que se realiza em condições diferentes dos padrões aceitáveis pela maioria; reforçando que adolescentes infratores se encontram em situação de exclusão social e com poucas oportunidades de inserção no mercado de trabalho, contexto esse que favorece a criminalidade. Tal situação conduz a afirmação de estereótipos a que estão condenados os adolescentes, a saber, bandidos, marginais, delinquentes e tantos outros, mas o Estado pouco se atenta que encontram como opção “produtiva”, o trabalho no comércio de drogas e em outras atividades ilícitas.
Retomando o capitulo 3 há relatos que confirme essa situação. Diante da situação que se encontra, o adolescente se sente frustrado, incapaz, sem autoestima. O trabalho de conscientização estes adolescentes é de extrema relevância, mas oferecer uma ação produtiva em que ele se sentisse útil e como parte da sociedade surtiria uma autovalorização. É necessário que esta motivação se dê com oportunidade para abertura de canais de profissionalização, que atendesse a realidade especifica daqueles que se encontra em situações de vulnerabilidade. Vale lembrar que os profissionais que lidam com os adolescentes, devem incentivá-los a esta atividade pó meio profissional sendo esta fonte de mudança de vida.
Ressaltamos papel do educador social mais do que ensinar é aprender, ou seja, conhecer primeiramente o adolescente, aprender com ele sobre suas experiências de vida ímpares para proporcionar condições, apontar caminhos na proximidade com o outro e a partir daí ensinar a partir da sua realidade. Assim é preciso que o educador social tenha sensibilidade para se colocar no lugar do outro e saber ouvir o que este tem a ensinar.
Tendo em vista o exposto, este estudo traz contribuições para a compreensão do panorama em que o adolescente está inserido, levando em conta sua complexidade, dimensão e implicações.
Almejamos que esta pesquisa sirva como instrumento de reflexão para que o Estado e sociedade elaborem políticas que compreendam o adolescente infrator como um ser complexo que pensa e reflete de forma peculiar sobre o que está ao seu redor.
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8. ANEXOS
8.1. ANEXO A - ROTEIRO DE ENTREVISTAS PARA EDUCADORES DO CENTRO DE REFERENCIA ESPECIALIZADO EM ASSISTÊNCIA SOCIAL - CREAS GV
Nome
Idade
Escolaridade
1 - Quais os objetivos do seu trabalho no CREAS?
2 – Que ações sócio-educativas você desenvolve no Programa? 3 - Você recebeu alguma capacitação para exercer este trabalho junto aos adolescenteso que cumprem medida socioeducativa de liberdade assistida?
4 - Quais as dificuldades encontradas no cotidiano de seu trabalho?
5 - O adolescente participa do programa? Se sim, como?
6 - Considera que a ação do Programa Medida Sócio-educativas vem colaborando para que os adolescentes possam (re) construir seu projeto de vida?
8.2. ANEXO B - ROTEIRO DE ENTREVISTA PARA OS ADOLESCENTES
Nome:
Idade
1 - Você estuda? Em que ano está? Gosta de estudar? Como você vê a escola?
2 - Mora com sua família? Quem mora na sua casa com você? O que é a família para você?
3 - O que você gosta de fazer no seu dia a dia?
4 - Que atividades você faz no CREAS? Estas atividades te auxiliam na sua vida? Como?
5 - Que atividades os educadores fazem com você?
6 - Você está aprendendo com os educadores aqui do CREAS? [SE SIM] O que você considera que está?
7 - O que é a vida para você? Quais os seus projetos?
Publicado por: Fabricia Alexsandra Abelha
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