AUTISMO E A EDUCAÇÃO FÍSICA INCLUSIVA: POSSIBILIDADES E DESAFIO

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1. INTRODUÇÃO

Ao longo das últimas décadas, a inclusão escolar é tema de grandes debates acerca da melhoria da educação para os que precisam ser incluídos. Entretanto, há também as correntes que consideram a inclusão de alunos deficientes em salas de aula regulares uma maneira errônea de incluir, pois dessa forma a mesma não irá se concretizar. Tratando especificamente da inclusão escolar do indivíduo autista, sabe-se que o principal objetivo de o incluir é o de colocá-lo em situações de interação social. Mas, considerando que, a prioridade de todas as crianças com necessidades educacionais especiais é seu desenvolvimento cognitivo, o desenvolvimento social virá mais tarde, quando possível. Acreditamos que a inclusão de crianças com necessidades educacionais especiais por apresentarem autismo deva ser realizada de modo criterioso e bem orientada, que vai variar de acordo com as possibilidades individuais de cada aluno (BRASIL, 2003).

Sabe-se que para viabilizar, de fato, a inclusão do autista na escola regular, é preciso contar com professores e recursos especializados para atender as especificidades do mesmo. Entretanto, encontrar estes profissionais e recursos na escola pública regular é tarefa difícil, pois a realidade é bem diferente. As escolas são obrigadas a matricular todos os indivíduos que querem fazer parte da mesma, nesse contexto o aluno deficiente entra neste “pacote” e é integrado ao sistema educacional, mas, inclusão e integração possuem significados distintos. Integrando o aluno, ele estará apenas fazendo parte daquele contexto, ao incluí-lo, ele estará interagindo, participando das ações, algo está sendo feito em busca de seu desenvolvimento.

2. OBJETIVOS

2.1. Objetivo Geral:

Refletir sobre as possibilidades e desafios do profissional em Educação Física no processo de inclusão de crianças autistas.

2.2. Objetivos Específicos:

Conhecer a história e contexto de trabalho das crianças com autismo;

Refletir sobre o amparo legal no processo de inclusão;

Discutir sobre os desafios da inclusão de autistas na educação física;

Identificar a potencialidade do lúdico no processo de inclusão.

3. O CONCEITO DE AUTISMO: UM BREVE RELATO HISTÓRICO

Em 1911, Paul Eugen Bleuler (psiquiatra) chamou a atenção para o autismo pela primeira vez, porém como uma forma de esquizofrenia. Em 1943, Leo Kanner (médico austríaco) foi o precursor sobre o estudo do autismo como um transtorno do desenvolvimento com a observação de onze crianças, desenvolvendo um artigo científico denominado “Os Transtornos Autistas do Contato Afetivo” no qual relatou que “[...] sua atenção foi atraída por certo número de crianças cujo estado difere tão marcada e distintamente de tudo o que foi descrito anteriormente, que cada caso merece uma consideração detalhada de suas fascinantes particularidades”. (KANNER, L. 1997, p.111 in CPPL).  

Embora não conhecesse o trabalho de Kanner, Hans Aspeger também descreveu diversos casos de crianças semelhantes às citadas por Kanner. Apesar de a palavra autismo ter sido usada primeiramente por Bleuler para descrever um sintoma da esquizofrenia que definiu como sendo uma “fuga da realidade”, Kanner e Asperger usaram-na para atribuir nome ao conjunto de sintomas observados em seus pacientes.

 A partir daí, muitos estudos foram desenvolvidos no intuito de desvendar este “universo particular” até então pouco conhecido. Entretanto, não se sabe a verdadeira causa do autismo. Não existe um dano físico no sistema nervoso central que desempenhe um papel no aparecimento do autismo, existem sim fatores ambientais e genéticos favoráveis para tal.

Inicialmente, foi valorizada a hipótese de que o autismo era causado por fatores psicogenéticos e de que, provavelmente, os pais eram responsáveis pelo surgimento do quadro clínico afetivo. A criança era “normal” no momento do nascimento, mas devido a fatores familiares seu desenvolvimento afetivo era afetado (para Kanner o autismo era uma perturbação emocional). Posteriormente, entende-se que o distúrbio emocional correspondia a uma resposta desadaptativa a um ambiente não-favorável. Por exemplo, crianças que eram vítimas de maus tratos, apresentavam distúrbios, mas não determinavam quadro clinico autístico.

Outra hipótese é de que nas perturbações do espectro autista existiria uma origem de base neurológica, com explicações biológicas, relacionado ao fato de crianças autistas possuírem grande probabilidade de vir a sofrer de epilepsia (VALENTE, apud PEREIRA, 1996; MARQUES, 1998), o autismo é quatro vezes mais comum em meninos do que em meninas, e esta relação eleva-se para 5/1 se considerar o espectro autista na sua totalidade, complementa Valente (2011).

Já na hipótese psicológica, os autistas armazenam informações verbais de forma neutra, sem avaliar ou reutilizar a informação.

A teoria afetiva, por sua vez, sugere que o autismo origina-se de uma inabilidade de interagir emocionalmente com os outros, levando a uma falha no reconhecimento de estados mentais e um prejuízo na habilidade para abstrair e simbolizar segundo Valente (2011).

A teoria cognitiva considera a síndrome autística como uma desordem do desenvolvimento causada por uma patologia do sistema nervoso central e salienta a importância dos déficits cognitivos do autismo.

O certo é que a descrição dos sintomas autísticos não sofreu alterações ao longo dos estudos, e o quadro de autismo passou de uma psicopatologia a uma síndrome clínica, suas possíveis causas são diversas e refletem a diversidade das pessoas com autismo, parece haver uma predisposição genética para isso, mas a etiologia do autismo ainda não foi definida, por isso é chamada de síndrome: conjunto de sintomas. Os mais comuns são: dificuldade em estabelecer contato com os olhos; pode começar a desenvolver a linguagem, mas repentinamente ela é interrompida; apresenta agressividade resistência em estabelecer diálogo; apresenta gestos repetitivos (balançar mãos, pernas, etc.); interesses restritos em coisas concretas (trens, carros, computadores); desejo pela conservação da semelhança; boa capacidade de memorização mecânica; expressão inteligente e ao mesmo tempo ausente; hipersensibilidade aos estímulos. Entretanto, nem todos os autistas apresentam as mesmas características e as que apresentam variam em grau de intensidade.

Com esse conjunto de sintomas vem as dificuldades que causam prejuízos qualitativos à interação social, dificuldade na comunicação verbal e repertório restrito de interesses e atividades. Através do tripé Interação Social-Comunicação-Comportamento, forma-se um modelo de diagnosticar o autismo, mas existem subitens para cada tópico do tripé que representa outros fatores que podem aparecer no diagnóstico. O autismo pode ser diagnosticado até os três anos de idade, os sintomas iniciais na maioria das vezes, e a preocupação inicial dos pais são com o fato de a criança estar demorando muito a falar, por isso procuram algum profissional para certificarem-se a respeito. Paralelamente aparecem as alterações na comunicação, a criança parece desligada do meio, parece viver “em seu próprio mundo”. A dificuldade para fazer amigos é grande, muitas vezes não evita o contato com os outros, mas também não procura. A criança apresenta interesses e manias pouco comuns e, frequentemente apresenta movimentos corporais repetitivos.

A principal área prejudicada, e a mais evidente, é a da habilidade social. A dificuldade de interpretar os sinais sociais e as intenções dos outros impede que as pessoas com autismo percebam corretamente algumas situações no ambiente em que vivem. A segunda área comprometida é a da comunicação verbal e a não-verbal. A terceira é a das inadequações comportamentais. Crianças com autismo apresentam repertório de interesses e atividades restritos e repetitivos [...], têm dificuldade de lidar com o inesperado e demonstram pouca flexibilidade para mudar as rotinas. (SILVA, 2012, p.20).

É possível observar nas palavras de Silva (2012) as dificuldades na socialização: “a dificuldade de socialização é a base da tríade de sintomas do funcionamento autístico” (SILVA, 2012, p.21) há isolamento, não participam de brincadeiras interativas, pouco contato físico. Para o autista, o relacionamento com outras pessoas não costuma despertar interesse, não é que eles não simpatizem com o outro, é o simples fato de não saberem lidar com o “mundo aberto”, não perceber sentido, significado para tantas “caras e bocas”, o mundo para eles parece ameaçador.

A segunda área desse tripé, a disfunção da linguagem: “a ausência da fala, na maioria dos casos, é o fator que mais preocupa os pais e o que os motiva a procurar ajuda” (SILVA, 2012, p.33), alguns autistas desenvolvem a fala, entretanto nem todos a utilizam para a comunicação necessariamente, apenas repetem falas dos pais ou de cenas de filmes, sons do dia a dia. “algumas frases podem ser constantemente repetidas e a comunicação acaba se dando, principalmente, por gestos” (como a indicação do objeto desejado apontando para o mesmo ou o local no qual se encontra) é o que enfatiza a fonoaudióloga Alyne Vasconcelos em uma matéria no jornal Mais Saúde. Também Ros Blackburn (palestrante autista), ressalta em uma de suas falas que:

O autismo é uma doença social grave, não temos desejos ou instintos sociais. O que as pessoas sabem por instinto, nós não sabemos. Temos a tendência a pensar sempre nas mesmas coisas e não temos vontade de compartilhar isso com ninguém. Sendo isto uma influência negativa e pode afetar de forma significativa a aprendizagem, também explica o porquê, muitas vezes, a linguagem não ocorre. A linguagem também não é instinto, deve ser ensinado. (CENTRO CONVIVER, 2013)

A terceira área da tríade é o pensamento e/ou comportamento: percebe detalhes nas coisas, porém tem fraca imaginação social, há ausência da noção de perigo, eventualmente insensibilidade a dor, autoagressão, risos e choros inapropriados, estabelecimento de rotina, hiperatividade ao barulho, movimentos estereotipados em momentos de estresse, facilidade e atração por assuntos mais concretos, dificuldade no pensamento simbólico (ausência do jogo imaginativo: morreu de rir; de amor, etc.),segundo Silva (2012, p.37), “tem uma forma concreta de ver o mundo”, melhor interação com animais, pensamento visual, atenção a fragmentos de informações ou de cenas, dificuldade para processar simultaneamente estímulos sensoriais, realizam tarefas ao seu modo, comportamentos que “parecem ser uma tentativa de paralisar o mundo para torná-lo mais coerente” é o que diz Silva (2012, p.46).

Os sintomas autísticos permanecem com a pessoa a vida toda pois autismo não tem cura, entretanto quando trabalhados esses sintomas, a pessoa com autismo aprende a lidar com eles e com as situações e leva uma vida aparentemente normal. Também não existem tratamentos específicos, cada caso é um caso. Geralmente, os casos com sintomas mais graves são tratados com medicação para controlar as autoagressões e a impulsividade. Entre outros tratamentos existem as terapias não só para os autistas como também para a família (pais, irmãos) e os acompanhamentos psicológicos, fonoaudiológos, psicopedagógicos, etc. com programas de linguagem, socialização, estimulação sensorial e recreativa, entre outros.

A intervenção precoce pode fazer uma grande diferença no desenvolvimento de crianças com autismo. O tratamento normalmente é intenso e abrangente, envolvendo profissionais e familiares.

3.1. Inclusão e o Amparo Legal

Inclusão é o ato de incluir, fazer parte, integrar e “inclusão tem sido a palavra de ordem nas escolas” (ALVES apud STOKLER & FELICE, 2012, p.49). Inclusão escolar é acolher todas as pessoas, sem exceção, no sistema de ensino, independentemente de cor, classe social e condições físicas e psicológicas. Mas esse termo é comumente usado à inclusão educacional de pessoas com deficiência física e mental e com distúrbios de comportamento. 

O termo inclusão não deve ser confundido com educação especial, pois a mesma só atende os portadores de deficiência em uma sala de aula ou escola separada, nem tão pouco com a simples inserção de alunos em escolas que não têm a mínima estrutura para recebê-los, ou ainda com integração. Aliás, integração e inclusão não são sinônimas no âmbito escolar. Serra (2008, p.32) assegura que,

a integração insere o sujeito na escola esperando uma adaptação deste ao ambiente escolar já estruturado, enquanto a inclusão escolar implica redimensionamento de estruturas físicas da escola, de atitudes e percepções dos educadores, adaptações curriculares, entre outros.

Mas de onde veio a ideia de incluir alunos especiais em salas de aulas regulares? A história da Educação Especial está ligada diretamente com a história da humanidade, mais necessariamente com os cuidados que as pessoas tinham para com os portadores de deficiência.

Historicamente podem ser reconhecidos quatro estádios de desenvolvimento das atitudes em relação às crianças excepcionais. Primeiramente, na era pré-cristã, tendia-se a negligenciar e maltratar os deficientes. Num segundo estádio, com a difusão do cristianismo, passou-se a protegê-los e compadecer-se deles. Num terceiro período, nos séculos XVIII e XIX, foram fundadas instituições para oferecer-lhes uma educação a parte. Finalmente, na última parte do século XX, observou-se um movimento que tende a aceitar as pessoas deficientes e integrá-las, tanto quanto possível, na sociedade. (KIRK & GALLAGHER, 1996).

A fundação dessas instituições, nos séculos XVIII e XIX, próprias para crianças com necessidades especiais, e as salas de Educação Especial, mesmo dentro de escolas regulares não fez dos educandos crianças incluídas, mas sim excluídas. Eles eram tidos como incapazes de progredir física, cognitiva e socialmente.

(...) historicamente, (pessoas com deficiência)* têm sido escolarizadas em ambientes restritos, segregados, percebidas com conotação negativa como sujeitos incapazes de aprender e cujas dificuldades são, ainda, consideradas como resultantes do que lhes ‘falta’, do que tem ‘a menos’ em ralação a outros, ditos normais (CARVALHO, 2004, p.110).

Uma das formas mais convencionais de integrá-los na sociedade é, sem dúvida, começar pela inclusão em escolas regulares. A partir de 1988, com a Constituição Federal os visionários tentaram fazer valer os direitos dos cidadãos com necessidades especiais, com a filosofia de que a escola é de todos e para todos. A Constituição Federal em seu título I dos Princípios Fundamentais, art. 1º, respalda e propõe avanços significativos para a educação escolar, elegendo a cidadania e a dignidade da pessoa humana como um dos seus objetivos fundamentais a promoção do bem de todos, sem preconceito de origem, sexo, raça, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação, garantia de direito a igualdade e direito de todos à educação.

Mais tarde, em 1994, com a chamada Declaração de Salamanca, ficou mais visível à sociedade, ao mundo, a questão do direito à educação escolar.

Em 1996, a Lei nº 9394 de Diretrizes e Bases da Educação em seu capitulo III, art.4º, inciso III garante atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente na rede regular de ensino (CARNEIRO, 2008, p.43)

Sabemos que o processo de aceitação (inclusão) não se dá exclusivamente por leis e decretos, embora estes instrumentos sejam de extrema relevância para garantia de entrada e permanência de uma criança com qualquer que seja a necessidade, em escolas regulares, em classes inclusivas correspondentes com sua idade cronológica, pois está comprovado que elas rendem mais quando convivem com crianças normais a mesma idade.

Matricular os alunos portadores de deficiência nas classes correspondentes à sua idade cronológica, para que construam, ainda que em defasagem mental, uma idade social. [...] Essa talvez seja uma das questões mais complexas no processo de inclusão, tendo em vista que muitas escolas ainda adotam o critério intelectual para a classificação do aluno com deficiência. O que se precisa saber é que, estando em classes inferiores a sua idade, o aluno adquire (por imitação) comportamentos defasados. Quanto ao conteúdo escolar – a maior preocupação da escola -, não se tem a garantia de que um aluno com deficiência mental convivendo com um grupo em idade inferior vá apresentar progressos na área cognitiva. (RAMOS, 2010, p.20-21)

Para a recepção os educandos com necessidades especiais, as escolas precisam de estrutura física adequada, adequações no currículo. Os conteúdos devem ser direcionados às necessidades de todos os educandos valorizando suas diferenças. Diferenças essas que muitas vezes tornam-se invisíveis aos olhos do sistema educacional, pois a avaliação é sempre feita em cima de um aluno-padrão, o que não deveria ocorrer nem em classes não-inclusivas, pois independente de ser portador de deficiência ou não, cada educando tem suas necessidades e desenvolve as competências exigidas pelo currículo, cada uma ao seu tempo e ao seu modo.

3.2. A Inclusão de Crianças Autistas nas atividades de Educação Física

A intervenção feita com uma criança com autismo depende do diagnóstico cedido pelo profissional, e o acompanhamento segue de acordo com as necessidades do autista e da família. Em muitos casos a escola auxilia o autista no seu desenvolvimento, o contato com os demais pode ajudá-lo a desenvolver habilidades sociais, a fala, o desenvolvimento físico-motor. Nesse contexto, entra em cena a questão de um atendimento especializado, bem como com programas educacionais específicos que incluem a formação e a inserção de atividades específicas para os autistas, a começar por uma educação física sensível as especificidades e inclusiva.

pode e deve ser usada como técnica para o alcance dos objetivos educacionais dessas crianças. Esses objetivos, normalmente, giram em torno de adquirir as habilidades básicas, desenvolvimento, especialmente das habilidades de comunicação e a autonomia. A educação é, portanto, indispensável no atendimento à criança autista e cabe-nos discutir modelos, programas e as melhores formas de educá-los (SERRA, 2008, p. 41-42).

Incluir ou não o autista na escola regular e consequentemente nas atividades de educação física é uma questão que merece muita reflexão, é necessário rever os conceitos impregnados no currículo, e ter sempre o aluno em questão como principal objetivo, para garantir-lhe a aprendizagem, oferecendo um espaço significativo, assim poderemos afirmar que desenvolvemos práticas inclusivas. Para que de fato ocorra inclusão nas escolas é necessário que haja aprendizagem e para que a aprendizagem seja significativa em uma criança autista é preciso que os profissionais que lidem com eles estejam realmente capacitados, tendo nesse cenário um forte destaque a educação física que proporcionará momentos de interação, ludicidades, descobertas, e múltiplas linguagens em uso durante o momento de aprendizagem.

A Lei de Diretrizes e Bases de 1996 em seu capitulo V da Educação Especial, art.59, inciso III,

assegura aos educandos com necessidades especiais professores com especialização adequada em nível médio ou superior, para atendimento especializado, bem como professores de ensino regular capacitados para a integração desses educandos nas classes comuns. (CARNEIRO, 2008, p.162)

O sistema de certa forma é cumprido quando a escola recebe um aluno especial, mas não há preocupação alguma na preparação do profissional que receberá e lidará com o educando especial. Carneiro (2008, p.161) afirma que,

Não conta o país com docentes bem preparados. Pode-se falar mesmo em descaso neste setor. A formação do professor que atua na Educação Especial é precária porque os cursos universitários são, normalmente, de baixa qualidade. Quase sempre noturnos, oferecem uma formação prática reduzidíssima e, tanto pior, as disciplinas especificas são poucas e a carga horária insatisfatória.

Com relação ao mesmo tema, Serra (2008, p.34) ressalta que infelizmente, a demanda da inclusão chega às escolas antes da preparação do professor, e a solução tem sido a capacitação do profissional em serviço, através dos programas e formação continuada. É necessário abandonar o comodismo de pensar que só os profissionais formados em Educação Especial podem trabalhar com crianças deficientes, é obvio que a formação inicial é primordial para que ele obtenha subsídios teórico-metodológicos, entretanto, o educador comprometido com seu trabalho nunca deve ficar a procura de culpados por seu despreparo, pois o que não falta são meios de busca de materiais e métodos que lhes deem capacidade de desenvolver trabalhos com crianças deficientes, enquanto seus superiores não lhes oferecem a formação apropriada. Isso mostra que eles sabem que podem ser o fator determinante para a inclusão ou não destas crianças.  A necessidade de recursos humanos devidamente capacitados para atuar em classes inclusivas implica não só no conhecimento sobre as especificidades da deficiência com a qual se vai trabalhar, mas também uma reflexão crítica a cerca do sentido da educação e de suas finalidades (SERRA, 2008).

Portanto, a inclusão não é um favor prestado a alguém incapacitado, mas sim um exercício de cidadania que felizmente, parece estar evoluindo, ainda que aos poucos. Todos os profissionais que estão compromissados com a melhoria da educação deveriam refletir um pouco, em especial, aos indivíduos com autismo que só precisam de um pouco mais de amor, compreensão, de alguém que entenda que ele “não está preso em seu próprio mundo”, ele está no mundo em que todos vivemos, influenciando e recebendo influências do meio social, a diferença é que não sabem como fazer para demonstrar sentimentos e interagir com os demais. Assim como todos possuem suas peculiaridades, os autistas são diferentes e precisam ter suas especificidades respeitadas.

3.3. O Lúdico no Processo de Inclusão de Crianças Autistas

A arte de ensinar não é e nunca foi uma tarefa tão simples como muitos pensam. Ao contrário, tal processo exige uma série de habilidades e competências para que o educador consiga diferenciar e articular fatores sociais, individuais, internos e externos, que influenciam o tempo todo no ensino. Mas se ensinar crianças [...] que estão inclusas dentro dos ‘padrões’ já é tão complexo, o que dizer de ensinar crianças especiais com autismo? (SANTOS, BISPO, PINHEIRO & SANTANA)

Dentre tantos fatores que influenciam nesse processo complexo de ensino-aprendizagem, há a falta de estrutura das escolas, de comunicação com a comunidade, com os pais dos educandos especiais e, especialmente, com os educandos já que têm essa área (comunicação) afetada, e falta de profissionais capacitados.

E quando falamos em profissionais não estamos nos referindo apenas aos professores e profissionais de educação física, mas também a todos os profissionais que, mesmo tendo funções distintas, compõem a escola e convivem direta e indiretamente com todos os alunos. Com relação ao termo capacitados, não nos referimos a um profissional que tenha porte de certificado ou diploma constando que ele está apto a lidar com turmas inclusivas, mas de alguém que busca dar o melhor de si por cada aluno, seja ele especial ou não. Anette M. Iverson (1999, p.335) apud Rogers (1993), afirma que

(...) a inclusão, caracteristicamente, insere uma criança que tem mais necessidades que a maioria das outras crianças da turma,, mas essas necessidades nem sempre são diferentes daquelas de outras crianças da classe. Por isso, o professor e os mediadores eficientes de classes não-inclusivas podem também esperar ser professores mediadores eficientes em classes inclusivas. (itálico do autor, grifo meu).

Cada indivíduo é um ser único, tem características próprias, tem habilidades, mas também dificuldades e o professor precisa conhecer cada um para poder intervir de maneira significativa no seu aprendizado. Portanto, como Santos & Paulino (2008, p.8) afirmam, nós concordamos que “não temos a pretensão de ensinar ninguém como fazer a inclusão, inclusão é processo, e processo não se ensina, vive-se”. Não existe uma fórmula pronta de como educar crianças autistas, tudo depende da singularidade da criança. Wajskop (1995, p.69) alerta que,

(...) um profissional atento poderá interferir na ampliação de possibilidades de usos dos materiais e dos espaços pelas crianças, assim como tornar fácil o acesso aos diferentes conhecimentos, mediante a utilização de livros, filmes, televisão, passeios e tudo aquilo que ela for capaz de criar.

Algumas dicas de melhorar o espaço para a recepção de alunos autistas é a redução de alunos na turma para que o professor possa dar-lhe mais atenção; criar uma rotina (arrumação da sala, a escrita utilizada no quadro, a sequência das atividades a serem realizadas sempre no mesmo horário, etc.) quando houver necessidade de mudança, explicá-la ao aluno para evitar crises de aborrecimento, pois autistas são detalhistas e irritam-se facilmente com mudanças que para eles são bruscas; utilizar mais métodos visuais que verbais, pela dificuldade que crianças autistas apresentam em sequências verbais; trabalhar com coisas do seu interesse sem esquecer de estimular coisas novas; aproveitar a sensibilidade sonora para trabalhar com músicas, lembrando sempre de evitar barulhos altos e bagunça, mantendo a disciplina pois os ruídos em excesso e a desordem causam irritação devido a sensibilidade sonora.

São metodologias simples que surtem efeito, no entanto ainda é pouco comparado ao que se pode fazer. Outra metodologia riquíssima é o uso do lúdico. Segundo Sahda Marta Ide in Kishimoto (2000, p.95) “o jogo não pode ser visto apenas como divertimento ou brincadeira para desgastar a energia, pois ele favorece o desenvolvimento físico, cognitivo, afetivo, social e moral”.

As atividades propostas envolvendo a ludicidade devem ter caráter de independência e aprendizado ao mesmo tempo. O professor deve ter em mente que crianças autistas têm que “ver para aprender”. Dráuzio Varella em seu blog relata um caso de um adolescente autista universitário que tinha a seguinte rotina: todas as manhãs ele tinha na sua refeição um ovo cozido e descascado pela mãe. Após a refeição ia para a faculdade. Um dia, porém, ao chegar em casa a mãe percebeu a presença do filho na cozinha, sentado à mesa num movimento de balançar as pernas impacientemente. Ela indagou-lhe se havia perdido o horário de ir para a aula ao que ele respondeu que por algum motivo ela não teria descascado o ovo de sua refeição matinal e como ele não sabia descascar, não sabia o que fazer e qual a rotina a ser seguida naquela situação. Refletindo sobre este episódio verídico, percebemos que situações tão simples para nós, apresentam um nível muito crítico de dificuldade para indivíduos autistas e que propondo situações similares para realização dessas atividades deixa a criança autista com mais autonomia. Leny Magalhães Mrech in Kishimoto (2000, p.111-112) relata que,

O fundamental é perceber o aluno em toda a sua especificidade, em um programa direcionado a atender as suas necessidades especiais. É a percepção desta singularidade que vai comandar o processo e não um modelo universal de desenvolvimento.

O brinquedo e a brincadeira proporcionam a criança vivenciar situações e até mesmo testar problemas ou hipóteses para estes, é possível analisar a ‘fala’ dessas crianças porque é através do brincar que elas demonstram o que sentem, vêem ou desejam. Segundo (CARVALHO, 2013, p.50) “conceber este (o lúdico), em uma escola, onde, grande maioria das crianças se encontram, [...]faz com que o lúdico tenha em sua essência mobilidade”, o que contribui e enriquece não só o desenvolvimento social, como também o intelectual. Ana Carla Batista Esquival (2014, p.20) apud Piaget (1976, p.160) afirma que,

O jogo e o brincar, portanto sob as suas formas essenciais de exercício sensório-motor e de simbolismo, proporciona uma assimilação da real a atividade própria fornecendo a esta seu alimento necessário e transformando o real em função das necessidades múltiplas do eu. Por isso os métodos ativos de educação das crianças exigem todos que se forneça as crianças um material conveniente, a fim de que, jogando e brincando, elas cheguem a assimilar as realidades intelectuais que sem isso, permanecem exteriores a inteligência infantil.

Enriquecendo esta fala ainda, Sahda Marta Ide (2000, p.96) in Kishimoto diz que,

as crianças ficam mais motivadas a usar a inteligência, pois querem jogar bem; sendo assim, esforçam-se para superar obstáculos, tanto cognitivos quanto emocionais. Estando mais motivados durante o jogo, ficam também mais ativas mentalmente.

Porém o jogo ou brincadeira não pode chegar ao extremo do cansaço para não deixar a criança desinteressada, “é fundamental estar atento aos indicadores sutis de cansaço do aluno (LENY MAGALHÃES MRECH in KISHIMOTO, 2000, p.125).”

Mas, em que momento e quais situações propor como forma de brincadeira para um contexto de aprendizagem?

É um grande desafio promover atividades lúdicas para crianças autistas, pois o professor tem que conhecê-lo e saber qual tarefa cabe propor em cada momento e para tal o professor só precisa de criatividade e paciência. A respeito disso diz Silva (2008, p.48) apud Ostrower (2002:10), “o homem cria não apenas porque quer, ou porque gosta e sim porque precisa [...] eis aqui uma primeira relação entre a criatividade e a inclusão: ambas são resultantes de uma necessidade humana que não é só individual, mas também cultural.”

Além das metodologias mencionadas, há também os métodos convencionais utilizados como intervenções terapêuticas em centros especializados, tais como as APAE’s (Associação dos Pais e Amigos dos Excepcionais), o grupo Lions, a ABRA (Associação Brasileira de Autismo), a AMA (Associação de Pais e Amigos do Autista), ASTECA (Associação Terapêutica Educacional para Crianças Autistas), que ‘temperados’ com um pouco de criatividade podem ser utilizados em sala de aula.

Entre os métodos mais usados estão o ABA (Análise do Comportamento Aplicada) que visa o ensino intensivo de habilidades necessárias para que o indivíduo autista se torne o mais independente possível. É considerado, hoje, como o mais eficaz. O método consiste na premiação da criança autista a cada comportamento socialmente correto. Santos (2001, p.46) diz que “a toda resposta correta dada pela criança, é-lhe oferecido algo agradável, que funciona como reforçador positivo”, podendo ser um doce, um brinquedo, uma coisa de sua preferência. Porém, Cunha (2011), como defensor do método, afirma ser de grande valia retirar o objeto de apoio, tão logo seja possível, para possibilitar a autonomia do indivíduo.

Outro método é o TEACCH (Tratamento e Educação para Crianças com Autismo e com Distúrbios Correlatos da Comunicação), com a meta de promover o desenvolvimento da comunicação e da independência. “Isto inclui ajudá-lo a compreender o mundo que o cerca através da aquisição de habilidades de comunicação que lhe permita relacionar-se com outras pessoas, oferecendo-lhe, até onde é possível, condições de escolher de acordo com suas próprias necessidades” (SANTOS, 2011, p.43-44).

O desenvolvimento da comunicação de crianças autistas não se dá somente pela fala, pode ser por gestos, por escrita, por imagens que levam sempre consigo em uma espécie de caderninho/agenda num sistema de comunicação através de troca de figuras, esse é o método PECS (Picture Exchange Comunicacion System).

Esses também são apenas os métodos mais usados, dentre tantos outros existentes. Desta forma entende-se que há uma gama de meios que possibilitam desenvolver o processo de ensino-aprendizagem com crianças autistas ao mesmo tempo em que ela desenvolve também a socialização e a comunicação. Silva in Santos & Paulino (2008, p.56) conclui que,

(...) assim como não se pode dizer a um artista qual a melhor tinta, qual a tela mais adequada, que tipo de combinação ele deverá utilizar para produzir a sua obra, talvez seja impossível dizer a um professor que ele deve ser criativo e promover a inclusão em sua sala de aula. Ostrover (2002) diz que cada artista parece carregar dentro de si uma BÚSSOLA que o orienta em seu percurso criador. A BÚSSOLA que o professor carrega- ou não- é a sua autonomia, que lhe dá a coragem, a responsabilidade e a liberdade necessária para criar e incluir a si mesmo e ao outro em sua prática pedagógica.

4. METODOLOGIA

Trata-se de um estudo descritivo com abordagem Qualitativa, sob o processo de inclusão de crianças autistas nas atividades de Educação Física identificando suas possibilidades e desafios frente a prática profissional.

A coleta de dados foi realizada por meio de dados secundários através de artigos científicos que abordem o tema. O estudo foi baseado na revisão da literatura sobre as potencialidades e desafios da prática profissional em educação física, fazendo-se uma análise das publicações científicas nacionais e internacionais.

A busca dos textos para esse estudo foi realizada em bibliotecas virtuais, utilizando como descritores as palavras-chave: Educação Física, Autismo e Inclusão.

O critério de inclusão dos textos foi através dos títulos e resumos que indicassem a proximidade com a temática. Neste contexto será analisada como ocorre à inclusão do aluno autista, bem como a visão dos pais perante o desenvolvimento e aprendizagem de seus filhos. 

5. ANÁLISES E RESULTADOS

Ao se estudar outros trabalhos e pesquisas que abordam a inclusão é possível levantar alguns pontos favoráveis para que o aluno com necessidades especiais seja incluído em uma classe comum do ensino regular, e são estes pontos que serão descritos a seguir.

O primeiro ponto favorável para se fazer a inclusão é que através dela é possível proporcionar ao aluno com necessidades especiais a inclusão social, permitindo, assim, a troca entre estes e os demais alunos.

De acordo com Sassaki (1999 apud FRÓES, 2007) conceitua-se inclusão social, como:

O processo pelo qual a sociedade se adapta para poder incluir, em seus sistemas sociais gerais, pessoas com necessidades especiais e, simultaneamente, estas se preparem para assumir seus papéis na sociedade. A inclusão social constitui, então, um processo bilateral no qual as pessoas, ainda excluídas e a sociedade buscam, em parceria, equacionar problemas, decidir sobre soluções e efetivar a equiparação de oportunidades para todos (SASSAKI, 1999 apud FRÓES, 2007. p. 71).

O ambiente escolar, como uma instituição da sociedade deve, então, se adaptar e proporcionar aos alunos com necessidades especiais a oportunidade de conviver socialmente com os demais alunos, preparando-os para a vida futura em uma sociedade na qual ainda precisa eliminar o preconceito existente com as pessoas com alguma necessidade especial.

Lago (2007) analisando os trabalhos de Jerusalinsky (1997) descreve que o autor aponta a escola como um espaço da sociedade na qual está presente, em certa proporção, a normalidade social. Por isso Jerusalinsky (1997) defende que “alguém que frequenta a escola sente-se mais reconhecido socialmente do que quem não a frequenta. As crianças passam a ter um lugar social como aluno de uma escola” (JERUSALINSKY, 1997 apud LAGO, 2007, p.40), ou seja, essas crianças passam a fazer parte da escola.

Na pesquisa de Kariya (2005 apud SOUSA, 2008) foi observado que os sujeitos de sua pesquisa que foram entrevistados argumentaram que só inserir crianças com necessidades especiais no mesmo espaço físico de outras crianças não é suficiente para garantir a ocorrência da inclusão, mas que a socialização é benéfica.

A inclusão vivenciada pela pesquisadora também mostra o convívio social com os demais colegas e profissionais da escola como um aspecto benéfico da inclusão, uma vez que o aluno com necessidades especiais terá oportunidade de interagir com pessoas ‘normais’.

Assim, essa convivência pode colaborar “com a promoção de aprendizagens diversas, sejam elas de cunho cognitivo, afetivo ou social, bem como para a aquisição de comportamentos normalizantes e socialmente aceitáveis” (SERRA, 2004, p.82).

Através da inclusão de alunos com necessidades especiais nas escolas é possível desenvolver na cultura escolar o respeito às diferenças e consequentemente contribuir para diminuir ou eliminar o preconceito, que é uma das razões para se praticar a exclusão tanto na escola quanto na sociedade.

Tendo a oportunidade de conviverem socialmente com outras pessoas no interior da escola, os alunos com necessidades especiais também têm a oportunidade de se desenvolverem com os colegas ‘normais’ da mesma faixa etária, ou seja, outro aspecto positivo da inclusão é permitir que tanto os alunos ‘normais’ quanto os alunos especiais aprendam com a diversidade.

Assim, segundo Camargo (2007), a inclusão não favorece apenas o desenvolvimento dos alunos especiais, mas o de outros alunos, na medida em que estes outros alunos, ditos ‘normais’, aprendam e convivam com as diferenças. De fato, há benefícios na convivência entre alunos especiais e alunos ‘normais’. E por parte dos alunos especiais um dos benefícios proporcionados por esta convivência é que ela “[...] possibilita o estímulo às suas capacidades interativas, impedindo o isolamento contínuo. Além disso, (...) as habilidades sociais são passíveis de serem adquiridas pelas trocas que acontecem no processo de aprendizagem social” (CAMARGO, 2007, p. 20).

Outro benefício é que inseridos numa escola regular os alunos com necessidades especiais têm “mais oportunidade de interagir e de aprender com a diversidade” (SOUSA, 2008, p. 112), ao contrário do que ocorre nas escolas especiais nas quais, segundo Sousa (2008), as crianças com necessidades especiais interagem apenas com seus “iguais”.

De modo geral, esta convivência com a diversidade no ambiente escolar propicia ganhos não só para os alunos como também aos professores e demais funcionários da escola, uma vez que estas pessoas têm a oportunidade de conviverem com as diferenças.

Segundo Karagiannis, Stainback; Stainback (1999) citados por Serra (2004) a convivência com a diversidade pode proporcionar uma melhoria na paz social:

Educando todos os alunos juntos, as pessoas com deficiências têm oportunidade de preparar-se para a vida na comunidade, os professores melhoram suas habilidades profissionais e a sociedade toma a decisão consciente de funcionar de acordo com o valor social de igualdade para todas as pessoas, com os consequentes resultados de melhoria da paz social (KARAGIANNIS, STAINBACK; STAINBACK, 1999 apud SERRA, 2004, p. 33).

Desta forma, a convivência com a diversidade no ambiente escolar tem seus reflexos dentro da própria sociedade, pois auxilia na constituição da vida das pessoas. Outro ponto benéfico relativo à inclusão é o fato de que os alunos com necessidades especiais obtêm melhoras significativas no comportamento, no relacionamento e nas habilidades.

Outro fato benéfico da inclusão é, segundo Lago (2007), o valor terapêutico da escola:

Mais do que um exercício de cidadania, ir à escola, para a criança psicótica, tem valor terapêutico, porque a escola pode contribuir para a retomada da estruturação perdida para o sujeito, na medida em que oferece oportunidade de criar laços sociais (LAGO, 2007, p. 38).

Revière (1995) citado por Giardinetto (2009) defende a educação oferecida pelas escolas como o tratamento mais efetivo para as crianças autistas da mesma forma que Jerusalinsky (2004 apud MARTINS, 2007) defende o fato de que só de crianças autistas estarem na escola já é terapêutico.

Diante deste cenário, tem-se também alguns aspectos desfavoráveis. Capellini (2001) em sua pesquisa estudou 89 alunos com diversas deficiências, inseridos em classes comuns do ensino regular público de uma cidade do estado de São Paulo e verificou que a maioria dos alunos especiais (cerca de 86%) possui um rendimento acadêmico menor se comparado com os demais alunos, ou seja, o processo de ensino e aprendizagem não está sendo tão eficaz quanto deveria, para promover futuramente a inserção destes alunos no meio social ou no mercado de trabalho, por exemplo.

Silva (2007) que restringiu seu estudo à inclusão de alunos com deficiência mental afirma que a inclusão escolar ocorre de modo mais efetivo na educação infantil, pois no ensino fundamental exige-se destes alunos uso do potencial cognitivo e de certas habilidades, que quando estas não são aquelas esperadas pelo professor acaba instaurando a exclusão dentro da própria inclusão ou acarretando o baixo rendimento acadêmico conforme corroborado por Capellini (2001), porque segundo Silva (2007):

A partir do momento que são exigidas do aluno as habilidades para ler, escrever e as habilidades matemáticas, instala-se os primeiros sinais da dificuldade e muitas vezes, acaba-se vivenciando a exclusão, com a saída do aluno da escola, ou a exclusão que se instala na suposta inclusão (SILVA, 2007, p. 158).

Além desta exigência maior dada no ensino fundamental à leitura, à escrita e às habilidades matemáticas, outro fator que coloca em xeque a inclusão neste nível de ensino é a seriação, como apontado por Sousa (2008)

É inconcebível que o aluno com deficiência mental aprenda ou se desenvolva numa escola em que o tempo de ensino e aprendizagem seja o mesmo para todos, e certamente uma escola seriada não contempla a inclusão como uma política educacional (SOUSA, 2008, p.123).

Portanto de forma até contraditória nota-se, muitas vezes, a exclusão presente em algumas escolas que supostamente se dizem inclusivas, pois o aluno especial que não consegue se ‘enquadrar’ no que é esperado pela escola acaba sendo deixado à distância e à margem do processo educacional, pois um tipo de ‘comparação’ com o aluno comum passa a ser estabelecido, ainda que de forma não declarada.

Silva (2007) neste aspecto intensifica sua contribuição ao pontuar o seguinte:

As escolas acolhem esses alunos, acreditando incluí-los, mas, muitas vezes, acabam por excluí- lós, pois se deparam com extremas dificuldades para interagir no processo ensino e aprendizagem frente às diferenciadas características do aluno com deficiência mental. Fica demonstrado, então, que sob o manto da tão discutida e debatida falta de formação anunciada por todos os professores, o que se percebe ainda, é a evidência de rótulos e estigmas fortemente arraigados no imaginário social de cada profissional, ou seja, o preconceito como construção social (SILVA, 2007, p. 159).

Desta forma torna-se necessário o preconceito ser revisto para chegar a ser eliminado, para que a inclusão possa ocorrer de maneira mais eficaz, sem que não recaia sobre os alunos especiais o rótulo de que são incapazes de aprender algo, sem que sejam discriminados por causa de sua deficiência.

A igualdade, entre os alunos ‘normais’ e alunos especiais, tão defendida pela Convenção de Guatemala (1999), promulgada no Brasil pelo Decreto n° 3.956, em 2001, ao declarar que “as pessoas portadoras de deficiência têm os mesmos direitos humanos e liberdades fundamentais que outras pessoas e que estes direitos, (...) emanam da dignidade e da igualdade que são inerentes a todo ser humano” (BRASIL, 2001, p.2), não tem sido praticada em algumas escolas inclusivas.

Pensa-se então, nos obstáculos para uma real prática promotora da inclusão, onde Lago (2007) corrobora com estas ideias ao afirmar, quanto à educação de alunos, com necessidades especiais, que;

Os professores costumam referir que a formação universitária e as práticas tradicionais de ensino não dão conta do aluno que se encontra em sua sala de aula. Isto faz com que se sintam, muitas vezes, sobrecarregados e impotentes mediante as problemáticas que se colocam no cotidiano (LAGO, 2007, p.54).

E quanto a isso, uma dessas problemáticas é a inclusão e diante desta proposta, de acordo com Lira (2004), deve-se priorizar “a formação do professor, pois sem ela nenhum projeto, nenhum currículo, nenhuma estratégia tem sentido.” (LIRA, 2004, p. 4). Sendo assim, nenhuma inclusão terá grandes êxitos sem uma formação adequada dos professores, portanto deve priorizar a formação dos mesmos.

Suplino (2007) em sua pesquisa cita vários autores cujos estudos destacam a inexperiência e o despreparo dos docentes que lecionam tanto no ensino regular quanto no ensino especial e menciona ainda que o conhecimento, a capacitação e a formação de professores que trabalham com a inclusão não são, por si só, elementos suficientes para se obter êxito na inclusão, porém são considerados necessários para se ter uma inclusão bem sucedida.

O que Serra (2004) afirma em seu trabalho é que a proposta inclusiva tem chegado às escolas antes da preparação dos docentes para trabalhar com os alunos com necessidades especiais e a solução encontrada tem sido capacitar esses profissionais, mesmo em serviço, através de programas de formação continuada.

Mas vale ressaltar que, segundo Martins (2007), nenhum curso oferece uma receita pronta de como trabalhar com os alunos especiais, com destaque para os autistas. Mas é possível estender esta afirmação de Martins (2007) a todos os alunos especiais seja qual for a deficiência. É no cotidiano escolar, nas lutas e conquistas diárias que o professor vai desvendando os melhores caminhos a serem percorridos para desenvolver o seu trabalho com os alunos com necessidades especiais, proporcionando a estes o desenvolvimento de suas habilidades.

Perrenoud (2002 apud SUPLINO, 2007, p.146) afirma que “a formação, inicial e continuada, embora não seja o único vetor de uma profissionalização progressiva do ofício de professor, continua sendo um dos propulsores que permitem elevar o nível de competência dos profissionais”, o que contribui direta ou indiretamente para o desenvolvimento da proposta de inclusão nas escolas.

Vale ressaltar que vários professores, frente à dificuldade em lecionar para alunos com necessidades especiais, se acomodam justificando que não foram formados nem preparados para trabalhar com tais alunos, ao invés de procurarem formação e informação a respeito da deficiência do aluno especial para realizar um trabalho de qualidade que promova o desenvolvimento do mesmo.

No caso deste trabalho, a pesquisadora por ter um aluno autista dedicou-se ao estudo desta deficiência para entender melhor seu aluno e transformou seu interesse em objeto desta pesquisa abordando a inclusão de alunos autistas em sala regular, ou seja, as dificuldades, a inexperiência em trabalhar com os alunos com necessidades especiais foram fatores determinantes para a elaboração desta pesquisa.

Desta forma, diante do despreparo para realizar a inclusão, há professores que buscam se aprimorar, estudando ou fazendo cursos para aprender a trabalhar com os alunos especiais e adentrando a reflexão sobre o tema, enquanto há outros que não se consideram aptos para trabalhar com tais alunos e que, de certa forma, não procuram se aprimorar seja pela falta de tempo ou de interesse mesmo.

Outro fator, conforme estudos de Lago (2007), Serra (2004), Balduino (2006) e Silva (2007), que dificulta o exercício da inclusão nas escolas regulares são as mudanças que se fazem necessárias no ambiente escolar, mudanças não só arquitetônicas, mas também atitudinais, pois

Uma escola regular, tal como se encontra estruturada hoje, não se torna automaticamente uma escola inclusiva somente por admitir alguns alunos com deficiência em suas turmas. Uma escola só se torna inclusiva depois que se reestrutura para atender à diversidade dos alunos em suas necessidades especiais, em suas habilidades e estilos de aprendizagem. (SILVA, 2007, p. 55).

Silva (2007) e Balduino (2006) fazem menção serem necessárias às adaptações curriculares para atender as necessidades e as especificidades de cada aluno com necessidades especiais nas salas de aula.

E segundo Carvalho (2003 apud SILVA, 2007, p. 138), estas adaptações curriculares podem ser entendidas como “[...] estratégias didáticas que viabilizam a aprendizagem dos alunos respeitando, principalmente, o ritmo de cada um”.

Mas só as mudanças no currículo não são suficientes para garantir a inclusão. É preciso mudanças físicas no espaço escolar como rampas de acesso e banheiros adaptados para deficientes físicos, a indicação de certos lugares em Braile e Libras para os deficientes visuais e auditivos, respectivamente, entre outras modificações.

Além disso, é necessária uma preparação dos profissionais da escola, principalmente dos professores, dos alunos e dos pais dos alunos que conviverão com estes alunos com necessidades especiais.

E para se trabalhar com a inclusão, segundo Beyer (2005) e Baptista (2002) citados por Silva (2007), é de fundamental importância que se tenha um número reduzido de alunos. Estes autores sugerem turmas com, no máximo, 20 ou 25 alunos já contando com os 2 alunos especiais incluídos nesta turma.

Suplino (2007) em sua pesquisa cita que concepções errôneas a respeito da inclusão também dificultam a viabilização de tal proposta, pois muitos professores entendem inclusão como apenas a introdução física do aluno especial e como consequência desta postura poucas iniciativas são realizadas a fim de promover trocas positivas entre os alunos especiais e os demais alunos.

6. CONSIDERAÇÕES

Tendo em vista que a inclusão escolar é necessária para o desenvolvimento da criança com autismo, pois além de estar diante das interações sociais, ela poderá superá outras dificuldades como o desenvolvimento da linguagem oral, torna-se relevante incluí-lo no sistema educacional. Tal princípio é fundamental para as práticas escolares inclusivas, principalmente nas atividades relacionadas a Educação Física, pois as mesmas se tornam mais reais e significativas quando a criança consegue obter resultados perante as dificuldades apresentadas pela criança. Entretanto, é necessária uma abordagem inclusiva para efetivar o trabalho com as aprendizagens com crianças autistas.

A inclusão da criança autista na escolarização regular provoca opiniões distintas, conforme o sistema educacional enxerga este aluno, e deseja atendê-lo de acordo com suas especificidades. Os professores, em geral, reconhecem a relevância da inclusão escolar, porém, infelizmente a preocupação em cumprir outras obrigações são mais privilegiadas. O despreparo profissional prevalece em algumas situações, e acabam prejudicando quem mais precisa de ajuda. Em Educação Física, estes aspectos são ainda mais delicados,uma vez que pouco sabem sobre os impactos das atividades corretamente direcionadas as crinças autistas. Enquanto isso, os que já estão prejudicados pela ausência de inclusão e pelo preconceito se prejudicam ainda mais.

É preciso resgatar e assegurar que mesmo em classes de ensino regular, as crianças usufruam de práticas escolares inclusivas, para que seu direito de aprender não fique distorcido, pois é preciso extinguir essa concepção de que o autista é incapacitado de aprender, assim como, é preciso desmistificar a concepção de que os autistas são verdadeiros gênios, o professor não deve esperar nenhum tipo de atividade excepcional deste alunos, reconhecendo também a importância da educação física e as potencialidades para o desenvolvimento do sujeito.

Trabalhar na perspectiva da educação física inclusiva deve permitir aos alunos que anseiam pelo mesmo poder desfrutar de um ambiente agradável, onde ele possa se sentir à vontade para ser ele mesmo. Diante disso, percebe-se a importância do contexto escolar das classes que possuem alunos autistas a fim de incluí-lo numa perspectiva de aprendizagem.

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Por

CLÁUDIO INÁCIO DOS SANTOS- UP19120229

DOUGLAS ALVES DA SILVA- UP19129242

MARIA LILIANE ALVES MARTINIANO- UP19129238

VITÓRIA GAMA DA SILVA- UP 19111402


Publicado por: Caio Luiz Medeiros Brito

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