FUTEBOL E VIOLÊNCIA: DOS CONFRONTOS ENTRE TORCEDORES ORGANIZADOS QUE ASSOLAM A SOCIEDADE

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1. RESUMO

O tema futebol e violência é alvo de muitas discussões entre historiadores, sociólogos e autoridades do executivo, legislativo e judiciário. Inicia-se o presente trabalho abordando o histórico do futebol e como ele se transformou no principal esporte do mundo, se popularizando em todos os continentes e sendo uma paixão nacional em diversos países. O futebol está interligado na sociedade, é um fenômeno social e se relaciona diretamente a outras questões como a política, educação, economia e também uma das principais mazelas da sociedade: a violência. É abordado como a violência da sociedade interfere no futebol assim como a violência relacionada ao futebol interfere na sociedade. São mencionados como a Inglaterra por muito tempo sofreu com atos violentos causados pelos hooligans e de que forma conseguiu solucionar este problema. Como tema principal estão as torcidas organizadas brasileiras, como surgiram, como se mantiveram e os motivos dos confrontos violentos intermináveis entre torcedores rivais. São relatados diversos casos desses confrontos, antigos e atuais. Tais atos violentos entram na questão de como o legislativo e judiciário precisam agir para que este problema seja solucionado, assim como aconteceu na Inglaterra e em outros países. O estatuto do torcedor é ineficaz neste ponto assim como não há no código penal uma tipificação para o confronto causado pelos torcedores que acabam impunes. O despreparo e repressão policial é outra questão que contribui para que os confrontos não cessem. Finaliza o trabalho apresentando possíveis soluções para que o Brasil consiga superar esse grave problema.

Palavras-chave: Futebol. Violência. Torcida

ABSTRACT

The topic of football and violence is the subject of many discussions among historians, sociologists and executive, legislative and judicial authorities. The present work begins by approaching the history of football and how it became the main sport in the world, becoming popular on all continents and being a national passion in some countries. Football is interconnected in society, it is a social phenomenon and is directly related to other issues such as politics, education, economy and also one of the main ills of society: violence. It is addressed how the violence of society as a whole interferes with football as well as violence related to football interferes with society. They mentioned how England suffered for a long time with violent acts caused by hooligans and how it managed to solve this problem. The main theme is the Brazilian organized supporters, how they emerged, how they remained and the reasons for the endless violent clashes between rival fans. Several cases of these clashes, past and present, are reported. Such violent acts enter the question of how the legislature and judiciary need to act to solve this problem, as happened in England and in other countries. The fan's statute is ineffective at this point, as there is no definition in the penal code for the confrontation caused by fans who go unpunished. The lack of preparation and police repression is another issue that contributes to the continuation of the confrontations. Concludes the work by presenting possible solutions for Brazil to overcome this serious problem.

Keywords: Football. Violence. Soccer crowd

2. INTRODUÇÃO

Falar sobre futebol vai muito mais além de se referir como um esporte, ele é muito mais do que isso, se transformou em um fenômeno social interligado com qualquer questão que envolva nossa sociedade, ele está presente na política, sendo usado como uma ferramenta de popularização por diversos líderes de estado, na economia, na educação e, infelizmente, fortemente relacionado à violência da sociedade. Essa violência se dá por conta dos confrontos violentos entre torcedores, na Inglaterra: os hooligans, no Brasil: os torcedores organizados.

O ambiente do futebol brasileiro parece uma ‘’terra sem lei’’ e é justamente por isso que torcedores violentos encontram o cenário ideal para destilar suas raivas e atos violentos. Atos que fora do ambiente do futebol são crimes, dentro dele são consideradas coisas comuns do futebol. Dentro de um estádio, durante um confronto entre torcedores, são encontrados diversos atos que estão presentes no Código Penal, há ofensa, ameaça, dano ao patrimônio, lesão corporal, roubo, rixa entre grupos, entre outros. Porém, tudo isso são relevados e tratados como coisas comuns de um estádio. Esse é um dos motivos para que a violência relacionada ao futebol em nosso país esteja longe de ter um fim. Quando há confrontos entre as torcidas, o punido é o clube, enquanto que os torcedores dificilmente são identificados, como consequência, na próxima partida estarão novamente lá para continuarem a saga sem fim dos confrontos.

É necessário destacar ainda a necessidade de uma melhor preparação aos policiais responsáveis pela segurança do evento esportivo. Eles deveriam agir de maneira a promover a segurança aos presentes, no entanto, agem de maneira despreparada e repressiva, não contribuindo em nada para solucionar o problema, muito pelo contrário, acabam alavancando ainda mais a ira dos torcedores.

Portanto, é necessário uma maior atenção das autoridades para que ocorra uma identificação e responsabilização a esses torcedores, além de elaborar técnicas para uma melhor preparação aos policiais responsáveis pelo evento esportivo, de modo que ajam de maneira preventiva e não repressiva. Talvez assim, o ambiente do estádio se torne seguro para todos.

3. FUTEBOL, UM FENÔMENO SOCIAL

3.1. CONTEXTO E HISTÓRICO

O futebol é o esporte mais popular do mundo e tem uma função que vai além de um mero esporte, sendo considerado como um fenômeno social no qual se torna um elemento crucial na cultura mundial.

Não há nenhum outro esporte que seja tão massificado e praticado ao redor do planeta, o futebol está presente de canto a canto em todos os continentes, independente das questões políticas, religiosas, econômicas ou sociais, ele faz parte do cotidiano de todas as sociedades atuais. É um esporte coletivo, multidisciplinar, socializante e serve para o desenvolvimento do caráter e da personalidade das pessoas que praticam essa arte (JÚNIOR, 2010, p. 1).

Podemos notar isso tudo de perto, aqui no Brasil. Em nosso país o futebol é um fenômeno sociocultural pois, além de conseguir dar uma importância e significado aos ensejos da população brasileira, também representa toda uma identidade nacionalista de um povo. A história do nosso futebol pode ser considerada como parcela da história de nossas lutas sociais, de nossos embates contra o elitismo e a exclusão estrutural e histórica da nossa formação social. Em solo brasileiro, o futebol é bem mais do que um esporte, é uma identidade, um símbolo cultural coletivo e, por isso, tem tanta relevância e exerce tanto impacto na vida de muitas pessoas (MURAD, 2013. p. 67).

Por sua simplicidade e acessibilidade ele logo caiu nas graças do brasileiro, sendo disparadamente o esporte mais popular do país em decorrência de ser algo emocionante e comovente, no qual proporciona diversos sentimentos durante uma partida.

Assim, passou a ter uma alta representatividade social e cultural de modo que influencia toda a população direta ou indiretamente. Neste sentido, Marcelo Palhares (2015, p. 111) considera:

“O futebol é um esporte de grande representatividade social na cultura brasileira. Seja na prática, seja na fruição, o futebol é parte significante das atividades de lazer de boa parte da população do país.

3.2. A POPULARIZAÇÃO

Inicialmente, o futebol era um esporte elitizado, no entanto, ao longo dos anos, sua popularização se expandiu cada vez mais rapidamente a partir do momento em que os torcedores se identificavam partilhando de uma paixão em comum: o gosto por um mesmo clube. Desse momento adiante, podemos analisar como o futebol, de origem burguesa e prática restrita, tornou-se um fenômeno de massa, se popularizando como o principal esporte das classes desfavorecidas socialmente.

Para Carlos Alberto Pimenta (1997, p. 38) não é fácil estabelecer o momento em que o futebol foi adotado pelas massas. Entretanto, aduz o autor que, na medida em que o esporte atinge a profissionalização, rapidamente adequa-se como sendo um culto proletário.

Muito antes de se disseminar pelo ambiente das fábricas, o futebol teve nas tradicionais instituições de ensino inglesas o seu ambiente inicial, servindo como um verdadeiro laboratório para a criação de suas regras iniciais, dessa forma, Eduardo Galeano (2018, p.33) concebe:

‘’Na sua forma moderna, o futebol provém de um acordo de cavalheiros que doze clubes ingleses selaram no outono de 1863, numa taverna de Londres. Os clubes assumiram as regras estabelecidas em 1846 pela Universidade de Cambridge. Em Cambridge, o futebol se havia divorciado do rugby: era proibido conduzir a bola com as mãos, embora fosse permitido tocá-la e era proibido chutar os adversários. "Os pontapés só devem ser dirigidos para a bola", advertia uma das regras: um século e meio depois, ainda há jogadores que confundem a bola com o crânio do rival, por sua forma parecida. O acordo de Londres não limitava o número de jogadores, nem a extensão do campo, nem a altura do arco, nem a duração das partidas. As partidas duravam duas ou três horas, e seus protagonistas conversavam e fumavam quando a bola voava para longe. Já existia, isso sim, o impedimento. Era desleal fazer gols nas costas do adversário.’’

Podemos relacionar o processo de massificação pelo qual passou o futebol na Inglaterra à intensa urbanização por ela vivida na segunda metade do século XIX. Este processo se iniciou na primeira década do século XX, quando a prática do esporte deixava de ser exclusividade da elite e passava a ser comum também àqueles que não pertenciam à alta sociedade, os operários das fábricas.

Richard Giulianotti (2002) relata que, entre 1820 e 1860, surgiu um enorme vácuo no lazer popular, com o abandono dos antigos esportes praticados pela população que seguia em massa rumo às cidades em busca de emprego nas indústrias. Desta forma, era necessário o surgimento de um novo meio de distração para os seus raros momentos de lazer. Sendo assim, o futebol serviu para preencher essa necessidade além de se transformar em um dos principais símbolos de uma nova sociedade urbana e industrial que se expandia cada vez mais.

A expansão do esporte pelo mundo afora foi diretamente relacionada à dominância cultural que a Inglaterra tinha na época. Trabalhadores britânicos levaram o futebol para todo o mundo através de marinheiros e ferroviários que viajavam ao redor do globo, levando com eles a prática do esporte. Neste contexto, Carlos Alberto Pimenta (1997, p. 39) afirma:

‘’O futebol neste contexto histórico de grandes transformações recebe características próprias e universais, gerenciadas por lógicas racionais, regras e códigos, de modo que sua introdução em territórios fronteiriços ou nas demais sociedades, se fez, na maioria das vezes, por expatriados ingleses e até por intermédio de fábricas de administração britânica. O esporte bretão entra na cultura brasileira através de um filho de britânicos – Charles Miller – que estudou na Europa e trouxe o jogo para o Brasil e, em terra fértil, proliferou entre as massas populares.’’

3.3. A POPULARIZAÇÃO NO BRASIL

No Brasil, o futebol foi introduzido “oficialmente” no final do século XIX, pelo estudante paulista Charles Miller1, em 1894, que havia retornado da Inglaterra e trouxe consigo diversos equipamentos de jogo como bolas e uniformes. Na época, famílias da elite enviavam seus filhos para estudarem na europa e ao retornarem, traziam na bagagem diversas novas experiências, entre elas, o futebol. Entretanto, existem relatos de partidas realizadas por marinheiros ingleses ainda na década anterior (UNZELTE, 2002, p.20-21).

Após a chegada ao país não demorou muito para o esporte se popularizar na sociedade, porém, inicialmente a adesão se deu de forma elitizada, sendo praticado somente por jovens estudantes da alta classe. No entanto, com o crescimento urbano e industrial do país, logo ocorreu a popularização entre as camadas menos favorecidas. No mesmo molde em que esse esporte se massificou e se popularizou na Inglaterra através dos operários fabris, no Brasil não foi diferente, ainda mais com a forte migração de operários britânicos que chegavam ao país para trabalharem em fábricas locais. A popularização do esporte se deu justamente por sua facilidade em se aprender as regras simples e capacidade de improviso, no qual bastava um espaço aberto, dois pedaços de madeira simulando as traves e uma bola feita de pano. Assim, não demorou muito para que o futebol caísse cada vez mais nas graças das camadas menos favorecidas.

No entanto, vale destacar que o futebol não foi totalmente recebido de braços abertos por todos os brasileiros, isso inclusive gerou diversos embates entre intelectuais da época. De um lado, por se tratar de uma “moda estrangeira”, o esporte era encarado com certo receio por alguns importantes escritores, como Lima Barreto2 e Graciliano Ramos3 que enxergavam o futebol apenas como mais um “estrangeirismo” de moda passageira. Contudo, havia também os que defendiam e viam no futebol uma enorme possibilidade de se tornar uma grande paixão nacional como o caso de Coelho Neto4.

Passados mais de 100 anos é inegável que Coelho Neto tinha razão e o futebol se tornou sim uma das maiores paixões nacionais, transformando o país em uma potência desse esporte. O futebol tornou-se parte da cultura brasileira, sendo um reflexo da sociedade e se relacionando fortemente a diversos meios como a economia, a educação e também a política.

3.4. FUTEBOL E POLÍTICA

Apesar de não ser o assunto principal do presente trabalho, é necessário destacar essa forte ligação entre o futebol e o reflexo disto na sociedade como um todo.

É impossível abordar a temática do futebol sem o relacionar com a política. Desde que o esporte se popularizou, se tornando o principal em diversos países, ele foi utilizado por muitos políticos, mundo afora, que buscaram se aproveitar de sua potência em manipular as massas para desviar a atenção popular de outras questões sociais.

O que não faltam são exemplos de líderes de estado que usaram o futebol para promoverem seus governos e manipular as massas através de uma forma muito parecida com um meio historicamente muito conhecido: a política do pão e circo5.

3.4.1. NA EUROPA

Na década de 1930, ditadores fascistas viram no futebol uma forte oportunidade de promoverem seus regimes totalitários, aproveitando-se da paixão popular para fazerem propagandas políticas.

O ditador Benito Mussolini, em 1934, usou a Copa do Mundo em seu favor, com um discurso nacionalista e uma falsa premissa de superioridade, o ditador usou a competição para fomentar o sentimento de unidade nacional entre os italianos, não medindo esforços para que o país conquistasse a Copa, chegando até mesmo ao ponto de ameaçar atletas e subornar árbitros6.

Em 1938 a história não foi diferente, novamente Mussolini fez uso da ameaça para pressionar seus atletas, enviando na véspera de cada partida o recado ‘’vencer ou morrer’’7. O resultado disso tudo foi novamente um triunfo italiano e autopromoção do líder fascista. Tal influência de Mussolini na manipulação de resultados é facilmente perceptível visto que a próxima Copa conquistada pelo país ocorreu 44 anos depois, somente em 1982.

3.4.2. NO BRASIL

Na América do Sul, líderes locais também se aproveitaram do futebol para propaganda de seus governos. No Brasil, Getúlio Vargas usou fortemente o esporte a seu favor visando uma formação da identidade nacional durante o governo, o futebol foi apresentado nos jornais como uma unidade em harmonia, sem conflitos e sendo um esporte coletivo. Neste sentido, afirmam Kellen Silva Prates e Carlos Eduardo Carvalho (2016, p. 254):

‘’O esporte das massas tornou-se o reflexo da unidade que se buscava no Brasil durante a Era Vargas. O futebol e a política se entrelaçam neste período e a imprensa, controlada pelo Estado, teve o papel de disseminar o “país do futebol” autêntico, singular e com identidade própria.’’

Outro regime que fez forte uso do poder do futebol foi a Ditadura Militar brasileira. Assim como em outros campos da sociedade, o futebol durante o período foi espaço de controle, atrito, tensão, propaganda e resistência. Não abordando muito sobre esse extenso assunto, serão destacados dois importantes momentos, primeiramente o uso da seleção brasileira durante a Copa de 1970 e posteriormente a importância de jogadores na luta pelo Diretas Já8.

Há um grande contexto por trás da conquista brasileira na copa de 70, tal fato serviu como instrumento para o regime militar alavancar o patriotismo nacional e ,através disso, desviar o foco da sociedade durante o período mais repressor e sanguinário do regime militar. A influência dos militares na Seleção Brasileira era tanta que ocorreu inclusive a troca de treinador meses antes da competição. A mando dos militares, João Saldanha foi demitido e em seu lugar foi contratado Mário Zagallo. Tal troca teve motivação, Saldanha era opositor do regime militar e um notório militante comunista, em suas próprias palavras afirmou: “Era difícil tolerar um cara com longa trajetória no Partido Comunista Brasileiro ganhando força, debaixo da bochecha deles”.9

Tal instrumentalização da conquista, na primeira Copa do Mundo transmitida pela televisão, combinado a propagandas ufanistas da época como “Pra frente Brasil’’ e “Brasil, ame-o ou deixe-o” foram uma forte ferramenta de propaganda e alavancagem do autoritário regime.

Por outro lado, da mesma forma em que o futebol foi usado como propaganda pelos repressores militares, o mesmo esporte também foi de extrema importância durante o período do ‘’Diretas Já’’, que defendia o fim da ditadura e a redemocratização do país.

Tal fato está diretamente relacionado à Democracia Corinthiana10, liderada pelo jogador Sócrates, um forte líder opositor ao regime militar que discursou em diversas manifestações e comícios, fazendo uso de sua imagem para atingir e influenciar o maior número de pessoas. Sócrates, inclusive, deixou o país, após a rejeição da Emenda Dante de Oliveira11. O jogador havia afirmado, anteriormente, que continuaria no Brasil caso a Emenda fosse aprovada.

Felizmente, um ano depois, em 1985, após forte influência do movimento Diretas Já, ocorreu oficialmente o fim do regime militar.

3.4.3. NOS DIAS ATUAIS

Atualmente, futebol e política seguem se relacionando fortemente um com o outro. São diversos os casos de candidatos políticos que fazem uso da maior paixão nacional para alavancarem suas imagens, declarando torcida a determinado clube e usando uniformes a cada visita aos diferentes municípios do país.

É notável como o futebol alavanca a imagem de um candidato quando analisamos alguns fatos, destacam-se aqui casos como o de Silvio Berlusconi, político italiano, que usou sua influência como presidente do clube de futebol Associação Calcio Milan, um dos maiores do país, para ser eleito o primeiro-ministro da Itália. No Brasil, guardadas as devidas proporções, Alexandre Kalil, presidente do Clube Atlético Mineiro, também usou essa influência a seu favor para ser eleito prefeito de Belo Horizonte.

E não para por aí, há também inúmeros casos de ex-jogadores que acabam se tornando políticos. No atual momento, destaca-se o caso de Romário, campeão mundial pela seleção brasileira em 1994 e atual senador pelo Estado do Rio de Janeiro.

Estes foram apenas alguns exemplos de como política e futebol estão e seguirão interligados um ao outro. Na verdade, todo o exposto reafirma o fato de como o futebol é um fenômeno cultural e social com forte influência sobre a sociedade, atingindo diversos meios como a economia, a política e, infelizmente, a violência, tema do próximo capítulo.

4. FUTEBOL E VIOLÊNCIA

Uma das principais mazelas da sociedade é a violência, seja de forma física ou não, este problema é intrínseco ao nosso cotidiano sendo algo inerente ao comportamento humano através de sua maneira de reagir a determinadas situações. A forma em que essa violência é expressada é variada devendo ser considerado o sistema histórico e cultural de cada sociedade e a forma em que isso acarreta em influências ao indivíduo.

A Organização Mundial da Saúde (OMS) definiu que a violência caracteriza-se pelo uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha a possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação (KRUG, 2002).

A violência se configura como uma questão social vinculando-se fortemente com a criminalidade, desta forma, se caracterizando como uma grave e reprovável conduta social.

Desta maneira, sendo o futebol um fenômeno social e a violência uma questão social, os dois acabam se entrelaçando em diversos momentos. A violência, cotidianamente está inserida em nossa sociedade, desta forma, acabou sendo inevitável sua ocorrência também em questões relacionadas ao futebol. Para Maurício Murad (1996) a compreensão sociológica da violência no interior do futebol, não pode estar desligada da compreensão sociológica das diferentes práticas de violência que perpassam a sociedade brasileira.

Neste mesmo sentido, expressa Heloisa Helena Reis (2006, p 15):

‘’As raízes da violência relacionada ao futebol estão na sociedade brasileira, sendo impossível separá-las. A formação de indivíduos apáticos ou agressivos e violentos ocorre a partir de sua sociabilidade primária, quando já podem ser percebidas tendências a manifestações agressivas ou apáticas (...) Os fatores geradores de violência são vários e complexos, e pode-se afirmar que a disseminação de uma cultura de que a violência e o futebol sempre caminharam juntos contribuiu para a permissividade da violência nos estádios e dificulta a sua diminuição”.

Desta forma, é necessário destacar as diferentes perspectivas de violência no futebol, há aquela que ocorre diretamente em uma partida, entre os próprios jogadores ao praticarem faltas comuns do jogo como uma trombada por exemplo, nesse caso, no entanto, não há de se falar em agressão, e muito menos crime, visto que os atletas estão exercendo seu exercício regular de direito, nos termos do inciso III, do artigo 23 do Código Penal12. Neste sentido, Julio Fabrini Mirabete (2019, p. 180) afirma:

‘’Há esportes que podem provocar danos à integridade corporal ou à vida (boxe, luta livre, futebol etc.). Havendo lesões ou morte, não ocorrerá crime por ter o agente atuado em exercício regular de direito. O Estado autoriza, regularmente, e até incentiva a prática de esportes, socialmente úteis, não podendo punir aqueles que, exercitando um direito, causam dano.’’

No entanto, é importante destacar que em casos de excesso e desobediência intencional das regras esportivas, é possível considerar como um crime, nos termos do parágrafo único do referido artigo13 e no expresso pelo Código Brasileiro de Justiça Desportiva.14

Esses casos que ocorrem no decorrer de uma partida, mesmo que legalmente autorizados, acabam influenciando em uma outra perspectiva de violência, um problema muito maior, a capacidade de refletir diretamente nos torcedores que estão acompanhando a partida, inflamando seus ânimos e ocasionando em possíveis cenas de baderna entre as torcidas. Sobre isso, afirma Maurício Murad (2012, p. 115):

‘’Dirigentes, treinadores e jogadores deveriam ter consciência das próprias responsabilidades, mas infelizmente não é o que acontece. O exemplo é um dos fatores que ajudam a explicar a violência, porque banaliza as agressões e estimula atritos. São muitos casos de dirigentes que se provocam, técnicos que batem boca, atletas que se agridem, jornalistas e repórteres que não têm limite naquilo que falam nem em relação às “brincadeiras” que fazem.’’

Desta maneira, conforme supracitado, a violência está presente na sociedade, porém, em certos lugares ela encontra cenários ideais para sua expansão, e um desses lugares é o estádio visto ser um espaço onde há grande concentração de pessoas, desta forma, a hostilidade acaba tomando proporções muito maiores. O estádio acaba se configurando em um local propício para a ação de indivíduos violentos, já que há um aglomerado de pessoas nas quais boa parte age de forma passional e instintiva sendo provocadas pela forte emoção que envolve a partida, além da própria influência dos atos cometidos pelos jogadores dentro de campo.

O resultado disso tudo é que diariamente, nos noticiários, presenciamos tristes acontecimentos de confrontos entre torcedores, dentro e fora do estádio.

Desta forma, não é possível abordar tais acontecimentos sem antes introduzir sobre como e quando esses torcedores começaram a se juntar, criando as torcidas organizadas, as maiores causadoras de episódios violentos. Outro fator indispensável é o Hooliganismo e a forma em que ele influenciou e transformou as torcidas brasileiras.

4.1. HOOLIGANISMO INGLÊS

O futebol tornou-se uma paixão continental, se popularizando fortemente por toda a Europa durante o século XX, período no qual clubes rivais se enfrentavam em estádios lotados de adeptos. A consequência não poderia ser outra, inspirados na paixão pelo mesmo clube, os torcedores começaram a se unir para acompanharem as partidas, desta forma, foi surgindo a rivalidade contra torcedores de outros clubes, sejam de outro país, estado, cidade ou até mesmos bairros diferentes.

A partir de 1950, houve um grande crescimento do sentimento de união entre torcedores que compartilhavam o gosto pelo mesmo clube. Grupos organizados se identificavam através de sua mesma origem e ideologia e enxergavam na torcida a oportunidade de confrontar seus rivais diretamente em busca de um sentimento de dominância sobre os outros grupos, desta forma, cenas de confrontos entre torcedores aumentaram desenfreadamente.

Estes grupos receberam o nome de ‘’Hooligans’’15, termo que se refere ao comportamento desordeiro, destrutivo e intimidador desempenhado por esses torcedores nos quais começaram a se organizar cada vez mais através da criação de hinos, gritos de guerra e brasões. Tais aspectos eram importantes para a distinção entre as torcidas rivais. De acordo com Luiz Henrique Toledo (1996, p. 125):

‘’Os hooligans é um segmento da torcida inglesa que frequenta os estádios de futebol, conhecidos pelo comportamento violento observado no interior das praças esportivas ou nos seus entornos.’’

Ainda, sobre os hooligans, Richard Giulianotti (2002, p. 74) afirma:

‘’Torcedores jovens procuravam ganhar prestígio para seu grupo de hooligans, ‘’ocupando’’ a arquibancada atrás do gol que ‘’pertencia’’ a seus rivais. Invasões de gramado também ocorriam, particularmente quando seu time estava perdendo. As autoridades policiais e do futebol introduziram cercas, ‘’enjaulando’’ os torcedores nas arquibancadas atrás do gol e segregando os torcedores da casa e os visitantes em diferentes partes do campo. Essas medidas modernistas inadvertidamente serviram para intensificar o hooliganismo no futebol. Aos poucos, a violência foi deslocada do campo, acentuando os diferentes sentidos de identidade dos grupos de hooligans e sua diferenciação formal do conjunto geral de torcedores.’’

O hooliganismo tornou-se um estilo de vida para esses indivíduos que sentiam prazer em brigar. A existência de hierarquias entre as torcidas eram formadas de acordo com o sucesso de cada indivíduo em suas empreitadas violentas, aquele que mais brigava, era o mais respeitado de forma a ascender dentro da própria torcida.

Na Inglaterra, o país precursor do futebol, foi onde esses grupos mais cresceram e causaram problemas à sociedade, a desordem tomou proporções absurdas e confrontos entre torcedores nos estádios e fora deles se tornaram frequentes a cada partida. Tais confrontos eram motivados além somente da diferença entre os clubes, indivíduos se aproveitavam desse rótulo de ‘’torcedores’’ para destilar sua xenofobia, homofobia e intolerância religiosas contra os outros grupos. Neste sentido, Luiz Henrique Toledo (1996, p. 127) destaca:

“A partir da Copa do mundo de 1966, realizada na Inglaterra, os skinheads aproximaram – se das torcidas, sendo englobados pela mídia, posteriormente, sob o rótulo comum de Hooligans. O processo de constituição desses agrupamentos, portanto, é complexo na medida em que, ao longo de décadas, incorporou vários outros grupos que vislumbravam no futebol uma possibilidade de expressão. Sendo assim, Hooligans compreende, primeiro, determinadas posturas e comportamentos diante da sociedade”

Este grupo causava terror nos estádios e nas ruas. Ocupavam os espaços mais populares dos estádios, atrás dos gols, e de lá promoviam a desordem, com sessões de violência e invasões de gramado. A então primeira-ministra britânica, Margaret Thatcher, tentou lidar com o problema através de forte repressão policial e isolamento dos hooligans que ficavam cercados por grades pontiagudas com arame farpado. Porém, tais procedimentos não bastavam, pelo contrário, apenas afloraram ainda mais o desejo violento dos grupos, que sentiam prazer em brigar, resultando em diversos confrontos contra os policiais.

Neste sentido, se faz pertinente destacar uma passagem do jornal The New York Times (2010) tratando acerca do hooliganismo:

‘’O que temos a ver com o hooligan? Quem ou o que é responsável pelo seu crescimento? Toda semana, algum incidente deixa claro que determinadas zonas de Londres são mais perigosas para o transeunte pacífico do que as recônditas regiões da Calábria, Silícia ou Grécia, outrora clássicos refúgios de bandoleiros. Todo dia, em algum tribunal, são narrados detalhes de atos de brutalidade, cujas vítimas são homens e mulheres inocentes. Enquanto o hooligan maltratava unicamente o hooligan – enquanto ouvíamos falar principalmente dos ataques e contra-ataques de bandos, ainda que por vezes munidos de armas mortais –, a questão era bem menos premente do que tornou agora... não há como olhar sem inquietação, contudo, para a insistente recorrência de explosões de violência por parte de marginais, o sistemático desrespeito à lei por parte de grupos de garotos e rapazes que representam o terror da vizinhança em que habitam. Nossos hooligans vão de mal a pior. Eles são uma degeneração no organismo político, sendo a pior circunstância o fato de estarem se multiplicando e que as juntas educacionais e previsões, os magistrados da polícia e os filantropos não parecerem contribuir para regenera-los. Outras grandes cidades podem se livrar de elementos mais perniciosos ao Estado. Não obstante, o hooligan constituiu uma odiosa excrecência de nossa civilização”.

O caso que ficou marcado, sendo um dos maiores exemplos da selvageria dos Hooligans, foi a “Tragédia de Heysel’’, na Bélgica, em 1985, durante uma partida válida pela final da UEFA Champions League, na disputa entre o Liverpool, da Inglaterra, contra a Juventus, da Itália. Nesta tragédia ocorreu o confronto entre torcedores dos dois clubes resultando em um desastre com mais 600 feridos e 39 mortos.

O ocorrido evidenciou o auge do hooliganismo durante a década de 1980. Em relatório oficial, a UEFA responsabilizou os hooligans ingleses pelo incidente, o que resultou em uma proibição aos clubes ingleses de participarem de competições europeias pelo período de cinco anos. Autoridades inglesas como a rainha Elizabeth II e a primeira-ministra Margareth Thatcher apoiaram a decisão e condenaram publicamente os torcedores ingleses.

Inicialmente, não houve nenhum detido, no entanto, três anos depois, 25 torcedores ingleses e o responsável pela segurança do estádio foram julgados e condenados.

Figura 1 -Manchete do jornal espanhol Marca noticiando a infeliz tragédia de Heysel.

Poucos anos depois, um outro desastre foi o ‘’basta’’ para as autoridades inglesas tomarem medidas mais severas acerca da conduta dos torcedores e melhoria nas estruturas dos estádios. Em 1989 ocorreu a “Tragédia de Hillsborough’’ no qual resultou na morte de 97 torcedores16 e outras dezenas de feridos. Inicialmente, através de relatório oficial, as autoridades competentes responsabilizaram os hooligans, alegando o uso de álcool e violência. No entanto, novas investigações apontaram que a tragédia não foi causada por ação violenta dos torcedores. As causas, desta vez, foram a superlotação do estádio e seu péssimo estado de conservação. Tal fato foi admitido somente anos depois através do responsável pela segurança no estádio que assumiu a culpa da Polícia pela tragédia.17

Figura 2 - Mosaico da torcida do Liverpool em homenagem às vítimas do desastre de Hillsborough.

Na sequência ao desastre, foi elaborado o Relatório Taylor18, documento com o objetivo de buscar explicações ao ocorrido, investigando as causas e consequências da tragédia para ao final apresentar recomendações e modificações para solucionar os problemas nos estádios através de uma melhor organização das estruturas e gestão da segurança do futebol.

Contrariando os primeiros documentos oficiais, o Relatório não atribuiu a culpa do desastre exclusivamente aos hooligans, mas sim considerou todo o contexto geral que, inevitavelmente, ocasionou o incidente, desde a venda em excesso de ingressos até a falta de estrutura mínima do estádio.

O relatório foi um marco para o futebol inglês pois elaborou diversas recomendações que visavam a evolução do espetáculo esportivo, dentre elas estavam as reformas estruturais dos estádios e o aumento do efetivo policial que deveria fazer a segurança da partida, para evitar o ocorrido em Heysel quando somente 6 policiais estavam na divisa entre os torcedores.

Entre outras importantes modificações estão a redução da capacidade de público, a comercialização antecipada de ingressos, a fixação do assento de cada torcedor, o controle na comercialização de bebidas alcoólicas e uma das mais polêmicas até então: a proibição de ficar em pé durante as partidas. Para Peter Taylor (1990), idealizador do Relatório, o comportamento e a segurança da multidão estão diretamente relacionados à qualidade das acomodações e instalações.

Tais modificações surtiram efeitos e como consequência houve a redução drástica do número de ocorrências envolvendo o confronto entre torcedores visto que também ocorreu um agravamento das responsabilizações aos torcedores que insistiam na violência.

4.1.1. DAS SOLUÇÕES PARA CONTER A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL INGLÊS

Motivada por tantos acontecimentos a Inglaterra precisou reconstruir seu futebol e foi a partir do Relatório Taylor que se iniciou esta reconstrução. Foram diversas melhorias voltadas para o objetivo de transformar o futebol apenas em um espetáculo esportivo, afastando dele os problemas da violência.

Desde o desastre de Hillsborough, centenas de estádios passaram por reformas estruturais, outras dezenas foram demolidos dando lugar a modernas arenas com assentos para todos os presentes excluindo o espaço onde os torcedores ficavam em pé, espaço este que era o epicentro do início das confusões e badernas.

Aliada à melhoria das estruturas, foi elaborada também uma política de prevenção da violência, medida muito mais eficaz que as violentas repressões policiais que até então existiam. Um importante método desta prevenção era a identificação prévia dos torcedores desordeiros, desta forma, já se buscava conter os confrontos antes de serem iniciados. Todos os estádios tiveram que instalar um sistema de monitoramento por câmeras e através desta ferramenta foi facilitado o trabalho das autoridades em identificarem os focos iniciais e líderes das brigas. Através deste meio, diversos hooligans eram retirados do estádio antes mesmo do início da partida, isso quando não eram barrados diretamente na catraca de acesso ao estádio. Assim, os confrontos entre torcidas e policiais deram lugar a um trabalho de inteligência, o resultado foi a queda drástica da quantidade de confrontos envolvendo esses polos.

Nos dias atuais, aliado a tecnologia, ficou ainda mais fácil fazer o controle de quem acessa o estádio. Todos os torcedores precisam fazer um cadastro através de sua biometria, desta forma, aquele que já causou algum tipo de problema dificilmente conseguirá adentrar à arena.

O recado que os ingleses querem passar aos hooligans é claro: ‘’você não é bem-vindo aqui’’. Todo torcedor que é detido por conta de algum ato violento sofre com uma Ordem de Banimento do Futebol, sendo obrigado a ficar de três a dez anos impedido de entrar em qualquer estádio do país. Ao ser banido o torcedor é direcionado a uma delegacia para ser identificado e fotografado. Em cada estádio há uma câmera com reconhecimento facial, desta forma, ao ser identificado qualquer hooligan, imediatamente é emitido um alerta às autoridades. Quem descumprir é detido e levado a julgamento. As penas geralmente são prisões de até 6 meses além de uma multa de 5 mil libras.

Tais medidas têm demonstrado resultado, segundo dados do departamento britânico Home Office19 Em 92% dos casos quem é banido não volta a apresentar outro tipo de ato violento. A cada ano a quantidade de torcedores na lista de banidos têm caído, comprovando assim a eficácia da medida, notada também pelo praticamente desaparecimento de confrontos entre torcidas de grandes clubes ingleses, fato inimaginável durante a década de 1980.

O método com que os ingleses usaram para conter a violência foi usado como exemplo por diversos outros países, principalmente os europeus que conseguiram controlar os atos violentos de seus torcedores. Neste sentido afirmou Heinz Palme, diretor do Centro Internacional de Segurança no Esporte: "O exemplo inglês foi decisivo para todo o futebol europeu, a Inglaterra reforçou a tese de que, quando a casa está limpa e organizada, os visitantes tendem a mantê-la assim.”20

No entanto, em muitos lugares a violência por conta do futebol segue sendo um problema e um destes lugares é o Brasil, muito em conta das rivalidades entre torcidas organizadas, tema que será trabalhado mais detalhadamente no próximo capítulo.

5. A VIOLÊNCIA NO FUTEBOL BRASILEIRO E AS TORCIDAS ORGANIZADAS BRASILEIRAS

No Brasil a violência que ronda o futebol ainda segue sendo um problema que parece estar longe de acabar, interferindo diretamente na sociedade em geral visto a força do esporte como um fenômeno social. Neste sentido, Maurício Murad (1996, p. 49) relaciona as violências sociais e as violências do futebol em nosso país:

“A problemática da violência no universo do futebol brasileiro é múltipla, plural e diversa. Objeto de caráter polissêmico, admite leituras diversas e isto porque a violência no futebol é multifacetada, como o é, também, na realidade brasileira. (...) A questão da violência no futebol é variada, não tem causa única. Razões estruturais e conjunturais, motivações macro e micro, combinam-se dialeticamente na elucidação do fenômeno, que é básico para o entendimento do futebol e do Brasil. ”

Da mesma maneira, destaca-se a visão de Carlos Alberto Pimenta (2000, p. 122):

‘’A violência entre torcidas organizadas não está desarticulada dos aspectos político, econômico e sociocultural vivenciados nas relações individuais e grupais na sociedade brasileira contemporânea. Consequentemente, o estilo de vida dos jovens não pode ser dissociado dos desdobramentos causados por esses traçados político-econômicos legitimados no "jogo" social.’’

Em grande maioria dos casos, os responsáveis pela forte violência vinculada ao futebol são as torcidas organizadas. O surgimento dessas torcidas têm muito em comum aos dos ingleses, inicialmente grupos pequenos de indivíduos nutrindo o sentimento de paixão pelo mesmo clube se identificam uns aos outros, existindo uma certa cumplicidade entre os membros, desta forma se unem para acompanhar a partida em um mesmo setor do estádio.

As organizadas surgiram na primeira metade do século XX, a Torcida Uniformizada do São Paulo (TUSP), criada em 1939, é considerada como a primeira torcida organizada do Brasil, seguido na sequência pela Charanga do Flamengo, de 1942 e pela Torcida Organizada do Vasco (TOV) de 1944.21 Essas torcidas eram formadas por sócios dos próprios clubes e membros da elite22, tendo objetivo único apenas de torcer e apoiar o clube, a violência e o confronto entre torcedores não era algo comum neste período.

No entanto, ao final da década de 1960 esse cenário muda e começam a surgir as torcidas organizadas nos modelos atuais, dominadas pelas classes mais populares. Além de torcer, esses torcedores também tinham como objetivo a questão de serem considerados os maiores, mais respeitados e temidos, o que inevitavelmente começou a gerar uma grande quantidade de confrontos entre os grupos que disputavam o domínio do título de maior torcida. Nesse sentido, expressa Carlos Alberto Máximo (2000. p. 122):

‘’Dos anos 80 para cá, sabe-se que, no Brasil, o comportamento do torcedor nas arquibancadas dos estádios de futebol modificou-se consideravelmente. Isso se deu pelo surgimento de configurações organizativas com característica burocrática/militar, fenômeno essencialmente urbano que cria uma nova categoria de torcedor, ou seja, o chamado torcedor organizado.’’

O Rio de Janeiro foi o palco inicial de surgimento dessas novas torcidas, em 1967 surgiu a Torcida Jovem do Flamengo, seguida pela Torcida Jovem do Botafogo em 1969 e pela Força Jovem do Vasco e Torcida Young Flu em 1970. Tal movimento de criação se espalhou pelo Brasil todo, ocorrendo durante a década de 1970 e 80 uma explosão de surgimento de novas torcidas organizadas. Nota-se nessa situação que a rivalidade esteve presente desde do início, pois assim que surgia a Torcida Organizada de um clube, na sequência era fundada a T.O do clube rival.

O que caracteriza essas torcidas são suas padronizações de vestimentas no qual utilizam uniformes da própria torcida em substituição ao do clube e principalmente sua estrutura hierárquica composta por presidente, vice-presidente, tesoureiro, diretores, conselheiros, entre outros cargos organizacionais. Tamanha organização e adesão de milhares de membros fizeram com que essas torcidas deixassem de ser apenas pequenos grupos, passando a ser praticamente uma empresa, inclusive com registro em cartório, visto a alta movimentação de dinheiro em decorrência das mensalidades dos associados e da venda de produtos como camisetas, bermudas e agasalhos, desta forma, diversas torcidas criaram até mesmo CNPJ próprio. Nesse sentido, expressam Felipe Tavares Lopes e Heloísa Helena Reis (2017, p. 36):

‘’A segunda geração surgiu no final da década de 1960 e é muito atuante até hoje. As torcidas dessa segunda geração nasceram reivindicando autonomia face aos clubes e adotando um novo estilo de torcer, a fim de demarcar distinção em relação às da primeira geração. Ao longo dos anos, foram se tornando mais profissionais, burocráticas e empresariais’’

Apenas apoiar o clube e fazer festa nas arquibancadas deixaram de ser os únicos objetivos das novas torcidas. Elas não se contentavam apenas com isso, queriam mais, queriam o título de ser a mais imponente, respeitada e temida. Cada clube tinha seu o rival, da mesma forma, automaticamente, cada torcida tinha a sua rival. Inevitavelmente os confrontos entre essas torcidas começaram a ocorrer de maneira desenfreada, indo muito mais além do futebol, tornando-se um problema para a sociedade.

Além da organização burocrática, as torcidas passaram a ter organizações aguerridas justamente para combater os torcedores rivais nesses confrontos, desta forma, dentro de uma torcida há a divisão entre os ‘’linhas de frente’’, os ‘’retaguardas’’, os responsáveis pela proteção dos materiais (faixas e instrumentos da bateria), entre outros. Ocorrendo literalmente uma espécie de militarização hierarquizada nas torcidas. Nesse contexto, Maurício Murad (1996, p. 97) afirma:

“A mudança de comportamento das "organizadas" levou de dez a quinze anos desde sua gestação até sua presença nas páginas policiais. De carnavalizadas passaram a ser militarizadas, seguindo as doutrinas e os padrões de organização do militarismo então vigente, que se entranhava em todos os setores da sociedade. (...) Seus símbolos são militares, como também são suas relações de poder, hierarquia interna e comportamento grupal.”

Um exemplo claro de imponência que essas torcidas desejam transmitir está na escolha dos nomes, muitas vezes remetendo à guerra. São diversas as torcidas com nomes como ‘’Fúria”, ‘’Ira’’, ‘’Força’’, “Império’’, ‘’Guerrilha’’, ‘’Terror’’, ‘’Guerreiros’’, Imbatíveis’’, ‘’Falange’’, ‘’Máfia’’, ‘’Inferno’’, entre outras. O que todos esses nomes têm em comum? Remetem à imponência, respeito, grandeza, e claro, indiretamente, à violência.

Neste sentido, Carlos Alberto Pimenta (2003, p. 44) recolheu em sua obra o relato de Paulo Serdan, ex-presidente da Torcida Mancha Verde da Sociedade Esportiva Palmeiras, uma das maiores do país:

"Escolhemos o nome Mancha Verde com base no personagem 'Mancha Negra' do Walt Disney, que é uma figura meio bandida, meio tenebrosa. A gente precisava de uma figura ideal e de pessoas que estivessem a fim de mudar a história. Na época, a gente tinha uns 13/14 anos de idade e já havíamos sofrido muito com as outras torcidas, então, a gente começou com muita vontade, muita garra e na base da violência. A gente deve ter exagerado um pouco, porém, foi um mal necessário. A gente conseguiu o nosso espaço e adquirimos o respeito das demais torcidas."

Nota-se, portanto, que desde a escolha do nome, em alusão a um personagem ‘’tenebroso’’, direta e indiretamente, a violência esteve presente e é através dela que as torcidas encontram o respeito e imponência que tanto desejam.

Diante de todo esse contexto, a violência entre as torcidas brasileiras se tornou algo comum em nosso futebol e sociedade, ocorrendo diversos atos violentos com certa frequência. Alguns desses casos merecem o devido destaque.

5.1. CASOS E CONFRONTOS

São diversos os acontecimentos de confrontos entre torcidas, no entanto, alguns desses ficaram marcados devido as fatalidades ocorridas.

Durante a década de 1970 e 1980 já havia relatos da existência de confrontos entre torcedores, no entanto, tais brigas aconteciam apenas ‘’na mão’’, sem o uso de armas brancas ou de fogo. O problema começou a surgir nesta época, porém, as autoridades competentes nada fizeram para combater logo no início, ocasionando, assim uma expansão desse problema, portanto, com o passar do tempo, os conflitos foram aumentando e com ele, o nível de agressividade dos torcedores também. Se inicialmente brigavam somente usando as mãos, agora passaram a utilizar instrumentos para praticarem seus atos, seja através de barras de ferro, pedaços de pau, pedras, facas e em alguns casos, armas de fogo.

A década de 1990 é marcada como o período quando se intensificou a violência entre as torcidas organizadas, foi nessa época em que os torcedores começaram a se armar com paus e pedras para participarem dos confrontos. Inevitavelmente a consequência foram os diversos casos de vítimas fatais ou com sequelas físicas irreversíveis.

Um fato que marcou o início dessa era sangrenta de confrontos foi o assassinato de Cleofas Sóstentes da Silva, um dos fundadores da Torcida Mancha Verde, em 1988. Apesar de investigações policiais não terem encontrado os envolvidos no crime, membros da torcida acreditam que a motivação foi uma vingança de outra torcida organizada rival após uma briga23. O assassinato de Cléofas foi um fato marcante pois até então as torcidas obedeciam um ‘’código de conduta’’ no qual proibia o uso de armas, no entanto, após esse crime, foi aberto um grave precente e o uso de equipamentos perigosos nos confrontos se tornaram frequente.

Esse caso até hoje não foi solucionado e nenhum participante foi identificado, tal exemplo de impunidade é mais uma questão que explica os motivos para os confrontos entre torcidas estarem longe de ter um fim. Talvez, caso os assassinos fossem identificados e responsabilizados na época, não teria sido aberto o precedente que intensificou os confrontos entre torcedores. É esse ‘’ar’’ de impunidade que colabora para que torcedores violentos continuem a praticar seus atos.

Pouco tempo após o assassinato, em uma partida entre Palmeiras e Cruzeiro, em São Paulo, torcedores cruzeirenses causaram uma ira e revolta dos palmeirenses ao provocarem e zombarem a morte de Cléofas. Tal fato resultou em uma briga generalizada nas arquibancadas, com invasão ao espaço em que se encontrava a torcida visitante que encurralada foi agredida por pedaços de pau e barras de ferro. Não houve a prisão dos envolvidos e mais uma vez a impunidade prevaleceu.

Diante tantos acontecimentos e através de uma omissão das autoridades públicas que não conseguiam responsabilizar os envolvidos, confronto entre torcedores foi se tornando algo cada vez mais frequente e o uso de armas brancas se tornaram algo comum.

Em 1995 aconteceu outro fato marcante, no qual, desta vez, resultou em medidas mais rígidas e restritivas às torcidas organizadas. Em 20 de Agosto de 1995 ocorreu a ‘’Batalha do Pacaembu’’, quando, após uma partida entre São Paulo FC e Palmeiras, centenas de torcedores invadiram o gramado e começaram as agressões dentro de campo, o futebol deu espaço a cenas de guerra. Este incidente foi marcante pois todas aquelas cenas de selvageria estavam sendo transmitidas ao vivo para todo o Brasil por emissoras de Televisão. O confronto entre os torcedores resultou em 102 feridos e um óbito. Apesar de diversos delitos ali cometidos por inúmeros participantes do confronto, apenas um foi identificado e julgado, sendo este, o primeiro caso de briga entre torcidas que foi a julgamento no Brasil.

Figura 3 - Imagem do confronto entre torcedores no Estádio Pacaembu.

Uma outra questão que merece ser destacada foi o descaso das autoridades públicas durante a organização e realização da partida. São diversos os relatos que demonstram que a falta de estrutura organizacional contribuiu para que o confronto entre torcedores ocorresse. Por se tratar de um clássico entre dois clubes rivais, não se podia ter um efetivo policial tão pequeno, sem contar que o estádio estava passando por reformas e os setores com entulhos não estavam devidamente isolados, possibilitando, então, o fácil acesso às pedras e pedaços de madeira utilizados como armas nas agressões. Outro sério erro foi que havia apenas uma médica e ambulância designada para acompanhar a partida, sendo a única responsável por atender as centenas de torcedores feridos. Nesse sentido, a médica Ana Maria Visconti relatou em entrevista ao Jornal Estadão (2020):

“O grupo de trabalho era pequeno, apenas uma ambulância de UTI, assim como o contingente policial (...) Nadamos em sangue. Ganhei uma experiência muito grande. Foram muitos atendimentos. De todos os tipos”

Seguindo nessa questão de omissão e falha do poder público na organização do evento esportivo, Ester Gasparin, mãe do torcedor que faleceu, entrou com uma ação responsabilizando os administradores do estádio, porém não teve êxito em seu pedido, em relato ao Jornal Estadão (2015) ela afirmou: "A culpa foi de quem deixou o jogo ser realizado lá, com aqueles entulhos."

Outros presentes no dia concordam com Ester e também afirmaram ao Jornal Estadão (2015) que os organizadores falharam. O torcedor Wildner Paula Rocha afirma: "A torcida tem culpa, sem dúvida. Mas não é possível que os dirigentes não tivessem avaliado o risco.’’. No mesmo sentido relatou Hélio Silva: "Pela experiência de torcedor, eu vi que tinha pouca polícia e aquele monte de entulho".

Diante do acontecimento estava claro, algo precisava ser feito e foi esse episódio sangrento que escancarou a necessidade de mudanças e providências por parte das autoridades. Foi a partir dele que iniciou-se um ‘’cerco’’ contra as Torcidas Organizadas e medidas mais rígidas passaram a ser tomadas para controlar os torcedores uniformizados.

Fernando Capez, à época Promotor de Justiça do Estado de São Paulo, foi quem liderou o movimento de combate à violência entre torcedores, pedindo inicialmente a extinção das torcidas organizadas envolvidas no incidente do Pacaembu, na sequência, a Federação Paulista de Futebol proibiu que todas as torcidas organizadas adentrassem aos estádios do Estado. No entanto, tais medidas foram apenas para ganharem popularidade visto que não se mostraram eficazes ao modo que os torcedores continuavam a se juntar, porém dessa vez apenas não usavam adereços da torcida. Outra medida sem muito sentido foi a proibição das bandeiras de mastro sob a alegação que poderiam ser utilizadas como armas, no entanto desconsideram o fato de que as armas utilizadas nos confrontos foram entulhos das obras do estádio. As duas torcidas extintas ainda encontraram outra alternativa para ‘’burlar’’ essa punição através da mudança de CNPJ e nome das associações que passaram a se chamar Torcida Mancha Alviverde e Torcida Tricolor Independente.

Esse incidente foi um ‘’divisor de águas’’ e foi a partir dele que os órgãos públicos passaram a se atentar mais a essa questão, o Ministério Público passou a ser mais atuante e fiscalizador, o que resultou em diversas multas e bloqueios às Organizadas, isso, de certa forma, acabou afetando financeiramente as associações e foi uma maneira encontrada para que os líderes tentassem controlar e limitar seus membros mais agressivos. Sobre essas punições às Organizadas, Fernando Capez afirmou, em entrevista ao Jornal Estadão (2015):

‘’Tivemos 22 mortes dentro de estádios de fevereiro de 1992 a agosto de 1995 e não se punia a torcida por esses crimes. Ali, também foi uma barreira que se quebrou. A partir daquele trabalho veio o Estatuto do Torcedor, a criação do Tribunal para pequenas causas e as investigações com torcidas.’’

Esses foram apenas alguns dos diversos casos de violência entre torcedores, um problema não solucionável e sem a devida atenção das autoridades até então. Somente após pressão da popular e midiática (visto que o confronto no Pacaembu foi transmitido ao vivo para todo o país) que as autoridades notaram que algo precisava ser feito, sendo necessário a elaboração de um plano visando a solução do problema.

Nessa toada, mediante tantos acontecimentos, o poder legislativo também começou a dar mais atenção aos transtornos que envolviam questões esportivas, foi nesse sentido que passou a ser elaborado o Estatuto de Defesa do Torcedor, publicado em 2003.

6. ESTATUTO DE DEFESA DO TORCEDOR - LEI 10.671/03

O Estatuto do Torcedor foi resultado de um histórico conturbado pelo qual passava o futebol brasileiro, alguns desses casos demonstrados nos capítulos anteriores. Tal momento e o ápice da violência entre as torcidas demandava medidas que protegessem o torcedor. Eram diversas as situações de estádios acima da capacidade de público, invasões ao campo e confronto entre torcedores. Mediante todo esse contexto, o objetivo da lei foi buscar uma melhor estruturação e normatização das competições desportivas brasileiras, protegendo os interesses dos torcedores e obrigando as instituições responsáveis a buscarem melhorias para a realização das partidas de modo em que o evento se tornasse mais organizado e seguro. Neste sentido, destaca-se o expresso em uma de suas publicações pela Revista Brasileira de Ciências do Esporte (2008, p. 28):

‘’A ideia do estatuto é de que uma vez garantidas as exigências da lei, serão fornecidos segurança e conforto, enfim, um bom produto ao espectador. Assim se resolveria o problema da violência no futebol, pois os consumidores estariam satisfeitos. No caso de insatisfação dos consumidores, eles teriam a possibilidade de prestar queixa ao Ministério Público e pedir indenização.’’

Desta forma, de modo geral, o Estatuto é uma espécie de prolongamento do Código de Defesa do Consumidor, porém, voltado ao ambiente esportivo, tratando o torcedor como um consumidor do esporte e o organizador do evento, um fornecedor. É assim que dispõe o art. 40 do EDT:

Art. 40. A defesa dos interesses e direitos dos torcedores em juízo observará, no que couber, a mesma disciplina da defesa dos consumidores em juízo de que trata o Título III da Lei no 8.078, de 11 de setembro de 1990.24

A lei tratou de diversos aspectos da relação entre o evento e o torcedor, abordando sobre todo o procedimento de logística, estrutura e organização necessária para que a partida, com público, ocorresse da melhor maneira possível.

Apesar de objetivar melhorias significativas para a organização das competições, houve controvérsias ao EDT, sendo objeto até mesmo de uma Ação Indireta de Inconstitucionalidade (ADI 2937), proposta pelo Partido Progressista que alegou:

‘’O Estatuto de Defesa do Torcedor significava uma afronta aos postulados constitucionais da liberdade de associação, da vedação de interferência estatal no funcionamento das associações e, sobretudo, da autonomia desportiva.”

No entanto, tal pedido não prosperou e foi julgado improcedente pelo Supremo Tribunal Federal.

O que difere bastante o Estatuto do Torcedor das demais leis anteriores a ele, também voltadas ao desporto, como a Lei nº 8.672/93 e a Lei 9.615/9825, é que estas estavam voltadas totalmente à regulamentação e organização dos clubes e campeonatos, deixando de lado outras questões. Já o EDT, traz em sua matéria questões como a estruturação dos estádios e segurança aos torcedores, buscando assim, uma mudança geral na qualidade do futebol brasileiro como um todo.

Dentre tantas questões abordadas pelo EDT, destacamos as principais voltadas ao assunto do presente trabalho: a segurança necessária aos torcedores.

6.1. SEGURANÇA E PROTEÇÃO AOS TORCEDORES

Logo em seu início o Estatuto apresenta uma valorização ao torcedor através de normas voltadas à sua proteção e segurança, como dispõe os artigos 1º e 1º-A26 da respectiva Lei.

Art. 1o Este Estatuto estabelece normas de proteção e defesa do torcedor.

Art. 1o-A. A prevenção da violência nos esportes é de responsabilidade do poder público, das confederações, federações, ligas, clubes, associações ou entidades esportivas, entidades recreativas e associações de torcedores, inclusive de seus respectivos dirigentes, bem como daqueles que, de qualquer forma, promovem, organizam, coordenam ou participam dos eventos esportivos.

Destaca-se também, logo de início, a preocupação com a prevenção da violência, determinando que é de responsabilidade de todos os entes envolvidos na organização do evento esportivo, seja de forma direta ou indireta e seja ente público ou não. Sobre isso, foi assim que relatou a Ministra Nancy Andrighi (2021) em um julgado do Superior Tribunal de Justiça:

‘’O Estatuto de Defesa do Torcedor (EDT) foi editado com o objetivo de frear a violência nas praças esportivas, de modo a assegurar a segurança dos torcedores. O direito à segurança nos locais dos eventos esportivos antes, durante e após a realização da partida está consagrado no art. 13 do EDT. A responsabilidade pela prevenção da violência nos esportes é das entidades esportivas e do Poder Público, os quais devem atuar de forma integrada para viabilizar a segurança do torcedor nas competições.’’

Nesse mesmo sentido, foi destinado um capítulo específico do Estatuto para tratar acerca dessa proteção e segurança aos torcedores, presente no capítulo IV, sob titulação de ‘’Da segurança do torcedor partícipe do evento esportivo’’. Em seu corpo trata de matérias como acessibilidade facilitada a torcedor portador de deficiência, estabelece que a responsabilidade pela organização e segurança do espaço esportivo é da equipe mandante, devendo informar às autoridades públicas detalhes sobre o evento esportivo, além de solicitar presença de efetivo policial, providenciar ambulâncias e médicos, providenciar sistema de monitoramento por câmeras, entre outras medidas. Enfim, é necessário traçar um plano estratégico e organizado para que a competição esportiva ocorra da melhor maneira possível sem qualquer tipo de incidente.

Ainda, dentro deste capítulo, destacam-se os artigos que tratam acerca do direito do torcedor a segurança no local, nos termos do art. 13 da respectiva Lei:

Art. 13. O torcedor tem direito a segurança nos locais onde são realizados os eventos esportivos antes, durante e após a realização das partidas.

Já o art. 13-A, também incluído pela lei nº 12.999/10, dispõe de algumas condições necessárias que devem ser seguidas pelos organizadores do evento, conforme exposto:

Art. 13-A. São condições de acesso e permanência do torcedor no recinto esportivo, sem prejuízo de outras condições previstas em lei:

I - estar na posse de ingresso válido;

II - não portar objetos, bebidas ou substâncias proibidas ou suscetíveis de gerar ou possibilitar a prática de atos de violência;

III - consentir com a revista pessoal de prevenção e segurança;

IV - não portar ou ostentar cartazes, bandeiras, símbolos ou outros sinais com mensagens ofensivas, inclusive de caráter racista ou xenófobo;

V - não entoar cânticos discriminatórios, racistas ou xenófobos;

VI - não arremessar objetos, de qualquer natureza, no interior do recinto esportivo;

VII - não portar ou utilizar fogos de artifício ou quaisquer outros engenhos pirotécnicos ou produtores de efeitos análogos;

VIII - não incitar e não praticar atos de violência no estádio, qualquer que seja a sua natureza;

IX - não invadir e não incitar a invasão, de qualquer forma, da área restrita aos competidores.

X - não utilizar bandeiras, inclusive com mastro de bambu ou similares, para outros fins que não o da manifestação festiva e amigável.

Parágrafo único. O não cumprimento das condições estabelecidas neste artigo implicará a impossibilidade de ingresso do torcedor ao recinto esportivo, ou, se for o caso, o seu afastamento imediato do recinto, sem prejuízo de outras sanções administrativas, civis ou penais eventualmente cabíveis.

Portanto, nesse artigo, notamos a presença de algumas condições que visam evitar que ocorra qualquer tipo de violência entre os torcedores, tal qual a necessidade de revista pessoal preventiva para segurança, não portar nenhum tipo de símbolo que transmite alguma mensagem ofensiva e possa causar revolta do torcedor adversário, não entoar cânticos discriminatórios, não incitar ou praticar qualquer ato de violência e também não invadir ou arremessar objetos no campo. O parágrafo único ainda destaca a possibilidade de sanção penal a quem descumprir alguma dessas condições. Todas essas exigências têm o objetivo claro de evitar qualquer tipo de briga ou tumulto entre os presentes no estádio.

6.2. DISPOSIÇÕES ACERCA DAS TORCIDAS ORGANIZADAS

De acordo com o apresentado em capítulos anteriores, membros das torcidas uniformizadas são responsáveis por boa parte dos atos violentos no âmbito futebolístico, deste modo, foi necessário que recebessem uma atenção especial do Estatuto.

O art, 2º-A, incluído pela Lei 12.999/10, diferencia as torcidas organizadas dos torcedores comuns, descrevendo que:

‘’Considera-se torcida organizada, para os efeitos desta Lei, a pessoa jurídica de direito privado ou existente de fato, que se organize para o fim de torcer e apoiar entidade de prática esportiva de qualquer natureza ou modalidade.’’

Em seu parágrafo único o presente artigo dispõe que a TO deve manter o cadastro de seus associados em dia, constando diversas informações pessoais tais quais o nome completo, fotografia, RG, CPF, profissão e endereço completo.

Essa é uma das alternativas encontradas que visa facilitar na identificação e responsabilização de torcedores baderneiros. Porém, na prática, dificilmente as torcidas cumprem essas condições e as autoridades competentes também estão longe de conseguirem efetivar a fiscalização.

6.3. INEFICÁCIA DO ESTATUTO FRENTE A VIOLÊNCIA PRATICADA PELOS TORCEDORES

Apesar de uma maior atenção das autoridades e surgimento de legislações objetivando o combate a violência, este problema ainda está longe de ser solucionado. Os casos de confrontos entre torcedores não diminuíram conforme o esperado, pelo contrário, ainda são muito comuns e acontecem frequentemente. À vista disso, uma pesquisa realizada pela Universidade Salgado de Oliveira27 levantou dados que entre 2009 a 2019 foram registradas 157 mortes relacionadas ao futebol, sendo o ano de 2013, exatamente 10 anos de vigência do Estatuto do Torcedor, o período de maiores casos de letalidade. Destaca-se, ainda, um levantamento do Jornal Estadão que apontou que atualmente, em 2022, o futebol brasileiro registra um episódio de violência a cada quatro dias.28

Gráfico 1 - Quantidade de mortes relacionadas ao confronto entre torcedores no período de 2009 a 2019.

Portanto, mesmo com a reformulação ao Estatuto ocorrida através da Lei 12.999/2010, o combate a violência tanto pretendido pelo EDT segue sendo ineficaz, visto a omissão do Estado em conseguir colocar em prática os dispostos na Lei. A Lei, em questão, acrescentou um novo capítulo específico ao combate a violência. O capítulo XI-A, acrescentado em 2010 sob a titulação ‘’Dos Crimes’’ traz em seus artigos as punições que devem ocorrer em casos de qualquer tipo de violência. Neste sentido, dispõe o artigo 41-B:

Art. 41-B. Promover tumulto, praticar ou incitar a violência, ou invadir local restrito aos competidores em eventos esportivos:

Pena - reclusão de 1 (um) a 2 (dois) anos e multa.

§ 1o Incorrerá nas mesmas penas o torcedor que:

I - promover tumulto, praticar ou incitar a violência num raio de 5.000 (cinco mil) metros ao redor do local de realização do evento esportivo, ou durante o trajeto de ida e volta do local da realização do evento;

II - portar, deter ou transportar, no interior do estádio, em suas imediações ou no seu trajeto, em dia de realização de evento esportivo, quaisquer instrumentos que possam servir para a prática de violência.

§ 2o Na sentença penal condenatória, o juiz deverá converter a pena de reclusão em pena impeditiva de comparecimento às proximidades do estádio, bem como a qualquer local em que se realize evento esportivo, pelo prazo de 3 (três) meses a 3 (três) anos, de acordo com a gravidade da conduta, na hipótese de o agente ser primário, ter bons antecedentes e não ter sido punido anteriormente pela prática de condutas previstas neste artigo.

§ 3o A pena impeditiva de comparecimento às proximidades do estádio, bem como a qualquer local em que se realize evento esportivo, converter-se-á em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta.

§ 4o Na conversão de pena prevista no § 2o, a sentença deverá determinar, ainda, a obrigatoriedade suplementar de o agente permanecer em estabelecimento indicado pelo juiz, no período compreendido entre as 2 (duas) horas antecedentes e as 2 (duas) horas posteriores à realização de partidas de entidade de prática desportiva ou de competição determinada.

§ 5o Na hipótese de o representante do Ministério Público propor aplicação da pena restritiva de direito prevista no art. 76 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, o juiz aplicará a sanção prevista no § 2o.

Desta maneira, a nova legislação foi uma tentativa para solucionar os casos de violência entre os torcedores, determinando punições a quem comete os delitos, no entanto, na prática há, ainda, muita falta de aplicação da lei pelas autoridades.

Essa falta de aplicação facilita muito para que a ocorrência de novos delitos seja frequente e esteja longe de ter um fim à medida que há punição a uma parcela mínima de torcedores que pratiquem atos de violência. Neste sentido, segundo Maurício Murad (2017, p. 264), entre os anos de 2015 a 2016, em 97% dos delitos ocorridos no meio futebolístico não houve nenhum tipo de sanção aos envolvidos.

Em alguns dos casos delituosos, os atos de violência saíram da esfera de confrontos entre torcedores e passaram a ser direcionados diretamente a jogadores e comissões técnicas, como o caso do atentado com bomba ao ônibus do Esporte Clube Bahia, em fevereiro de 2022, no qual resultou em ferimentos graves aos jogadores.29

Diante todos esses acontecimentos atuais, Alfredo Sampaio, presidente da Federação Nacional dos Atletas, cobrou maiores providências por parte das autoridades competentes através de relato ao Jornal Estadão (2022):

‘’Todo mundo fala, fica indignado, só que ninguém toma atitude. Já enviamos um ofício ao STJD e à CBF com toda a nossa indignação do nosso medo de um dia chegar em um homicídio e sugerindo medidas imediatas. Não tivemos resposta ainda (...) O clube não é 100% culpado disso, mas precisamos punir o clube para punir o torcedor. Precisamos pedir que as federações e a CBF sejam responsáveis por essa violência. Nem quando alguém morrer, vai parar. Vai virar estatística.’’

Neste sentido, Sampaio abordou acerca da responsabilidade civil dos clubes por danos causados por seus torcedores, tema este que será melhor destacado na sequência.

6.4. DA RESPONSABILIDADE DOS CLUBES

O Estatuto de Defesa do Torcedor legitimou que a prevenção a violência também é de responsabilidade dos clubes. Sendo o Estatuto um prolongamento do Código do Consumidor, há de se falar também em responsabilidade civil visto que os clubes de futebol passam a ser considerados fornecedores. No entanto, há algumas divergências sobre o tipo de responsabilidade destinada aos entes esportivos.

Levando em consideração apenas o disposto pelo EDT, a responsabilidade será aplicada na forma subjetiva, no entanto, o Estatuto, em seu artigo 3º equiparou a fornecedor o clube mandante da partida, sendo responsabilidade dele a organização do evento esportivo. Desta maneira, ao ocorrer esta equiparação é necessário apontar o artigo 19 que dispõe expressamente que os agentes serão responsabilizados objetivamente pelos prejuízos causados ao torcedor. Acerca disso, Gustavo Polidoro (2010, p. 61) destacou:

‘’Contudo, a problemática em relação à qual modalidade de responsabilidade civil se deve aplicar aos eventos desportivos, surge no momento em que citado artigo enfatiza as hipóteses de "falhas de segurança" "inobservância do disposto neste capítulo". Assim, tem-se a noção de que na não ocorrência de nenhum dos casos citados acima, haver-se-ia de se aplicar a responsabilização subjetiva, pois o art. 19, ao enfatizar a expressões "falhas de segurança" e "inobservância do disposto neste capítulo", determinou a exclusão da responsabilidade civil em sua modalidade objetiva, restando, apenas, a ser aplicada, a modalidade subjetiva’’

Diante todo esse contexto, se faz necessário apresentar um julgado recente do Superior Tribunal de Justiça, através da Ministra Nancy Andrighi, que abordou sobre a responsabilização dos clubes e demais organizadores do evento que devem promover a devida segurança aos torcedores, antes, durante e após a partida, dentro e fora do estádio. Devendo ser responsabilizados em caso de falha nessa obrigação:

CIVIL. RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COMPENSAÇÃO DE DANOS MATERIAIS E MORAIS. ESTATUTO DE DEFESA DO TORCEDOR. PREQUESTIONAMENTO PARCIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. INOCORRÊNCIA. OBRIGAÇÃO DA AGREMIAÇÃO MANDANTE DE ASSEGURAR A SEGURANÇA DO TORCEDOR ANTES, DURANTE E APÓS A PARTIDA. DESCUMPRIMENTO. REDUZIDO NÚMERO DE SEGURANÇAS NO LOCAL. FATO EXCLUSIVO DE TERCEIRO. INEXISTÊNCIA. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL. AUSÊNCIA DE SIMILITUDE FÁTICA. JULGAMENTO: CPC/2015. 1. Ação de compensação de danos materiais e morais proposta em 07/04/2015, da qual foi extraído o presente recurso especial interposto em 18/11/2019 e atribuído ao gabinete em 02/02/2021. 2. O propósito recursal é decidir acerca da ocorrência de negativa de prestação jurisdicional e se, na hipótese dos autos, o clube de futebol recorrente é responsável pelos danos experimentados por torcedores em decorrência de atos violentos perpetrados por membros da torcida rival. 3. A jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça é firme no sentido de que não há ofensa ao art. 1.022 quando o Tribunal de origem, aplicando o direito que entende cabível à hipótese, soluciona integralmente a controvérsia submetida à sua apreciação, ainda que de forma diversa daquela pretendida pela parte. Precedentes. 4. O Estatuto de Defesa do Torcedor (EDT) foi editado com o objetivo de frear a violência nas praças esportivas, de modo a assegurar a segurança dos torcedores. O direito à segurança nos locais dos eventos esportivos antes, durante e após a realização da partida está consagrado no art. 13 do EDT. A responsabilidade pela prevenção da violência nos esportes é das entidades esportivas e do Poder Público, os quais devem atuar de forma integrada para viabilizar a segurança do torcedor nas competições. 5. Em caso de falha de segurança nos estádios, as entidades responsáveis pela organização da competição, bem como seus dirigentes responderão solidariamente, independentemente da existência de culpa, pelos prejuízos causados ao torcedor (art. 19 do EDT). O art. 14 do EDT é enfático ao atribuir à entidade de prática desportiva detentora do mando de jogo e a seus dirigentes a responsabilidade pela segurança do torcedor em evento esportivo. Assim, para despontar a responsabilidade da agremiação, é suficiente a comprovação do dano, da falha de segurança e do nexo de causalidade. 6. Segundo dessume-se do conteúdo do EDT, o local do evento esportivo não se restringe ao estádio ou ginásio, mas abrange também o seu entorno. Por essa razão, o clube mandante deve promover a segurança dos torcedores na chegada do evento, organizando a logística no entorno do estádio, de modo a proporcionar a entrada e a saída de torcedores com celeridade e segurança. 7. Na hipótese dos autos, o episódio violento ocorreu no entorno do estádio, na área reservada especialmente aos torcedores do Goiás Esporte Clube. Tanto é assim que o segundo recorrido e seus amigos conseguiram correr para dentro do estádio para se proteger, local que também acabou sendo invadido pelos torcedores adversários. Sendo a área destinada aos torcedores do Goiás, o recorrente deveria ter providenciado a segurança necessária para conter conflitos entre opositores, propiciando a chega segura dos torcedores daquela agremiação no local da partida. Mas não foi o que ocorreu, porquanto o reduzido número de seguranças no local não foi capaz de impedir a destruição do veículo de propriedade do primeiro recorrido. 8. Para que haja o rompimento do nexo causal, o fato de terceiro, além de ser a única causa do evento danoso, não deve apresentar qualquer relação com a organização do negócio e os riscos da atividade. Na espécie, não está configurada tal excludente de responsabilidade, porquanto a entidade mandante tem o dever legal de assegurar a segurança do torcedor no interior e no entorno do estádio antes, durante e após a partida e essa obrigação foi descumprida pelo recorrente, à medida em que não disponibilizou seguranças em número suficiente para permitir a chegada ao estádio, em segurança, dos torcedores do time do Goiás Esporte Clube, o que permitiu que eles fossem encurralados por torcedores da agremiação adversária, os quais, munidos de foguetes e bombas, depredaram o veículo em que estavam o segundo recorrido e seus amigos. Ademais, os atos de violência entre torcedores adversários são, lamentavelmente, eventos frequentes, estando relacionados com a atividade desempenhada pela agremiação. 9. Entre os acórdãos trazidos à colação, não há similitude fática, elemento indispensável à demonstração da divergência. 10. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa extensão, desprovido. (STJ - REsp: 1924527 PR 2020/0243009-2, Relator: Ministra NANCY ANDRIGHI, Data de Julgamento: 15/06/2021, T3 - TERCEIRA TURMA, Data de Publicação: DJe 17/06/2021) (Grifado)

Ainda, acerca da responsabilidade, é necessário destacar o papel da Polícia Militar na prevenção e combate a violência entre as torcidas, infelizmente em muitas vezes, realizada de maneira ineficaz e repressiva.

7. DESPREPARO E REPRESSÃO POLICIAL

Não é segredo para ninguém o histórico de despreparo e repressão policial em nossa sociedade, no meio futebolístico isso não é diferente e esses casos também ocorrem com certa frequência. São diversos os casos que exemplificam isso e o que se pode analisar é que caso o efetivo policial fosse melhor preparado, seria uma enorme contribuição na diminuição dos confrontos violentos no meio do futebol. Se de um lado temos os torcedores organizados que desejam a violência, do outro temos uma força policial pouco preparada que além de não conseguir combater, acaba inflamando ainda mais os ânimos dos torcedores.

Eventos esportivos movimentam milhares de pessoas, portanto é necessário uma preparação qualificada aos profissionais da segurança pública que trabalharão nessas competições, porém, na prática o que presenciamos são apenas policiais munidos de spray de pimenta, bombas de gás e armas com bala de borracha usando esses equipamentos de formas desordenadas e despreparadas, atingindo em diversos casos inocentes sem nenhuma relação com o problema. Sobre isso, relata o jornalista Mauro Cezar Pereira (2017):

‘’Falta treinamento adequado a muitos policiais que atuam em jogos de futebol. Não são raros os casos em que deveriam controlar, evitar conflitos, agir como mediadores que impedem o alastramento do tumulto, mas tensão, logo lançam bombas de gás, atingindo até torcedores inocentes, jogadores etc. Despreparo claro e incontestável.‘’

O efetivo policial deveria ser usado de maneira preventiva, no entanto, no Brasil seu uso é de maneira repressiva, desta maneira, em nada contribui para o solucionar os casos de violência, pelo contrário, acaba aumentando. Neste sentido, relatou Bernardo Buarque de Hollanda ao Jornal El País (2017):

“Existem a via da repressão e a via da prevenção. O ideal seria dosar as duas coisas, mas, no Brasil, tem prevalecido a via da repressão, ao contrário de outros países que estão conseguindo bons resultados com trabalhos preventivos no futebol, como Alemanha e Colômbia. E a repressão indiscriminada, sem separar agressores de torcedores, acontece através de inúmeras tentativas de asfixiar as torcidas organizadas, qualificando seus membros como pessoas predispostas ao enfrentamento. Isso gera um efeito colateral, que é o aumento do nível de beligerância nos estádios, acirrando a tensão entre torcidas e a polícia.”

São diversos os casos do uso da força policial de maneira desproporcional ao necessário, ocasionando em fatalidades que poderiam ser evitadas caso houvesse um melhor preparo aos policiais. Dentre esses casos, destacamos uma fatalidade ocorrida em 2008, durante uma partida entre Goiás Esporte Clube e São Paulo Futebol Clube, no qual, fora do estádio, houve um pequeno tumulto entre os torcedores dos dois clubes que poderia ser solucionado de maneira mais pacífica, porém, ocorreu que, um policial militar, que deveria estar lá para proteger os torcedores, acabou perseguindo e encurralando um torcedor que não esboçou nenhuma resistência ou reação, no entanto, mesmo assim, foi atingido por uma coronhada na cabeça, acontece que, a arma do militar estava destravada e o torcedor acabou sendo atingido por um projétil balístico na nuca, falecendo três dias depois.30 O policial não foi condenado e sequer foi expulso da corporação. A mãe da vítima requereu indenização por parte do Estado. Destaca-se, aqui, o exposto na decisão da juíza Sandra Cristina Candeira de Lira, da Sexta Vara da Fazenda Pública do Distrito Federal, nos autos nº 2009.01.1.011105-9 que tratou como desastrada e despreparada a ação do policial militar:

‘’Está devidamente comprovado nos autos que foi a desastrada, equivocada, despreparada e absurda atuação do então Sargento da Polícia Militar José Luiz Carvalho Barreto a razão da desnecessária morte do filho da autora. Desde logo afasto o argumento de que a vítima foi a exclusiva responsável pelo evento. Aqui não se julga a conveniência da existência e manutenção de torcidas organizadas. De fato, há inúmeros casos de violência por elas estimulados e praticados, manchando a história do esporte mais popular do país. Isto em absolutamente nada justifica o fato de uma autoridade policial militar, agente público que deveria ser preparado pelo Estado para enfrentar e conter a violência, acabar praticando violação maior do que a combatida. Ainda cabe recurso da sentença.’’ (Grifado)

Ainda sobre o despreparo policial, Maurício Murad relatou em entrevista ao Jornal El País (2017):

“O torcedor é maltratado e humilhado nos estádios brasileiros. Tumultos como o do Maracanã também expõem uma polícia desaparelhada e despreparada para resguardar os direitos de torcedores. É impossível dissociar a escalada de violência no futebol do panorama de desordem pública, social, econômica e política vivido pelo país".

O caso supracitado é apenas um dos diversos exemplos do despreparo e repressão policial. Assim, se faz necessário concluir que é necessário de maneira urgente que o efetivo policial seja melhor treinado e preparado para poder lidar com torcedores, à medida que a repressão em nada está contribuindo para solucionar o problema da violência no âmbito futebolístico.

A Inglaterra foi um exemplo de que a repressão policial não resolve o problema, durante a década de 1980 e 90 a polícia britânica fazia forte uso da repressão para tentar controlar os hooligans, no entanto, sem obter sucesso. Foi a partir de uma melhor estruturação de seu efetivo policial e com menos uso da repressão que o problema foi começando a ser resolvido.

O Brasil, no entanto, está muito atrasado nesse sentido, desta maneira se faz necessário o quanto antes uma melhor especialização do efetivo policial. Atualmente, pouquíssimos Estados federativos têm um setor especializado em eventos esportivos como o caso do Grupamento Especial de Policiamento em Estádios (GEPE) da Polícia Militar do Rio de Janeiro.

Sobre o GEPE afirmou o secretário Nacional de Futebol, à época, Rogério Hammam, em entrevista ao Jornal O Globo (2015):

‘’Não há fórmula mágica para resolver a questão de segurança do país. É um plano de ações. Gostamos do que o Gepe faz aqui no Rio. Por mais que ainda tenhamos alguns problemas, existe um mapeamento das organizadas, um sistema de prevenção e mecanismos para conter as brigas. Isso que queremos levar para outros estados.’’

Porém, tal relato aconteceu em 2015, passados sete anos o país pouco evoluiu na melhoria da segurança dos torcedores e qualificação do efetivo policial. Fica claro que ainda são necessárias inúmeras medidas para a solução do problema.

8. DA INEFICÁCIA DAS MEDIDAS E POSSÍVEIS SOLUÇÕES

São ineficazes as práticas aplicadas pelas autoridades públicas para tentarem combater a violência no âmbito futebolístico. Na grande maioria dos casos em que há algum incidente entre torcedores, as punições são destinadas aos clubes ou torcidas organizadas no geral, e não aos torcedores responsáveis pelo confronto. Desta maneira, são necessárias novas medidas para solucionar o problema, algumas delas apresentadas no decorrer deste capítulo

8.1. INEFICIÊNCIA DAS MEDIDAS RESTRITIVAS AOS TORCEDORES

Inúmeras são as tentativas, pouco eficientes, adotadas pelas autoridades, podendo-se listar alguns exemplos: proibição das bandeiras de mastro; suspensão da torcida organizada em adentrar ao estádio; perda do mando de campo; torcida única em clássicos; entre tantos outros. Todas essas práticas têm em comum que em nada contribuem para que seja solucionado o problema da violência, pelo contrário, acabam atingindo os torcedores que apenas desejam acompanhar o espetáculo esportivo.

Segundo um levantamento realizado por Maurício Murad, apenas 5% dos associados das torcidas organizadas são indivíduos violentos31. Desta maneira, punir toda a associação, proibindo os demais membros em acompanharem a partida não é a maneira mais propícia para a solução do problema. Isso se torna mais injusto ainda em casos nos quais as punições exigem portões fechados ou então que determinem que o clube jogue em outra cidade, tais medidas inoperantes acabam afetando quem sequer seja membro das torcidas uniformizadas.

Outra medida também muito criticada por especialistas é a determinação de torcida única durante os clássicos entre clubes rivais, para Mauro Cezar Pereira (2020), trata-se de uma medida ‘’Bizarra e Ineficaz’’, ainda segundo ele

‘’Graças à torcida única, medida paliativa que se tornou definitiva e serve apenas para iludir parte da sociedade. (...) em vários países onde o veto aos visitantes foi adotado, as autoridades acabaram por desistir, pela ineficiência da medida e por retirar de torcedores que não brigam o direito de ir a um jogo de seus clubes. Os exemplos são vários. Torcida única é a sociedade se rendendo a uma minoria. Tiraram as bandeiras, o papel picado, a fumaça, os piscas. Depois tiraram o visitante.’’

Analisando de uma forma superficial, esta restrição se tornou eficaz somente dentro do estádio, onde realmente ocorreu uma diminuição dos casos de violência. No entanto, tal medida em nada resolveu a violência entre os torcedores, pelo contrário, os números mostram que os casos de confronto seguem frequentes, porém agora, espalhados pelas regiões das cidades. No Estado de São Paulo, seis anos após a restrição ser anunciada pelo Secretário de Segurança Pública à época, Alexandre de Moraes, atual ministro do Supremo Tribunal Federal, os casos de violência seguem longe de serem solucionados. Neste sentido, em relato ao Jornal O Tempo (2020), o advogado Renan Bohus, especialista no assunto, afirmou:

"Basta ver dados sobre brigas envolvendo torcedores em jogo de torcida única, e percebemos que elas acontecem em locais diversos, dezenas ou centenas de quilômetros do evento esportivo (...) O Estado, através da PM, perde o controle de onde os torcedores estão localizados, uma vez que, em jogos com duas torcidas, os torcedores ficavam centralizados em local determinado pelo Batalhão de Choque."

A Federação Paulista de Futebol (FPF) e os clubes são contrários às determinações, a FPF enviou um pedido formal ao Ministério Público para que a proposta fosse revista, enquanto que o Sport Clube Corinthians através de nota enviada ao Jornal O Tempo (2020) afirmou: "O Corinthians não é favorável à medida de manutenção de torcida única em clássicos nos estádios de São Paulo, pela evidente ineficácia da medida, que, como era de se esperar, não resolveu conflitos."

Nota-se, portanto, que as medidas até então aplicadas pelas autoridades não se mostram eficientes à maneira em que não estão atingindo seu real objetivo, que é o combate a violência no esporte, mesmo com tantas restrições, os confrontos continuam ocorrendo com frequência, desta maneira é necessário encontrar outras formas para a solução do problema.

8.2. INDIVIDUALIZAÇÃO DA PENA

Conforme demonstrado, responsabilizar e sancionar apenas os clubes e as torcidas organizadas se demonstra a medida mais eficiente, visto que apenas uma minoria dos torcedores uniformizados são os causadores do problema. Desta forma, são necessárias medidas em que se sancione os verdadeiros responsáveis pelos atos violentos, ou seja, essa minoria violenta.

Punir a torcida organizada produz um resultado durante um curto tempo, enquanto que o torcedor transgressor das regras continua indo às partidas livremente. Tem-se, então, que investigar e punir a pessoa, afastá-la dos eventos esportivos. Uma vez que o indivíduo seja punido, isso deixa uma mensagem clara e aos demais que tais atitudes violentas não serão mais toleradas.

Desta maneira, é necessário que ocorra uma identificação desses torcedores e após identificados, que as sanções sejam individualizadas a eles. Em diversos crimes cometidos por esses indivíduos é possível a identificação através de provas como filmagens ou testemunhos. Assim, as denúncias podem ser individualizadas, dando um início a resolução do problema da sensação de impunidade.

Superado o obstáculo da identificação, se dará início a instrução criminal, etapa no qual será formulado todo o conteúdo probatório para apresentação ao magistrado, aguardando-se então a sanção penal cabível ao agente. Sobre a individualização da pena, expõe Guilherme Nucci (2014, p. 90):

‘’A individualização da pena, por outro lado, é indispensável para que haja o impacto certo ao delinquente, levando-se em conta suas condições pessoais e o risco representado para a sociedade, além de se considerar a gravidade da infração cometida e o seu reflexo na desaprovação pública, merecendo, em qualquer situação, haver proporcionalidade entre o crime e a pena aplicada. Sentenças padronizadas são injustas, porque cada réu é uma individualidade e assim deve ser considerado.’’

Deste modo, espera-se do magistrado que seja adotado o princípio da proporcionalidade, se fazendo pertinente na análise de cada caso de maneira individualizada. Este princípio, um dos principais do ordenamento jurídico brasileiro, deve servir como norte aos magistrados no estudo de cada caso, encontrando a sanção da maneira mais justa possível, evitando-se assim uma análise fria e banalizada

No mesmo sentido, corrobora, ainda, Nucci (2014, p. 254):

‘’O Direito Penal, para ser considerado efetivamente a ultima ratio (última opção), instrumento derradeiro da força estatal de contenção e composição dos mais sérios conflitos existentes, precisa abster-se de posturas radicais. De nada adianta a criminalização exagerada, tornando delito toda e qualquer lesão a bem jurídico protegido, uma vez que seria invadir em demasia a vida privada do indivíduo, promovendo o inadequado gigantismo punitivo do Estado, incompatível com a proteção aos direitos e garantias individuais prometidas pelo texto constitucional. Ser humano sem vida privada, sem intimidade assegurada, enfim, sem liberdade mínima para agir, pensar e inclusive errar, é pessoa infeliz e tolhida na sua natural maneira de existir.’’

Desta maneira, não há razão para uma sanção excessivamente gravosa a condutas praticadas pelos torcedores que não lesionam tanto o bem jurídico tutelado, porém, não há de se possibilitar o abolicionismo penal no combate à sensação de impunidade que os crimes cometidos no contexto do futebol exercem.

Portanto, o ideal é a pena proporcionalmente imposta ao indivíduo na medida de sua culpabilidade, fugindo da opressão estatal na mesma forma que se foge da impunidade de decisões genéricas.

8.3. PROJETOS DE LEI

Nesta toada de impunidade aos torcedores que praticam crimes, nos últimos anos foram propostos alguns projetos de lei que visam solucionar o problema, sendo destacados alguns desses.

O Projeto de Lei nº 297 de 2020, de autoria do deputado federal Felipe Carreras (PSB/PE) quis tornar possível a prisão de torcedores que se envolverem em atos violentos ou depredação ao patrimônio, seja dentro ou fora dos estádios, prevendo uma pena de reclusão de três a seis anos, alterando desta forma o Estatuto do Torcedor que prevê apenas o banimento do torcedor em acessar o estádio por cinco anos, período este que fora alterado pela Lei 13.912 de 2019. Segue a íntegra do PL 297/2020 que está em tramitação:

Art. 1º A Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003, passa a vigorar acrescida dos seguintes artigos:

“Art. 41-H. Participar de brigas entre torcidas.

Pena- reclusão de 3 (três) a 6 (seis) anos e multa

§1º. A depredação de patrimônio público e/ou privado incide a mesma pena acrescida da reparação patrimonial.

§2º Os clubes que patrocinam torcidas organizadas são solidariamente responsáveis pela reparação patrimonial disciplinada no parágrafo anterior.

Art. 41-I Perseguir alguém ou grupo de pessoas por se identificarem com uma torcida Pena- reclusão de 3 (três) a 6 (seis) anos e multa”

Mais recentemente, em março de 2022, o senador mineiro Alexandre Silveira afirmou a proposta de um novo Projeto de Lei32, com a alteração do Código Penal, tipificando a briga entre torcidas e criando um novo tipo penal: a ‘’rixa em decorrência de eventos esportivos’’, com pena de dois a quatro anos, podendo chegar a até oito anos em caso de morte ou lesão corporal de natureza grave.

Segundo leciona Nelson Hungria (1955, p.14, apud, GRECO, 2014, p. 385), a rixa é uma briga entre mais de duas pessoas, acompanhada de vias de fato ou violências recíprocas, pouco importando que se forme ex improviso ou ex propósito.

O Projeto ainda prevê a possibilidade da justiça proibir o torcedor que estiver sendo investigado de acessar o estádio. Este Projeto de Lei, além de criar um novo tipo penal, aumentaria consideravelmente a pena do crime de rixa, que nos termos do art. 137 do CP33, incumbe em uma detenção de quinze dias a dois meses, ou multa.

8.4. POSSÍVEIS SOLUÇÕES

A questão da violência entre as torcidas realmente é um tema de difícil solução em decorrência de todo o contexto no qual está inserido. Porém, o combate é possível, há algumas medidas que devem ser tomadas, medidas estas, possivelmente mais eficazes que as até então aplicadas pelas autoridades brasileiras. É necessário um trabalho conjunto entre as autoridades públicas, federações e clubes de maneira que ocorra toda uma reestruturação no futebol brasileiro, através de uma melhor conscientização e educação aos torcedores. Neste sentido, afirma Murad (2017, p. 195):

‘’As autoridades governamentais, as forças de segurança, os clubes, as federações e confederações devem fazer parcerias. Isto, no sentido de concretizar planos e programas de segurança coletiva, que punam exemplarmente os infratores, previnam com inteligência, para evitar novos eventos de descontrole e vandalismo e para isolar os delinquentes, bem como reeduquem de ‘baixo para cima’, para transformar, mas a partir das culturas de raiz das próprias torcidas organizadas, o que exige, claro, que a torcida e suas culturas sejam estudadas, em bases científicas profunda e constantemente”.

Medidas realizadas na Inglaterra, mencionadas em capítulo anterior, também devem ser seguidas pelo futebol brasileiro. Dentre as mais eficazes, estão a reestruturação dos estádios, resultando em maior conforto aos torcedores; introdução de seguranças treinados em substituição ao efetivo policial repressivo; e o uso da tecnologia para cadastrar os torcedores, assim, qualquer pessoa que já tenha praticado algum ato violento será impedido de entrar. No Brasil, apenas os estádios utilizados na Copa do Mundo de 2014 têm essa tecnologia de identificação.

Por fim, é necessário também uma melhor preparação aos efetivos policiais voltados especificamente na relação com os eventos esportivos, de modo que seja um policiamento preventivo e não repressivo. Todos os Estados federativos devem ter um grupo especializado em atendimento à segurança dos torcedores, como o caso do GEPE, no Rio de Janeiro que recebem treinamentos específicos de como agir em situações características que só ocorrem nesse tipo de evento, tendo um preparo psicológico e equipamentos adequados para trabalharem da melhor forma possível e garantir, assim, a segurança e ordem da competição esportiva.

9. CONCLUSÃO

As conclusões a respeito da problemática analisada pelo presente trabalho não têm o objetivo de atuar de maneira generalizada. A intenção foi aprofundar o estudo do futebol como um fenômeno social e a sua relação com a violência.

A presente monografia permite chegar à conclusão da maneira como o futebol está diretamente interligado à sociedade, se relacionando com a política, sendo usado como ferramenta de autopromoção por diversos líderes de estado, antigos e atuais, desde as primeiras décadas do século XX através de líderes fascistas que fizeram o uso da força de massificação popular do esporte para a promoção dos regimes ditatoriais, como Benito Mussolini, na Itália, que chegou até mesmo a interferir diretamente na manipulação de resultados das competições. No Brasil não foi diferente com o regime ditatorial militar que fez o uso da conquista da Copa do Mundo de 1970 para autopromoção do regime totalitário além de desviar o foco da sociedade das repressões que aconteciam no período. Nos dias atuais essa interligação entre futebol e política segue forte a modo que diversas pessoas relacionadas ao futebol fazem o uso disso para se candidatarem a cargos políticos, como o caso de Romário, ex-jogador e atual senador federal.

Se o futebol se relaciona tanto com a política, com o fenômeno da violência na sociedade não foi diferente. Foi analisado que após seu surgimento não demorou muito para que ocorresse a popularização. O esporte tornou-se uma paixão nacional em diversos países e foi através do fenômeno do fanatismo que grupos começaram a se unir para acompanhar as partidas, inicialmente de forma pacífica, porém, pouco tempo depois, indivíduos mais violentos encontraram no estádio o espaço propício para promoverem seus atos de violência, desta forma, este problema foi se tornando cada vez mais frequente. Um grande exemplo apresentado foi o caso dos hooligans ingleses que por muitos anos causaram grandes confrontos sem que as autoridades britânicas conseguissem combatê-los. Foi posteriormente ao Relatório Taylor que o país iniciou uma grande reestruturação em seu futebol, consequentemente, de certa forma, conseguindo controlar os hooligans com a queda drástica do número de confrontos.

No Brasil não foi muito diferente, logo que o esporte se tornou uma paixão nacional, o fanatismo uniu os torcedores. Inicialmente também de forma pacífica, sendo as primeiras torcidas organizadas criadas por diretores dos próprios clubes. No entanto, foi abordado pelo presente trabalho que durante a década de 1970 começaram a surgir uma nova modalidade de torcidas organizadas, essas, infelizmente, ao longo dos anos proporcionaram e, ainda proporcionam diversos casos de atos violentos. No nome dessas associações é possível notar o desejo pela violência, sendo comum torcidas com titulação como ‘’Terror’’ ou ‘’Fúria’’ por exemplo.

É comum nos depararmos com a expressão de que a relação entre futebol e violência dos torcedores é uma ‘’terra sem lei’’ visto a dificuldade das autoridades em responsabilizar os torcedores causadores dos confrontos. Diferentemente da Inglaterra, o Brasil demorou muito para buscar soluções a esse problema. A década de 1990 vivenciou o auge das brigas entre torcedores e foi somente em 2003 que autoridades brasileiras iniciaram uma tentativa de combate ao elaborar o Estatuto de Defesa do Torcedor, sendo a primeira legislação nacional a tratar acerca da segurança aos torcedores. Salienta-se que os primeiros confrontos entre torcedores aconteceram ainda na década de 1980 e foi somente mais de vinte anos depois que o Brasil elaborou o Estatuto.

Esse descaso das autoridades combinado com a ineficácia pela não aplicação dos dispostos no Estatuto do Torcedor resultam que o Brasil está longe de solucionar o problema entre as torcidas organizadas, sendo cotidianamente relatados casos de confrontos entre torcedores. Em 2022, inclusive, há casos de violência relacionada ao futebol a cada quatro dias.

Outro questão analisada foi o despreparo da Polícia Militar no tratamento aos torcedores, a PM age de maneira repressiva enquanto que deveria agir de maneira preventiva, desta forma, em nada consegue controlar os torcedores. Portanto, é necessário também uma melhor preparação, inclusive emocional, aos servidores designados aos eventos esportivos.

Por fim, realmente é difícil apontar uma solução exata para que o Brasil resolva esta mazela, porém, algumas alternativas apresentadas aqui, que deram certo em outros países devem ser introduzidas em nosso contexto. Pode-se destacar a necessidade de identificação e responsabilização dos torcedores envolvidos nos embates, para isso, uma reestruturação dos estádios brasileiros com a instalação de sistema de identificação é necessária. Outra solução é a ocorrência de um trabalho conjunto entre autoridade pública, federações, clubes e líderes das torcidas a modo que a conscientização e a educação aos torcedores sejam introduzidas de maneira ampla e estratégica e assim, o Brasil consiga solucionar este problema.

10. REFERÊNCIAS

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BRASIL. Decreto-Lei 2.848, de 07 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de Janeiro, 31 dez. 1940.

BRASIL. Lei nº 10.671, de 15 de maio de 2003. Dispõe sobre o Estatuto de Defesa do Torcedor e dá outras providências. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Leis/2003/L10.671.htm.

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1Apesar de relatos de partidas de futebol realizadas anteriormente, Charles Miller é considerado como introdutor do futebol no Brasil pelo fato dele ter sido o primeiro a chegar ao nosso país com um livro contendo regras da football association, criado em 1863 na Inglaterra, além de exercer um importante papel organizando clubes e competições, dando início à prática contínua do futebol e contribuindo para a sua consolidação no país.

2Há cem anos, Lima Barreto começava campanha contra o futebol. Disponível em:

http://www.jornaldocampus.usp.br/index.php/2018/12/ha-cem-anos-lima-barreto-comecava-campanha-contra-o-futebol/. Acesso em 28/02/22.

3Para Graciliano Ramos, os esportes genuinamente brasileiros tais como a cavalhada, o cambapé, a rasteira e o jogo de palha de milho poderiam perfeitamente substituir o futebol no gosto popular (PEREIRA, 2000, p.305).

4 Coelho Neto e sua batalha por uma Paixão Nacional. Disponível em :https://www.fluminense.com.br/noticia/coelho-netto-e-sua-batalha-por-uma-paixao-nacional. Acesso em 28/02/22.

5A política do Pão e circo era o modo com o qual os líderes romanos lidavam com a população em geral, para mantê-la fiel à ordem estabelecida e conquistar o seu apoio. Realizavam enormes espetáculos em arenas (muitas vezes sangrentos) de forma a entreter o povo e desviar a atenção dos problemas sociais.. Atualmente, pode-se dizer que essas Arenas foram substituídas pelos estádios

6Túlio Vilela, “Futebol e nazi-fascismo: Esporte serviu propaganda de Mussolini e Hitler”. Disponível em https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia/futebol-e-nazi-fascismo-esporte-serviu-propaganda-de-mussolini-e-hitler.htm. Acesso em 01/03/2022.

7Edgardo Martolio, ‘’Vencer ou Morrer’’. Disponível em: https://rollingstone.uol.com.br/edicao/edicao-92/vencer-ou-morrer/. Acesso em 01/03/2022.

8Diretas Já foi um movimento político de cunho popular que teve como objetivo a retomada das eleições diretas ao cargo de presidente da República no Brasil, durante a ditadura militar brasileira.

9‘’João Saldanha, o técnico que atormentou a Ditadura’’. Disponível em https://observatorioracialfutebol.com.br/joao-saldanha-o-tecnico-que-atormentou-a-ditadura. Acesso em 03/03/2022.

10A Democracia Corinthiana foi um movimento surgido na década de 1980, no Sport Clube Corinthians Paulista, liderado por um grupo de futebolistas politizados como Sócrates e Casagrande. Constituiu o maior movimento ideológico da história do futebol brasileiro.

11A Emenda Constitucional Dante de Oliveira abordava sobre o restabelecimento das eleições diretas para presidente da república no Brasil, no entanto foi derrubada em votação na Câmara dos Deputados na noite de 25 de abril de 1984.

12Art. 23. Não há crime quando o agente pratica o fato: III - em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício regular de direito.

13Parágrafo único. O agente, em qualquer das hipóteses deste artigo, responderá pelo excesso doloso ou culposo.

14Art. 254. Praticar jogada violenta: PENA: suspensão de uma a seis partidas, provas ou equivalentes I - qualquer ação cujo emprego da força seja incompatível com o padrão razoavelmente esperado para a respectiva modalidade.

15O termo “hooligans” tem sua origem ligada ao nome de uma família irlandesa que viveu em Londres no fim do século XIX. Devido às características de violência e de não sociabilidade de seus membros, esse termo passou, gradativamente, a designar os jovens que se organizavam em gangues. (COSTA, 1992, p.17).

16A tragédia inicialmente vitimou fatalmente 96 pessoas. Em 2021, Andrew Devine, que permaneceu por 32 anos em estado vegetativo, faleceu e foi considerado oficialmente a 97ª vítima.

17Polícia admitiu responsabilidade pela tragédia de Hillsborough. Disponível em https://www.jn.pt/desporto/policia-admitiu-responsabilidade-pela-tragedia-de-hillsborough-4459070.html?id=4459070. Acesso em 06/03/2022

18Nome dado em referência ao instituidor do relatório, Peter Murray Taylor, magistrado inglês e conselheiro da rainha britânica. Taylor foi o responsável por propor uma transformação radical no futebol inglês.

19Departamento ministerial do Governo do Reino Unido, responsável pela política de governo em questões relacionadas à segurança, direito e ordem.

20Alexandre Salvador e Pieter Zalis. Como a Inglaterra acabou com a barbárie das torcidas. Disponível em https://placar.abril.com.br/esporte/como-a-inglaterra-acabou-com-a-barbarie-das-torcidas/. Acesso em 07/03/2022

21Mauro Cezar Pereira. Origem de torcidas organizadas é a participação política pela democracia. Disponível em https://www.uol.com.br/esporte/futebol/colunas/mauro-cezar-pereira/2020/05/31/origem-de-torcidas-organizadas-e-a-participacao-politica-pela-democracia%20organizadas%20surgiram%20ainda20na,%20Botafogo%20. Acesso em 07/03/2022.

22Um exemplo disso é a Torcida Uniformizada do São Paulo (TUSP) foi criada por Manoel Raymundo de Almeida, dirigente e conselheiro do clube.

23Redação Sport Life. ‘’Primeira morte entre torcidas no Brasil ainda não foi solucionada’’. Disponível em: https://www.terra.com.br/esportes/futebol/primeira-morte-entre-torcidas-no-brasil-ainda-nao-foi-solucionada,ced0d98b03e56e238387d7d3a81f36903w89ul1r.html Acesso em 10/03/2022.

24 Título do Código de Defesa do Consumidor que dispõe acerca da defesa do consumidor em Juízo.

25Popularmente conhecidas como Lei Zico e Lei Pelé, respectivamente.

26Incluído pela Lei nº 12.299, de 2010. Essa lei, assinada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, visou reformular o Estatuto de Defesa do Torcedor, acrescentando a ele novos artigos que dispõem sobre medidas de prevenção e repressão aos fenômenos de violência por ocasião de competições esportivas

27Nelson Oliveira e Ana Luisa Araújo. ‘’Brasil dá resposta insuficiente à violência’’. Disponível em https://www12.senado.leg.br/noticias/especiais/especial-cidadania/brasil-da-resposta-insuficiente-a-violencia-de-torcidas. Acesso em 12/03/2022.

28Pedro Ramos e Ricardo Magatti. ‘’Futebol brasileiro registra em 2022 um episódio de violência a cada quatro dias.’’ Disponível em: https://esportes.estadao.com.br/noticias/futebol,futebol-brasileiro-2022-violencia-episodios-punicoes,70004001142. Acesso em 14/03/2022.

29Redação TNT Sports. ‘’Bomba explode dentro do ônibus do Bahia e deixa atletas feridos.’’ Disponível em: https://tntsports.com.br/futebolbrasileiro/Bomba-explode-dentro-do-onibus-do-Bahia-e-deixa-atletas-feridos-20220224-0019.html. Acesso em 16/03/2022.

30Morre torcedor do São Paulo baleado por PM em Goiás. Disponível em: https://extra.globo.com/esporte/brasileiro/morre-torcedor-do-sao-paulo-baleado-por-pm-em-goias-624217.html. Acesso em 19/03/2022.

31Sociólogo defende plano estratégico para conter violência de torcidas. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/esportes/noticia/2020-08/cientista-defende-plano-estrategico-para-conter-violencia-de-torcidas. Acesso em 25/03/2022

32Senador mineiro quer pena de 2 a 4 anos para torcedores violentos. Disponível em https://www.itatiaia.com.br/noticia/senador-mineiro-quer-pena-de-2-a-4-anos-de-prisao-para-torcedores-violentos. Acesso em 29/03/2022.

33Art. 137, CP - Participar de rixa, salvo para separar os contendores: Pena - detenção, de quinze dias a dois meses, ou multa.  


Publicado por: Lucas Santi

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