Excludentes de Ilicitude
- DA EXCLUSÃO DE ILICITUDE (ANTIJURIDICIDADE) -
ART. 23
ESTADO DE NECESSIDADE
LEGÍTIMA DEFESA ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL ou no EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO
ILICITUDE: é a relação de antagonismo, contrariedade que se estabelece entre o fato típico e o ordenamento legal (todo fato típico, indiretamente, é ilícito = caráter indiciário da ilicitude).
Excludentes de ilicitude específicas, previstas na Parte Especial do Código Penal (= tipos permissivos):
a) Aborto para salvar a vida da gestante ou quando a gravidez resulta de estupro – art. 128, I e II;
b) Injúria e difamação, quando a ofensa é irrogada em juízo na discussão da causa, na opinião desfavorável da crítica artística, literária ou científica e no conceito emitido por funcionário público em informação prestada no desempenho de suas funções;
c) Constrangimento ilegal se é feita à intervenção médica ou cirúrgica sem o consentimento do paciente, ou de seu representante legal, se justificada por iminente perigo de vida, e na coação exercida para impedir suicídio (art. 146, § 3°, I e II).
d) Violação de domicílio, quando um crime está ali sendo cometido (art. 150, § 3°, II).
1. ESTRITO CUMPRIMENTO DO DEVER LEGAL: art. 23, III.
Conceito: é uma exclusão de ilicitude, que consiste na realização de um fato típico, por força de desempenho de uma obrigação imposta em lei. O “dever” deve constar de lei, decretos, regulamentos ou atos administrativos fundados em lei e que sejam de caráter geral.
Importante: tal excludente não pode ser reconhecida em crimes culposos (Princípio do Interesse Preponderante).
Requisitos:
a) Objetivos: cumprimento estrito, regular, nos limites do dever imposto pela norma, sendo punível todo excesso ou abuso de direito.
b) Subjetivos:conhecimento do dever e vontade de cumpri-los, nos exatos termos da lei (caso seja extrapolado os limites, haverá crime).
2. EXERCÍCIO REGULAR DE DIREITO: art. 23, III.
Conceito: exercício de uma prerrogativa conferida pelo ordenamento jurídico, caracterizada como fato típico.
“Direito”: empregada em sentido amplo, de forma a abranger todas as espécies de direito subjetivo, penal ou extrapenal.
Ä O exercício abusivo do direito faz desaparecer a excludente.
Requisitos:
a) Objetivos: atuação efetiva no exercício regular de direitos.
b) Subjetivos: conhecimento do direito e a vontade de exercita-lo
â Ofendículos: são aparatos visíveis destinados à defesa da propriedade ou de qualquer outro bem jurídico destinados à defesa da propriedade ou de qualquer outro bem jurídico.
Ex: pontas-de-lança em portão, cacos de vidra em cima de um muito, tela elétrica com aviso.
ê O uso dos ofendículos é LÍCITO, desde que não coloquem em risco pessoas não agressoras.
ê Natureza – duas opiniões:
(1°) Há LEGÍTIMA DEFESA preordenada. Existe a legítima defesa porque o aparato só funcionará quando houver agressão, e é preordenada porque foi posta anteriormente a esta.
(2ª) Não há crime, pois há exercício regular do direito de defesa de bens jurídicos. Não poderia cogitar de legítima defesa por não haver agressão atual ou iminente.
â Defesa mecânica predisposta: são aparatos que têm a mesma finalidade dos ofendículos. Podem, dependendo das circunstâncias, caracterizar algum crime culposo.
Ex: colocar tela elétrica sem aviso. Se alguém encosta e sofre lesão, o responsável pela colocação da tela responde por lesões culposas.
3. DO ESTADO DE NECESSIDADE: art. 24.
Conceito: é a prática de fato para salvar de perigo atual, que o agente ativo não provocou por sua vontade, nem poderia de outro modo evitar, direito próprio ou alheio, cujo sacrifício, pelas circunstâncias, não era razoável exigir-se.
Obs: O padrão é o homem normal.
Estado de necessidade ¹ Legítima defesa: enquanto o primeiro é um choque de direitos, o segundo é a agressão a um direito.
Requisitos para que a situação de risco configure a excludente:
I. Perigo atual – presente, a ameaça concreta ao bem jurídico.
II. Proteção do direito próprio ou alheio – abrange qualquer bem protegido pelo ordenamento jurídico.
III. Situação de perigo não causada voluntariamente (dolosamente) pelo agente.
â Damásio sustenta que se o agente deu causa culposamente ao perigo, pode invocar o estado de necessidade em seu favor, pois a lei só proíbe tal invocação quando a situação de perigo tiver sido causada intencionalmente por ele. Há, porém, entendimento em sentido contrário, excluindo o estado de necessidade em relação àquele que, culposamente, produziu o risco.
IV. Inexistência do dever legal de enfrentar o perigo.
Requisitos para o reconhecimento do estado de necessidade no caso concreto:
I. Inevitabilidade da conduta: o comportamento (lesão ao bem jurídico alheio) deve ser absolutamente inevitável para salvar o direito próprio ou de terceiro que está sofrendo a situação de risco, pois, caso contrário, não se admite o estado de necessidade.
A inevitabilidade deve ser considerada sob dois enfoques:
a) Em face do homem comum.
b) Em relação àquele que tem o dever legal de enfrentar o perigo (para estes, a conduta lesiva só é inevitável quando ficar comprovado que nem mesmo enfrentando o perigo o bem poderia ser salvo).
II. Razoabilidade do sacrifício: deve ser, o sacrifício do bem alheio, razoável, de acordo com o senso comum – requisito da proporcionalidade, entre a gravidade do perigo que ameaça o bem jurídico do agente ou alheio e o dano que será causado em outro bem para afasta-lo.
III. Conhecimento da situação justificante: não se aplica a excludente quando o sujeito não tem conhecimento de que age para salvar um bem jurídico próprio ou alheio. O conhecimento acerca do risco é o chamado elemento subjetivo da excludente da ilicitude.
Teorias do Estado de Necessidade:
a. Teoria Unitária: o estado de necessidade é sempre causa de exclusão da ilicitude – irrelevância da ponderação dos bens em confronto.
b. Teoria Diferenciada: colisão entre bens jurídicos de igual ou maior valor exclui a culpabilidade, enquanto que o sacrifício de bem de menor valor exclui a ilicitude ê Adotada pelo Código Penal Militar. Nesse diapasão apresenta-se sob dois aspectos:
* Estado de necessidade justificante: quando o bem ou interesse sacrificado for de menor valor. Assim a ação será considerada lícita, afastando sua criminalidade, desde que tenha sido indispensável para a conservação do bem mais valioso.
* Estado de necessidade esculpante: quando o bem ou interesse sacrificado for de valor igual ou superior ao que se salva. Neste caso o Direito não aprova a conduta. No entanto, ate a inexigibilidade de conduta diversa, a culpabilidade.
Atual Código Penal: adotou a TEORIA UNITÁRIA.
Espécies:
A) Quanto à titularidade:
ê Estado de necessidade próprio: agente protege bem próprio.
ê Estado de necessidade de terceiro: agente protege bem de terceiro.
â No caso de defesa do direito de terceiro é necessário a prévia autorização deste? Não, a pessoa pode defender o terceiro independentemente de sua prévia autorização, pois a lei não exige este requisito.
B) Quanto ao elemento subjetivo do agente:
ê Estado de necessidade real:quando existe efetivamente situação de perigo.
ê Estado de necessidade putativo: quando a situação de risco é imaginada por erro do agente.
C) Quanto ao terceiro que sofre a ofensa:
ê Estado de necessidade defensivo: se sacrifica bem jurídico pertencente à própria pessoa que criou a situação de perigo.
ê Estado de necessidade agressivo: sacrifica-se bem de terceiro inocente, de pessoa que não criou situação de perigo.
â Existe estado de necessidade quando o perigo for apenas iminente? Duas posições:
(1ª) NÃO – o art. 24 só mencionada a situação de perigo atual, não mencionando o perigo iminente (como faz na legítima defesa). Nesse desiderato, se a lei nada mencionou a respeito da iminência de perigo, significa que o legislador não a quis abranger no estado de necessidade.
(2ª) SIM – a lei deve ser interpretada com bom senso, não sendo aceitável que o agente fique de braços cruzados esperando o perigo iminente transformar-se em atual para, então, agir = entendimento prevalente.
4. DA LEGÍTIMA DEFESA: art. 25.
Conceito: é a utilização moderada dos meios necessários para repelir injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem.
Requisitos:
a) Existência de uma agressão: a agressão (efetivo ataque contra os bens jurídicos de alguém) não pode ser confundida com uma simples provocação.
Pressupõe agressão consistente em uma taque provocado e praticado por pessoa humana.
b) Agressão injusta: no sentido de “agressão ilícita”.
c) Agressão atual ou iminente: atual é a que está ocorrendo, enquanto a iminente é a que está prestes a ocorrer.
d) Agressão dirigida à proteção de direito próprio ou de terceiro: insta ponderar que deve haver uma proporcionalidade entre os bens jurídicos em conflito.
Obs: A legítima defesa de terceiro pode voltar-se inclusive contra o próprio terceiro, como no caso em que se agride um suicida para evitar que ele se mate.
e) Utilização dos meios necessários: meios necessários são os meios menos lesivos, ou seja, menos vulnerantes à disposição doa gente no momento da agressão.
Obs: se o meio é desnecessário não há que se cogitar em excesso, pois descaracteriza-se de plano a legítima defesa. A jurisprudência, entretanto, vem entendendo de modo diverso.
f) Moderação: o sujeito deve agir com moderação, ou seja, não ir além do necessário para proteger o bem jurídico agredido.
g) Elemento subjetivo: como ocorre também no estado de necessidade (e nas demais excludentes), só poderá ser reconhecida a legítima defesa se ficar demonstrado que o agente tinha ciência de que estava agindo acobertado por ela, ou seja, que estava ciente da presença de seus requisitos.
Excesso (art. 23, parágrafo único): é a intensificação desnecessária de uma conduta inicialmente justificada. Pode ser:
a) DOLOSO: descaracteriza a legítima defesa a partir do momento em que é empregado o excesso, e o agente responde dolosamente pelo resultado que produzir.
Ex: uma pessoa que inicialmente estava em legítima defesa consegue desarmar o agressor, e, na seqüência, o mata. Responde por homicídio doloso.
b) CULPOSO (ou excesso inconsciente ou não intencional): é o excesso que deriva de culpa em relação à moderação, e, para alguns doutrinadores, também quanto à escolha dos meios necessários. O agente, assim, responde por crime culposo. Trata-se também de hipótese de culpa imprópria.
Obs: O excesso doloso ou culposo é também aplicável nas demais excludentes de ilicitude.
â LEGÍTIMA DEFESA SUCESSIVA: é a repulsa do agressor inicial contra o excesso. A pessoa que estava inicialmente se defendendo, no momento do excesso, passa a ser considerada agressora, de forma a permitir legítima defesa por parte do primeiro agressor.
â LEGÍTIMA DEFESA SUBJETIVA: é excesso por erro de tipo escusável, ou seja, quando o agente, por erro, supõe ainda existir a agressão e, por isso, excede-se. Nesse caso, excluem-se o dolo e a culpa (art. 20, § 1°, 1ª parte).
â Admite-se:
1. Legítima defesa putativa contra legítima defesa putativa.
Legítima defesa putativa é aquela imaginada por erro. Os agentes imaginam haver agressão injusta quando na realidade esta inexiste.
Ex: dois desafetos se encontram e, equivocadamente, acham que serão agredidos pelo outro.
2. Legítima defesa real da legítima defesa putativa.
Ex: A atira contra um parente que está entrando em sua casa, supondo tratar-se de um assalto. B, que também está armado, reage e mata o primeiro agressor.
3. Legitima defesa putativa de legítima defesa real.
Ex: A vai agredir B. A joga B no chão. B, em legítima defesa real imobiliza A. Nesse instante chega C e, desconhecendo que B está em legítima defesa real, o ataca agindo em legítima defesa putativa de A (legítima defesa de terceiro).
4. Legítima defesa contra agressão culposa.
Ainda que a agressão seja culposa, sendo ela também ilícita, contra ela cabe a excludente.
â Não se admite: (nenhum desses casos tem-se agressão injusta, ilícita)
a) Legítima defesa real de legítima defesa real.
Publicado por: Clodoaldo
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