ESTUDO SOBRE A HIPÓTESE DE CONSTITUIÇÃO DE COOPERATIVA DE TRABALHO PARA OS PROFISSIONAIS DO SEXO COMO INSTRUMENTO DE INCLUSÃO SOCIAL

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1. RESUMO

O presente estudo monográfico faz uma análise sobre a hipótese de constituição de cooperativa de trabalho para os profissionais do sexo, visando integrar essas pessoas na sociedade. O trabalho busca uma alternativa jurídica preexistente para atenuar os problemas sociais derivados da prostituição. Para tal, inicia-se trazendo o conceito de prostituição e os sistemas jurídicos, políticos, sociais relacionados ao tema com objetivo de demonstrar a situação em que essas pessoas se encontram em nossa sociedade. Doravante são analisadas as normas penais que circundam a prostituição demonstrando como elas atingem diretamente a vida do profissional do sexo. O trabalho traz aspectos previdenciários com o objetivo de demonstrar a importância social da previdência na vida dessas pessoas. São abordados os sistemas de cooperativas segundo as leis vigentes, e qual o melhor sistema se enquadra para o profissional do sexo levando em conta os princípios constitucionais as normas civis, sem desconsiderar as limitações impostas pelo Código Penal. Para ser construído tal raciocínio utilizou do método dedutivo através de pesquisa bibliográfica. As apreciações feitas em todo material deste estudo levam a exteriorização do grave problema social existente, e que o Estado deve buscar meios de solucioná-los, sendo que as cooperativas de trabalho seriam uma hipótese plausível de adaptação para fins de amortização do problema social enfrentado pelo profissional do sexo.

Palavras-chave: Prostituição; Direitos humanos; Inclusão social.

ABSTRACT

The present monographic study makes an analysis about the hypothesis of the creation of a cooperative of work for the sex workers, aiming to integrate these people in the society. The work seeks a preexisting legal alternative to alleviate the social problems derived from prostitution. To do so, it begins by bringing the concept of prostitution and the legal, political, and social systems related to the subject in order to demonstrate the situation in which these people are in our society. From now on, the criminal rules surrounding prostitution are analyzed, demonstrating how they directly affect the life of the sex worker. The work brings social security aspects with the purpose of demonstrating the social importance of social security in the life of these people. Cooperative systems are approached according to prevailing laws, and the best system fits the sex worker taking into account the constitutional principles of civil norms, without overlooking the limitations imposed by the Penal Code. To be constructed such reasoning used the deductive method through bibliographic research. The assessments made in all material of this study lead to the externalization of the serious social problem that exists, and that the State must seek ways to solve them, and that labor cooperatives would be a plausible hypothesis of adaptation for the purpose of amortization of the social problem faced by Professional relationship.

KEY WORDS: Prostitution; Human rights; Social inclusion.

2. INTRODUÇÃO

O presente trabalho propôs um estudo sobre os aspectos sociais e jurídicos relacionados aos profissionais do sexo e os problemas sociais enfrentados por essas pessoas, deslumbrando a hipótese de constituição de cooperativa de trabalho de serviço como um instrumento de viabilização da inclusão social.

Este estudo traz a concepção de prostituição na sociedade atual, não apenas de maneira léxica mais no contexto cultural, decorrendo sobre a própria sexualidade humana.

A pesquisa aborda a questão do valor e do preço da prostituição, relatando que grande parte das pessoas envolvidas com a prostituição a utilizam como meio se subsistência sendo um trabalho efêmero do qual tem vontade de deixar, o trabalho enfatiza a necessidade de inclusão social das pessoas que vivem da prostituição.

Esta monografia demonstra a atual conjuntura jurídica e política que envolve a prostituição no Brasil, evidenciando a necessidade de amparo do Estado a estas pessoas que vivem à margem da sociedade. O intuito desse trabalho é amortecer um problema social demonstrando a hipótese de constituição de cooperativa de trabalho para os profissionais do sexo.

O presente estudo foi realizado através de método dedutivo que segundo Marconi e Lakatos significa o “[p]rocesso pelo qual, com base em enunciados ou premissas, se chega a uma conclusão necessária, em virtude da correta aplicação de regras logicas. ” (MARCONI; LAKATOS, 2011, p. 256).

Quanto ao seu procedimento, a pesquisa utilizada foi a bibliográfica, que no entender de Antônio Carlos Gil é aquela “[...] elaborada com base em material já publicado. Tradicionalmente, esta modalidade de pesquisa inclui material impresso, como livros, revistas, jornais, teses, dissertações e anais de eventos científicos” (GIL, 2010, p. 29).

O método dedutivo com pesquisa bibliográfica, possibilitou a obtenção de informações que ajudaram no entendimento dos princípios e normas relacionadas a hipótese de constituição de cooperativa de trabalho de serviço para os profissionais do sexo.

Deste modo, o primeiro capítulo traz o cenário Jurídico, social e político da prostituição no brasil, trazendo o conceito de prostituição como fenômeno social, cultural, e como uma problemática a ser resolvida pelo Estado.

São expostos os principais sistemas jurídicos de enquadramento da prostituição ao redor do mundo e como estes sistemas gerem a prestação de serviços sexuais e o sistema que rege o Brasil. Há análises também de projetos de Lei relacionados a solucionar o problema social dos profissionais do sexo, os projetos de lei abordados buscam regulamentar a profissão visando ampliar os direitos das pessoas que vivem da própria prostituição.

O segundo capítulo inicia evidenciando sobre a licitude da prostituição no Brasil e a abordagem dos crimes relacionados à prostituição, sendo trabalhados os artigos 228, 229 e 230 do Código Penal brasileiro, visando demonstrar a sua função prática e social. Ainda no segundo capítulo são abordados os aspectos previdenciários relacionados a prostituição, ressaltando que a adesão da prostituição na previdência social não visando incentivá-la e sim de integração social das pessoas que exercem essa atividade, concedendo aos profissionais do sexo direitos fundamentais sociais básicos.

O terceiro capítulo analisa a hipótese de constituição de sociedade cooperativa de trabalho para os profissionais do sexo, abordando princípios constitucionais, analisando na Constituição Federal e as Leis de cooperativas, o conceito de cooperativa, suas formas, e aspectos relacionados para a conjuntura para o profissional do sexo. Este capítulo também demonstra o princípio fundamental da dignidade da pessoa humana, o princípio fundamental dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o princípio da igualdade, da liberdade de trabalho e da liberdade de associação e de criação de cooperativas. Demonstrando também a correlação com os profissionais do sexo.

O capitulo três aborda os sistemas de associações cooperativas no Brasil, dando seu conceito e suas formas, direcionando para a melhor concepção de cooperativa para os profissionais do sexo, qual seja a cooperativa de trabalho de serviço. São apresentadas as normas da cooperativa de trabalho de serviço e como sua estrutura em face dos crimes estabelecidos pelo Código Penal brasileiro a respeito da prostituição, buscando demonstrar se existe a hipótese real da constituição de cooperativa de trabalho para os profissionais do sexo.

3. O CENÁRIO JURÍDICO, SOCIAL E POLITICO DA PROSTITUIÇÃO NO BRASIL

3.1. Aspectos gerais da prostituição

Lexicamente, a palavra prostituição apresenta os seguintes significados: “[...]Ato ou efeito de prostituir (-se). [...] Comércio sexual profissional. [...] Modo de vida próprio de quem se prostitui. ” (FERREIRA, 2010, p. 618)

A análise puramente léxica da prostituição não delimita seus conceitos, pois nota-se que neles é possível encontrar há variações de suas compreensões, como por exemplo a seguinte afirmação de Rodrigo Alves Moreira (2007, p. 25): “´[t]ambém poderíamos definir prostituição como venda de relações sexuais extramatrimoniais, com vista à obtenção de géneros materiais. ”

Para melhor entendimento do conceito da prostituição se faz imperioso trazer o fato de que a sexualidade humana é uma manifestação social, segundo a seguinte afirmação de Manuel Carlos Silva, Helena Machado e Susana Silva (2002, p. 185):

A essencialização [sic] naturalizada da sexualidade e outros fenómenos com ela relacionados viriam a ser desconstruídos por sociólogos, antropólogos, historiadores e outros cientistas sociais, que começaram a encarar a sexualidade não apenas como um atributo ou propriedade de ordem biogenética ou psíquica, mas como um «produto social» [...].

Os referidos autores trazem também a associação da sexualidade com a cultura, reafirmando o fato de que as relações sexuais são relações sociais:

De acordo com as abordagens mais recentes no seio das ciências sociais e humanas, a sexualidade engloba um conjunto de possibilidades biológicas e mentais (identidade de género, diferenças corporais, capacidades reprodutivas, necessidades, desejos e fantasias), mas que não necessitam estar todas associadas e, de facto, em certas culturas não o estão. Por isso, contrariamente a uma abordagem fixista, determinista e reducionista de cariz ora biogenético ora psíquico, entendemos aqui que a sexualidade comporta várias dimensões que fazem de qualquer relação sexual uma relação social que, como qualquer outra, é socialmente condicionada, estruturada e construída em diversos patamares: sócio-estrutural, organizacional e interaccional. (SILVA; MACHADO; SILVA, 2002, p.186-187).

A concepção de “troca” é uma característica do fenômeno social prostituição, onde a mercantilização do corpo envolve mais que uma transação econômica, Gláucia Russo possui o seguinte parecer de sua compreensão da prostituição:

[...] compreendo a prostituição como uma forma de troca econômica e sexual que ultrapassa a si mesma. Nela, uma sociabilidade específica é construída; identidades são erigidas; constroem-se relações perpassadas não apenas por valores econômicos, mas também pela afetividade, pelo encontro com o outro, pelo rompimento com a solidão corporal e ainda com a solidão típica da metrópole, em que, mesmo com o outro, se está só. (RUSSO, 2007, p. 499)

Essa troca econômica e sexual elencada por Gláucia Russo resulta na ideia de valor e preço, sobre a definição de valor, tendo a seguinte concepção:

A definição de valor está no cerne das relações de prostituição, pois nela ocorre uma troca, que só é possível porque diferentes valores estão em jogo. No âmbito da mercantilização que tem lugar na prostituição, trocam-se valores diferenciados: sexo por dinheiro, satisfação sexual por liberdade de ter o que se quer, dentre outros. O corpo e o prazer por ele prometido são transformados em mercadorias. (RUSSO, 2007, p. 498-499)

Pode-se compreender no sentido de que, segundo a referida autora, a emblemática do valor adquire contexto mercantil dentro da prostituição, discorrendo que o dinheiro pago nesta troca é medido da relação oferecida conforme a seguir:

[...] o valor é um dos componentes das relações de prostituição e, assim como o dinheiro adquire valor na troca, os objetos ou serviços que ele mede também são valorados dentro dela, e isso ocorre também com a prostituição. Se assim o é, se a mercantilização torna um produto valioso, é na troca que tem lugar nas relações de prostituição que o serviço oferecido pelas mulheres torna-se um valor. (RUSSO, 2007, p. 503)

A concepção de valor da prostituição como um fenômeno social influi na determinação do preço do programa, como descrito pela referida autora:

O preço conseguido com o programa configura-se como uma representação econômica de um valor que abarca os dois lados da mesma moeda – o qualitativo e o quantitativo –, de forma a remeter a uma série de elementos que só podem ser compreendidos nas relações sociais em que se inserem. (RUSSO, 2007, p. 503)

Demonstrado o aspecto de troca da prostituição e evidenciado a questão de valor e preço como algo social se faz necessário abordar outro aspecto do complexo conceito da prostituição que é o do uso da prostituição como meio de subsistência.

Maria Ilidiana Diniz leva a entender no sentido de a prostituição ser uma condição efêmera por grande parte das pessoas que a praticam, sendo apenas um meio de subsistência, e que a camada social influi diretamente na permanência dessas pessoas no mundo da prostituição segundo a seguinte afirmação:

Para grande parte das prostitutas, a prostituição ainda é considerada como algo transitório, apenas para garantir a subsistência. Vale ressaltar que para aquelas oriundas de camadas sociais mais baixas, as perspectivas de mudança de atividade torna-se mais difícil em virtude do contexto da crise de capital, da reestruturação produtiva e do emprego estrutural. Desse modo, a profissão deixa de ser uma opção individual, para se estabelecer enquanto alternativa na busca da sobrevivência. (DINIZ, 2009, p. 90)

A referida autora destaca também a necessidade da inserção social dessas pessoas, pois a questão econômica social acaba por fomentar a prostituição:

As condições precárias, e por vezes insalubres, em que desenvolvem a atividade prostitucional, demonstram que as condições de vida e de pobreza determinam à inserção e permanência de muitas mulheres nessa atividade. Desse modo, tal segmento se encontra nos exemplos mais precários de inserção social, marginalizadas, sem acesso a condições dignas de moradia, higiene, alimentação, serviços de saúde, escolaridade, entre outras. (DINIZ, 2009, p. 96)

Fica evidenciado que o conceito de prostituição é amplo e variável determinado socialmente e culturalmente, porém consiste na troca de um serviço sexual por determinado benefício.

Com isso, é possível seguir uma linha de compreensão no sentido de que a prostituição é um fenômeno social complexo diretamente ligado a questões socioeconômicas, sendo a pobreza e a necessidade financeira o maior fomentador da prostituição.

3.2. Sistemas jurídicos

A prostituição, enquanto atividade profissional regulamentada é matéria de estudo de ampla relevância jurídica, mesmo não sendo satisfatoriamente amparada pelo direito positivo pátrio, haja vista a sua integração social e histórica. No contexto mundial configuram-se três sistemas político-jurídicos de enquadramento da prostituição.

Antes de debater sobre o problema social dos profissionais do sexo deve-se analisar o objetivo e os sistemas jurídicos utilizados ao redor do mundo acerca da prostituição, e enquadrar o Brasil no devido preceito.

Como dito, verifica-se a existência de três principais sistemas jurídicos de enquadramento da prostituição, quais sejam o sistema proibicionista, o abolicionista e o regulador.

Passa-se a analisar primeiro o sistema jurídico proibicionista, que tem como metodologia a de coagir qualquer nuance da prestação de serviços sexuais, o qual Manuela Tavares evidência que o intuito do sistema é erradicar a prostituição:

O sistema proibicionista considera a prostituição um crime a erradicar e, deste modo, condena todos os elementos envolvidos: prostituta, proxeneta e cliente. Existe nos EUA, na China, em Malta, na Eslovénia e em outros países do Leste Europeu. São os sectores mais conservadores e puritanos da sociedade que defendem este modelo. Esta proibição não elimina a prostituição, antes favorece a sua clandestinidade. (TAVARES, 2006, p. 3, grifo do autor).

Baldner relata a visão praticada no sistema jurídico proibicionista:

[...] Proibicionismo: Por esta visão, é ilegal prostituir-se, ou seja, o Estado decide o que a pessoa pode ou não fazer com seu corpo. É percebido como de difícil aplicação em certos casos, uma vez que um presente após uma noite de sexo pode ser entendido como pagamento pelo serviço sexual. Tanto a prostituta quanto o dono de casa de prostituição e até o cliente são puníveis pela lei. É adotado por pouquíssimos países, mas, como é o sistema vigente nos Estados Unidos, é muito conhecido. (BALDNER, 2011, p. 31-32).

Devido a rigidez do sistema proibicionista poucos países o seguem, pois, segundo afirma Mario Bezerra da Silva, ele demonstra que o fato do sistema ser tão reconhecido se dá pela influencia Norte Americana que é signatária de tal sistema:

O Proibicionismo é adotado por pouquíssimos países, mas, como é o sistema vigente nos Estados Unidos, com sua poderosa indústria cultural, é muito conhecido. Quem nunca viu em filmes, por exemplo, prostitutas sendo levadas presas? Por esta visão, é ilegal prostituir-se, ou seja, o Estado decide o que a pessoa pode ou não fazer com seu corpo. É de difícil aplicação em certos casos. Um presente após uma noite de sexo pode ser entendido como pagamento pelo serviço sexual. Tanto a prostituta quanto o dono de casa de prostituição e até cliente são puníveis pela lei. (SILVA, 2008, online)

Partindo para o sistema regulador, tal sistema possui como intuito regulamentar a profissão, porém demanda exigências para a prestação do serviço, segundo explica Baldner ao expor o seguinte conceito sobre o sistema jurídico regulador:

Regulamentarismo: Nesse sistema a profissão é reconhecida e regulamentada, consequentemente, para as profissionais, há vantagens e desvantagens. Este é um sistema mais conservador e há exigências para que se exerça a prostituição, como a de que a mulher se submeta a exames periódicos, o que não é exigido para outras profissões ou a de que só exerça a atividade em locais determinados. Entre as vantagens, há a possibilidade de ter um contrato de trabalho, seguridade social, inclusive aposentadoria, garantias legais e outros. (BALDNER, 2011, p. 31).

Ademais, nesse sentido, de acordo com Silva (2008, online), “[o] Brasil já foi Regulamentarista e as prostitutas eram fichadas pelas delegacias. ”

Tavares traz ainda em sua contextualização do sistema a questão social levado em conta pelos países signatários:

O sistema regulador ou regulamentarismo, na sua versão mais tradicional, considera a prostituição como um fenômeno social não erradicável e, como tal, é preciso limitar os danos que pode causar na sociedade, regulamentando. Deste modo, desde que se cumpram as regras estabelecidas pelo Estado, não existe penalização da prostituta, que é encarada como uma prestadora de serviços, do cliente, que é considerado um consumidor e, ainda, de quem faz desta actividade [sic] um negócio. (TAVARES, 2006, p. 3, grifo do autor).

A obra de Tavares aborda um novo sistema que vem emergindo dentro do próprio sistema regulador, que deriva de um pensamento contemporâneo de inclusão social, tratando o prestador sexual de maneira mais humana:

Uma visão mais moderna deste sistema procura que as mulheres que vivem da prostituição possam ter um enquadramento legal, conferindo-lhes direitos e deveres associados a essa actividade [sic]: acesso aos sistemas públicos de saúde, segurança social, associação, cobrança de impostos. Países como a Alemanha e a Holanda têm vindo a aplicar este modelo. (TAVARES, 2006, p. 4).

Esta vertente do sistema jurídico regulador busca a descriminalização do prestador de serviços sexuais e dos agentes, porém não tira do Estado o dever de coibir a prostituição que existir de maneira forçada ou errônea, como fica explicitado na obra de Manoela Tavares:

Contudo, existe uma variante neste modelo, orientada para uma menor estigmatização [sic] de quem vive desta actividade [sic]. Fala-se, então, de descriminalização. A prestação de serviços sexuais não deveria ter uma regulamentação especial, mas serem aplicados os direitos laborais iguais aos de outros trabalhadores às pessoas que vivem desta actividade [sic]. Desta forma, descriminalizam-se também todos os agentes envolvidos, sendo que o Estado deveria acentuar o combate ao tráfico e à exploração do que se designa por “prostituição forçada”. (TAVARES, 2006, p. 4, grifo do autor).

Por fim há também o sistema jurídico abolicionista, sobre o qual Baldner tem o seguinte conceito:

[...] Abolicionismo: Adotado pela maioria dos países, como por exemplo, o Brasil. Nesse sistema, a prostituta é entendida como vítima e só exerce a atividade por coação de um terceiro, o “explorador” ou “agenciador”, que receberia parte dos lucros obtidos pela profissional do sexo, o que, segundo estudiosos do direito, facilita a corrupção. Na legislação abolicionista quem está na ilegalidade é o empresário ou o patrão, mas não há qualquer relação quanto a proibição da prostituta ou algum cliente negociar sexo diretamente com ela. O Brasil adota esse sistema desde 1942, quando entrou o Código Penal em vigor, em reforma há mais de nove anos, e é nessa legislação que o PL 98/2003 pretende oferecer alterações, tanto para a prostituta no exercício da profissão quanto para o empresário que sai da criminalidade e legaliza o negócio. (BALDNER, 2011, p. 31).

Como citado o Brasil encontra-se no sistema abolicionista e ao longo dos anos vem se demonstrando incongruente e até omisso ao tratar do tema prostituição, o que só majora problemas sociais.

O posicionamento Abolicionista trata o tema de maneira inacabada o que acarreta na vitimização do trabalhador sexual, porém traduz como anormal e socialmente incorreto o labor, o que acaba marginalizando o individuo, essa disparidade é descrita na obra de Melissa Farley, psicóloga clínica e pesquisadora da área:

Os defensores da descriminalização argumentam que a saúde das pessoas em prostituição será melhorada com a descriminalização, pois caso contrário às mulheres não teriam acesso aos cuidados de médicos. Supõe-se que as mulheres vão procurar cuidados de saúde, logo que o estigma da prisão é removido da prostituição. Se o estigma é removido, os defensores argumentam, as mulheres vão, em seguida, apresentar uma queixa sempre que elas forem abusadas, estupradas, ou agredidas na prostituição. Eles assumem que a queixa será seguida com uma resposta policial que tratrá a as mulheres na prostituição com dignidade e como cidadãos comuns. Infelizmente, os trabalhadores da saúde e da polícia também muitas vezes compartilham o mesmo desprezo para com aqueles em prostituição do que os outros fazem. (FARLEY, 2004, p. 1093, tradução nossa)1

Daniele do Carmo Baldner traz à tona a problemática dos paradigmas abarcados no tema e como eles promovem o retardamento da resolução do tema:

A questão da regulamentação da profissão do sexo, sempre exercida de maneira informal e marginalizada, causa profunda polêmica, uma vez que vem de encontro a fortes paradigmas enraizados na sociedade, que construiu a imagem da prostituta degenerada nata e da mulher honesta, perpassando profundas e subjetivas questões a cerca da configuração da família, do trabalho, da mulher e de seu papel como mantenedora primária da sociedade. Além dessas questões, pode-se falar ainda em tantas outras questões impostas pela Igreja, chegando até mesmo a índices preocupantes na administração pública sobre o tráfico de pessoas no território nacional [...] (BALDNER, 2011, p. 17-18).

Analisados os sistemas jurídicos ao redor do mundo, nota-se que mesmo os países desenvolvidos são incapazes de uma resolução definitiva para os impasses enfrentados pelo prestador de serviços sexuais.

Fica evidente a necessidade de um aprimoramento desses sistemas jurídicos de enquadramento da prostituição, pois são imprescindíveis os aperfeiçoamentos que incluam este prestador de serviços sexuais na sociedade sem criminalizá-los e marginalizá-los.

Findo com a ideia da necessidade da expansão do sistema regulamentarista, onde o prestador de serviços sexuais seja tratado com os mesmos direitos de um trabalhador de outra área qualquer, e que não seja exposto a danos físicos e psicológicos por opressão social ou do próprio Estado.

3.3. Aspectos sociais e políticos

Fica evidente que ao abordar o tema da prostituição, o objeto de estudo não se desenvolve de maneira racionalizada, pois ele traz consigo premissas morais e sociais históricas, e Baldner traz a seguinte consideração sobre o assunto:

A sociedade percebe como perigo mortal qualquer movimento contrário que ataque a sua própria realidade social histórica e, quando se traz tal debate à esfera da sexualidade e a ligamos a um passado social histórico composto por repressões que se tornaram menos densas a partir da emancipação feminina e da revolução sexual, podemos começar a elucidar questões sobre o que é considerado anormal e patológico, pois dentro do imaginário se constituiu a impossibilidade de questionamento e transgressão da ordem sócio-cultural [sic] pré-estabelecida.

Questões como o incesto, a virgindade, a masturbação, a homossexualidade, a pedofilia, o pansexualismo, a zoofilia, a prostituição dentre tantos outros tabus, foram estabelecidos dentro do imaginário social como sinônimo de pecado ou de anormalidade, criando representações solidificadas pela sociedade que estabeleceram esteriótipos [sic], determinantes de uma preocupação moral e religiosa capaz de restringir e pré-conceituar [sic] quaisquer indivíduos que percorram tal fronteira. (BALDNER, 2011, p. 42-43).

Moura descreve a formação do comportamento social em relação a assuntos referentes a sexo, demonstrando que existe um convencionalismo sobre o tema:

O discurso sobre o sexo é um dos modelos de controle e disciplina do sexo e estes podem ser observados recriando os modelos de repressão da sexualidade de épocas antigas, nas quais se impunha que desde a mais tenra idade o sujeito passasse por instituições nas quais tem sua conduta formada dentro de sua sexualidade. Por isso mesmo é que o sexo tem uma disposição toda especial de ser tratado, uma maneira toda própria de ser inserido no discurso (MOURA, 2013, p. 54).

Consequentemente a sociedade impõe ao sujeito de maneira coercitiva o que é tolerável o que é correto interligando a sua sexualidade com sua posição social, sendo que a sexualidade de um sujeito acaba por impor seu status social, influenciando assim diretamente na política, como discorre João Carlos da Cunha Moura:

É a sexualidade que denota o local do sujeito e do seu corpo na sociedade. Assim, os direitos os quais se quer perceber para si são modelos de atos e fatos jurídicos relacionados e determinados pela sua posição sexual na vida política. Nas democracias de modelo burguês há preterimento do público pelo privado e toda liberdade ou liberalidade é sempre politicamente decidida. À vista disso, o corpo como sujeito da política é definido pela sexualidade. (MOURA, 2013, p. 56)

Adriana Piscitelli em sua obra demonstra outro problema existente a respeito do tema qual seja a inconsistência que era existente nos estudos praticados ao analisar seriamente os problemas referentes ao trabalho sexual em nosso país:

[...] nos estudos antropológicos sobre prostituição realizados no Brasil existia uma reticência em conceder destaque às dimensões de violência presentes na vida das/os trabalhadores sexuais. Um dos motivos talvez tenha sido o esforço por distanciar-se das leituras sobre prostituição que a percebem como inerentemente violenta. (PISCITELLI, 2014, online).

João Carlos da Cunha Moura especifica ainda a falta de profundidade existente no mundo jurídico sobre o tema:

São poucos os autores de manuais jurídicos que se debruçam sobre os temas da prostituição e analisam apenas os artigos referentes à atividade (cujos dispositivos sofreram recente alteração em suas redações) de forma objetiva, sem aprofundar as condutas subjetivas, dos sujeitos ativos e passivos, voltando ao velho positivismo de que premissas maiores e premissas menores resultariam na cominação de determinada pena. (MOURA, 2013, p. 83)

Moura faz ainda alusão ao problema da incoerência das normas jurídicas existentes no país:

O discurso de proteção das pessoas perante um mundo perigoso abre uma espécie de preleção para todas as formas de repressão contra o que determinados seguimentos da sociedade consideram imoral e inaceitável. É este “pânico moral” que enseja maneiras de pensar e de se lutar contra o crime, no qual os direitos das pessoas que seriam protegidas pela norma, são reprimidos. Por tal característica, os crimes que se ligam à prostituição, por exemplo, não são aparelhos de proteção da prostituta, antes são instrumentos de repressão da própria prostituição. (MOURA, 2013, p. 85)

Este estereótipo fomentado pela sociedade para com o profissional do sexo aumenta exponencialmente a violência sofrida por estes trabalhadores, o que Romeu Gomes em, em seu artigo, destaca a ingenuidade da sociedade em perceber o real alcance da violência sofrida:

Em nossa sociedade atual, a violência é fato visto e sentido. Apesar dos inúmeros estudos sobre o assunto, alguns equívocos ainda estão presentes no cotidiano social. Em geral, estes equívocos surgem a partir de uma atitude reducionista frente à questão da violência. Um dos exemplos que limitam a compreensão desta questão se refere ao fato de muitos situarem-na apenas no campo do crime. Sabemos que os crimes, enquanto delitos cometidos contra a lei, concretamente revelam a existência da violência, uma vez que podem comprometer a vida de pessoas e de grupos, mas também sabemos que por detrás dos crimes estão presentes outros níveis de violência que necessariamente não se articulam diretamente com os crimes e que nem sempre são percebidos como violência. (GOMES, 1994, p. 156)

Gomes também promoveu uma investigação de natureza qualitativa, voltada para diagnóstico institucional sobre a concepção e a atuação frente à prostituição infantil feminina, que lhe concedeu a seguinte conclusão:

[...] o fato de viver nas ruas já implica negação de condições mínimas que assegurem uma qualidade de vida adequada. Por outro lado, além de comprometer a vida, o viver nas ruas pode ter como conseqüência [sic] o pior: a morte. Assim, o sistema estruturalmente violento, além de não permitir o acesso de pessoas aos padrões adequados à vida, decreta a morte dessas pessoas previamente excluídas.

Concluímos, ainda, que as marcas decorrentes dessas situações aparecem, nos relatos, como agravos no campo da saúde mental, evidenciados por profundos comprometimentos emocionais, inseguranças, medo e baixa autoestima, que podem se caracterizar como comportamentos paralisantes num processo de recuperação da cidadania das meninas. (GOMES, 1994, p. 166).

E notável que a postura social influencia jurídica e politicamente na situação fática do prestador de serviços sexuais, tanto que o tema se transformou em um tabu legislativo, uma vez que não se vislumbra uma ponderação de uma resolução concreta para o problema, mesmo que alguns políticos já buscaram arguir leis para regularizar a situação. Apesar de hoje em dia ter-se acesso a muita informação e que a tendência é a de se abordar tabus com menos preconceitos, a prostituição ainda sofre com a opressão social e política nacional, que resulta na marginalização dos prestadores de serviços sexuais. O preconceito disfarçado contra o trabalhador sexual é enraizado na sociedade o que afeta o discernimento dos políticos para o assunto, tornando a vida dos trabalhadores sexuais um martírio, os colocando em situações subumanas.

Quando se relata no presente estudo o fato do preconceito ser disfarçado refere-se à discordância de dados e informações sobre o tema, uma vez que, por exemplo, a pornografia e os produtos eróticos geram grandes rendimentos financeiros, em contra censo aumentam os casos de agressões contra trabalhadores sexuais devido a falta de regulamentação jurídica adequada e satisfatória para esta espécie de ocupação.

Em pesquisa veiculada pelo programa Profissão Repórter em maio de 2016 constatou-se que “a indústria de artigos pornográficos movimenta R$400 bilhões ao ano” (PROFISSÃO REPÓRTER, 2016, online). A reportagem alude ainda à proporção de acessos a conteúdo pornográfico na internet sendo que “Cerca de 30% de todo conteúdo acessado na internet é pornográfico. Um dos maiores sites de sexo virtual do Brasil recebe 50 mil acessos ao dia.” (PROFISSÃO REPÓRTER, 2016, online).

Visto esse crescente número de busca deste tipo de serviços é inconcebível que o preconceito invalide a necessidade de regulamentação, visto que as mesmas mídias veiculam constantemente casos de violências contra prestadores de serviços sexuais:

Polícia acha prostituta agredida por quinteto

Rio – A polícia localizou uma prostituta que também acusa de agressão os rapazes presos pelo espancamento da doméstica Sirlei Dias, de 32 anos, na madrugada de sábado. A moça, identificada como Ângela, já prestou depoimento e contou que foi atacada no mesmo dia, num ponto de ônibus anterior ao que Sirlei estava. O grupo de jovens de classe média também é acusado de agredir um rapaz num posto de gasolina. De acordo com Ângela, ela estava com um cliente quando os rapazes chegaram, fazendo ameaças. O cliente os afastou. O grupo voltou quando ela ficou sozinha. A moça contou que foi chutada e que os rapazes roubaram sua pochete. Na delegacia, Ângela reconheceu o estudante de Direito Rubens Corrêa como o primeiro a bater nela. “O primeiro a agredir foi o Rubens. Ela não reconheceu os outros, porque ficou de costas, depois que começou a apanhar e saiu correndo”, disse o delegado Carlos Augusto Nogueira, da 16.ª Delegacia de Polícia (Barra da Tijuca). (GAZETA DO POVO, 2007, online)

Tem-se que levar em conta ainda que as pessoas que exercem atividade de prostituição podem estar sujeitas a violências de motivos ainda mais fúteis ou torpes, como por exemplo, a notícia abaixo em que cita uma agressão sofrida simplesmente por ter desistido de realizar um programa com o agressor.

Prostituta é agredida e estuprada depois de desistir de programa no DF

Caso ocorreu no Gama na noite deste sábado (20).
Suspeito foi preso em flagrante e permanece na 20ª DP.

Homem foi preso em flagrante depois de agredir e estuprar uma garota de programa na noite deste sábado, no Gama, Distrito Federal. Segundo a polícia, agressor e vítima combinaram um programa, mas a mulher desistiu momentos antes.

O homem não gostou da decisão e passou a agredi-la. O suspeito violentou a garota em um matagal no Gama Oeste. A investigação é conduzida pela 20ª DP, onde o suspeito foi detido. (G1 DISTRITO FEDERAL, 2013, online, grifo do autor).

Isso demonstra sinais de que a exposição a violência dessas pessoas que exercem a prostituição é de alto índice e de alta gravidade, necessitando, portanto, de medidas eficazes para assegurar a essas pessoas melhores condições de segurança na sua integridade física, saúde e inclusão social.

Crimes absurdos são diariamente cometidos contra prestadores de serviço sexual, tais como colocar uma garota praticamente morta em saco plástico e jogá-la na rodovia:

Garota de programa é achada ferida dentro de saco em rodovia de Batatais

[...]

Uma garota de programa de 20 anos foi achada gravemente ferida dentro de um saco plástico na madrugada desta quarta-feira (24) em Batatais (SP). Segundo a Polícia Militar, a mulher foi abandonada no km 57 da Rodovia Altino Arantes após ter sido espancada por um casal. Ninguém foi preso. (G1 RIBEIRÃO E FRANCA, 2016, online)

Com isso, é possível demonstrar que, apesar do aumento constante do consumo de serviços sexuais mantém-se estagnado o preconceito e a criminalização do prestador do serviço sexual.

3.4. Projetos de leis em destaque

No ano de 2003 o então deputado Fernando Gabeira pelo PV-RJ, propôs o Projeto de Lei (PL) 98/03, que dispõe sobre a exigibilidade de pagamento por serviço de natureza sexual e supressão dos arts. 228, 229 e 231 do Código Penal:

O projeto de Lei em seu primeiro artigo e seu parágrafo primeiro submetem à obrigação de pagar pelo serviço prestado, determinando que o acordo de pagamento deva ser estabelecido pelo tempo conveniando entre as partes.

Art. 1º É exigível o pagamento pela prestação de serviços de natureza sexual.

§ 1º O pagamento pela prestação de serviços de natureza sexual será devido igualmente pelo tempo em que a pessoa permanecer disponível para tais serviços, quer tenha sido solicitada a prestá-los ou não. (BRASIL, CD, 2003, online).

No mesmo artigo em seu segundo parágrafo, o Projeto de Lei determina ainda que a exigibilidade do pagamento é do prestador do serviço sexual, sendo intransferível, o que se pode verificar que esse parágrafo busca coagir a exploração sexual: “§ 2º O pagamento pela prestação de serviços de natureza sexual somente poderá ser exigido pela pessoa que os tiver prestado ou que tiver permanecido disponível para os prestar. ” (BRASIL, CD, 2003, online).

O artigo 2º, do Projeto de Lei busca suprimir do Código Penal os artigos 228, 229 e 231, que se referem respectivamente aos tipos penais de favorecimento da prostituição, casa de prostituição e do tráfico de mulheres: “Art. 2º Ficam revogados os artigos 228, 229 e 231 do Código Penal.” (BRASIL, CD, 2003, online).

O Projeto de Lei em sua justificação estabelece os motivos de sua concepção, demonstrando o paradoxo social existente:

Já houve reiteradas tentativas de tornar legalmente lícita a prostituição. Todas estas iniciativas parlamentares compartilham com a presente a mesma inconformidade com a inaceitável hipocrisia com que se considera a questão.

Com efeito, a prostituição é uma atividade contemporânea à própria civilização. Embora tenha sido, e continue sendo, reprimida inclusive com violência e estigmatizada, o fato é que a atividade subsiste porque a própria sociedade que a condena a mantém. Não haveria prostituição se não houvesse quem pagasse por ela.

Houve, igualmente, várias estratégias para suprimi-la, e do fato de que nenhuma, por mais violenta que tenha sido, tenha logrado êxito, demonstra que o único caminho digno é o de admitir a realidade e lançar as bases para que se reduzam os malefícios resultantes da marginalização a que a atividade está relegada. Com efeito, não fosse a prostituição uma ocupação relegada à marginalidade – não obstante, sob o ponto de vista legal, não se tenha ousado tipificá-la como crime – seria possível uma série de providências, inclusive de ordem sanitária e de política urbana, que preveniriam os seus efeitos indesejáveis. (BRASIL, CD, 2003, online).

No Projeto Lei nº 98 de 2003, vários temas foram abordados de maneira superficial sem a devida pesquisa antropológica e jurídica necessária para elucidar o problema, segundo pode-se compreender na afirmação de Darlon Costa Duarte, ao analisar o projeto que chegou à seguinte conclusão:

Em conclusão, no tocante aos aspectos civis, acredita-se que o Projeto de Lei 98 de 2003 pecou pela superficialidade com que tratou a matéria. Seja como for, crê-se que, mesmo diante da falta de previsão legal, considerando o tratamento que é dado pelo ordenamento jurídico à atividade individual dos profissionais do sexo, eventuais débitos oriundos da prestação de seus serviços são plenamente exigíveis judicialmente, não se configurando meras obrigações naturais como defenderam alguns deputados responsáveis pela análise do Projeto.

Sob a ótica penal, por sua vez, o referido projeto pecou pelo excesso, pois pretendeu revogar disposições legais que deixariam o contrato prostitucional sem o amparo legal específico que merece.

Não obstante, a iniciativa foi louvável, pois pôs em pauta a discussão sobre a prostituição e a valorização dos profissionais do sexo numa das casas do Congresso Nacional e na própria sociedade. Ademais, tal Projeto deu fôlego para que fosse ventilada, atualmente, uma nova iniciativa, muito mais madura e coerente, que se passa a analisar. (DUARTE, 2014, p. 69).

O Projeto de Lei n. 98 de 2003 encontra-se arquivado segundo informações disponíveis para consulta e acompanhamento no sítio eletrônico da Câmara dos Deputados (BRASIL, CD, 2017a, online).

Duarte (2014, p.99) demonstra, porém, que apesar de não ter sido frutífero, o projeto de Lei n. 98/03 trouxe mais visualização para a classe dos trabalhadores sexuais tanto que, seguindo o Poder Executivo em 2005, o Ministério do Trabalho reconheceu, pela Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), a prostituição como atividade profissional. Tal classificação na CBO é a de número 5198-05 contendo o seguinte teor:

TÍTULO

5198-05 Profissional do sexo - Garota de programa; Garoto de programa; Meretriz; Messalina; Michê; Mulher da vida; Prostituta; Trabalhador do sexo.

DESCRIÇÃO SUMÁRIA

Buscam programas sexuais; atendem e acompanham clientes; participam em ações educativas no campo da sexualidade. As atividades são exercidas seguindo normas e procedimentos que minimizam a vulnerabilidades da profissão. (BRASIL, MTE, 2010, p. 809, grifo do autor).

Ponderando sobre a inclusão do trabalhador sexual na CBO, Duarte aborda a fragilidade do sistema político em reger sobre o tema, devido à percepção social, e evidência que existem discrepâncias entre o Poder Executivo e o Legislativo:

Denota-se que o Poder Executivo encontra-se passos a frente do Poder Legislativo (cujos membros mantêm posicionamentos sempre antiquados, raramente se propondo a adotar posições mais vanguardistas a fim de não se indisporem com seus futuros (re)eleitores) e, curiosamente, do próprio Poder Judiciário no que tange à proteção dos prostitutos. Com efeito, reconhecendo a prostituição como ocupação regular, os prostitutos podem ser contribuintes da Previdência Social, nos termos da Lei n° 8.212/1991, assegurando-lhes código próprio de contribuição, sob o numero 1007, fazendo jus a alguns direitos próprios deste regime contributivo, como o salário-maternidade e auxílio-doença, bem como à aposentadoria, todos, em regra, mediante contribuição de 20% sobre o salário de contribuição. (DUARTE, 2014, p. 99).

Mais uma vez as ponderações demonstram que dilemas sociais, influenciam na política, porem a propagação de deliberações sobre o tema tem trazido mesmo que a pequenos passos avanços a respeito do tema da prostituição.

Doravante no ano de 2012, o deputado federal Jean Wyllys pelo PSOL–RJ propôs outro Projeto de Lei para regulamentar a prostituição, o PL nº 4.211/12, além de propor algumas alterações nos tipos legais dos arts. 228, 229, 230, 231 e 231-A do Código Penal, estabelecem alguns direitos dessa categoria de profissionais.

O Projeto de Lei nº 4.211/12, busca a consolidação da dignidade humana, concedendo aos trabalhadores desta classe direitos embrionários. O deputado avulta ainda, a existência de um moralismo deturpado, que promove e ao mesmo tempo condena a prostituição:

É de um moralismo superficial causador de injustiças a negação de direitos aos profissionais cuja existência nunca deixou de ser fomentada pela própria sociedade que a condena. Trata-se de contradição causadora de marginalização de segmento numeroso da sociedade. (BRASIL, CD, 2012, online)

O Projeto o Lei aborta aspectos civis e penais, em seu artigo 1º caput, exigindo que o prestador de serviços sexuais possua maioridade penal, que seja absolutamente capaz e estabelece a voluntariedade, para suprimir a coação ou mesmo indução a pratica sexual: “Art. 1º - Considera-se profissional do sexo toda pessoa maior de dezoito anos e absolutamente capaz que voluntariamente presta serviços sexuais mediante remuneração. ” (BRASIL, CD, 2012, online, grifo do autor).

Consequentemente os parágrafos 1º e 2º do primeiro artigo tratam da exigibilidade de pagamento pela prestação de serviços e a impossibilidade de transferência do pagamento, com isso se estipula que o prestador de serviços sexuais tem o direito de cobrar pelo labor e que não pode passar esse direito a outro, no intuito justamente de vetar a exploração sexual:

§ 1º É juridicamente exigível o pagamento pela prestação de serviços de natureza sexual a quem os contrata.

§ 2º A obrigação de prestação de serviço sexual é pessoal e intransferível. (BRASIL, CD, 2012, online, grifo do autor).

O primeiro intento é tornar exigível o pagamento pela prestação de serviços sexuais, em segundo se permite a casa de prostituição, contando que nela não se exerça qualquer tipo de exploração sexual. Pelo PL define-se exploração quando:

Art. 2º - É vedada a prática de exploração sexual.

Parágrafo único: São espécies de exploração sexual, além de outras estipuladas em legislação específica:

I- apropriação total ou maior que 50% do rendimento de prestação de serviço sexual por terceiro;

II- o não pagamento pelo serviço sexual contratado;

III- forçar alguém a praticar prostituição mediante grave ameaça ou violência. (BRASIL, CD, 2012, online, grifo do autor).

O parágrafo 3º estabelece as possibilidades laborais para o prestador de serviços sexuais, tendo ainda um adendo para a casa de prostituição, tornando legal sua existência, desde que não pratique exploração sexual pré-determinada no artigo 2º do PL:

Art. 3º - A/O profissional do sexo pode prestar serviços:

I - como trabalhador/a autônomo/a;

II - coletivamente em cooperativa.

Parágrafo único. A casa de prostituição é permitida desde que nela não se exerce qualquer tipo de exploração sexual. (BRASIL, CD, 2012, online, grifo do autor).

O texto traz ainda alterações no Código Penal para que sejam descriminalizadas práticas laborais estipuladas no Projeto de Lei:

Art. 4º - O Capítulo V da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940, Código Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações:

Favorecimento da prostituição ou da exploração sexual.

Art. 228. Induzir ou atrair alguém à exploração sexual, ou impedir ou dificultar que alguém abandone a exploração sexual ou a prostituição:

[...].”

Casa de exploração sexual

Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente:

[...].”

Rufianismo

Art. 230. Tirar proveito de exploração sexual, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:

[...].”

Art. 231. Promover a entrada, no território nacional, de alguém que nele venha a ser submetido à exploração sexual, ou a saída de alguém que vá exercê-la no estrangeiro.

[...].”

Art. 231-A. Promover ou facilitar o deslocamento de alguém dentro do território nacional para ser submetido à exploração sexual:

[...].” (BRASIL, CD, 2012, online, grifo do autor).

Por fim o Projeto de Lei estabelece beneficio previdenciário ao trabalhador sexual consubstanciado pelas condições prejudiciais que o labor impõe: “Art. 5º. O Profissional do sexo terá direito a aposentadoria especial de 25 anos, nos termos do artigo 57 da Lei 8.213, de 24 de julho de 1991. ” (BRASIL, CD, 2012, online).

O Projeto de Lei possui mais solidez em seus artigos e fundamentações, sendo mais embaçado juridicamente, Duarte pondera sobre o projeto como uma evolução do Projeto de Lei nº 98, de 2003, e ainda expressa que o projeto precisa ser avaliado de maneira menos preconceituosa:

O referido Projeto avança em relação ao seu predecessor (o Projeto de Lei 98 de 2003, do Deputado Fernando Gabeira), notadamente sob o aspecto penal, pela propositura da distinção entre prostituição e exploração sexual, além de não incorrer nos excessos deste último projeto quanto à revogação de importantes tipos penais destinados a tutelar a dignidade sexual.

Além do mais, propõe um importante direito social (a aposentadoria especial), atento à realidade da atividade da prostituição, cuja “carreira” é curta.

Em suma, tal Projeto trará novamente o debate para as pautas da Câmara dos Deputados. Espera-se que, desta vez, a questão seja debatido sob uma ótica menos preconceituosa e mais voltada para a realidade social, e que a Câmara lide com a questão de maneira pragmática (tal qual deve se dar) a fim de proporcionar melhores condições de trabalho e de vida para as milhares de pessoas que estão envolvidas e que serão diretamente atingidas com tais mudanças legislativas. (DUARTE, 2014, p. 74)

O Projeto de Lei n. 4.211/2012 foi arquivado no ano de 2015 e em seguida desarquivado no mesmo ano a requerimento do Deputado Jean Wyllys. (BRASIL, CD, 2017b, online).

Os temas que envolvem a prostituição, não possuem a abordagem política necessária, sendo por motivos antropológicos enraizados culturalmente, o que afeta diretamente o prestador de serviços sexuais.

É possível cogitar que existe uma desmotivação política devido ao próprio desinteresse social, acometendo na manutenção da marginalização do prestador de serviços sexuais.

4. ASPECTOS PENAIS E PREVIDENCIÁRIOS A RESPEITO DA PROSTITUIÇÃO NO BRASIL

4.1. Aspectos penais

No Brasil há em vigor o sistema abolicionista de enquadramento da prostituição, com isso as normas penais tornam lícitas as atividades do prestador sexual, e tem como alvo da tutela penal quem se favorece da prostituição.

Rogério Greco tem a seguinte concepção do sistema normativo penal brasileiro a respeito do prestador de serviço sexual: “[...] a prostituição, em si, é considerada uma conduta indiferente ao Direito Penal, vale dizer, é um fato que não mereceu a atenção do legislador penal, sendo, portanto, atípico.” (GRECO, 2011, p. 687).

Greco traz ainda que mesmo a prestação de serviço sexual ser fato atípico o código penal reprime a fomentação da prostituição:

[...] embora atípico o comportamento de se prostituir, a lei penal reprime aquelas pessoas que, de alguma forma, contribuem para sua existência, punindo os proxenetas, cafetões, rufiões, enfim aqueles que estimulam o comércio carnal, seja ou não com finalidade de lucro. (GRECO, 2011, p. 687-688)

O Código Penal brasileiro possui um capítulo próprio para a punição das atividades correlacionadas a prostituição – especialmente a partir de alterações dadas Lei nº 12.015, de 2009 – em seu Título VI, Capítulo V, mas para esta pesquisa tem-se por análise das redações atuais de seus artigos 228, 229 e 230. (BRASIL, 1940, online).

O primeiro artigo tratado no Capítulo V refere-se ao crime de “Favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual” (BRASIL, 1940, online):

Art. 228. Induzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009). (BRASIL, 1940, online).

Fernando Capez explana o objeto jurídico abordado pelo artigo 228 da Lei nº 12.015, de 2009: “[...] o crime em estudo tutela, principalmente, a dignidade sexual do indivíduo, que é levado à prostituição ou outra forma de exploração sexual. ” (CAPEZ, 2013, p.133).

Na abordagem do objeto jurídico Capez explana ainda a sobre a proteção da moralidade “Em segundo plano, protege-se a moral média da sociedade, os bons costumes”. (CAPEZ, 2013, p.133).

A concepção moral social dentro do objeto material e jurídico é abordada também por Guilherme de Souza Nucci: “[o] objeto jurídico é a moralidade sexual publica”. (NUCCI, 2010, p. 945).

Como supracitado o objeto jurídico tutelado não envolve apenas o indivíduo ela busca também conservar a moral e os bons costumes determinados pela sociedade.

Caracterizado o objeto material e jurídico, em sequência se faz necessário classificar o crime, Nucci traz sinteticamente a seguinte classificação para o crime de favorecimento da prostituição ou outra forma de exploração sexual:

[...] trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial); material (delito que exige resultado naturalístico, consistente na efetiva prática da prostituição, ou outra forma de exploração sexual, pelo sujeito passivo); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos indicam ações) e, excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º, do Código Penal); instantâneo (cujo resultado se dá de maneira instantânea, não se prolongando com o tempo). (NUCCI, 2010, p. 945).

Por se tratar de crime comum Capez explana que “qualquer pessoa pode praticar o delito em análise” (CAPEZ, 2013, p. 134) neste ponto se faz necessário também avaliar o parágrafo 1º do artigo 228 co Código Penal que seja:

§ 1º Se o agente é ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou se assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Pena - reclusão, de 3 (três) a 8 (oito) anos. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) (BRASIL, 1940, online).

Esse parágrafo enquadra a qualificação do crime supra apresentado, sendo que afeta na pena prevista para o crime que fundamentalmente é de 2(dois) a 5(cinco) e passa para de 3(três) a 8(oito). (GRECO, 2011, p. 692)

Há ainda, ainda dois parágrafos que majoram a pena por qualificarem o delito quais sejam:

§ 2º - Se o crime, é cometido com emprego de violência, grave ameaça ou fraude:

Pena - reclusão, de quatro a dez anos, além da pena correspondente à violência.

§ 3º - Se o crime é cometido com o fim de lucro, aplica-se também multa. (BRASIL, 1940, online).

Quanto ao sujeito passivo do delito, ou seja, quem sofre o crime, Rogério Greco traz a seguinte explanação:

[...] qualquer pessoa poderá figurar como sujeito passivo do delito, seja do sexo masculino ou feminino. Nos dias de hoje, verifica-se com clareza o aumento da prostituição masculina, a ponto de se exporem em programas de televisão, rádio e em outros meios de comunicação de massa, a exemplo de jornais revistas etc. (GRECO, 2011, p. 691, grifo do autor).

Vale ressaltar que mesmo podendo ser qualquer pessoa existe a necessidade da determinação da vítima para a configuração do delito, sobre isso Nucci aduz:

[...] é preciso que a pessoa ofendida seja certa e identificada, não se configurando o tipo penal caso o agente, genericamente, leve pessoas indeterminadas à prostituição ou outra forma de exploração sexual. (NUCCI, 2010, p. 944)

Visto os sujeitos ativos e passivos do delito, a análise da consumação e tentativa do delito se faz imperioso, Greco traz a seguinte fala sobre a consumação do crime:

Tem-se por consumando o crime tipificado no art. 228 do Código Penal, por meio das condutas de induzir ou atrair, quando a vítima, efetivamente dá início ao comércio carnal, ou seja, às atividades próprias características da prostituição, com a colocação de seu corpo à venda, mesmo que não tenha, ainda, praticado qualquer ato sexual com algum “cliente”; ou ainda de acordo com a nova redação legal levada a efeito pela Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, quando a vítima é, efetivamente, explorada sexualmente, mesmo sem praticar o comércio carnal. (GRECO, 2011, p. 691)

Quanto ao delito em sua forma tentada Fernando Capez traz a seguinte fala:

[...] para a consumação, será necessário que a pessoa induzida etc. passe a se dedicar habitualmente à pratica do sexo mediante contraprestação financeira, não bastando que, em razão da indução ou facilitação, venha a manter, eventualmente, relações sexuais negociadas. Assim, o que deve ser habitual não é a realização do núcleo da ação típica, mais o resultado dessa atuação, qual seja a prostituição da ofendida. Não havendo habitualidade no comportamento da induzida, o crime ficará na esfera da tentativa. (CAPEZ, 2013, p.135)

Entretanto para Guilherme de Souza Nucci, a modalidade tentada do delito é inaplicável nos casos de indução ou atração: “não admite tentativa nas formas induzir ou atrair, por se tratar de crime condicionado” (NUCCI, 2010, p.945) alegando que poderiam se configurar apenas nas modalidades impedir e dificultar más o próprio não crê na inviabilidade real do fato:

Nas formas facilitar, impedir e dificultar poderia configurar, mas, para nós, como já exposto, é figura de configuração impossível no campo fático. Se prostituição é uma conduta habitual e o sujeito passivo deste crime não pode ser pessoa já prostituída, logo, na forma impedir (quando não há violência, ameaça ou fraude), inexiste viabilidade de consumação. Argumentar de modo contrário seria admitir que a força de um simples “ não” pudesse fazer com que uma prostituta – pessoa experiente e calejada – cedesse aos caprichos de outrem, continuando na sua vida sexual já desregrada. Cremos ser hipótese inverossímil. (NUCCI, 2010, p. 945, grifos do autor)

O intuito jurídico deste artigo é o de reprimir o fomento da prostituição, contudo Duarte traz que o artigo é demasiado abstruso, visto que o legislador identifica como exploração qualquer agenciamento da prostituição, confundindo seus conceitos semânticos:

Todavia, andou mal o Congresso ao confundir tais conceitos. É evidente que, em alguns casos, a prostituição deságua em exploração sexual, a exemplo do que ocorre quando há pressões exercidas por rufiões em desfavor do prostituto. Não é o que acontece, todavia, em todas (melhor: na maioria) das hipóteses. (DUARTE, 2014, p. 53)

Nucci traz ainda uma reflexão sobre o artigo e sobre sãs nuances sociais que não são consideradas pelo legislador:

Cuidaria melhor o legislador de proteger o menor de idade ou aquele que é vitima de atos violentos, ameaçadores ou fraudulentos, mas não a pessoa adulta que foi convencida a levar vida promíscua. Ressaltemos, se tal conduta fosse realmente relevante e danosa à sociedade, não se teria a proliferação de anúncios e propagandas de tida ordem nessa área, com o beneplácito das autoridades. (NUCCI, 2010, p. 944).

Analisado o artigo 228, é possível concluir que que o artigo busca realmente suprimir o aumento da prostituição e da exploração sexual, porém, é possível verificar que a legislação atual não alcança efetivamente a solucionar problemas graves inerentes ao ambiente da atividade de prostituição, como por exemplo, problemas de exposição à graves riscos de violência às pessoas que exercem a prostituição livremente.

O próximo artigo analisado trata do crime de “Casa de prostituição” (BRASIL, 1940, online) sendo ele o art. 229 do Código Penal, que tem a seguinte redação:

Art. 229. Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009).

Pena – reclusão, de dois a cinco anos, e multa. (BRASIL, 1940, online).

O objeto jurídico deste artigo sofreu alteração devido a sua nova redação alterada pela Lei nº 12.015, de 7 de agosto de 2009, com isso Capez traz o seguinte conceito do objeto jurídico do delito:

Com a nova rubrica do Capítulo V, mudou-se o foco da proteção jurídica. Tem-se em vista, agora, principalmente, a proteção da dignidade do indivíduo, sob o ponto de vista sexual. Secundariamente, protege-se também os bons costumes. (CAPEZ, 2013, p.141)

Greco ao definir o objeto material e o bem juridicamente protegido no artigo 229, também traz a questão social:

A moralidade pública sexual é o bem juridicamente protegido pelo tipo penal que prevê o delito tipificado no art. 229 do Código Penal e, num sentido mais amplo, a dignidade sexual.

O objeto material é o próprio estabelecimento em que ocorre a exploração sexual. (GRECO, 2011, p. 695)

Como no artigo 228 do Código Penal, o artigo 229 preza pela manutenção da moralidade, e segundo Greco tal artigo acaba por envilecer a Justiça Penal pela inviabilidade e desmotivação real do controle do delito:

A existência de tipos penais como o do art.229 somente traz descrédito e desmoralização para a Justiça Penal (Polícia, Ministério Público, Magistratura etc.) pois que, embora sendo do conhecimento da população em geral que essas atividades são contrárias à lei, ainda assim seu exercício é levado a efeito com propagandas em jornais, revistas, outdoors, até mesmo em televisão, e nada se faz para coibi-lo. (GRECO, 2011, p. 694)

Doravante Nucci traz sinteticamente a Classificação doutrinária do artigo 229 do Código Penal brasileiro:

[...] trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial; formal (delito que não exige resultado naturalístico, consistente na efetiva degradação da moral sexual); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“manter” implica em ação) e, excepcionalmente comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, § 2.º do Código Penal); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (como regra, vários atos integram a conduta). É delito habitual e não comporta tentativa. (NUCCI, 2010, p. 951)

Sendo crime comum qualquer individuo pode praticar o ato criminoso, sem necessidade de qualquer qualificação, nas palavras de Capez o sujeito ativo possui a seguinte definição:

Qualquer pessoa (homem ou mulher) que mantenha estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja ou não o intuito de lucro ou a intermediação direta dele. Dispensa-se que o agente obtenha proveito econômico com a exploração sexual exercida em seu estabelecimento. Assim, no caso de exercício de prostituição no local, dispensa-se a mediação entre o proprietário da casa, a prostituta e o seu cliente, ou seja, não se exige que o proprietário realize qualquer captação de clientela. (CAPEZ, 2013, p.145)

Quanto ao sujeito passivo existem algumas discussões Greco traz o seguinte texto em sua obra:

Tem-se apontado a coletividade como sujeito passivo do art. 229 do Código Penal, haja vista ser a moralidade pública sexual o bem por ele juridicamente protegido. Alguns autores, a exemplo de Luiz Regis Prado, apontam, também, como sujeito passivo aquele que exerce a prostituição nesses lugares. (GRECO, 2011, p. 695, grifo do autor)

A discussão decorre do fato da adesão do trabalhador sexual como sujeito passivo contrário a esta fala Nucci traz o seguinte:

Há quem inclua, como sujeito passivo, a pessoa que exerce a prostituição ou outra forma de exploração sexual, com o que não podemos concordar. A pessoa que se prostitui, por exemplo, não é sujeito passivo, tendo em vista que o ato em si não é considerado ilícito penal, além do que ela também está ferindo os bons costumes, ao ter vida sexualmente desregrada, de todo modo que não pode ser vítima de sua própria liberdade de ação. (NUCCI, 2010, p. 946)

Neste artigo se faz necessário também a apreciação da diferença entre proxeneta e rufião, visto que este artigo tem como alvo o proxenetismo, Nucci traz a definição de ambos para melhor entendimento do sujeito abordado no artigo:

[...] reserva-se o termo proxeneta à pessoa que intermedeia encontros amorosos para terceiros, mantendo locais próprios para tanto, auferindo ou não lucro; para o rufião (ou cafetão) guarda-se o conceito de pessoa que vive da prostituição alheia, fazendo-se sustentar pela (o) prostituta (o), com ou sem o emprego de violência. (NUCCI, 2010, p. 946)

Determinado os sujeitos faz-se prudente avaliar a consumação e tentativa do delito que sinteticamente Capez traz da seguinte maneira:

Ocorre a consumação com o início de manutenção do estabelecimento em que ocorra a exploração sexual. Não é necessária a prática de qualquer ato sexual [...]. Basta a prova de que a casa se destina à exploração sexual, por exemplo: prostitutas que já se encontram alojadas nos quartos no aguardo de clientes, panfletos anunciando a abertura da casa de prostituição etc. A tentativa é inadmissível, pois se trará de crime habitual. (CAPEZ, 2013, p.146-147)

Apesar de majoritariamente ser considerado inadmissível a tentativa, alguns autores discordam argumentando a possibilidade de se tentar o delito do art. 229 do Código Penal brasileiro, Greco aduz o seguinte:

[...] tratando-se de crime plurissubsistente, em nossa opinião, torna-se perfeitamente admissível o raciocínio da tentativa, pois que se pode visualizar o fracionamento do iter criminis.

Assim, imagine-se a hipótese daquele que seja surpreendido no exato instante em que ia levar a efeito a inauguração de seu bordel, que foi impedido de ser aberto por circunstâncias alheias à vontade do agente.

Neste caso, poderíamos entender pela tentativa do delito tipificado no art. 229 do Código Penal. (GRECO, 2011, p. 696)

Esse ponto da análise induz a várias dúvidas na capacidade do artigo e na forma que ele atinge a sociedade, visto que o artigo 229 do Código Penal poderia atingir casas de massagem, motéis, hotéis, saunas, bares, boates etc., devido a maneira como prevê a redação do referido tipo penal.

Porém a jurisprudência e as doutrinas já chegaram a um consenso pacificando o assunto. Sobre a conclusão majoritária sobre as casas de massagem, motéis, hotéis, bares etc., Nucci faz a seguinte ponderação:

[...] não configuram tipo penal, segundo jurisprudência e doutrina majoritárias. A explicação, como abordado no item anterior, é simples: não são lugares específicos para a exploração sexual, de onde se destaca a prostituição, pois têm outra finalidade, como a hospedagem, o serviço de massagem ou relaxamento, a sauna, o serviço de bar etc.” (NUCCI, 2010, p.950)

Quanto a jurisprudência se tratando dos locais supracitados há julgados que decidiram pela abolição, visto que se entende que o intuito do local não é o de exploração sexual, e mesmo que ocorra a exploração sexual é praticamente impossível a configuração do delito por insuficiência de provas, remetendo novamente a absolvição, situação comum em todo território nacional:

APELAÇÃO CRIMINAL. CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL. FACILITAÇÃO DE PROSTITUIÇÃO E MANUTENÇÃO DE CASA DE PROSTITUIÇÃO (ARTS. 228 E 229, DO CÓDIGO PENAL). SENTENÇA ABSOLUTÓRIA. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL.

PLEITO PELA CONDENAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS DA PRÁTICA EFETIVA DA PROSTITUIÇÃO OU OUTRA FORMA DE EXPLORAÇÃO SEXUAL. MULHERES QUE FREQUENTAVAM O LOCAL (BAR) POR LIVRE E ESPONTÂNEA VONTADE. MANUTENÇÃO DE BAR E MOTEL QUE, POR SI SÓ, NÃO CONFIGURA O CRIME DO ART. 229 DO CP. FRAGILIDADE DO CONJUNTO PROBATÓRIO. AUSÊNCIA ABSOLUTA DE PROVAS A ALICERÇAR ÉDITO CONDENATÓRIO. ABSOLVIÇÃO MANTIDA.

RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (SANTA CATARINA, TJSC, 2016, online)

São constantes as denuncia de bares, casa de massagem, motéis, boates etc., que incidem no art. 229 do Código Penal, mais o desfecho em maioria das vezes é o mesmo sendo absolvidos os proprietários por falta de provas da exploração sexual:

[...] APELAÇÃO CRIMINAL - ARTIGO 229 E 230 DO CÓDIGO PENAL - RECURSO MINISTERIAL - CONDENAÇÃO DO ACUSADO - IMPOSSIBILIDADE - AUSÊNCIA DOS ELEMENTOS DOS TIPOS PENAIS APTOS A CONDUZIR A UM JUÍZO DE CERTEZA EM RELAÇÃO À AUTORIA DELITIVA POR PARTE DO ACUSADO - RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1. Para a configuração do crime de casa de prostituição e rufanismo mister se faz a presença de todos os requisitos inerentes ao tipo penal, o que não restou demonstrado, in casu. 2. No caso focado, não me resta dúvida que o réu era proprietário de um local onde mulheres se prostituíam e praticavam atos libidinosos, mas, inexistem elementos evidentes para se afirmar que ali havia situação de exploração sexual. Pelo que se dessume dos autos, todas as mulheres que ali atuavam eram maiores de idade e ali estavam por vontade própria, sem qualquer tipo de coação física ou moral para a prática dos atos que se propunham a praticar, não subsistindo assim, os requisitos para a incidência nos artigos 229 e 230, do Código Penal. 3. Recurso conhecido e improvido. (ESPÍRITO SANTO, TJES, 2015, online, grifos do autor).

Nucci faz ainda uma crítica sobre o artigo 229 do Código Penal, evidenciando a incapacidade do artigo em atingir plenamente seus objetivos:

Sabe-se perfeitamente que, em muitos desses locais, trata-se de autêntica casa de prostituição disfarçada com um nome mais moderno e adaptado à realidade, embora antiquado e decadente seja o tipo penal. Por isso, a tentativa de aperfeiçoar o tipo penal, editando-se a Lei 12.015/2009, foi um fracasso. (NUCCI, 2010, p. 950, grifo do autor)

Alguns tribunais regionais já optaram por absolver acusados do crime previsto no art. 229 do Código Penal mesmo em situações que se configurou o delito, exemplo da apelação crime do RS n.  70065345324  alegando a conduta como atípica, em razão da adequação social do fato:

APELAÇÃO CRIMINAL.

MANUTENÇÃO DE CASA DE PROSTITUIÇÃO.

Absolvição da ré que se impõe, pois a conduta a ela imputada é atípica, em razão da adequação social do fato.

APELO PROVIDO. POR MAIORIA. (Rio Grande do Sul, TJRS, 2015, online, grifo do autor)

Vale ressaltar que devido a questão foi analisada pelo STF que fixou que não incorre adequação social na manutenção de casa de prostituição, no julgamento do HC 104.467:

HABEAS CORPUS. CONSTITUCIONAL. PROCESSUAL PENAL. CASA DE PROSTITUIÇÃO. APLICAÇÃO DOS PRINCÍPIOS DA FRAGMENTARIEDADE E DA ADEQUAÇÃO SOCIAL: IMPOSSIBILIDADE. CONDUTA TÍPICA. CONSTRANGIMENTO NÃO CONFIGURADO.

1. No crime de manter casa de prostituição, imputado aos pacientes, os bens jurídicos protegidos são a moralidade sexual e os bons costumes, valores de elevada importância social a serem resguardados pelo direito penal, não havendo que se falar em aplicação do princípio da fragmentariedade.

2. Quanto à aplicação do princípio da adequação social, esse, por si só, não tem o condão de revogar tipos penais. Nos termos do art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro (com alteração da Lei 12.376/2010), “não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique ou revogue”.

3. Mesmo que a conduta imputada aos pacientes fizesse parte dos costumes ou fosse socialmente aceita, isso não seria suficiente para revogar a lei penal em vigor.

4. Habeas corpus denegado. (BRASIL, STF, 2014, p. 596, grifo do autor).

Alisando o artigo 229 do Código Penal, é possível concluir que existe uma severa deficiência em sua prática. É possível entender o intuito do legislador é o de inibir a exploração sexual, porém é obtusa a lei, que não consegue inibir o crescimento de casas de prostituição devido impossibilidade de provas.

Por fim Por fim, no presente estudo chega-se a análise do artigo 230 do Código Penal que trata do crime de “Rufianismo”:

Art. 230 - Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça:

Pena - reclusão, de um a quatro anos, e multa. (BRASIL, 1940, online).

Este artigo previamente é necessário delimitar o conceito de rufianismo, Nucci traz o seguinte conceito:

É uma modalidade do lenocínio, que consiste em viver à custa da prostituição alheia. É a atividade exercida por aquele que explora prostitutas e, conseqüentemente, incentiva o comércio sexual. O termo equivalente é cafetão ou cáften. (NUCCI, 2010, p. 955)

Após abordado o conceito de rufião, se faz imperiosa a análise do objeto jurídico do delito, que para Fernando Capez: “tutela-se a dignidade sexual da prostituta, vítima da exploração do rufião, ou seja, aquele que procura tirar proveito do exercício da prostituição alheia” (CAPEZ, 2013, p.149)

Rogério Greco discorre junto do bem juridicamente protegido o objeto material, ressaltando o peso da moral social do artigo 230 do Código Penal, da seguinte maneira:

A moralidade pública é o bem juridicamente protegido pelo tipo penal que prevê o delito de rufianismo, bem como, num sentido mais amplo, a dignidade sexual, de acordo com a nova redação conferida ao Título VI do Código Penal, pela Lei 12.015, de 7 de agosto de 2009.

A pessoa explorada pelo rufião (ou cafetina), seja do sexo masculino, seja do sexo feminino, é o objeto material do delito em estudo. (GRECO, 2011, p. 699)

Visto o objeto jurídico e o objeto material do delito, se faz imperiosa a classificação do crime, Nucci sinteticamente traz a seguinte classificação:

[...] trata-se de crime comum (aquele que não demanda sujeito ativo qualificado ou especial); material (delito que exige resultado naturalístico, consistente no efetivo proveito do auferido pelo agente em detrimento da vítima); de forma livre (podendo ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (“tirar proveito” implica em ação) e excepcionalmente, comissivo por omissão (omissivo impróprio, ou seja, é a aplicação do art. 13, §2.º, do Código Penal); habitual (modalidade específica de crime, cuja relevância penal somente se encontra analisando-se o conjunto dos atos do agente. Não se focaliza uma ação isolada, pois a consumação é um todo indefinido, que precisa ser provado no curso da investigação ou do processo); unissubjetivo (que pode ser praticado por um só agente); plurissubsistente (como regra, vários atos integram a conduta, embora, por ser habitual, tais atos devam ser vistos no conjunto); não admite tentativa. (NUCCI, 2010, p. 956)

Por se tratar de crime comum o sujeito ativo independe de qualquer qualificação, Greco quanto aos sujeitos do delito diz: “Qualquer pessoa pode ser sujeito ativo do delito. O sujeito passivo é a pessoa explorada pelo rufião, abrangendo-se, também, em um sentido mais amplo, a coletividade.” (GRECO, 2011, p. 699).

Nucci reafirma esse sentindo mais amplo onde a coletividade, integra o sujeito passivo do delito: “[...] secundariamente, é a coletividade, pois o delito é contra a moralidade sexual.” (NUCCI, 2010, p. 955). O que aduz novamente que o conceito de moral é fundido ao de legal no artigo comentado.

O artigo possui em seu elemento subjetivo o dolo, inexistindo a forma culposa do delito Capez traz a seguinte fala quanto ao elemento subjetivo: “É o dolo, consiste na vontade livre e consciente de tirar proveito da prostituição alheia, participando dos seus lucros, ou ser por ela sustentado, ainda que em parte. Não se exige nenhuma finalidade específica.” (CAPEZ, 2013, p.149)

O delito do artigo 230 do Código Penal possui caráter habitual o que influi na sua consumação e tentativa, Greco traz a seguinte explanação:

Ocorre a consumação com o efetivo aproveitamento, pelo agente, da prostituição alheia, a exemplo de quando recebe o primeiro pagamento, os primeiros presentes, desde que seja com uma característica duradoura, vale dizer, não eventual.

Mesmo com alguma dificuldade de reconhecimento, não descartamos a possibilidade do raciocínio correspondente à tentativa. (GRECO, 2011, p. 699)

Apesar de ver possibilidade no reconhecimento da tentativa para o delito, por se tratar de crime habitual há entendimento doutrinário que adere pela inexistência de tentativa para o artigo 230 do Código Penal, Nucci traz o seguinte: “Em primeiro lugar, não admite tentativa o delito habitual, pois é impossível fracionar o iter criminis, vale dizer, é inaceitável considerar um fato isolado [...]” (NUCCI, 2010, p. 951, grifo do autor).

Capez quanto à consumação e tentativa diz o seguinte:

Dá-se a consumação com a participação reiterada do rufião no recebimento dos lucros, bem como da sua manutenção à custa da prostituta. Há necessidade de habitualidade.

Por se cuidar de crime habitual, é inadmissível a tentativa. (CAPEZ, 2013, p.150).

O crime de Rufianismo aceita ainda majoração por qualificação do delito, estando descrito nos parágrafos 1º e 2º do art. 230 do Código Penal:

§ 1º Se a vítima é menor de 18 (dezoito) e maior de 14 (catorze) anos ou se o crime é cometido por ascendente, padrasto, madrasta, irmão, enteado, cônjuge, companheiro, tutor ou curador, preceptor ou empregador da vítima, ou por quem assumiu, por lei ou outra forma, obrigação de cuidado, proteção ou vigilância: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Pena - reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

§ 2º Se o crime é cometido mediante violência, grave ameaça, fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação da vontade da vítima: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009)

Pena - reclusão, de 2 (dois) a 8 (oito) anos, sem prejuízo da pena correspondente à violência. (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) (BRASIL, 1940, online).

Ponto importante sobre o delito e que para o enquadramento do artigo 230 do Código Penal é necessário que ocorra lucro direto, qual seja a exploração sexual como já dito, logo mesmo que o proprietário de determinado local lucre vendendo bebidas, quartos, camisinhas ou qualquer outro bem que não provenha diretamente da prostituição, este, não esta sujeito ao artigo 230 do CP. (NUCCI, 2010, p. 955).

O fato da necessidade do lucro direto facilita o acometimento do crime por rufiões que lucram cobrando valores em quartos ou outros bens relativos à prostituição, porém não diretos, porém pelo artigo não é levado em conta que se trabalhador sexual é obrigado a usar ou consumir seus aposentos ou bens, o que acaba livrando o rufião. Como na jurisprudência a seguir:

APELAÇÃO CRIMINAL. FAVORECIMENTO DE PROSTITUIÇÃO DE VULNERÁVEL E CASA DE PROSTITUIÇÃO. ARTS. 218-B E 229, AMBOS DO CÓDIGO PENAL. PRETENSÃO ABSOLUTÓRIA FUNDADA NA AUSÊNCIA DE PROVAS E NA ATIPICIDADE DA CONDUTA. AUTORIA E MATERIALIDADE COMPROVADAS. DESCABIMENTO.

Se o conjunto probatório revela clara e insofismavelmente a materialidade e a autoria dos crimes narrados na denúncia, descabe a pretensão absolutória.

IRRESIGNAÇÃO DO REPRESENTANTE DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ABSOLVIÇÃO NO TOCANTE AO CRIME DE RUFIANISMO. PRETENSÃO CONDENATÓRIA INADMISSÍVEL. DÚVIDAS ACERCA DA PARTICIPAÇÃO DIRETA NO LUCRO DA PROSTITUIÇÃO ALHEIA. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS PARA ALICERÇAR DECRETO CONDENATÓRIO.

RECURSOS DESPROVIDOS. [...] (SANTA CATARINA, TJSC, 2011, online).

O artigo acaba por não atingir seus objetivos, bem ainda acomete na proibição do trabalhador sexual em contratar um agente para sua promoção, sobre esse efeito colateral do artigo 230 do Código Penal, Moura traz o seguinte:

[...] o crime de rufianismo, disposto no artigo 230 do Código Penal Brasileiro, ou seja, o fundamento paternalista acomete a norma já que impede a prostituta de ter um “gerente” ou alguma pessoa que ela mesma possa contratar para agenciar na escolha de clientes mais confiáveis. (MOURA, 2013, p. 86).

O artigo claramente impede que o profissional do sexo busque um agente ou empresário, com o fundamento que qualquer destes agentes estaria cometendo exploração sexual, não levando em conta que na esfera trabalhista tais agentes estão apenas recebendo por um serviço prestado, como acontece em várias outras profissões como músicos, jogadores de futebol, artistas etc.

Isso demonstra que o artigo é falho e não condiz com a nossa realidade social, uma vez que o artigo 230 do Código Penal é praticamente ineficaz, e acaba por obstruir melhoras no labor do prestador de serviços sexual, que tem que se sujeitar a ilicitude e a falta de amparo governamental.

Por fim analisando os três artigos, 228, 229 e 230 do Código Penal, é possível identificar uma similaridade de ineficiência prática dos artigos, não sendo plenamente aplicada nem sendo realisticamente viável. Além do fato da incongruência social, pois em alguns aspectos os artigos confundem ilegalidade com imoralidade, o que acaba por atingir negativamente apenas o prestador do serviço sexual.

4.2. Aspectos previdenciários

A CBO (Classificação Brasileira de Ocupações) “[é] referência obrigatória dos registros administrativos que informam os diversos programas da política de trabalho do País.” (BRASIL, MTE, 2010, p. 5), e descreve a prostituição sob a denominação “Profissional do sexo”, sob a enumeração 5198-05, abrangendo também as nomenclaturas “Garota de programa; Garoto de programa; Meretriz; Messalina; Michê; Mulher da vida; Prostituta; Trabalhador do sexo.” (BRASIL, MTE, 2010, p. 809)

Pela descrição sumária dos profissionais do sexo, assim fixada pela CBO: “[b]uscam programas sexuais; atendem e acompanham clientes; participam em ações educativas no campo da sexualidade. As atividades são exercidas seguindo normas e procedimentos que minimizam a vulnerabilidades da profissão.” (BRASIL, MTE, 2010, p. 809)

A inclusão dos profissionais do sexo na CBO resulta em sua integração nas políticas públicas do MTE e consequentemente dando maior viabilidade ao a este profissional no direito a inscrição na previdência social, tendo em vista as funções que a CBO possuem conforme a seguir:

A função enumerativa da CBO é utilizada em registros administrativos como a Relação Anual de Informações Sociais – Rais, Cadastro Geral de Empregados e Desempregados – Caged; Seguro Desemprego; Declaração do Imposto de Renda de Pessoa Física – Dirpf, entre outros. Em pesquisas domiciliares é utilizada para codificar a ocupação como, por exemplo, no Censo Demográfico, na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios – Pnad e outras pesquisas de institutos de estatísticas como o IBGE e congêneres nas esferas dos estados e dos municípios.

A função descritiva é utilizada nos serviços de recolocação de trabalhadores como o realizado no Sistema Nacional de Empregos – Sine, na elaboração de currículos e na avaliação de formação profissional, nas atividades educativas das empresas e dos sindicatos, nas escolas, nos serviços de imigração, enfim, em atividades nas quais informações do conteúdo do trabalho sejam requeridas. (BRASIL, MTE, 2010, p. 8)

Dentre o rol dos direitos fundamentais tem-se a Previdência Social como um direito social, ora previsto no art. 6º da Constituição Federal de 1988:

Art. 6º São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 90, de 2015) (BRASIL, 1988, online, grifo nosso).

Com isso a previdência social se torna um direito a ser exigível por qualquer membro da sociedade, atendidas as condições e possibilidades legais para tanto, sendo dever do Estado a prestação desse direito social.

A previdência social é de iniciativa dos Poderes Públicos sendo parte da seguridade social que se encontra no art. 194 da Constituição Federal de 1988:

Art. 194. A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social. (BRASIL, 1988, online, grifo nosso).

Visto a competência do Poder Público na prestação da seguridade social, Hugo Goes traz ainda que a previdência é separada em regimes:

A Previdência brasileira é formada por dois regimes básicos, de filiação obrigatória, que são o Regime Geral de Previdência Social (RGPS) e os Regimes Próprios de Previdência Social dos servidores públicos e militares. Há também o Regime de Previdência Complementar, ao qual o participante adere facultativamente. (GOES, 2016, p.15-16)

Visto que na previdência social existem regimes distintos, sendo eles o Regime Geral da Previdência, os Regimes Próprios de Previdência Social dos Servidores Públicos e Militares e a Previdência Complementar, se faz necessária a diferenciação destes regimes.

O Regime Geral de Previdência Social é definido pelo artigo 201 da Constituição Federal de 1988 com o seguinte caput: “Art. 201. A previdência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória [...]” (BRASIL, 1988, online), este regime é o que abrange grande parte da população nacional, o que, nas palavras de Hugo Goes: “[e]sse é o regime de previdência mais amplo, responsável pela proteção da grande maioria dos trabalhadores brasileiros.” (GOES, 2016, p. 16)

Os Regimes Próprios de Previdência Social dos Servidores Públicos e Militares são resguardados pela Constituição Federal do Brasil, e Hugo Goes traz de forma sintética os beneficiários deste regime:

Os beneficiários de Regime Próprio de Previdência Social - RPPS são os magistrados, ministros e conselheiros dos Tribunais de Contas, membros do Ministério Público, militares e servidores públicos ocupantes de cargo efetivo de quaisquer dos poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações. (GOES, 2016, p. 16)

O art. 40 da Constituição Federal é a norma que dispõe o benefício aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações:

Art. 40. Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 41, 19.12.2003). (BRASIL, 1988, online)

Quanto ao Regime de Previdência Complementar, Hugo Goes faz a seguinte síntese conceitual:

O Regime de Previdência Complementar é facultativo. A pessoa tem a possibilidade de entrar no sistema, de nele permanecer e dele retirar-se, dependendo de sua vontade. 3 Trata-se de uma faculdade dada à sociedade de ampliar seus rendimentos quando da aposentação. No entanto, a adesão a este regime não exclui a obrigatoriedade da filiação ao RGPS ou, no caso de militar ou servidor titular de cargo efetivo, ao regime próprio. (GOES, 2016, p. 21)

Devido ao objetivo principal do presente estudo ser quanto aos aspectos previdenciários relacionados aos prestadores de serviços sexuais, foca-se no Regime Geral da Previdência Social, visto ser este o enquadramento dos profissionais do sexo.

Dito que o regime geral de previdência social é o mais abrangente, faz-se necessária a definição do beneficiário, a qual Hugo Goes traz a seguinte introdução: “Beneficiários são os titulares do direito subjetivo de gozar das prestações previdenciárias. Ou seja, é toda pessoa física que recebe ou possa vir a receber alguma prestação previdenciária (benefício ou serviço).” (GOES, 2016, p. 77)

Dentro do regime geral de previdência social, no tocante ao seu modo de regime obrigatório existe uma classificação dos segurados, definido pela redação atual da Lei nº 8213, de 24 de julho de 1991, em seu artigo 11, sendo os segurados obrigatórios o “empregado”, o “empregado doméstico”, o “contribuinte individual”, “trabalhador avulso”, e o “segurado especial”. (BRASIL, 1991, online).

Os profissionais do sexo melhor se enquadram na espécie de contribuinte individual, nos termos do artigo 11, inciso V, alínea h da Lei nº 8213, de 24 de julho de 1991, que diz: “h) a pessoa física que exerce, por conta própria, atividade econômica de natureza urbana, com fins lucrativos ou não [...]” (BRASIL, 1991, online).

Hugo Goes traz a seguinte conceituação sobre esta espécie de contribuinte individual:

[...] é a pessoa física que presta serviços esporádicos. Esse obreiro não se fixa a uma fonte de trabalho, é contratado para trabalhar diante de uma situação específica, ocasional (trocar uma instalação elétrica, consertar o encanamento etc.). Terminado o trabalho, o eventual não retoma mais à empresa, vai à busca de outros trabalhos em empresas distintas. (GOES, 2016, p.115)

A inexistência de continuidade na prestação de serviço é determinante para a diferenciação do contribuinte, quanto a isso Hugo Goes que traz a seguinte analogia:

Diferentemente do empregado, no serviço prestado pelo trabalhador eventual não há a continuidade. Porém, de forma semelhante ao empregado, o trabalhador eventual é um trabalhador subordinado (está sujeito ao poder de direção do contratante). (GOES, 2016, p.115)

A ausência de continuidade na prestação de serviços já exime a relação de emprego o que conceitua o prestador de serviços sexuais como trabalhador eventual, segundo Sergio Pinto Martins:

Trabalhador eventual é a pessoa física que presta serviços esporádicos a uma ou mais de uma pessoa.

Para a teoria da descontinuidade ou da fixação jurídica do trabalhador na empresa, eventual é o trabalhador que não presta serviços para o mesmo tomador ou não se fixa numa empresa. (MARTINS, 2012, p.166)

A forma do serviço influi na arrecadação da contribuição, e visto a verossimilhança da forma de serviço prestado pelo profissional do sexo como contribuinte individual é necessário destacar a margem percentual de recolhimento para o adimplemento da previdência segundo Decreto nº 3.048, de 1999, na atual redação de seu art. 199 que determina que o contribuinte individual terá que recolher a seguinte alíquota:

Art. 199. A alíquota de contribuição dos segurados contribuinte individual e facultativo é de vinte por cento aplicada sobre o respectivo salário-de-contribuição, observado os limites a que se referem os §§ 3º e 5º do art. 214. (Redação dada pelo Decreto nº 3.265, de 1999) (BRASIL, 1999, online).

Tal dispositivo se complementa com as redações atuais dos parágrafos 3º e 5º do art. 214 do Decreto nº 3.048, de 1999 que determinam o seguinte:

§ 3º O limite mínimo do salário-de-contribuição corresponde: (Redação dada pelo Decreto nº 3.265, de 1999)

I - para os segurados contribuinte individual e facultativo, ao salário mínimo; e (Incluído pelo Decreto nº 3.265, de 1999)

II - para os segurados empregado, inclusive o doméstico, e trabalhador avulso, ao piso salarial legal ou normativo da categoria ou, inexistindo este, ao salário mínimo, tomado no seu valor mensal, diário ou horário, conforme o ajustado e o tempo de trabalho efetivo durante o mês. (Incluído pelo Decreto nº 3.265, de 1999)

[...]

§ 5º O valor do limite máximo do salário-de-contribuição será publicado mediante portaria do Ministério da Previdência e Assistência Social, sempre que ocorrer alteração do valor dos benefícios. (BRASIL, 1999, online).

Explicitada a espécie de Regime Geral da Previdência em que se enquadra o prestador de serviços sexuais, se faz oportuno dizer que desde 2005 o Ministério do Trabalho reconheceu, pela Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), a prostituição como atividade profissional, indexando-a com o número 5198-05.

Com a inclusão na CBO, o prestador de serviços sexuais adquiriu então direito de se tornar contribuinte individual e ter seus direitos previdenciários garantidos pelo Estado.

Conclusa a breve análise dos aspectos previdenciários do prestador de serviços sexuais é visto que adquirindo a qualidade de contribuinte todos os direitos previdenciários devem ser garantidos pelo Estado, outro ponto é do conceito social da previdência, visto que o intuito não é estimular a prostituição, o intuito é o de inclusão tirando a pessoa que se prostitui da marginalidade.

5. PROFISSIONAIS DO SEXO NA HIPÓTESE DE CRIAÇÃO DE COOPERATIVA

A profissionalização da prostituição, de modo melhor organizado e regularizado, para o presente estudo, não tem o foco de fomentá-la como empresa e sim de estudar possibilidades jurídicas para assim amenizar um problema social, como alternativas para potencializar a inclusão social dessas pessoas de algum modo na sociedade garantindo-lhes direitos fundamentais em patamares dignos.

Maria Ilidiana Diniz faz uma reflexão contundente sobre a questão social da prostituição:

É salutar destacar que a expansão da prática prostitucional não pode ser vista como uma opção das mulheres, e sim como uma falta de opção que cada vez se intensifica, dada as condições de desemprego que acompanha as mulheres no sistema capitalista. (DINIZ, 2009, p. 59)

Tânia Navarro Swain traz ainda enfaticamente a problemática de fazer analogia de prostituição com trabalho:

Confundir prostituição e trabalho é dotá-la de uma dignidade que não possui no imaginário e na materialidade social – o linguajar popular exprime o desprezo social em relação à prostituta e nenhuma legislação irá modificar esta imagem: é a forma falaciosa de justificar o completo assujeitamento das mulheres a seu corpo sexuado, mergulhando-as na total imanência. (SWAIN, 2004, p. 27, grifo do autor)

A autora Maria Ilidiana Diniz diz ressalta que pesquisas nessa área indicam que a prostituição insurge da necessidade de subsistência e não de puro estigma consumerista:

Todos(as) estamos inseridos(as) numa sociedade consumista onde prevalece a individualidade e o consumo sem restrições de pessoas e coisas. Nesse contexto, perceber as prostitutas como trabalhadoras tem o claro objetivo de reforçar a mercantilização das mulheres numa escala global. Como estratégias, disseminam a ideia da livre escolha, do desejo que as prostitutas apresentam pelo “trabalho sexual”, escamoteando assim, o que os estudos e pesquisas comprovam: que as mulheres se prostituem por questão de sobrevivência. (DINIZ, 2009, p. 93)

Outro ponto abordado pela referida autora corresponde às demandas sociais derivadas do sistema capitalista, e como elas influenciam diretamente no aumento de profissionais do sexo:

Nesse contexto contraditório do sistema capitalista, cuja a consequência direta é o desemprego, a precarização dos(as) trabalhadores(as), o aumento da jornada de trabalho, enfim a ampliação da pobreza em escala mundial, tem implicações diretas na vida dos(as) trabalhadores(as), que não conseguem inserir-se no mercado de trabalho formal. Desse modo, buscam alternativas nas mais variadas atividades, visando minimizar a miséria a qual são inseridos(as) no sistema dos descartáveis, dentre elas a prostituição. (DINIZ, 2009, p.96)

É necessário enfatizar que, apesar da prostituição estar classificada na CBO como uma ocupação denominada de “Profissionais do Sexo” (BRASIL, MTE, 2010, p. 809), o foco do presente estudo não é confundir prostituição com trabalho e sim demonstrar que o Estado possui obrigação de incluir essas pessoas na sociedade provendo-lhes a devida dignidade.

Darlon Costa Duarte discorre que a respeito do problema social gerado pela prostituição, criticando a falta de um posicionamento por parte do Estado:

Dessa forma, não há como deixar de criticar a postura adotada pelo Brasil, que se diz um país abolicionista mas pouco ou nada faz em prol dos prostitutos, deixando as num verdadeiro limbo jurídico: nem regulamenta a atividade, nem a proíbe; nem admite o agenciamento da prostituição (pois tipifica penalmente tal conduta), nem envida esforços efetivos para contê-la. Muitas vezes, a inércia e a letargia são piores do que a tomada de alguma posição, conquanto não haja pacificidade sobre ela. (DUARTE, 2014, p. 40)

Com esse prospecto de inclusão social que o trabalho argui a hipótese de constituição de cooperativa para o profissional do sexo, visando garantir direitos básicos, como segurança, saúde e dignidade, uma que o Estado possui uma postura absorta perante tal problema social.

5.1. Aspectos constitucionais

Araujo e Nunes Junior trazem o seguinte conceito quanto aos princípios constitucionais:

Os princípios são regras-mestras dentro do sistema positivo. Devem ser identificados dentro da Constituição de cada Estado as estruturas básicas, os fundamentos e os alicerces desse sistema. Fazendo isso estaremos identificando os princípios constitucionais. (ARAUJO; NUNES JUNIOR, 2009, p. 66)

Vicente Paulo e Marcelo Alexandrino trazem a seguinte ponderação sobre os princípios constitucionais: “[...] encontram-se os valores e os fins mais gerais orientadores de nosso ordenamento constitucional, funcionando como diretrizes para todos os órgãos mediante os quais atuam os poderes constituídos. ” (PAULO; ALEXANDRINO, 2016, p. 87)

São estes princípios que norteiam os direitos e as garantias da nossa sociedade, sobre isso Paulo e Alexandrino trazem o seguinte parecer:

De um modo geral, esses princípios consubstanciam o reconhecimento da soberania, no plano internacional, como elemento igualador dos Estados, além de reconhecer, também nesse âmbito, o ser humano como centro das preocupações da nossa República. (PAULO; ALEXRANDRINO, 2016, p. 87)

A Constituição Federal brasileira em seu art. 1º enumera os fundamentos do Estado brasileiro, sendo eles:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

I - a soberania;

II - a cidadania;

III - a dignidade da pessoa humana;

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

V - o pluralismo político. (BRASIL, 1988, online)

Os princípios e os direitos fundamentais são o cerne de uma constituição, consequentemente eles são a essência do Estado, onde toda organização política, jurídica e social decorre dos pareceres constitucionais sendo eles fonte soberana.

Sé faz pertinente ao trabalho a análise de determinados princípios e direitos fundamentais constitucionais para discorrer sobre a hipótese de constituição de cooperativas para os profissionais do sexo.

5.1.1. O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana

A dignidade da pessoa humana é afirmada do 1º artigo da Constituição Federal do Brasil, estabelecida como princípio fundamental visando uma sociedade justa e o bem-estar social, o que Araujo e Nunes Junior reforçam: “[...] a Constituição identificou como objetos fundamentais da República, dentre outros, a construção de uma sociedade justa, a erradicação da pobreza e a redução de desigualdades sociais. ” (ARAUJO e NUNES JUNIOR, 2010, p. 99)

Em consonância com o Estado em sua organização, Paulo e Alexandrino demonstram que o cerne do princípio da dignidade humana é o ser humano:

A dignidade da pessoa humana como fundamento da República Federativa do Brasil consagra, desde logo, nosso Estado como uma organização centrada no ser humano, e não em qualquer outro referencial. (PAULO e ALEXANDRINO, 2016, p. 90)

Azevedo discorre sobre o objeto central do princípio da dignidade humana com essa compreensão de uma sociedade justa e do bem-estar social, dizendo: “O princípio jurídico da dignidade, como fundamento da República, exige como pressuposto a intangibilidade da vida humana. Sem vida, não há pessoa, e sem pessoa, não há dignidade.” (AZEVEDO, 2002, p. 95, grifo do autor)

Alexandre de Moraes traz a seguinte concepção conceitual da dignidade humana:

A dignidade é um valor espiritual e moral inerente à pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos. (MORAES, 2014, p.18)

Azevedo sintetiza em três preceitos hierárquicos a dignidade da pessoa humana:

[...] a dignidade da pessoa humana como princípio jurídico pressupõe o imperativo categórico da intangibilidade da vida humana e dá origem, em seqüência hierárquica, aos seguintes preceitos: 1) respeito à integridade física e psíquica das pessoas; 2) consideração pelos pressupostos materiais mínimos para o exercício da vida; e 3) respeito às condições mínimas de liberdade e convivência social igualitária. (AZEVEDO, 2002, p. 100)

Sendo a vida o cerne do princípio da dignidade humana, Azevedo diz que: “[o] preceito da intangibilidade da vida humana, portanto, não admite exceção; é absoluto e está, de resto, confirmado pelo caput do art. 5º da Constituição da República.” (AZEVEDO, 2002, p. 96)

Azevedo traz que o princípio da dignidade humana em seu segundo preceito que sendo a vida humana intangível se faz necessária a manutenção de sua integridade física e psíquica: “Depois da intangibilidade da vida humana, a primeira conseqüência direta que se pode tirar do princípio da dignidade é o respeito à integridade física e psíquica da pessoa humana.” (AZEVEDO, 2002, p. 97, grifo do autor)

José Afonso da Silva demonstra a relação da vida com a integridade física dizendo: “Agredir o corpo humano é um modo de agredir a vida, pois esta se realiza naquele. A integridade físico-corporal constitui, por isso, um bem vital e revela um direito fundamental do indivíduo.” (SILVA, 2010, p. 199)

Azevedo traz que o princípio da dignidade humana aborda em seu terceiro preceito questões relativas a igualdade de convivência e pressupostos de liberdade: “[...] a terceira conseqüência [sic] do princípio da dignidade é a consistente no respeito aos pressupostos mínimos de liberdade e convivência igualitária entre os homens (condições culturais).” (AZEVEDO, 2002, p. 98)

O princípio da dignidade humana é um pilar constitucional, incidente a todos os seres humanos, que busca proteger sua vida, sua integridade física e psíquica, sua liberdade, enfim estabelecer um bem-estar social mínimo. Ressaltando que não existe distinção de raça, sexo, idade estado civil ou condição econômica, sendo necessário apenas o fato de ser alguém para estar resguardado por este princípio.

5.1.2. O princípio fundamental dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa

O princípio dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa se encontra no art. 1º inciso IV da Constituição Federal (BRASIL, 1988, online), sendo um princípio fundamental.

Alexandre de Moraes introduz o princípio fundamental dos valores sociais do trabalho e da livre iniciativa com a seguinte colocação: “[...] é através do trabalho que o homem garante sua subsistência e o crescimento do país, prevendo a Constituição, em diversas passagens, a liberdade, o respeito e a dignidade ao trabalhador (por exemplo: CF, arts. 5a, XIII; 6a; 7a; 8a; 194-204).” (MORAES, 2014, p. 19)

Uadi Lammêgo Bulos faz a seguinte introdução sobre o princípio fundamental dos valores sociais e da livre iniciativa:

[...] o trabalho, certamente, dignifica a existência terrena, e, quando livre e criativo, liga o homem a Deus. Daí a Constituição enfatizar o respeito e a dignidade ao trabalho em diversos lugares (arts. 5º, XIII, 6º, 7º etc.), para dizer que a garantia do trabalho engloba empregados, empregadores, autônomos e assalariados. Aliás, para alcançar o seu desígnio constitucional o labor deve ser livre. (BULOS, 2015, p. 515)

O artigo 170 da Constituição Federal traz pontos chave para a apreciação desse princípio: “A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios: [...]” (BRASIL, 1988, online)

Bulos traz a seguinte reflexão a respeito do constituinte frente ao princípio abordado no caput do art. 170 da Constituição Federal:

[...] o constituinte prestigiou uma economia de mercado, de cunho capitalista, priorizando o labor humano como valor constitucional supremo em relação aos demais valores integrantes da economia de mercado. Quanto a livre-iniciativa, não é absoluta; encontra limites na dignidade da pessoa humana (art. º III), na defesa do consumidor (art. 170, V), no direito de propriedade (art. 5º, XXII), na igualdade de todos perante a lei (5º caput) etc. (BULOS, 2015, p.1523)

O parágrafo único do artigo 170 da Constituição federal diz que: “É assegurado a todos o livre exercício de qualquer atividade econômica, independentemente de autorização de órgãos públicos, salvo nos casos previstos em lei.” (BRASIL, 1988, online).

Sobre o parágrafo único do art. 170 da CF, Bulos discorre a respeito da existência digna dizendo que “[...] a intervenção do Estado na economia deve atentar para a dignidade da pessoa humana, fundamento não só da ordem econômica mas também da República Federativa como um todo (CF, art. 1º, III).” (BULOS, 2015, p. 1523). O referido autor traz ainda uma crítica a respeito da justiça social:

[...] eis um dos instrumentos de tutela dos hipossuficientes (CF, art. 6º) que, até hoje, não saiu do papel. O espirito do neoliberalismo não conseguiu estancar as desigualdades sociais, criadas e produzidas pela aníqua distribuição de rendas. Num regime de acumulação do capital, pela apropriação privada dos meios produtivos, prepondera a diversidade de classes sociais. Por outro lado, justiça social é cada um poder dispor dos meios materiais para viver com certo conforto, gozando segurança física, espiritual, econômica e política. (BULOS, 2015, p. 1523)

É pertinente ao trabalho analisar o inciso VII do art. 170 da CF/88, que possui o seguinte princípio: “[...] redução das desigualdades regionais e sociais.” (BRASIL, 1988, online).

Sobre este inciso Bulos faz a seguinte ponderação:

[...] a redução das desigualdades, além de ser um dos objetivos fundamentais da Republica Federativa do Brasil (CF, art. 3º, III), constitui um dos princípios regentes da ordem econômica, Há, até mecanismos tributários e orçamentários que podem implementar esse princípio (CF 43 e 165, §1º) (BULOS, 2015, p. 1525)

Sobre o princípio da “busca pelo pleno emprego” previsto no art. 170, inciso VIII da Constituição Federal (BRASIL, 1988, online) Bulos também o critica: “Eis uma matéria controvertida e contraditória, pois “pleno emprego” é algo inexistente no Brasil. Logo estamos diante de mais uma ilusão constitucional. (BULOS, 2015, p. 1525)

O princípio fundamental do valor social do trabalho e da livre iniciativa agrega valor social ao homem e à sociedade, defendendo o trabalhador e o seu meio de trabalho, garantindo liberdade de escolha compactuando com o liberalismo econômico.

5.1.3. Os objetivos fundamentais da república

A Constituição Federal possui em seu art. 3º os objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil, vide:

Art. 3º Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

I - construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II - garantir o desenvolvimento nacional;

III - erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV - promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. (BRASIL, 1988, online)

Paulo e Alexandrino fazem a seguinte conceituação dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil:

Constata-se que esses objetivos têm em comum assegurar a igualdade material entre os brasileiros, possibilitando a todos iguais oportunidades para alcançar o pleno desenvolvimento de sua personalidade, bem como para autodeterminar e lograr atingir suas aspirações materiais e espirituais, condizentes com a dignidade inerente a sua condição humana. (PAULO; ALEXANDRINO, 2016, p. 91)

A respeito do inciso III do art. 3º da CF, Bulos faz o seguinte comentário: “[...] ante a pobreza generalizada, o desenvolvimento social impõe a sua extirpação como única saída para o extermínio das desigualdades sociais e regionais.” (BULOS, 2015, p. 520)

O referido autor afirma também a respeito do inciso IV do art. 3º da CF/88, sobre a promoção do bem de todos sem preconceitos:

[...] eis a igualdade formal consagrada como um dos objetivos da república pátria. Nossos irmãos do sul, norte, leste, oeste; os brancos, negros, judeus, índios, mulatos etc.; os heterossexuais os homossexuais; crianças, jovens, adultos e idosos todos são iguais em direitos e deveres. (BULOS, 2015, p. 521)

Os objetivos elencados buscam o crescimento social do país, visando o bem-estar de todos os membros da sociedade sem nenhuma distinção, embora por vezes alguns objetivos não são plenamente exercidos, gerando desigualdades sociais.

5.1.4. O princípio da igualdade

A Constituição Federal traz em seu art. 5º a igualdade e a inviolabilidade dos direitos fundamentais:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: [...] (BRASIL, 1988, online, grifo nosso).

Alexandre Moraes faz a seguinte redação sobre o conceito básico do princípio da igualdade:

A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da igualdade de direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito de tratamento idêntico pela lei, em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico. (MORAES, 2014, p. 35)

Uma vez conceituada o referido autor demonstra o que o princípio proíbe:

[...] o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, é exigência tradicional do próprio conceito de Justiça, pois o que realmente protege são certas finalidades, somente se tendo por lesado o princípio constitucional quando o elemento discriminador não se encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito [...]. (MORAES, 2014, p. 35)

Bulos, comentando o posicionamento do STF em relação ao princípio da igualdade, faz a seguinte afirmação:

A igualdade constitucional mais do que um direito é um princípio, uma regra de ouro, que serve de diretriz interpretativa para as demais normas constitucionais.

Daí o Supremo Tribunal Federal apontar o seu tríplice objetivo: limitar o legislador a autoridade pública e o particular. (BULOS, 2015, p. 560, grifo do autor)

Conclui-se com que este princípio é um pilar da República Federativa do Brasil, com objetivo de tratamento igualitário de todos os cidadãos da sociedade, sendo de preocupação tanto do legislador como do aplicador da lei, a manutenção do princípio para que decorra o equilíbrio social.

5.1.5. A liberdade de trabalho, ofício ou profissão

Quanto à liberdade laboral, o inciso XIII do art. 5º da Constituição Federal dispõe que “[...] é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer [...]” (BRASIL, 1988, online).

José Afonso da Silva em referência ao artigo 5º inciso XIII, aduz que o seguinte princípio não constitui direito social e sim um direito individual, com o seguinte dizer:

O teor do dispositivo, de si, já demonstra que estamos diante de simples direito individual, não daquilo que a doutrina chama de liberdade do conteúdo social, pois ali não se garante o trabalho, não se assegura o conteúdo do trabalho, nem a possibilidade de trabalho, nem o emprego nem tampouco as condições materiais para a investidura num ofício ou para a aquisição de qualquer profissão. Isso, sim seria direito social. (SILVA, 2010, p. 257)

Silva traz ainda o seu conceito do referido dispositivo constitucional:

O dispositivo confere liberdade de escolha de trabalho, de ofício e de profissão, de acordo com as propensões de cada pessoa e na medida em que a sorte e o esforço próprio possam romper as barreiras que se antepõem à maioria do povo. Confere, igualmente, a liberdade de exercer o que fora escolhido, no sentido apenas de que o Poder Público não pode constranger a escolher e a exercer outro. (SILVA, 2010, p. 257)

A respeito do conceito do princípio de liberdade de profissão, Araujo e Nunes Junior têm o seguinte parecer:

[...] cuida-se de um típico direito de liberdade do cidadão. A norma, fixando uma limitação da atividade do Estado, demarca um território impenetrável da vida individual e, dessa forma, fixa o direito à autodeterminação do indivíduo na escolha de sua profissão. (ARAUJO; NUNES JUNIOR, 2009, p. 162)

Os referidos autores trazem à tona também a questão do poder do Estado em delimitar determinadas profissões, ressaltando o que decorre da falta de regulamentação de algumas profissões:

O dispositivo, porém, foi erigido sob os moldes de uma regra de eficácia contida, permitindo que lei infraconstitucional venha a limitá-la, criando requisitos e qualificações para o exercício de determinadas profissões. Logo, enquanto não existir lei acerca dessa ou daquela profissão, a permissão constitucional tem alcance amplo. (ARAUJO; NUNES JUNIOR, 2009, p.162)

É possível dizer que este inciso da Constituição traz o sentido de que o princípio de liberdade de trabalho ofício ou profissão estabelece um direito individual onde o Estado não deve constranger o trabalhador que pode optar por exercer qualquer labor, desde que tendidas às qualificações profissionais.

Consequentemente o princípio da liberdade de trabalho, permite que qualquer pessoa exerça a prostituição, levando em conta o sistema abolicionista que o Brasil adota a respeito da atividade de prostituição, abordagem esta contida na subseção 1.2 da presente monografia.

5.1.6. A liberdade de associação e de criação de cooperativas

Tem-se no inciso XVII do art. 5º da Constituição Federal dispondo que “[...] é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar [...]”. (BRASIL, 1988, online)

O artigo é explicito sendo que exprime o direito de duas ou mais pessoas se unirem para constituir uma sociedade, o que Bulos traz o seguinte conceito a respeito do direito de associação previsto no referido dispositivo constitucional: “[...] é o direito público subjetivo que permite a coligação voluntaria de algumas ou várias pessoas físicas, por longo tempo, com o propósito de alcançar objetivos lícitos, sob direção unificante.” (BULOS, 2015, p. 613).

Em seguida, já no inciso XVIII do artigo 5º da CF dispõe que “[...] a criação de associações e, na forma da lei, a de cooperativas independem de autorização, sendo vedada a interferência estatal em seu funcionamento [...]” (BRASIL, 1988, online).

A Constituição Federal traz então em seu art. 174 a obrigação do Estado em incentivar atividade econômica, sendo que em seu parágrafo segundo explicita a estimulação do sistema de Cooperativa:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

[...]

§ 2º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo. (BRASIL, 1988, online).

José Afonso da Silva faz menção à liberdade de associação correlacionada com o cooperativismo discorrido no inciso XVIII do art. 5º da Constituição Federal e no seu artigo 174 § 2º:

[...] a Constituição correlaciona as cooperativas com associações (art. 5º, XVIII) e, num dispositivo da ordem econômica, dispõe que a lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo (art. 174, §2º). Aqui correlaciona associativismo e cooperativismo entre as instituições da ordem econômica[...] (SILVA, 2010, p. 267) (grifos do autor)

O direito à liberdade de associação possui respaldo constitucional, tendo ainda o Estado a função de incentivar, regular e fiscalizar este sistema, a liberdade de associação é fundamental para o progresso social e econômico.

5.2. Sociedade cooperativa

A política de cooperativismo está presente no ordenamento jurídico brasileiro como visto previamente na Constituição Federal em seu art. 5º, XVIII e 174, § 2º, sendo regulado por legislação específica e com disposições gerais previstas no Código Civil.

O Código Civil traz normas de aspecto geral a respeito das cooperativas, deixando isso explicito no seu art. 1.093 que diz: A sociedade cooperativa reger-se-á pelo disposto no presente Capítulo, ressalvada a legislação especial. (BRASIL, 2002, online).

Dito isso, em seu art. 1.094 o Código civil demonstrada as seguintes características das cooperativas:

Art. 1.094. São características da sociedade cooperativa:

I - variabilidade, ou dispensa do capital social;

II - concurso de sócios em número mínimo necessário a compor a administração da sociedade, sem limitação de número máximo;

III - limitação do valor da soma de quotas do capital social que cada sócio poderá tomar;

IV - intransferibilidade [sic] das quotas do capital a terceiros estranhos à sociedade, ainda que por herança;

V - quorum, para a assembléia [sic] geral funcionar e deliberar, fundado no número de sócios presentes à reunião, e não no capital social representado;

VI - direito de cada sócio a um só voto nas deliberações, tenha ou não capital a sociedade, e qualquer que seja o valor de sua participação;

VII - distribuição dos resultados, proporcionalmente ao valor das operações efetuadas pelo sócio com a sociedade, podendo ser atribuído juro fixo ao capital realizado;

VIII - indivisibilidade do fundo de reserva entre os sócios, ainda que em caso de dissolução da sociedade. (BRASIL, 2002, online, grifo do autor)

Sobre as características da sociedade cooperativa inseridas no Código Civil e especialmente na Lei 5.764 de 1971 nesta lei há no art. 4ª, I, que trazem a questão da variabilidade do capital social:

Art. 4º As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes características:

[...]

II - variabilidade do capital social representado por quotas-partes; (BRASIL, 1971, online, grifo nosso)

A Lei 5.764 de 1971 em seu art. 4º, III, faz referência a característica da cooperativa a respeito da limitação do número de cotas: “III - limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais [...]”. (BRASIL, 1971, online)

A inacessibilidade das quotas partes da cooperativa, estabelecida na Lei 5.764 de 1971 no art. 4º, IV esclarece e especifica quanto a impossibilidade de obtenção de cotas por terceiro: “IV – incessibilidade [sic] das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade [...]”. (BRASIL, 1971, online)

Outra consonância da Lei 5.764 de 1971 em destaque é a do direito de voto igualitário independente de contribuição, o que estabelece um sistema democrático no cooperativismo, pois tal lei esta determinação na atual redação de seu art. 42: “Art. 42. Nas cooperativas singulares, cada associado presente não terá direito a mais de 1 (um) voto, qualquer que seja o número de suas quotas-partes. (Redação dada pela Lei nº 6.981, de 30/03/82)”. (BRASIL, 1971, online)

A Lei 5.764 de 1971 especifica uma peculiaridade distributiva das despesas de exercício da cooperativa em seu art. 80 ao dispor que “[a]s despesas da sociedade serão cobertas pelos associados mediante rateio na proporção direta da fruição de serviços.” (BRASIL, 1971, online).

O Código Civil traz em seu artigo 1.095 a questão relacionada a responsabilidade dos sócios:

Art. 1.095. Na sociedade cooperativa, a responsabilidade dos sócios pode ser limitada ou ilimitada.

§ 1o É limitada a responsabilidade na cooperativa em que o sócio responde somente pelo valor de suas quotas e pelo prejuízo verificado nas operações sociais, guardada a proporção de sua participação nas mesmas operações.

§ 2o É ilimitada a responsabilidade na cooperativa em que o sócio responde solidária e ilimitadamente pelas obrigações sociais. (BRASIL, 2002, online)

A lei nº 5.764/71 “[d]efine a Política Nacional de Cooperativismo, institui o regime jurídico das sociedades cooperativas, e dá outras providências”, e em seu art. 1º dispõe a compreensão de tal política como sendo “[...] a atividade decorrente das iniciativas ligadas ao sistema cooperativo originárias de setor público ou privado, isoladas ou coordenadas entre si, desde que reconhecido seu interesse público.” (BRASIL, 1971, online). Ressalta-se que tal política instituída por uma lei de 1971 requer observâncias na aplicação desta lei em face dos supervenientes comandos constitucionais e infraconstitucionais a partir a entrada em vigor da Constituição Federal de 1988.

O artigo 3º da referida lei atenua que a cooperativa denota de uma estrutura de prestação de serviços por parte dos associados sem objetivo de lucro: “[...] celebram contrato de sociedade cooperativa as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir com bens ou serviços para o exercício de uma atividade econômica, de proveito comum, sem objetivo de lucro.” (BRASIL, 1971, online)

O art. 4º da Lei 5.764/71 elenca outras características dentre as quais encontram-se disposições capazes de distinguir sociedade cooperativa das demais, dentre as quais algumas já abordadas acima, mas citando abaixo na íntegra a redação do referido dispositivo legal:

Art. 4º As cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas a falência, constituídas para prestar serviços aos associados, distinguindo-se das demais sociedades pelas seguintes características:

I - adesão voluntária, com número ilimitado de associados, salvo impossibilidade técnica de prestação de serviços;

II - variabilidade do capital social representado por quotas-partes;

III - limitação do número de quotas-partes do capital para cada associado, facultado, porém, o estabelecimento de critérios de proporcionalidade, se assim for mais adequado para o cumprimento dos objetivos sociais;

IV - incessibilidade das quotas-partes do capital a terceiros, estranhos à sociedade;

V - singularidade de voto, podendo as cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas, com exceção das que exerçam atividade de crédito, optar pelo critério da proporcionalidade;

VI - quorum para o funcionamento e deliberação da Assembléia Geral baseado no número de associados e não no capital;

VII - retorno das sobras líquidas do exercício, proporcionalmente às operações realizadas pelo associado, salvo deliberação em contrário da Assembléia Geral;

VIII - indivisibilidade dos fundos de Reserva e de Assistência Técnica Educacional e Social;

IX - neutralidade política e indiscriminação religiosa, racial e social;

X - prestação de assistência aos associados, e, quando previsto nos estatutos, aos empregados da cooperativa;

XI - área de admissão de associados limitada às possibilidades de reunião, controle, operações e prestação de serviços. (BRASIL, 1971, online)

Com isso tem-se que para que se institua uma cooperativa é imperativo que as características elencadas sejam cumpridas, sob pena de descaracterização como cooperativa pela Política Nacional de Cooperativismo.

A Lei 5.764/71 explicita em seu art. 5º a amplitude da cooperativa, sendo que não impede nenhum ramo de serviço para a sua instituição:

Art. 5º. As sociedades cooperativas poderão adotar por objeto qualquer gênero de serviço, operação ou atividade, assegurando-se-lhes o direito exclusivo e exigindo-se-lhes a obrigação do uso da expressão "cooperativa" em sua denominação. (BRASIL, 1971, online).

Tem-se ainda definido pela Lei supracitada a inexistência de vínculo empregatício entre os membros o que acarreta a não incidência de subordinação entre si, o que existe é um regime de colaboração, como está descrito no artigo 90 da Lei 5.764/74 ao dispor que “[q]ualquer que seja o tipo de cooperativa, não existe vínculo empregatício entre ela e seus associados. (BRASIL, 1971, online).

Feita a análise sobre algumas normas relativas ao cooperativismo no Brasil, verifica-se que o cooperativismo almeja equilibrar a sociedade no seu aspecto tanto social e quanto economicamente. Dentre os diversos ramos de atividades organizáveis por meio de cooperativas, verifica-se como abordagem pertinente ao objeto de estudo desta monografia a análise sobre a cooperativa de trabalho tendo em vista a verificação de sua hipótese de constituição para os profissionais do sexo.

5.3. Cooperativa de trabalho e sua hipótese para os profissionais do sexo

Esse ramo de cooperativas encontra-se atualmente regulamentado pela Lei 12.690, de 19 de julho de 2012, que, dentre outras providências, “[d]ispõe sobre a organização e o funcionamento das Cooperativas de Trabalho [...]” (BRASIL, 2012, online). Além disso, segundo dispõe o seu art. 1º, “[a] Cooperativa de Trabalho é regulada por esta Lei e, no que com ela não colidir, pelas Leis nos 5.764, de 16 de dezembro de 1971, e 10.406, de 10 de janeiro de 2002 -Código Civil. ” (BRASIL, 2012, online).

Gustavo Filipe Barbosa Garcia demonstra característica basilar na constituição de uma cooperativa de trabalho:

[...] a verdadeira cooperativa de trabalho deve ser criada e formada por profissionais autônomos, que exerçam a mesma profissão, unindo esforços para obter vantagens ao próprio empreendimento, prestando serviços sem nenhuma intermediação nem subordinação (seja perante terceiros, seja em face da cooperativa). (GARCIA, 2012, p.78)

O artigo 2º da Lei 12.690/12 explicita que a cooperativa de trabalho é aquela que os associados têm como finalidade principal a melhoria de salários e condições de trabalho pessoal, dispensando a intervenção de um patrão ou empresários:

Art. 2o Considera-se Cooperativa de Trabalho a sociedade constituída por trabalhadores para o exercício de suas atividades laborativas ou profissionais com proveito comum, autonomia e autogestão para obterem melhor qualificação, renda, situação socioeconômica e condições gerais de trabalho. (BRASIL, 2012, online).

A nova lei traz em seu artigo 3º os princípios e valores atribuídos a uma cooperativa de trabalho:

Art. 3o A Cooperativa de Trabalho rege-se pelos seguintes princípios e valores: 

I - adesão voluntária e livre; 

II - gestão democrática; 

III - participação econômica dos membros; 

IV - autonomia e independência; 

V - educação, formação e informação; 

VI - intercooperação; 

VII - interesse pela comunidade; 

VIII - preservação dos direitos sociais, do valor social do trabalho e da livre iniciativa; 

IX - não precarização do trabalho; 

X - respeito às decisões de asssembleia [sic], observado o disposto nesta Lei; 

XI - participação na gestão em todos os níveis de decisão de acordo com o previsto em lei e no Estatuto Social. (BRASIL, 2012, online)

O art. 4 da Lei 12.690/12 divide a cooperativa de trabalho em duas sendo elas a cooperativa “de produção” e a “de serviço”, dando as seguintes definições:

Art. 4o A Cooperativa de Trabalho pode ser: 

I - de produção, quando constituída por sócios que contribuem com trabalho para a produção em comum de bens e a cooperativa detém, a qualquer título, os meios de produção; e 

II - de serviço, quando constituída por sócios para a prestação de serviços especializados a terceiros, sem a presença dos pressupostos da relação de emprego. (BRASIL, 2012, online)

No que se refere à cooperativa de serviço faz-se necessário enfatizar essa regra de que esta espécie de cooperativa não deve ter a presença dos pressupostos para configuração de relação de emprego, pois a presença de tais pressupostos para os profissionais do sexo incidiria inequivocamente no art. 230 do Cód. Penal, uma vez que é proibido tirar proveito da prostituição alheia.

A Lei de Cooperativas de Trabalho, traz especificações para sua constituição que buscam estabelecer veridicidade nas cooperativas, visando evitar delitos e fraudes, elementos como a autonomia e autogestão, elencados no art. 2º da Lei 12.690/12, e essas especificações tornam a cooperativa de trabalho possível de compatibilização com a atividade exercida pelo profissional do sexo, sendo possível uma interpretação jurídica capaz de não enquadrar tal cooperativa às tipificações impostas pelo Código Penal sobre atividades relacionadas a prostituição.

De certo modo, é possível afirmar que a CBO acaba exercendo uma função de integrar as ocupações em políticas públicas que almejam melhores condições trabalhistas, o que está em consonância com a cooperativa de trabalho, que almeja melhores condições de higiene, segurança, saúde, e direitos sociais etc. Daí, agregando a inserção dos profissionais do sexo na CBO através do seu código “5198-05” (BRASIL, MTE, 2010, p. 809, grifo do autor) com o conceito e princípios da cooperativa de trabalho previstos na legislação vigente, tem-se reforçada a linha de entendimento capaz de confirmar a hipótese de enquadramento tipo de profissional nessa forma de cooperativa.

O artigo 4º da Lei 12.690.12, traz duas espécies de cooperativas de trabalho sendo a “de produção” e a “de serviço” (BRASIL, 2012, online), sendo que para o profissional do sexo torna-se inaplicável a sua organização sob a espécie de cooperativa de produção, uma vez que a atividade básica de tal tipo de profissional não corresponde em produzir bens e a cooperativa também não pode ser detentora de todos os meios de produção, pois de tal modo a prática esteja possível de ser interpretada na configuração criminal “tirar proveito da prostituição alheia” (BRASIL, 1940, online). Com isso, é possível entender no sentido de que a espécie de cooperativa de trabalho com maior possibilidade de interpretação como adequável para o profissional do sexo seria a cooperativa de serviço, desde que a prestação da atividade profissional se dê de maneira que corretamente não se configure em vínculo empregatício.

A lei 12.690/12 possui em seu artigo 7º o rol de direitos básicos garantidos ao associado de uma cooperativa de trabalho:

Art. 7o A Cooperativa de Trabalho deve garantir aos sócios os seguintes direitos, além de outros que a Assembleia Geral venha a instituir: 

I - retiradas não inferiores ao piso da categoria profissional e, na ausência deste, não inferiores ao salário mínimo, calculadas de forma proporcional às horas trabalhadas ou às atividades desenvolvidas; 

II - duração do trabalho normal não superior a 8 (oito) horas diárias e 44 (quarenta e quatro) horas semanais, exceto quando a atividade, por sua natureza, demandar a prestação de trabalho por meio de plantões ou escalas, facultada a compensação de horários; 

III - repouso semanal remunerado, preferencialmente aos domingos; 

IV - repouso anual remunerado; 

V - retirada para o trabalho noturno superior à do diurno; 

VI - adicional sobre a retirada para as atividades insalubres ou perigosas; 

VII - seguro de acidente de trabalho. (BRASIL, 2012, online).

O artigo 8º da Lei 12.690/12 traz ainda obrigações sanitárias e de segurança do trabalho ao dispor que “[a]s Cooperativas de Trabalho devem observar as normas de saúde e segurança do trabalho previstas na legislação em vigor e em atos normativos expedidos pelas autoridades competentes.” (BRASIL, 2012, online)

Cabe ainda ressaltar que é de competência do Estado a fiscalização e o cumprimento desta Lei, mais especificamente do Ministério do Trabalho e Emprego, como se encontra citado no artigo 17 da Lei 12.690/12: “Art. 17.  Cabe ao Ministério do Trabalho e Emprego, no âmbito de sua competência, a fiscalização do cumprimento do disposto nesta Lei.” (BRASIL, 2012, online).

De acordo com o vem sendo abordado em outros itens desta monografia, compreende-se que os profissionais do sexo, em sua grande parte, carecem de inclusão social e de um mínimo de dignidade na profissão. Daí, feita a análise dos artigos 7º e 8º da Lei 12.690/12, que asseguram direitos trabalhistas fundamentais e de proteção para o associado, fica implícito que esses direitos abrandariam a marginalização dos profissionais do sexo e eles teriam melhor escopo social.

A sistemática da cooperativa de trabalho exerceria uma função de instrumento, previamente existente no ordenamento jurídico, capaz de viabilizar melhor inclusão social aos profissionais do sexo, com os direitos básicos arrolados pelo art. 7º da Lei 12.690/12, bem como as obrigações sanitárias e de segurança do trabalho na forma de seu arti. 8º, concederiam um mínimo de dignidade humana a essas pessoas.

Assim como na Lei 5.764/74, a Lei das cooperativas de trabalho (12.690/12) explicita o que é livre a adoção de qualquer gênero de serviço como objeto social da Cooperativa de Trabalho: Art. 10º A Cooperativa de Trabalho poderá adotar por objeto social qualquer gênero de serviço, operação ou atividade, desde que previsto no seu Estatuto Social. (BRASIL, 2012, online).

O artigo 10 da Lei 12.690 traz ainda em seu § 3º a limitação na admissão de associados: “[a] admissão de sócios na cooperativa estará limitada consoante as possibilidades de reunião, abrangência das operações, controle e prestação de serviços e congruente com o objeto estatuído.” (BRASIL, 2012, online).

O sistema de cooperativa delimita expressamente a forma de adimplemento da função do associado, em seu artigo 13 da Lei 12.690/12:

Art. 13.  É vedado à Cooperativa de Trabalho distribuir verbas de qualquer natureza entre os sócios, exceto a retirada devida em razão do exercício de sua atividade como sócio ou retribuição por conta de reembolso de despesas comprovadamente realizadas em proveito da Cooperativa. (BRASIL, 2012, online).

O artigo 14 da Lei 12.690/12 deixa expresso ainda a obrigação dos associados de anualmente deliberarem em Assembleia Geral Ordinária sobre as retiradas dos associados:

Art. 14.  A Cooperativa de Trabalho deverá deliberar, anualmente, na Assembleia Geral Ordinária, sobre a adoção ou não de diferentes faixas de retirada dos sócios. 

Parágrafo único.  No caso de fixação de faixas de retirada, a diferença entre as de maior e as de menor valor deverá ser fixada na Assembleia. (BRASIL, 2012, online).

Ponto crucial na Lei 12.690/12 é a inserção do PRONACOOP, que é o Programa Nacional de Fomento as Cooperativas de Trabalho, estando textualizado no artigo 19 da Lei 12.690/12:

Art. 19.  É instituído, no âmbito do Ministério do Trabalho e Emprego, o Programa Nacional de Fomento às Cooperativas de Trabalho - PRONACOOP, com a finalidade de promover o desenvolvimento e a melhoria do desempenho econômico e social da Cooperativa de Trabalho. (BRASIL, 2012, online).

O parágrafo único do artigo 19 da Lei 12.690/12 elenca a finalidade do PRONACOOP:

O Pronacoop tem como finalidade apoiar:

I - a produção de diagnóstico e plano de desenvolvimento institucional para as Cooperativas de Trabalho dele participantes;

II - a realização de acompanhamento técnico visando ao fortalecimento financeiro, de gestão, de organização do processo produtivo ou de trabalho, bem como à qualificação dos recursos humanos;

III - a viabilização de linhas de crédito;

IV - o acesso a mercados e à comercialização da produção;

V - o fortalecimento institucional, a educação cooperativista e a constituição de cooperativas centrais, federações e confederações de cooperativas;

VI - outras ações que venham a ser definidas por seu Comitê Gestor no cumprimento da finalidade estabelecida no caput deste artigo. (BRASIL, 2012, online).

O Estado através destas medidas busca fomentar o sistema de cooperativas, Pereira e Silva fazem uma ponderação geral sobre a Lei 12.690/12:

Como visto, a nova Lei de Cooperativas de Trabalho no Brasil surge com dois objetivos. Primeiro, desestimular a criação e consolidar a punição das falsas cooperativas. Segundo, apoiar a constituição e o fortalecimento de cooperativas de trabalhadores desejosos em melhorar suas condições de vida. Nesse sentido, ela se apresenta, ao mesmo tempo, como um novo instrumento de combate à precarização dos postos de trabalho; e como um passo importante para a construção de um ambiente institucional mais favorável ao exercício do trabalho segundo bases associativas. (PEREIRA e SILVA, 2012, p.72)

Analisado o sistema de cooperativas e demonstrando o sistema de cooperativa de trabalho de serviços, conclui-se que o Estado deve fomentar a abertura de cooperativas, e é visto ainda que o objeto social é livre desde que não seja serviço ilícito e que mesmo que exista a finalidade não é a obtenção de lucro mais a melhoria de condições laborais para o associado.

O sistema de cooperativas de trabalho se encontra no ordenamento jurídico brasileiro como já observado, a Constituição Federal respalda e tem como dever fomentar a constituição de novas cooperativas, a obrigação de estimulo de cooperativismo se encontra no art. 174 §2º da CF/88:

Art. 174. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este determinante para o setor público e indicativo para o setor privado.

§ 2º A lei apoiará e estimulará o cooperativismo e outras formas de associativismo. (BRASIL, 1988, online, grifo nosso)

Com esse posicionamento de estímulo e incentivo do governo na constituição de cooperativas, uma vez tentada a constituição de cooperativa para o profissional do sexo o Estado deveria não só apoiar como incentivar, ressaltando que, pelo foco da presente monografia, tal incentivo é no sentido de buscar inclusão social e dignidade para aqueles profissionais que se encontram prostituindo-se em condições e ambientes de marginalidade e de exclusão social.

É preciso esclarecer que a prostituição é licita no ordenamento Brasileiro. Porém as relações associadas à prostituição são crimes, como já visto no item 2.1 da presente monografia, taxados no capítulo V Código Penal brasileiro.

Com isso se faz necessário respeitar o Código Penal, o que condiciona o trabalho sexual a determinado enquadramento para a constituição de cooperativa. Os artigos que influem no condicionamento do enquadramento do trabalho sexual são respectivamente os artigos 228, 229 e 230 do Código Penal.

Assim, o art. 228 do Código Penal possui o seguinte texto normativo: “[i]nduzir ou atrair alguém à prostituição ou outra forma de exploração sexual, facilitá-la, impedir ou dificultar que alguém a abandone: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) [...]”. (BRASIL, 1940, online)

Daí, lexicamente pode ocorrer uma confusão com a disposição do art. 170, § 2º da CF que diz: “[a] lei apoiará e estimulará o cooperativismo [...]”. (BRASIL, 1988, online), uma vez que o art. 228 do CP, diz que é crime aspectos que incentivem a prostituição, porém é necessário esclarecer que o incentivo do Estado seria para a constituição da cooperativa para profissional do sexo e não para a prostituição. Sendo necessário ressaltar que a intenção é retirar essas pessoas da marginalização, dando-lhes condições básicas de subsistência digna.

Quanto ao artigo 229 do CP, que diz: “Manter, por conta própria ou de terceiro, estabelecimento em que ocorra exploração sexual, haja, ou não, intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente: (Redação dada pela Lei nº 12.015, de 2009) [...]”. (BRASIL, 1940, online), este artigo traz explicito em texto que para a tipificação penal é necessária que a atividade sexual ocorra por exploração, tendo então que enquadrar a cooperativa do profissional do sexo como serviço – e não exploração – que evade os pressupostos da relação de emprego como decorre no art. 4º, inciso II, da Lei 12.690/12:

Art. 4o A Cooperativa de Trabalho pode ser: 

[...]

II - de serviço, quando constituída por sócios para a prestação de serviços especializados a terceiros, sem a presença dos pressupostos da relação de emprego. (BRASIL, 2012, online)

Deve-se mencionar ainda que a Lei 12.690/12 exige que não exista distribuição de verbas entre os associados, sendo permitida apenas a retirada devida em contraprestação do serviço prestado, o que excluiria o fator “exploração sexual”:

Art. 13.  É vedado à Cooperativa de Trabalho distribuir verbas de qualquer natureza entre os sócios, exceto a retirada devida em razão do exercício de sua atividade como sócio ou retribuição por conta de reembolso de despesas comprovadamente realizadas em proveito da Cooperativa. (BRASIL, 2012, online).

O artigo 13 da Lei 12.690/12 deixa claro também que as cooperativas se esquivam do art. 230 que trata do crime de Rufianismo: “Tirar proveito da prostituição alheia, participando diretamente de seus lucros ou fazendo-se sustentar, no todo ou em parte, por quem a exerça [...]” (BRASIL, 1940, online), uma vez que cada sócio da cooperativa retira o devido em razão do exercício de seu trabalho.

Dito isso os profissionais do sexo se organizando e cumprindo as exigências legais para a constituição de cooperativa de trabalho de serviço, supostamente não deveriam ser impedidos, sendo que a liberdade de associação é um princípio fundamental de nossa Constituição em seu art. 5º inciso XVII: “[...] é plena a liberdade de associação para fins lícitos, vedada a de caráter paramilitar [...]” (BRASIL, 1988, online).

6. CONCLUSÃO

Consubstanciado pela licitude da profissão sexual, pela função do Estado na inclusão social, pela análise doutrinária e jurisprudencial do que foi abordado, é demonstrado que a possibilidade jurídica de constituição de cooperativa de serviço não está plenamente descartada para o profissional do sexo. Porém, a licitude de sua constituição ainda possui riscos na sua interpretação jurídica, principalmente no âmbito criminal.

Evidenciado o problema social existente perante o profissional do sexo, o Estado precisa buscar ou viabilizar medidas para efetiva inclusão social dessas pessoas, sendo o sistema de cooperativas de serviço um instrumento de inclusão social eficaz, uma vez que possui características e condições pertinentes ao profissional do sexo, que garantem direitos fundamentais ao associado.

As análises dos elementos da presente monografia levam a conclusão que hipoteticamente, no plano teórico, os profissionais do sexo possuem condições jurídicas de constituir cooperativa de trabalho de serviço, visando melhores condições de vida, e amparados pelos direitos humanos e os princípios constitucionais, e as leis de cooperativas vigentes.

A presente monografia demonstra uma linha de entendimento no sentido de que as cooperativas trabalho de serviço para profissionais do sexo – embora ainda haja riscos de interpretação jurídica predominar-se no sentido de ainda compreendê-las como ilícitas – são possíveis de não se configurarem dos crimes relacionados à prostituição elencados no Código Penal, uma vez que, a princípio, não buscam incentivar a prostituição nem dificultar sua saída, como descrito no art. 228 do CP, tampouco incide também no art. 229 do CP, que diz respeito a manter casa de prostituição onde ocorra exploração sexual, visto que o referido modelo de cooperativa paga aos sócios individualmente na proporção de seus serviços prestados, forma de pagamento essa juntamente com a condição autônoma concedida por esse sistema de cooperativa além do fato das condições de igualdade dos membros da associação dão a entender pelo afastamento do delito de rufianismo do art. 230 do CP.

A prostituição é um fenômeno social, entretanto os tipos penais relacionados a prostituição não são agraciados pelo princípio da fragmentaridade e da adequação social, segundo o STF, mesmo que a prostituição seja parte dos costumes aceitos pela sociedade, pois eles não são suficientes para revogar a Lei penal, o que em algumas situações o acaba por aumentar a dificuldade de efetivação de direitos fundamentais do profissional do sexo, dos princípios constitucionais que primam pela proteção dos direitos humanos, e assim viabilizando o grave fomento da marginalização dessas pessoas.

Quando buscado o conceito de prostituição ficou concluso que é um conceito mutável, que varia culturalmente e socialmente, sendo um fenômeno social recorrente. A prostituição se estabelece como um problema social, visto que os profissionais do sexo são pessoas marginalizadas em sua grande parcela.

A prostituição em suma é considerada profissão provisória, onde seu estabelecimento decorre de condições econômicas e sociais, como a pobreza e o desemprego.

Fica demonstrado nos três principais sistemas jurídicos existentes no mundo como eles definem a maneira que o país responde a prostituição, sendo eles os sistemas proibicionista, regulamentarista e abolicionista.

O Brasil se enquadra no sistema abolicionista, sendo que este opta por descriminalizar a prostituição estabelecendo o profissional do sexo como uma vítima a ser reintegrada a sociedade, criminalizando as atividades relacionadas à prostituição.

Apesar da intenção deste sistema ser a proteção do ser humano, fica evidente que acaba por não atender sua função social na atualidade, visto que os prestadores de serviços sexuais, em sua grande parcela, são pessoas marginalizadas e pouco integradas na sociedade, sendo plausível uma reanálise do melhor sistema jurídico a ser seguido.

Abordados os aspectos penais a respeito da prostituição no Brasil, fica claro que a prostituição não é penalmente ilícita, afastando o erro de se considerar a prostituição como crime, e demonstrando os principais crimes que estão relacionados à prostituição.

O trabalho demonstra que existem algumas medidas sendo estabelecidas para a inclusão social dos profissionais do sexo, um exemplo é a inclusão da prostituição pelo Ministério do Trabalho na Classificação Brasileira de Ocupações CBO, e com isso facilitando burocraticamente a essas pessoas de se tornarem contribuintes previdenciários.

A presente monografia aponta para o sentido de haver obrigação do Estado em apoiar o cooperativismo, explicitando que o objeto social é livre, desde que não seja ilícito, como no caso da prostituição.

O objetivo de uma cooperativa de trabalho consiste no da melhoria de condições do exercício profissional para o associado, o que para um prestador de serviços sexuais se faz necessário, já que tais profissionais são pessoas, em sua grande parte, que exercem tais serviços de maneira que ficam expostas a ambientes sem condições sanitárias e de higiene devidamente adequadas, condições e ambientes propensos a riscos de sofrerem violências de quaisquer espécies, riscos à saúde, e também excluídas da percepção de direitos sociais básicos, os quais são viabilizados aos associados de uma cooperativa de trabalho.

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1 Texto no idioma original: “Advocates of decriminalization argue that the health of those in prostitution will be improved by decriminalization because otherwise women will not have access to health care. It is assumed that women will seek health care as soon as the stigma of arrest is removed from prostitution. If the stigma is removed, advocates argue, women will then file a complaint whenever they are abused, raped, or assaulted in prostitution. They assume that the complaint will be followed with a police response that treats women in prostitution with dignity and as ordinary citizens. Unfortunately, health care workers and police too often share the same contempt toward those in prostitution that others do.” (FARLEY, 2004, p. 1093).


Publicado por: CARLOS YVANHOE BRAGA MOURA

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