Violência de gênero e aplicabilidade da lei Maria da Penha

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1. RESUMO

Trata-se de uma análise a Lei 11.340/2006, intitulada pelo Presidente da República como Lei Maria da Penha, em razão de uma farmacêutica chamada Maria da Penha Maia Fernandes ter, em uma das agressões sofridas por ela, perdido os movimentos em seus membros inferiores, por meio de um tiro desferido por seu ex-marido enquanto dormia. O tema da pesquisa está relacionado com as medidas previstas na referida Lei, que são aplicadas aos casos de “violência doméstica e familiar”, ou seja, quando há violência no âmbito familiar. É feita uma breve explicação sobre a violência por gênero e a banalização do assunto na sociedade atual. O trabalho aprofunda-se no que tange ao verdadeiro significado desta violência em questão e sua eficácia. Conclui-se que alguns fatores externos ao meio jurídico contribuem para a prática desta violência, resultando em um clamor social maior e a diferença entre gêneros.

Palavras-chave: Violência Doméstica. Eficácia. Gênero. Aplicabilidade.

ABSTRACT

The purpose of this paper is an analysis regarding law 11.340/2006 addressed by the president as Maria da Penha law, when a pharmaceutical named maria da penha maia fernandes after suffering many physical abuses in which one of them left her to lose physical moviments of her legs after having been shot by her ex-husband while she was sleeping. The motive of the research is related to the penalties that are referred to this law. Therefore are applied to cases that envolves domestic abuse and harrasment within the family. In this paper contains a brief explanation on every different type of abuses which society does not give proper attention to the matter. The target of this project is finding the real meaning of abuses and how it relates to the law’s effeciency. thus, some external facts contributes for such violence as result there is a higher social claim and the different type of abuses.

Key Words: Domestic Abuses, Effeciency, Types, Applycability

2. INTRODUÇÃO

Este trabalho apresenta uma abordagem à situação atual da mulher sob a ótica da Lei 11.340/2006 que cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar, que ficou mais conhecida como Lei Maria da Penha Maia em razão da luta de uma farmacêutica vítima de constantes agressões durante o casamento. Esta lei, já com quase seis anos, trouxe muitos benefícios e, com eles, também, a dúvida na representação de um sentido mais igualitário entre os sexos.

O objetivo deste trabalho é trazer uma concepção diversa do conceito de igualdade entre pessoas. Embora este conceito seja muito influente e base da sociedade brasileira, não é tratada com a devida importância de que necessita.

A violência em combinação de diversos fatores históricos e culturais gera um estado frágil de temor onde à descrença por justiça e segurança está cada vez mais ampla.

Visto que a violência representa um câncer na sociedade desde os povos antepassados até os contemporâneos e partindo da idéia de que a Lei Maior do ordenamento jurídico brasileiro prevê a igualdade de todos, inclusive entre homens e mulheres, é admirável que a violência penetre também no lar, local onde se encontra a base de uma sociedade, a família.

Acontece que, com a evolução dos tempos, configura-se o aspecto da falta de segurança até mesmo dentro do próprio lar. A mulher é obrigada a promover a reconstrução de si mesma e do seu lar após agressão causada muitas vezes por seu próprio companheiro.

Fica então a questão de que se a Lei Maior estabelece um Estado Democrático, onde há a prevalência da dignidade da pessoa humana e igualdade entre homens e mulheres nos direitos e deveres, como é possível afirmar que existe uma compatibilidade de tratamento entre os sexos na referida Lei, se a mesma dá ao homem, quando pratica violência contra a mulher, um tratamento mais rígido e gravoso do que quando a própria mulher agride o companheiro?

Nesse contexto, é preciso que haja uma maior verificação sobre a aplicabilidade da Lei Maria da Penha, partindo dos principais fatos que concorreram para a sua formação como Lei e o seu objetivo e destinação final, sempre em concordância com os princípios fundamentais e igualitários que regem o ordenamento jurídico Brasileiro.

3. A MULHER DO PASSADO E DO PRESENTE

No passado, a mulher sempre foi tratada com subordinação em relação ao homem. No ano de 2.000 a.C foi excluída definitivamente a idéia do matriarcado, fixando-se, então, o patriarcado com o conceito do homem como dominador e mulher como dominada.

Este conceito patriarcal pode ser observado até mesmo pelo livro sagrado do Cristianismo, a Bíblia. De acordo com o livro de Gênesis, foi a primeira mulher criada por Deus com o nome de Eva que, ao comer o fruto proibido, privou a humanidade de viver na perfeição. Alem disso, “as genealogias bíblicas habitualmente não listam as filhas mulheres”.1

Além de o velho testamento do livro sagrado trazer conceitos de submissão de poligamia, o novo testamento também trouxe alguns conceitos patriarcais se referindo a fatos anteriores à Idade Média:

A Igreja católica [...] perseguiu as mulheres, especialmente as que se atreveram a pensar por conta própria. Por qualquer palavra, ação ou omissão eram acusadas de bruxaria e condenadas à morte na fogueira. El martillo de lãs brujas (grifo do autor), manual da Inquisição escrito em 1546, dedicou todo o seu texto à demonstração da inferioridade biológica das mulheres e à justificação da necessidade de serem castigadas. 2

Desde a antiguidade, passando pela Idade Média até a Idade Moderna, as mulheres apresentam uma característica de inferioridade, onde até mesmo a concepção de filhas mulheres era indesejável em razão de servirem somente ao ambiente doméstico até o momento do casamento, que era decidido por seu pai, através da oferta de um dote ao pretendente. A partir daí, a mulher deixava a submissão ao pai e passava a submissão ao marido.

Mas, ao longo da história, também existiram exemplos de mulheres que participaram soberanas do poder, tanto político como cultural.

[...] A Rainha de Sabá pôs à prova a sabedoria de Salomão; Cleópatra. Rainha do Egito manipulou, com sensualidade e inteligência, dois homens poderosos – Julio Cesar e Marco Antonio -, desafiando a hegemonia do Império Romano em defesa da integridade e independência de seu reino. Muitos séculos depois, a rainha Elisabeth I governou a Inglaterra com sabedoria e autoridade por mais de quarenta anos, garantindo ao povo britânico longo tempo de paz e prosperidade. Catarina de Prússia, irreverente desde a infância, reinou sobre a Rússia por casamento [...]3

 

Além disso, existem registros no curso da historia, de mulheres que literalmente enfrentaram o patriarcado como, por exemplo, Joana D’Arc, que foi queimada pela fogueira da inquisição em 30 de maio de 143, além de Anita Garibaldi e Chiquinha Gonzaga.

Os movimentos feministas foram movimentos sociais que tinham como meta um tratamento isonômico entre os gêneros. Em um primeiro momento, no século XIX, surgiu o sufrágio que trazia a idéia de direito feminino ao voto. No Brasil, o direito feminino ao voto foi concedido na década de 30 e somente em 1933, teve disposto legalmente no Código Eleitoral.

Um dos fatos relevantes que marcaram a revolução social ocorrida no mundo entre 1945 e 1990 foi o ingresso maciço das mulheres - especialmente das mulheres casadas – no mercado de trabalho. Em 1940, só 14% das mulheres casadas que viviam com os maridos trabalhavam fora. Em 1980, este índice havia aumentado para mais de 50%. No mesmo período as mulheres também ingressaram, maciçamente, na educação superior, principal porta de acesso às profissões liberais. Logo depois do fim da Segunda Guerra, 15 a 20% dos universitários eram mulheres; em 1980, este percentual havia aumentado para mais de 50% em média. Esses dois fatores formaram – pelo menos nos países ocidentais – o pano de fundo para transformar a população feminina numa força política importante. 4

 

O Código Civil de 1916 foi elaborado em 1899 por Clóvis Beviláqua, com conceitos muito patriarcais, [...] “por isso a mulher ao casar perdia a plena capacidade (grifo do autor), tornando-se relativamente capaz” 5.

Diz, ainda, Maria Berenice Dias6:

O primeiro grande marco para romper a hegemonia masculina foi à edição do chamado Estatuto da Mulher Casada (grifo ao autor) (L 4.121/62). Foi Devolvida a plena capacidade à mulher, que passou à condição de colaboradora do marido na administração da sociedade conjugal. [...] O passo seguinte – e muito significativo – veio com a aprovação do divórcio, rompendo uma resistência secular capitaneada pela Igreja Católica. [...] A Lei do Divórcio (grifo do autor) (L 6.515/77) [...] [também] trouxe alguns avanços em relação à mulher. 7

Mas, foi somente na CF/1988 que homens e mulheres alcançaram a igualdade e igualdade jurídica na forma da Lei.

Apesar da evolução, a violência contra a mulher persiste na sociedade atual. Damásio de Jesus8 complementa, ainda, que esta “violência contra a mulher parece não escolher o nível socioeconômico e cultural, atingindo igualmente mulheres de países pobres e ricos”.

En 2006, el Estudio a fondo del Secretario General confirmó que la violencia contra las mujeres, ya sea que ocurra en el hogar, el lugar de trabajo o en otro sitio, constituye una violación especialmente atroz a los derechos humanos que debe ser erradicada. Si bien la Convención sobre la Eliminación de Todas las Formas de Discriminación contra la Mujer (CEDAW, por sus siglas en inglés) de 1981 no hace mención explícita a la violencia contra las mujeres [48], el Comité para la Eliminación de la Discriminación contra la Mujer, el cual es responsable de interpretar y fiscalizar la aplicación de la CEDAW, ha aclarado en su. Recomendación general no. 19 (1992) que los Estados Partes en la Convención se encuentran obligados a adoptar todas las medidas necesarias para eliminar la violencia contra las mujeres.9

E, após todos esses anos de exclusão da mulher pelo sexo masculino, esta retorna novamente as pautas das discussões sociais, infelizmente como vítima da violência configurada dentro do seu próprio lar.

Embora os atos de agressão de homens contra mulheres nas relações de casais tenham diminuído sensivelmente — redução nitidamente visível em relação aos chamados homicídios passionais no Brasil, quase desaparecidos dos registros do sistema penal —, relações de hierarquização e dominação ainda subsistem, assim subsistindo atos identificáveis como expressão da chamada violência de gênero, isto é, motivados não apenas por questões estritamente pessoais, mas expressando fundamentalmente a hierarquização estruturada em posições de dominação do homem e subordinação da mulher, por isso se constituindo em manifestações de discriminação10

4. O COMBATE A VIOLÊNCIA DE GÊNERO

De acordo com NUCCI11, violência significa, em linhas gerais, qualquer forma de constrangimento ou força, que pode ser física ou moral. Entretanto, em termos penais, padronizou-se o entendimento de que o termo, quando lançado nos tipos penais incriminadores, tem o condão de representar apenas a violência física.

O dicionário Aurélio da língua portuguesa traz a significação da palavra “gênero” como sendo “grupo da classificação dos seres vivos que reúne espécies vizinhas, aparentadas, afins, por apresentarem entre si semelhanças constantes”.

A união destes dois conceitos nos traz uma idéia clara da expressão “violência de gênero” como o ato praticado desprezando o gênero mulher, ou seja, é vítima desse tipo de violência simplesmente por ser mulher.

Embora muito utilizada em contexto feminista do Direito, a acepção do gênero como diferenciadora do masculino e feminino, de todo modo, parece ganhar campo também na área penal12.

Nas sociedades onde a definição de gênero feminino tradicionalmente é referida à esfera familiar e à maternidade, a referencia fundamental da construção social do gênero masculino é sua atividade na esfera pública, concentrador dos valores materiais, o que faz dele o provedor e protetor da família13.

Uma forma mais conhecida da violência de gênero é a violência doméstica e familiar, que se trata de toda a ação ou omissão cometida no âmbito familiar que ameaçam a vida, integridade (física ou psicológica) e até mesmo a liberdade. Sua configuração passa por duas variáveis importantes: quem agride e onde agride.

Uma pesquisa realizada pela Organização Mundial da Saúde14 indica que

As consequências da violência de gênero são diferentes para homens e mulheres, bem como os motivos que levam as pessoas a praticá-la. Estudos realizados no Canadá e nos Estados Unidos mostraram que as mulheres têm muito mais probabilidade de serem machucadas durante as agressões por parceiros íntimos do que os homens, e que as mulheres sofrem formas mais graves de violência.

Damásio de Jesus15 ensina que existe uma expressão denominada “Femicídio”, termo que:

Indica o caráter social e generalizado da violência baseada na iniquidade de gênero e nos impede de elaborar teses que tendam a culpar as vitimas e a representar os agressores como ‘loucos’, ‘fora de controle’, ou a conceber essas mortes como crimes passionais.

Este termo “Femicídio” foi usado pela primeira vez por Radford e Russel, autoras do livro Femicide: the politics of woman killing tendo como significado “o assassinato de mulheres por razões associadas a seu gênero (sua condição de mulher)” 16

A sociologia, a antropologia e outras ciências humanas lançaram mão da categoria gênero para demonstrar e sistematizar as desigualdades socioculturais existentes entre mulheres e homens, que repercutem na esfera da vida pública e privada de ambos os sexos, impondo a eles papéis sociais diferenciados que foram construídos historicamente, e criaram pólos de dominação e submissão17

Dados provenientes de uma grande variedade de países indicam que a violência de gênero é responsável por um significativo número de mortes por assassinato entre as mulheres. Estudos realizados na África do Sul, na Austrália, no Canadá, nos Estados Unidos e em Israel mostram que, das mulheres vítimas de assassinato, de 40 a 70% foram mortas por seus maridos ou namorados, normalmente no contexto de um relacionamento de abusos constantes.18

4.1. A EVOLUÇÃO LEGISLATIVA NA PROTEÇÃO À MULHER

Até a chegada de uma Lei que realmente tratasse da violência contra a mulher, a violência domestica nunca mereceu a devida atenção.

Em 1975, foi realizada no México a I Conferência Mundial sobre a Mulher que teve como resultado a elaboração da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação Contra a Mulher (CEDAW).

Em 18 de Dezembro de 1979, a Assembleia Geral das Nações Unidas em sua resolução 34/180 trouxe a CEDAW, que tratava da ampla proteção à mulher sobre direitos políticos, econômicos, trabalhistas entre outros.

De acordo com NUCCI19, a convenção sobre a CEDAW, traz em vários trechos, destacando, expressamente, que o objetivo não é privilegiar a mulher diante do homem, mas buscar a igualdade entre os sexos.

Em 1990, a Organização Mundial de Saúde (OMS) reconheceu a violência doméstica como tema legítimo de direitos humanos e saúde publica. [...] Em 25 de novembro de 1998, o Brasil e as Nações Unidas firmaram o Pacto Comunitário Contra Violência Intrafamiliar, com o compromisso de “capacitar os policiais civis e militares para o atendimento adequado em situações de violência contra a mulher, incluídas as situações de violência doméstica20.

Já em 09 de Junho de 1994, foi aprovada pela Assembléia Geral da Organização dos Estados Americanos (OEA), a Convenção Interamericana Para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher que ficou conhecida como Convenção de Belém do Pará, sendo ratificada pelo Brasil em novembro de 1995.

A “Convenção de Belém do Pará” (ANEXO A) busca instigar os Estados a editar normas de proteção contra a violência generalizada contra a mulher, dentro ou fora do lar21

A “Convenção de Belém do Pará”:

reconhece a violência contra a mulher como um fenômeno generalizado, que alcança, sem distinção de raça, classe, religião, idade ou qualquer outra condição, um elevado número de mulheres. Afirma que esta violência constitui grave violação aos direitos humanos, constituindo manifestação de relações de poder historicamente desiguais entre mulheres e homens22

Dispõe, ainda, Damásio de Jesus23:

De acordo com a convenção de Belém do Pará (1994), defini-se como “violência contra a mulher” qualquer conduta, de ação ou omissão, baseada no gênero (grifo nosso), que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, no âmbito publico ou privado.

É importante salientar que o Congresso Nacional Brasileiro aprova os tratados e atos internacionais mediante a edição de decreto legislativo, que dispensa sanção ou promulgação por parte do presidente da república24. Há que se lembrar, entretanto, que os tratados apenas adentram no ordenamento quando o presidente o promulga, por decreto.

Em 1995 com a criação da Lei 9.099 – Lei dos Juizados Especiais Criminais (JECRIMs) veio a possibilidade da criação de juízos especiais para a resolução de pequenos delitos no intuito de desafogar a Justiça e ganhar celeridade nos processos. Ou seja, crimes contra a integridade física e psicológica, bem como contra a dignidade feminina, eram apreciados da mesma forma que os crimes de transito ou as brigas de vizinhos.25

As Nações Unidas apresentavam tanta preocupação na configuração deste tipo de violência que elaboraram a resolução 52/86 da Assembleia Geral das Nações Unidas (12 de dezembro de 1997) recomendando a aprovação de “códigos deontológicos e medidas de auto-regulamentação no que respeita à violência nos media, com vista a melhorar o respeito pelos direitos das mulheres e desencorajar a discriminação e os estereótipos”.

Atendendo a esta resolução, o Brasil logo tratou de criar sua legislação específica, trazendo a Lei 10.886/2004 que acrescenta o parágrafo 9º ao artigo 129 do Código Penal (CP):

Art. 129 - Ofender a integridade corporal ou a saúde de outrem:
[...].

Violência Doméstica

§ 9º Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade: [...].26
 

Passados anos de luta pelo fim da violência no âmbito doméstico, finalmente foi editada a Lei 11.340/2006, dando cumprimento às convenções e tratados internacionais do qual o Brasil é signatário.

5. LEI 11.340/2006 – LEI MARIA DA PENHA

Quanto ao tema, Adriana Ramos de Mello destaca em sua obra:

Maria da Penha tornou-se símbolo da luta contra violência doméstica em todo Brasil. [...] O caso tomou tanta repercussão que chegou ao conhecimento da Comissão Interamericana de direitos humanos, órgão da Organização dos Estados Americanos (OEA), sediada em Washington, Estados Unidos, que acatou pela primeira vez, a denúncia de um crime de violência doméstica27

Maria da Penha Maia Fernandes é uma farmacêutica vitima de violência doméstica que sofreu repetidas agressões durante anos em seu lar, mas não reagiu nem tomou qualquer atitude, temendo que seu ex-marido fizesse algo mais grave contra as filhas e até mesmo contra ela. Em maio de 1983, ficou paraplégica em razão de um tiro desferido por seu ex-companheiro, enquanto casados. Logo após este tiro quase fatal, Maria da Penha sofreu um novo atentado: uma descarga elétrica enquanto estava no banho.

Foi a partir daí que esta farmacêutica resolveu procurar apoio na justiça para que cessasse a violência. Resolveu fazer uma denúncia pública de suas agressões, porém nenhuma providência foi tomada. Mesmo assim não silenciou. Escreveu um livro intitulado “Sobrevivi, posso contar” 28 com o intuito de manifestar publicamente sua indignação e reunir as vítimas em um movimento feminino no intuito de acabar com esse tipo de violência.

Em 1991, o ex-marido de Maria da Penha foi condenado a oito anos de prisão, recorreu em liberdade e, em 1992, teve seu julgamento anulado. Retornou a novo julgamento em 1996, foi condenado a dez anos e seis meses de prisão, novamente recorreu em liberdade e, somente em 2002 foi preso, ficando “atrás das grades” até o ano de 2004.

A luta de Maria da Penha repercutiu internacionalmente a ponto da formalização de uma denúncia na Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos, que solicitou, por quatro vezes, respostas ao governo brasileiro que não respondeu.

A OEA emitiu em seu relatório nº 54, além de medidas para o governo brasileiro, a imposição de um pagamento de indenização à Maria da Penha Maia Fernandes no valor de vinte mil dólares sendo paga somente em julho de 2008, juntamente com um pedido de desculpas pelo Estado do Ceará.

O projeto, que teve início em 2002, foi elaborado por um consórcio de cinco organizações não governamentais – ONGs que trabalharam com a violência doméstica. O Grupo de Trabalho Interministerial, criado pelo Decreto 5.030/04, sob a coordenação da Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, elaborou o projeto que, em novembro de 2004, foi enviado ao Congresso Nacional29

A deputada Jandira Feghali, relatora do Projeto de Lei 4.559/2004, realizou audiências publicas em vários Estados e apresentou um substitutivo. A Lei 11.340 (que recebeu o nome de Lei Maria da Penha) foi sancionada pelo Presidente da República em 07 de agosto de 2006, entrando em vigor a partir de 22 de setembro de 2006, trazendo a criação de:

Mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências. 30


 MEDIDAS DE PROTEÇÃO À MULHER:

A LMP estabeleceu em seu texto um rol de medidas para dar efetividade ao seu propósito: assegurar à mulher o direito de uma vida sem violência.

Por isso, sempre que houver violação de qualquer direito estabelecido legalmente nesta Lei, serão estabelecidas medidas protetivas na intenção de proporcionar maior segurança e proteção à vítima de violência doméstica. Algumas dessas medidas previstas já estavam dispostas no parágrafo único do art. 69 da Lei de Juizados Especiais (9.099/1995)31: “Art. 69. [...] Parágrafo Único.[...] Em caso de violência doméstica, o juiz poderá determinar, como medida de cautela, seu afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a vítima”. Outras, porém, tem caráter inovador.

Enquanto vítimas de crime frequentemente têm preocupação com a sua participação no processo, na lei, nas consequências e efetividade, as vítimas da opressão e do abuso de poder necessitam e querem proteção e assistência antes de mais nada32.

Uma das grandes novidades trazidas pela LMP foi à admissão de medidas de urgência, estabelecidas no capítulo II, que servem para deter o agressor e garantir a segurança pessoal e patrimonial da vítima de violência doméstica.

O referido capítulo II, a partir do art. 19 da lei de violência domestica e familiar traz a previsão de medidas protetivas de urgência. Reza o artigo 19:

Art. 19. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.
§ 1º. As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado.
§ 2o. As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.

§ 3o. Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, [...]. 33

As medidas protetivas podem ser requeridas pelo Ministério Público ou a pedido da ofendida diretamente, sendo, nesse caso, prescindível a figura do advogado, conforme leitura do art. 27 da mesma lei.

Certos juristas concordam em dizer que as medidas protetivas, como por exemplo, a retirada do agressor do convívio do lar e até mesmo a proibição de seu acesso ao mesmo, se tratam de medidas que previnem à pratica da violência doméstica e familiar, mostrando à vitima que esta poderá contar com a justiça. Além disso, proporciona segurança a vitima e tranquilidade ao lar.

Sobre a retirada do agressor do lar, ensina Alice Bianchini:34

Há que se compreender, ainda, que a mulher agredida não busca, necessariamente, a punição do agressor, pessoa com quem ela mantém estreitos laços afetivos; figura que, na maioria dos casos, constitui-se no pai de seus filhos. Ela pretende (e acredita ser possível) que haja a cessação da violência. E, para isso, a nova medida (afastamento do lar) pode ser válida, pois a distância física que ela objetiva, além dos outros fatores já mencionados, contribui para arrefecer o conflito familiar. Por menos, quebra hábitos cotidianos, obriga à reflexão.

Logo após, o artigo 22 traz a “natureza cautelar, sendo aplicáveis unicamente para assegurar os meios e fins de processo em que se busca ou se irá buscar a realização da pretensão punitiva fundada na alegada prática do crime configurador da violência de gênero” 35[...]

Art. 22.  Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:
I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;
II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;
III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:
a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;
b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) frequentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;
V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.
§ 2o  Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.
§ 3o  Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.
§ 4o  Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil). 36

E ainda os geradores de polêmica, os artigos 17 e 41, que são objeto de constantes discussões. O artigo 17 traz a vedação da aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa” e o artigo 41 informa que “aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995”.

Importante mencionar também, que o artigo 17 citado acima, trata da proibição da aplicação da prestação pecuniária como forma de punição, mesmo que seja aplicada cumulativamente, como é o caso da pena de multa, que poderá se cumular até mesmo com outra pena restritiva de direitos ou prestação de serviços à comunidade, sendo vedada a aplicação desta como forma de pagamento isolado.

Dando continuidade, os artigos 23 e 24 tratam do “lado oposto”: medidas protetivas de urgência à ofendida.

Art. 23.  Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:
I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;

III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;

IV - determinar a separação de corpos. 37

E ainda:

Art. 24.  Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:

I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida.
II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;
III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida o agressor;
IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.

Parágrafo único.  Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo. 38

 

A partir dessas análises é possível perceber que a referida Lei trata com muita seriedade a questão da proteção à vitima, lembrando, também que ao juiz não cabe somente aceitar as medidas protetivas requeridas pelo Ministério Público ou até mesmo pela vítima, mas, também, poderá agir de ofício, conforme disposto nos artigos 20, 22 § 4º, 23 e 24).

Esperamos que a nova lei seja ainda muito discutida e sua aplicação renovada em interpretações jurídicas cada vez mais justas e adequadas. Rogamos que o Judiciário deixe aberta uma brecha de criatividade na aplicação da novel Lei, não se fechando tal qual ocorreu inicialmente com a Lei dos Juizados Especiais, nos idos de 1995.39

5.1. INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.340/2006.

Complementando algumas medidas de caráter inovador abordadas anteriormente, o artigo 10 vem devolvendo à autoridade policial o poder investigatório. Diz o artigo: “na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis”.

A autoridade policial, no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, deverá garantir proteção policial se for necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário, encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal, fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida, se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar e informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis. (LMP, art. 11)

Registrada a ocorrência, a autoridade policial deverá ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada (LMP, art. 12,I), colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias (LMP, art. 12,II), remeter, no prazo de quarenta e oito horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência (LMP, art. 12,III), determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários (LMP, art. 12,IV), ouvir o agressor e as testemunhas (LMP, art. 12,V), ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele (LMP, art. 12,VI) e remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público40.

Além disso, a vítima, que antes tinha de procurar representação por advogado ou até mesmo pela Defensoria Publica para garantir sua segurança, agora conta com o dispositivo 27 da LMP e, para enfatizar, estará sempre garantido seu acesso à Assistência Judiciária Gratuita a qualquer tempo.

O Ministério Público, de acordo com o artigo 2541 da LMP, é legitimo para agir como parte tanto em ações cíveis como em ações criminais, podendo requerer a aplicação ou substituição de algumas medidas.

O dispositivo 14 da LMP traz a criação de Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher (JVDFM) para o “processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher”, e logo após, o artigo 4142 da LMP afasta dos Juizados Especiais a competência sobre os crimes de violência domestica e familiar.

Enquanto não acontecer efetivamente à instalação dos JVDFM, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher (LMP, art. 33).

6. BANALIZAÇÃO NOS TEMPOS ATUAIS

É notória nos tempos atuais a banalização quando se fala em LMP. É necessária a observação de alguns pontos que a diferenciam.

Segundo o Dicionário Eletrônico Houaiss da Língua Portuguesa, versão 1.0, doméstico (grifo do autor), dentre outras acepções, é adjetivo que significa relativo ao lar, à família, à vida particular de uma pessoa (grifo do autor). E familiar (grifo do autor), dentre outros significados, é adjetivo que traduz o que é da família ou vive na mesma casa; íntimo, que é considerado como fazendo parte da família (grifo do autor).43


 

Em linhas gerais significa que não será qualquer agressão sofrida pela mulher dentro de casa que configurará a violência doméstica e familiar. Esta não tem o objetivo de resolver conflitos entre parentes. Um claro exemplo aconteceu na cidade de Governador Valadares, estado de Minas Gerais, onde Marilza S. O ingressou com uma representação contra sua irmã M. S. O alegando ofensa verbal, com xingamentos e gritaria em sua casa. E, ainda segundo Marilza, após o incidente o proprietário do imóvel do qual era inquilina a pediu que se retirasse44.

O Juizado Especial Criminal de Governador Valadares entendeu, já que as irmãs viviam em atrito, que seria caso de configuração na Lei 11.340/2006, passando então a competência a uma das varas criminais da cidade. Assim, os autos foram encaminhados para a 1ª Vara Criminal de Governador Valadares.

A 1ª Vara Criminal de Governador Valadares, por sua vez, entendeu o não enquadramento do caso na Lei 11.340/2006 e determinou a remessa do processo ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), alegando conflito de competência.

Diante dos fatos, o ministro relator do recurso, Og Fernandes, declarou competência ao Juizado Especial de Governador Valadares para processar e julgar a representação. O voto foi aprovado, por unanimidade, pelos ministros da terceira seção.

Trata-se, diante do exposto, de uma situação comprovada de banalização. Diz, ainda, o ministro relator Og Fernandes:

É evidente, no caso, que a troca de ofensas entre irmãs não se insere na hipótese de incidência examinada. Se assim fosse, qualquer briga entre parentes daria ensejo ao enquadramento na Lei nº 11.340/06. Além do mais, a situação dos autos não demonstra qualquer relação de vulnerabilidade, hipossuficiência, inferioridade física ou econômica entre autora e vítima. (grifo nosso). Fica evidente, pela análise do caso, que o delito supostamente praticado não encerra qualquer motivação de gênero, tendo havido apenas discussões e ofensas entre duas irmãs com problemas de relacionamento preexistentes.

Pode-se afirmar a banalização só acontece porque a sociedade é entusiasta do rigor penal como solução para a violência de gênero e acenam com a finalidade de superação de práticas diferenciadas, arbitrárias ou discriminatórias, acenando conjuntamente com a realização do direito fundamental à igualdade para homens e mulheres. Mas, para atender seus desejos punitivos, não hesitam em, paradoxalmente, aplaudir as próprias práticas diferenciadas, arbitrárias e dis­criminatórias que suprimem direitos fundamentais45

Existe todo um clamor social que acaba mostrando apologia à repressão pelo sistema penal, causando a impressão de que este sistema acabará de forma única e justa com todo problema da violência doméstica e familiar. Deve ser observado sempre que, ao apresentar um posicionamento qualquer, os direitos fundamentais deverão estar em primeiro lugar, se este não for o pensamento, não haverá superação de preconceitos e discriminações que, ao final, são confirmados pela repreensão do sistema penal.

Complementando a discussão, importa destacar que:

O paradoxal comportamento de mulheres e homens entusiastas do rigor penal como pretensa solução para a violência de gênero não se esgota no aplauso a essas exemplares violações de princípios e normas assentados nas declarações universais de direitos e nas Constituições democráticas. Para atender seus desejos punitivos vão além, aplaudindo até mesmo regras que, paradoxalmente, discriminam as próprias mulheres46

Além disso, os costumes, a educação e os meios de comunicação tratam de criar e preservar estereótipos que reforçam a idéia de que o sexo masculino tem o poder de controlar os desejos, as opiniões e a liberdade de ir e vir das mulheres47.

Mas, certamente, o enfrentamento da violência de gênero, a superação dos resquícios patriarcais, o fim desta ou de qualquer outra forma de discriminação não se darão através da sempre enganosa, dolorosa e danosa intervenção do sistema penal, como equivocadamente crêem mulheres e homens que aplaudem o maior rigor penal introduzido em legislações como a nova Lei brasileira nº 11.340/2006 ou sua inspiradora espanhola Ley Orgáni­ca 1/2004. 48

Em relação à matéria disposta, ensina Maria Berenice Dias49:

A banalização da violência doméstica levou à invisibilidade do crime de maior incidência no país e o único que tem perverso efeito multiplicador. Suas seqüelas não se restringem à pessoa da ofendida. Comprometem todos os membros da entidade familiar, principalmente os filhos, que terão a tendência de se transformar em agentes repetidores do comportamento que vivenciam dentro de casa.

É necessário buscar meios que sejam mais eficientes do que simplesmente acreditar na resolução mais rápida, através de uma cobrança maior ao sistema penal que, ao final, não alcança o esperado e acaba por gerar mais danos, injustiças e desigualdades decorrentes da não solução dos conflitos além de causar mais dor e aumentar a violência.

7. A QUESTÃO DA CONSTITUCIONALIDADE.

Para muitos, a principal causa de controvérsia em relação a Lei 11.340/2006 é de que esta representa uma afronta ao princípio da igualdade previsto na Carta Magna, uma vez que há tratamento diferenciado entre mulheres e homens quando vítimas de violência doméstica, porém é mister fazer uma análise concreta do tema.

7.1. PRINCÍPIO DA IGUALDADE

A Declaração Universal dos Direitos Humanos50, em seu artigo VII traz uma disposição sobre igualdade onde afirma que:

Todos são iguais perante a lei e têm direito, sem qualquer distinção, a igual proteção da lei. Todos têm direito a igual proteção contra qualquer discriminação que viole a presente Declaração e contra qualquer incitamento a tal discriminação.   

Complementando o assunto, dispõe o MORAES51:

A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da igualdade de direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito de tratamento idêntico pela lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de Justiça [...]

Esta referida igualdade na Constituição Federal vem no artigo 5º é uma forma de garantir aos cidadãos brasileiros o direito constitucional da igualdade. Porém, apresenta-se amplo quando se trata da banalização da violência de gênero.

Sobre a questão dos gêneros, é importante frisar que:

A diferença, portanto, não é o contrário da igualdade, mas da identidade: duas coisas são idênticas ou diferentes, mesmo que um objeto possa ser idêntico a outro sob determinado ponto de vista, e diferente, sob outro ponto de vista ou aspecto. Desse modo, o homem e a mulher são diferentes por certos caracteres e semelhantes por outros. Quanto à igualdade, ela se opõe à desigualdade, e não à diferença52

A desigualdade na Lei:

[...] se produz quando a norma distingue de forma não razoável ou arbitrária um tratamento específico a pessoas diversas. Para que as diferenciações normativas possam ser consideradas não discriminatórias, torna-se indispensável que exista uma justificativa objetiva e razoável, de acordo com critérios e juízos valorativos genericamente aceitos, cuja exigência deve aplicar-se em relação à finalidade e efeitos da medida considerada, devendo estar presente por isso uma razoável relação de proporcionalidade entre os meios empregados e a finalidade perseguida, sempre em conformidade com os direitos e garantias constitucionalmente protegidos.53

Porém:

Quanto mais progridem e se organizam as coletividades, maior é o grau de diferenciação (grifo nosso) a que atinge seu sistema legislativo. A lei raramente colhe no mesmo comando todos os indivíduos, quase sempre atende a diferenças de sexo, de profissão, de atividade, de situação econômica, de posição jurídica, de direito anterior; raramente regula do mesmo modo a situação de todos os bens, quase sempre se distingue conforme a natureza, a utilidade, a raridade, a intensidade de valia que ofereceu a todos; raramente qualifica de um modo único as múltiplas ocorrências de um mesmo fato, quase sempre os distingue conforme as circunstâncias em que se produzem, ou conforme a repercussão que têm no interesse geral. Todas essas situações, inspiradas no agrupamento natural e racional dos indivíduos e dos fatos, são essenciais ao processo legislativo, e não ferem o princípio da igualdade. Servem, porém, para indicar a necessidade de uma construção teórica, que permita distinguir as leis arbitrárias das leis conforme o direito, e eleve até esta alta triagem a tarefa do órgão do Poder Judiciário.54

Está clara a preocupação do legislador em proteger não apenas a incolumidade física individual da vítima (homem ou mulher), como também tutelar a tranquilidade e harmonia dentro do âmbito familiar55

Partindo para outra análise, a CF traz em seu artigo 226 a criação de situações diferentes em relação à isonomia constitucional. Trata-se de direitos e deveres na sociedade conjugal:

Art. 226 - A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...]
§ 5º - Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher. 56

Portanto, a Constituição Federal já fez o seu papel, igualando os brasileiros perante a Lei (art. 5.º, caput), e os homens e mulheres em direitos e obrigações (art. 5º. I), bem como o homem e mulher na relação conjugal (art. 226, § 5.º) 57

Sendo assim, conclui-se que o sujeito ativo do crime de violência doméstica pode ser tanto homem quanto a mulher, desde que exista uma relação que está estabelecida no § 9º do artigo 129 CP. [...] 58

Condicionar (grifo do autor) a punibilidade dessa espécie de “vítima (grifo do autor) significa dificultar-lhe o alcance da violência doméstica” à representação (grifo do autor) da tutela penal, na medida em que, quando não por outras razões, pela simples coa­bitação com o agressor (grifo do autor) (normalmente mais forte, quase sempre temido ou respeitado), a vítima não tem coragem nem independência suficientes para manifestar livremente sua vontade de requerer/autorizar a coerção estatal59

Em suma, é dever do princípio da igualdade permitir o tratamento dos desiguais na medida de sua desigualdade. A mulher tem sido vitima de violência no âmbito do lar há muitos anos, resultando em um tratamento desigual em razão de sua desigualdade.

O que se percebe é que a LMP não se atentou a questão do gênero, pois acabou por excluir a participação da mulher na discussão do problema, o que resolveria satisfatoriamente o conflito. Prova disto é o disposto no artigo 16 da LMP que traz a renúncia à representação somente perante o juiz, em audiência especialmente designada para este fim.

O artigo 1660 citado anteriormente estabelece que a renúncia à representação só poderá se dar perante o juiz, em audiência especialmente designada para tal fim e ouvido o Ministério Público. A mulher passa a ser assim objetivamente inferiorizada, ocupando uma posição passiva e vitimizadora, tratada como alguém incapaz de tomar decisões por si própria.61

Não há dúvida ainda de que esse tratamento previsto na lei irá alcançar o lar, tanto as famílias advindas do casamento, quanto aquelas originadas de uniões de fato, estáveis ou não62, e as homoafetivas.

Por outro lado, cabe mais um registro: embora a criminalização da “violência doméstica” tenha resultado, merecidamente, do trabalho dos movimentos feministas, a verdade é que as mulheres e filhos, geralmente vítimas, também podem ser sujeitos ativos desse crime. 63

7.2. A QUESTÃO DA HOMOAFETIVIDADE

[...] “não se pode deixar de lado as relações homoafetivas, que passam a ser reconhecidas no território nacional, seguindo a evolução legislativa do mundo ocidental”.64

Uniões homossexuais receberam, ao passar dos anos, títulos discriminatórios de toda natureza, inclusive como traz Maria Berenice Dias65, a própria palavra “homossexualismo” foi substituída por homossexualidade em razão do sufixo “ismo”, significar “doença”. Considerada por muitos como relegados da sociedade, a união homossexual vem aos poucos garantindo seu lugar no ordenamento.

Somente é necessário que duas pessoas sejam ligadas por um vinculo afetivo e mantenham relação publica e duradoura para que formem uma família, independente de sua orientação sexual. Na união homoafetiva, só não existirão frutos do relacionamento em razão de serem do mesmo sexo.

A lei 11.340/2006 trouxe em seu artigo 2º que “toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual (grifo nosso), renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana” [...] e ainda em seu artigo 5º, parágrafo único onde “as relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual”, provando assim que no meio de toda a legislação existe um conceito diferenciado de família, visto que a violência doméstica e familiar só acontece em ambiente doméstico.

No Tribunal de Justiça (TJ) do estado do Rio de Janeiro, o juiz Alcides da Fonseca Neto, da décima primeira vara criminal aplicou a LMP para um casal de homossexuais, concedendo em sua decisão, liberdade provisória ao réu, o não pagamento de fiança e a assinatura de um termo que garante proteção ao companheiro do réu, que não poderá se aproximar pelo limite de 250 metros.66 O juiz Alcides da Fonseca Neto, sobre a aplicação da medida, afirma ainda que é importante

[...] salientar que a presente medida, de natureza cautelar, é concedida com fundamento na Lei 11.340/06 (Lei Maria da Penha), muito embora esta lei seja direcionada para as hipóteses de violência doméstica e familiar contra a mulher. Entretanto, a especial proteção destinada à mulher pode e dever ser estendida ao homem naqueles casos em que ele também é vítima de violência doméstica e familiar, eis que no caso em exame a relação homoafetiva entre o réu e o ofendido, isto é, entre dois homens, também requer a imposição de medidas protetivas de urgência, até mesmo para que seja respeitado o Princípio Constitucional da Isonomia.67

O casal Adriano Cruz de Oliveira e Renã Fernandes Silva, já mantinham a relação homoafetiva há três anos, e moravam no centro da cidade do Rio de Janeiro, quando na madrugada de trinta de março deste ano, Renã atingiu seu companheiro com uma garrafa causando-lhe muitos ferimentos68.

7.3. REPRESENTAÇÃO

Apesar de afastada expressamente a vigência da Lei de Juizados Especiais (art. 41, a LMP fala em “renúncia à representação” (art.16) recebida até o momento da denúncia. Assim, a posterior manifestação da vítima perante o juiz de não querer que a ação se instaure, se trata de “retratação à representação”69

A representação da vitima é colhida pela autoridade policial, sendo ratificada em juízo através de uma conversa franca e explicativa do juiz em relação à manutenção ou desistência por parte desta vitima.

8.  CONCLUSÃO

Como visto, a mulher passou por vários momentos de repressão até conseguir a tão sonhada “igualdade”. Durante o passar dos anos, foi excessiva a luta por sua dignidade. E, mesmo após alcançar seus objetivos, se torna vítima de um tipo de violência covarde que surge no leito de seu lar, de sua família.

É sabido que a violência está disseminada na sociedade e no mundo atual. Pessoas já não mais respeitam o instituto familiar. Mais é de suma relevância que se coloque os pingos nos “i”s.

A violência doméstica e familiar contra a mulher tem como pressuposto o gênero. Ocorre pelo simples fato de “ser mulher”.

Levando em consideração que o ordenamento atual dita o princípio igualitário entre todos perante a lei, os desiguais serão tratados na medida de sua desigualdade.

Surge então, em 2006, mais uma vitória para as mulheres: a Lei 11.340 que vem trazendo todas as disposições necessárias para que haja um tratamento mais igualitário.

Esta Lei recebeu o nome de Maria da Penha em homenagem à luta de uma mulher que perdeu os movimentos das pernas em função de uma das formas de violência praticadas por seu companheiro.

A partir daí a violência de gênero partiu para uma ampla e merecida análise e concretização de uma vitória às vitimas.

Assim, é preciso trazer a Lei limitada somente ao gênero, eliminando de uma vez toda a banalização e o clamor social por um rigor penal, tornando o ordenamento brasileiro cada dia mais justo e igual.


REFERÊNCIAS

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VENTURI, Gustavo; RECAMEN, Marisol. As mulheres brasileiras no início do século XXI. Fundação Perseu Abramo. Disponível em:

ANEXO A

LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006.

Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.

O PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

TÍTULO I

DISPOSIÇÕES PRELIMINARES

Art. 1o  Esta Lei cria mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8o do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Violência contra a Mulher, da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher e de outros tratados internacionais ratificados pela República Federativa do Brasil; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; e estabelece medidas de assistência e proteção às mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

Art. 2o  Toda mulher, independentemente de classe, raça, etnia, orientação sexual, renda, cultura, nível educacional, idade e religião, goza dos direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sendo-lhe asseguradas as oportunidades e facilidades para viver sem violência, preservar sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual e social.

Art. 3o  Serão asseguradas às mulheres as condições para o exercício efetivo dos direitos à vida, à segurança, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, à moradia, ao acesso à justiça, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

§ 1o  O poder público desenvolverá políticas que visem garantir os direitos humanos das mulheres no âmbito das relações domésticas e familiares no sentido de resguardá-las de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

§ 2o  Cabe à família, à sociedade e ao poder público criar as condições necessárias para o efetivo exercício dos direitos enunciados no caput.

Art. 4o  Na interpretação desta Lei, serão considerados os fins sociais a que ela se destina e, especialmente, as condições peculiares das mulheres em situação de violência doméstica e familiar.

TÍTULO II

DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR CONTRA A MULHER

CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 5o  Para os efeitos desta Lei, configura violência doméstica e familiar contra a mulher qualquer ação ou omissão baseada no gênero que lhe cause morte, lesão, sofrimento físico, sexual ou psicológico e dano moral ou patrimonial:

I - no âmbito da unidade doméstica, compreendida como o espaço de convívio permanente de pessoas, com ou sem vínculo familiar, inclusive as esporadicamente agregadas;

II - no âmbito da família, compreendida como a comunidade formada por indivíduos que são ou se consideram aparentados, unidos por laços naturais, por afinidade ou por vontade expressa;

III - em qualquer relação íntima de afeto, na qual o agressor conviva ou tenha convivido com a ofendida, independentemente de coabitação.

Parágrafo único.  As relações pessoais enunciadas neste artigo independem de orientação sexual.

Art. 6o  A violência doméstica e familiar contra a mulher constitui uma das formas de violação dos direitos humanos.

CAPÍTULO II

DAS FORMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

CONTRA A MULHER

Art. 7o  São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras:

I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal;

II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da auto-estima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação;

III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos;

IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades;

V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.

TÍTULO III

DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR 

CAPÍTULO I

DAS MEDIDAS INTEGRADAS DE PREVENÇÃO

Art. 8o  A política pública que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher far-se-á por meio de um conjunto articulado de ações da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios e de ações não-governamentais, tendo por diretrizes:

I - a integração operacional do Poder Judiciário, do Ministério Público e da Defensoria Pública com as áreas de segurança pública, assistência social, saúde, educação, trabalho e habitação;

II - a promoção de estudos e pesquisas, estatísticas e outras informações relevantes, com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia, concernentes às causas, às conseqüências e à freqüência da violência doméstica e familiar contra a mulher, para a sistematização de dados, a serem unificados nacionalmente, e a avaliação periódica dos resultados das medidas adotadas;

III - o respeito, nos meios de comunicação social, dos valores éticos e sociais da pessoa e da família, de forma a coibir os papéis estereotipados que legitimem ou exacerbem a violência doméstica e familiar, de acordo com o estabelecido no inciso III do art. 1o, no inciso IV do art. 3o e no inciso IV do art. 221 da Constituição Federal;

IV - a implementação de atendimento policial especializado para as mulheres, em particular nas Delegacias de Atendimento à Mulher;

V - a promoção e a realização de campanhas educativas de prevenção da violência doméstica e familiar contra a mulher, voltadas ao público escolar e à sociedade em geral, e a difusão desta Lei e dos instrumentos de proteção aos direitos humanos das mulheres;

VI - a celebração de convênios, protocolos, ajustes, termos ou outros instrumentos de promoção de parceria entre órgãos governamentais ou entre estes e entidades não-governamentais, tendo por objetivo a implementação de programas de erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher;

VII - a capacitação permanente das Polícias Civil e Militar, da Guarda Municipal, do Corpo de Bombeiros e dos profissionais pertencentes aos órgãos e às áreas enunciados no inciso I quanto às questões de gênero e de raça ou etnia;

VIII - a promoção de programas educacionais que disseminem valores éticos de irrestrito respeito à dignidade da pessoa humana com a perspectiva de gênero e de raça ou etnia;

IX - o destaque, nos currículos escolares de todos os níveis de ensino, para os conteúdos relativos aos direitos humanos, à eqüidade de gênero e de raça ou etnia e ao problema da violência doméstica e familiar contra a mulher.

CAPÍTULO II

DA ASSISTÊNCIA À MULHER EM SITUAÇÃO DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR

Art. 9o  A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar será prestada de forma articulada e conforme os princípios e as diretrizes previstos na Lei Orgânica da Assistência Social, no Sistema Único de Saúde, no Sistema Único de Segurança Pública, entre outras normas e políticas públicas de proteção, e emergencialmente quando for o caso.

§ 1o  O juiz determinará, por prazo certo, a inclusão da mulher em situação de violência doméstica e familiar no cadastro de programas assistenciais do governo federal, estadual e municipal.

§ 2o  O juiz assegurará à mulher em situação de violência doméstica e familiar, para preservar sua integridade física e psicológica:

I - acesso prioritário à remoção quando servidora pública, integrante da administração direta ou indireta;

II - manutenção do vínculo trabalhista, quando necessário o afastamento do local de trabalho, por até seis meses.

§ 3o  A assistência à mulher em situação de violência doméstica e familiar compreenderá o acesso aos benefícios decorrentes do desenvolvimento científico e tecnológico, incluindo os serviços de contracepção de emergência, a profilaxia das Doenças Sexualmente Transmissíveis (DST) e da Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e outros procedimentos médicos necessários e cabíveis nos casos de violência sexual.

CAPÍTULO III

DO ATENDIMENTO PELA AUTORIDADE POLICIAL

Art. 10.  Na hipótese da iminência ou da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, a autoridade policial que tomar conhecimento da ocorrência adotará, de imediato, as providências legais cabíveis.

Parágrafo único.  Aplica-se o disposto no caput deste artigo ao descumprimento de medida protetiva de urgência deferida.

Art. 11.  No atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, a autoridade policial deverá, entre outras providências:

I - garantir proteção policial, quando necessário, comunicando de imediato ao Ministério Público e ao Poder Judiciário;

II - encaminhar a ofendida ao hospital ou posto de saúde e ao Instituto Médico Legal;

III - fornecer transporte para a ofendida e seus dependentes para abrigo ou local seguro, quando houver risco de vida;

IV - se necessário, acompanhar a ofendida para assegurar a retirada de seus pertences do local da ocorrência ou do domicílio familiar;

V - informar à ofendida os direitos a ela conferidos nesta Lei e os serviços disponíveis.

Art. 12.  Em todos os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, feito o registro da ocorrência, deverá a autoridade policial adotar, de imediato, os seguintes procedimentos, sem prejuízo daqueles previstos no Código de Processo Penal:

I - ouvir a ofendida, lavrar o boletim de ocorrência e tomar a representação a termo, se apresentada;

II - colher todas as provas que servirem para o esclarecimento do fato e de suas circunstâncias;

III - remeter, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas, expediente apartado ao juiz com o pedido da ofendida, para a concessão de medidas protetivas de urgência;

IV - determinar que se proceda ao exame de corpo de delito da ofendida e requisitar outros exames periciais necessários;

V - ouvir o agressor e as testemunhas;

VI - ordenar a identificação do agressor e fazer juntar aos autos sua folha de antecedentes criminais, indicando a existência de mandado de prisão ou registro de outras ocorrências policiais contra ele;

VII - remeter, no prazo legal, os autos do inquérito policial ao juiz e ao Ministério Público.

§ 1o  O pedido da ofendida será tomado a termo pela autoridade policial e deverá conter:

I - qualificação da ofendida e do agressor;

II - nome e idade dos dependentes;

III - descrição sucinta do fato e das medidas protetivas solicitadas pela ofendida.

§ 2o  A autoridade policial deverá anexar ao documento referido no § 1o o boletim de ocorrência e cópia de todos os documentos disponíveis em posse da ofendida.

§ 3o  Serão admitidos como meios de prova os laudos ou prontuários médicos fornecidos por hospitais e postos de saúde.

TÍTULO IV

DOS PROCEDIMENTOS

 CAPÍTULO I

DISPOSIÇÕES GERAIS

Art. 13.  Ao processo, ao julgamento e à execução das causas cíveis e criminais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher aplicar-se-ão as normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil e da legislação específica relativa à criança, ao adolescente e ao idoso que não conflitarem com o estabelecido nesta Lei.

Art. 14.  Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, órgãos da Justiça Ordinária com competência cível e criminal, poderão ser criados pela União, no Distrito Federal e nos Territórios, e pelos Estados, para o processo, o julgamento e a execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher.

Parágrafo único.  Os atos processuais poderão realizar-se em horário noturno, conforme dispuserem as normas de organização judiciária.

Art. 15.  É competente, por opção da ofendida, para os processos cíveis regidos por esta Lei, o Juizado:

I - do seu domicílio ou de sua residência;

II - do lugar do fato em que se baseou a demanda;

III - do domicílio do agressor.

Art. 16.  Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

Art. 17.  É vedada a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento isolado de multa.

CAPÍTULO II

DAS MEDIDAS PROTETIVAS DE URGÊNCIA

 Seção I

Disposições Gerais

Art. 18.  Recebido o expediente com o pedido da ofendida, caberá ao juiz, no prazo de 48 (quarenta e oito) horas:

I - conhecer do expediente e do pedido e decidir sobre as medidas protetivas de urgência;

II - determinar o encaminhamento da ofendida ao órgão de assistência judiciária, quando for o caso;

III - comunicar ao Ministério Público para que adote as providências cabíveis.

Art. 19.  As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas pelo juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida.

§ 1o  As medidas protetivas de urgência poderão ser concedidas de imediato, independentemente de audiência das partes e de manifestação do Ministério Público, devendo este ser prontamente comunicado.

§ 2o  As medidas protetivas de urgência serão aplicadas isolada ou cumulativamente, e poderão ser substituídas a qualquer tempo por outras de maior eficácia, sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados.

§ 3o  Poderá o juiz, a requerimento do Ministério Público ou a pedido da ofendida, conceder novas medidas protetivas de urgência ou rever aquelas já concedidas, se entender necessário à proteção da ofendida, de seus familiares e de seu patrimônio, ouvido o Ministério Público.

Art. 20.  Em qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, caberá a prisão preventiva do agressor, decretada pelo juiz, de ofício, a requerimento do Ministério Público ou mediante representação da autoridade policial.

Parágrafo único.  O juiz poderá revogar a prisão preventiva se, no curso do processo, verificar a falta de motivo para que subsista, bem como de novo decretá-la, se sobrevierem razões que a justifiquem.

Art. 21.  A ofendida deverá ser notificada dos atos processuais relativos ao agressor, especialmente dos pertinentes ao ingresso e à saída da prisão, sem prejuízo da intimação do advogado constituído ou do defensor público.

Parágrafo único.  A ofendida não poderá entregar intimação ou notificação ao agressor.

Seção II

Das Medidas Protetivas de Urgência que Obrigam o Agressor

Art. 22.  Constatada a prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos desta Lei, o juiz poderá aplicar, de imediato, ao agressor, em conjunto ou separadamente, as seguintes medidas protetivas de urgência, entre outras:

I - suspensão da posse ou restrição do porte de armas, com comunicação ao órgão competente, nos termos da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003;

II - afastamento do lar, domicílio ou local de convivência com a ofendida;

III - proibição de determinadas condutas, entre as quais:

a) aproximação da ofendida, de seus familiares e das testemunhas, fixando o limite mínimo de distância entre estes e o agressor;

b) contato com a ofendida, seus familiares e testemunhas por qualquer meio de comunicação;

c) freqüentação de determinados lugares a fim de preservar a integridade física e psicológica da ofendida;

IV - restrição ou suspensão de visitas aos dependentes menores, ouvida a equipe de atendimento multidisciplinar ou serviço similar;

V - prestação de alimentos provisionais ou provisórios.

§ 1o  As medidas referidas neste artigo não impedem a aplicação de outras previstas na legislação em vigor, sempre que a segurança da ofendida ou as circunstâncias o exigirem, devendo a providência ser comunicada ao Ministério Público.

§ 2o  Na hipótese de aplicação do inciso I, encontrando-se o agressor nas condições mencionadas no caput e incisos do art. 6o da Lei no 10.826, de 22 de dezembro de 2003, o juiz comunicará ao respectivo órgão, corporação ou instituição as medidas protetivas de urgência concedidas e determinará a restrição do porte de armas, ficando o superior imediato do agressor responsável pelo cumprimento da determinação judicial, sob pena de incorrer nos crimes de prevaricação ou de desobediência, conforme o caso.

§ 3o  Para garantir a efetividade das medidas protetivas de urgência, poderá o juiz requisitar, a qualquer momento, auxílio da força policial.

§ 4o  Aplica-se às hipóteses previstas neste artigo, no que couber, o disposto no caput e nos §§ 5o e 6º do art. 461 da Lei no 5.869, de 11 de janeiro de 1973 (Código de Processo Civil).

Seção III

Das Medidas Protetivas de Urgência à Ofendida

Art. 23.  Poderá o juiz, quando necessário, sem prejuízo de outras medidas:

I - encaminhar a ofendida e seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de atendimento;

II - determinar a recondução da ofendida e a de seus dependentes ao respectivo domicílio, após afastamento do agressor;

III - determinar o afastamento da ofendida do lar, sem prejuízo dos direitos relativos a bens, guarda dos filhos e alimentos;

IV - determinar a separação de corpos.

Art. 24.  Para a proteção patrimonial dos bens da sociedade conjugal ou daqueles de propriedade particular da mulher, o juiz poderá determinar, liminarmente, as seguintes medidas, entre outras:

I - restituição de bens indevidamente subtraídos pelo agressor à ofendida;

II - proibição temporária para a celebração de atos e contratos de compra, venda e locação de propriedade em comum, salvo expressa autorização judicial;

III - suspensão das procurações conferidas pela ofendida ao agressor;

IV - prestação de caução provisória, mediante depósito judicial, por perdas e danos materiais decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a ofendida.

Parágrafo único.  Deverá o juiz oficiar ao cartório competente para os fins previstos nos incisos II e III deste artigo.

CAPÍTULO III

DA ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO

Art. 25.  O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher.

Art. 26.  Caberá ao Ministério Público, sem prejuízo de outras atribuições, nos casos de violência doméstica e familiar contra a mulher, quando necessário:

I - requisitar força policial e serviços públicos de saúde, de educação, de assistência social e de segurança, entre outros;

II - fiscalizar os estabelecimentos públicos e particulares de atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar, e adotar, de imediato, as medidas administrativas ou judiciais cabíveis no tocante a quaisquer irregularidades constatadas;

III - cadastrar os casos de violência doméstica e familiar contra a mulher.

CAPÍTULO IV

DA ASSISTÊNCIA JUDICIÁRIA

Art. 27.  Em todos os atos processuais, cíveis e criminais, a mulher em situação de violência doméstica e familiar deverá estar acompanhada de advogado, ressalvado o previsto no art. 19 desta Lei.

Art. 28.  É garantido a toda mulher em situação de violência doméstica e familiar o acesso aos serviços de Defensoria Pública ou de Assistência Judiciária Gratuita, nos termos da lei, em sede policial e judicial, mediante atendimento específico e humanizado.

TÍTULO V

DA EQUIPE DE ATENDIMENTO MULTIDISCIPLINAR

Art. 29.  Os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher que vierem a ser criados poderão contar com uma equipe de atendimento multidisciplinar, a ser integrada por profissionais especializados nas áreas psicossocial, jurídica e de saúde.

Art. 30.  Compete à equipe de atendimento multidisciplinar, entre outras atribuições que lhe forem reservadas pela legislação local, fornecer subsídios por escrito ao juiz, ao Ministério Público e à Defensoria Pública, mediante laudos ou verbalmente em audiência, e desenvolver trabalhos de orientação, encaminhamento, prevenção e outras medidas, voltados para a ofendida, o agressor e os familiares, com especial atenção às crianças e aos adolescentes.

Art. 31.  Quando a complexidade do caso exigir avaliação mais aprofundada, o juiz poderá determinar a manifestação de profissional especializado, mediante a indicação da equipe de atendimento multidisciplinar.

Art. 32.  O Poder Judiciário, na elaboração de sua proposta orçamentária, poderá prever recursos para a criação e manutenção da equipe de atendimento multidisciplinar, nos termos da Lei de Diretrizes Orçamentárias.

TÍTULO VI

DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

Art. 33.  Enquanto não estruturados os Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, as varas criminais acumularão as competências cível e criminal para conhecer e julgar as causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher, observadas as previsões do Título IV desta Lei, subsidiada pela legislação processual pertinente.

Parágrafo único.  Será garantido o direito de preferência, nas varas criminais, para o processo e o julgamento das causas referidas no caput.

TÍTULO VII

DISPOSIÇÕES FINAIS

Art. 34.  A instituição dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher poderá ser acompanhada pela implantação das curadorias necessárias e do serviço de assistência judiciária.

Art. 35.  A União, o Distrito Federal, os Estados e os Municípios poderão criar e promover, no limite das respectivas competências:

I - centros de atendimento integral e multidisciplinar para mulheres e respectivos dependentes em situação de violência doméstica e familiar;

II - casas-abrigos para mulheres e respectivos dependentes menores em situação de violência doméstica e familiar;

III - delegacias, núcleos de defensoria pública, serviços de saúde e centros de perícia médico-legal especializados no atendimento à mulher em situação de violência doméstica e familiar;

IV - programas e campanhas de enfrentamento da violência doméstica e familiar;

V - centros de educação e de reabilitação para os agressores.

Art. 36.  A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios promoverão a adaptação de seus órgãos e de seus programas às diretrizes e aos princípios desta Lei.

Art. 37.  A defesa dos interesses e direitos transindividuais previstos nesta Lei poderá ser exercida, concorrentemente, pelo Ministério Público e por associação de atuação na área, regularmente constituída há pelo menos um ano, nos termos da legislação civil.

Parágrafo único.  O requisito da pré-constituição poderá ser dispensado pelo juiz quando entender que não há outra entidade com representatividade adequada para o ajuizamento da demanda coletiva.

Art. 38.  As estatísticas sobre a violência doméstica e familiar contra a mulher serão incluídas nas bases de dados dos órgãos oficiais do Sistema de Justiça e Segurança a fim de subsidiar o sistema nacional de dados e informações relativo às mulheres.

Parágrafo único.  As Secretarias de Segurança Pública dos Estados e do Distrito Federal poderão remeter suas informações criminais para a base de dados do Ministério da Justiça.

Art. 39.  A União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, no limite de suas competências e nos termos das respectivas leis de diretrizes orçamentárias, poderão estabelecer dotações orçamentárias específicas, em cada exercício financeiro, para a implementação das medidas estabelecidas nesta Lei.

Art. 40.  As obrigações previstas nesta Lei não excluem outras decorrentes dos princípios por ela adotados.

Art. 41.  Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.

Art. 42.  O art. 313 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), passa a vigorar acrescido do seguinte inciso IV:

“Art. 313.  [...]

[...] IV - se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos da lei específica, para garantir a execução das medidas protetivas de urgência.” (NR)

Art. 43.  A alínea f do inciso II do art. 61 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 61. II [...]

[...] f) com abuso de autoridade ou prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade, ou com violência contra a mulher na forma da lei específica;

Art. 44.  O art. 129 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), passa a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 129. [...]

[...] § 9o  Se a lesão for praticada contra ascendente, descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações domésticas, de coabitação ou de hospitalidade:

Pena - detenção, de 3 (três) meses a 3 (três) anos.[...]

[...] § 11.  Na hipótese do § 9o deste artigo, a pena será aumentada de um terço se o crime for cometido contra pessoa portadora de deficiência.” (NR)

Art. 45.  O art. 152 da Lei no 7.210, de 11 de julho de 1984 (Lei de Execução Penal), passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 152.  [...]

[...] Parágrafo único.  Nos casos de violência doméstica contra a mulher, o juiz poderá determinar o comparecimento obrigatório do agressor a programas de recuperação e reeducação.” (NR)

Art. 46.  Esta Lei entra em vigor 45 (quarenta e cinco) dias após sua publicação.

Brasília,  7  de  agosto  de 2006; 185o da Independência e 118o da República.

LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA 
Dilma Rousseff

1 HERMANN, Leda Maria. Maria da Penha – Lei com nome de mulher. Editora Servanda: 2008.

2 HERMANN, 2008.

3 HERMANN, Leda Maria. Maria da Penha – Lei com nome de mulher. Editora Servanda: 2008.

4 HERMANN, 2008.

5 DIAS. Maria Berenice. Manual De Direito Das Famílias. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

6 DIAS, 2010.

7 Ibid., p.112.

8 JESUS, Damásio de. Violência contra mulher. São Paulo: Saraiva, 2010.

9 UNIFEM. Disponível em:

10 KARAM, Maria Lúcia. Violência de gênero: o paradoxal entusiasmo pelo rigor penal. Boletim IBCCrim, nº 168, p.7, Nov. 2006.

11 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis penais e processuais comentadas. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006.

12 SILVEIRA, Renato de Mello Jorge. Tipificação criminal da violência de gênero: paternalismo legal ou moralismo penal. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.14, n.166, p. 7-8, set. 2006

13 JESUS, 2010, p. 14.

14 ORGANIZAÇÃO MUNDIAL DE SAÚDE, Relatório mundial sobre violência e saúde. Genebra, 2002. Disponível em: < http://www.opas.org.br/cedoc/hpp/ml03/0329.pdf> . Acesso em 11 set.2014.

15
JESUS, op. cit., p. 14.

16
JESUS, op. cit., p. 14.

17
CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. A violência doméstica como violação dos Direitos Humanos. Disponível em

18
CAVALCANTI, Stela Valéria Soares de Farias. A violência doméstica como violação dos Direitos Humanos. Disponível em

19
NUCCI, 2006, p. 16.

20
JESUS, op. cit., p. 14.

21
NUCCI, op. cit., p. 16.

22
PIOVESAN, Flávia. Violência contra a mulher: um escândalo! Boletim Agência Carta Maior, 21.06.2005. Disponível em

23

JESUS, op. cit., p. 14.

24

DIAS. Maria Berenice. A Lei Maria Da Penha na Justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2010.

25

Idem. Ibidem.

26

BRASIL, CP [1940]. Código Penal [1940]. Brasília: Senado Federal, 1940. Saraiva, 2013, p.594.

27

MELLO, Adriana Ramos de; PRADO, Geraldo; PINHO, Humberto Dalla Bernardina de; CARVALHO, Luiz Gustavo Grandinetti Castanho de; BATISTA, Nilo. Comentários à Lei de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher. 2ª edição. Rio de Janeiro: Editora Lumen Juris, 2009.

28

FERNANDES, Maria da Penha Maia. Sobrevivi, posso contar. Fortaleza: Editora Armazém da Cultura, 1994.

29

DIAS, op. cit., p. 19.

30

BRASIL, Lei 11.340/2006. Lei Maria da Penha [2006]. Brasília: Senado Federal, 2006. Saraiva, 2013, p.1789.

31

BRASIL, Lei 9.099/1995. Lei dos Juizados Especiais Cíveis e Criminais [1995]. Brasília: Senado Federal, 1995. Saraiva, 2013, p.1591.

32

CAVALCANTI, op. cit., p. 17.

33

BRASIL, Lei 11.340/2006. Lei Maria da Penha [2006]. Brasília: Senado Federal, 2006. Saraiva, 2013, p.1791.

34

BIANCHINI, Alice. Violência doméstica e afastamento preventivo do agressor: alteração trazida pela lei n. 10.455/02. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.10, n.120, p. 9-11, nov. 2002. 

35

KARAM, op. cit., p. 15.

36

BRASIL, Lei 11.340/2006. Lei Maria da Penha [2006]. Brasília: Senado Federal, 2006. Saraiva, 2013, p.1792.

37

BRASIL, Lei 11.340/2006. Lei Maria da Penha [2006]. Brasília: Senado Federal, 2006. Saraiva, 2013, p.1792

3

BRASIL, Lei 11.340/2006. Lei Maria da Penha [2006]. Brasília: Senado Federal, 2006. Saraiva, 2013, p.1792.

39

ALVES, Fabrício da Mota. Lei Maria da Penha: discussões à aprovação de uma proposta concreta de combate à violência doméstica e familiar contra a mulher. Disponível em

40

De acordo com o artigo 10 do Código de Processo Penal, o prazo será de 30 dias.

41

Art. 25. O Ministério Público intervirá, quando não for parte, nas causas cíveis e criminais decorrentes da violência doméstica e familiar contra a mulher.

42

Art. 41.  Aos crimes praticados com violência doméstica e familiar contra a mulher, independentemente da pena prevista, não se aplica a Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995.

43

NOGUEIRA, Fernando Célio de Brito. Notas de reflexão sobre a Lei 11.340/2006, que visa coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Disponível em:

44

Processo CC nº 88.027 - MG

45

KARAM, op. cit., p. 15.

46

KARAM, op. cit., p. 15.

47
CAALCANTI, op. cit., p. 17.

48
KARAM, op. cit., p. 15.

49
DIAS, op. cit., p. 19.

50
Declaração Universal dos Direitos Humanos, adotada e proclamada pela resolução 217 A (III) da  Assembléia Geral das Nações Unidas em 10 de dezembro de 1948.

51
MORAES, Alexandre de. Curso de Direito Constitucional. 13 Ed. São Paulo. Atlas, 2003.

52
AGACINSKI, Sylviane. Política dos Sexos. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1999.

53
MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 25 Ed. São Paulo: Atlas, 2010

54
Idem. Ibidem.

55

BITENCOURT, Cezar Roberto. A abrangência da definição de violência doméstica. Boletim IBCCRIM, São Paulo, ano 17, n. 198, p.8-10, maio 2009

56

BRASIL, Constituição [1988]. Constituição da República Federativa do Brasil [1988]. Brasília: Senado Federal, 1988. Saraiva, 2013, p.134.

57
NUCCI, op. cit., p. 16.

58
MELLO, PRADO, PINHO, CARVALHO, BATISTA, op. cit., p. 20

59
BITENCOURT, loc. cit.

60
Art. 16. Nas ações penais públicas condicionadas à representação da ofendida de que trata esta Lei, só será admitida a renúncia à representação perante o juiz, em audiência especialmente designada com tal finalidade, antes do recebimento da denúncia e ouvido o Ministério Público.

61
KARAM, op. cit., p. 15.

62
DIAS. op. cit., p. 19.

63
BITENCOURT, op. cit., p. 34.

64
SOUZA, João Paulo de Aguiar Sampaio, FONSECA, Tiago Abud da. A aplicação da Lei n 9.099/1995 nos casos de violência doméstica contra a mulher. Boletim IBCCRIM. São Paulo, v.14, n.168, p. 4-5, nov. 2006. 

65
DIAS, op. cit., p. 19.

66
IOB. Instituto. Disponível em:

67

IOB. Instituto. Disponível em

68
Idem. Ibidem.

69
DIAS, op. cit., p. 19.


Publicado por: RAFAEL JONATHAN AYRES

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