Prisão Ilegal e Responsabilidade Civil do Estado

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1. RESUMO

O tema deste estudo monográfico, diz respeito à Prisão Ilegal e a Responsabilidade Civil do Estado. Analisa, para tanto, os diversos posicionamentos referentes à questão, a partir de uma interpretação teleológica e sistemática da liberdade pessoal, do conceito de prisão e do alcance e aplicabilidade da responsabilidade civil do Estado diante da devida reparação da prisão ilegal, sem olvidar a utilização de lições doutrinárias e jurisprudenciais. As conclusões trazem as eventuais formas de responsabilização do ente estatal responsável pela prisão ilegal admitidas pelo ordenamento e o entendimento do Superior Tribunal de Justiça acerca da responsabilização do Estado diante da prisão ilegal e sua consequente reparação, seja pelos danos morais, materiais ou ambos, demonstrando que o referido instituto da responsabilidade civil objetiva aplica-se aos casos de prisão ilegal.

Palavras-chave: Liberdade. Prisão Ilegal. Responsabilidade Civil do Estado.

ABSTRACT

The theme of this monographic study concerns the Illegal Imprisonment and Liability of the State. Analyzes, therefore, the various positions regarding the issue from a teleological and systematic interpretation of personal freedom, the concept of arrest and the scope and applicability of the liability of the State before the proper repair of unlawful imprisonment, without forgetting the use doctrinal and jurisprudential lessons. The findings bring any forms of accountability of the state entity responsible for the illegal arrest and admitted for spatial understanding of the Superior Court of Justice about the accountability of the state before the illegal arrest and his subsequent repair, whether for moral, material or both, demonstrating that such Office of objective liability applies to cases of illegal imprisonment.

Keywords: Freedom. Illegal Prison. Liability of the State.

2. INTRODUÇÃO

A presente monografia tem por intuito efetuar a análise da Prisão Ilegal e a Responsabilidade Civil do Estado. Objetivando compreender o tema proposto é que a presente examina o trato doutrinário e jurisprudencial dado à mencionada questão.

A importância da pesquisa encontra-se no fato de estar assegurado ao cidadão o princípio constitucional do direito à liberdade, sendo esta uma garantia fundamental elencada na Constituição Federal de 1988.

Diante de tal intento e da necessidade da análise de diversas questões subjacentes, a monografia foi dividida em três capítulos, nos moldes explicados a seguir.

No primeiro capítulo, enfocar-se-á o conceito de liberdade, a fim de constatar ser patente que o ato praticado diante do cerceamento da liberdade individual de maneira arbitrária, além de ilegal, representa grave lesão ao status de dignidade e liberdade constitucionalmente protegidos.

Quando o Estado, por meio de seu poder jurisdicional, decreta a prisão de alguém de forma indevida, está interferindo no âmbito dos direitos e das garantias constitucionais asseguradas ao cidadão. Espera-se, desse modo, que a prisão seja exercida de forma devida, pois, do contrário, o indivíduo sofrerá diversos prejuízos e sofrimentos.

Não havendo razões contundentes para privar a liberdade pessoal, não deve ocorrer a prisão. Tal estudo possibilitará um melhor entendimento acerca do tema proposto, fornecendo uma interpretação adequada à luz do sopesamento dos princípios da liberdade e da legalidade.

No segundo capítulo tratar-se-á especificamente da conceituação da prisão, discutindo-se a proteção dada à prisão, visando resguardar que quando esta ocorrer, deve pautar-se na mais estrita legalidade sob pena de restar provado o ato ilegal na privação da liberdade. Assim, onde a liberdade é a regra, a prisão deve ser a exceção, sendo ilegal qualquer ato que não venha a ser pautado no que determinam as leis, sobretudo a Constituição Federal de 1988 e a Lei nº 4.898 de 9 de dezembro de 1965 que regulamenta o direito de representação e o processo para apuração de responsabilidade por abuso de autoridade, assegurando uma resposta aos abusos cometidos pelos agentes do Estado em matéria de prisão ilegal e, ainda, a possibilidade de responsabilização do agente que supostamente esteja praticando a arbitrariedade consistente na manutenção de uma prisão ilegal.

Na sequência, no terceiro e último capítulo, examinar-se-á o entendimento doutrinário acerca da responsabilidade civil, com sua efetiva conceituação para melhor compreensão técnica do tema e seus desdobramentos quanto a sua efetiva responsabilização civil objetiva recair sobre o Estado.

Por derradeiro, este capítulo traz ainda o entendimento dos Tribunais pátrios, especialmente o Superior Tribunal de Justiça e os Tribunais de Justiça dos Estados de Santa Catarina, Rio de Janeiro e Minas Gerais, revelando que tais tribunais julgam com unanimidade a responsabilidade civil do Estado ante a prisão ilegal e seu consequente dever de indenizar o particular afetado pela injusta ação estatal, caso caracterizada a ocorrência de dano moral e patrimonial em virtude da prisão ilegal.

Quanto ao método de abordagem adotado, consistiu no método dedutivo, visto que foi o mais adequado para levar a uma conclusão lógica acerca da possibilidade de reparação civil estatal diante da prisão ilegal.

Pretende-se um estudo não exaustivo, cujo objetivo é mostrar as formas de admissibilidade da reparação dos danos patrimoniais e morais, com a aplicação da responsabilidade civil objetiva do Estado ante a prisão ilegal, de modo a garantir a dignidade da pessoa humana, pilar do Estado Democrático de Direito.

3. LIBERDADE PESSOAL

3.1. NOÇÕES

Desde as revoluções liberais dos séculos XVII e XVIII que os chamados direitos fundamentais começaram a ser formulados e positivados nas constituições dos países em formação. Hodiernamente, os direitos fundamentais, matéria necessária em quase todas as constituições do mundo, englobam tanto os direitos inicialmente considerados como tal, agora direitos individuais, como toda uma nova série de prerrogativas e garantias que buscam assegurar o exercício da cidadania plena, esta entendida em sua conceituação mais ampla.

Conforme o ilustre doutrinador Alexandre de Moraes, direitos fundamentais podem ser definidos como:

o conjunto institucionalizado de direitos e garantias do ser humano, que tem por finalidade básica o respeito a sua dignidade, por meio de sua proteção contra o arbítrio do poder estatal e o estabelecimento de condições mínimas de vida e desenvolvimento da personalidade humana.1

O direito de liberdade, tendo surgido como forma de libertar o homem das amarras do estado absolutista, é o mais destacado dos direitos fundamentais individuais, sendo que tal direito não mais poderia ser restrito pelo Estado de forma deliberada e absoluta.

A Constituição Federal de 1988 deu especial evidência aos direitos fundamentais, estabelecendo em seu preâmbulo o dever de assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, a justiça, etc., elevando-os à categoria de valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos.

Reza a Lex Major que a República Federativa do Brasil se constitui em Estado Democrático de Direito, tendo como fundamento a prevalência dos direitos humanos em suas relações, respeitando-se a dignidade da pessoa humana. Assim, a liberdade, entendida como o bem maior de todo e qualquer cidadão, é um direito indisponível, sendo evidente que o ato praticado diante do cerceamento da liberdade individual de maneira arbitrária, além de ilegal, representa grave lesão ao status de dignidade e liberdade constitucionalmente protegidos.

Corolário à determinação do artigo 5º da Constituição Federal tem-se, desta forma, que a liberdade pessoal é um direito natural do homem. “É o único direito nato no qual todos os outros estão implícitos”2. Ocorre que a vida em sociedade nos impõe determinadas regras de convivência que, por vezes, limitam nossa liberdade em detrimento da coletividade e do respeito ao direito de nosso semelhante.

A imposição de um sacrifício ao particular faz incidir a regra da igualdade dos ônus e encargos, levando à distribuição destes por todos os administrados. Mas a atuação do Estado em benefício da sociedade implica também a garantia dos direitos que a ordem constitucional deferiu ao cidadão.3

Assim, ainda que caiba ao Estado determinar quando o indivíduo pode sofrer a violação de seu direito à liberdade pessoal, ele tem que fazê-lo com respaldo do regramento jurídico, conforme lição de Arnaldo Quirino de Almeida:

quando exerce o seu poder de restrição da liberdade pessoal, na verdade o Estado está atuando em nome da própria sociedade, que, por meio seus representantes, edificam a ordem institucional vigente. Entretanto, para que exerça o seu poder quando chamado a fazê-lo, o Estado somente pode atuar restringindo a liberdade pessoal se o fizer em estrita obediência aos princípios e ao regramento legal vigente, legitimando sua ação.4

A restrição imposta à liberdade pessoal deve ser o necessário e suficiente para que seja atingido o equilíbrio entre os indivíduos no convívio social. Neste sentido, torna-se fundamental estabelecer equilíbrio entre a liberdade individual e a autoridade estatal. Isto porque o conceito de liberdade legítima não é irrestrito, não implica em ausência de coação. Liberdade consiste na ausência de coação atípica, espúria e amoral. Dessa forma, “num Estado em que há leis, a liberdade não pode consistir senão em poder fazer o que se deve querer e não em ser constrangido a fazer o que não se deve desejar”.5

No entendimento de Lenilma Cristina Sena de Figueiredo Meirelles:

a liberdade física implica necessariamente no direito de ir, vir e permanecer. Todavia, essa liberdade que podemos chamar de natural, não é absoluta, esbarra no poder estatal, encarregado de manter a ordem e a paz pública.

Assim, podemos afirmar que a liberdade pessoal é condicionada pela lei, que regula o que não se pode fazer, circunscrevendo o arbítrio de cada pessoa. Inexistindo, dessa forma, liberdade absoluta, pois todos devem agir dentro dos limites impostos pela ordem legal.6

Destarte, apenas a lei geral estatal pode restringir a liberdade pessoal, e, para tanto, as leis devem ser elaboradas segundo regras preestabelecidas e aceitas pela coletividade. A lei limitadora do conteúdo da liberdade individual precisa ser típica, moral e legítima, no sentido de ser consentida por aqueles que a liberdade restringe.

A liberdade, portanto, está indissociavelmente ligada ao princípio da legalidade, sendo este garantia daquela. Na Carta Magna de 1988, percebe-se esta ligação no artigo 5º, inciso II, que assegura: "ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei". A liberdade somente poderia ser limitada pela lei. Esta forma de considerar-se a legalidade frente à liberdade é baseada em um conteúdo negativo, sendo a liberdade o conceito geral e a restrição da lei a exceção.

Ao legislador é delegada a tarefa de criar normas destinadas a limitar o direito à liberdade pessoal ou de locomoção (assegurado pelo artigo 5º, inciso XV, CF/88), legitimando e possibilitando a ação do Estado nesse campo, já que o referido direito tem seu exercício condicionado às exigências da sociedade pelos interesses dos tutelados. Essas normas limitadoras são verdadeiras exceções à liberdade pessoal e devem, assim, atender aos mais rigorosos limites impostos pelas determinações do Estado Democrático de Direito.

Pelo exposto, diante de qualquer irregularidade que ocorra em face da restrição da liberdade pessoal, especialmente pela prisão ilegal, o Estado deve ser responsabilizado para que os danos causados ao indivíduo sejam integralmente reparados.

4. PRISÃO

4.1. NOÇÕES E CONCEITO

O Estado tem na pena de prisão o seu instrumento maior de restrição da liberdade individual. Lenilma Cristina Sena de Figueiredo Meirelles, citando De Plácido e Silva, assim determina:

O termo prisão deriva do latim prehensio, de prehendere, que significa "o ato de prender ou o ato de agarrar uma coisa"7. Indica "o ato pelo qual se priva a pessoa de sua liberdade de locomoção, isto é, da liberdade de ir e vir, recolhendo-a a um lugar seguro e fechado, de onde não poderá sair"8. Em suma, a prisão indica a perda da liberdade, suprimindo-a mediante o encarceramento. 9

No entendimento de Humberto Theodoro Junior o conceito de prisão é “a supressão da liberdade individual.”10 Nesse mesmo norte, Julio Fabbrini Mirabette, entende que:

A prisão, em sentido jurídico, é a privação de liberdade de locomoção, ou seja, do direito de ir e vir, por motivo ilícito ou ordem legal. Entretanto, o termo tem significado vários no direito pátrio, pois pode significar a pena privativa de liberdade (“prisão simples” para o autor de contravenções, “prisão” para crimes militares, além do sinônimo de “reclusão” e “detenção”), o ato da captura (prisão em flagrante ou em cumprimento de mandado) e a custódia (recolhimento da pessoa ao cárcere). Assim, embora seja tradição no direito objetivo o uso da palavra em todos os seus sentidos, nada impede se utilize os termos captura e custódia, com os significados mencionados em substituição ao termo prisão. Também se faz distinção das espécies de prisão no direito brasileiro: a prisão-pena (penal) e a prisão sem pena (processual penal, civil, administrativa e disciplinar).11

Corroborando com tais entendimentos, Fernando da Costa Tourinho Filho conceitua prisão da seguinte forma:

Em princípio, prisão é a supressão da liberdade individual, mediante clausura. É a privação da liberdade individual de ir e vir, e, tendo em vista a denominação prisão-albergue, podemos definir a prisão como a privação, mais ou menos intensa, da liberdade ambulatória. Esse conceito abrange as duas espécies de prisão: a prisão com pena, ou a prisão – sanção, isto é, a decorrente de sentença penal condenatória irrecorrível, utilizada como meio de repressão aos crimes e contravenções, e a prisão sem caráter de pena, também conhecida sob denominação genérica prisão sem pena.12

Nesse mesmo sentido, Guilherme de Souza Nucci, determina que prisão é “a privação da liberdade, tolhendo-se o direito de ir e vir, através do recolhimento da pessoa humana ao cárcere”.13

A regra determinada pela Constituição Federal de 1988 é a da liberdade, permitindo o aprisionamento apenas diante de flagrância na prática de crime, ou mediante expedição da competente ordem de prisão devidamente fundamentada e nos demais casos previstos em lei. Qualquer que seja a modalidade de prisão que não esteja de acordo com tais fundamentos será considerada ilegal e portanto, será passível de indenização pela autoridade estatal.

Com intuito de proteger, resguardar e blindar a liberdade individual, a Constituição Federal prevê em seus vários incisos do art. 5º, uma série de garantias, quais sejam:

Art. 5º - Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

[...]

LXI - ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar, definidos em lei;

LXII - a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele indicada;

LXIII - o preso será informado de seus direitos entre os quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de advogado;

LXIV - o preso tem direito a identificação dos responsáveis por sua prisão ou por seu interrogatório policial;

LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária;

LXVI - ninguém será levado à prisão ou nela mantido, quando a lei admitir a liberdade provisória, com ou sem fiança;

LXVII - não haverá prisão civil por dívida, salvo a do responsável pelo inadimplemento voluntário e inescusável de obrigação alimentícia e a do depositário infiel;

LXVIII - conceder-se-á habeas corpus sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção por ilegalidade ou abuso de poder;

LXIX - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença.

Como se percebe, a Constituição Federal de 1988 se mostrou obediente ao princípio da legalidade, pelo qual o direito de liberdade individual do cidadão deve ser respeitado, não se permitindo violação, pois a regra tem sido a liberdade, excepcionalmente e nos casos legalmente previstos é que tal princípio pode ser mitigado. É tanto que se o cidadão for atingido por um ato que se constitua em uma coação ilegal, cabe a ele afastá-la mediante o emprego dos instrumentos de impugnação previstos em lei, como o habeas corpus, o relaxamento, a liberdade provisória e a revisão criminal.

Ademais, cabe relembrar que a prisão ilegal é aquela modalidade de prisão promovida sem observância das formalidades legais ou com abuso de poder. Desta forma, sobressai-se que ante qualquer irregularidade face à restrição da liberdade pessoal, especialmente pela prisão ilegal, o Estado deve ser responsabilizado para que os danos causados ao indivíduo sejam integralmente reparados.

4.2. ESPÉCIES DE PRISÃO NO DIREITO PROCESSUAL PENAL BRASILEIRO

Conceituada a prisão e feitas as devidas considerações, faz-se necessário discorrer acerca das várias espécies de prisão reconhecidas no ordenamento jurídico pátrio, ao que passamos adiante.

Diante do princípio constitucional da presunção de inocência, que defende a não culpabilidade antes do reconhecimento da autoria e materialidade de uma infração criminal, podemos afirmar que o ordenamento jurídico brasileiro possui como regra a liberdade do indivíduo.

Considerando o que fora anteriormente citado, pode-se dizer então, que o encarceramento é medida que se faz excepcional, permanecendo o indivíduo em seu status de inocência até o transito em julgado da sentença penal condenatória. Portanto, a aplicação de qualquer que seja a pena ou a medida cautelar, exige obediência impositiva ao que dispõe a legislação vigente, onde a intervenção estatal na liberdade individual será a mínima possível.

Segundo Luiz Flávio Gomes14, a prisão preventiva não é apenas a ultima ratio. Ela é a extrema ratio da ultima ratio. A regra é a liberdade; a exceção são as cautelares restritivas da liberdade (art. 319, CPP); dentre elas, vem por último, a prisão, por expressa previsão legal.

Corroborando com o supra mencionado, eis o artigo 283 do Código de Processo Penal Brasileiro, após o advento da Lei 12.403/2011:

Art. 283.  Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva.

Acerca da prisão em flagrante, elucida Guilherme Nucci (2012, p. 631):

é medida cautelar se segregação provisória, com caráter administrativo, do autor da infração penal. Assim, exige apenas a aparência da tipicidade, não se exigindo nenhuma valoração sobre a ilicitude e a culpabilidade, outros requisitos para a configuração do crime. É o fumus boni juris (fumaça do bom direito). Tem, inicialmente, natureza administrativa, pois o auto de prisão em flagrante, formalizador da detenção, é realizado pela Polícia Judiciária, mas se torna jurisdicional, quando o juiz, tomando conhecimento dela, ao invés de relaxá-la, prefere mantê-la, pois considerada legal, convertendo-a em preventiva.15

Após o advento da lei 12.403/2011, a prisão em flagrante torna-se medida administrativa que visa resguardar a ordem social podendo ser efetivada por qualquer pessoa, conforme disciplina o artigo 301 do Código de Processo Penal. Daí considera-la uma exceção, pois via de regra a prisão só se dará mediante ordem judicial.

Não é muito acrescentar que a prisão em flagrante não poderá subsistir por período superior a 24 horas. Em consonância com o artigo 306 do Código de Processo Penal Brasileiro, deverá o delegado de polícia avaliar a legalidade da prisão e a necessidade de encarceramento, onde se estiverem presentes os requisitos, comunicará de imediato ao juízo competente, ao Ministério Público e à família do preso ou à pessoa que ele indicar. Caso o preso não informe o nome de seu advogado, comunicará também à Defensoria Pública.

Nesta senda, trazemos a baila o artigo 310 do Código de Processo Penal Brasileiro:

Art. 310.  Ao receber o auto de prisão em flagrante, o juiz deverá fundamentadamente:

I - relaxar a prisão ilegal; ou 

II - converter a prisão em flagrante em preventiva, quando presentes os requisitos constantes do art. 312 deste Código, e se revelarem inadequadas ou insuficientes as medidas cautelares diversas da prisão; ou 

III - conceder liberdade provisória, com ou sem fiança.

Parágrafo único.  Se o juiz verificar, pelo auto de prisão em flagrante, que o agente praticou o fato nas condições constantes dos incisos I a III do caput do art. 23 do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 - Código Penal, poderá, fundamentadamente, conceder ao acusado liberdade provisória, mediante termo de comparecimento a todos os atos processuais, sob pena de revogação.

O artigo mencionado fora inserido pela Lei 12.403/2011, e passou a exigir resposta imediata do juiz no sentido de relaxar a prisão, aplicar medidas cautelares diversas da prisão previstas no artigo 319 do CPP, ou conceder liberdade provisória, com ou sem fiança. Neste sentido, Reinaldo Rossano Alves “comunicado acerca do flagrante deve o juiz verificar não só a sua legalidade, como também a necessidade de se manter a prisão, avaliando se estão presentes o fumus comissi delicti e o periculum libertatis”.16

Indo adiante, mencionaremos as prisões cautelares, quais sejam: a prisão preventiva e a prisão temporária.

Elucidando acerca das prisões cautelares, podemos dizer que por se tratar de medida de acautelamento, provisoriedade, excepcionalidade, proporcionalidade, e extrema necessidade, jamais poderá ser transformada em punição antecipada, vez que é decretada antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

Como pressupostos, trazem em seu bojo o fumus comissi delicti (fumaça da prática de um ato unível) e o periculum libertatis (perigo que decorre do estado de liberdade).

A prisão preventiva é a prisão de natureza cautelar mais ampla, podendo ser aplicada na fase de inquérito policial ou na fase processual, desde que esteja demonstrada prova de existência do crime, indícios suficientes de autoria, materialidade ou de participação na infração. Para a sua imposição, faz-se necessária a comprovação da presença obrigatória dos elementos citados, bem como fator de risco que justifique a imposição da medida.

Como fundamentos legais para a imposição da prisão preventiva podemos citar: garantia da ordem pública, conveniência da instrução criminal, garantia de aplicação da lei penal, garantia da ordem econômica e o descumprimento de medidas cautelares.

Neste sentido, extrai-se do artigo 312 do Código de Processo Penal:

Art. 312.  A prisão preventiva poderá ser decretada como garantia da ordem pública, da ordem econômica, por conveniência da instrução criminal, ou para assegurar a aplicação da lei penal, quando houver prova da existência do crime e indício suficiente de autoria.

Parágrafo único.  A prisão preventiva também poderá ser decretada em caso de descumprimento de qualquer das obrigações impostas por força de outras medidas cautelares (art. 282, § 4o).

Aplicar-se-á a prisão preventiva caso seja descumprida alguma das medidas cautelares previamente impostas ao indivíduo, pois as medidas cautelares tiveram seu rol ampliado após a reforma da Lei 12.403/2011, que prevê 9 (nove) medidas cautelares diversas da prisão, fiança, liberdade provisória, no intuito de garantir maior segurança e aplicabilidade ao princípio da presunção de inocência, citado anteriormente, e que prevê a liberdade como regra. Vez que seja descumprida, entende o legislador que a medida aplicada não fora suficiente ou adequada, admitindo-se a substituição ou cumulação, decretando-se em último caso a prisão preventiva.

Conforme leciona Nestor Távora e Rosmar Rodrigues (2012, p. 584), destacamos que de regra, a preventiva só é admitida para os crimes dolosos com pena superior a quatro anos, tendo como garantia o devido processo legal, salvo em casos de urgência ou de perigo de ineficácia da medida, quando o contraditório será diferido.17

Acerca da prisão temporária, podemos dizer que é uma modalidade de prisão cautelar, com prazo preestabelecido de duração, cabível exclusivamente na fase de inquérito policial, consoantes artigo 283 do Código de Processo Penal, por ter finalidade de assegurar a eficácia da investigação policial, quando se tratar de apuração de natureza grave.

Devido a excepcionalidade de cabimento da prisão temporária, faz-se necessário o cumprimento dos pressupostos da necessidade para aplicação da medida e da adequação à gravidade do crime imputado. Requer ainda, que sejam atendidos os requisitos específicos da sua aplicação conforme se extrai do art. 1º da Lei 7.960/1989, in verbis:

Art. 1° Caberá prisão temporária:

I - quando imprescindível para as investigações do inquérito policial;

II - quando o indicado não tiver residência fixa ou não fornecer elementos necessários ao esclarecimento de sua identidade;

III - quando houver fundadas razões, de acordo com qualquer prova admitida na legislação penal, de autoria ou participação do indiciado nos seguintes crimes:

a) homicídio doloso (art. 121, caput, e seu § 2°);

b) seqüestro ou cárcere privado (art. 148, caput, e seus §§ 1° e 2°);

c) roubo (art. 157, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°);

d) extorsão (art. 158, caput, e seus §§ 1° e 2°);

e) extorsão mediante seqüestro (art. 159, caput, e seus §§ 1°, 2° e 3°);

f) estupro (art. 213, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);

g) atentado violento ao pudor (art. 214, caput, e sua combinação com o art. 223, caput, e parágrafo único);

h) rapto violento (art. 219, e sua combinação com o art. 223 caput, e parágrafo único);

i) epidemia com resultado de morte (art. 267, § 1°);

j) envenenamento de água potável ou substância alimentícia ou medicinal qualificado pela morte (art. 270, caput, combinado com art. 285);

l) quadrilha ou bando (art. 288), todos do Código Penal;

m) genocídio (arts. 1°, 2° e 3° da Lei n° 2.889, de 1° de outubro de 1956), em qualquer de sua formas típicas;

n) tráfico de drogas (art. 12 da Lei n° 6.368, de 21 de outubro de 1976);

o) crimes contra o sistema financeiro (Lei n° 7.492, de 16 de junho de 1986).

Ressalta-se a opinião de Rossano Alves, acerca das divergências doutrinárias existentes:

Diverge a doutrina quanto à aplicação da prisão temporária, tendo se formado três posições. Para a primeira (Mirabete e Tourinho), é cabível a prisão temporária em qualquer das situações acima previstas (I, II ou III), pois os requisitos são alternativos. A segunda posição (Antônio Scarance) defende que a prisão temporária só pode ser decretada se estiverem presentes as três situações, pois os requisitos são cumulativos. Por sua vez, para a última corrente (Damásio, Capez, Nucci e Magalhães Gomes Filho) a prisão temporária só pode ser decretada nos crimes previstos na lei (inc. III do art. 1º) e desde que concorra qualquer uma das duas primeiras situações (medida imprescindível para a investigação ou se o endereço ou identificação do indiciado forem incertos). É a posição majoritária.18

Tratando as posições divergentes como um caso à parte, frisamos ainda a possibilidade de decretação da prisão temporária em todos os crimes hediondos e equiparados, conforme expresso pelo art. 2º da Lei 8.072/1990.

A prisão domiciliar passou a ter caráter cautelar após o advento da lei 12.403/2011, sendo que antes era prevista para o cumprimento da pena e agora migrou para o âmbito da ação penal e sua cautela. As hipóteses legais, que coadunam com essa ideia, justificam-se ou pela condição pessoal do agente, ou pela condição de necessidade de seus dependentes.

Nos ensinamentos de Rosmar Rodrigues e Nestor Távora (2012, p. 606):

A prisão domiciliar é medida cautelar cerceadora de liberdade prevista expressamente nos artigos 317 e 318 do Código, e tem lugar toda vez que a execução da prisão preventiva não seja recomendada em cadeia publica (para os presos provisórios) ou em prisão especial (para os acusados que detêm essa prerrogativa por forca de lei), em razão de condições especiais, mormente as relacionadas à idade e à saúde do agente. A prisão domiciliar é decretada em substituição da preventiva, sempre por ordem judicial. Consiste no recolhimento do indiciado ou do acusado em sua residência, só podendo dela se ausentar por ordem do juiz. Para seu deferimento é exigida prova idônea evidenciando a situação especifica que a autorize.19

Em relação às condições especiais relacionadas à idade e à saúde do agente, conforme citado acima, eis que inserimos o que nos apresenta o Capítulo IV que fora inserido pela Lei 12.403/2011, no Código de Processo Penal Brasileiro, qual seja:

CAPÍTULO IV

DA PRISÃO DOMICILIAR

Art. 317.  A prisão domiciliar consiste no recolhimento do indiciado ou acusado em sua residência, só podendo dela ausentar-se com autorização judicial.

Art. 318.  Poderá o juiz substituir a prisão preventiva pela domiciliar quando o agente for:

I - maior de 80 (oitenta) anos;

II - extremamente debilitado por motivo de doença grave;

III - imprescindível aos cuidados especiais de pessoa menor de 6 (seis) anos de idade ou com deficiência;

IV - gestante a partir do 7o (sétimo) mês de gravidez ou sendo esta de alto risco.

Parágrafo único.  Para a substituição, o juiz exigirá prova idônea dos requisitos estabelecidos neste artigo.

Por derradeiro, afirmamos que a Lei nº 12.403/2011 surgiu positivamente no intuito de encerrar os excessos na decretação de prisões cautelares. Desta feita, o novel diploma legislativo, prevê a utilização de medidas cautelares que permitirão impor limites adequados ao acusado, sem privá-lo do direito a liberdade.

4.3. MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À PRISÃO

As medidas cautelares são pessoais, relacionadas com o réu e com os efeitos de seu comportamento para a ordem processual, ou seja, são providências antecipadas, que objetivam evitar a incidência de efeitos nefastos sobre a pretensão que se visa obter através do processo.

Em nosso ordenamento jurídico, tais medidas cautelares estão descritas no Capítulo V do Código Processual Penal, vejamos:

CAPÍTULO V

DAS OUTRAS MEDIDAS CAUTELARES

Art. 319.  São medidas cautelares diversas da prisão:

I - comparecimento periódico em juízo, no prazo e nas condições fixadas pelo juiz, para informar e justificar atividades;

II - proibição de acesso ou frequência a determinados lugares quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado permanecer distante desses locais para evitar o risco de novas infrações;

III - proibição de manter contato com pessoa determinada quando, por circunstâncias relacionadas ao fato, deva o indiciado ou acusado dela permanecer distante;

IV - proibição de ausentar-se da Comarca quando a permanência seja conveniente ou necessária para a investigação ou instrução;

V - recolhimento domiciliar no período noturno e nos dias de folga quando o investigado ou acusado tenha residência e trabalho fixos;

VI - suspensão do exercício de função pública ou de atividade de natureza econômica ou financeira quando houver justo receio de sua utilização para a prática de infrações penais;

VII - internação provisória do acusado nas hipóteses de crimes praticados com violência ou grave ameaça, quando os peritos concluírem ser inimputável ou semi-imputável (art. 26 do Código Penal) e houver risco de reiteração;

VIII - fiança, nas infrações que a admitem, para assegurar o comparecimento a atos do processo, evitar a obstrução do seu andamento ou em caso de resistência injustificada à ordem judicial;

IX - monitoração eletrônica.

§ 1o  (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

§ 2o  (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

§ 3o  (Revogado pela Lei nº 12.403, de 2011).

§ 4o  A fiança será aplicada de acordo com as disposições do Capítulo VI deste Título, podendo ser cumulada com outras medidas cautelares.

Art. 320.  A proibição de ausentar-se do País será comunicada pelo juiz às autoridades encarregadas de fiscalizar as saídas do território nacional, intimando-se o indiciado ou acusado para entregar o passaporte, no prazo de 24 (vinte e quatro) horas.

Após o surgimento destas medidas, encerrou-se a bipolaridade cautelar anteriormente existente, onde o juiz ficava adstrito à prisão ou à liberdade provisória, não existindo nenhuma outra alternativa. Em outras palavras, essa mudança passou a proteger de forma mais efetiva o processo, o acusado e a própria sociedade. O processo, porque surge um novo rol de medidas de resguardo à ordem processual. O acusado, porque a prisão cautelar, ato de extrema violência, será a extrema e última opção. A sociedade, porque a redução da prisão cautelar significa o desencarceramento de cidadãos sem condenação definitiva, que eram submetidos desde o início do processo ao contato nefasto com o submundo de valores criados pela cultura da prisão.

Contudo, estão submetidas ao binômio necessidade e adequação, previstos no caput do artigo 282 do Código de Processo Penal, além de fazer-se necessária a presença do fumus comissi delicti somada ao periculum libertatis, garantido o devido processo legal.

Acerca das exigências para a aplicabilidade das medidas cautelares, podemos citar os ilustres doutrinadores Rosmar Rodrigues e Nestor Távora (2012, p. 674):

A necessidade para aplicação da lei penal, para investigação ou a instrução criminal e, nos casos expressamente previstos, para evitar a prática de infrações penais; a adequação da medida à gravidade do crime, circunstancias do fato e condições pessoais do indiciado ou acusado; e aplicação isolada, cumulada ou alternada de pena privativa de liberdade.20

Desta feita, afirmamos que o rol exemplificativo de medidas constritivas está passível de aplicação ao longo de toda a persecução penal e durante o processo. Assim, devido ao fato do legislador não ter deixado claro na lei qual é o prazo de durabilidade da medida, pressupõe que o fator tempo, dependerá do fator necessidade.

Tais medidas, podem ser decretadas pelo juiz de oficio ou a requerimento das partes, ou na fase investigatória por representação da autoridade policial ou a requerimento do Ministério Público. A depender da adequação ao caso concreto e do estado das coisas (cláusula rebus sic stantibus), poderão ser substituídas cumuladas com outras, ou revogadas, caso não sejam mais necessárias.

De se ressaltar que não se aplicam aos crimes a que não for cominada, isolada ou cumulativamente, pena privativa de liberdade, assim dispõe o parágrafo 1º do artigo 283 do Código de Processo Penal.

4.4. PRISÃO ILEGAL POR ABUSO DE AUTORIDADE

A Lei nº 4.898 de 9 de dezembro de 1965 regulamenta o direito de representação e o processo para apuração de responsabilidade por abuso de autoridade, assegurando uma resposta aos abusos cometidos pelos agentes do Estado em matéria de prisão ilegal e a possibilidade de responsabilização do agente que supostamente esteja praticando a arbitrariedade consistente na manutenção de uma prisão ilegal.

Argumentando acerca do abuso de poder, Cândido Furtado Maia Neto propõe a imprescritibilidade do mesmo, evitando danos maiores contrários à ordem constitucional:

O abuso de poder e de autoridade são delitos graves que lesionam a humanidade, em geral vítimas diretas e indiretas, razão pela qual poderiam ser crimes imprescritíveis, contra a ordem constitucional e o Estado democrático.21

A Lei nº. 4.898/65 é instrumento de grande importância no combate às arbitrariedades praticadas contra o exercício legítimo dos mais diversos direitos individuais elencados pelo artigo 5º da Carta Magna.

A responsabilização deve ser apurada nas três esferas: administrativas, civil e penal (art. 6º.), podendo os processos ser promovidos simultaneamente, conforme informa o artigo 9º, assim redigido:

Art. 9º. Simultaneamente com a representação dirigida à autoridade administrativa ou independentemente dela, poderá ser promovida, pela vítima do abuso, a responsabilidade civil ou penal ou ambas, da autoridade culpada.

Depreende-se da Lei 4.898/65 a intenção do legislador em proteger o cidadão contra os atos abusivos nela assegurados, demonstrando também sua preocupação com a necessidade de reparar os danos sofridos pela vítima de arbitrariedades, quando prevê expressamente a possibilidade de simultaneamente ser promovida a responsabilidade civil ou penal ou ambas da autoridade culpada (art. 9º).

Ressalte-se que, em se tratando do artigo 9º da Lei 4.898/65, a ação competente deve ser proposta contra o Estado, em razão do preceituado pelo artigo 37, § 6º, da Constituição Federal, não somente por razões de ordem econômica ou prática, já que o Estado detém poder indenizatório maior do que o agente causador do dano, mas principalmente pelos fundamentos que norteiam a responsabilidade do Estado no Direito moderno, bem como pela desnecessidade de comprovação da culpa do agente público.

Ainda em relação ao direito de ação, adverte-se quanto ao ensinamento de Cândido Furtado Maia Neto22 ao lembrar que o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem insuficiência de recursos às vítimas de erro judiciário ou por abuso de poder, que comprovarem carência de recursos econômicos, através da Lei de Assistência Judiciária Gratuita (Lei nº 1060/1950) ou da Defensoria Pública (art. 133 e 134 da Constituição Federal).

4.5. ILEGALIDADE DA PRISÃO PREVENTIVA DEVIDO A FALTA DOS PRESSUPOSTOS LEGAIS

De acordo com o retro mencionado, reafirmamos que no ordenamento constitucional vigente, a liberdade é regra, excetuada apenas quando concretamente se comprovar, em relação ao indiciado ou réu, a existência de periculum libertatis.

Neste sentido, o parágrafo 6º do artigo 282 do Código de Processo Penal, estabelece o cabimento da prisão preventiva quando não for cabível a sua substituição por medida cautelar. Resta dizer que a legalidade da prisão preventiva está atrelada ao cumprimento dos seus pressupostos, quais sejam, os expressos no artigo 312 do Código de Processo Penal.

Descumpridos os requisitos ensejadores da prisão preventiva e efetivada a mesma sem observância dos pressupostos legais, estamos diante de um ato ilícito praticado pelo Estado, pois advém do descumprimento do seu dever legal de adotar todas as cautelas necessárias à efetivação da medida.

Cabe elucidar que o inciso LXXV do artigo 5º da Carta Maior, disciplina que “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”.

Destarte, restando demonstrados os requisitos para a configuração da responsabilidade subjetiva, quais sejam, o dano sofrido e o nexo de causalidade entre o referido dano e a atuação estatal, resta ao Estado a obrigação de indenizar.

Muito embora existam divergências doutrinárias acerca da responsabilidade do Estado por atos jurisdicionais, não o eximem do dever de reparar pelos danos causados aos jurisdicionados

Temos ainda, a teoria do risco administrativo, consagrada em sucessivos documentos constitucionais pátrios a partir da Carta Política de 1946 que confere fundamento doutrinário à responsabilidade civil objetiva do Poder Público pelos danos a que os agentes públicos houverem dado causa, por ação ou omissão, fazendo emergir da mera ocorrência de ato lesivo causado à vítima do Estado o dever de indenizá-la pelo dano pessoal e/ou patrimonial sofrido, independentemente de caracterização de culpa dos agentes estatais ou de demonstração de falta de serviço público.

Neste sentido, dispõe o artigo 37, parágrafo 6º da Carta Magna:

Art. 37, § 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

Dispõe a Carta da República, ao tratar dos direitos e garantias fundamentais: “Art. 5º - LXXV – o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”.

Segundo De Plácido e Silva (in Vocabulário Jurídico, Rio de Janeiro, 1998, p. 313), erro judiciário é o "erro de fato ocorrido nos julgamentos penais, em virtude do qual o juiz, fundado num engano ou num erro, referente à falsa ideia das circunstâncias acerca do crime, condena injustamente, o que depois pode motivar uma reparação ao injustiçado, tão logo se verifique a improcedência da condenação".23

Cabe registrar alguns entendimentos jurisprudenciais que coadunam com o dever de reparação do Estado:

HABEAS CORPUS - FURTO - PRISÃO PREVENTIVA - IDENTIDADE FALSA - INOCENTE PRESA EM LUGAR DE SUPOSTA CRIMINOSA - TERMO DE RETIFICAÇÃO - ANÁLISE APROFUNDADA DE PROVA - EXCESSO DE PRAZO - OCORRÊNCIA - CONCESSÃO DA ORDEM. É inviável a análise do pedido de reconhecimento de documento falso, e conseqüente revogação de prisão preventiva ao titular do documento verdadeiro, se não foi requerida, na instância primeva, a retificação, por termo, nos autos, consoante disposição do art. 259 do Código de Processo Penal. É sabido doutrinária e jurisprudencialmente que a ação constitucional de habeas corpus não se presta a discutir qualquer matéria que envolva análise aprofundada de provas. A prisão provisória que supera o prazo estabelecido no Provimento n.º 02/68 do Conselho Superior da Magistratura, sem que para isso haja justificativa razoável, torna-se ilegal e merece revogação. Ordem concedida. (TJMG HC nº 1.0000.07.467771-7/000. 5ª Câmara Criminal. Rel. Alexandre Victor de Carvalho. Publ. 28/03/2008).

Muito embora, na jurisprudência acima destacada, o pedido pela condenação do Estado em reparar o indivíduo e indenizá-lo, não esteja presente, podemos afirmar que restam comprovados os requisitos para a configuração do direito.

Indo adiante, citamos jurisprudências em que foram considerados procedentes os pedidos dos autores, devido a comprovação do dano e do nexo de causalidade:

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. PRISÃO PREVENTIVA. ILEGALIDADE. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. MÁCULA À DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. ERRO JUDICIÁRIO. COMPROVAÇÃO. DANO MORAL. CONFIGURAÇÃO. CRITÉRIO DE FIXAÇÃO. MAJORAÇÃO. ARTS. 5º, LXXV E 37, § 6º AMBOS DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. A prisão preventiva indevida do Autor somente ocorreu em razão de falha do Estado de Minas Gerais na correta identificação da sua pessoa, que, ao menos, foi identificada em relação ao delito, em tese, por ele cometido. Tal fato grave dá ensejo à reparação por dano moral, porquanto violador de princípios e direitos fundamentais da Constituição da República, como dignidade da pessoa humana, honra, imagem e liberdade. O desrespeito à dignidade da pessoa humana não pode ficar impune, razão pela qual o Requerente faz jus ao ressarcimento integral dos danos morais sofridos pela indevida mácula à sua honra, imagem e liberdade, decorrente de sua prisão indevida. No arbitramento do valor do dano moral, tendo em vista sua carga de subjetividade, deve ser estabelecido em quantia que sirva de reparação pela dor sofrida, bem como pela reprimenda ao ato praticado, não se podendo servir, ainda, como fonte de enriquecimento ilícito por parte do ofendido. (Número do processo: 1.0024.07.492315-2/001 / Relator: Des.(a) MARIA ELZA / Data do Julgamento: 05/03/2009 / Data da Publicação: 24/03/2009).

EMENTA: AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. RESPONSABILIDE CIVIL OBJETIVA. PRISÃO ILEGAL. HOMÔNIMO. DANOS MORAIS. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. Presentes os elementos constitutivos da responsabilidade civil objetiva a teor do art. 37, §6º da CR/88, forçoso reconhecer o dever indenizatório do Estado de Minas Gerais. Por fim, os honorários advocatícios devem ser fixados de forma a melhor atender os critérios do §4º do artigo 20 do Código de Processo Civil. Recurso conhecido e provido em parte. (Número do processo: 1.0024.07.441546-4/001 / Relator: Des.(a) ALBERGARIA COSTA / Data do Julgamento: 20/08/2009 / Data da Publicação: 02/10/2009)

Desta feita, passamos ao estudo específico da responsabilidade civil do Estado diante da prisão ilegal.

5. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO DIANTE DA PRISÃO ILEGAL

5.1. A RESPONSABILIDADE CIVIL

Desde os primórdios das civilizações antigas há a idéia de reação a uma ofensa e, por conseguinte, a responsabilização por um dano causado, levando a restauração do equilíbrio moral e patrimonial desfeito, buscando não prejudicar o outro. Tal tendência na sociedade é no sentido de não haver vítima de dano sem sua devida reparação. Isso reflete diretamente no instituto da responsabilidade civil, uma vez que tem proporcionado um fenômeno de expansão dos danos suscetíveis de indenização.

Desta forma, a responsabilidade civil constitui um dos temas de maior relevância jurídica da atualidade por sua surpreendente evolução e disseminação nas relações humanas e sociais, e, por isso, sua repercussão em todos os ramos do direito.

Várias são as classificações da responsabilidade civil no direito hodierno. Maria Helena Diniz apresenta o conceito de responsabilidade civil e determina:

A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem uma pessoa a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros, em razão de ato por ela mesma praticado, por pessoa por quem ela responde, por alguma coisa a ela pertencente ou de simples imposição legal.24

Por conseguinte, a responsabilidade pode ser definida como a aplicação de medidas que obrigam a reparar o dano causado a outrem em razão de sua ação ou omissão. Para Sérgio Cavalieri Filho responsabilidade civil é

um dever jurídico sucessivo que surge para recompor o dano decorrente da violação de um dever jurídico originário. Só se cogita, destarte, de responsabilidade civil onde houver violação de um dever jurídico e dano. Em outras palavras, responsável é a pessoa que deve ressarcir o prejuízo decorrente da violação de um precedente dever jurídico. E assim é porque a responsabilidade pressupõe um dever jurídico preexistente, uma obrigação descumprida.25

A responsabilidade pode ser subjetiva ou objetiva. A responsabilidade será subjetiva quando depender de constatação do elemento subjetivo culpa. A responsabilidade será objetiva quando prescindir da culpa. Isso porque, na acepção de César Augusto de Castro Fiúza: “a responsabilidade sem culpa recebe o nome de responsabilidade objetiva, por se basear apenas na ocorrência do dano.”26 Enquanto a responsabilidade subjetiva decorre necessariamente de ato ilícito, a responsabilidade objetiva pode decorrer de ato lícito (teoria do risco) ou ilícito.

A responsabilidade está pautada em uma sanção que tem como pressuposto uma infração ou um ato ilícito. Destarte, na responsabilidade civil objetiva, baseada na teoria do risco, é irrelevante a conduta do agente, sendo suficiente a existência do dano e o nexo de causalidade entre o fato e o dano, requisitos legitimados pelo art. 187 ao versar que o dano deve ser reparado independentemente de culpa.

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes.

Na análise do artigo 186 CC/02 é possível identificar os elementos da responsabilidade civil, que são: a conduta culposa do agente, nexo causal, dano e culpa. Este artigo é o alicerce da responsabilidade civil, e consagra o princípio de que a ninguém é dado o direito de causar prejuízo a outrem.

Na lição de Fernando Noronha, para que surja a obrigação de indenizar são necessários os seguintes pressupostos:

1. que haja um fato (uma ação ou omissão humana, ou um fato humano, mas independente da vontade, ou ainda um fato da natureza), que seja antijurídico, isto é, que não seja permitido pelo direito, em si mesmo ou nas suas consequências;

2.que o fato possa ser imputado a alguém, seja por dever a atuação culposa da pessoa, seja por simplesmente ter acontecido no decurso de uma atividade realizada no interesse dela;

3.que tenham sido produzidos danos;

4. que tais danos possam ser juridicamente considerados como causados pelo ato ou fato praticado, embora em casos excepcionais seja suficiente que o dano constitua risco próprio da atividade do responsável, sem propriamente ter sido causado por esta.27

Para melhor acepção dos enunciados, mister ressaltar as palavras de Heraldo Garcia Vitta,

O ilícito é a conduta (ação ou omissão) que contravém o mandamento da norma, a qual estabelece consequência jurídica, institucionalizada, organizada normativamente: a sanção. Assim, conforme se vê, apenas quando houver descumprimento do mandamento da norma jurídica, poder-se-á falar em ilícito e sua consequência (a sanção). 28

Assim, a comprovação de atos do Estado praticados com ilegalidade ou abuso de poder devem ensejar direito à reparação civil pelos danos materiais e morais eventualmente sofridos em decorrência destes.

Especificamente quando da privação ou cerceio injusto do direito constitucional do indivíduo de ir e vir, o art. 5º, inc. LXXV, da CF/1988, prevê que “o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença.”

Por outro lado, o Código Civil arrola nos incisos do art. 954, como atos ofensivos da liberdade pessoal, o cárcere privado, a prisão por queixa ou denúncia falsa e de má-fé e a prisão ilegal. Trata-se de rol meramente exemplificativo, lembrando a doutrina que:

há inúmeras hipóteses de prisão indevida por abuso por parte da autoridade policial, sem que venha a vítima a ser objeto de investigação ou de ação penal. Também nesses casos impõe-se a responsabilização do Estado, posto que o abuso do direito, como o abuso do poder, são ensancha à reparação por parte do Estado, respondendo o servidor civil e penalmente e, ainda, no plano administrativo, para efeito de demissão.

Do que decorre que nem a Constituição, nem a Lei Civil estabelecem hipóteses clausuladas de ofensa à liberdade pessoal. [...]

São, portanto, hipóteses de prisão indevida por erro judicial (e não erro judiciário) que se traduzem em ofensa à liberdade pessoal e que também empenham a responsabilidade do Estado, por força das garantias asseguradas no art. 5º da CF/88 e art. 954 do CC, pois, como estabelece o §2º do art. 5º daquela Carta, 'os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela dotados29.

Isto posto, considerando-se que se trata de equacionamento da atuação estatal, a responsabilidade civil pelo evento danoso deve ser analisada à luz da teoria do risco administrativo, fundamento para a responsabilidade objetiva, preceituada no artigo 37, § 6o, da Constituição Federal.

5.2. A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO

A Constituição Federal de 1988 disciplinou a extensão da responsabilidade civil do Estado, no seu parágrafo 6° do artigo 37:

Art. 37 - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e também, ao seguinte:

§ 6º - As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.

A responsabilidade descrita é objetiva, haja vista que não precisa provar a ocorrência do dano, somente a relação de causalidade entre este e seu causador. Destarte, a culpa do Estado é inferida do ato lesivo da Administração. Basta a comprovação pela vítima, do fato danoso e injusto decorrente de ação ou omissão do agente público para que o Estado seja obrigado a recompor o dano causado.

Celso Antônio Bandeira de Mello esclarece que:

No que atina às condições para engajar responsabilidade do Estado, seu posto mais evoluído é a responsabilidade objetiva, a dizer, independentemente de culpa ou procedimento contrário ao Direito. Essa fronteira também já é território incorporado, em largo trecho, ao Direito contemporâneo. Aliás, no Brasil, doutrina e jurisprudência, preponderantemente, afirmam a responsabilidade objetiva como regra de nosso sistema, desde a Constituição de 1946 (art. 194), passando pela Carta de 1967 (art. 105), pela Carta de 1969, dita Emenda 1 à Constituição de 1967 (art. 105), cujos dispositivos, no que a isto concerne, equivalem ao atual art. 37, § 6º.30

Assim, as últimas Constituições já demonstravam a obrigação do Estado em restaurar o dano sofrido ilegalmente pelo particular. Depreende-se ainda do texto legal a expressa adoção da teoria do risco administrativo como fundamento da responsabilidade do Estado, ao condicionar a responsabilidade objetiva ao dano decorrente da sua atividade administrativa, conforme lição de Antônio Luiz Soares Hentz:

Adotou a Constituição, assim, a teoria da responsabilidade objetiva estatal, em razão de que bastam o ato ou a omissão, o dano e o nexo de causalidade, sendo desnecessária a perquirição sobre a intenção do agente. Deve-se observar, ainda, que o foco da norma constitucional é a reparação do dano, e não o caráter lícito ou ilícito da ação ou da omissão do agente.31

Desta sorte nos remete Maria Helena Diniz:

A responsabilidade civil das pessoas jurídicas de direito público funda-se nas suas relações com os administrados na teoria do risco, em razão de comportamentos comissivos e omissivos danosos, caso em que será objetiva (CF/88, art. 37, §6°).32

Como exemplo dessa concepção, apresenta-se o julgado do Colendo Tribunal de Justiça de Minas Gerais:

ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. RESPONSABILIDADE CIVIL. PRISÃO INDEVIDA. INDENIZAÇÃO. DEVER DO ESTADO. A prisão injustificada do cidadão caracteriza abuso de direito da autoridade policial, acarretando àquele dano de ordem moral, que deve ser indenizado pelo Estado, cuja responsabilidade é objetiva. (AC nº. 1.0105.07.212253-1/001, Comarca de Governador Valadares, 6ª CC., rel. Des. Antônio Sérvulo, j. 15/06/2010).

Nos dizeres de Kiyoshi Harada:

A responsabilidade civil do Estado, por atos comissivos ou omissivos de seus agentes, é de natureza objetiva, isto é, prescinde da comprovação de culpa. Neste particular, houve uma evolução da responsabilidade civilística, que não prescinde da culpa subjetiva do agente, para a responsabilidade pública, isto é, responsabilidade objetiva. Esta teoria é a única compatível com a posição do Poder Público ante os seus súditos, pois, o Estado dispõe de uma força infinitamente maior que o particular. Aquele, além de privilégios e prerrogativas que o cidadão não possui, dispõe de toda uma infra-estrutura material e pessoal para a movimentação da máquina judiciária e de órgãos que devam atuar na apuração da verdade processual. Se colocasse o cidadão em posição de igualdade com o Estado, em uma relação jurídica processual, evidentemente, haveria um desequilíbrio de tal ordem que comprometeria a correta distribuição da justiça.33

Deste modo, a responsabilidade estatal, como já expresso, funda-se na obrigação de reparar do Estado ao dano que causou a bens juridicamente protegidos pertencentes a seus administrados, no desempenho de seus atos ou omissões, tanto lícitos quanto ilícitos. De tal forma, incumbe ao Estado o dever constitucional de indenizar terceiros lesados por atos praticados por seus agentes pela deficiente consecução das atividades da administração, sem suprimir o direito de regresso estatal contra o causador direto do dano.

Odete Medauar assim esclarece:

Informada pela teoria do risco, a responsabilidade do Estado apresenta-se, hoje, na maioria dos ordenamentos, como responsabilidade objetiva. Nessa linha, não mais se invoca o dolo ou culpa do agente, o mau funcionamento ou falha da Administração. Necessário se torna existir relação de causa e efeito entre ação ou omissão administrativa e dano sofrido pela vítima. É o chamado nexo causal ou nexo de causalidade. Deixa-se de lado, para fins de ressarcimento do dano, o questionamento da licitude ou ilicitude da conduta, o questionamento do bom ou mau funcionamento da Administração. Demonstrado o nexo de causalidade, o Estado deve ressarcir.34

José dos Santos Carvalho Filho, ao tratar da responsabilidade do Estado, também consigna:

Para configurar-se esse tipo de responsabilidade, bastam três pressupostos. O primeiro deles é a ocorrência do fato administrativo, assim considerado como qualquer forma de conduta, comissiva ou omissiva, legítima ou ilegítima, singular ou coletiva, atribuída ao Poder Público. (...)

O segundo pressuposto é o dano. Já vimos que não há falar em responsabilidade civil sem que a conduta haja provocado um dano. Não importa a natureza do dano, tanto é indenizável o dano patrimonial como o do dano moral. (...) O último pressuposto é o nexo causal (ou relação de causalidade) entre o fato administrativo e o dano. Significa dizer que ao lesado cabe apenas demonstrar que o prejuízo sofrido se originou da conduta estatal, sem qualquer consideração sobre o dolo ou culpa. (...) O nexo de causalidade é fator de fundamental importância para a atribuição de responsabilidade civil do Estado. (...) A responsabilidade objetiva do Estado se dará pela presença dos seus pressupostos - o fato administrativo, o dano e o nexo causal.35

Relatando ainda sobre a responsabilidade objetiva estatal, expõe Carlos Ari Sundfeld, que o Estado não é responsabilizado aleatoriamente, mas apenas naquilo que contenha nexo de causalidade entre a conduta estatal e o dano:

Para, diante de um evento lesivo, configurar-se a responsabilidade estatal, necessária a existência de relação de causa e efeito entre o comportamento do Estado (positivo ou negativo, isto é, uma ação ou omissão) e o dano provocado. A responsabilidade objetiva não faz do Estado um segurador universal, mas apenas o obriga a suportar os prejuízos que gere, direta ou indiretamente [...]. Quando se tratar de dano derivados de comportamento positivo (por ação), pouco importa a juridicidade ou ilegitimidade da conduta estatal: havendo nexo de causalidade entre esta e o dano, surge a vinculação do Estado [...]. Entretanto, quando em pauta a responsabilidade por comportamento negativo, o Estado só responderá se houver omitido dever que lhe tenha sido prescrito pelas normas; não se sua inação for lícita. É que o ‘conceito de omissão, em direito, está ligado ao de ilicitude’. Sob o ponto de vista jurídico, a mera inação não configura omissão; esta só se apresenta quando, tendo o dever de agir, o sujeito fica inerte.36

Retomando, diante da definição de responsabilidade civil, verifica-se que nela estão presentes os requisitos para a configuração do dever de indenizar: ação, dano e nexo de causalidade entre o dano e a ação. A ação, elemento constitutivo da responsabilidade, vem a ser, segundo Maria Helena Diniz

o ato humano, comissivo ou omissivo, ilícito ou lícito, voluntário e objetivamente imputável, do próprio agente ou de terceiro, ou o fato de animal ou coisa inanimada, que cause dano a outrem, gerando o dever de satisfazer os direitos do lesado.37

Não poderá haver dever de reparar se não tiver um prejuízo, ou seja, “dano consiste no prejuízo sofrido pelo agente. Pode ser individual ou coletivo, moral ou material, ou melhor, econômico e não econômico”38.

O nexo causal é o vínculo existente entre a ação e o dano, por meio do qual conclui-se quem foi o agente. O ônus da prova do nexo causal cabe ao autor da demanda.

Além disso, a responsabilidade civil do Estado também pode ser encontrada na legislação comum, conforme estipula o artigo 43 do Código Civil de 2002, que "as pessoas jurídicas de direito público interna são civilmente responsáveis por atos dos seus agentes que nessa qualidade causem danos a terceiros, ressalvado direito regressivo contra os causadores do dano, se houver, por parte destes, culpa ou dolo", repetindo a redação do §6º do artigo 37 da CR/88.

Cabe ressaltar que José dos Santos Carvalho Filho chama a atenção para o fato de o texto constitucional fazer menção a duas categorias de pessoas sujeitas à responsabilidade objetiva, quais sejam, as pessoas jurídicas de direito público e as pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de direito público e assim estabelece:

Em relação a primeira categoria, não há novidade. São objetivamente responsáveis as pessoas jurídicas de direito público: as pessoas componentes da federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), as autarquias e as fundações públicas de natureza autárquica. A segunda categoria constituiu inovação no mandamento constitucional – as pessoas de direito privado prestadoras de serviços públicos. A intenção do Constituinte foi a de igualar, para fins de sujeição à teoria da responsabilidade objetiva, as pessoas de direito público e aquelas que, embora com personalidade jurídica de direito privado, executassem funções que, em princípio, caberiam ao Estado. Com efeito, se tais serviços são delegados a terceiros pelo próprio Poder Público, não seria justo nem correto que a só delegação tivesse o efeito de alijar a responsabilidade objetiva estatal e dificultar a reparação de prejuízos pelos administrados.39

Lado outro, dispõe o art. 37, §6º, da CF que o Estado é civilmente responsável pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, venham a causar a terceiros. Sendo assim, acredita-se que o Estado não pode causar dano a ninguém, posto não se tratar de pessoa física. Ocorre que os agentes atuam pelo Estado, visto serem pessoas físicas capazes de expressar suas vontades. Todavia, essa vontade é imputada ao Estado, sendo este o responsável civil pelos danos causados.

Semelhante é a observação levantada por Kiyoshi Harada:

A expressão funcionário público, empregada pelas diversas Cartas Políticas, deve ser interpretada em seu sentido mais amplo. Abarca, para fins de responsabilidade civil objetiva do Estado, qualquer pessoa incumbida da execução de qualquer obra ou serviço público. É sinônimo de agente administrativo ou agente público, isto é, todo aquele que presta serviços à Administração Pública, direta ou indireta. Engloba, também, os agentes políticos que são apenas os governantes e seus auxiliares diretos como os Ministros e Secretários das diversas partes do Poder Executivo, bem como os membros de Poder.

Para efeito de responsabilização civil do Estado não importa que o agente público, que praticou o ato ou a omissão administrativa, estivesse irregularmente investido no cargo ou na função. O importante é que o dano causado a terceiro decorra da ação ou omissão do agente público no exercício de suas funções ou a pretexto de exercê-las. De fato, é indiferente para a vítima o título pelo qual o causador do dano esteja vinculado à entidade política. Outrossim, dano decorrente de abuso do agente público no exercício de suas atribuições não exime o Estado da sua responsabilidade objetiva, antes a agrava, pois caracteriza-se aí a culpa in eligendo.40

Nesse ínterim, ensina José dos Santos Carvalho Filho:

Importa lembrar que o Estado, como pessoa jurídica, é um ser intangível. Somente se faz presente no mundo jurídico através de seus agentes, pessoas físicas cuja conduta é a ele imputada. O Estado, por si só, não pode causar danos a ninguém. Sendo assim, o cenário concernente ao tema que estudamos se compõe de três sujeitos: o Estado, o lesado e o agente do Estado. Nesse cenário, o Estado, segundo o direito positivo, é civilmente responsável pelos danos que seus agentes causarem a terceiros. Sendo-o, incumbe-lhe reparar os prejuízos causados, ficando obrigado a pagar as respectivas indenizações.41

O autor42 alega ainda que a expressão “nessa qualidade” tem razão de ser, porque só pode o Estado ser responsabilizado se o preposto estatal estiver no exercício de suas funções ou, ao menos, se esteja conduzindo a pretexto de exercê-la. Desse modo, se causar dano a terceiro no correr de sua vida privada, sua responsabilidade é pessoal e regida pelo Direito Civil.

5.3. A INDENIZAÇÃO DA PRISÃO ILEGAL

As ações indenizatórias baseadas em prisão ilegal têm supedâneo na Constituição Federal de 1988 (art. 5º, incisos LVII, LXV e LXXV), no Código de Processo Penal (art. 630) e no Código Civil de 2002 nos arts. 186, 927, 954 "caput" e parágrafo.

Art. 5º. [...]

LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória; [...]

LXV - a prisão ilegal será imediatamente relaxada pela autoridade judiciária; [...]

LXXV - o Estado indenizará o condenado por erro judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença.

O Código de Processo Penal, ao tratar da ocorrência em revisão criminal:

Art. 630. O tribunal, se o interessado o requerer, poderá reconhecer o direito a uma justa indenização pelos prejuízos sofridos.

§ 1º. Por essa indenização, que será liquidada no juízo cível, responderá a União, se a condenação tiver sido proferida pela justiça do Distrito Federal ou de Território, ou o Estado, se o tiver sido pela respectiva justiça.

§ 2º. A indenização não será devida:

a) se o erro ou a injustiça da condenação proceder de ato ou falta imputável ao próprio impetrante, como a confissão ou a ocultação de prova em seu poder;

b) se a acusação houver sido meramente privada.

E finalmente o Código Civil:

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.

Art. 954. A indenização por ofensa à liberdade pessoal consistirá no pagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e se este não puder provar prejuízo, tem aplicação o disposto no parágrafo único do artigo antecedente.

Parágrafo único. Consideram-se ofensivos da liberdade pessoal:

I - o cárcere privado;

II - a prisão por queixa ou denúncia falsa e de má-fé;

III - a prisão ilegal.

Demonstrado o nexo de causalidade entre a conduta do Poder Público em cumprir ordem judicial e o evento danoso, qual seja, a prisão ilegal do autor, impõe-se reconhecer a responsabilidade civil do Estado.

Ao entender necessário, para a boa convivência entre o poder do Estado e o respeito ao direito do cidadão, a menção explícita da possibilidade de indenização por prisão indevida, o legislador buscou um equilíbrio indispensável à vida social por intermédio da boa aplicação do Direito. O intuito principal, numa projeção ainda da dignidade da pessoa humana, proclamada como fundamento do Estado Democrático de Direito que se instaurava, poderá ser visto como o soerguimento da pessoa humana à estatura de único e verdadeiro destinatário das ações estatais. Desse modo, da atuação do Estado não pode advir à coletividade senão benefícios. E a prisão de alguém, sem correspondência com a condenação legítima emanada do órgão estatal com poderes para tanto, fere não só o direito abstratamente considerado, mas também in concreto a esfera de direitos do cidadão protegidos constitucionalmente, como se dá com a liberdade.43

Insta assinalar que a jurisprudência acompanha o entendimento doutrinário no sentido de que em caso de decretada prisão de maneira ilegal, a mesma enseja reparação.

Tal entendimento é corroborado pelo Egrégio Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro:

APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. PRISÃO ILEGAL. DANO MORAL. Sentença de improcedência. Inconformidade recursal que merece acolhida. Em face da teoria do risco administrativo (art. 37, § 6º, da CF), o Estado responde objetivamente pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Prova dos autos a demonstrar a indevida restrição da liberdade. Ordem de prisão originariamente legal. Demora de quase 27 anos para seu cumprimento. Prescrição da pretensão punitiva e abolitio criminis. Ordem judicial que impeliu os policiais a efetuaram a prisão, que possuía aparência de legalidade. Todavia, naquele momento, o direito estatal de punir já estava extinto, a impor o reconhecimento de ilegalidade da prisão. Decisão proferida em sede de Habeas Corpus, que ratifica a ilegalidade do ato de prisão. Precedentes do eg. STJ, no sentido de que, para o ressarcimento do particular, basta a discussão sobre a responsabilidade objetiva, sendo desnecessária e irrelevante a verificação da responsabilidade subjetiva do agente causador do dano. Indevido cerceamento do direito de ir e vir e ofensa à dignidade da pessoa humana. Induvidosa responsabilidade civil do Estado. Precedentes do eg. STJ. Dano moral. Ofensa à liberdade e à dignidade da pessoa humana, que não exige a comprovação dos seus reflexos, os quais emergem in re ipsa. Verba indenizatória. Parâmetros. Intensidade do sofrimento da vítima, reprovabilidade do ato do causador do dano e caráter punitivo da reparação. Valor de R$ 20.000,00, que guarda observância aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, além de estar em consonância com a média fixada pelo eg. STJ para casos desse jaez. Art. 557, §1º-A do CPC. Sentença em testilha com jurisprudência dominante do eg. STJ. PARCIAL PROVIMENTO DO RECURSO. APELAÇÃO 0001934-74.2009.8.19.0033 - 1ª Ementa. DES. CELIA MELIGA PESSOA - Julgamento: 01/04/2011 – 18ª CC.

Pelo exposto e diante do direito assegurado pela Constituição Federal de indenização pelo Estado ao sujeito que for preso ilegalmente, é incontroverso o dever de indenização pelo Estado nestes casos, conforme Luiz Antonio Soares Hentz determina: “submetido o réu à prisão indevida, não importa o motivo, fará jus a indenização às custas do Estado. O caso é de responsabilidade ex vi legis, atribuindo o legislador obrigação ao poder público.”44

Cabe lembrar a lição de Cândido Furtado Maia Neto que ressalta ser a indenização paga à vítima da prisão ilegal cabível dentro do orçamento do ente estatal que gerou o dano, conforme se depreende:

No contexto do Estado Democrático de Direito a configuração de um erro judiciário cometido por magistrados ou representantes do Ministério Público, o “quantum” da indenização e/ou o valor monetário do ressarcimento financeiro, não mais deve sair somente dos cofres do Executivo, propriamente dito, como ocorrida outrora, mas sim do orçamento de cada Poder ou instituição estatal. O ordenamento jurídico enquadra esta questão no sistema republicano de governo, seja a nível federal, estadual ou municipal à luz da Lei de Responsabilidade Fiscal.

“A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios...” (art. 1º CF), assim deve ser respeitada a divisão dos Poderes, as competências e as atribuições específicas, as previsões orçamentárias definidas na Carta Magna, na Lei de Responsabilidades Fiscais e na Lei de Diretrizes Orçamentárias, em observância aos princípios da representação popular, da responsabilidade funcional ou administrativa, da indelegabilidade de funções - “no judex ex officio” -, como reitores do Estado Democrático de Direito que proíbe transferências de encargos públicos, delegações de funções judiciais e/ou entre Poderes Públicos.

É importante ressaltarmos. Nesta ótica jurídica e em base a devida aplicação e interpretação do dispositivo constitucional referente ao erro judiciário, todos os agentes políticos, servidores e funcionário públicos estão obrigados a atuarem sob o maior e estrito respeito às leis e à Constituição federal, especialmente no que se refere às garantias fundamentais individuais e coletivas da cidadania.45

Desta forma, pretende-se facilitar as ações de regresso do determinado ente estatal contra seu agente que, de fato, deu causa ao dano experimentado pelo particular.

5.3.1. O dano patrimonial

Em verdade, para que haja reparação ou para que seja configurada a responsabilidade civil do Estado, faz-se necessário a ocorrência de um dano indenizável. Assim, “resume-se o dano à conseqüência de uma desacertada atuação do poder público.”46

Relativamente ao desmembramento do dano, o esperado é que este seja produzido no presente e, em regra, cause diminuição patrimonial, podendo também ter efeitos negativos de ordem moral para o lesado (dano emergente). Desta maneira, a devida indenização “deve corresponder ao valor de avaliação da diminuição sentida pelo lesado em seu patrimônio, seja de natureza material, atingindo o patrimônio da pessoa e consistindo em perda monetária decorrente da sua redução (dano emergente).”47

Ocorre que em alguns casos, essa diminuição patrimonial ou moral tem seus reflexos voltados para o futuro, frustrando o lesado de benefícios afins (lucro cessante). Nesta esteira, a indenização deve corresponder ao valor “da supressão de possibilidade de seu aumento (lucro cessante)”.48

Dano emergente e lucro cessante podem ocorrer simultaneamente ou isoladamente, tudo dependendo da análise do caso concreto. Para se aferir a existência de lucro cessante é necessário mais do que a mera possibilidade de prejuízo futuro. Todavia, se de um lado a simples possibilidade não é suficiente para existência do lucro cessante, de outro lado também não é de se exigir certeza absoluta.

Logo, essa responsabilização civil deve abranger o dano emergente e os lucros cessantes, conforme artigos 1059 a 1061 do Código Civil. Indeniza-se o credor do dano efetivamente verificado, isto é, a diminuição do patrimônio sofrido pelo credor, bem como, a privação de um ganho que deixou de auferir ou de que foi privado o referido credor, em razão do comportamento comissivo ou omissivo do agente público ou daquele que faz as suas vezes.

Por isso o texto do art.1059 do CC refere-se às perdas e danos e ao que razoavelmente deixou de lucrar. Esta última expressão está a exigir bases seguras e fundadas para a indenização dos lucros cessantes. Não são indenizáveis os lucros imaginários, sob pena de propiciar locupletamento ilícito ao credor. Outrossim, a indenização deve abranger os juros moratórios, os honorários advocatícios arbitrados pelo juiz, bem como, a atualização monetária, segundo pronunciamento pacífico de nossos tribunais.49

O dano pode ser reparado de forma natural (ou específica) e pela indenização pecuniária, embora a reparação natural seja aquela que maior afinidade possui para o fim de recompor a situação anterior do lesado (statu quo ante); o que ocorre é que, em face da dificuldade de se estabelecer a reparação específica, devido a problemas de ordem prática atribuídos ao caso concreto, notadamente quando o dano tem como característica a destruição do objeto, o certo é que a reparação pecuniária acaba por ser a mais privilegiada e preferida para recompor o prejuízo havido, legitimando essa última forma de indenização pois sua finalidade, como é óbvio, também é a compensação ou recomposição patrimonial do lesado.

Especificamente em se tratando de prisão indevida e no que diz respeito ao dano patrimonial, deverá ser avaliado o prejuízo efetivo sentido pelo lesado conforme a realidade do caso concreto, podendo a indenização ter caráter alimentar ou ter natureza de recomposição patrimonial propriamente dita, restringindo-se nesta última hipótese ao restabelecimento do statu quo ante.

Mais comum, entretanto, é que o prejuízo decorra da perda de remuneração ou rendimentos devido a impossibilidade de exercício de sua profissão (e até mesmo diminuição patrimonial em razão de depreciação da reputação do ofendido junto ao seu círculo de negócios), hipóteses em que a justa avaliação deve ser efetuada computando-se o salário ou rendimentos que o ofendido deixou de perceber injustamente por conta da injusta privação de sua liberdade, na forma como disposto nos artigos 953 e 954 do Código Civil, dentre outros.

Maria Helena Diniz nos adverte acerca da exigibilidade e legitimidade para propor a reparação do dano experimentado.

A exigibilidade do ressarcimento do dano pertence a todos os que efetivamente experimentaram o prejuízo, isto é, aos lesados diretos ou indiretos (CC, art. 12, parágrafo único). Assim sendo, caberá, em regra, à vítima (lesado direto), que sofreu uma lesão em seu patrimônio ou em sua pessoa, o direito de pleitear, judicialmente, a indenização, desde que prove o liame de causalidade, o prejuízo, a culpabilidade do lesante, se, obviamente, não de tratar de culpa presumida ou de responsabilidade objetiva.50

Silvio de Salvo Venosa salienta que

reparar o dano, qualquer que seja sua natureza, significa indenizar, tornar indene o prejuízo. Indene é que se mostra íntegro, perfeito, incólume. O ideal de justiça é que a reparação de dano seja feita de molde que a situação anterior seja reconstruída.51

Acrescenta ainda que nem sempre será possível indenizar exatamente o valor da perda, ao mesmo tempo em que não se pode converter a indenização em lucro ou enriquecimento injusto para a vítima.52

5.3.2. O dano moral

Diferente do dano material que pode abranger dano emergente e lucro cessante, o dano moral é avaliado não pela repercussão no patrimônio do lesado, mas sim em razão da importância e pelo fato da ofensa perpetrada, presumindo-se assim a existência do dano.

Luiz Antonio Soares Hentz explica que

No dano moral, com efeito, não há diminuição patrimonial sentida em termos monetários, o que tem ensejado algumas discussões sobre o seu cabimento. O dano moral é o que atinge aspectos não econômicos dos bens jurídicos da pessoa. É uma ofensa ao patrimônio não-econômico, não se confundindo com o dano material, que implica diminuição patrimonial. Nem significa tais afirmativas que o dano patrimonial descaracteriza o dano moral, sendo possível resultar da concomitância de lesões duas indenizações, uma pelo dano material e outra pelo dano moral.53

A avaliação do dano moral deve revestir-se de caráter compensatório, produzindo-se uma contrapartida pelo mal sofrido (dor, sentimento de perda, constrangimento, etc.). Deve, pois, ser levado em consideração para a apuração do valor da indenização, dentre outros fatores: a gravidade do dano, a situação familiar e social do lesado, bem como sua reputação; ou seja, a quantia a ser arbitrada deve observar a situação pessoal do ofendido e, sendo o caso, também as posses do ofensor, de maneira a permitir que a compensação seja a mais justa possível e, por outro lado, não se permitindo que haja enriquecimento sem causa do lesado.

Saliente-se que a dificuldade em se avaliar a indenização do dano moral nas hipóteses de prisão indevida é amenizada pela existência das regras contidas nos artigos 944 a 947, 954 e parágrafo único do artigo 953 do Código Civil, que, consoante o arbítrio do juiz, levará em consideração quais foram os aspectos da personalidade lesados e a sua extensão, notadamente se em face da privação indevida da liberdade ocorrerem lesões físicas com reflexo no aspecto moral do ofendido.

Acerca do tema, tem-se a doutrina de Maria Helena Diniz:

Na reparação do dano moral, o juiz determina, por equidade, levando em conta as circunstâncias de cada caso, o quantum da indenização devida, que deverá corresponder à lesão e não ser equivalente, por ser impossível, tal equivalência. A reparação pecuniária do dano moral é um misto de pena e satisfação compensatória. Não se pode negar sua função: penal, constituindo uma sanção imposta ao ofensor; e compensatória, sendo uma satisfação que atenue a ofensa causada, proporcionando uma vantagem ao ofendido, que poderá, com a soma de dinheiro recebida, procurar atender a necessidades materiais ou ideais que repute convenientes, diminuindo, assim, seu sofrimento54.

Digna de nota, ainda, a seguinte lição de Rui Stoco, onde determina que o pagamento pelo dano moral:

deve representar para a vítima uma satisfação, igualmente moral, ou seja, psicológica, capaz de neutralizar ou 'anestesiar' em alguma parte o sofrimento impingido. A eficácia da contrapartida pecuniária está na aptidão para proporcionar tal satisfação em justa medida, de modo que tampouco signifique um enriquecimento sem causa da vítima, mas está também em produzir no causador do mal impacto bastante para dissuadi-lo de igual e novo atentado. Trata-se, então, de uma estimação prudencial [...] A composição do dano moral causado pela dor, ou o encontro do 'pretium doloris' há de representar para a vítima uma satisfação, igualmente moral, ou seja, psicológica, e uma compensação pela perda de um bem insubstituível.55

No mais, o dano moral sofrido pela vítima de prisão ilegal é presumido, sendo desnecessária a sua comprovação. Isso porque a Constituição de 1988 consagrou o direito à indenização pelo chamado dano moral puro (art. 5º, V), indenizável a partir do momento em que o ato ou fato danoso causa ao ofendido dor, molestação ou angústia, por atingir direitos da personalidade. O ofendido não precisa fazer prova desses incômodos, o que, a rigor, seria quase impossível. Basta provar o ato ou fato danoso e o seu causador.

Instado a se manifestar sobre o tema, o colendo Superior Tribunal de Justiça assim se expressou:

DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA. PRISÃO ILEGAL. DANOS MORAIS. 1. O Estado está obrigado a indenizar o particular quando, por atuação dos seus agentes, pratica contra o mesmo, prisão ilegal. 2. Em caso de prisão indevida, o fundamento indenizatório da responsabilidade do Estado deve ser enfocado sobre o prisma de que a entidade estatal assume o dever de respeitar, integralmente, os direitos subjetivos constitucionais assegurados ao cidadão, especialmente, o de ir e vir. 3. O Estado, ao prender indevidamente o indivíduo, atenta contra os direitos humanos e provoca dano moral ao paciente, com reflexos em suas atividades profissionais e sociais. 4. A indenização por danos morais é uma recompensa pelo sofrimento vivenciado pelo cidadão, ao ver, publicamente, a sua honra atingida e o seu direito de locomoção sacrificado. 5. A responsabilidade pública por prisão indevida, no direito brasileiro, está fundamentada na expressão contida no art. 5º, LXXV, da CF. 6. Recurso especial provido (REsp. n.º 220.982/RS, 1ª T., rel. Min. José Delgado, j. 22/02/2000, DJ 03/04/2000, p. 116).

O Colendo Tribunal de Justiça de Santa Catarina também se manifesta dessa maneira.

RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO - PRISÃO EM FLAGRANTE - INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS - PRIVAÇÃO DE LIBERDADE EFETIVADA FORA DOS REQUISITOS LEGAIS - INEXISTÊNCIA DE INFRAÇÃO À LEI PENAL INCRIMINADORA - REPARAÇÃO DEVIDA - AFRONTA AO PRINCÍPIO CONSTITUCIONAL DE LIBERDADE (ART. 5º DA CRFB). Configura constrangimento ilegal à pessoa e afronta à garantia constitucional de liberdade (art. 5°, caput, da CRFB) a prisão em flagrante realizada sem que o cidadão tenha efetivamente infringido a lei penal incriminadora. Portanto, deve o Poder Público compensar o dano moral advindo do ato praticado por seus agentes. (TJSC - AC n. 2006.010084-1, Comarca de Blumenau, Relator: Des. Volnei Carlin, julgada em 08/06/2006).

CIVIL - ESTADO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - PRISÃO ILEGAL - DANOS MORAIS - OCORRÊNCIA - FIXAÇÃO DO QUANTUM DELEGADA AO PRUDENTE ARBÍTRIO DO JULGADOR – HONORÁRIOS. 1. Demonstrado de forma inequívoca que a prisão foi abusiva e ilegal, bem assim as agressões infligidas no detido, torna-se inafastável a responsabilidade do Estado em indenizar os danos suportados pelo ofendido. A responsabilidade em casos tais é objetiva (CF, art. 37, § 6º). 2. Na fixação do valor dos danos morais deve o julgador, na falta de critérios objetivos, estabelecer o quantum indenizatório com prudência, de modo que sejam atendidas as peculiaridades e a repercussão econômica da reparação, devendo esta guardar proporcionalidade com o grau de culpa e o gravame sofrido. 3. Na ausência de circunstâncias especiais, sedimentou-se a jurisprudência da Corte no sentido de que a fixação dos honorários advocatícios, quando se tratar de pessoa jurídica de direito público, deve se situar no patamar de 10% sobre o valor da condenação. (TJSC - AC n. 2000.018170-6, Comarca de São Joaquim, Rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, julgada em 21/03/2006).

Tratamento idêntico é dispensado pelo Colendo Tribunal de Justiça de Minas Gerais, especialmente na 6ª Câmara Cível, que assim tem decidido:

CIVIL - INDENIZAÇÃO – PRISÃO ILEGAL – DANO E NEXO DE CAUSALIDADE DEMONSTRADOS - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO. O fato de o autor ter sido levado à delegacia a fim de que fosse dado cumprimento a um mandado de prisão contra si, por crime cuja reprimenda já havia sido julgada extinta, foi o motivo determinante para a ocorrência do dano por ele suportado, restando preenchido o nexo de causalidade, situação que ampara o pedido de indenização formulado contra o Estado. O montante indenizatório não pode promover um enriquecimento sem causa da vítima, devendo guardar sintonia com os dissabores por ela sofridos, motivo pelo qual torna-se imperiosa sua redução diante do caso concreto. (AC nº. 1.0026.06.022639-1/001, Comarca de Andradas, 6ª CC., rel. Des. Edilson Fernandes, j. 15/04/2008)

CIVIL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO – PRISÃO ILEGAL – DANO MORAL - CONFIGURAÇÃO - QUANTUM INDENIZATÓRIO. CORREÇÃO MONETÁRIA - TERMO INICIAL. 1- Configura dano moral indenizável a prisão ilegal por débito alimentar já quitado, notadamente pelo fato de que não foi recolhida, por negligência do Poder Público, a ordem de prisão. 2 - Provados os danos morais, e verificando-se que o valor da indenização fixado na sentença é suficiente, deve ser mantido. 3 - No cálculo do valor da indenização por dano moral, a correção monetária deve incidir a partir do ajuizamento da ação. (AC nº. 1.0313.09.278592-9/001, Comarca de Ipatinga, 6ª CC., rel. Des. Maurício Barros, j. 30/11/2010).

RESPONSABILIDADE CIVIL - AUTOR RECOLHIDO À PRISÃO E MANTIDO ENCARCERADO POR QUARENTA E CINCO DIAS - POSTERIOR CONSTATAÇÃO, POR EXAME DATILOSCÓPICO, DE TRATAR-SE DE PESSOA DIVERSA DAQUELA PROCURADA PELA JUSTIÇA - ENCARCERAMENTO ILEGAL - RESPONSABILIDADE DOS AGENTES DO ESTADO DE MINAS GERAIS PELA DEMORA NA AVERIGUAÇÃO DA INDENTIDADE DO AUTOR - DEVER DE INDENIZAR POR DANOS MORAIS CONFIGURADO - QUANTUM INDENIZATÓRIO - VALOR FIXADO EXCESSIVO, LEVANDO-SE EM CONSIDERAÇÃO AS CIRCUNSTÂNCIAS DO CASO - REDUÇÃO DO VALOR - HONORÁRIOS - REDUÇÃO - DESCABIMENTO - SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA, PREJUDICADO O RECURSO VOLUNTÁRIO DO RÉU - HONORÁRIOS - SOBEJAMENTO DA VERBA - ARBITRAMENTO EM CONSONÂNCIA COM O ART. 20, §4º, DO CPC. - O recolhimento do cidadão, e a sua manutenção na prisão por quarenta e cinco dias, em razão de demora dos agentes estatais na constatação de tratar-se o detido de pessoa diversa daquela procurada pela Justiça, garante ao ofendido o direito ao recebimento de indenização por danos morais, considerando o ferimento a honra, a sensação de injustiça e revolta e a limitação ilegal do direito de ir e vir. - Na fixação do quantum indenizatório dos danos morais, devem ser atendidos os critérios objetivos e subjetivos do caso, concernentes à gravidade e repercussão da ofensa, à posição social do ofendido e à situação econômica do ofensor, sendo excessiva a condenação que não reflete os requisitos referidos, convertendo-se em fonte de enriquecimento para o ofendido. - Honorários arbitrados em valor não excessivo, descabendo sua redução. - Sentença parcialmente reformada, em reexame necessário, prejudicado o recurso voluntário do réu, e o do autor, na parte em que pretende o sobejamento da indenização. - O arbitramento dos honorários advocatícios, nos termos do §4º, do art. 20, do CPC, a critério da apreciação equitativa do juízo, deve levar em consideração o grau de zelo do advogado, o lugar da realização do serviço, a natureza e a importância da causa, o trabalho realizado e o tempo de duração do serviço, cabendo a sua majoração, quando não atendidos os referidos requisitos. (AC nº. 1.0024.08.942489-9/001, Comarca de Belo Horizonte, 6ª CC., rel. Desª. Sandra Fonseca, j. 11/10/2011).

Ainda que, por todo exposto, persista o dever de indenização do Estado, Cândido Furtado Maia Neto ainda esclarece que, em caso do não reconhecimento da prisão ilegal em todas as instâncias judiciais pátrias, esgotada a via recursal, cabe recurso para a Corte Interamericana de Direitos Humanos, conforme:

Ainda quando pleiteado judicialmente o reconhecimento de erro judiciário ou a indenização por prisão ilegal, em todas as instâncias judiciais do sistema de administração de Justiça (Poder Judiciário) brasileira, esgotadas todas as vias legais interna pátria, e mesmo assim não declarado o erro ou não reconhecida a ilegalidade da prisão, cabe denuncia e recurso ao sistema interamericano de Justiça, ante a Comissão e a Corte Interamericana de Direitos Humanos, ambos órgãos oficiais da Organização dos Estados Americanos – OEA, com função jurisdicional e consultiva, nos termos do art. 34 usque 51, e 52 usque 69, do Pacto de San Jose – Costa Rica (Convenção Americana sobre Direitos Humanos/ OEA, 1969 – Adotada pelo governo brasileiro através do Decreto n. 678, de 06.11.992, publicado no D.O.U. em 09.11.92).56 (sic)

Cândido Furtado Maia Neto57 ainda determina que o dispositivo legal referente ao direito de indenização por prisão ilegal refere-se a uma garantia fundamental constitucional da cidadania, com amparo nos instrumentos internacionais de Direitos Humanos (paráf. 2º art. 5º CF), sendo garantia fundamental e cláusula pétrea auto-aplicável (paráf. 1º art. 5º CF) e não se permite alteração ou abolição, somente via emenda constitucional (art.60, paráf. 4º, inciso III CF).

Portanto, adotando-se os critérios apresentados quanto ao dano moral poderá ser atingido o fim almejado pela justiça, que é o de, na medida do possível, restabelecer os direitos do lesado à situação anterior ao dano causado pelo Estado.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

A liberdade é um direito indisponível, sendo evidente que o ato praticado diante do cerceamento da liberdade individual de maneira arbitrária, além de ilegal, representa grave lesão ao status de dignidade e liberdade constitucionalmente protegidos. Não havendo razões contundentes para privar a liberdade pessoal, não deve ocorrer a prisão.

Ainda que a liberdade pessoal não seja irrestrita, ficando limitada em razão da necessidade de se manter o equilíbrio do convício social, o limite ao exercício da liberdade pessoal é imposto pelo ordenamento jurídico, que por sua vez é formulado pelo próprio corpo social por intermédio de seus representantes, como reflexo de seus anseios, o que legitima a ação do Estado sempre que for necessário atuar no sentido de restringir a liberdade pessoal, o que somente poderá ser efetuado pelo modo determinado pela lei, de maneira que seja restabelecida a paz e a ordem social.

Qualquer irregularidade que ocorra na prisão estará configurando a prisão indevida. Desta forma, sobressai-se que ante qualquer irregularidade face à restrição da liberdade pessoal, especialmente pela prisão ilegal, o Estado deve ser responsabilizado para que os danos causados ao indivíduo sejam integralmente reparados.

O Brasil adotou a teoria da responsabilidade civil objetiva para apuração do nexo causal entre a conduta do agente estatal e dano sofrido pelo particular. A objetividade que impera na imputação da responsabilidade pública por prisão indevida tem efeito no momento da apuração do dano, bastando a aferição de sua ocorrência in concreto para a imposição da obrigação ao Estado, ficando afastada a possibilidade de alegação de normalidade do dano e culpa da vítima. O direito fundamental ferido pela ilegal privação da liberdade individual implica dano passível de composição patrimonial (indenização), da qual não pode fugir o poder público, devendo a recomposição do lesado ser plena, não remanescendo dano sem a devida reparação.

Restou demonstrado que os Tribunais acolhem a obrigação do Estado de indenizar aquele que sofreu ilegalmente privação de sua liberdade e que, por tal fato, resta ao Estado indenizar o particular pelo desgaste sofrido. A indenização deve corresponder ao valor de avaliação da diminuição sentida pelo lesado em seu patrimônio, seja de natureza material, atingindo o patrimônio da pessoa e consistindo em perda monetária decorrente da sua redução (dano emergente) ou da supressão de possibilidade de seu aumento (lucro cessante), seja moral, a atingir aspectos não-econômicos dos bens jurídicos da pessoa, bastando a indevida privação da liberdade individual para que o Estado seja compelido a indenizar o correspondente período de restrição do direito de liberdade.

Ainda que esgotada a via recursal pátria, cabe recurso à Corte Interamericana de Direitos Humanos para sanar a irregularidade da prisão ilegal.

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1 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada e legislação constitucional. 7ªed. Atlas: São Paulo, 2007. p. 178.

2 POLETTI, Ronaldo Rebello de Britto. Liberdade e Direito. In: Revista Consulex. n. 203. 30 jun. 2005. p. 6.

3 HENTZ, Luiz Antonio Soares. Responsabilidade do Estado por prisão indevida. In: Revista dos Tribunais. Ano 85. v. 730. ago. 1996. p. 68.

4 ALMEIDA, Arnaldo Quirino de. Abuso de Poder e a Responsabilidade do Estado. Disponível em <

5 POLETTI. Obra citada. p. 6.

6 MEIRELLES, Lenilma Cristina Sena de Figueiredo. Responsabilidade civil do Estado por prisão ilegal. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 505, 24 nov. 2004. Disponível em: <

7 SILVA, De Plácido. Vocabulário jurídico. 2 ed., Vol. III, Rio de Janeiro : Forense, 1967. p. 1221. apud. MEIRELLES. Obra citada.

8 Idem.

9 MEIRELLES. Obra citada.

10 THEODORO JÚNIOR, Humberto. Código de processo civil anotado. 13. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2009. p. 764.

11 MIRABETTE, Julio Fabbrini. Processo penal. 18 ed. São Paulo: Atlas S.A., 2006. p. 261.

12 TOURINHO FILHO, Fernando da Costa. Processo penal. v.3. 18. ed. rev. atual. São Paulo: Saraiva, 2006. p. 392.

13 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo penal e execução penal. 8.ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2011. p. 575.

14 Prisão e Medidas cautelares – Comentários à Lei 12.403/2011. São Paulo: RT, 2011

15 NUCCI, Guilherme de Souza. Código de Processo Penal Comentado. 11ªed. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais,2012. p. 631.

16 ALVES, Reinaldo Rossano. Direito Processual Penal. 7ªed. Ed. Impetus. 2011.

17 TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 7ªed. Ed.Juspodivm. Salvador. 2012. p. 584.

18 ALVES, Reinaldo Rossano. Direito Processual Penal. 7ªed. Ed. Impetus. 2011.

19 TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 7ªed. Ed.Juspodivm. Salvador. 2012. p. 606

20 TÁVORA, Nestor; ALENCAR, Rosmar Rodrigues. Curso de Direito Processual Penal. 7ªed. Ed.Juspodivm. Salvador. 2012. p. 674.

21 MAIA NETO, Cândido Furtado. Abuso de poder e de autoridade. Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 28 jan. 2009. Disponivel em:

22 MAIA NETO, Cândido Furtado. Erro Judiciário, prisão ilegal e Direitos Humanos. In: Prática Jurídica, Ed. Consulex. Ano II, nº 13, de 30/04/2003. p. 34.

23 MEIRELLES, Lenilma Cristina Sena de Figueiredo. Responsabilidade civil do Estado por prisão ilegal. Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 505, 24 nov. 2004. Disponível em: <

24 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro: Responsabilidade Civil. v. 7. São Paulo: Saraiva, 2002. p. 34.

25 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 5. ed. rev., aum. e atual. São Paulo: Malheiros, 2004. p. 40.

26 FIUZA, César Augusto de Castro. Direito Civil: curso completo. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. p. 284.

27 NORONHA, Fernando. Direito das obrigações. 3. ed. rev. e atual. São Paulo: Saraiva, 2010. p. 468-469.

28 VITTA, Heraldo Garcia. A sanção no Direito Administrativo. São Paulo: Malheiros Editores, 2003. p. 29.

29 STOCO, Rui. Tratado de Responsabilidade Civil: doutrina e jurisprudência. 7ª ed. rev., atual. e amp. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007. p.1066

30 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 13ª ed. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 802.

31 HENTZ. Obra citada. p. 68.

32 DINIZ, 2002. Obra citada. p. 543.

33 HARADA, Kiyoshi. Responsabilidade civil do Estado. Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 41, 1 maio 2000. Disponível em: <

34 MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 9ª ed. Ed. Revista dos Tribunais, 2005. p. 430.

35 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 14ª ed. Lúmen Júris Editora, 2005. p. 448 e p. 454.

36 SUNDFELD, Carlos Ari. Fundamentos de Direito Público. 4 ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2002. p. 181.

37 DINIZ, 2002. Obra citada. p. 37.

38 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito Civil: responsabilidade civil. 4. ed. São Paulo: Atlas, 2004. v. 4, p. 33.

39 CARVALHO FILHO. Obra citada. p.479

40 HARADA. Obra citada.

41 CARVALHO FILHO. Obra citada. p.473.

42 CARVALHO FILHO. Obra citada. p. 473.

43 HENTZ. Obra citada. p. 70.

44 HENTZ. Obra citada. p. 73.

45 MAIA NETO, 2003. Obra citada. p. 34.

46 HENTZ. Obra citada. p. 74.

47 HENTZ. Obra citada. p. 79.

48 HENTZ. Obra citada. p. 79.

49 HARADA. Obra citada.

50 DINIZ. 2002. Obra citada. p. 149.

51 VENOSA. Obra citada. p. 182.

52 VENOSA. Obra citada. p. 182.

53 HENTZ. Obra citada. p. 76.

54 DINIZ, 1996. Obra citada. p.9.

55 STOCO, Rui. Responsabilidade Civil e sua Interpretação Jurisprudencial. 2ª ed. Revista dos Tribunais: São Paulo, 1995. p. 491-492.

56 MAIA NETO. Obra citada. p. 37.

57 MAIA NETO. Obra citada. p. 33.


Publicado por: Arthur Henrique Quirino

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