TERRORISMO E O ESTADO FUNDAMENTAL DE DIREITO NO BRASIL

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1. RESUMO

O presente trabalho tem por objetivo apresentar questões relacionadas ao terrorismo e o estado fundamental de direito no Brasil. Assim, escrever sobre terrorismo, no Brasil, concentrando o enfoque no estado fundamental do direito, pareceu, claramente, a opção mais indicada para a temática, dada a escassez de livros atualizados e abrangentes sobre a temática em nosso país. Essa desatenção ao tema pareceu preocupante, pois nenhum Estado pode considerar-se a salvo do terrorismo, e entender o fenômeno é o primeiro passo para evitar que atos terroristas sejam praticados e os terroristas, punidos. O estudo está baseado nos ditames das pesquisas bibliográficas, legislativas, onde foram analisadas doutrinas relacionadas ao tema proposto e demais trabalhos relacionados para se conseguir o fim desejado. E, com o estudo concluiu-se que Falta dizer, ainda, que todas as ações humanas destinadas a combater o terrorismo, adotadas pela sociedade civil, pelos governos, por entidades dos mais variados tipos, pelas religiões, pelos partidos políticos e por organizações internacionais, devem ser pautadas pela mais rígida observância aos Direitos Humanos. Certamente, não é torturando ou humilhando terroristas, culpados ou apenas suspeitos, que se impedirá a proliferação do terrorismo. Tratar terroristas a latere do Direito é igualar-se a eles, é renunciar às conquistas morais da civilização, é glorificar a barbárie.

Palavras-Chave: Brasil. Estado Fundamental de Direito. Terrorismo.

ABSTRACT

The present work aims to present issues related to terrorism and the fundamental state of law in Brazil. Thus, writing about terrorism in Brazil, concentrating the focus on the fundamental state of law, seemed clearly the most appropriate option for the subject, given the scarcity of up-to-date and comprehensive books on the subject in our country. This inattention to the topic seemed to be a cause of concern, since no state could consider itself safe from terrorism, and understanding the phenomenon is the first step to prevent terrorist acts being committed and terrorists punished. The study is based on the dictates of bibliographical and legislative research, which analyzed doctrines related to the proposed theme and other related works to achieve the desired end. And the study concluded that it remains to be said that all human actions aimed at combating terrorism, adopted by civil society, governments, various types of entities, religions, political parties and international organizations , Should be guided by the strictest observance of human rights. Certainly, it is not torturing or humiliating terrorists, guilty or just suspects, that will prevent the proliferation of terrorism. To treat terrorists with the law is to equate them, to renounce the moral achievements of civilization, to glorify barbarism.

Keywords: Brazil. Fundamental State of Law. Terrorism.

2. INTRODUÇÃO

Não será jamais suficientemente enfatizado que o terrorismo é um crime abominável, que merece ser chamado pelo nome, jamais glorificado. Mostram-se como estratégia típica de sóciopatas perdedores, frustrados e fracassados, como a História tem reiteradamente demonstrado em inúmeras ocasiões e períodos, cuja única e discutível “glória” seja, talvez, a de ter estampas na mídia às imagens dos atos atrozes cometidos: civis mortos, entre eles crianças com membros dilacerados, prédios destruídos, vias despedaçadas, desespero da população atingida.

Esses atos tornam-se notícias imediatamente, pois são do tipo que agrada ao moderno e cosmopolita jornalista bien pensant, que se julga capaz de traduzir e interpretar fatos complexos com extraordinária velocidade, o que gera inevitáveis distorções, a começar pelo conteúdo da “mensagem” enviada pelos terroristas.

Contudo, talvez sempre continuemos a encontrar, até mesmo no meio acadêmico, surpreendentemente, outro idiot savant, disposto a proclamar que o terrorismo é uma “estratégia de sucesso”.

Nada mais falso e distante da realidade.

O que desejam os atuais terroristas é mudar os sistemas democráticos por meio da força e da violência, sempre dirigidos indiscriminadamente contra civis inocentes. Aparecer na mídia, portanto, é mero reflexo da brutalidade de suas ações, jamais seu objetivo primordial, e não constitui, por certo, a medida do “sucesso” que almejam. E mudar sistemas por meio de atos terroristas, prova-o a História, jamais foi conseguido, em época alguma. Que “sucesso” é essa coleção de fracassos?

O mundo, hoje, defronta-se, agora, com um inimigo que se esconde insidiosamente na multidão, se infiltra em nossa sociedade, lança mão dos vastos recursos tecnológicos de que o mundo dispõe e zomba de nossa democracia e dos Direitos Civis e Políticos que vimos construindo a duras penas, há alguns séculos. Esse inimigo tem nome, mas não tem pátria, nem tem rosto: terrorista.

Assim, escrever sobre terrorismo, no Brasil, concentrando o enfoque no estado fundamental do direito, pareceu, claramente, a opção mais indicada para a temática, dada a escassez de livros atualizados e abrangentes sobre a temática em nosso país. Essa desatenção ao tema parece preocupante, pois nenhum Estado pode considerar-se a salvo do terrorismo, e entender o fenômeno é o primeiro passo para evitar que atos terroristas sejam praticados e os terroristas, punidos.

O objetivo geral do estudo a que me propus é escrever sobre o terrorismo de forma geral e abordar o Brasil e o estado fundamental de direito. Isso, embora o estudo claramente não se esgote, dado que as organizações terroristas não dão sinais de que pretendam reduzir suas atividades.

O estudo está baseado nos ditames das pesquisas bibliográficas, legislativas, onde foram analisadas doutrinas relacionadas ao tema proposto e demais trabalhos relacionados para se conseguir o fim desejado.

O trabalho está estruturado em uma introdução, que expõe o que será abordado durante o estudo, e mais 4 capítulos. O primeiro capítulo aborda sobre o terrorismo e suas definições; O segundo capítulo discorre sobre a jurisdição do que se refere ao terrorismo; O terceiro capítulo fala acerca das considerações sobre o tratamento interno do terrorismo; O quarto capítulo discorre sobre o Brasil e o terrorismo. E, por fim, as conclusões e referencias do estudo.

3. TERRORISMO E SUAS DEFINIÇÕES

O termo terrorismo possui inúmeras interpretações. Porém, em grosso modo uma definição talvez mais coerente no que viria a ser “terrorismo” poderia ser considerada a conceituação dada pela Organização das Nações Unidas: O terrorismo é “ato criminoso pretendido ou calculado para provocar um estado de terror no público em geral, num grupo de pessoas ou em indivíduos para fins políticos são injustificáveis em qualquer circunstância, independentemente das considerações de ordem política, filosófica, ideológica, racial, étnica, religiosa ou de qualquer outra natureza que possam ser invocadas para justificá-los.”.

Logo, de acordo com a conceituação acima, para que se possam diferenciar ações violentas de ações terroristas é preciso que o ato seja analisado dentro de uma observação geral em que tal ação ocorreu. Outro ponto importante a ser considerado é que terroristas não agem pensando simplesmente em atingir diretamente seus alvos, pois, se conseguir matar um grupo de pessoas não vai fazer tanta diferença.

O predominar da ideia terrorista está na ideia da ação ser impactante o suficiente para mobilizar o resto da sociedade, a imprensa, os órgãos governamentais, as redes sociais, etc. Assim, acontece um promover desses atos para outros terroristas que conseguem dessa forma a atenção para suas causas políticas, que em grande maioria, são radicais.

Algumas características comuns que permeiam um ato terrorista são a premeditação, fim político, vítimas são civis. Os atos terroristas são sempre planejados com antecedência, pois precisam ser precisos no que irão atingir e sempre procuram um efeito no campo político, pois na maioria das vezes querem que os governantes façam ou deixem de fazer algo. Já que não acontecem em campos de batalha, se pode concluir que os atos terrorismas sempre terão como vítimas os civis e em lugares de grande circulação como: shoppings, aeroportos, prédios, etc. Os terroristas são grupos clandestinos, sem reconhecimento e muito menos respaldo legal. O ato sempre é para aterrorizar a sociedade e convencer outros grupos a aderirem suas causas.

Em 1934, um atentado vitimou o estadista francês Jean-Louis Barthou (1862-1934), Presidente do Conselho da República Francesa, e o Rei Alexandre I da Iugoslávia, provocando a realização, entre 1º e 16/11/1937, sob os auspícios da Sociedade das Nações, da Conferência Internacional para a Repressão do Terrorismo, ao final da qual foi concluído o primeiro instrumento jurídico que considerava o terrorismo como crime internacional, a Convenção para a Prevenção e Punição do Terrorismo, que, no entendo, não chegou a entrar em vigor, tendo sido ratificada apenas pela Índia.

Essa primeira convenção internacional sobre o terrorismo dispunha que, para a dita convenção, “atos de terrorismo” são “atos criminosos dirigidos contra um Estado cujo objetivo ou natureza é a de provocar um estado de terror em determinadas personalidades, em grupos de pessoas, ou no público em geral” (Artigo 1.2). A Convenção para a Prevenção e a Punição do Terrorismo não definia, pois, “terrorismo”, e sim atos de terrorismo e os enumerava no Artigo 2 como sendo os seguintes:

1 Fatos internacionais que tenham por finalidade atingir a vida, a integridade corporal, a saúde ou a liberdade de: Chefes de Estado, pessoas que exerçam prerrogativas de Chefe de Estado, de seus sucessores hereditários ou designados; Cônjuges das pessoas enumeradas acima; Pessoas encarregadas de funções públicas ou que ocupem cargos públicos quando o fato for praticado contra eles em razão das funções ou cargos que exerçam.

2 O fato internacional que consiste em destruir ou causar dano a bens públicos ou destinados a finalidades públicas que pertençam a outra Alta Parte Contratante ou que estejam sujeitos à sua autoridade.

3 O fato internacional de colocar em risco vidas humanas para a criação de um perigo comum.

4 A tentativa de cometer as violações previstas nos dispositivos precedentes do presente Artigo.

5 A fabricação, obtenção, detenção ou fornecimento de armas, munições, produtos explosivos ou substâncias nocivas visando à prática, em qualquer país, das duas condutas previstas no presente Artigo.

Nessa mesma conferência, conclui-se uma Convenção para o Estabelecimento de um Tribunal Penal Internacional, a qual, até 31/05/1938, contava com treze Altas Partes Contratantes. O Tribunal Penal Internacional que pretendeu criar, destinava-se a julgar pessoas acusadas apenas das condutas descritas na Convenção para a Preservação e a Punição do Terrorismo (Artigo 1).

Devido a questões políticas, nenhuma dessas convenções, como se sabe, chegou a entrar em vigor internacionalmente, mas é inegável que apresentam extraordinário interesse histórico e jurídico, como marcos do esforço codificador da matéria. Intuía-se, já na época, a internacionalização dos delitos, o que é revelado, por exemplo, pelo exame do Preâmbulo da Convenção que criava o Tribunal Internacional, que declarava: “Um tribunal penal internacional com vista a progredir na luta contra as infrações de carácter internacional”.

Atualmente, decorridas sete décadas da conclusão dessas convenções, o forte conteúdo político do termo ainda prevalece sobre seu significado jurídico. Uma vez que o significado político é rapidamente mutante, recorde-se que o Teleban e Osama bin-Laden eram, na época da dominação soviética do Afeganistão, denominados mujabedin (combatentes pela liberdade), a opinião dos Estados sobre o que deve conter a definição também está sujeita às mudanças na política internacional.

3.1. TIPOS DE TERRORISMO

Existem algumas diferentes entre tipos de terrorismo que são: terrorismo indiscriminado, terrorismo seletivo, terrorismo de estado e o terrorismo comunal. A diferença básica entre esses quatro tipos de terrorismo se encontra em seu alvo, no que se quer ou quem se quer alcançar.

No terrorismo indiscriminado, o alvo não é pensado, o ato acontece simplesmente pela necessidade de uma revolta e de serem realizadas ações violentas contra a sociedade para chamar atenção do governo e causar terror. Exemplos: bombas em locais públicos.

O terrorismo seletivo, como o próprio nome sugere, há um foco na ação, ou seja, existe uma especificidade. As ações são focadas em torturas psicológicas, chantagens, etc.

O terrorismo de estado é denominado o terrorismo que “vem de cima”. Ou seja, vem do próprio Estado.

O terrorismo comunal ou comunitário é coletivo. “Vem de baixo”, da sociedade, isso sem o apoio do Estado e/ou autoridades e quase sempre são atos de manifestações e atentados que causam muita desordem.

No próximo tópico será abordado o Terrorismo de Estado, haja vista que é um dos focos desse estudo de grande relevância para se compreender o terrorismo e o estado fundamental de direito no Brasil.

3.2. TERRORISMO DE ESTADO

O terrorismo de Estado é considerado o ato mais antigo da era moderna. Seu Início se deu na época da França revolucionária, no momento em que o Estado usou métodos violentos para coagir os cidadãos, quando se viu ameaçado pelo movimento dos “insurgentes”, como o objetivo de proteger a maquina Estatal. É possível perceber neste período que os atos usados por meio a força são voltados contra civis, o que caracteriza a mudança do entendimento quando é o Estado que usa dessa força, e não uma facção terrorista.

De acordo Celso Duvivier Albuquerque Mello (1999, p.76): “As ações terroristas cometidas pelo Estado, geralmente se dão em ditaduras militares o que torna o Estado radicalmente opressor e violento contra aqueles que vão de contra a ditadura e a favor da democracia.”. Logo, pode-se perceber que o terrorismo pode ser tanto do Governo quanto dos que contestam o governo.

Quando o Estado deseja em algum momento impor ao povo uma determinada conduta que a luz do governo é o melhor para o Estado, utiliza-se de praticas terroristas, sendo elas físicas, psicológicas, midiáticas e educacionais entre outras contra a população. Podem-se destacar alguns exemplos de terrorismo de Estado, como: Os Estados totalitários fascistas e nazistas e a ditadura militar no Brasil.

A prática terrorista foi usada pelos revolucionários russos na luta contra os czares. Naquela época, conforme nos relata Sarah Pellet, "o terrorismo era então utilizado por agrupamentos políticos como um meio de ação cujo objetivo era derrubar o poder vigente em um determinado país." (BRANT, 2003, p.11), restringindo-se então ao Ordenamento Jurídico Interno.

A ditadura militar ocorrida no Brasil, através do golpe militar em 1964, mesmo sendo extremamente violenta e terrorista, não reproduziu as chacinas que foram executadas através dos regimes totalitários nazistas e soviéticos. Porém, não justifica e tampouco absolve os fatos criminosos cometidos contra a população. No final do ano de 1960, surgiu uma organização, grupos militares que se reuniam para executar, assassinar opositores políticos da época, criminosos e todo e qualquer outro que ameaçasse o poder do regime militar Brasileiro.

No Brasil, o golpe militar propagava terror e medo na população, em razão da utilização da tortura, o desaparecimento súbito e forçado dos oposicionistas, os assassinatos repentinos, exílios, entre outros, como métodos de intervenção a qualquer tipo de manifestação contra o governo da época. Os esquadrões da morte foram o principal mecanismo de proliferação do terror através da polícia brasileira. Segundo Huggins:

O quinto Ato Institucional do governo militar respondeu a seus critérios políticos concedendo amplos poderes ao seu próprio Executivo, inclusive o poder de declarar unilateralmente o estado de sítio. A censura à imprensa ampliou-se enormemente, o Congresso foi fechado, todas as garantias constitucionais e individuais foram suspensas - inclusive o habeas corpus - e as detenções foram permitidas sem qualquer mandato ou acusação formal. Os crimes políticos deveriam ser julgados por tribunais militares e suprimiam-se os direitos eleitorais por crimes políticos; as propriedades desses “criminosos” deviam ser confiscadas. (HUGGINS, 1998, p. 74).

Todo Estado, mesmo os mais criminoso, estabeleceu-se sobre a estrutura de uma organização jurídica. Assim, pode-se invalidar a falsa presunção de que a lei afasta o arbítrio, os abusos, os crimes e a violência indiscriminada por parte do Estado. Esta prevista divergência entre lei e violência é improcedente, principalmente para o Estado de direito. Nas palavras de Poulantzas:

É o Estado de direito, o Estado da lei por excelência que detém, ao contrário dos Estados pré-capitalistas, o monopólio da violência e do terror supremo, o monopólio da guerra (...) e mais: a lei organiza as leis de funcionamento da repressão física, designa e gradua as modalidades, enquadra os dispositivos que a exercem. A lei é, neste sentido, o código da violência pública organizada. (POULANTZAS, 1978, p. 45).

Por tanto, é importante deixar de forma proeminente que estado tem a violência como parte integrante e é através dela que surge a possibilidade de manipular partindo do pressuposto que a legitimação a transforma em algo típico e comum. O Estado não atua apenas por meio da violência física, mas também por meio da violência simbólica, o que modifica o discurso em relação a proteção dos cidadãos em justificativa para a utilização, através do aparelho repressivo do Estado, da violência física contra cidadãos.

No Brasil, há exemplos de terrorismo de Estado, como o massacre do Carandiru, que ocorreu em 02 de outubro de 1992, onde, para conter uma rebelião se fez necessário uma intervenção da polícia militar de São Paulo. Segundo os veículos de informações da época, este ato causou a morte de 111 detentos. É notório, aqui, o ato terrorista cometido pelo Estado, através de seus excessos e destituição de tecnologia e disciplina. Outro exemplo de terrorismo de Estado, pode ser citado. É o caso da rebelião ocorrida no complexo penitenciário Anísio Jobim, em Manaus, onde pôde-se ver o resultado de inúmeras mortes de detentos. Neste exemplo, pode-se perceber uma modalidade de terrorismo de Estado: terrorismo de Estado por omissão. Situação em que o Estado não age de forma alguma para cessar os ato ali acontecidos. Passado o fato, o Presidente Michel Temer, em uma reunião com Ministros sobre segurança pública, disse que o acontecido ali foi "um acidente pavoroso". O que na prática mostra-se a omissão do Estado. Será que enquanto sociedade, nós, brasileiros, falhamos?

3.3. TERRORISMO CLÁSSICO

Durante A Baixa Idade Média, na Europa Ocidental, as guerras ocorriam com a observância de determinados rituais, baseados na ideia de certo código de ética ideal, nem sempre respeitado, mas frequentemente invocado.

As guerras tinham efeito limitado aos Estados e a seus soberanos, e a população civil era muito pouco atingida diretamente. Os exércitos, na maioria privados, eram de tamanho reduzido, sendo financiados pelos habitantes dos burgos por meio de tributos. Isso não quer dizer que não ocorressem certos fatos típicos das guerras, que datam de tempos imemoriais, como pilhagem e os períodos de escassez de alimentos. Na época, no entanto, os civis não eram especialmente visados e, uma vez que suas vidas valiam pouquíssimo, e a população era majoritariamente rural, não constituíam alvos militares.

Os eventos que alteraram essas características eram dotados de cunho religioso: a Reforma e a Contra Reforma. A partir de então, no século XV, a guerra ganhou uma dimensão moral, que tem origem na ética protestante e na cultura humanista. Uma das alterações mais profundas é a de que as populações civis tornaram-se alvos das hostilidades, frequentes entre os católicos e protestantes, que se sucediam na Europa.

Essas guerras religiosas nada tinham de “cavalheirescas”, como as do período anterior, tanto pela violência quanto pela falta de diferenciação entre combatentes e civis, que tornava ambos os alvos de ações armadas. Valia à máxima cujus régio, cujos religio (= a religião do príncipe é a religião do povo).

Em 1579 e 1586, Alexandre Farnese, governador dos Países Baixos, praticava a chamada “estratégia de acessórios” que consistia em uma série de ataques e cidades rebeldes, seguida da destruição dos campos e das colheitas, com a finalidade de limitar o aprovisionamento das urbes. (EL KENZ, 2003, p. 20)

As batalhas passaram a ser muito mais frequentes, ocorrendo em inúmeros lugares, mas cada uma de envergadura menor, pois interessava capturar os inimigos nas estradas e queimar-lhes as colheitas. Além disso, campanhas militares eram dispendiosas e os exércitos pequenos, o que fazia com que o custo de cada uma delas fosse inversamente proporcional ao número de intervenções armadas. (CHALIAND, 2004, p. 87-101)

A violência tornou-se comum, não se respeitando nem mesmo a chamada “trégua invernal”, passando o massacre de populações a ser considerada arma estratégica: em 1562, por exemplo, François de Beaumont cometeu “quatre mille meurtres de sang-froid, durante a campanha que empreendeu na região da Provence, a fim de aniquilar todo e qualquer foco de resistência.

A Guerra dos Trinta anos (1618-1648) simbolizou a continuidade do estilo das hostilidades das guerras de religião (que passaram a não mais existir como tais), que revelam a realidade política de então, e que consiste no desafio da hegemonia do Santo Império Romano-Germânico, representado pelas vontades dos soberanos da França e da Suécia, ensanguentando a Alemanha com violenta guerra civil.

Nesse conflito, a população alemã, que contava com cerca de 20 milhões de habitantes, reduziram-se de 50 a 60%, no período. Os civis foram vítimas diretas dos exércitos regulares e também dos bandos armados de mercenários particulares, bem como vítimas indiretas das epidemias, da fome e dos deslocamentos maciços das populações. Foram, sobretudo, vítimas de campanhas de terror planejadas pelos exércitos, com finalidades estratégicas, à semelhança das forças de Tamerlão.

A Paz de Westfália, da qual resultaram os tratados de Munster e de Osnabruck, considerados dois dos mais importantes acordos de paz de todos os tempos, encerrou a guerra dos Trinta Anos, embora não tenha pacificado completamente a Europa, apesar de ter instaurado o “Concerto Europeu”, que assegurou relativo equilíbrio nas relações entre as potencias do continente. Uma das principais preocupações dos signatários desses tratados era evitar a violência e o terror das guerras, bem como proteger civis, podendo vislumbrar-se, nesses instrumentos, o embrião daquilo que, mais tarde, viria a ser designado por “Direitos Humanos” e “Direito Humanitário”.

Com efeito, a Paz de Westfália assinala o início de um período no qual cessaram as guerras de religião e as campanhas de terror que as acompanhavam. Essas campanhas de terror viriam a ressurgir apenas em 1789, agora em outra dimensão, já não mais como ferramenta secundária do aparelho militar, mas como instrumento fundamental da política e do aparelho do Estado Moderno. A revolução Francesa é apontada como a origem do terror moderno, pois, com ela, nasceu à palavra “terrorismo”.

Uma visão ampla das manifestações do terrorismo ao longo da História evidencia a existência de profundas diferenças entre os tipos de atos praticados e os objetivos dos terroristas “tradicionais”, em comparação com os modernos terroristas. O quadro a seguir aponta algumas dessas diferenças.

Quadro 1 – Principais diferenças entre o terrorismo clássico e o moderno

Características quanto a...

Terrorismo “clássico”

Terrorismo “moderno”

Espaço da prática dos atos

Local, regional.

Transnacional, global.

Vítimas

Determinadas pela relação percebida com o status quo que pretendiam mudar.

Aleatórias, sem relação direta com o status quo.

Armamento

Armas brancas, pistolas, bombas (a partir do século XIX).

Bombas potentes, armas de destruição em massa, aviões.

Ideologia

Anarquistas, românticos

Fundamentalistas, racionais.

Local de atentados

Em regra, não relevante (em praça pública ou no interior de edifícios).

Sempre de grande importância simbólica (World Trade Center, Pentágono, estações movimentadas de trem ou metrô).

Recursos financeiros

Escassos.

Relativamente abundantes.

Fonte: O autor, 2016.

3.4. CONFLITO DE 4º GRAU

O “Conflito de 4ª Geração” torna-se visível entre estrategistas e planejadores militares internacionais, ao final da década de 1980, com o objetivo de caracterizar a dinâmica e a orientação geral de como fazer a guerra no futuro. Essa comunidade compartimentou a evolução dos conflitos armados, a partir do Século XVII, em quatro fases distintas.

Na “1ª Geração” (a partir da “Paz de Westphalia”, acordo firmado em 1648, que propiciou o nascimento das relações internacionais entre Estados soberanos), a guerra caracterizou-se pelo emprego preponderante do “Princípio da Massa” e teve seu clímax nas épicas campanhas napoleônicas. O emprego intensivo do “Fogo” caracterizou a “2ª Geração”, que culminou na Primeira Guerra Mundial. A “3ª Geração” foi dominada pela “Manobra”, perfeitamente caracterizada pela “blitzkrieg”, tática brilhantemente desenvolvida pelos alemães na Segunda Guerra Mundial. Ressalte-se que os atores protagonistas nos diferentes cenários de 1ª, 2ª e 3ª Gerações eram, predominantemente, estados nacionais.

A “4ª Geração” resulta de uma evolução que visa tirar vantagem das mudanças política, social, econômica e tecnológica vivenciadas desde a Segunda Guerra Mundial. Junto aos estados nacionais, aparecem como novos atores protagonistas, organizações não estatais armadas, forças irregulares de diferentes matizes: separatistas, anarquistas, extremistas políticos, étnicos ou religiosos, crime organizado e outras, cuja principal forma de atuação se baseia nas táticas, técnicas e procedimentos da guerra irregular.

Fundamentalmente, utilizam-se das vantagens que essas mudanças possam proporcionar a essas forças, independentemente de suas diversificadas motivações político-ideológicas, estruturas organizacionais, nível de apoio da população local, nível de capacitação militar e eventual suporte externo. Proliferou, particularmente, por ocasião do auge da Guerra Fria, quando a ameaça do holocausto nuclear consequente da confrontação entre os Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) ameaçava o mundo.

Mao Tse Tung foi o pioneiro no emprego muito bem sucedido desse modelo de insurreição como instrumento de luta político-ideológica. Desde então, outros notórios revolucionários empenharam-se nessa trajetória, com base em lições aprendidas, não raro, no contexto de dolorosos e dramáticos processos de ensaio e erro.

A opinião pública internacional, de uma maneira geral, está ciente que o Conflito de 4ª Geração é a única modalidade em que os EUA foram batidos. E, mesmo considerando as significativas diferenças existentes entre cada crise, há que se ter em mente que não foi numa única oportunidade, foi em três: Vietnam, Líbano e Somália. Essa forma de fazer a guerra também derrotou os franceses na Indochina e os russos no Afeganistão. Na atualidade, continua “sangrando” a Rússia, na Chechênia e os EUA, no Afeganistão e no Iraque.

A constatação de que estados nacionais poderosos, sobretudo, no que se refere à sua capacitação militar, vivenciaram dramáticas derrotas em diferentes partes do globo, constitui-se, hoje, na maior motivação de grupos e facções radicais de diferentes matizes que adotaram a subversão, a guerrilha e o terrorismo como pilares básicos dessa forma diferenciados de fazer a guerra.

Desde o término da Segunda Guerra Mundial, em diferentes partes do mundo, eclodiram alguns poucos conflitos armados convencionais e uma significativa quantidade de guerras irregulares. A Guerra da Coréia; os conflitos armados árabe-israelenses de 1956, 1967 e 1973; a Guerra das Malvinas; a Guerra Irã – Iraque e a Primeira Guerra do Golfo foram os convencionais.

Em contraste com estes, eclodiram, nos cinco continentes, um grande número de sangrentos conflitos caracterizados pelo emprego intensivo de forças irregulares. Dentre outros, destacam-se: a Revolução Comunista na China; a Primeira e Segunda Guerra na Indochina; a Guerra de Independência na Argélia; e a Guerra Afegão-Soviética nos anos 80. Conflitos armados caracterizados pela assimetria entre os oponentes e que continuaram a ser desencadeados mesmo após o término da Guerra Fria, como é o caso do conflito étnico-religioso nos Bálcãs que desmembrou a antiga Iugoslávia; a Primeira Intifada, na Palestina; a Primeira Guerra (2000) e, mais recentemente (2006), Segunda Guerra do Líbano, sangrento conflito armado entre as Forças de Defesa de Israel e o Hezbollah, no sul daquele País.

Na própria América Latina, o Conflito de 4ª Geração se fez presente num grande número de países que vivenciou trágicas experiências revolucionárias de motivação predominantemente marxista-leninista. Os “Montoneros” na Argentina, os “Tupamaros” no Uruguai, o “Sendero Luminoso” no Peru, e a guerra civil na Colômbia são alguns marcantes exemplos. Nem mesmo o Brasil, País em que a luta armada motivada pelo radicalismo ideológico jamais recebeu o apoio da população, escapou dessa confrontação.

O resultado cumulativo de todas essas experiências, fundamentadas num amplo repertório de táticas, técnicas e procedimentos de guerra irregular, foi o acentuado aprimoramento de uma nova forma de fazer a guerra.

Hoje, em diferentes Teatros de Operações, tais como no Afeganistão, na Chechênia, no Iraque, na Palestina, no Líbano, no Kosovo, nas Filipinas e na Colômbia, forças irregulares de diferentes matizes, tais como o Movimento Talibã, a Frente Separatista Chechena, as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), a Frente de Libertação Abu Sayaf, o Hamas, o Hezbollah e, sobretudo, a Al Qaeda, de Osama Bin Laden, são os atuais agentes dessas táticas, técnicas e procedimentos que, na realidade, estão sendo desenvolvidos há várias décadas, ratificando que a guerra irregular se tornou um dos instrumentos mais eficientes e eficazes na consecução de transformações radicais, quer sejam elas de cunho político-ideológico, étnico ou religioso.

Transformações essas que, na atualidade, são os fatores de motivação preponderantes dos conflitos assimétricos caracterizados pela confrontação armada entre forças militares regulares estabelecidas, cuja capacitação militar é incontestavelmente superior, e forças irregulares de diferentes matizes e níveis de capacitação militar. Inequivocamente, o Conflito de 4ª Geração se apresenta como o conflito armado do Século XXI.

4. JURISDIÇÃO SOBRE O TERRORISMO

O artigo 5 da declaração Universal dos direitos do Homem estabelece que “ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante”. E o artigo 7 do Pacto Internacional sobre Direitos Econômicos, Sociais e Culturais, de 16/12/1996, assegura “uma existência decente para os trabalhadores e para as suas famílias”.

A resolução 3.074 (XXVIII), de 03/12/1973, da Assembleia Geral, estabeleceu os princípios para a cooperação internacional na detecção, prisão, extradição e punção de pessoas culpadas de crimes de guerra e crimes contra a Humanidade.

Outra resolução da Assembleia Geral, 3.452, de 09/12/1975, proclamou o desejo de tornar mais efetiva a luta contra a tortura em todo o mundo.

Os direitos fundamentais dos indivíduos, que derivam da dignidade inerente da pessoa humana, tornaram-se, a partir de então, lugar comum no Direito Internacional, e o Artigo 55 da Carta da ONU passou a ser considerada norma cogente, impondo a todos os Estados obrigatoriedade de promover o respeito universal pela observância dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais.

A partir da década de 1970, a tendência já parece ser clara: os crimes de guerra passaram a ser substituídos pelos crimes contra a Humanidade, e a forma pela qual os governantes tratam seus próprios cidadãos nos limites territoriais de seus Estados, torna-se questão da mais legítima preocupação por parte da comunidade internacional.

Os crimes mais graves contra a Humanidade são o genocídio e a tortura, cujo uso sistemático, associado ao assassinato em larga escala, de opositores a certos regimes, com finalidades políticas, passou a ser encarado como afronta à ordem jurídica internacional.

O genocídio foi objeto da Convenção para a Prevenção e a Repressão do Crime de Genocídio, concluída em Nova Iorque em 1948 e a tortura foi objeto de três instrumentos internacionais, um deles, universal, e dois, regionais:

  1. A Convenção contra a Tortura e outras Penas ou Tratamentos Cruéis, Desumanos ou Degradantes (Nova Iorque, 1984) e seu Protocolo opcional, de 2002;

  2. A Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura (Cartagena das Índias, 1985); e

  3. A Convenção Europeia para a Prevenção da Tortura e das Penas ou Tratamentos Desumanos ou Degradantes (ESTRASBURGO, 1984)

4.1. LEGISLAÇÃO NACIONAL AUTORIZANDO A ADOÇÃO DO CONCEITO DE JURISDIÇÃO UNIVERSAL PARA CRIMES INTERNACIONAIS

De acordo com informação veiculada pela organização não governamental Amnesty International, incluindo dados fornecidos por ontra ONG internacional, a Redress, alguns Estados possuem leis que permitem aos respectivos judiciários o exercício da jurisdição universal a respeito de uma série de crimes internacionais, em especial quando incluem violações a Direitos Humanos.

Crimes contra a Humanidade, crimes de guerra e outros crimes internacionais, tais como tortura e desaparecimento forçado são de jurisdição universal para esses Estados. Muitos deles celebram tratados para julgar ou extraditar pessoas suspeitas de tais crimes, que se tornam parte da legislação nacional.

Além disso, uma série de decisões judiciais tem evidenciado a aceitação, por parte de tribunais nacionais, da ampliação do conceito de jurisdição universal, especialmente após a criação do Tribunal Penal Internacional para a ex-Iugoslávia, em 1993, e do Tribunal Internacional para Ruanda, em 1994.

Ainda mais recentemente, alguns tribunais nacionais passaram a considerar-se competentes para julgar atos praticados em outros Estados, como os crimes contra a Humanidade e tortura.

Entre esses Estados, a Anistia Internacional e outros documentos de entidades de defesa dos Direitos Humanos destacam, especialmente, os países: Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Bolívia, Canadá, Chile, Colombia, Costa Rica, Dinamarca, El Salvador, Equador, Espanha, França, Guatemala, Holanda, Honduras, Israel, México, Nicarágua, Noruega, Panamá, Peru, Ruanda, Suécia, Suíça, Uruguai, Venezuela e por fim, deixa-se o país no qual é objeto desse estudo, o Brasil.

O Código Penal Brasileiro (Artigo 7) dispõe que os tribunais nacionais são competentes para julgar: crimes de genocídio, quando o agente for brasileiro ou domiciliado no Brasil (inc.I, “d”); crimes que, por tratado, o Brasil se obrigou a reprimir (inc. II, “a”).

4.2. TERRORISMO E A JURISDIÇÃO UNIVERSAL

Parece não haver dúvidas de que, para certos crimes internacionais como: pirataria, tortura, crimes de guerra, crimes contra a Humanidade e genocídio, pode ser invocada sem maiores dificuldades a tese da jurisdição universal.

No entanto, para o terrorismo, não parece claro, ainda, nem na doutrina nem na jurisprudência (que, ademais é escassa) que se possa, inquestionavelmente, adotar os mesmos parâmetros aceitos para os demais crimes internacionais.

É certo que grande parte dos tratados internacionais que tem por objeto atos associados ou conexos ao terrorismo, como a tomada de reféns, o sequestro de aeronaves ou o emprego de bombas, prevê um mecanismo de julgamento por parte de mais de um Estado, refletindo na máxima do aut dedere aut iudicare.

Quanto à jurisdição internacional do TPI, ainda que completar às dos Estados, supondo que, um dia, possa ser autorizado a julgar o crime de terrorismo, a questão não é pacífica, sendo questionada na doutrina se esta não violaria a “constituição global”, representada pelo princípio da igualdade entre os Estados. (CASEY, 2003)

Uma possível solução seria aproximar os atos de terrorismo do crime de genocídio ou de crime contra a Humanidade, para o efeito de dotar tribunais da necessária jurisdição universal para processar e julgar terroristas.

Com efeito, se para o Tribunal Penal Internacional, genocídio é tipificado como “qualquer dos atos mencionados” no artigo 6 do Estatuto e, dentre esses atos, “praticados com a intenção de destruir total ou parcialmente um grupo nacional” encontram-se os de “matar membros do grupo” e “causar lesões graves à integridade física ou mental de membros do grupo”, certo que atos de terrorismo causam esses efeitos.

Em relação aos crimes contra a Humanidade, assim considerados como qualquer dos atos enumerados no artigo 7, “quando praticados como parte de um ataque generalizado ou sistemático contra uma população civil e com conhecimento de tal ataque”, dentre os quais, “homicídio”, “perseguição de um grupo ou coletividade com identidade própria, fundada em motivos políticos...” ou “outros motivos universalmente reconhecidos como inaceitáveis conforme o direito internacional” e “outros atos desumanos de caráter similar que causem internacionalmente grande sofrimento ou atentem gravemente contra a integridade física ou a saúde mental ou física”, não parece haver dúvidas acerca da similaridade entre as condutas descritas e atos de terrorismo.

Ademais, se considerarmos que a expressão “ataque contra uma população civil deve ser entendida como “uma linha de conduta que implique a perpetração múltipla dos atos mencionados no § 1º contra uma população civil, em consonância com a política de um Estado ou de uma organização para cometer tais atos ou para promover tal política”; e por “perseguição” entende-se a privação intencional e grave de direitos fundamentais, em violação ao direito internacional, em razão da identidade do grupo ou coletividade”, parece difícil deixar de sucumbir à tentação de aplicar o Estatuto do TPI a terroristas.

Esse parece um caminho relativamente fácil de ser trilhado, conforme sugere James D. Fry (2001). Contudo, à parte a questão de, ao fazê-lo deixar de tratar o terrorismo como crime internacional autônomo, enquadrando-o imprecisamente em outras categorias, que possuem peculiaridades próprias, inclusive em termos do contexto sócio-político em que são cometidos o genocídio e os crimes contra a Humanidade, conduzirá a um enfraquecimento das aplicações das inúmeras convenções internacionais incluídas e resoluções adotadas no seio da ONU nos últimos 40 anos e que impõem aos Estados-parte a criminalização das condutas em seus respectivos ordenamentos jurídicos internos, além da obrigatoriedade da cooperação entre as nações no combate ao terrorismo.

Como afirma Pierre-Marie Dupuy:

No estado atual da evolução do Direito Internacional, constata-se a ausência de uma norma resolução de conflitos de jurisdição que seria integrada ao Direito Internacional geral. As tentativas convencionais de redução dos casos dessa espécie permanecem parciais (...) e não são aceitas senão por um número relativamente limitado de Estados. Na prática, constata-se que, frequentemente, quando surge um conflito, é o Estado que está sendo a vítima principal da violência àquele que irá impor sua autoridade à pessoa privada. (DUPUY, 2004, p.90)

A moderna agenda de combate ao terrorismo deve levar em conta a acelerada globalização dos últimos decênios, que tem provado alterações nas formas pelas quais as nações interagem entre si. De início, na ONU, o fenômeno era tratado como injustificável simpatia e paternalismo, embora se procurasse conter a expansão do fenômeno. Essa postura foi sendo progressivamente alterada, até atingir o atual estágio de total condenação do terrorismo, sob qualquer pretexto, constante das resoluções do Conselho de Segurança desde a década de 1990. (CRETELLA NETO, 2006. p. 206-218)

Sem dúvida, a melhor compreensão e o desenvolvimento da natureza das violações aos Direitos Humanos cometidas em períodos mais recentes da História, têm levado a comunidade internacional a adotar a jurisdição universal para processar suspeitos não apenas de atentar contra esses direitos, mas também de acusados da prática de outros crimes que igualmente repugnam a consciência humana.

Certos autores entendem, contudo, que a consolidação da jurisdição universal, poderá causar mais turbulências e problemas do que seus defensores pretendem resolver. Dentre esses últimos, devem ser examinados os argumentos de Ruth Wedgwood, que justifica a posição americana em não aderir ao TPI, argumentando que os comandantes das forças militares dos EUA, que detêm a maior parcela da responsabilidade pela segurança no mundo atual, ficariam muito vulneráveis à ação de tribunais locais. (WEDGWOOD, 2003)

Também Marc Henzelin (2002), entende que a jurisdição universal deve ser adotada com bastante cautela, apenas caso expressamente prevista em convenções internacionais, com muitos dos instrumentos adotados contra o terrorismo, de acordo com a regra primo dedere secundum prosequi.

Sem dúvida, a presença de Estados com vítimas ou apoiadores de terrorismo revigorou o ímpeto para internacionalizar o combate nessa área, por meio de tribunais penais internacionais, da jurisdição universal e dos poderes do Conselho de Segurança. No entanto, as características políticas do terrorismo internacional limitam significativamente esses mecanismos de internacionalização. Consequentemente, apesar desses justificados esforços, a persecução dos terroristas ainda ocorre, preponderantemente, em nível nacional, em geral no Estado que foi alvo de atentados. É provável que essa forma de repressão ao terrorismo continue a prevalecer por bom tempo ainda. (MORRIS, 2003-2004)

Os argumentos contra e a favor da jurisdição internacional foram por nós examinados. Embora número crescente de Estados venha adotando legislação que acolhe o princípio, parece-nos ainda prematuro adotar o princípio de forma generalizada, especialmente pela assimetria entre os interesses dos Estados.

Isso ficou claro, por exemplo, no caso Lockerbie: nem os EUA nem a Grã-Bretanha julgaram os acusados nos tribunais nacionais, pois americanos e britânicos haviam sido vítimas do atentado. Tampouco o julgamento realizado na Líbia, anteriormente apresentado como “prova” de que aquele Estado era contrário ao terrorismo, mereceu credibilidade, justamente pelo fato de que os suspeitos tinham nacionalidade Líbia.

5. CONSIDERAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO INTERNO DO TERRORISMO

A crime is a crime is a crime”.

Essa observação de Margaret Thatcher, feita durante a conferencia de imprensa na Arábia Saudita, em 1981, rejeitando qualquer opinião de que poderia haver razões políticas, e, portanto, eventualmente desculpáveis, para a violência praticada pelo Irish Republican Army, IRA, permanece válida, na medida em que todos os crimes, incluindo os atos conexos ao terrorismo, devem estar sujeitos a sanções.

Ainda que a inaplicabilidade de exceção do crime político seja objeto de discussões no cenário internacional, a maioria dos sistemas jurídicos pune atos terroristas independentemente de motivações políticas ou religiosas. Nem todos os Estados, é verdade, como o faz a Alemanha, por exemplo, diferenciam medidas preventivas de medidas repressivas. (PITSCHAS, 2002, p. 13)

No entanto, parece evidente a diferença drástica entre as medidas de persecução penal que existiam antes de 11/09/2001 e a introdução de novas leis, após os ataques terroristas nos EUA.

Em países que já enfrentavam formas de terrorismo interno, durante as últimas décadas, como Alemanha, Itália, Espanha, Grã-Bretanha, Japão, Turquia e Israel e, em menor escala, França e Bélgica, o tratamento jurídico dispensado à luta contra o terrorismo era basicamente de caráter nacional e quase completamente baseado em leis materiais e processuais unilaterais.

Após 11 de setembro, esses instrumentos foram emendados ou alterados, no sentido de que as normas penais já existentes, no contexto do combate ao terrorismo interno, foram ampliadas e adaptadas para enfrentar o terrorismo internacional em todas as suas formas.

Já em países que desfrutavam de relativa paz em seus territórios e não tinham vasta experiência com o terror nacional até anos recentes, como o Canadá e, em certa medida, também a Rússia e os Estados Unidos, os eventos de 11 de setembro induziram a aprovação de diversas normas, dando ênfase à persecução de terroristas internacionais. (SCHMAHI, 2004, p. 82-118)

Apenas os EUA escolheram caminho diverso: com a intervenção armada no Afeganistão, em outubro de 2001, os serviços militares e de inteligência passaram a serem elementos centrais dos esforços americanos contra o terrorismo. Desde essa época, o interesse antes existente em capturar terroristas e agilizar a persecução penal, bem como mantê-los em prisões, deixou de ser a principal prioridade do governo americano. (DRUMBI, 2002)

À dimensão política internacional do terrorismo foi igualmente conferida extraordinária importância, pois, como as revoluções, o terrorismo é um ato político praticado à margem (ou além) das normas dos sistemas políticos estabelecidos. (MACIONIS, 2005, p.390)

Assim, o terrorismo “global” passou não apenas a ameaçar determinadas comunidades ou países, como antes de 11 de setembro, mas toda a comunidade de nações, indiscriminadamente, colocando em risco a paz mundial.

Os eventos de 11 de setembro desencadearam reações exacerbadas de uma série de países, tanto no plano normativo quanto no repressivo, mas, se, por um lado, os Estados devem proteger os direitos fundamentais de seus cidadãos e perseguir terroristas, também devem respeitas os Direitos Humanos tanto da população como um todo, quanto dos terroristas. Quando a estes últimos, respeitar seus direitos significa não puni-los (ou executá-los, onde existir a pena de morte) sem observância ao devido processo legal.

A preocupação obsessiva com a segurança, em sentido restrito, parece ter atingido virtual ubiquidade na vida pública contemporânea, permitindo o planejamento e a implementação de novas medidas, legislativas, administrativas e ultra vires, algumas destinadas a sufocar grande parte das obrigações dos Estados em relação aos Direitos Humanos. (SEIBERT-FOHR, 2004, p. 125-162) Reclama-se, com justa razão, o monitoramento internacional dessas medidas antiterroristas, dado seu impacto sobre as garantias fundamentais e as violações a Direitos Humanos. (SEIDERMAN, 2004, p. 399-420)

Dworkin observa que a alegação costumeira do Poder Executivo, em tempos de determinadas crises, de que existe um equilíbrio essencial a ser estabelecido entre a segurança e a liberdade é, na verdade, uma falsa dicotomia. (DWORKIN, 2002)

O argumento político corriqueiro é o de que a ameaça terrorista à segurança é de tal forma grave, que os níveis de liberdade aos quais temos direitos conferidos pela lei e de que normalmente usufruímos, devem ser reduzidos. Assim, por essa lógica, a segurança deve sobrepor-se à liberdade, sob certas circunstancias, e por limitado período de tempo. (PHILIP, 2002-2003)

Outro argumento “oficial”, bastante comum, criticado por Dworkin, é o de que a população, em geral, estaria disposta a aceitar limitações às suas liberdades pessoais em troca de um aumento na segurança, em relação a ataques terroristas.

Contra esse argumento, chama atenção para o fato de que relativamente poucas pessoas são afetadas por essas medidas extremadas de segurança: a classe média, que é o grupo numérica e economicamente mais importante em qualquer país industrializado, continua a levar a vida de forma distante e relativamente intocada pelas novas atitudes governamentais.

O mais prováveis alvos (e vítimas) da redução nos padrões de justiça são sempre os estrangeiros residentes, a primeira geração de imigrantes, as minorias étnicas ou religiosas, especialmente árabes e seguidores do Islã, da mesma forma que a comunidade irlandesa na Inglaterra era estigmatizada no auge das campanhas terroristas com uso de bombas, realizadas pelo IRA.

A maioria dos textos doutrinários enfatiza as limitações do Direito Internacional como arma eficaz no combate ao terrorismo, pois os Estados devem combater o fenômeno em dois planos: o jurídico, representado pela elaboração de tratados multilaterais e de leis internas, bem como na cooperação judicial e policial, que levam à repressão criminal dos terroristas, e o político, que depende de negociações diplomáticas e de cooperação institucional.

Essas duas abordagens repousam em fundamentos filosóficos diversos: a primeira é de natureza mais técnica, e toma por base a legislação penal e o processo penal, de acordo com a leis nacionais; concentra-se em verificar que um ato criminoso foi praticado, em indiciar suspeitos e realizar a devida persecução criminal. Já a segunda implica na abertura de amplo e imprescindível debate, que deve levar em conta não apenas cada ato terrorista, isoladamente, levando a certo “diálogo”, que rapidamente transcende o nível dos autores individuais dos atos terroristas, e conduz a discussão ao patamar do inter-relacionamento entre Estados.

Esse processo é dificultado por duas complicações: o diálogo pode impedir a repressão eficaz por parte dos Estados, criando certa aparência de cumplicidade. Além disso, as intervenções são feitas pelos Estados segundo o interesse nacional de cada um, o que pode dificultar a imprescindível cooperação internacional. (FLORY, 1997, p. 30-39)

Quanto ao perigo que representam certas leis internas, aprovadas no calor de reações emocionais a atos de terrorismo, vale recordar as palavras proferidas em 1993, por um jovem, mas já experiente político britânico, discursando no Parlamento, que afirmou:

Se covardemente aceitarmos que qualquer ação do governo e o intitulado Prevention of Terrorism Act deva ser apoiado integralmente sem discussão, não estaremos reforçando a luta contra o terrorismo, e sim, enfraquecendo-a. Espero que nenhum Honrado Membro diga que não temos o direito de questionar os poderes, e de nos assegurarmos de que agem de acordo com as liberdades civis de nosso país.

Seu nome? Era o então “Shadow Home Secretary” (secretário de governo paralelo) e ex- Primeiro-Ministro britânico, Tony Blair.

6. O BRASIL E O TERRORISMO

A Constituição Federal de 1988 elencou no caput artigo 5º, os direitos e garantias fundamentais, deixando de forma evidente a determinação de garantias de vários bens jurídicos, especificando garantir aos brasileiros e estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à privacidade. Estes são os valores mais vulneráveis perante os terroristas, e, por este motivo, são bens que merecem a proteção da ordem jurídica.

O entendimento de bem jurídico e a carência de sua proteção fundamenta a justificativa pelo qual o legislador constitucional pátrio estabeleceu grande relevância à rejeição ao terrorismo. A rejeição ao terrorismo tomou grande relevância constitucional, em virtude de ter sido expressamente elencado na Carta Magna brasileira de 1988, o que dá fundamento, previsão para o seu combate.

A prática do terrorismo não só vai de encontro à vida humana, bem jurídico maior, com também contra o patrimônio, o que abrange alguns princípios e garantias fundamentais. A Constituição Brasileira se refere ao terrorismo o enquadrando na esfera das relações internacionais.

Ao analisar a forma como a Constituição Federal brasileira de 1988 se refere ao terrorismo, percebe-se que a pratica do ato terrorista atinge princípios que, inclusive, se mostram vulneráveis, com, por exemplo, o princípio da dignidade da pessoa humana, o da importância dos direitos humanos e da solução dos conflitos.

O artigo 1º. A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, Municípios e do Distrito Federal, constituísse em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos III – a dignidade da pessoa humana.

Art. 4º. A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: II – prevalência dos direitos humanos. Introduzido em meio aos princípios fundamentais da constituição federal de 1988, nota-se uma alusão direta ao terrorismo contida no artigo 4º, que reza os princípios relacionados à comunidade internacional, ou seja, que conduzem o Brasil perante suas relações internacionais, prescrevendo a conduta do Brasil como pessoa jurídica de Direito Internacional:

Art. 4º. “A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: VIII – repúdio ao terrorismo e ao racismo”. Outra referência que está destacada diretamente na CF/88, está elencada no artigo 5º que fala dos direitos e garantias fundamentais, estabelecendo o terrorismo como crime hediondo, inafiançável e não sujeito a anistia.

O Art. 5º, XLIII – “a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática de tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”.

O desprezo ao terrorismo indiretamente no texto constitucional de 1988 se mostra na vedação de associação de caráter paramilitar (art. 5º, XVII – é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar), ou ainda de sua utilização por partidos políticos (art. 17, § 4º - é vedada a utilização pelos partidos políticos de organização paramilitar).

A Constituição Federal brasileira abordou especificamente do assunto terrorismo, mesmo que de forma muito breve, tipificando, o termo terrorismo expressamente, ilustrando como a legislação infraconstitucional deve tratar da matéria.

6.1. A NOVA LEI BRASILEIRA SOBRE O TERRORISMO

O Brasil não possuía em seu âmbito jurídico uma legalidade de definição sobre o que seria considerado terrorismo. O que existiam eram variadas normatizações fazem referência ao terrorismo: Lei 6.815/80, art. 77, § 3º; Lei n° 7.170/83, art. 20; CF, art. 5°, XLIII; Lei n° 8.072/90, art. 2°; Lei n° 12.850/13, art. 1°, §2°, II.

No dia 17 de março do ano de 2016 entra em vigor a Lei n° 13.260, que regulamenta o disposto no inciso XLIII do art. 5°, da Constituição Federal:

Constituição Federal, art. 5°, XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem [...] 

Definindo, assim, nacionalmente o que se deve ser tratado como terrorismo.

No concerto internacional das nações o Brasil havia assumido a responsabilidade e/ou obrigação de tipificar em seu território o crime de terrorismo. E, por este motivo, já havia uma situação desconfortável no país, por conta da demora na implementação desta tipificação.

Perante o a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, o Brasil se sentiu obrigado a acelerar este compromisso de criar formas legais contra possíveis práticas terroristas. Logo, no art. 2°, desta nova legislação, foi delineada a tipificação do crime de terrorismo: 

Art. 2o  O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando cometidos com a finalidade de provocar terror social ou generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública ou a incolumidade pública. 
§ 1o  São atos de terrorismo: 
I - usar ou ameaçar usar, transportar, guardar, portar ou trazer consigo explosivos, gases tóxicos, venenos, conteúdos biológicos, químicos, nucleares ou outros meios capazes de causar danos ou promover destruição em massa; 
II – (VETADO); 
III - (VETADO); 
IV - sabotar o funcionamento ou apoderar-se, com violência, grave ameaça a pessoa ou servindo-se de mecanismos cibernéticos, do controle total ou parcial, ainda que de modo temporário, de meio de comunicação ou de transporte, de portos, aeroportos, estações ferroviárias ou rodoviárias, hospitais, casas de saúde, escolas, estádios esportivos, instalações públicas ou locais onde funcionem serviços públicos essenciais, instalações de geração ou transmissão de energia, instalações militares, instalações de exploração, refino e processamento de petróleo e gás e instituições bancárias e sua rede de atendimento; 
V - atentar contra a vida ou a integridade física de pessoa:
Pena - reclusão, de doze a trinta anos, além das sanções correspondentes à ameaça ou à violência.

Conseguir um acordo sobre uma definição de terrorismo não foi fácil. Pois, até a nível internacional, até hoje, não se tem uma definição definitiva do que vem a ser essa prática criminosa.

Um exemplo dessa dificuldade pode ser visualizada quando no âmbito regional das Américas, a Organização dos Estados Americanos (OEA), elaborou a Convenção Interamericana contra o Terrorismo, assinada em Barbados em 03 de junho de 2002. Os países que integram a OEA teriam que prevenir, combater, punir e eliminar o terrorismo (art. 1):

Artigo 1:  Esta Convenção tem por objeto prevenir, punir e eliminar o terrorismo. Para esses fins, os Estados Partes assumem o compromisso de adotar as medidas necessárias e fortalecer a cooperação entre eles, de acordo com o estabelecido nesta Convenção.

E esta convenção foi colocada e aplicada no sistema jurídico brasileiro pelo Decreto n° 5.639 de 26 de dezembro de 2005. Sem, contudo, dar uma exata conceituação de terrorismo.

As divergências existem, pois, o que para alguns é considerado terrorismo para outros é somente atos de resistência contra supostas ocupações territoriais ilegais. Exemplo disso, podemos citar a rivalidade entre israelenses e palestinos que se acusam de práticas terroristas. Para Israel, a acusação se refere ao denominado terrorismo de Estado.

Diante de todo esse contexto é que de fato, agora o Brasil dispõe de uma lei específica sobre terrorismo. Essa lei pode não ser o que se esperava, mas já preencheu as lacunas legislativas sobre o tema.

7. CONCLUSÃO

A população brasileira, em geral, parece não acreditar que atos terroristas já aconteceram, e podem continuar a acontecer em solo pátrio.

Na contemporaneidade, há um formato de guerras, que podem ser configuradas também, em enfrentamentos de conflitos urbanos, movimentos sociais, religiosos, extremistas, hostis, etc. E, isso, nos remete a ideia de comemoração pela nova lei antiterror brasileira. Claro que avanços e aperfeiçoamentos devem acontecer de maneira que se municie o sistema jurídico, com ferramentas legais condizentes com a gravidade das situações decorrentes do terrorismo.

Uma obra monográfica deve chegar a determinadas conclusões, as quais enumeramos nos itens anteriores. Não significa, em absoluto, que se encerre o trabalho doutrinário, pois o Direito Internacional é ramo jurídico em permanente e célebre construção.

Falta dizer, ainda, que todas as ações humanas destinadas a combater o terrorismo, adotadas pela sociedade civil, pelos governos, por entidades dos mais variados tipos, pelas religiões, pelos partidos políticos e por organizações internacionais, devem ser pautadas pela mais rígida observância aos Direitos Humanos.

Certamente, não é torturando ou humilhando terroristas, culpados ou apenas suspeitos, que se impedirá a proliferação do terrorismo. Tratar terroristas a latere do Direito é igualar-se a eles, é renunciar às conquistas morais da civilização, é glorificar a barbárie.

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HUGGINS, Martha K. Polícia e política: relações Estados Unidos/América Latina. 1ª Ed. São Paulo: Cortez, 1998.

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SOTTILE, Antoine. Le Terrorisme Internacionale, Recueildes Cours de l’ADI, Haia, 1938-II, tomo 65, p. 91-183

The Changing Face of War: Into the Fourth Generation. William S. Lind, Colonel Keith Nightengale (USA), Captain John F. Schmitt (USMC), Colonel Joseph W. Sutton (USA), and Lieutenant Colonel Gary I. Wilson (USMCR),  Marine Corps Gazette, October 1989.


Publicado por: MARCOS PAULO MACHADO DOS SANTOS

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