Inquérito Policial: Finalidade, Atribuição para presidí-lo e Características

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1. RESUMO

O presente artigo refere-se ao estudo do Inquérito Policial, abordando sua natureza jurídica, finalidade e sua importância como meio de investigação à disposição do poder estatal, cujo objetivo primordial é o de se obter um mínimo de certeza acerca do possível autor e da existência da infração penal. Assim, o Estado poderá exercer seu poder-dever de punir o infrator por meio de um processo criminal, evitando-se, dessa forma, que sejam cometidas eventuais injustiças. Posteriormente, serão tratadas de maneira detalhada as principais características que compõem o inquérito policial, tornando-o um procedimento de natureza administrativa com regras próprias, diferindo-o de outros meios investigativos. Por fim, será abordado a autoridade com atribuição para instaurá-lo e presidi-lo.

PALAVRAS-CHAVE: Inquérito Policial. Finalidade. Características.

2. INTRODUÇÃO

O presente estudo visa tratar sobre Inquérito Policial, conceituando-o e abordando de forma detalhada suas principais características.

Com a promulgação da Constituição Federal de 1988, passou-se a prever de forma expressa que a República Federativa do Brasil constitui-se em um Estado Democrático de Direito, ou seja, um Estado politicamente organizado que obedece às suas próprias leis e, como tal, detentor de meios próprios de solução dos conflitos. Dessa forma, ao vedar que os próprios indivíduos resolvam por meio de força seus problemas, proporciona uma convivência harmônica em sociedade.

A partir do momento então em que o Estado retira dos cidadãos o poder de resolver por si sós seus conflitos, insere na sociedade um instrumento eficaz para realização de uma investigação preliminar, assim como meios idôneos para punir eventual autor de um delito, instrumentalizado pelo processo penal.

Antes, porém, de um processo criminal ser instaurado efetivamente, deve haver um lastro probatório mínimo em que constem indícios de autoria e prova da materialidade da infração penal praticada, para que o processo possa seguir seu curso natural sem que haja eventuais injustiças.

Dentre as diversas formas de investigação preliminar, com o fito de se obter a justa causa para que seja deflagrada a persecução criminal, há à disposição do Estado o inquérito policial, podendo ser definido como um “procedimento administrativo, preliminar, presidido pelo Delegado de Polícia, no intuito de identificar o autor do ilícito e os elementos que atestem a sua materialidade (existência), contribuindo para a formação da opinião delitiva do titular da ação penal, ou seja, fornecendo elementos para convencer o titular da ação penal se o processo deve ou não ser deflagrado” (NESTOR TÁVORA E ROSMAR RODRIGUES ALENCAR, 2012).

Daí a importância do inquérito policial, instrumento geralmente usado pelo Estado para a colheita desses elementos de informação, viabilizando o oferecimento da peça acusatória quando houver justa causa para o processo (fumus comissi delicti), mas também contribuindo para que pessoas inocentes não sejam injustamente submetidas às cerimônias degradantes do processo criminal (RENATO BRASILEIRO DE LIMA, 2013).

O Inquérito Policial, portanto, é um procedimento administrativo e possui características e regras próprias que o diferem do processo criminal. Dentre elas, há a inobservância do contraditório e da ampla defesa, fazendo com que alguns doutrinadores sustentem ser o inquérito policial um resquício do sistema inquisitivo outrora dominante no processo penal. Entretanto, a inobservância dessas garantias constitucionais não desonera as autoridades policiais a tratar com respeito e dignidade os “suspeitos”, devendo ser-lhes asseguradas diversas outras garantias, como o direito de permanecer em silêncio e a assistência da família e de advogados. Além do mais, no inquérito não há sujeitos processuais e dele não resulta diretamente uma sanção, não descaracterizando assim o atual sistema acusatório.

E com base nessas peculiaridades é que se desenvolve o presente trabalho.

3. DESENVOLVIMENTO

3.1. ATRIBUIÇÃO PARA PRESIDIR O INQUÉRITO POLICIAL

Cabe a autoridade policial instaurar e presidir o inquérito policial, conforme art. 1°, § 1o da Lei n° 12.830/2013, in verbis:

“Ao delegado de polícia, na qualidade de autoridade policial, cabe a condução da investigação criminal por meio de inquérito policial ou outro procedimento previsto em lei, que tem como objetivo a apuração das circunstâncias, da materialidade e da autoria das infrações penais.”

Quando determinada infração penal é praticada, determinados critérios pré-estabelecidos irão definir o delegado de polícia responsável pela condução das investigações. Esses critérios, que são o territorial e em razão da natureza da infração penal, serão tratados adiante, sendo certo que ambos não se excluem, mas se complementam.

3.1.1. CRITÉRIO TERRITORIAL

De acordo com tal critério, terá atribuição para presidir o inquérito a autoridade policial que exerce suas funções na circunscrição em que a infração penal se consumou ou, no caso de tentativa, de onde ocorreu o último ato de execução.

3.1.2. CRITÉRIO EM RAZÃO DA NATUREZA DA INFRAÇÃO PENAL

Em se tratando de uma infração penal cuja competência será da Justiça Federal, a atribuição para condução das investigações e para presidir o inquérito policial será da Policia Federal, nos termos do art. 144, § 1o, I da Constituição Federal que dispõe: “apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei”.

Sendo a competência da Justiça Estadual, em regra, as investigações ficarão a cargo da Polícia Civil. No entanto, também incumbirá à Polícia Federal, caso a infração penal tenha repercussão internacional ou interestadual e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei (art. 144, § 1o, I in fine da CF).

Caso o delito seja de competência da Justiça Eleitoral, a atribuição para a realização das investigações será da Polícia Federal. Porém, de acordo com Tribunal Superior Eleitoral, se não houver unidade da Polícia Federal no local em que houve a prática delituosa, a Polícia Civil poderá realizar as investigações.

No caso de infrações penais de competência da Justiça Militar, quem possui atribuição para investigá-las será a autoridade de polícia judiciária militar.

Importante ressaltar que a violação a tais critérios não possui o condão de macular o futuro processo. O advogado do indiciado, entretanto, poderá impetrar habeas corpus para trancar o inquérito que tramita irregularmente, por desrespeito à fixação da atribuição (NESTOR TÁVORA E ROSMAR RODRIGUES ALENCAR, 2012).

3.2. CARACTERÍSTICAS DO INQUÉRITO POLICIAL

3.2.1. Procedimento Escrito

Por ser o inquérito policial um procedimento administrativo que tem como finalidade precípua o fornecimento de elementos de informação para que o titular da ação penal possa ingressar em juízo, tais elementos, devem ser fornecidos por escrito, conforme preceitua o art. 9° do Código de Processo Penal: “todas as peças do inquérito policial serão, num só processado, reduzidas a escrito ou datilografadas e, neste caso, rubricadas pela autoridade.”

Porém, a Lei nº 11.719 de 2008 passou a prever a possibilidade do registro do depoimento do indiciado, ofendido e testemunhas pelos meios ou recursos de gravação magnética, estenotipia, digital ou técnica similar, inclusive audiovisual, destinada a obter maior fidelidade das informações (art. 405 do CPP). Assim, permite-se que nos autos do inquérito policial também sejam utilizados recursos audiovisuais.

3.2.2. Procedimento Sigiloso

Diversamente do que ocorre com os atos processuais aos quais, por força constitucional estão adstritos ao princípio da publicidade (art. 5°, LX da CF), o inquérito policial é um procedimento sigiloso por força do art. 20 do CPP, que dispõe: “a autoridade assegurará no inquérito o sigilo necessário à elucidação do fato ou exigido pelo interesse da sociedade.”. Este sigilo, porém, não atinge a autoridade judiciária, tampouco o Ministério Público.

De acordo com o Estatuto da OAB, tal sigilo também não alcança o advogado que possui o direito de examinar em qualquer repartição policial, mesmo sem procuração, autos de flagrante e de inquérito, findos ou em andamento, ainda que conclusos à autoridade, podendo copiar peças e tomar apontamentos (Lei 8.906/94, art. 7°, inciso XIV). Esse direito, porém, não é absoluto, pois, nos termos da súmula vinculante n° 14, o advogado somente terá acesso às diligências já documentadas, não tendo acesso às que ainda se encontram em andamento ou que não foram ainda realizadas.

Caso seja negado ao advogado acesso aos autos do inquérito policial, este poderá: ajuizar reclamação ao Supremo Tribunal Federal, por ter havido desrespeito à súmula vinculante; impetrar mandado de segurança, uma vez que houve violação à direito líquido e certo do advogado de ter amplo acesso aos autos do inquérito policial, nos termos da Lei 8.906/94, art. 7°, XIV; ou, ainda, poderá impetrar habeas corpus em favor do acusado, caso haja lesão ou ameaça à sua liberdade de locomoção.

3.2.3. Procedimento Dispensável

A finalidade precípua do inquérito policial é a colheita de elementos de informação acerca da autoria e materialidade da infração penal praticada, para que o titular da ação penal forme sua opinio delicti. Caso esse obtenha um lastro probatório mínimo que o habilite ao oferecimento da peça acusatória por meio de um procedimento investigatório diverso, o inquérito torna-se dispensável.

O próprio Código de Processo Penal, em diversos dispositivos, deixa claro o caráter dispensável do inquérito policial. De acordo com o art. 12 do CPP, “o inquérito policial acompanhará a denúncia ou queixa, sempre que servir de base a uma ou outra.” A contrario sensu, se o inquérito policial não servir de base à denúncia ou a queixa, não há necessidade de a peça acusatória ser acompanhada dos autos do procedimento investigatório (RENATO BRASILEIRO DE LIMA, 2013).

3.2.4. Procedimento Oficioso

Caso a autoridade policial tome conhecimento da prática de um delito que seja de ação penal pública incondicionada, deverá agir de ofício, instaurando o inquérito policial por meio de uma portaria, independentemente da manifestação de vontade do ofendido ou de seu representante legal.

Nos demais casos (crimes de ação penal pública condicionada à representação e ação penal de iniciativa privada), o inquérito policial somente poderá ser instaurado após prévia manifestação do ofendido ou de seu representante legal.

3.2.5. Procedimento Discricionário

A autoridade policial irá conduzir as investigações, realizando diligências de maneira discricionária, conforme as peculiaridades de cada caso. Os artigos 6° e 7° do CPP descrevem diligências que podem ou não ser adotadas no curso do inquérito policial. Essa discricionariedade, porém, não implica dizer que há uma liberdade absoluta na atuação do delegado de polícia, devendo agir sempre nos termos e limites da lei.

Contudo, existem diligências que são dotadas de obrigatoriedade, como ocorre nas infrações que deixarem vestígios, em que é obrigatória a realização do exame de corpo de delito, direto ou indireto, nos termos do art. 158 do CPP.

Além do mais, no curso das investigações, o ofendido ou seu representante legal e o indiciado poderão requerer qualquer diligência, que será realizada, ou não, a juízo da autoridade, consoante art. 14 do CPP.

O fato de o inquérito policial ser um procedimento oficioso não descaracteriza sua discricionariedade, uma vez que aquele apenas diz respeito à obrigatoriedade de sua instauração por parte da autoridade policial.

3.2.6. Procedimento oficial

A oficialidade encontra-se sufragada pela própria Constituição Federal, que dispõe no art. 144, § 4°: “O Delegado de Policia de carreira, autoridade que preside o inquérito policial, constitui-se em órgão oficial do Estado.”.

3.2.7. Procedimento Indisponível

Uma vez determinada a instauração do inquérito policial pelo Delegado de Polícia, este não poderá mandar arquivá-lo (art. 17 do CPP), uma vez que o arquivamento é veiculado por meio de uma decisão judicial, após prévio requerimento feito pelo titular da ação penal à autoridade judiciária.

3.2.8. Procedimento Inquisitorial

Durante o inquérito policial, não há observância do contraditório e da ampla defesa, uma vez que se trata de um procedimento de natureza administrativa e não de processo judicial ou administrativo, já que dele não resulta diretamente qualquer sanção.

Como mencionado anteriormente, isso não significa que o indiciado não possua direitos fundamentais, já que é garantido a ele o direito ao silêncio, de ser assistido por advogado, etc.

Há uma corrente doutrinária minoritária que sustenta a possibilidade de ampla defesa na fase inquisitorial, pois de acordo com Marta Saad, “se não se mostra apropriado falar em contraditório no curso do inquérito policial, seja porque não há acusação formal, seja porque, na opinião de alguns, sequer há procedimento, não se pode afirmar que não se admite o exercício do direito de defesa, porque esta tem lugar em todos os crimes e em qualquer tempo, e estado da causa”.

Porém, no inquérito que visar à expulsão do estrangeiro, será obrigatória a observância do contraditório e da ampla defesa, sendo tal procedimento instaurado após prévia requisição do Ministro da Justiça e realizado pelo Departamento de Polícia Federal, nos termos do art. 102 do Decreto n° 86.715/81.

3.2.9. Procedimento Temporário

O inquérito policial não é ad eternum, devendo haver prazo para sua conclusão, que irá variar de acordo com a natureza da infração penal praticada.

Como regra geral, nos crimes de competência da Justiça Estadual, o inquérito deverá ser concluído, de acordo com o art. 10 do CPP, no prazo de dez dias se o indiciado tiver sido preso em flagrante, ou estiver preso preventivamente. Ou, quando estiver solto (mediante fiança ou sem ela), no prazo de trinta dias.

Estando o acusado solto, o prazo para a conclusão do inquérito comportará prorrogação se o fato for de difícil elucidação, podendo a autoridade policial requerer ao juiz a devolução dos autos, para ulteriores diligências, que serão realizadas no prazo marcado pelo juiz (art. 10, § 3o do CPP).

Se de acordo com a natureza do delito praticado a competência para processo e julgamento for da Justiça Federal, o prazo para a conclusão do inquérito policial será de quinze dias, prorrogável por igual período, a pedido fundamentado da autoridade policial e mediante autorização judicial, se o indiciado estiver preso (art. 66 da Lei n° 5.010/66). Caso o indiciado esteja solto, no silêncio da referida lei, aplica-se o prazo previsto no art. 10 do CPP, de trinta dias.

Nos crimes contra a economia popular, o prazo para a conclusão do inquérito policial será de dez dias, estando o indivíduo preso ou solto (art. 10, § 1º da Lei n° 1.521/51).

Sendo a atribuição do inquérito policial da Justiça Militar, tal procedimento deverá ser concluído em vinte dias, se o indiciado estiver preso, contado esse prazo a partir do dia em que se executar a ordem de prisão. Quando o indiciado estiver solto, o prazo será de quarenta dias, contados a partir da data em que se instaurar o inquérito, podendo, nesse caso, ser prorrogado por mais vinte dias pela autoridade militar superior, desde que não estejam concluídos exames ou perícias já iniciados, ou haja necessidade de diligência, indispensáveis à elucidação do fato (art. 20 caput e § 1º do Código de Processo Penal Militar).

Nos crimes previstos na Lei n° 11.343/06, o inquérito policial deverá ser concluído no prazo de trinta dias, se o indiciado estiver preso, e noventa dias se estiver solto. Ambos os prazos poderão ser duplicados pelo juiz, ouvido o Ministério Público, mediante pedido justificado da autoridade policial.

Por fim, no caso de ter sido decretada a prisão temporária, as investigações deverão ser concluídas em cinco dias, prorrogável por igual período em caso de extrema e comprovada necessidade (art. 2° da Lei n° 7.960). No caso de crimes hediondos ou equiparados, o prazo será de trinta dias, prorrogável por igual em caso de extrema e comprovada necessidade (art. 2°, §4° da Lei n° 8072/90).

4. CONCLUSÃO

O inquérito policial é, portanto, a principal fonte investigatória acerca da existência de um crime e de sua autoria, servindo como um importante subsídio para a formação da opinio delicti do titular da ação penal.

Afinal, vivemos em uma sociedade que repudia processos levianos. Em um Estado Democrático de Direitos, a máquina pública não pode ser utilizada como instrumento de vingança, barganha ou passatempo. E a partir do momento em que o Estado toma para si a responsabilidade da solução dos conflitos, fica vedado aos particulares o poder de resolvê-los por si próprios e o jus puniendi, ou seja, o poder-dever de punir após a prática de uma infração penal, que se concretiza através do processo, passa a ser exclusivo do Estado.

Sendo assim, o inquérito policial, conforme visto, tem a dupla função de, ao mesmo tempo em que antecede um processo criminal, fornecendo-lhe elementos mínimos, também o impede, caso esses elementos não se façam presentes.

Diante de todo o exposto, resta silente de dúvidas a grande importância do inquérito policial, sendo fundamental a todo operador do direito conhecer as nuances que o envolvem, bem como suas principais características.

5. REFERÊNCIAS

AVENA, NORBERTO. Processo Penal: Esquematizado. 5° ed. revista e atualizada. Rio de Janeiro: forense; São Paulo: Editora Método, 2012.

DE LIMA, RENATO BRASILEIRO. Curso de Processo Penal. Niterói. Editora Impetus, 2013.

NUCCI, GUILHERME DE SOUZA. Manual de Processo Penal e Execução Penal. 6°ed. revista, atualizada e ampliada. São Paulo. Editora Revista dos Tribunais, 2010.

TÁVORA, NESTOR; ALENCAR, ROSMAR RODRIGUES. Curso de Direito Processual Penal. 7° ed. revista, atualizada e ampliada. Salvador. Editora JusPodivm, 2012.

BRASIL. CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988.

BRASIL. CÓDIGO DE PROCESSO PENAL de 1941.


Publicado por: Thiago da Silva Teixeira

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