Aposentadoria Especial do Servidor Público
RESUMO
A Seguridade Social passou por inúmeras crises estruturais desde o final da década de 1970, em razão da existência de desequilíbrios dos gastos públicos em consequência do financiamento dos benefícios sociais, mormente aqueles que garantem a proteção dos desassistidos, sem que houvesse a contrapartida da fonte de custeio, que abrange tanto as despesas com os benefícios previdenciários quanto o financiamento de gastos da saúde. O regime próprio dos servidores públicos tem caráter contributivo e deve observar critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial dos benefícios. Com a alteração do caput do artigo 40 da Constituição Federal pela Emenda Constitucional n. 41, passou a figurar a exigibilidade legal do princípio da contributividade, com regime de financiamento misto (repartição e capitalização) para assegurar critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial. A emenda constitucional n. 41/2003 atingiu de forma visceral os servidores pertencentes ao Regime Próprio de Previdência Social. A referida emenda continuou as alterações implementadas pela emenda constitucional n. 20/98, porém inovou ao tentar igualar as regras da concessão dos benefícios dos servidores públicos aos segurados do regime geral.
Palavras-Chave: Aposentadoria Especial. Servidor Público. Direito Previdenciário. Regime Próprio da Previdência.
ABSTRACT
Social Securityhas gone through numerous structural crises since the late 1970s, due to the existence of imbalances in public spending due to the financing of social benefits, especially those that guarantee the protection of the disadvantaged, with no consideration for the source funding, which covers expenditure on social security benefits and the financing of health spending. The particular system of public servants have contributory character and must observe criteria to preserve the financial and actuarial balance of benefits. By changing the heading of article 40 of the Federal Constitution by Constitutional Amendment 41, was renumbered the law of the principle of liability to pay, with joint funding scheme (allocation and capitalization) criteria to ensure that preserve the financial and actuarial balance. The constitutional amendment No 41/2003 reached the visceral form of the servers belonging to the Special Social Security. The amendment continued the changes implemented by Constitutional Amendment 20/98, but broke new ground by trying to match the rules of granting benefits to policyholders of the public servants of the general scheme.
Keywords: Special Retirement. Civil Servants. Social Security Law. Own System Security.
SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO.. 8
2. SEGURIDADE SOCIAL.. 10
2.1. Conceitos. 10
2.2. Princípios fundamentais informadores da Seguridade Social12
2.3. Sistema jurídico de Previdência Social no Brasil13
3. O REGIME PRÓPRIO DO SERVIDOR PÚBLICO.. 16
3.1. Histórico. 16
3.2. Emendas Constitucionais. 19
3.2.1. Diversidade de Regras, Princípios Constitucionais, Emendas e Posicionamento do STF 22
3.3. Principais Polêmicas. 23
3.3.1. Emenda 20/98. 24
3.3.2. Emenda 41/03. 27
4. APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO.. 35
4.1. Conceitos. 35
4.2. Aposentadoria Especial do Servidor sob o Regime Celetista. 36
4.3. Da falta de Regulamentação da Aposentadoria Especial do Servidor Público. 38
4.3.1. Instrução Normativa 01, de 22.07.2010. 42
4.4. Aposentadoria do Professor46
4.5. Aposentadoria Especial dos Policiais Civis. 51
5. CONCLUSÃO.. 55
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.. 59
1. INTRODUÇÃO
Antes da Emenda Constitucional n. 41/2003, os servidores públicos se aposentavam com proventos no mínimo iguais aos de seus vencimentos na atividade, enquanto os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, além de estarem sujeitos a um teto previdenciário, instituído pelo Poder Executivo, possuíam regras de cálculo que acarretava invariavelmente um valor inferior ao do último salário-de-contribuição do segurado. Assim, enquanto a contribuição dos servidores incidia sobre o total de sua remuneração, a contribuição dos segurados do RGPS encontrava-se sujeita ao teto previdenciário.
A diversidade de regras existentes entre os segurados do RGPS e os servidores públicos do RPPS é lesiva ao princípio da isonomia e indicativa de privilégios para os servidores; entretanto, é possível de ser defendida como instrumento de proteção do próprio Estado e da sociedade, na medida em que permite aos servidores exercerem suas funções com maior autonomia, sem se sujeitarem a pressões decorrentes da preocupação em complementar sua aposentadoria. Ressalte-se que o regime jurídico dos servidores públicos consagra restrições quanto ao exercício de outras atividades, seja no próprio serviço público (regras de acumulação), seja na iniciativa privada (exercício de atividade comercial), e, além disso, impõe um regime disciplinar específico. Os servidores públicos, por sua vez, constituem um elemento humano indispensável à instituição de políticas públicas, ao exercício de atividades típicas de Estado (como fiscalização e arrecadação) e à própria construção de um Estado Social.
As atividades do Estado e os fins que ele deve atingir demandam a atuação, imprescindível, de seus servidores, muitos dos quais exercem funções que não aconselham a aplicação das mesmas normas referentes ao setor privado para disciplinar seu relacionamento com o poder público, até mesmo no que toca a seus direitos previdenciários.
A Constituição Federal, em seu artigo 247, acrescentado pela Emenda Constitucional n. 19/98, refere-se à necessidade de se estabelecerem, por lei, critérios e garantias especiais para a perda do cargo pelo servidor público estável que, em decorrência das atribuições de seu cargo efetivo, desenvolva atividades típicas de Estado. Portanto, existe previsão constitucional de servidores que exercem atividades típicas de Estado e outros que não exigem a importância das atribuições dos primeiros devido a normas diferenciadas.
A Emenda Constitucional n. 20/98, que alterou o artigo 40 da Constituição originária, traçou, pela primeira vez, normas atinentes à previdência dos servidores públicos de todas as esferas de governo. Antes desta emenda não existia um corpo orgânico e uniforme de regras referentes à matéria. De qualquer modo, diversos mandados de injunção junto ao STF, bem como da aplicação que vem sendo feita das regras do regime geral do INSS em relação aos estatutários pelo Supremo Tribunal Federal, em vista da omissão do poder legislativo (falta de lei complementar regulamentando a matéria) para os regimes próprios.
2. SEGURIDADE SOCIAL
2.1. Conceitos
Como expressão sociológica, a Seguridade Social organiza-se como um sistema que engloba princípios, valores e objetivos políticos, econômicos e sociais que estão atrelados à organização de direitos, prestações, financiamentos e gestão de proteção social, gerido, organizado pelo Estado, direta ou indiretamente, objetivando a cobertura de riscos ou contingências sociais que possam atingir os indivíduos.
Hodiernamente, é tarefa árdua definir com precisão o que é Seguridade Social.Além disso, não é possível chegar-se a uma definição única que sirva a todos os ordenamentos jurídicos, pois são distintos os princípios políticos e jurídicos e as condições econômicas e sociais que determinam a eleição dentre os vários sistemas de seguridade.
O caráter fundamental da Seguridade Social é sua original questão ética, o princípio da obrigação universal de garantir a todo ser humano a tutela contra as conseqüências danosas que derivam dos eventos da vida individual, familiar e coletiva (BALERA, 2002).
A doutrina moderna adota uma concepção distributiva da Seguridade Social. Para essa corrente, o fundamento do direito à Seguridade Social não se baseia no exercício de atividade profissional e na contribuição de cada indivíduo para o sistema, mas se encontra nas necessidades dos indivíduos, levando-se em conta a existência de solidariedade entre os membros da mesma coletividade (BALERA, 2002).
A solidariedade surge a partir das necessidades vitais dos indivíduos, que passam a ser garantidas pelo Estado,pois, em última análise, a instabilidade social que poderá advir do não-atendimento de tais garantias essenciais poderá acarretar sérios danos para a sociedade, haja vista que o dano sofrido por um membro da sociedade reflete-se, de modo inexorável, em toda a sociedade (BALERA, 2002).
De acordo com o magistério de Celso Barroso Leite, “as necessidades essenciais de cada indivíduo, a que a sociedade deve atender, tornam-se, na realidade, necessidades sociais, pois, quando não são atendidas, repercutem sobre os demais indivíduos e sobre a sociedade inteira” (BALERA, 2002, p.20). Deve-se, portanto, assegurar melhor repartição das rendas em função das necessidades de cada indivíduo. O novo conceito de Seguridade Social caracteriza-se pela garantia do mínimo vital para a vida em sociedade.
No entanto, a nova definição de Seguridade Social, expressa no artigo 194 da Constituição Federal de 1988, desprende-se da idéia referente exclusivamente à renda profissional (atividade laboral), orientando-se, ao revés, pela via complementar das necessidades humanas básicas aferidas em virtude da sociedade em que vivem os sujeitos a serem tutelados pela Seguridade Social. Em relação a essa nova definição, Celso Barroso Leite apud Balera (2002, p.17) ensina que,
[...] a Seguridade Social deve ser entendida e conceituada como o conjunto das medidas com as quais o Estado, agente da sociedade, procura atender à necessidade que o ser humano tem de segurança na adversidade, de tranqüilidade quanto ao dia de amanhã.
A Seguridade Social foi introduzida no ordenamento jurídico pátrio vigente por meio da Constituição Federal de 1988, disciplinada no artigo 193 do Capítulo II, do Título VII (“Da Ordem Social”), que preceitua: “A ordem social tem como base o primado do trabalho e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais”.
Esse artigo é norteador de todo o sistema protetor social, que está intimamente ligado ao artigo 1º, inciso IV, da Carta Fundamental, cujo dispositivo enuncia como fundamentos da República Federativa do Brasil “os valores sociais do trabalho”, que são, segundo o professor Wagner Balera (1989, p.32), a “chave interpretativa para toda a Seguridade Social”.
Já no Título II, “Dos Direitos e Garantias Fundamentais”, a ordem social forma “o núcleo substancial do regime democrático instituído”, frente à importância dada pela Constituição Federal à ordem social, conforme lições de José Afonso da Silva (1999, p. 802).
2.2. Princípios fundamentais informadores da Seguridade Social
Os princípios têm origem análoga aos usos e costumes. Cristalizados pela legislação, corporificados pela doutrina e acolhidos pela jurisprudência, funcionam como fontes inspiradoras do direito. A maioria dos princípios previdenciários possui os fundamentos do seguro social. Dessa maneira, revelam-se as bases da Previdência Social. Mesmo diante da positivação da norma jurídica, os princípios são freqüentemente invocados, pois se impuseram como noção necessária à compreensão do fenômeno jurídico, em razão das regras jurídicas que não normatizaram todas as situações, advindo daí a relevância de diretrizes superiores incorporadas pelos princípios.
Os princípios não se confundem com votos de intenções. Antes, são normas formais, positivadas com efetividade, uma espécie de norma jurídica. Cada princípio tem uma função e um campo de atuação específico possuindo eficácia, o que é fundamental para a sua sobrevivência e deve ser empregado na interpretação do direito previdenciário. Conforme o tipo e sua aplicação, os princípios são diversificados. Para Martinez (1995),o princípio fundamental é o da solidariedade social. Existem, ainda, os princípios básicos que servem como orientadores para a elaboração da norma, os técnicos, os aplicadores e, por último, os interpretativos, aqueles obrigados a entender a norma.
Os princípios são de grande relevância, uma vez que, informadores da ciência jurídica, podem ser considerados regras aplicáveis ao ordenamento. Em alguns casos, o ordenamento está em consonância com a realidade e, em outros, contraria o objeto da ciência jurídica. Assim, os princípios estão consagrados em normas expressas, explícitas ou implícitas– tendo, por si só, aplicação orientadora da norma jurídica (FARIAS, 1996, p. 27).
Assim, os princípios constitucionais fundamentais devem ser considerados como fonte informadora do legislador e apresentam-se como norma jurídica ao aplicador da lei. Caso possuam características técnicas, devem ser aplicados com força de norma jurídica, pois os princípios técnicos são verdadeiras regras jurídicas a serem aproveitadas na execução, na integração e na interpretação do direito.
2.3. Sistema jurídico de Previdência Social no Brasil
O sistema jurídico constitucional de Previdência Social no Brasil comporta duas divisões: o público e o privado (BALERA, 2003, p. 18).O sistema público de previdência está previsto nos artigos 40 e 201 da Constituição Federal, e se diferencia do privado, previsto no artigo 202 do mesmo diploma legal, por seu caráter institucional (não-contratual), de filiação compulsória e financiamento mediante contribuições sociais e recursos orçamentários.
A Carta Maior consagra no capítulo “Da Ordem Social” dois modelos públicos: o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), que congrega todos os trabalhadores da iniciativa privada e é gerido pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), e o Regime Próprio dos Servidores Públicos (RPSP), organizado e gerido por cada uma das entidades estatais (União, estados, distrito federal e municípios), que reúne servidores que exercem ou já exerceram cargos públicos efetivos (MODESTO, 2004, p.108-110).
O artigo 202 dispõe do regime privado supletivo de previdência, denominado “previdência privada”, que, apesar de seu caráter privado, também integra o sistema de Seguridade Social. Conforme traçado na Constituição Federal, o sistema de previdência privada tem caráter complementar e facultativo e deve se organizar de forma autônoma em relação ao Regime Geral de Previdência Social. Esse tipo de sistema se baseia na constituição de reservas que garantam o benefício contratado e regulado por lei complementar. O professor Wagner Balera (2002, p. 61) enfatiza:
Integram o quadro de componentes do Sistema de Seguridade Social brasileiro os entes de previdência privada. Servem, os entes supletivos, como estruturas de expansão do arcabouço de proteção, formando, como já se costuma dizer em França, segunda rede de seguridade social, em estreita colaboração com o Poder Público, no interior do aparato do bem-estar. Mas não perdem os traços característicos que são peculiares às pessoas privadas.
Por fim, o artigo 203 e o artigo 6º da Constituição Federal enunciam:
Art. 203 – A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice; II – o amparo às crianças e adolescentes carentes; III – a promoção da integração do mercado de trabalho; IV – a habilitação e a reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária; V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.
Art. 6º: São direitos sociais à educação, à saúde, ao trabalho, à moradia, ao lazer, à segurança, à Previdência Social, à proteção à maternidade e à infância, à assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.
A assistência social é prestada a quem precisar, independentemente da contribuição para a seguridade. Assim, só quem a sociedade reconhece como necessitado e desamparado pode utilizar a assistência social.
Conclui-se, de acordo com tal raciocínio, que o sistema de proteção social, expresso na Constituição Federal de 1988, ainda possui características diversas da acepção do Welfare State, pois a garantia do seguro social mediante prévia contribuição e filiação obrigatória seleciona a população; somente podem ter acesso à Previdência Social os indivíduos que contribuírem e se filiarem ao sistema de Seguridade Social. Ademais, as duas dimensões fundamentais do Welfare State são a segurança e a igualdade, que possui o caráter fundamental da universalidade referente aos sujeitos a serem protegidos em relação a todos os riscos sociais passíveis de cobertura.
Wagner Balera (1993, p. 112) afirma que:
Os valores que a relação de Seguridade Social se destina a preservar se expressam no primado do trabalho, no bem-estar e na justiça social. Seguridade Social, em suma, é a concretização do conjunto das relações jurídicas cujo objetivo final se expressa naqueles magnos valores.
A Seguridade Social, no direito brasileiro, é o conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade, destinado a assegurar o direito relativo à saúde, à previdência e à assistência social, tendo como objetivo principal a preservação do primado do trabalho e o alcance do bem-estar e da justiça sociais, garantindo vida digna ao ser humano.
3. O REGIME PRÓPRIO DO SERVIDOR PÚBLICO
3.1. Histórico
A origem do regime previdenciário dos servidores públicos está vinculada à relação de trabalho pró-labore facto, em que a aposentadoria não decorre da contribuição, mas da vinculação de servidor público (SILVA, 2003, p.15-16).
O sistema dos servidores públicos teve início no Império para a proteção gratuita de determinadas categorias funcionais na época que foram instituídos o Montepio do Exército, em 1827, e o Montepio Geral da Economia, em 1935. A partir da Constituição Federal de 1891, o sistema próprio foi aprimorado, mas manteve o financiamento exclusivo pelo Estado, sem participação dos servidores. O artigo 75 da referida Carta Magna foi o primeiro dispositivo constitucional a se referir à proteção social, por meio do pagamento de um benefício. O artigo 75 da Constituição de 1891 dispunha: “A aposentadoria só pode ser dada aos funcionários públicos em caso de invalidez a serviço da nação”.
No período da proclamação da República, aumentou-se a proteção previdenciária do Estado de algumas categorias de servidores públicos civis, sendo contemplados os servidores civis do Ministério da Guerra e do Arsenal da Marinha (Dec. n. 9.212-A, de 26/03/1988), o Fundo de Pensões do Pessoal da Imprensa Nacional (Dec. n. 10.269, de 20/07/1889), a Caixa de Socorros dos Correios em cada uma das Estradas de Ferro do Império (Lei n. 3.397, de 24/11/1988). Também foram contemplados por atos legislativos o Montepio Obrigatório dos Empregados da Fazenda Pública (Dec. n. 942-A, de 31/10/1890) (OLIVEIRA e TEIXEIRA, 1985, p. 19-20).
O servidor público inativo recebe os proventos de aposentadoria do Estado da mesma forma que o servidor na ativa. Ou seja, ao contrário da iniciativa privada que cessa o vínculo com o empregador após a aposentadoria e o INSS assume o pagamento das aposentadorias, o Estado assume duas obrigações: a de pagar o servidor ativo e daquele que passou para a inatividade, com base nas variações salariais.
Importante destacar alguns conceitos do termo serviço público feitos por alguns doutrinadores especialistas em direito do Estado. O professor Celso Antonio Bandeira de Mello (1977, p. 25), em seu artigo “Prestação centralizada e descentralizada de serviços públicos”, aduz:
Serviço público é toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material fruível diretamente pelos administradores, prestada pelo Estado ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de direito público – portanto, consagrador de prerrogativas de supremacia e de restrições especiais –, instituído pelo Estado em favor dos interesses que houver definido como próprios no sistema normativo”. Para o ilustre professor, a “noção de serviço público há de se compor necessariamente de dois elementos: um, material, consistente na prestação de utilidade ou comodidade fruível diretamente pelos administrados, e outro, formal, consistente em um específico regime de direito público, daí a supremacia do interesse público sobre o privado.
Maria Sylvia Zanella Di Pietro (1997, p. 31) reforça a idéia de que o serviço público é atribuído ao Estado, “precisamente por ser uma atividade considerada essencial a coletividade”.
Acresça-se, por último, a doutrina do professor Hely Lopes (1999, p. 294) sobre serviço público, cujo conceito
é todo aquele prestado pela administração ou por seus delegados, sob normas e controle estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado.
As bases desse sistema residem na visão patrimonialista do Estado. As primeiras categorias a se beneficiarem com a Previdência Social foram as que mantinham a base de formação do Estado, ou seja, os militares e os que tinham as funções de administrar, judicar e legislar. Representavam aquelas categorias que estavam mais ligadas ao Estado em sua estrutura patrimonialista, cuja administração nada mais era do que a extensão da vontade do monarca.
Os servidores eram, assim, chamados por servirem ao soberano; seus cargos eram vitalícios, recebiam seus rendimentos diretamente do Estado e, dessa maneira, permaneciam após a inatividade. Com o objetivo de amparar os dependentes dos servidores, foram criados os Montepios e os Institutos de Pensão, cujo pagamento das aposentadorias era custeado pelo Estado.
Na década de 30, já no século XX, várias organizações econômicas passaram a constituir Caixas de Aposentadorias e Pensões que deram origem aos institutos de aposentadorias e pensões de âmbito nacional e que objetivavam sempre o amparo dos trabalhadores e de seus dependentes. Em 1938, foi criado o Instituto de Previdência e Assistência do Estado (IPASE), que unificou os diversos montepios de categorias distintas de servidores públicos federais. Este instituto previa, inicialmente, uma contribuição de 5% para o financiamento de pensões e pecúlios, pois o tesouro nacional financiava, integralmente, a aposentadoria e a assistência médica de todos os servidores da época. Dentre os benefícios cobertos pelo instituto, estavam a aposentadoria ordinária para os servidores que completassem sessenta anos de idade e trinta anos de serviço e a pensão para cônjuge mulher e para o homem inválido maior de 68 anos, sendo proibida a acumulação entre benefícios (SILVA, 2003).
Apesar da unificação de todos os IAPs existentes num único instituto, que foi denominado Instituto Nacional do Seguro Social (INPS), em 1966, pelo Decreto-Lei n. 72, o IPASE continuou a existir, só sendo extinto em 1977, com a criação do SINPAS. Os servidores do IPASE eram vinculados pela Lei n. 1.711, de 28/10/1952, ao regime estatutário.
A partir de 12/07/1960, a Lei n. 3.780 passou a admitir a contratação de servidores pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e criou duas categorias de servidores públicos e, ao mesmo tempo, dois regimes jurídicos para uma mesma categoria de trabalhadores (SILVA, 2003). Essa duplicidade de regimes estava prevista na Constituição Federal de 1967, que previa em seu artigo 104: “Aplica-se à legislação trabalhista aos servidores admitidos temporariamente para obras, ou contratados para funções de natureza técnica ou especializada”.
Com a promulgação da Constituição de 1988, que determinava em seu artigo 39242 a unificação de regimes dos servidores públicos, a União criou o regime unificado, por meio da Lei n. 8.112, de 11 de dezembro de 1990. Dessa forma, os empregados celetistas foram transformados em servidores estatutários e, conseqüentemente, o Estado assumiu o passivo previdenciário dessa categoria de trabalhadores, o que gerou um crescimento gigantesco das despesas de pessoal dos entes públicos conjugado com critérios generosos para concessão de benefícios herdados pelo Regime Jurídico Único (Lei n. 8.112/90) do Regime Estatutário (Lei n. 1.711/52). Cumpre ressaltar, ainda, que os servidores da União eram promovidos quando aposentados e recebiam um acréscimo de 20 a 39 % em seus proventos. Essas distorções, sem dúvida, contribuíram para aumentar as despesas publicas e, conseqüentemente, foram fatores, dentre outros, que provocaram, cumulativamente, o desequilíbrio financeiro e atuarial do regime.
Efetivamente, os servidores públicos da União somente passaram a contribuir para suas aposentadorias e pensões em 1993, quando a Emenda Constitucional n. 3, de 16 de março de 1993, acrescentou o § 6º ao artigo 40 da Constituição originária. Passou a existir, pois, previsão constitucional para a cobrança de contribuições dos servidores para o custeio do regime próprio de previdência com alíquota variante em 9% a 12%, instituída pelo caput do artigo 1º da Lei n. 9.783/99 que regulamentou a contribuição para o custeio da Previdência Social dos servidores públicos, ativos e inativos.
No entanto, a Emenda Constitucional n. 20/98 alterou o previsto no § 6º, artigo 40 da Constituição Federal ao receber nova redação, totalmente diversa da anterior, que manteve o princípio contributivo do sistema, mas fez referência somente “a servidores de cargos efetivos”, abrangendo apenas os servidores em atividade. Sendo assim, o caput do artigo 1º da Lei n. 9.783/99 foi considerado inconstitucional pelo Supremo Tribunal Federal no julgamento da ADIn n. 2.010-2,244 em 12/04/2002, que retirou os termos “e dos inativos e das pensionistas”, modificando o sistema de Previdência Social.
3.2. Emendas Constitucionais
O Regime Próprio de Previdência Social dos servidores públicos da União, dos estados, do distrito federal, dos municípios e dos militares está previsto, essencialmente, no artigo 40 da Constituição de 1988, com nova redação dada pela Emenda Constitucional n. 19, de 04/06/1998, pela Emenda Constitucional n. 20, de 15/12/1998, pela Lei n. 9.717, de 27/11/1998 e pela Emenda Constitucional n. 41/2003, regulamentada pela Lei n. 10.887, de 18/06/2004.
Com a Emenda Constitucional n. 20/1998, foi instituído novo regime jurídico de Previdência Social aos servidores públicos que ingressaram no serviço público após a sua publicação. Desse modo, passou a existir duas situações para o Regime Próprio de Previdência Social: uma para os servidores públicos que ingressaram após a publicação da referida emenda e outra para os servidores públicos que já estavam no sistema antes da emenda, porém esses servidores foram submetidos a regras de transição.
O artigo 40, caput, da Constituição Federal assegura o regime peculiar de Previdência Social apenas aos servidores titulares de cargos efetivos e vitalícios da União, dos estados e do distrito federal. Os regimes próprios de Previdência Social, como já mencionado, passaram a ter caráter contributivo a partir da Emenda Constitucional n. 3/1993.
O sistema de financiamento do regime é a repartição simples que também sebeneficia do princípio da solidariedade. Duas características básicas distanciam o RPPS do RGPS: integralidade e paridade, previstas no artigo 40, §§ 3º, 7º, e 8º, respectivamente, com redação dada pela EC n. 20/1998, anterior, portanto, à EC n. 41/2003.
O critério da integralidade determinava que a base de cálculo da aposentadoria ou pensão por morte deveria ser o valor da última remuneração do servidor em atividade. O critério da paridade determinava que os valores das aposentadorias e pensões do serviço público deveriam ser revistos nas mesmas épocas em que fossem revistas as remunerações dos servidores ativos, bem como deveriam sofrer aumentos de benefícios e vantagens concedidas aos servidores ativos.
A Emenda Constitucional n. 41/2003 deu nova redação ao caput do artigo 40 da Carta Maior quando incluiu o princípio da solidariedade no Regime Próprio de Previdência de servidores públicos ocupantes de cargo efetivo, uma vez que determina que serão responsáveis pelas contribuições vertidas para o sistema: os entes públicos, os servidores ativos, os inativos e seus pensionistas.
Art. 40: “Aos servidores titulares de cargos efetivos da União, dos estados, do distrito federal e dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações, é assegurado regime de previdência de caráter contributivo e solidário, mediante contribuição do respectivo ente público, dos servidores ativos e inativos e dos pensionistas, observados os critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial e o disposto neste artigo” (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 41, de 19/12/2003).
O regime próprio dos servidores públicos prevê, em linhas gerais, os seguintes benefícios constitucionais: aposentadoria por invalidez permanente (art. 40, § 1º, I); aposentadoria compulsória (art. 40, § 1º, II); aposentadoria voluntária (art. 40, § 1º, III, “a ” e “ b”); e pensão por morte (art. 40, § 7), sem prejuízo dos inúmeros benefícios previstos em leis próprias.
A Lei n. 8.112, de 11/12/1990, dispõe sobre o regime jurídico dos servidores públicos civis da União, das autarquias e das fundações públicas federais.
Em síntese: o regime próprio de previdência dos titulares de cargos efetivos civis, antes e depois da Emenda Constitucional n. 41, deve ser caracterizado como um plano de benefício definido e financiado mediante repartição simples, de natureza contributiva, filiação obrigatória e natureza estatutária.
Os regimes próprios de previdência dos titulares de cargos efetivos abrangem tanto a disciplina dos benefícios destinados aos servidores civis quanto a disciplina dos benefícios devidos aos militares. No entanto, após as Emendas Constitucionais n. 20/98 e n. 41/2003, esses dois segmentos dos regimes próprios de previdência foram distanciados, apresentando características diferentes. Conclui-se, então, que a União possui dois sistemas distintos: um para os servidores civis (Lei n. 8.112/91) e um para os militares (Lei n. 6.880/80).
Os militares em atividade não foram afetados por qualquer dessas alterações porque não contribuem para o custeio do regime próprio de aposentadoria, mas apenas para o financiamento das pensões e da assistência médica com alíquotas inferiores às aplicadas pelo regime próprio dos servidores civis. O artigo 42 § 2º, da Constituição Federal foi modificado para evitar que os militares fossem alcançados pelas alterações sofridas pelos servidores civis. Assim, os militares mantiveram o direito à integralidade e à paridade após seu ingresso na reserva (aposentadoria).
Art. 42.
[...]
§ 2º: Aos pensionistas dos militares dos Estados, do distrito federal e dos territórios aplica-se o que for fixado em lei específica do respectivo ente estatal (NR).
Com a EC n. 41/2003, o regime de previdência específico dos militares foi “desconstitucionalizado”. A intenção do legislador foi afastar essa categoria de servidores do regime constitucional dos servidores civis. Contrariando a sua omissão com relação à cobrança de contribuição dos militares da União para o regime próprio de previdência, a EC n. 41/2003 estabelece, no artigo 149 § 1º, a obrigatoriedade da instituição pelos estados, distrito federal e municípios de cobrarem de seus servidores contribuições para o custeio do regime previdenciário.
Art. 149. [...] § 1º: Os estados, o distrito federal e os municípios instituirão contribuição, cobrada de seus servidores, para o custeio, em benefício destes, do regime previdenciário de que trata o artigo 40, cuja alíquota não será inferior à da contribuição dos servidores titulares de cargos efetivos da União.
Por último, vale ressaltar que o regime próprio de previdência dos servidores públicos observará, quando necessário às regras instituídas para o Regime Geral de Previdência Social (art. 40, § 12, da CF/88, com a redação após a Emenda Constitucional n. 20 de 1998).
3.2.1. Diversidade de Regras, Princípios Constitucionais, Emendas e Posicionamento do STF
Antes da Emenda Constitucional n. 41/2003, os servidores públicos se aposentavam com proventos no mínimo iguais aos de seus vencimentos na atividade, enquanto os benefícios do Regime Geral de Previdência Social, além de estarem sujeitos a um teto previdenciário, instituído pelo Poder Executivo, possuíam regras de cálculo que acarretava invariavelmente um valor inferior ao do último salário-de-contribuição do segurado. Assim, enquanto a contribuição dos servidores incidia sobre o total de sua remuneração, a contribuição dos segurados do RGPS encontrava-se sujeita ao teto previdenciário.
A diversidade de regras existentes entre os segurados do RGPS e os servidores públicos do RPPS é lesiva ao princípio da isonomia e indicativa de privilégios para os servidores; entretanto, é possível de ser defendida como instrumento de proteção do próprio Estado e da sociedade, na medida em que permite aos servidores exercerem suas funções com maior autonomia, sem se sujeitarem a pressões decorrentes da preocupação em complementar sua aposentadoria.
Ressalte-se que o regime jurídico dos servidores públicos consagra restrições quanto ao exercício de outras atividades, seja no próprio serviço público (regras de acumulação), seja na iniciativa privada (exercício de atividade comercial), e, além disso, impõe um regime disciplinar específico. Os servidores públicos, por sua vez, constituem um elemento humano indispensável à instituição de políticas públicas, ao exercício de atividades típicas de Estado (como fiscalização e arrecadação) e à própria construção de um Estado Social.
As atividades do Estado e os fins que ele deve atingir demandam a atuação, imprescindível, de seus servidores, muitos dos quais exercem funções que não aconselham a aplicação das mesmas normas referentes ao setor privado para disciplinar seu relacionamento com o poder público, até mesmo no que toca a seus direitos previdenciários.
3.3. Principais Polêmicas
A Constituição Federal, em seu artigo 247, acrescentado pela Emenda Constitucional n. 19/98, refere-se à necessidade de se estabelecerem, por lei, critérios e garantias especiais para a perda do cargo pelo servidor público estável que, em decorrência das atribuições de seu cargo efetivo, desenvolva atividades típicas de Estado. Portanto, existe previsão constitucional de servidores que exercem atividades típicas de Estado e outros que não exigem a importância das atribuições dos primeiros devido a normas diferenciadas.
Nesse sentido, foi a decisão adotada pelo Supremo Tribunal Federal, a respeito da Lei n. 9.986, de 18 de julho de 2000 (DUO de 19/07/2000), que determinou que o regime de pessoal das agências reguladoras seria o da CLT. Esta determinação legal viola a independência técnica – que é a de exigir do quadro de servidores das agências – e, portanto, foi suspensa pela Corte Maior, mediante liminar concedida na ADIn 2.310-1-DF, relatada pelo Ministro Marco Aurélio de Mello.O ministro considerou que o regime de emprego público é incompatível com a tarefa de fiscalização desenvolvida pelas agências, a qual constitui uma atividade típica de Estado. Assim, temos o seguinte trecho do voto:
Os servidores das agências reguladoras hão de estar, necessariamente, submetidos ao regime de cargo público, ou podem, como previsto na lei em exame, ser contratados para empregos públicos?
Ninguém coloca em dúvida o objetivo maior das agências reguladoras, no que está ligado à proteção do consumidor, sob os mais diversos aspectos negativos – ineficiência, domínio do mercado, concentração econômica, concorrência desleal e aumento arbitrário dos lucros.
Hão de estar as decisões desses órgãos imunes a aspectos políticos, devendo fazer-se presente, sempre, o contorno técnico. É isso o exigível não só dos respectivos dirigentes – detentores de mandato – mas também dos servidores – reguladores, analistas de suporte à regulação – Anexo I da Lei n. 9.986/2000 – que, juntamente com os primeiros, hão de corporificar o próprio Estado nesse mister da mais alta importância, para a efetiva regulação dos serviços.
Prescindir, no caso, da ocupação de cargos públicos, com os direitos e garantias a eles inerentes, é adotar flexibilidade incompatível com a natureza dos serviços a serem prestados, igualizando os servidores das agências a prestadores de serviços subalternos, dos quais não se exige, até mesmo, escolaridade maior, como serventes, artífices, mecanógrafos, entre outros.
Atente-se para a espécie. Está-se diante de atividade na qual o poder de fiscalização, o poder de polícia fazem-se com envergadura ímpar, exigindo, por isso mesmo, que aquele que a desempenhe sinta-se seguro, atue sem receios outros, e isso pressupõe a ocupação de cargo público, a estabilidade prevista no artigo 41 da Constituição Federal.
3.3.1. Emenda 20/98
A Emenda Constitucional n. 20/98, que alterou o artigo 40 da Constituição originária, traçou, pela primeira vez, normas atinentes à previdência dos servidores públicos de todas as esferas de governo. Antes desta emenda não existia um corpo orgânico e uniforme de regras referentes à matéria.
Na esfera federal, por exemplo, muito embora diversas categorias de servidores contribuíssem para o seu sistema previdenciário, a obrigatoriedade da contribuição somente foi determinada a partir da Emenda Constitucional n. 03/1993, que modificou a redação do § 6º do artigo 40 da Constituição, prevendo que “as aposentadorias e pensões dos servidores públicos federais serão custeadas com recursos provenientes da União e das contribuições dos servidores, na forma da lei”.
O parágrafo único do artigo 149 da Carta Maior, em sua redação originária, não exigia a contribuição de forma obrigatória, mas dizia que os entes estatais poderiam cobrá-la. Assim, já que algumas vezes a contribuição cobrada destinava-se apenas à pensão, faz sentido dizer que benefícios (aposentadoria e pensão) eram custeados pelos respectivos tesouros à conta de impostos gerais. Ou seja, toda a sociedade financiava a “previdência” dos servidores públicos, política de pessoal referente aos mencionados agentes públicos.
A inexistência de regras claras a respeito da contribuição do ente público (diversamente do que se verificava para o empregador no âmbito do INSS) fazia com que o Estado não se preocupasse em contribuir. Ademais, o Estado, seria credor e devedor de si mesmo. No entanto, a experiência mostrou que a ausência dessas regras levou a uma série de distorções. Não se tratou a previdência dos servidores com o rigor técnico necessário, concedendo integralidade entre o benefício e a última remuneração sem qualquer preocupação com o histórico contributivo do servidor.
Nesses casos era possível ter contribuído a maior parte da vida laboral sobre um valor pequeno para o INSS; ou ser aprovado em um concurso público de remuneração mais elevada e se aposentar com um valor alto que não correspondia ao montante sobre o qual o servidor contribuiu.
Outro fator preponderante era a paridade entre ativos e inativos, estendendo-se aos últimos vantagens e reajustes concedidos aos primeiros sem haver correspondência com o nível de contribuição que tiveram em atividade. Havia mecanismos de incorporação à remuneração e aos proventos de aposentadoria de vantagens transitórias (auferidas durante algum tempo), onerando ainda mais a folha de pagamento do Estado.
A previsão de um Regime Jurídico Único por parte da Constituição Federal de 1988, que implicou a mudança de regime de celetista para estatutário de um grande número de servidores, acarretou consequências para seu regime de previdência, tendo em vista que, na situação anterior, se aposentavam pelo Regime Geral de Previdência Social, ao passo que, após a conversão de regime jurídico, passaram a se aposentar por seus sistemas próprios de previdência, onerando os cofres públicos, já que passaram a ter direito à integralidade de sua última remuneração, bem como à paridade com os ativos.
No momento da instituição do regime jurídico único, Lei n. 8.112/90, dos 750 mil servidores civis da União naquela data, mais de 150 mil eram regidos pela Lei n. 1.711/52 (estatutários) e aproximadamente 600 mil eram celetistas (SILVA, 2002, p. 21).
Ademais, o impacto financeiro e orçamentário dessas medidas se fez sentir a partir da estabilidade monetária propiciada pelo Plano Real, em 1994. Em 2002, por exemplo, a diferença entre os gastos com aposentadorias e pensões no serviço público e o valor das contribuições vertidas, compreendendo União, estados, DF e municípios, chegou a aproximadamente 39,1 bilhões de reais. No plano da União Federal, o déficit é de 22,1 bilhões de reais e nos estados é de 14,5 bilhões. E tais valores já incluem, além das contribuições dos servidores, a contribuição dos entes estatais, considerada como o dobro (dois para um) da contribuição dos primeiros.
A Emenda Constitucional n. 20/98 criou um autêntico sistema previdenciário para os servidores e instituiu a previsão de seu caráter contributivo obrigatório com regras para preservar o equilíbrio financeiro e atuarial ao impor as seguintes medidas: a) transformou o conceito de tempo de serviço em tempo de contribuição; b) proibiu a contagem de tempo de serviço fictício; c) extinguiu a aposentadoria proporcional por tempo de serviço; d) criou a aposentadoria por tempo de contribuição vinculada a requisitos de tempo de contribuição e idade mínima; d) aproximou o regime dos servidores ao Regime Geral de Previdência Social pela cláusula prevista no § 12 do artigo 40 e pela previsão da possibilidade de instituir uma previdência complementar, hipótese em que os servidores poderiam ser sujeitos ao mesmo teto do RGPS. Adotou, ademais, regras mais claras sobre a aplicação do teto remuneratório nas acumulações de remunerações e proventos de aposentadorias e pensões, mas manteve-se, porém, a integralidade e a paridade entre ativos e inativos.
Estas são as chamadas regras permanentes, válidas a princípio para os que ingressaram no sistema a partir da publicação da Emenda Constitucional n. 20/98. Manteve-se a proteção a situações de direito adquirido, bem como foram previstas regras de transição, de forma a beneficiar quem não tivesse ainda direito adquirido às normas anteriores.
Posteriormente ou simultaneamente com a Emenda Constitucional n. 20/98, foram editados outros atos normativos que concretizaram várias de suas disposições. No tocante aos regimes de previdência dos servidores públicos, foram editadas as Leis n. 9.717/98 e n. 9.796/99, estabelecendo respectivamente normas gerais para os referidos regimes, dentre as quais a obrigação de o ente público contribuir para o sistema com até o dobro do valor da contribuição dos segurados, e as regras referentes à compensação previdenciária entre os diferentes sistemas.
3.3.2. Emenda 41/03
A Emenda Constitucional n. 41, de 31 de dezembro de 2003, concluiu as alterações iniciadas com a Emenda Constitucional n. 20/98. Assim, quanto aos requisitos para a concessão da aposentadoria, foram mantidas as regras permanentes do artigo 40 da Constituição Federal e alteradas as regras transitórias para quem era servidor em 16 de dezembro de 1998. Nesse sentido, foi extinta a aposentadoria com proventos proporcionais, prevista no artigo 8º, § 1º, da Emenda Constitucional n. 20/98, bem como foi imposta a aplicação de um redutor no valor da aposentadoria com proventos integrais por cada ano antecipado em relação às idades previstas no artigo 40, § 1º, alínea “a”, e § 5º da Constituição Federal. O objetivo dessas alterações foi evitar aposentadorias precoces a partir dos quarenta e oito anos de idade, para a mulher, e cinquenta e três anos de idade, para o homem, principalmente levando-se em conta que a expectativa de vida do brasileiro superou a casa dos setenta anos.
No que concerne ao critério de cálculo das aposentadorias, a Emenda Constitucional n. 41/2003 acabou com a regra da integralidade. Antes desta EC, os proventos de aposentadoria eram calculados com base na remuneração integral de cargo efetivo em que se dava a aposentadoria. O tempo máximo exigido de permanência no cargo efetivo em que se concedia a aposentadoria era de apenas cinco anos, ainda assim somente para a modalidade de aposentadoria voluntária.
Por consequência, a regra da integralidade possibilitava a concessão de aposentadoria em valor superior ao esforço contributivo do servidor. A nova regra adotada pela Emenda Constitucional n. 41/2003 determina que o valor da aposentadoria seja calculado com base nas remunerações sobre as quais incidiu contribuição previdenciária para o Regime Geral de Previdência Social e para o Regime Próprio de Previdência Social, ou seja, a base de cálculo da aposentadoria passou a considerar a vida laboral e o esforço contributivo do servidor, homenageando, dessa forma, o princípio da preservação do equilíbrio financeiro e atuarial, necessário para a manutenção do sistema protetivo.
Com relação ao critério de reajuste dos proventos de aposentadoria e pensões, extinguiu-se a regra da paridade. Os benefícios dos servidores passaram a ser reajustados, conforme critérios definidos em lei, de forma a preservar o seu valor real, igualando ao Regime Geral de Previdência Social.
No serviço publico federal, a título de exemplo, existem 942 mil inativos e pensionistas e 851 mil ativos, ou seja, há mais inativos e pensionistas do que servidores em atividade, segundo dados coletados no site www.mps.gov.br.
A Emenda Constitucional n. 41/2003 introduziu no cálculo da pensão por morte aplicação do redutor de 30% sobre o valor excedente ao teto do regime de Previdência Social, tendo como justificativa que os rendimentos, com a morte do servidor, deverá sustentar um grupo familiar menor, com a finalidade de manter o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema protetivo.
Os §§ 14, 15 (alterado pela EC n. 41/2003), e 16 do artigo 40 da Constituição passaram a regulamentar a instituição da previdência complementar do servidor publico como condição para a aplicação do teto do regime geral nos benefícios da previdência do regime próprio. Esta emenda determinou a criação de previdência complementar por lei de iniciativa do Poder Executivo, conforme o disposto no artigo 202 da Constituição Federal, por intermédio de entidade fechada de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerá planos somente na modalidade contribuição definida.
As alterações, assim, facilitaram a criação da previdência complementar e garantiram que essa poupança coletiva seria gerida por ente de natureza pública, sem finalidade lucrativa, o que traz segurança para os servidores que aderirem ao sistema. Acresça-se que esses fundos têm a finalidade de desonerar o Tesouro do aporte de recursos para financiamento dos sistemas próprios de previdência de seus servidores e dependentes, até mesmo para limitar suas despesas. Todavia, é importante salientar que os servidores que ingressarem no serviço público antes da instituição dos regimes de previdência complementar poderão optar pela sistemática imposta no § 15 do artigo 40.
CF: Art. 40 –
[...]
§ 14: A União, os estados, o distrito federal e os municípios, desde que instituam regime de previdência complementar para os seus respectivos servidores titulares de cargo efetivo, poderão fixar, para o valor das aposentadorias e pensões a serem concedidas pelo regime de que trata este artigo, o limite máximo estabelecido para os benefícios do Regime Geral de Previdência Social de que trata o artigo 201. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 20, de 15/12/98)
§ 15: O regime de previdência complementar de que trata o § 14 será instituído por lei de iniciativa do respectivo Poder Executivo, observado o disposto no artigo 202 e seus parágrafos, no que couber, por intermédio de entidades fechadas de previdência complementar, de natureza pública, que oferecerão aos respectivos participantes planos de benefícios somente na modalidade de contribuição definida. (Redação dada pela Emenda Constitucional n. 41, de 19/12/2003)
§ 16: Somente mediante sua prévia e expressa opção, o disposto nos §§ 14 e 15 poderá ser aplicado ao servidor que tiver ingressado no serviço público até a data da publicação do ato de instituição do correspondente regime de previdência complementar. (Incluído pela Emenda Constitucional n. 20, de 15/12/98) A previdência complementar prevista no § 15º do artigo 40 da Constituição Federal não se confunde com a instituição de fundos, integrados por recursos provenientes de contribuições e por bens, direitos e ativos de qualquer natureza, destinados a assegurar recursos para o pagamento de proventos de aposentadorias e pensões concedidas aos respectivos servidores e seus dependentes, previstas pelo artigo 248 da Constituição, acrescido pela Emenda Constitucional n. 20/98.
A fixação do novo teto remuneratório, como limite para o somatório do total de proventos e da remuneração de servidores, aposentados e pensionistas, incluídas as vantagens de caráter pessoal, tem dois obstáculos a serem superados: operacionais e jurídicos. O operacional relaciona-se à necessidade de se instituir um sistema informatizado de banco de dados, a ser compartilhado pelas diferentes esferas do governo.
A perspectiva jurídica se foca na existência ou não de impedimentos à aplicação do novo teto para o efeito de aumentar o valor pago a servidores, aposentados e pensionistas, cujos critérios de cálculo de remuneração ou proventos sejam decorrentes de normas anteriores à Emenda n. 41/2003.
Quanto às situações com fundamento no artigo 17 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias, não se poderia diminuir o que já vinha sendo pago aos servidores, pois não se aplica alteração por meio de emenda constitucional retroativamente com a finalidade de atingir situações anteriores já constituídas em que se tenha fixado determinada fórmula de cálculo do valor da remuneração ou dos proventos.
Nesse sentido, haveria direito adquirido inatingível, sob a forma do principio da irredutibilidade da remuneração ou dos proventos.
ADIn n. 1898-1 Distrito Federal. Relator Ministro Octávio Gallotti. EMENTA: Ação direta de inconstitucionalidade proposta pelo Procurador-Geral da Repúplica contra ato normativo da presidência do Conselho da Justiça Federal, onde se baixaram tabelas de remuneração de magistrados, com base em valor atribuído aos subsídios de ministro do Supremo Tribunal, antes que venham estes a ser fixados por lei formal. Relevância do fundamento jurídico da inicial, perante o artigo 37, inciso XI da Constituição, com a redação dada pela Emenda n. 19, cujo artigo 29 não foi reputado auto-aplicável em decisão administrativa do Supremo Tribunal. Medida cautelar deferida, por maioria, com efeitos ex- tunc.
Importante destacar o entendimento do professor Wagner Balera (2006, p.35-37) a respeito do teto remuneratório:
Entendo que não pode a emenda à Constituição, em virtude do princípio da irredutibilidade, provocar diminuição nos proventos da inatividade mediante critérios que, adredemente, tornem impossível a obtenção de padrão de vida digno do trabalhador. De igual modo, a emenda constitucional não é veículo idôneo para repercutir de modo instantâneo sobre cláusulas imodificáveis. EC 41/2003 – Art. 9º– “Aplica-se o disposto no artigo 17 do Ato das Disposições Transitórias aos vencimentos, remunerações e subsídios dos ocupantes de cargos, funções e empregos públicos da administração direta, autarquia e fundacional, dos membros de qualquer dos poderes da União, estados, distrito federal e municípios, dos detentores de mandato eletivo e dos demais agentes políticos e os proventos, pensões ou outra espécie remuneratória percebidos cumulativamente ou não, incluídas as vantagens pessoais ou de qualquer outra natureza”.
[...] A única possibilidade de ocorrência de redução no valor do benefício já concedido foi contemplada pelo artigo 17 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias de 05/10/1988, explicitando que se tratava de direito adquirido. CF/88 – ADCT – Art. 17 – “Os vencimentos, a remuneração, as vantagens e os adicionais, bem como os proventos de aposentadorias que estejam sendo percebidos em desacordo com a Constituição serão imediatamente reduzidos aos limites dela decorrentes, não se admitindo, neste caso, invocação de direito adquirido ou percepção de excesso de qualquer título”.
E, continua:
Tratava-se, por conseguinte, de limitação constitucional transitória da cobertura previdenciária já anteriormente concedida que, a partir daquele momento, de imediato, se via reduzida ao teto pelo qual o sistema de proteção social instaurado pelo Estatuto Fundamental considerava suficientemente amparados todos quantos dele fruíssem as prestações continuadas de que beneficiavam até então. Naturalmente, nenhum sentido teria o preceito quando considerado o futuro da proteção social em nosso país. Todas as futuras prestações já nasceriam debaixo do limite de cobertura que veria a ser descrito na hipótese de incidência da lei a ser editada com fundamento no artigo 48, inciso XV, da Constituição.CF/88 – Art. 48 – [...] inciso XV: “fixação do subsídio dos ministros do Supremo Tribunal Federal, observado o que dispõem os artigos 39, § 4º; 150, II; 153, III; e 153, § 2º, I”.
Ocorre que a lei de iniciativa conjunta dos chefes dos três poderes da República jamais foi editada; assim, o STF decidiu pela inaplicabilidade do teto remuneratório na forma prevista pela EC n. 19/98.
Esse entendimento foi reiterado no julgamento da ADI n. 1898-1, no qual conclui-se que o inciso XI do artigo 37, com redação dada pela EC n. 19/98, não era auto-aplicável. Portanto, na ausência de lei de iniciativa conjunta, vigeria a redação original do CF/88. Logo, o STF entendeu que o teto remuneratório, até o advento da EC n. 41/2003, corresponderia à remuneração de ministro de Estado, excluindo as vantagens pessoais.
Há de se observar, ainda a norma provisória da EC n. 41/2003:
Art. 8º – Até que seja fixado o valor do subsídio de que trata o artigo 37, XI, da Constituição Federal, será considerado, para fins do limite fixado naquele inciso, o valor da maior remuneração atribuída por lei na data da publicação desta emenda a ministro do Supremo Tribunal Federal, a título de vencimento, de representação mensal e da parcela recebida em razão de tempo de serviço [...].
A Emenda Constitucional n. 41/2003 introduziu significativa mudança com relação ao teto remuneratório, pois incluiu as vantagens pessoais ao valor do teto, que continua sendo o subsídio do ministro do STF. Todavia, O Supremo Tribunal Federal, na sessão administrativa de 05/02/2004, definiu o que seria entendido como maior remuneração do ministro do STF, fixada por lei em 31/12/2003: o teto provisório corresponderá ao vencimento acrescido da representação mensal e da parcela correspondente ao tempo de serviço.
Quanto à contribuição dos aposentados e pensionistas, não se pode inovar a existência de direito adquirido a determinado regime jurídico com a finalidade de alegar a inconstitucionalidade de sua instituição para os que, quando da entrada em vigor das novas normas, ainda não preencheram os requisitos para aposentadoria ou percepção de pensão. Já para os que se encontravam aposentados ou percebendo pensão na data da publicação da Emenda Constitucional n. 41/2003, ou possuíam direito adquirido aos citados benefícios naquela ocasião, a cobrança deve-se justificar com fundamento na inexistência de direito a não ser tributado. Não se atinge a forma de cálculo do valor dos proventos, mas estes são submetidos à tributação.
A contribuição destina-se, então, a assegurar a redução do déficit e um equilíbrio do sistema, justificando-se, ainda, porque a situação de referidos inativos é idêntica à dos ativos, ou seja, ambos possuem direito à integralidade e paridade entre vencimentos e proventos (artigo 7º da Emenda Constitucional n. 41/2003). Ademais, consagrou-se um teto-limite de recebimento dos proventos à cobrança de contribuições.
ADIn 3.105-8, DF. Relatora originária: Min. Ellen Gracie. Relator para o Acórdão: Min. Cezar Peluso.
EMENTAS:
1. Inconstitucionalidade. Seguridade Social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadorias e pensões. Sujeição á incidência de contribuição previdenciária. Ofensa a direito adquirido no ato da aposentadoria. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Emenda Constitucional n. 41/2003 (art. 4º, caput). Regra não retroativa. Incidência sobre fatos geradores ocorridos depois do início de sua vigência. Precedentes da corte. Inteligência dos artigos 5º, XXXVI, 146, III, 149, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, da CF e artigo 4º, caput, da EC n. 41/2003. No ordenamento jurídico vigente, não há norma, expressa nem sistemática, que atribua à condição jurídico-subjetiva da aposentadoria de servidor público o efeito de lhe gerar direito subjetivo como poder de subtrair ad aeternum a percepção dos respectivos proventos e pensões à incidência de lei tributária que, anterior ou ulterior, submeta-os à incidência de contribuição previdencial. Noutras palavras, não há em nosso ordenamento nenhuma norma jurídica válida que, com efeito específico do fato jurídico da aposentadoria, imunize-lhe os proventos e as pensões, de modo absoluto, à tributação de ordem constitucional, qualquer que seja a modalidade do tributo eleito, donde não houver, a respeito, direito adquirido com o aposentamento.
2. Inconstitucionalidade. Ação direta. Seguridade Social. Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária, por força de Emenda Constitucional. Ofensa a outros direitos e garantias individuais. Não ocorrência. Contribuição social. Exigência patrimonial de natureza tributária. Inexistência de norma de imunidade tributária absoluta. Regra não retroativa. Instrumento de atuação do Estado na área da Previdência Social. Obediência aos princípios da solidariedade e do equilíbrio financeiro e atuarial, bem como aos objetivos constitucionais de universalidade, equidade na forma de participação e no custeio e diversidade da base de financiamento. Ação julgada improcedente em relação ao artigo 4º, caput, da EC n. 41/2003. Votos vencidos. Aplicação dos artigos 149, caput, 150, I e III, 194, 195, caput, II e § 6º, e 201, caput, da CF. Não é inconstitucional o artigo 4º, caput, da Emenda Constitucional n. 41, de 19 de dezembro de 2003, que instituiu contribuição previdenciária sobre os proventos de aposentadorias e as pensões dos servidores públicos da União, dos estados, do distrito federal e dos municípios, incluídas suas autarquias e fundações.
3. Inconstitucionalidade. Ação direta. Emenda Constitucional (EC n. 41/2003, art. 4º, § único, I e II). Servidor público. Vencimentos. Proventos de aposentadoria e pensões. Sujeição à incidência de contribuição previdenciária. Bases de cálculo diferenciadas. Arbitrariedade. Tratamento discriminatório entre servidores e pensionistas dos estados, do distrito federal e dos municípios, de outro. Ofensa ao princípio constitucional da isonomia tributária, que é particularização do princípio fundamental da igualdade. Ação julgada procedente para declarar inconstitucionais as expressões “cinqüenta por cento do” e “sessenta por cento do”, constante no artigo 4º, § único, I e II, da EC n. 41/2003. Aplicação dos artigos 145, § 1º, e 150, II, cc artigo 5º, caput e § 1º, e 60, § 4º, IV, da CF, com restabelecimento do caráter geral da regra do artigo 40, § 18. São inconstitucionais as expressões “cinqüenta por cento do” e “sessenta por cento do”, constantes do § único, incisos I e II, do artigo 4º da Emenda Constitucional n. 41, de 19 de dezembro de 2003, e tal pronúncia restabelece o caráter geral da regra do artigo 40, § 18, da Constituição da República, com a redação dada por essa mesma emenda. Decisão do STF quanto às contribuições.
Vale ressaltar, no entanto que a justificativa do Poder Executivo para enviar a proposta de emenda que culminou na Emenda Constitucional n. 41/2003, teve como idéia principal o princípio do equilíbrio financeiro e atuarial, uma vez que já havia sido introduzido no artigo 201 da Constituição Federal pela EC n. 20/98. De fato, até a promulgação da EC n. 20/98, não havia previsão legal da necessidade do equilíbrio financeiro e atuarial dos regimes próprios de Previdência Social geridos pela União, estados, municípios e distrito federal.
A Emenda Constitucional n. 41/2003 pretendeu corrigir as deficiências atuariais provocadas pela não-contribuição dos servidores públicos, contrariando o preceito constitucional da contrapartida, até a década de 1990.
Dessa forma, baseado em deficiências financeiras nos regimes próprios de Previdência Social, o Poder Executivo resolveu transferir aos beneficiários do regime próprio – os atuais e os futuros – a obrigatoriedade da cobertura do déficit de caixa apurado, rompendo a proteção social dos servidores e contrariando os direitos sociais constitucionais. Descumpriu, ainda, outros preceitos constitucionais, tais como: a isonomia, a segurança, jurídica, a irretroatividade, a irredutibilidade e o direito adquirido. Violou, também, o princípio federativo, artigos 1º e 60º, § 4º, I, da Constituição Federal e o caráter atuarial do custeio da previdência previsto no artigo 40, caput, da Constituição Federal (BALERA, 2003b).
Diante da constatação da violação do direito adquirido, pela cobrança de contribuição, dos servidores que já se encontravam na inatividade até a promulgação da Emenda Constitucional n. 41/2003, defendo a necessidade de planejamento em matéria previdenciária. Uma vez que é por meio da elaboração do plano de custeio que ocorre o planejamento do sistema protetivo, quando serão determinadas as necessidades do grupo protegido e a devida forma de custeio, o que trará confiabilidade aos beneficiários, bem como protegerá o sistema de oscilações econômicas, estruturais e políticas.
4. APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO
4.1. Conceitos
A aposentadoria especial é um benefício que visa garantir ao segurado do Regime Geral da Previdência Social uma compensação pelo desgaste resultante do tempo de serviço prestado em condições prejudiciais à sua saúde ou integridade física.
Wladimir Novaes Martinez (2001, p. 21) a define como
espécie de aposentadoria por tempo de serviço devida a segurados que, durante 15 ou 20 ou 25 anos de serviços consecutivos ou não, em uma ou mais empresas, em caráter habitual e permanente, expuseram-se a agentes nocivos físicos, químicos e biológicos, em níveis além da tolerância legal, sem a utilização eficaz de EPI ou em face de EPC insuficiente, fatos exaustivamente comprovados mediante laudos técnicos periciais emi- tidos por profissional formalmente habilitado, ou perfil profissiográfico, em consonância com dados cadastrais fornecidos pelo empregador (DSS 8030 e CTPS) ou outra pessoa autorizada para isso.
A Desembargadora Suzana Camargo, do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, registra que a aposentadoria especial tem por finalidade proteger os trabalhadores que laboram ou laboraram em atividades que afetam a saúde ou integridade física, “reclamando assim, a redução do tempo de serviço para obtenção do benefício, de molde que os riscos a que estão sujeitos não se tornem fatais à vida”(TRF-3ª Reg. – Ap. Cív. 95.03.063329-0/SP – Rel.ª Des.ª Suzana Camargo – DJU 08.09.1998).
Novamente assinala Wladimir Novaes Martinez (2001, p.23) que,
de certo modo, a doutrina tem como assente tratar-se de uma indenização social pela exposição aos agentes nocivos ou possibilidade de prejuízos à saúde do trabalhador, distinguindo-a da aposentadoria por tempo de contribuição e da aposentadoria por invalidez.
Nilton Freitas (2001) anota que a aposentadoria especial constitui um “ benefício em forma de ‘compensação’ para aqueles que se dispuseram ou não tiveram outra alternativa ocupacional, a realizar atividades em que expu- nham sua saúde ou integridade física aos riscos oriundos do trabalho, em prol do desenvolvimento nacional”.
4.2. Aposentadoria Especial do Servidor sob o Regime Celetista
O direito do servidor público estatutário à aposentadoria especial ainda depende de tratamento por lei complementar, pelo que, neste aspecto, resta aguardar a lei integrativa.
Entretanto, deve ser observado que, até a promulgação da Constituição Federal de 1988, a relação de trabalho de um grande contingente de servidores da Administração Pública era regida pela Consolidação das Leis do Trabalho.
Após a instituição do regime jurídico único, o regime desses servidores converteu-se em estatutário e, a partir daí, surgiram dúvidas relativamente ao cômputo do tempo de serviço prestado em condições especiais, tendo em vista que lei complementar, que deveria dar tratamento à aposentadoria especial para os servidores públicos, ainda não havia sido editada.
Em razão da garantia constitucional do direito adquirido e do princípio da irretroatividade das leis, as alterações advindas ao regime dos servidores não poderão retroagir para prejudicá-los, não tendo eficácia em relação ao tempo de serviço exercido em condições que o regime anterior reconhecia como de natureza especial.
A mudança do regime celetista para o regime estatutário não faz desaparecer o direito ao cômputo do tempo de serviço especial prestado no regime anterior sob condições de penosidade, insalubridade e periculosidade, tendo em vista que esse direito se integrou ao patrimônio jurídico do servidor.
Dessa forma, o tempo de serviço prestado pelo servidor anterior- mente à adoção do regime jurídico único, instituído pela Lei 8.112/90, pode ser convertido e somado ao restante do tempo comum, para a obtenção de aposentadoria por tempo integral ou proporcional.
No Mandado de Injunção de 823, o Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito dos cirurgiões-dentistas do Distrito Federal à contagem especial do tempo de serviço insalubre prestado no período estatutário.
Nesse sentido, a jurisprudência:
Administrativo. Processual civil e previdenciário. Servidor público. Aposentadoria. Impossibilidade jurídica do pedido. Prescrição quinquenal. Tempo de serviço. Atividade especial. Conversão. 1 – Não ocorre impossibilidade jurídica do pedido quando a pretensão formulada na exordial está prevista e amparada pela legislação previdenciária. 2 – A prescrição não incide sobre os valores correspondentes aos cinco anos anteriores à propositura da ação. 3 – O Decreto 83.080/79, art. 60, § 2º, assegurava aos segurados da Previdência Social o direito à conversão do tempo de atividade especial em tempo de atividade comum para fins de aposentadoria. 4 – Quando o emprego ocupado pelo autor foi transformado em cargo público, por força do art. 243, § 1º, da Lei 8.112/90, este trouxe para o novo cargo todos os direitos até então adquiridos sob a égide do regime anterior. 5 – (...). (AC 1998.010.00.70315-7/MG – 2ª T. – Rel. Juiz Jirair Aram Meguerian – 1ª Reg. – DJ 10.08.2001, p. 130)
No mesmo diapasão
Administrativo e previdenciário. Período em que a autora era regida pela CLT. Mudança de regime para estatutário. Conversão de tempo especial em comum. 1. O entendimento da jurisprudência desta Corte é no sentido de que o servidor público ex-celetista que exerceu atividade considerada penosa, insalubre ou perigosa, tem direito à contagem especial desse período, a despeito de ter, posteriormente, passado à condição de estatutário. 2. A servidora pública que laborava em condições insalubres quando celetista, tem o direito à conversão do tempo de serviço especial em comum, na forma da legislação previdenciária, posto que já havia incorporado tal direito ao seu patrimônio jurídico. 3. Apelação a que se dá provimento para, reformando a r. sentença, julgar procedente o pedido com a inversão dos ônus da sucumbência. (AC – 199938030021573– 2ª T. – Rel.Juíza Federal Maria Helena Carreira Alvim Ribeiro (Conv.) – TRF1 – DJ 23.09.2005, p. 150)
Previdenciário e administrativo. Certidão de tempo de serviço. Conversão do tempo especial, exercido sob o regime celetista, em comum. Mudança de regime. 1. Descabe o chamamento da União para figurar no pólo passivo do mandamus, vez que a UFPB, de natureza autárquica, possui a prerrogativa de autoadministração, abrangendo, inclusive, a autonomia financeira. 2. O servidor que muda do regime jurídico celetista para o estatutário tem direito adquirido à conversão do tempo de serviço prestado em condições especiais, com vínculo ao RGPS, para fins de aposentadoria em regime próprio de previdência. 3. O Decreto 53.831/64, que elencava o magistério como atividade penosa, não obstante tenha sido revogado pelo Decreto 65.755/68, teve a eficácia de seu anexo repristinada pelo decreto 611/62, que regulamentou a Lei 8.213/91. 4.(...). (AMS 99.05.23758-5/PB – 4ª T., – Rel. Des. Federal Luiz Alberto Gur- gel de Faria – TRF – 5ª Reg. un. – DJ 01.06.2001, p. 560)
Também não se pode proibir o cômputo de tempo de serviço prestado pelo servidor em condições especiais, ao argumento de ser vedada a contagem de tempo fictício, após a promulgação da Emenda Constitucional 20/98.
A vedação de contagem do chamado tempo de serviço fictício não pode retroagir para prejudicar direito adquirido, de forma a impossibilitar a conversão do tempo de serviço prestado em atividades especiais.
A exegese dos novos dispositivos constitucionais não pode ignorar direitos adquiridos à luz das normas anteriores à edição da Emenda Constitucional 20/98, incorporados ao patrimônio jurídico do servidor, como o direito ao cômputo do tempo de serviço de acordo com a legislação vigente à época em que esses serviços foram prestados.
4.3. Da falta de Regulamentação da Aposentadoria Especial do Servidor Público
Em relação a aposentadoria especial do servidor público não existe uma legislação específica, já que a lei complementar não foi editada até o presente momento, o que tem levado aos servidores públicos que desenvolvem atividade de risco ou sob condições especiais que prejudiquem a sua saúde ou a sua integridade física (condições insalubres) a, diretamente ou por intermédio de sua entidade de classe, buscar a tutela do Poder Judiciário, para salvaguardar o seu direito a uma aposentadoria diferenciada, ou seja, especial.
Ademais, o servidor público que trabalha em condições de risco ou sob condições insalubres não pode ser prejudicado pela inércia do legislador infraconstitucional, a lacuna legal não pode ser óbice ao reconhecimento de um direito de garantia constitucional (SANTOS, 2010).
Apesar disso, o Poder Judiciário, até o Supremo Tribunal Federal, tem reconhecido o direito à aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo efetivo que esteja submetido ao labor em condições de risco e a insalubridade, desde que a submissão seja permanente, não ocasional e nem intermitente, conforme demonstrado nas decisões a seguir:
O Supremo Tribunal Federal julgou parcialmente procedente o Mandado de Injunção 721-7/DF entendendo que, “inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral – art. 57, § 1º, da Lei 8.213/91”.
Mandado de injunção. Natureza. Conforme disposto no inc. LXXI do art. 5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada.
Mandado de injunção. Decisão. Balizas. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada.
Aposentadoria. Trabalho em condições especiais. Prejuízo à saúde do servidor. Inexistência de lei complementar. Art. 40, § 4º, da Constituição Federal. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral – art. 57, § 1º, da Lei 8.213/91” (MI 721/DF, Tribunal Pleno – Rel. Min. Marco Aurélio – DJ 30.11.2007, p. 29)
Transcrevemos parcialmente o voto, do Relator Exm. Sr. Ministro Marco Aurélio, que assim se manifesta:
A natureza da citada ação constitucional – mandado de injunção -, procedente a causa de pedir versada na inicial, leva o pronunciamento a ganhar contornos mandamentais, a ganhar eficácia maior, a ponto de viabilizar, consideradas as balizas subjetivas da impetração, o exercício do direito, da liberdade constitucionalou das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e á cidadania. Eis que surgiu no cenário normativo- constitucional o instrumento capaz de revelar a lei fundamental como de concretude maior, abandonada visão simplesmente lírica. Pois bem, na redação primitiva, a Carta de 1988, ao dispor sobre a aposentadoria dos servidores públicos, previa, ao lado das balizas temporais, alusivas à jubilação espontânea, a possibilidade de lei complementar estabelecer exceções. Confira-se com o preceito: Art. 40. O servidor será aposentado: (...) III – voluntariamente: a) aos trinta e cinco anos de serviço, se homem, e aos trinta, se mulher, com proventos integrais; (...) c) aos trinta anos de serviço, se homem, e aos vinte e cinco, se mulher, com proventos proporcionais a esse tempo; § 1ºLei complementar poderá estabelecer exceções ao disposto no inc. III, a e c, no caso de exercício de atividades consideradas penosas, insalubres ou perigosas. (...) Com a Emenda Constitucional 20, afastou-se a óptica medíocre do sentido do verbo “poder” – considerado o tempo, futuro do presente “poderá”, para prever-se, no § 4º do art. 40 da Carta que: § 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados os casos de atividades exercidas exclusivamente sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, definidos em lei complementar. Tal afastamento foi mantido pela emenda constitucional 47, de 05.07.2005, eu deu nova redação ao citado § 4º: § 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo, ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores: I – portadores de deficiência; II – que exerçam atividades de risco; III – cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física. Então é dado concluir que a jurisprudência mencionada nas informações sobre simples faculdade ficou, sob o ângulo normativo-constitucional, suplantada. Refiro-me ao que decidido no Mandado de Injunção 484-6/RJ, citado os precedentes formalizados quando do julgamento dos Mandados de Injunção 425-1/DF e 444-7/MG. Em síntese, hoje não sugere dúvida a existência do direito constitucional a adoção e critérios diferenciados para alcançar a aposentadoria daquelas que hajam trabalhado sob condições especiais, que prejudiquem a saúde ou integridade física. Permaneceu a cláusula da definição em lei complementar. Assento, por isso, a adequação da medida intentada. Passados mais de quinze anos da vigência da Carta, permanece-se com o direito latente, sem ter-se base para o exercício. Cumpre, então, acolher o pedido formulado, pacífica a situação da impetrante. Cabe ao Supremo, porque autorizado pela Carta da República a fazê-lo, estabelecer para o caso concreto e de forma temporária, até a vinda da lei complementar prevista, as balizas do exercício do direito assegurado constitucionalmente. No caso a dificuldade não é maior, porquanto é possível adotar-se, ante o fator tempo e situação concreta da impetrante, o sistema revelado pelo regime geral da previdência social, O art. 57 da Lei 8.213, de 24.07.1991, dispõe: Art. 57. A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei. § 1ºA aposentadoria especial, observado o disposto no Art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário-de-benefício. A impetrante conta com vinte e cinco anos de serviços prestados, atendendo a dilação maior prevista na Lei 8.2131/91. Julgo parcialmente procedente o pedido formulado para, de forma mandamental, assentar o direito da impetrante à aposentadoria especial de que cogita o § 4º do art. 40 da Constituição Federal”. Trata-se do reconhecimento do direito do servidor público à obtenção da aposentadoria especial, em “decisão plenoperante, marcada pela carga de concretude” nas termos do voto do Exmº Sr. Ministro Carlos Brito.
Também em 2007 o Plenário do Supremo Tribunal Federal reconheceu o direito à aposentadoria especial por insalubridade para servidora da área da saúde, acompanhando o voto do ministro-relator Marco Aurélio, no Mandado de Injunção 721.
No Mandado de Injunção 874 impetrado pelos filiados do Sindicato dos Médicos de Santa Catarina, foi concedida a ordem injuncional, para “garantir, aos filiados à entidade sindical ora impetrante, o direito de ter os seus pedidos de aposentadoria especial analisados, pela autoridade administrativa competente, à luz do art. 57 da Lei 8.213/91”.
Transcrevemos parcialmente o voto do Relator Exm. Sr. Ministro Ministro Celso de Mello:
Cumpre assinalar, nesse contexto, que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, ao apreciar ação injuncional em que também se pretendia a concessão de aposentadoria especial, não só reconheceu a mora do Presidente da República (“mora agendi”) na apresentação de projeto de lei dispondo sobre a regulamentação do art. 40, § 4º, da Constituição, como, ainda, determinou a aplicação analógica do art. 57, § 1º, da Lei 8.213/91, com o objetivo de colmatar a lacuna normativa existente:
(...) Aposentadoria. Trabalho em condições especiais. Prejuízo à saúde do servidor. Inexistência de lei complementar. Art. 40, § 4º, da Constituição Federal. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral – art. 57, § 1º, da Lei 8.213/91. (MI 721/DF – Rel. Min. Marco Aurélio – Pleno)
Registro, ainda, que esta Suprema Corte, em sucessivas decisões, reafirmou essa orientação (MI 758/DF, Rel. Min. Marco Aurélio – MI 796/DF, Rel. Min. Carlos Britto – MI 809/SP, Rel. Min. Min. Ellen Gracie, v.g.), garantindo, em consequência, aos servidores públicos que se enquadrem nas hipóteses previstas nos incs. II e III do § 4º do art. 40 da Constituição (execução de trabalhos em ambientes insalubres ou exercício de atividades de risco), o direito à aposentadoria especial:
Direito constitucional e administrativo. Mandado de injunção. Servidora pública. Atividades exercidas em condições de risco ou insalubres. Aposentadoria especial. § 4º do art. 40 da Constituição Federal. Ausência de lei complementar. Mora legislativa. Regime geral da previdência social. 1. Ante a prolongada mora legislativa, no tocante à edição da lei complementar reclamada pela parte final do § 4º do art. 40 da Magna Carta, impõe-se ao caso a aplicação das normas correlatas previstas no art. 57 da Lei 8.213/91, em sede de processo administrativo. 2. Precedente: MI 721, da relatoria do ministro Marco Aurélio. 3. Mandado de injunção deferido nesses termos. (MI 788/DF, Rel. Min. Carlos Britto)
Mandado de injunção. Aposentadoria especial do servidor público. Art. 40, § 4º, da Constituição da República. Ausência de lei complementar a disciplinar a matéria. Necessidade de integração legislativa. 1. Servidor público. Investigador da polícia civil do Estado de São Paulo. Alegado exercício de atividade sob condições de periculosidade e insalubridade. 2. Reconhecida a omissão legislativa em razão da ausência de lei complementar a definir as condições para o implemento da aposentadoria especial. 3. Mandado de injunção conhecido e concedido para comunicar a mora à autoridade competente e determinar a aplicação, no que couber, do art. 57 da Lei8.213/91. (MI 795/DF – Rel. Min. Cármen Lúcia – grifei)Min. Eros Grau – MI 834/DF, Rel. Min. Ricardo Lewandowski – MI 912/DF, Rel. Min. Cezar Peluso – MI 970/DF, Rel.
A Suprema Corte brasileira consolidou o entendimento de concessão das ordens de injunção para determinar que se aplique o art. 57 da Lei 8.213/91, enquanto não sobrevenham as leis complementares específicas e também o entendimento de que compete às administrações responsáveis a análise do preenchimento dos requisitos da aposentadoria especial para que o servidor faça jus (ou não) a esse benefício. Como se vê, a ordem de injunção não é direta, para determinar a concessão da aposentadoria especial, eis que condiciona essa, à verificação da reunião dos requisitos necessários pela autoridade responsável pelo RPPS.
4.3.1. Instrução Normativa 01, de 22.07.2010
O Ministério da Previdência expediu a Instrução Normativa 01, de 22.07.2010, que estabeleceu instruções para o reconhecimento do tempo de serviço público exercido sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física pelos regimes próprios de previdência social para fins de concessão de aposentadoria especial dos servidores públicos amparados por mandado de injunção. A referida IN reproduz a forma pela qual a aposentadoria especial é disciplinada no RGPS.
A IN 01/2010 considera, em seu art. 2º, que a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerão ao disposto na legislação em vigor na época do exercício das atribuições do servidor público, da seguinte forma:
a) até 28.04.1995, data anterior à vigência da Lei 9.032, o enquadramento de atividade especial ocorrerá (art. 3º da IN 01/2010):
– por cargo público cujas atribuições sejam análogas às atividades profissionais das categorias presumidamente sujeitas a condições especiais, consoante as ocupações/grupos profissionais agrupados sob o código 2.0.0 do quadro anexo ao Decreto 53.831, de 25.03.1964, e sob o código 2.0.0 do Anexo II do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto 83.080, de 24.01.1979 (art. 3º, I, da IN 01/2010); ou
– por exposição a agentes nocivos no exercício de atribuições do cargo público, em condições análogas às que permitem enquadrar as atividades profissionais como perigosas, insalubres ou penosas, conforme a classificação em função da exposição aos referidos agentes, agrupados sob o código 1.0.0 do quadro anexo ao Decreto 53.831, de 1964, e sob o código 1.0.0 do Anexo I do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto 83.080, de 1979 (art. 3º, II, da IN 01/2010);
b) de 29.04.1995 a 05.03.1997, somente nos termos do art. 3º, II, da IN 01/2010 (art. 4º, da IN 01/2010);
c) de 06.03.1997 até 06.05.1999, o enquadramento de atividade especial observará a relação dos agentes nocivos prejudiciais à saúde ou à integridade física que consta do Anexo IV do Regulamento dos Benefícios da Previdência Social, aprovado pelo Decreto 2.172, de 05.03.1997 (art. 5º, da IN 01/2010);
d) a partir de 07.05.1999, o enquadramento de atividade especial observará a relação dos agentes nocivos prejudiciais à saúde ou à integridade física que consta do Anexo IV do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto 3.048, de 06.05.1999 (art. 6º, da IN 01/2010).
O art. 2º, § 1º, da IN 01/2010 exige que o tempo tenha sido exercido sob condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física de modo permanente, não ocasional e nem intermitente. A demonstração desse tempo não pode ser feita por meio de prova exclusivamente testemunhal ou com base no mero recebimento de adicional de insalubridade ou equivalente (art. 2º, § 2º, IN 01/2010), o que não exclui a possibilidade de prova por outros meios ou mesmo na conjugação dessas duas modalidades.
O art. 14 da IN 01/2010 estabelece de forma simples que, no cálculo e reajuste dos proventos de aposentadoria especial, se aplica o disposto nos §§ 2º, 3º, 8º e 17 do art. 40 da Constituição Federal. Entretanto não creio seja tão simples o tratamento da questão.
Com efeito, a aposentadoria especial do servidor é direito assegurado desde a redação original da Constituição de 1988 e considerando o princípio do tempus regit actum, o efeito ex tuncdas ordens de injunção que garantem esse benefício ao servidor e o contido no art. 2º da IN 01/2010, pelo qual a caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerão ao disposto na legislação em vigor na época do exercício das atribuições do servidor público, entendo que o cálculo e reajuste dos proventos de aposentadoria especial dependem da data em que o servidor reuniu os requisitos para fazer jus a esse benefício.
Nesse sentido os proventos de aposentadoria especial dos servi- dores públicos, até por uma questão de isonomia constitucional com os demais, deverão ser calculados e reajustados da seguinte forma:
a)o servidor que completar os requisitos para a aposentadoria especial antes da EC 20/98 deverá ter os seus proventos calculados com base na regra da integralidade, ainda que esta aposentadoria seja concedida por ordem judicial em data posterior àquela emenda constitucional, e o reajuste deverá obedecer à regra da paridade. Nesse caso deve-se aplicar a redação original da CF/88, em vigor à época;
b) O servidor que completar os requisitos para aposentadoria especial no período entre a EC 20/98 e a EC 41/03 deverá ter os seus proventos calculados com base na totalidade da remuneração do cargo efetivo em que se der a aposentado- ria, ainda que a mesma seja concedida por ordem judicial em data posterior, e o reajuste deverá obedecer à regra da paridade. Nesse caso deve-se aplicar a redação do art. 40 da CF/88 dada pela EC 20/98;
c) O servidor que completar os requisitos para aposentadoria especial no período posterior à EC 41/03 deverá ter os seus proventos calculados com base na média a que se referem o art. 40, § 3º, da CF/88 c.c. art. 1º da Lei 10.887/04, e o reajuste deverá obedecer o art. 15, da Lei 10.887/04. Nesse caso deve-se aplicar a redação do art. 40 da CF/88 dada pela EC 41/03.
O art. 16, da IN 01/2010 dispõe que a Instrução Normativa INSS/PRESS 20, de 11.10.2007, tem aplicação subsidiária ao RPPS para o reconhecimento do tempo de serviço exercido sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física e concessão da respectiva aposentadoria. Tramitam no Congresso Nacional os projetos de leis complementares que tratam da disciplina normativa da aposentadoria especial dos servidores públicos.
a)O PLP 554/2010, apresentado pelo Presidente da República, visa regulamentar o inc. II do § 4º, do art. 40 da Constituição de 1988, disciplinando a aposentadoria especial dos servidores públicos titulares de cargos efetivos que exerçam atividades de risco de todas as unidades da federação;
b)O PLP 555/2010, apresentado pelo Presidente da República, visa regulamentar o inc. III do § 4º do art. 40 da Constituição de 1988, que dispõe sobre a concessão de aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo efetivo cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física;
c) o PLP 472/09, apresentado pelo Deputado Federal Arnaldo Faria de Sá, que tem vício de origem, porquanto a matéria é de iniciativa legislativa reservada ao Presidente da República (CF, art. 61, § 1º, II, “c”), visa regulamentar o inc. III do § 4º do art. 40 da Constituição de 1988, que dispõe sobre a concessão de aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo efetivo cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física;
d) O PLP 227/05, apresentado pelo então Deputado Leonardo Mattos, que tem vício de origem, porquanto a matéria é de iniciativa legislativa reservada ao Presidente da República (CF, art. 61, § 1º, II, “c”), visa regulamentar o inc. I do § 4º do art. 40 da Constituição de 1988, que dispõe sobre a concessão de aposentadoria especial ao servidor público titular de cargo efetivo portador de deficiência.
É importante que haja ampla discussão sobre esses projetos de leis para que não haja inconstitucionalidades que possam prejudicar os seus destinatários.
4.4. Aposentadoria do Professor
O entendimento jurisprudencial é no sentido de que o trabalho como professor (a), previsto no Código 2.1.4 do quadro anexo do Decreto 53.831/64, deve ser enquadrado como tempo especial.
Neste sentido, a jurisprudência advinda do TRF da 4ª Região:
Previdenciário. Mandado de segurança. Magistério. Atividade especial.Se o segurado comprova, mediante formulário DSS 8030, que exerce o magistério quando em vigor o Decreto 53.831/64, que arrolava, dentre as categorias profissionais, a atividade de professor como penosa e, portanto, especial, tem direito líquido e certo à conversão desse tempo de serviço, com aplicação do multiplicador 1.4, e sua soma ao período de atividade comum, na forma do § 5º do art. 57 da lei 8.213/91, para fins de aposentação.(AMS 200072000080178/SC – 5ª T. – Rel. Juiz A. A. Ramos de Oliveira – TRF – 4ª Reg. – DJU 30.10.2002 p. 1148).
No mesmo sentido:
Previdenciário. Mandado de segurança. Prova pré-constituída. Conversão do tempo de serviço exercido na função de professor. Atividade penosa. Aplicabilidade das normas pertinentes a aposentadoria especial. Lei 8.213/91, art. 57. Decreto 53.831/64. 1. Uma vez que o formulário SB-40 é apto a demonstrar o desempenho das tarefas nele descritas, configura-se a liquidez e a certeza do direito, sendo desnecessária a realização de laudo pericial, visto que a controvérsia não é o exercício da atividade, mas a insalubridade e o enquadramento das funções exercidas pelo impetrante na legislação vigente. 2. Embora regulada por regra específica, a aposentadoria de professor é historicamente oriunda da aposentadoria especial, visto que o DEC-53831/64 arrola a função como penosa. Enquanto não foi editado o DEC-2172/97, que revogou os regulamentos anteriores, permaneceram aplicáveis as normas relativas à conversão de tempo de serviço laborado em condições especiais, no exercício de magistério, porquanto a natureza do benefício não foi transmudada”. (AMS 9604539230 – 6ª T. – Rel. Juiz Carlos Sobrinho – TRF – 4ª Reg. – DJ 05.05.1999, p. 562)
Em sentido contrário:
Administrativo. Mandado de segurança. Professor. Pedido de aposentadoria. Utilização do tempo de serviço com os acréscimos previstos na legislação previdenciária. Incabimento. Hipótese em que o apelante, professor submetido ao regime celetista, busca a concessão de aposentadoria por tempo de serviço, computando-se os acréscimos da legislação previdenciária, referente ao tempo de serviço prestado, compreendido entre o período de 01.03.74 a 26.04.99, com fundamento nos Decretos 53.831/64 e 83.080/79, que consideravam como penosa a atividade desempenhada pelo impetrante (magistério), e sujeita a aposentadoria após 25 (vinte e cinco) anos de trabalho; e, nos Decretos 611/92, 2.172/97 3.048/99, que tratam da conversão do tempo de serviço especial para o comum. A aposentadoria do professor, que se submete a regime especial próprio, é devida após 30 anos, para os homens, e 25 anos, para as mulheres, de efetivo exercício nas funções de magistério, por determinação constitucional. Incompatível, pois, com a regra de conversão que prevê a utilização do adicional de 40% na contagem do tempo de serviço exercido em atividade penosa, perigosa ou insalubre para o tempo de atividade comum sujeita a 35 anos de serviço” . (MAS 200005000136880/PB – 1ª T. – Rel. Des. Federal Castro Meira – TRF – 5ª Reg. – DJ 22.12.2000, p. 96)
De acordo com a referida Emenda Constitucional, o docente (homem) não mais faria jus à aposentadoria aos 25 anos, conforme previsto anteriormente na legislação previdenciária, e sua aposentadoria seria concedida após 30 (trinta) anos de efetivo exercício em funções de magistério, com salário integral.
Não obstante ter afetado o direito do professor, passando a lhe conceder a aposentadoria somente após 30 anos de trabalho no magistério, o que deve ser compreendido é que a aposentadoria do professor, segurado do RGPS, aos 30 anos de efetivo exercício na mesma função, continuou a ser- lhe assegurada com proventos integrais, não se aplicando, então, as regras de cálculo dos demais benefícios previdenciários.
Promulgada a Constituição Federal de 1988, a aposentadoria do professor foi também prevista no art. 202, III; in verbis:
Art. 201. Aprevidência social será organizada sob a forma de regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que preservem o equilíbrio financeiro e atuarial, e atenderá, nos termos da lei, a:
.....................................................
§ 8º. Os requisitos a que se refere o inc. I do parágrafo anterior serão reduzidos em cinco anos para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
Somente a partir da Emenda Constitucional 20/98 passou a ser exigido o tempo exclusivo na função de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio para a concessão da aposentadoria aos trinta anos para o docente (homem) e vinte e cinco para a docente (mulher). Por sua vez, o § 2º do mesmo artigo dispôs:
§ 2ºO professor que, até a data da publicação desta Emenda, tenha exercido atividade de magistério e que opte por aposentar-se na forma do disposto no caput, terá o tempo de serviço exercido até a publicação desta Emenda contado com o acréscimo de dezessete por cento, se homem, e de vinte por cento, se mulher, desde que se aposente, exclusivamente, com tempo de efetivo exercício de atividade de magistério.
Conforme se constata nos termos dessa Circular, os professores filiados ao RGPS não poderiam converter o tempo laborado no magistério quando optarem pela aposentadoria comum, o que contraria o § 2º do art. 9º da referida Emenda. Observamos que a Circular 24/98 faz referência à ADI 178-7, requerida pelo Governador do Estado do Rio Grande do Sul, objetivando declarar a inconstitucionalidade do § 4º do art. 38 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, cujo acórdão foi publicado no DJ em 26.04.1996:
Ação direta de inconstitucionalidade. Contagem proporcional do tempo de serviço prestado por professores para efeito de contagem de tempo para aposentadoria comum. Impugnação, pelo governador do Estado, do § 4º. do art. 38 da Constituição estadual, que assim dispor: “na contagem do tempo de serviço para aposentadoria do servidor aos trinta e cinco anos de serviço e da servidora aos trinta, o período de exercício de atividades que assegurem direito a aposentadoria especial será acrescido de um sexto e de um quinto, respectivamente”. “ação julgada procedente. 1. O art. 40, III, “b”, da Constituição Federal, assegura o direito à aposentadoria especial, de forma que o tempo de efetivo exercício em funções de magistério é contado com o acréscimo de 1/6 (um sexto) e o da professora com o 1/5 (um quinto), em relação ao tempo de efetivo exercício em funções de magistério e contado com o acréscimo de 1/6 (um sexto) e o da professora com o de 1/5 (um quinto), em relação ao tempo de serviço exigido para a aposentadoria comum (35 anos para o homem e 30 anos para a mulher): 2. A expressão “efetivo exercício em funções de magistério” (CF, art. 40, III, “b”) contém a exigência de que o direito a aposentadoria especial dos professores só se aperfeiçoa quando cumprido totalmente este especial requisito temporal no exercício das específicas funções de magistério, excluída qualquer outra. 3. Não é permitido ao constituinte estadual fundir normas que regem a contagem do tempo de serviço para aposentadorias normal e especial, contando proporcionalmente o tempo de serviço exercido em funções diversas. 4. Ação direta conhecida e julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade do par. 4. do art. 38 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul. Eis que a norma do art. 40 da Constituição Federal é de observância obrigatória por todos os níveis de Poder. Observação: Votação: Unânime. Resultado: Procedente.
Essa Ação Direta de Inconstitucionalidade foi proposta objetivando a declaração de inconstitucionalidade do § 4º do art. 38 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, sendo conhecida e julgada procedente, para declarar a inconstitucionalidade deste dispositivo tendo em vista que “a norma do art. 40 da Constituição Federal é de observância obrigatória por todos os níveis de Poder”.
O referido art. 40 está inserido na Constituição Federal de 1988, na Seção II – Dos Servidores Públicos, incluído no Capítulo VII “Da Administração Pública”, sendo que, na redação anterior à promulgação da Emenda Constitucional 18/98, o inc. III, “b”, do art. 40 da Constituição Federal, já assegurava o direito à aposentadoria somente “aos trinta anos de efetivo exercício em funções de magistério se professor, e vinte e cinco, se professora, com proventos integrais”.
Portanto, o art. 38 da Constituição do Estado do Rio Grande do Sul, dispondo que “ na contagem do tempo de serviço para aposentadoria do servidoraos trinta e cinco anos de serviço e da servidora aos trinta, o período de exercício de atividades que assegurem direito a aposentadoria especial será acrescido de um sexto e de um quinto, respectivamente” foi declarado inconstitucional, em face do disposto art. 40, III, “b” da Constituição Federal, que assegurava, na redação então vigente, o direito ao benefício, desde que cumprido totalmente o requisito temporal no efetivo exercício das funções de magistério.
É certo que, após a alteração do art. 40 pela EC 18/98, a matéria passou a regulada pelo § 5º do art. 40, estabelecendo que
os requisitos de idade e de tempo de contribuição serão reduzidos em cinco anos, em relação ao disposto no § 1º, II, a, para o professor que comprove exclusivamente tempo de efetivo exercício das funções de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.
Em síntese, em relação aos servidores públicos, as regras de aposentadoria somente foram alteradas para o professor universitário, que anteriormente encontrava-se na mesma situação dos que exerciam funções de magistério.
O STF entendeu não ser “permitido ao constitutivo estadual fundir normas que regem a contagem do tempo de serviço para aposentadorias normal e especial, contando proporcionalmente o tempo de serviço exercido em funções diversas”, julgando a ação procedente. Em seu voto, o Exmo. Sr. Ministro Maurício Corrêa sustenta:
A disposição impugnada, ao dizer que:
Art. 38....... § 4º
Na contagem do tempo para aaposentadoria do servidor aos trinta e cinco anos de serviço e da servidoraaos trinta, o período de exercício de atividades que assegurem direito à aposentadoria especial será acrescido de um sexto e de um quinto, respectivamente, faz referência conjunta à aposentadoria voluntária comum e à voluntária especial dos professores, com proventos integrais, previstas no art. 40, III, a e b, da Constituição, in verbis:
.................
Trazendo o art. 40 da constituição Federal norma de observância obrigatória por todos os níveis de Poder, concluo que é inconstitucional o § 4ºdo art. 38 da Constituição sul- rio-grandense.
Estas considerações permite concluir que a interpretação da decisão do STF, que motivou a edição da Circular 24/98, em 10.03.1998, orientando que “de acordo com a Ação Direta de Inconstitucionalidade 178- 7 (item 2.2 da Emenda, DJ de 26.04.1996) não é permitida, em tempo algum, a conversão do tempo de exercício de magistério para qualquer espécie de benefício” não tem embasamento legal relativamente ao professor vinculado ao RGPS.
É certo que os servidores públicos que exercem as funções de magistério não poderiam converter o tempo laborado como professor em tempo comum, tendo em vista que, no caso do servidor público, a aposentadoria é específica, e a instituição da aposentadoria especial necessitaria ser definida por lei complementar, ainda não editada.
4.5. Aposentadoria Especial dos Policiais Civis
Questão inçada de dificuldades refere-se à norma de aplicação à aposentadoria do policial civil. Com efeito, antes da Constituição de 1988, a questão era regida pelo disposto na Lei Complementar 51, de 20.12.1985, nos seguintes termos:
Art. 1º. O funcionário policial será aposentado:
I – voluntariamente, com proveitos integrais, após 30 (trinta) anos de serviço, desde que conte, pelo menos 20 (vinte) anos de exercício em cargo de natureza estritamente policial;
II – compulsoriamente, com proventos proporcionais ao tempo de serviço, aos 65 anos (sessenta e cinco) anos de idade, qualquer que seja a natureza dos serviços prestados.
Com certa desconfiança a referida norma teria sido recepcionada pela redação original da Constituição de 1988, especialmente em relação ao disposto no art. 40, § 1º, segundo o qual a lei complementar poderia estabelecer exceções às regras de aposentadoria para o caso de exercício de atividades consideradas penosas, insalubres ou perigosas. A referência feita pela norma à atividade perigosa seria o mote para a recepção da LC 51/85 pela redação original do art. 40, § 1º, da Constituição de 1988.
Porém, com o advento da EC 20/98 e a consequente alteração da redação do art. 40, § 1º, da Constituição de 1988, transformado no § 4º, as dúvidas sobre a recepção da LC 51/85 aumentaram em face do novo texto, eis que o mesmo exigia tempo de atividades exercidas exclusivamentesob condições especiais que prejudicassem a saúde ou a integridade física, a serem definidos em lei complementar. Ocorre que o art. 1º, da LC 51/85 não se refere à exclusividade do tempo, já que dos 30 anos, apenas 20 são exigidos em atividade policial.
O Superior Tribunal de Justiça firmou posição no sentido da não recepção da LC 51/85:
Recurso ordinário. Mandado de Segurança. Servidor Público. Comissário da Polícia Civil do Estado de Santa Catarina. Aposentadoria especial. Inexistência de direito líquido e certo, em face do art. 40, CR/88 por não se tratar de trabalho em condições insalubres ou que coloquem em risco a integridade física do servidor.
Recurso desprovido. 1. A CR/88, em seu art. 40, § 4º, só admite a aposentadoria especial de servidor público, pelo efetivo exercício em condições insalubres ou que coloquem em risco a integridade física do servidor. 2. Não há que se falar em aposentadoria especial dos servidores da polícia civil do Estado de Santa Catarina, nos termos da Lei Complementar Estadual nº 51/85, que não foi recepcionada pela CR/88. 3. Recurso desprovido. (STJ – 6ª T. – RMS 14.976/SC – Rel. Min. Paulo Medina – DJU 16.05.2005, p. 417)
O Superior Tribunal de Justiça ainda entendeu necessário que a lei complementar fosse federal:
Recurso em Mandado de Segurança. Administrativo. Aposentadoria especial. Policial. Contagem de tempo de serviço prestado especificamente naquela função. Lei Complementar 51/85. Disposição constitucional. Exceção. Interpretação restritiva. Necessidade de legislação federal. Conforme precedente análogo (RMS 10.457/RO), somente legislação federal, e não estadual, poderia dispor sobre o tema proposto (exceção do art. 40, § 4º da Constituição, coma disposição dada pela Emenda Constitucional 20/98), sendo mesmo inviável pretender se beneficiar de legislação anterior à vigência da atual Constituição. Recurso desprovido. (STJ – 5ª T. – RMS 13.848/MG – Rel. Min. José Arnando da Fonseca – DJU 01.07.2002)
Em seguida, a EC 47/05 alterou a redação do art. 40, § 4º, da Constituição de 1988 e suprimiu a exigência da exclusividadecom relação ao tempo de serviço policial. Em face disso poderia ser admitida a repristinação da LC 51/85? Entendo que não, em razão de vedação expressa contida no art. 2º, § 3º, da Lei de Introdução ao Código Civil, já que não houve qualquer ressalva a respeito.
Contudo, há posicionamento diverso daquele esposado pelo STJ no RMS 13.848/MG, ao dispor que apenas lei complementar federal, e não estadual, poderia dispor sobre a aposentadoria especial dos policiais civis. Isto porque admitir apenas lei complementar federal seria desrespeitar o disposto no art. 24, XII, da Constituição de 1988, que prevê ser competência legislativa concorrente entre Estados e a União dispor sobre previdência social, máxime considerando o disposto no § 3º do mesmo art. 24 da Constituição de 1988, segundo o qual inexistindo lei federal sobre normas gerais, os Estados exercerão a competência legislativa plena, para atender a suas peculiaridades.
Assim, é possível lei complementar estadual dispor sobre a aposentadoria especial dos policiais civis no uso de sua competência legislativa plena, até a superveniência de lei federal que trate do assunto (CF, art. 24, § 4º).
Entretanto, a legislação estadual não pode simplesmente remeter à lei complementar federal, no caso a Lei Complementar 51/85, eis que revogada, por isso a Emenda à Constituição do Estado de Minas Gerais 68/04 tornou-se inócua, eis que apenas fazia remissão à lei complementar federal inexistente. Nestes termos é o Parecer 14.550-AGE/MG, da lavra do Procurador Sérgio Pessoa de Paula Castro, aprovado pelo Advogado-Geral e pelo Governador do Estado, publica- do no Diário Oficial de Minas Gerais em 23.09.2005 cuja ementa é a seguinte:
Lei Complementar Federal n. 51, de 20.12.1985. Aposentadoria especial. Constituição da República de 1988 com a redação dada pela Emenda Constitucional n. 20, de 16.12.1998 e pela Emenda Constitucional 47, de 05.07.2005. Emenda Constitucional 68, de 20.12.2004 à Constituição mineira. Exame da jurisprudência a respeito da matéria. Prevalência da tese jurídica da não recepção da legislação complementar federal objurgada. (CASTRO, 2004. p. 33).
Para suprir essa deficiência foi editada a Lei Complementar Estadual 98/07, que tem os seguintes termos:
Art. 20-A. Será adotado regime especial de aposentadoria, nos termos do art. 40, § 4º, incisos II e III, da Constituição Federal, para os ocupantes dos cargos de provimento efetivo que integram as carreiras policiais civis, cujo exercício é considerado atividade de risco.
Art. 20-B. O servidor policial civil será aposentado voluntariamente, independentemente da idade, após trinta anos de contribuição, desde que conte, pelo menos, vinte anos de efetivo exercício nos cargos a que se referem os incisos I a IV do art. 7º desta Lei.
§ 1º Para a obtenção do prazo mínimo de vinte anos a que se refere o caput deste artigo, poderá ser considerado o tempo de serviço prestado como militar integrante dos quadros da Polícia Militar do Estado de Minas Gerais.
§ 2ºOs proventos do policial aposentado na forma do caput deste artigo corresponderão à totalidade da remuneração do cargo efetivo em que se deu a aposentadoria e serão revistos, na mesma proporção e data, sempre que se modificar a remuneração dos servidores em atividade, sendo estendidos ao policial aposentado quaisquer benefícios ou vantagens posteriormente concedidos a esses servidores, inclusive os decorrentes da transformação ou reclassificação do cargo ou função em que se deu a aposentadoria.
Não há qualquer inconstitucionalidade nos citados dispositivos da referida lei estadual, tanto no aspecto formal, quanto no material, eis que foi editada no uso da competência legislativa plena do Estado de Minas Gerais, ante a inexistência de lei complementar federal (CF, art. 24, XII e §§ 3º e 4º), estando ainda em consonância com o disposto no art. 40, § 4º, da Constituição de 1988, que remete ao legislador complementar a possibilidade de excepcionar, da maneira autônoma que entender, as regras dispostas nos demais dispositivos do citado art. 40 da Constituição de 1988.
5. CONCLUSÃO
Os princípios da Seguridade Social são fontes informadoras do legislador e fundamento axiológico da norma jurídica para o aplicador do direito. Os princípios previdenciários constitucionais fundamentais são aqueles que ocupam uma posição hierarquicamente superior às demais normas jurídicas. Dentre os princípios constitucionais gerais, aqueles que impõem diretrizes básicas a todas as áreas do direito, inclusive à Seguridade Social, destacam-se a solidariedade, a liberdade, a igualdade, a legalidade, a dignidade humana, o direito adquirido e o devido processo legal.
O sistema de Seguridade Social no Brasil é o conjunto integrado de ações de iniciativa dos poderes públicos e da sociedade destinado a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.
A Constituição Federal prevê três tipos de regimes previdenciários, ou seja, três formas de proteção social: o Regime Geral de Previdência Social (RGPS), o regime próprio de previdência social (RPPS) concedido aos servidores públicos civis e militares e o regime de previdência privada.
O pensamento jurídico assimilou a compreensão de que as normas constitucionais são todas as regras que integram uma Constituição e que, dotadas de supremacia, situam-se no vértice do ordenamento jurídico e servem de fundamento e validade a todas as demais normas.
A concepção jurídica de Constituição, denominada de “normativismo jurídico”, que considera apenas como direito positivo o “puro dever-ser”, sem qualquer pretensão à fundamentação sociológica ou filosófica, ou seja, meramente formalista, está superada. A doutrina moderna se preocupa com um conceito material de Constituição que possa adequar o direito à realidade social ou possibilite a modificação dessa realidade pela norma jurídica.
A norma constitucional é o modelo de ordenação juridicamente vinculante e orientada à concretização material, constituída por meio de um programa normativo e por um conjunto de fatores econômicos e sociais que sintetizam os valores do Estado Democrático de Direito.
A regra do direito adquirido (artigo 5º, inciso XXXVI) dirige-se, originariamente, ao legislador e provoca reflexos nos órgãos judiciários e administrativos, alcançando, ainda, o constituinte derivado.
Em função da não-retroatividade que está protegida pelo artigo 60, § 4º, da Constituição Federal, as emendas à Constituição e as leis infraconstitucionais não podem ferir o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada, não alcançando o poder constituinte originário.
A expectativa de direito configura-se por uma seqüência de elementos constitutivos, cuja aquisição faz-se gradativamente. Portanto, não se trata de um fato jurídico que provoque instantaneamente a aquisição de um direito. O direito está em formação e constitui-se quando o último elemento advém. Se houve fatos adequados para a sua aquisição, que, contudo, ainda dependem de outros fatos não ocorridos, caracteriza-se uma situação jurídica preliminar. Logo, o interessado tem expectativa em alcançar o direito em formação, ou não.
As normas de transição se referem à disciplina de situação jurídica e se baseiam em expectativa de direito, não se tratando de direito adquirido, nem de direito consumado, pois não se perfizeram todas as condições necessárias à sua aquisição. Nesse contexto, as normas de transição estabelecem um regime intermediário entre a lei antiga e a lei nova e atendem ao interesse público.
As causas geradoras das reformas previdenciárias no direito brasileiro se originaram na dinâmica demográfica com a diminuição da taxa de mortalidade e da taxa natalidade, e o conseqüente aumento da longevidade da população.
No campo econômico, a informalidade, gerada pelo desemprego e pelos baixos salários, diminuiu a receita do orçamento da seguridade, o que causou o desequilíbrio financeiro e a atuarial do sistema.
A Emenda Constitucional n. 20/1998, quanto ao caráter contributivo dos servidores ativos e inativos, estabeleceu: a) obrigatoriedade de contribuição (princípio da contributividade) e necessidade de equilíbrio financeiro e atuarial; b) inseriu no texto constitucional o regime de previdência privada de caráter complementar, autonomia com relação ao Regime Geral de Previdência Social, exigências de reservas matemáticas, facultatividade e regulamentação por lei complementar; c) desconstitucionalizou o cálculo do benefício de aposentadoria, antes previsto no artigo 202, da Constituição originária de 1988, passando o cálculo a ser regulamentado por de lei ordinária que criou o fator previdenciário, conjugando na sistemática do cálculo fatores como idade, tempo de contribuição e expectativa de sobrevida do segurado visando ao equilíbrio financeiro e aturial do regime.
A EC n. 20/98 modificou a redação do artigo 195, incisos I e II da Constituição Federal com finalidade de ampliar as fontes de custeio do regime geral. Isentou no inciso II os benefícios de aposentadorias e pensões da incidência de contribuição previdenciária.
A Emenda Constitucional n. 41/2003, quanto ao regime próprio de previdência dos servidores públicos, estabeleceu: a) aproximação dos dois subsistemas previdenciário público (RGPS e RPPS), financiados mediante repartição simples e aportes orçamentários; b) aproximação do regime privado de previdência complementar dos servidores públicos empregados de empresas estatais com o regime de previdência complementar aplicável aos titulares de cargos efetivo; c) ampliação do distanciamento do regime de previdência dos servidores civis em relação ao regime de previdência dos militares, englobado no Regime Próprio de Previdência Social; d) vinculação entre os sistemas de repartição do sistema público e o regime de capitalização da previdência complementar, mas mantendo os sistemas diferenciados e regidos por regras próprias. 236
As alterações trazidas pela Emenda n. 41/2003 ao regime próprio da previdência dos titulares de cargos efetivos não igualou o funcionamento do sistema público próprio ao Regime Geral de Previdência Social, nem ao regime jurídico de previdência complementar, que continuam com regras diferenciadas.
A Emenda Constitucional n. 47, de 05/12/2005, provocou profunda alteração nas regras de transição do sistema previdenciário, ECs n. 20/1998 e n. 41/2003, que refletiu mais efetivamente sobre os servidores públicos do Regime Próprio de Previdência Social e, em parte, no regime geral; irradiou efeitos sobre as minorias discriminadas (portadores de deficiências e parte de trabalhadores da informalidade, como donas-de-casa e trabalhadores de baixa renda que pertençam a famílias de baixa renda, como desempregados e estudantes), o que a emenda denominou de “sistema especial de inclusão previdenciária”. Essas alterações ocorreram por meio de normas de eficácia limitada, pois dependem de regulamentação por lei infraconstitucional, que não poderá escusar-se de fixar alíquotas diferenciadas, respeitando o preceito constitucional que ordena o caráter contributivo e o equilíbrio financeiro e atuarial do sistema protetivo.
É lamentável que o Poder Executivo federal não teve a sensibilidade suficiente para enviar também o projeto de lei complementar visando regulamentar a aposentadoria especial dos servidores públicos titulares de cargos efetivos deficientes, a que se refere o inc. I do § 4º do art. 40, da Constituição de 1988.
A ausência de tal regulamentação, além de ser um prejuízo aos direitos fundamentais dos servidores públicos deficientes, constitui a manutenção de uma inconstitucionalidade por omissão, que deve ser, o quanto antes, suprida por lei complementar. Mas, enquanto a norma jurídica não vem, compete aos servidores públicos deficientes eleger a via do mandado de injunção para efetivar os seus direitos relativos à aposentadoria especial. Já existe o precedente do MI 1.967, da relatoria do Ministro Celso de Mello, do STF, pelo qual um servidor deficiente teve o direito de ter seu pedido de aposentadoria especial analisado pela autoridade competente, nos moldes da aposentadoria em atividades exercidas em condições especiais que prejudiquem a saúde ou integridade física.
Registre-se também a existência do MI 1.614, da relatoria do Ministro Marco Aurélio que reconheceu direito dos servidores auditores fiscais de terem seu pedido de aposentadoria especial analisado pela autoridade competente, por se tratar de atividade de risco.
Convém anotar que, em decorrência do direito à contagem recíproca do tempo de contribuição previsto no art. 40, § 9º, e art. 201, § 9º, ambos da CF/88, o tempo especial deverá ser contado como tal em qualquer dos regimes a que estiver sujeito o servidor. Nesse sentido é perfeitamente possível que o tempo especial realizado na iniciativa privada seja averbado como especial no serviço público e vice-versa.
Por fim, vale destacar que os servidores devem ter direito à conversão do tempo especial em comum, nos moldes estabelecidos pelo art. 57, § 5º, da Lei 8.213/91, até o momento aplicável à espécie. Não se trata de tempo ficto, mas de tempo real convertido para outra modalidade de aposentadoria. O STJ na AR 3.320-PR já fixou o entendimento de que os servidores públicos federais têm direito de contagem do tempo especial nos moldes do RGPS, antes da Lei 8.112/90, considerando a mudança de seu regime jurídico administrativo. Entendo que também tenham esse direito após a Lei 8.112/90, considerando o novo entendimento do STF sobre o direito à aposentadoria especial.
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Publicado por: Fabio Leal de Oliveira
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