ABORTO DE MICROCÉFALO: UMA AGRESSÃO AOS PRECEITOS FUNDAMENTAIS DO NASCITURO

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1.  RESUMO

O presente trabalho de conclusão de curso visa ampliar a discussão acerca da polêmica sobre a possibilidade da descriminalização do aborto em casos de microcefalia, principalmente em tempos de epidemia do Zika Vírus, o que constitui uma ofensa aos direitos fundamentais do nascituro, sobretudo o direito à vida. A microcefalia trata-se de uma má formação e tem como consequência o não crescimento suficiente do cérebro durante a gravidez ou após o nascimento, ocorrendo em diversos casos um retardo mental, fazendo com que a criança venha a sofrer com problemas de locomoção, surdez e convulsões. Várias gestantes de nascituros com microcefalia pensam nas dificuldades que enfrentará caso levem a gravidez adiante, mas esquecem da gravidade da agressão que estão cometendo contra seus próprios filhos e a si mesmas. Desta forma, deve existir uma atenção maior do Estado, buscando informa-las que um feto diagnosticado com microcefalia tem plena expectativa de vida que uma criança saudável possui, seu nascimento é algo certo e esperado, porém é importante o apoio familiar e governamental para que a criança nascida com microcefalia venha a ter uma vida digna, independentemente de suas limitações. A metodologia aplicada é bibliográfica, com intuito de observar os fatos e fenômenos exatamente como ocorrem na realidade, bem como o estudo da legislação referente ao tema.

PALAVRAS-CHAVE: Aborto de Microcéfalo. Nascituro. Zika Vírus. Direito à Vida. Dignidade da Pessoa Humana.

ABSTRACT

The present study aims to broaden the discussion about the controversy about the possibility of decriminalization of abortion in cases of microcephaly, especially in times of epidemic of the Zika Virus, which is an offense against the fundamental rights of the unborn child, especially the right to life. Microcephaly is malformed and results in insufficient growth of the brain during pregnancy or after birth, and in many cases there is mental retardation, causing the child to suffer with problems of locomotion, deafness and seizures. Several pregnant women with microcephaly think of the difficulties they will face if they carry the pregnancy forward, but forget the seriousness of the aggression they are committing against their own children and themselves. In this way, there must be a greater attention of the State, seeking to inform them that a fetus diagnosed with microcephaly has full life expectancy that a healthy child has, its birth is something certain and expected, but it is important the family and governmental support so that the child born with microcephaly will live a dignified life regardless of its limitations. The applied methodology is bibliographical, in order to observe the facts and phenomena exactly as they occur in reality, as well as the study of the legislation related to the subject.

KEY WORDS: Abortion of Microcephalus. Unborn. Zika virus. Right to life. Dignity of the Human Person.

2. INTRODUÇÃO

Nos últimos anos muito se tem falado sobre a possibilidade da descriminalização do aborto para gestantes de microcéfalos, principalmente após a chegada ao Brasil do zika vírus, sua epidemia e sua direta relação como causa do crescimento de casos de bebês portadores de microcefalia. Da mesma forma, tem aumentado o debate acerca do tema, com posições contundentes contra e a favor, indo para uma discussão maior, que é o direito à vida do nascituro e todas as demais garantias constitucionais consequentes.

O aborto no Brasil ainda é assunto que divide opiniões, especialmente quando está em jogo o risco de morte da gestante ou quando há diagnóstico de má formação do feto, com um possível nascimento com anomalias que irão prejudicar a qualidade de vida do bebê e, consequentemente, o sofrimento de sua mãe e família. A microcefalia é um exemplo de síndrome que, caracterizada pelo não desenvolvimento completo do cérebro pode trazer para a criança sérias complicações, e que, é tida hoje como um dos principais motivos da busca pela interrupção da gestação.

O portador da microcefalia, além da principal característica aparente que é a cabeça pequena, poderá ter que conviver com diversas consequências da doença como o atraso mental, convulsões, alterações físicas como dificuldade para andar, hiperatividade e problemas de fala, podendo ainda necessitar de ajuda para tomar banho e comer, sequelas que, sabidas após o diagnóstico da doença, podem assustar a gestante e fazê-la pensar na interrupção da gravidez. Porém, a depender do momento desse diagnóstico é possível que o microcéfalo tenha um bom desenvolvimento, desde que bem acompanhado por profissionais fisioterapeutas, fonoaudiólogos, terapeutas ocupacionais, entre outros.

Os que defendem o aborto do nascituro diagnosticado com a microcefalia levam em consideração todos estes aspectos inerentes à má prestação da saúde pública no Brasil, como a precária oferta de serviços de especialidades médicas no Sistema Único de Saúde (SUS) e o sucateamento de suas unidades básicas. Os que defendem a vida do nascituro entendem como possível a fiscalização desses setores e a busca pelo direito à saúde, presente em nossa Carta Magna de 1988, a fim de garantir ao microcéfalo todas as condições necessárias a uma vida digna e saudável.

O presente trabalho, que será de cunho bibliográfico, utilizando-se também de artigos e dissertações publicadas na rede mundial de computadores, tem como cerne principal ampliar essa discussão em torno desse tema tão atual, como forma de trazer à tona questões de ordem moral, social e religiosa, porém, principalmente, com o foco de despertar em todos nós a conscientização para a preservação de valores fundamentais do ser humano, garantidos constitucionalmente, sobretudo o nosso bem maior: a vida.

Como pontapé inicial de tão relevante discussão, iniciamos o presente trabalho fazendo um apanhado, no primeiro capítulo, sobre os direitos do nascituro positivados no Código Civil Brasileiro de 2002, uma breve exposição conceitual sobre as teorias que explicam a personalidade jurídica do nascituro e seu direito à vida, além de discorrermos sobre o início da vida e o princípio da Dignidade da Pessoa Humana.

No segundo capítulo, adentramos em questões mais específicas inerentes ao Aborto e a Microcefalia, fazendo uma explanação sobre o Aborto no Brasil, onde buscamos expor o que há de legislação vigente nesse sentido, partindo em seguida para os tipos de aborto elencados na doutrina. A doença da microcefalia é assunto ainda tratado neste capítulo, onde se cuida em trazer sua origem, principais causas e principais sequelas e sua atual ligação com o Zika Vírus. Para encerrar o segundo capítulo, traça-se um diagnóstico da microcefalia no Brasil, com indicação de como se deu esse aumento de casos, regiões com maior incidência da doença e indicações de como o país vem se comportando em relação a essa nova realidade na saúde pública.

O aborto de microcéfalos é tratado mais especificamente no terceiro e último capítulo do presente trabalho, fazendo-se uma exposição do que há de mais recente na legislação brasileira sobre o assunto, a exemplo da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5581, ajuizada no Supremo Tribunal Federal (STF) em 2016, por um grupo de advogados e ativistas, encabeçado pela antropóloga Débora Diniz, que esteve à frente do pedido de legalização do aborto de anencéfalos, aprovado em 2012, e que agora busca junto ao Supremo Tribunal Federal a mesma legalização para o aborto de microcéfalos. Neste capítulo também, fazemos uma análise das posições favoráveis e desfavoráveis à legalização do aborto para gestantes com fetos diagnosticados com microcefalia, adentrando na questão do direito à saúde do microcéfalo e uma breve exposição sobre como vivem as crianças portadoras de microcefalia no Brasil, onde utilizamos exemplos reais de pessoas que convivem com a síndrome em questão, suas limitações e desafios.

Nas Considerações Finais buscamos expor nossa opinião a respeito do tema trabalhado, colocando o direito à vida como valor supremo, os princípios como norteadores e expondo os motivos que nos levam a considerar o aborto de microcéfalos uma agressão aos preceitos fundamentais do nascituro, tomando como base toda a legislação vigente atualmente no Brasil, sobretudo a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, o Código Civil Brasileiro de 2002, o Código Penal Brasileiro de 1940 e demais jurisprudências e legislação especial.

3. O NASCITURO COMO SUJEITO DE DIREITOS

3.1. O Nascituro no Direito Civil Brasileiro

O termo nascituro vem do latim nascitūrus, que significa aquele que vai nascer, refere-se ao que foi gerado e ainda não nasceu. É considerado também sinônimo de feto e como o produto da concepção que ainda não foi retirado do ventre, é o ser vivo que ainda estar por nascer, é o ente já concebido, mas ainda não nascido.

O art. 2º do Código Civil brasileiro estabelece que o nascituro tem seus direitos assegurados pela lei desde a sua concepção, porém o feto só vai adquirir personalidade civil no momento em que nascer, ou seja, sair do ventre materno. Seus direitos ficam sob condição suspensiva porque ele, enquanto nascituro, detém apenas expectativa de direito, e estes são condicionados ao seu nascimento com vida.

É importante salientar que o nascimento com vida é aquele em que o bebê sai do ventre materno e respira nem que seja por milésimos de segundo.

Mesmo que o nascituro, ao ser concebido, possua alguns direitos inerentes a ele desde a sua concepção, ele ainda não possui a personalidade jurídica, pois esta só passa a existir após o seu nascimento com vida. Porém, o mesmo é possuidor de direitos limitados, aqueles os quais são garantidos após a sua concepção, que são o direito à vida, direito a alimentos, direito a representação, direito a receber doação, direito de suceder, entre outros.

No dia 19 de março de 2007, foi apresentado na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei (PL 489/2007), pelo deputado Luiz Bassuma (PT-BA), que dispõe sobre o Estatuto do Nascituro, visando garantir a proteção a qualquer óvulo humano fecundado por um espermatozoide, mesmo que o processo tenha sido realizado in vitro, e não tenha sido inseminado.

O projeto de lei tem sido alvo de muitas discussões e críticas. O texto original defendia a alteração do código Penal Brasileiro para considerar o aborto como crime hediondo, proibindo a prática em todos os casos, além de vetar o congelamento, descarte e comércio de embriões humanos, com a finalidade de serem usados como células tronco, para transplante em doentes.

Em junho de 2013, o Estatuto do Nascituro foi aprovado na Câmara dos Deputados e ainda está sob análise da Comissão de Constituição e Justiça do Senado para em seguida ser apresentado e votado em plenário.

A partir do exposto, podemos concluir que a personalidade jurídica é um assunto que divide opiniões, das quais surgem diversas teorias acerca do assunto que serão explanadas detalhadamente nos tópicos seguinte.

3.1.1. Teoria Natalista

A Teoria Natalista defende que a personalidade tem início a partir do nascimento com vida, e que o nascituro possui uma mera expectativa de direito. O nascimento com vida é um pressuposto para adquirir a personalidade.

Para essa teoria, o nascituro ainda não é considerado pessoa, portanto não seria titular de direitos, pois o mesmo não possui vida independente, estando ligado à sua genitora para que possa manter o principal de seus direitos, a vida.

Carlos Roberto Gonçalves, adepto dessa teoria, nos fala:

Muitas são as críticas à mencionada teoria. Afirma-se, por exemplo, que, entendendo que o nascituro não é uma pessoa, admite-se a referida teoria que deve ser tratado com uma coisa; olvida-se, ainda, de que há, no Código Civil, um sistema de proteção ao nascituro, com as mesmas conotações da conferida a qualquer ser dotado de personalidade. (GONÇALVES, 2013, p. 101)

O artigo 2º, do atual Código Civil de 2002, embora tenha melhorado a redação do antigo Código Civil de 1916, em seu artigo 4º, continuou com a adoção desta teoria para explicar o início da personalidade civil da pessoa.

3.1.2. Teoria Concepcionista

A Teoria Concepcionista assegura que a personalidade jurídica inicia desde a concepção, independentemente de qualquer condição para que seja concretizada a personalidade do nascituro.

Essa corrente defende que o nascituro deve ser considerado pessoa a partir do momento da sua concepção, dando a ele seus respectivos direitos e deveres para figurar como um sujeito de direitos no mundo jurídico.

Alguns doutrinadores que seguem essa teoria entendem que o nascituro é uma pessoa natural, como qualquer outra, pelo fato de haver direitos resguardados pela lei.

Silmara Juny Chinellato, explana que:

O nascimento com vida apenas consolida o direito patrimonial, aperfeiçoando-o. O nascimento sem vida atua, para a doação e a herança, como condição resolutiva, problema que não se coloca em se tratando de direitos não patrimoniais. De grande relevância, os direitos da personalidade do nascituro, abarcados pela revisão não taxativa do art. 2º. Entre estes avulta o direito à vida, à integridade física, à honra e à imagem, desenvolvendo-se cada vez mais a indenização de danos pré-natais, entre nós com impulso maior depois dos Estudos de Bioética. (ALMEIDA, 2000, p. 134)

Portanto, entende-se que, a personalidade jurídica se divide em duas esferas: a personalidade jurídica patrimonial, a qual o nascituro só adquire a partir de seu nascimento com vida, e a personalidade jurídica formal, onde ele adquire desde a sua concepção.

3.1.3. Teoria Condicionalista

A Teoria Condicionalista ampara que a personalidade começa com a concepção, mas é necessário que a criança nasça com vida, é o que garante os direitos adquiridos desde a concepção, mesmo que o recém-nascido morra segundos após ter vindo ao mundo.

Apesar da Personalidade Jurídica iniciar na concepção, ela fica sob uma condição suspensiva, até que o nascituro venha a nascer com vida, para que se torne titular dos direitos e contraia obrigações para si.

Washington de Barros Monteiro apud Nathan Lino, esclarece:

Discute-se se o nascituro é pessoa virtual, cidadão em germe, homem in spem. Seja qual for a conceituação, há para o feto uma expectativa de vida humana, uma pessoa em formação. A lei não pode ignorá-lo e por isso lhe salvaguarda os eventuais direitos. Mas para que estes se adquiram, preciso é que ocorra o nascimento com vida. Por assim dizer, nascituro é pessoa condicional; a aquisição da personalidade acha-se sob a dependência de condição suspensiva, o nascimento com vida. A esta situação toda especial chama Planiol de antecipação da personalidade. (SILVA, 2014, p. 3-4) (Grifos do Autor)

Nessa Teoria, a personalidade do nascituro só passa a ser reconhecida, caso o mesmo venha a nascer com vida, no entanto, indo por essa corrente, passaria a existir nascituros com e sem personalidade.

3.2. O Início da Vida

Inexiste definição legal do que seja o início da vida humana à luz da constituição, pois até hoje existem grandes discussões, entre os cientistas, de quando a vida tem seu marco inicial.

A própria ciência não traz uma definição concreta de quando inicia a vida humana, pois existem várias respostas acerca de quando a vida tem seu início.

Na visão genética, a vida inicia no momento em que o óvulo é fecundado pelo espermatozoide, gerando a partir dali a formação de um indivíduo. Essa tese é defendida pela igreja católica e algumas igrejas protestantes, também defendida pelo cientista Jerome Lefeune, professor da Universidade René Descartes, em Paris.

Lefeune apud Martins e Carvalho, nos diz:

Não quero repetir o óbvio, mas na verdade, a vida começa na fecundação. Quando os 23 cromossomos masculinos se encontram com os 23 cromossomos femininos, todos os dados genéticos que definem o novo ser humano estão presentes. A fecundação é o marco do início da vida. Daí para frente, qualquer método artificial para destruí-la é um assassinato. (MARTINS E CARVALHO, 2013, p.101.)

Além da visão genética, existem, no mínimo, outras quatro grandes visões acerca do início da vida.

A visão embriológica, nos fala que a vida inicia após a 3ª semana de gestação, quando é estabelecida a individualidade humana. Na visão neurológica, a vida tem início quando o feto apresenta atividade cerebral igual ao de uma pessoa. Para a visão ecológica, a vida tem seu início quando o feto tem a capacidade de sobreviver fora do útero. E por fim a visão metabólica, que afirma que o começo da vida humana é irrelevante, uma vez que não existe momento único no qual a vida tem seu início, pois os óvulos e os espermatozoides são tão vivos quanto qualquer ser humano.

Segundo Lefeune apud Martins e Carvalho:

(...) a vida humana começa na concepção, isto é, no momento em que o espermatozoide entra em contato com o óvulo, fato que ocorre já nas primeiras horas após a relação sexual. É nessa fase, na fase do zigoto, que toda identidade genética do novo ser é definida. A partir daí, segundo a ciência, inicia a vida biológica do ser humano. Todos fomos concebidos assim. O que somos hoje geneticamente, já o éramos desde a concepção. (MARTINS E CARVALHO, 2013, p. 101)

São diversas teorias que tratam sobre o início da vida humana, cada uma fundamentada em um parâmetro diferente, porém o Pacto de São José da Costa Rica, o qual o Brasil assinou, afirma que a vida deve ser protegida desde a sua concepção pelo fato de ser comprovado cientificamente que existe vida humana após a fecundação.

Diante disso, reconhecendo que a vida humana começa na concepção, o Código Civil Brasileiro em harmonia com a Constituição Federal e o Pacto de São José da Costa Rica, estabelece em seu art. 2º que:

Art. 2º A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro.

Portanto, se a lei põe a salvo os direitos do nascituro desde a sua concepção, então a lei protege o mais importante desses direitos, que é o direito à vida.

3.3. O Direito a Vida do Nascituro

O direito à vida é uma garantia fundamental expressa na Constituição Federal, promulgada em 05 de outubro de 1988, onde, em seu art. 5º, caput, descreve:

Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade. (Grifos nossos)

Segundo Maria Helena Diniz, em seu livro sobre a inviolabilidade constitucional do direito à vida, sustenta:

O direito à vida, por ser essencial ao ser humano, condiciona os demais direitos da personalidade. A Constituição Federal de 1988, em seu art. 5º, caput, assegura a inviolabilidade do direito à vida, ou seja, a integralidade existencial, consequentemente, a vida é um bem jurídico tutelado como direito fundamental básico desde a concepção, momento específico, comprovado cientificamente, da formação da pessoa. Se assim é, a vida humana deve ser protegida contra tudo e contra todos, pois é objeto de direito personalíssimo. O respeito a ela e aos demais bens ou direitos correlatos decorre de um dever absoluto erga omnes, por sua própria natureza, ao qual a ninguém é lícito desobedecer... Garantido está o direito à vida pela norma constitucional em cláusula pétrea, que é intangível, pois contra ela nem mesmo há o poder de emendar...tem eficácia positiva e negativa...A vida é um bem jurídico de tal grandeza que se deve protegê-lo contra a insânia coletiva, que preconiza a legalização do aborto, a pena de morte e a guerra, criando-se normas impeditivas da prática de crueldades inúteis e degradantes...Estamos no limiar de um grande desafio do século XXI, qual seja, manter o respeito à dignidade humana. (DINIZ, 2009, p.32,34) (Grifos Nossos)

É notório que o direito à vida é o principal direito individual dos seres humanos, o maior bem jurídico tutelado pela ordem constitucional, uma vez que os demais direitos assegurados pela constituição são dependentes deste. Portanto, o direito à vida é um pressuposto básico de todos os demais direitos do ser humano.

Tais direitos são cláusulas pétreas, não podem ser suprimidas, nem mesmo emendadas, por serem esses direitos e garantias estabelecidas pelo constituinte originário, estando redigido em seu § 4º, inciso IV do artigo 60 da Constituição Federal de 1988 (CF/88):

§4º - Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir:

IV – Os direitos e garantias individuais.

Os direitos e garantias individuais não se restringem aqueles mencionados pelo art. 5º da Constituição Federal, pois não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou de tratados internacionais na forma dos § 2º e § 3º dos referidos artigos, assim redigidos:

§ 2º Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte.

§ 3º Os tratados e convenções internacionais sobre direitos humanos que forem aprovados, em cada Casa do Congresso Nacional, em dois turnos, por três quintos dos votos dos respectivos membros, serão equivalentes às emendas constitucionais.

A inviolabilidade da vida não é só declarada pela Constituição Federal Brasileira, mas também nos acordos internacionais sobre direitos humanos que o Brasil assinou, afirmando ser a vida inviolável.

A vida só pode ser interrompida por causas naturais, nenhum indivíduo pode tirar a vida do outro, a não ser em caso de guerra declarada, o que está prevista em nossa Carta Maior, em seu art. 5º, XLVII, alínea a.

A Constituição Federal de 1988 garante o direito à vida, devendo o Estado assegurar o direito de continuar vivo e o direito de ter meios de vida e subsistência, para ter uma vida digna.

Portanto, não há dúvidas de que a vida é o princípio mais importante existente na Constituição Federal, tornando-se um direito indispensável ao cidadão. Tal direito se comprova também no princípio da dignidade da pessoa humana, tema que abordaremos adiante.

3.4. O Princípio da Dignidade da Pessoa Humana

Antes de adentrar ao princípio da dignidade da pessoa humana, é importante destacarmos o significado da palavra dignidade. Segundo Buarque de Holanda (2000, p. 236) dignidade significa “qualidade de digno; Função, título, etc., que confere posição graduada. Honestidade”.

A dignidade é um atributo humano sentido e criado pelo homem, por ele desenvolvido e estudado, existindo desde os primórdios da humanidade, mas só nos últimos dois séculos percebido plenamente. Contudo, apesar de que quando o ser humano começou a viver em sociedades rudimentares organizadas, a honra, a honradez e a nobreza já eram respeitadas por todos do grupo, o que não era percebido e entendido concretamente, mas geravam destaque a alguns membros.

Plácido e Silva consigna que:

Dignidade é a palavra derivada do latim dignitas (virtude, honra, consideração), em regra se entende a qualidade moral, que, possuída por uma pessoa serve de base ao próprio respeito em que é tida: compreende-se também como o próprio procedimento da pessoa pelo qual se faz merecedor do conceito público; em sentido jurídico, também se estende como a dignidade a distinção ou a honraria conferida a uma pessoa, consistente em cargo ou título de alta graduação; no Direito Canônico, indica-se o benefício ou prerrogativa de um cargo eclesiástico. (PLÁCIDO, 1967, p. 526)

Podemos assim entender a dignidade como algo inerente ao próprio ser humano, aquilo que o distingue dos demais e que o aproxima da imagem e semelhança de Deus, o que o faz ser respeitado perante seus pares, o que o faz especial.

O princípio da dignidade da pessoa humana é um valor moral e espiritual inerente à pessoa, ou seja, todo ser humano é dotado desse preceito, e tal constitui o Princípio Máximo do Estado Democrático de Direito.

A sua formulação clássica foi dada por Immanuel Kant, na sua obra Fundamentação da Metafísica dos Costumes em 1785, na qual defendia que as pessoas deveriam ser tratadas como um fim em si mesmas e não como um meio (objetos), formulando assim esse princípio:

No reino dos fins tudo tem ou um preço ou uma dignidade. Quando uma coisa tem um preço, pode pôr-se em vez dela qualquer outra como equivalente; mas quando uma coisa está acima de todo o preço, e, portanto, não permite equivalente, então tem ela dignidade. (...) Esta apreciação dá, pois, a conhecer como dignidade o valor de uma tal disposição de espírito e põe-na infinitamente acima de todo preço. Nunca ela poderia ser posta em cálculo ou confronto com qualquer coisa que tivesse um preço, sem de qualquer modo ferir sua santidade. (KANT, 1980, p. 140)

A dignidade da pessoa humana abrange uma grande diversidade de valores existentes na sociedade e se constitui uma das questões mais frequentes nos debates bioéticos atuais. Trata-se de um conceito adequável à realidade e a modernização da sociedade, devendo estar sempre coligado com a evolução e as tendências modernas das necessidades do ser humano.

Sobre a Dignidade da Pessoa humana, Ingo Wolfgang Sarlet assim preceitua:

Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que asseguram a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. (SARLET, 2007, p.62)

A Dignidade da pessoa Humana é um valor supremo que compreende o conteúdo de todos os direitos fundamentais do homem desde o direito à vida.

A Carta Magna de 1988 traz como fundamentos da República Federativa do Brasil e, consequentemente, do Estado Democrático do Direito, a dignidade da pessoa humana, dispondo em seu art. 1º, inciso III:

A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:

III – a dignidade da pessoa humana.

Portanto, a norma constitucional protege desde logo a dignidade da pessoa como um bem supremo, devendo ser resguardada como princípio norteador dos demais direitos, fazendo ser garantido e respeitado pelo estado todo e qualquer direito inerente à pessoa e derivado de seus valores.

Ives Gandra da Silva Martins escreve:

O Estado pode criar diversos institutos, mas não pode criar aquilo que diz respeito ao ser humano, à sua vida, à sua dignidade. Afinal, a função do Estado, nesse caso, é apenas reconhecer e respeitar. E o nosso constituinte colocou dignidade humana como terceiro inciso, para já na enunciação dos princípios fundamentais, deixar claro que o Estado brasileiro é um Estado Democrático de Direito, ou seja, é aquele que assegura os direitos e garantias ao cidadão, perante a atuação do Estado. (MARTINS E CARVALHO, 2013, p. 96-97)

Desta forma, o princípio da dignidade da pessoa humana ao qual se reporta a ideia democrática como um dos fundamentos do Estado de Direito Democrático, torna-se o elemento referencial para a interpretação e aplicação das normas jurídicas, devendo ser tratado o homem não como mero objeto, mas como cidadão dotado de direitos e garantias constitucionais.

4. ABORTO E MICROCEFALIA

4.1. Aborto no Brasil

O Código Penal Brasileiro de 1940 tipifica o crime de aborto em seus artigos 124 a 128, onde mantem tal ato como uma prática criminosa.

Aborto nada mais é do que a privação do nascimento, ou seja, é a interrupção da gravidez com a consequente morte do produto da concepção. O objeto jurídico do tipo penal do aborto, ou melhor, o bem interessado protegido por lei é o amparo da vida humana durante a gravidez, qualquer que seja a fase desta, de modo que se busque sempre o nascimento com vida do feto.

Segundo Nelson Hungria apud Martins e Carvalho no livro “Inviolabilidade do Direito à Vida”,

O Código, ao incriminar o aborto, não distingue entre óvulo fecundado, embrião ou feto: interrompida a gravidez, antes de seu termo normal, há o crime de aborto. Qualquer que seja a fase da gravidez (desde a concepção até o início do parto, isto é, até o rompimento da membrana amniótica), provocar sua interrupção é cometer o crime de aborto. (MARTINS E CARVALHO, 2013, p. 199)

A proteção jurídica tem início desde a concepção ou fecundação, ou seja, no momento em que a célula reprodutora feminina se encontra com o espermatozoide masculino, onde logo após esse encontro, estão presentes todos os dados genéticos de um ser humano. Portanto, a partir daí qualquer método realizado a fim de destruir esse novo ser, pode ser considerado crime.

Alguns juristas entendem que só há gestação quando o óvulo fecundado é depositado no ventre materno (nidação), daí em diante pode-se dizer que já existe um novo ser em desenvolvimento no útero. Portanto, para esses juristas que possuem tal entendimento, após a nidação, qualquer método artificial com intuito de destruir esse novo ser, é um assassinato.

A ciência tem definido o início da gravidez somente a partir da fecundação. Analisando pelo lado da ciência, quanto ao início da gravidez, aquelas mulheres que após a relação sexual tomam remédio contraceptivo, estaria praticando o aborto? Essa ação de tomar pílulas no dia seguinte após a exposição ao risco de gravidez constitui crime? No Brasil, não existe nenhuma proibição quanto ao uso desses remédios contraceptivos, portanto, todas as mulheres que tomam tal atitude logo após a relação sexual, não cometem crime por estarem no exercício regular de direito – excludente de ilicitude do art. 25 do Código Penal. Desse modo, qualquer que seja a corrente adotada, as mulheres que usam tais métodos contraceptivos, inclusive os médicos que indicam tomar tal atitude, não cometem o crime de aborto, por estarem cobertos por excludente de ilicitude.

4.2. Tipos de Aborto

Do latim aboriri, abortar significa a interrupção prematura do desenvolvimento e expulsão do concepto do útero, antes de se tornar viável, ou seja, capaz de viver fora do útero.

O aborto pode ser espontâneo ou induzido. São várias as causas e os motivos que podem levar à interrupção de uma gravidez, quer espontaneamente ou por indução. O aborto pode ser induzido de forma medicamentosa, utilizando como recurso um agente farmacológico, ou realizado por técnicas cirúrgicas, como a aspiração, dilatação e curetagem.

Na literatura existem vários tipos de aborto, porém, podemos classificar o crime de aborto em 4 tipos, que serão definidas pelas situações em que acontecem, resultando na retirada da vida do feto.

4.2.1. Aborto Natural

O aborto natural se dá pela interrupção espontânea da gravidez, também conhecido na sociedade por aborto espontâneo. Na maioria dos casos das mulheres que passam por essa situação o aborto se dá pelo fato do feto não se desenvolver de forma natural, e acabam sendo eliminados pelo próprio útero. Isso ocorre até as primeiras 20 semanas de gestação, sendo mais corriqueiro, na maioria dos casos, ocorrer da 10º a 12º semana gestacional. Em alguns casos, existem maiores chances da mulher sofrer um aborto natural, como é o caso de mulheres com idade avançada, ou mulheres que já possui um histórico de abortos anteriores por motivos de remédios contraceptivos, ou também com problemas uterinos.

Muitas vezes esse tipo de aborto passa despercebido, e nem sempre os sinais podem ser notados. Um leve sangramento, por exemplo, pode vir a ser um aborto, porém muitas vezes é entendido como uma menstruação por parte delas. Em outras situações, o aborto espontâneo acaba sendo acompanhado por uma cólica muito forte e um sangramento anormal.

4.2.2. Aborto Acidental

O aborto acidental ocorre através da interrupção da gravidez, acarretado por consequência de traumatismos, quedas, acidentes em geral.

O aborto acidental não constitui crime, pois a ação que levou ao fim da vida do feto não foi resultado da ação da própria gestante, mas sim de uma situação inesperada. A maioria dos casos de mulheres gravidas que perdem seus filhos ainda no ventre, é decorrente de acidentes automobilísticos.

Hoje em dia, algumas mulheres que não querem ser penalizadas pelo crime de aborto, buscam essa opção de tentar realiza-lo através de um acidente planejado, tentando se jogar de uma escada em um momento que ninguém a veja realizando esse ato, se jogando na frente de um carro, entre outros. Ocorre que, muitas mulheres que tentam o aborto de uma forma acidental, esquece que isso pode custar a própria vida, além da vida do próprio filho vivo em seu ventre.

4.2.3. Aborto Criminoso

Previsto nos artigos 124 a 127 do Código Penal Brasileiro, o aborto criminoso busca punir aqueles que tentam, de uma forma ou de outra, retirar a vida do feto. São hipóteses de interrupção forçada e voluntaria da gravidez, resultando na morte do produto da concepção.

O artigo 124 do Código Penal trata do aborto provocado pela própria gestante, ou com seu consentimento, que possui uma pena de um a três anos de detenção. A lei pune o auto aborto, independente do meio utilizado para retirar a vida do feto. A norma penal também pune a mulher gravida que consentiu um terceiro a realizar tal conduta, para resultar na morte do nascituro.

O aborto provocado por terceiro, está previsto nos artigos 125 e 126 do Código Penal. No artigo 125, temos o aborto provocado por terceiro sem o consentimento da gestante, onde a lei atribui pena de 3 a 10 anos de Reclusão, ou seja, alguém que não seja a gestante, que tente acabar com a vida daquele feto, responderá pelo crime de aborto, mesmo que a norma penal não estabeleça o meio empregado para abortar, mas que a ação adotada resulte na morte do embrião humano. Já no artigo 126, aquele que provocar o aborto com o consentimento da gestante, independente dos meios utilizados, responderá pelo crime, junto com a mãe, que permitiu que tal conduta fosse realizada e chegada ao resultado, porém a gestante que consentiu responderá pelo crime previsto no artigo 124 do mesmo código.

A forma qualificada no crime de aborto é citada pelo art. 127 do Código Penal, onde as penas dos artigos 125 e 126 do mesmo código são aumentadas de um terço, se a gestante sofrer algum tipo de lesão corporal grave, em consequência do aborto ou dos meios que são praticados para provoca-lo. A pena poderá ser duplicada, se além da morte do feto, o aborto resulte também na morte da gestante.

É importante ressaltar que esses aumentos de penas só são aplicados ao terceiro que provocar o aborto com ou sem o consentimento da gestante. Não se aplicam a gestante, por expressa disposição legal, pois a lei não pune a autolesão.

Essas regras, referente ao aumento da Pena, prevista no artigo 127, só são aplicadas quando o agente queria causar o aborto, mas não tinha a intenção de lesionar gravemente a gestante ou até mesmo a morte desta. Portanto, existe dolo referente ao aborto e culpa referente ao resultado agravador.

Acontece muito no dia a dia esse tipo de ato ilícito, pelo fato de no nosso país existir um grande número de abortos realizados por pessoas inexperientes na área médica, com instrumentos inadequados e sem quaisquer condições higiênicas, causando muitas vezes hemorragias e infecções que podem resultar lesão grave na gestante ou até mesmo a morte.

Esse aumento de pena é aplicado também quando o aborto não se consuma, mas a gestante sofre lesão corporal grave ou morre. Essa conclusão decorre do próprio texto da lei, que determina o aumento quando as lesões graves ou a morte constituem consequências do aborto ou dos meios empregados para provocá-lo.

4.2.4. Aborto Legal

A legislação penal, em seu art. 128, prevê duas espécies de aborto legal ou permitido, onde ambas são causas especiais de exclusão de ilicitude.

Primeiramente, o Aborto Necessário, onde não se pune o aborto praticado por médico, quando este entender que a gestante se encontra em perigo de vida. Cumpre salientar que não é necessário que o risco de vida da gestante seja atual, basta saber que a prolongação da gravidez colocará a vida da mulher em risco.

Como nós sabemos, existem muitas falhas por parte dos médicos referente ao diagnóstico de suas pacientes, portanto, caso esse médico suponha de forma errônea o perigo de vida da gestante diante das circunstâncias, ele não responderá pelo crime do aborto caso tenha praticado, pois será reconhecida a descriminante putativa, prevista no art. 20 do §1º do Código Penal, onde fala que será isento da pena quem por erro plenamente justificado pelas circunstâncias, supõe situação de fato que se existisse, tornaria a ação legítima.

O aborto realizado por enfermeira é considerado legal, quando a mesma entender que o perigo para a gestante é atual. O ato torna-se lícito devido ao estado de necessidade de terceiro, ou seja, da própria gestante. Entretanto, caso não exista situação de risco atual e a mesma pratica o aborto, esta responderá pelo crime.

O aborto no caso de gravidez resultante de estupro é a segunda espécie de aborto legal, amparada pela legislação penal, porém são necessários alguns requisitos para que esta prática seja realmente considerada lícita. Inicialmente, que o aborto seja realizado por médico e que para este procedimento haja o consentimento da gestante ou, quando incapaz, de seu representante legal.

Diferente do aborto necessário, que pode ser realizado pela enfermeira quando há risco atual para a gestante, essa hipótese de aborto permitido por lei não pode ser realizada por enfermeira, pois não existe situação de emergência para que a prática abortiva seja realizada de forma imediata.

Recentemente, o STF (Supremo Tribunal Federal) julgou procedente a ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) de nº 54, que legaliza o aborto em casos de anencefalia, permitindo que as mulheres grávidas de feto anencéfalo, optem em querer dar continuidade à gestação ou não.

A anencefalia se constitui em uma má formação do cérebro do nascituro, durante a fase do desenvolvimento no ventre materno, causando a inexistência total do cérebro e da caixa craniana do feto, não havendo possibilidade de vida extrauterina.

Portanto, diante de tal decisão, as gestantes que não desejarem continuar com a gestação de um feto anencéfalo, poderão optar pelo aborto realizado somente por médico, se constituindo numa terceira hipótese de aborto legal ou permitido.

4.3. A doença da Microcefalia

A microcefalia é uma condição neurológica rara em que o perímetro cefálico (tamanho da cabeça) encontra-se abaixo do esperado em comparação com o de outras crianças da mesma idade e sexo.

A etiologia da microcefalia é complexa e multifatorial, em que o cérebro não se desenvolve de maneira adequada, ou seja, essa doença é um sinal de que há alguma alteração no desenvolvimento cerebral. Ela pode estar associada a malformações estruturais do cérebro ou ser secundária a causas diversas.

A microcefalia pode ser classificada quanto à época em que surge, época em que se é feito o diagnóstico, por congênita, onde o bebê já apresenta desde o seu nascimento, ou podemos classificar ainda a microcefalia como secundária que se desenvolve no período pós-natal, quando a criança nasce com o tamanho do cérebro normal e em seu desenvolvimento ocorreu uma falha no crescimento do perímetro cefálico.

Existem alguns fatores que podem causar a microcefalia, como por exemplo, algumas doenças genéticas ou infecciosas, exposição a substâncias tóxicas ou desnutrição. Entre esses fatores citados, existem também outros que podem provocar a doença, como é o caso do Zika Vírus que pode atingir a gestante nos primeiros meses de gestação.

4.4. A Microcefalia no Brasil

Para termos um panorama da microcefalia no Brasil, faz-se necessário estudar seus principais causadores. Nos últimos anos, tem se tornado quase que inevitável fazer a associação desta síndrome com o Zika Vírus, por conta de sua intensa proliferação em solo nacional.

Para tentar identificar quando o Zika Vírus passou a circular pelo Brasil, foi preciso saber qual a sua origem. Pesquisadores buscaram detectar o DNA (ácido desoxirribonucleico) do vírus e chegaram à conclusão de que não era o mesmo de origem Africana, que se deu em Uganda desde 1947, mas se tratava do mesmo de família asiática.

Portanto, pelo fato de não saber quem foi o primeiro paciente que contraiu o vírus, os cientistas pensam que o marco inicial se deu na Copa das Confederações em 2013 ou no Campeonato de Canoagem em 2014, pelo fato de ter passado atletas de origem da Polinésia Francesa.

Dr. Carlos Brito, médico clínico e epidemiologista de Recife, acredita que o marco inicial do vírus se deu sim na Copa do Mundo de 2014, pois o mosquito transmissor do vírus, Aedes Aegypti, não aguardaria cerca de um ano para infectar diversos brasileiros. Foi após a copa mundial, de 2014 para 2015, que o mesmo passou a ter contato com diversos casos de doentes com dores e manchas na pele, que não pareciam ser de dengue ou chikungunya.

Portanto, foi através do contato com pacientes com sintomas diferentes que o Dr. Brito passou a tirar sua própria conclusão, de que o vírus teria chegado no mesmo período da Copa do Mundo de 2014.

Essa epidemia do vírus da zika se deu no Brasil pelo fato da situação precária em que se encontrava o país, em termos de saneamento e saúde pública. Era necessária a assistência do governo na saúde pública, prestando um serviço de qualidade e dando uma atenção maior aqueles novos casos que passaram a surgir. Essa epidemia do Zika vírus se deu de forma forte no Nordeste brasileiro, onde o Ministério da Saúde investigou mais de 1.200 casos que ali foram encontrados.

O vírus da Zika ganhou grande repercussão pelas mídias, em abril de 2015. Muitos telejornais noticiavam a multidão de infectados pelo zika vírus que buscavam assistência médica em hospitais. Dr. Carlos Britou buscava sempre entender os sintomas de cada paciente, realizando exames laboratoriais para tentar compreender de que tipo de doença se tratava, pois, a tríplice epidemia da dengue, zika e chikungunya, poderia esconder outros tipos de vírus.

Em meados de maio a outubro de 2015, apareceram novidades no que se apresentava como uma suposta dengue fraca, porém desta vez com novos sintomas. Pessoas entre crianças, adultos e idosos, passaram a ir aos hospitais com paralisia em determinadas partes do corpo. Esse novo tipo de doença passou a ser conhecido como a síndrome paralisante, parecida com a zika, porém com sintomas mais leves. A síndrome paralisante era conhecida e chamada de síndrome de Guillain-Barré, assim descrita pela literatura médica em 1916.

A inquietação do Dr. Brito com o crescente número de casos da síndrome paralisante ficou ainda maior de julho a outubro de 2015, pois essa veio para confundir ainda mais a tríplice epidemia. E para piorar a situação em que se encontrava o Brasil, Dr. Carlos Brito recebeu uma ligação em outubro de 2015, de Dra. Vanessa Van der Linden, neuropediatra de Recife, informando sobre a existência de crianças com Microcefalia. Dra. Vanessa se preocupou por se tratar dos primeiros casos da microcefalia causada por uma doença com transmissão vertical, passada de mãe para filho durante a gestação. A partir daí várias gestantes no Nordeste brasileiro, com sintomas do zika vírus, passaram a procurar assistência médica, sendo constatado que a maioria dos fetos dessas mulheres estava com o perímetro cefálico reduzido. O Nordeste foi o centro da epidemia do zika vírus, com maior concentração no estado da Paraíba e Pernambuco, e com esse surto passou a surgir vários casos de crianças com microcefalia e mulheres grávidas que foram infectadas pelo vírus durante a gestação e estavam a carregar fetos microcéfalos em seu ventre.

Diante desse cenário de surto do zika vírus e de vários surgimentos de casos de microcefalia no Nordeste brasileiro o governo decretou Estado de Emergência em Saúde Pública em novembro de 2015. Esse cenário de calamidade só veio a mudar em maio de 2017, quando foi posto fim ao Estado de Emergência pelo Ministério da Saúde, pelo fato do número de casos ter diminuído em relação ao ano de 2015 e 2016.

5. ABORTO DE MICROCÉFALOS

5.1. A Legislação Brasileira frente ao aborto em casos de Microcefalia

Diante do cenário que se encontra o Brasil, nos crescentes casos de mulheres grávidas infectadas pelo Zika Vírus a partir do ano de 2015 e fetos microcéfalos, novamente volta a ser pauta de discussão no STF (Supremo Tribunal Federal) a questão da descriminalização do aborto, dessa vez em casos de fetos que forem diagnosticados com microcefalia.

Um grupo de advogados, acadêmicos e ativistas entraram com um pedido ao Supremo Tribunal Federal, para que gestantes não sejam penalizadas pela pratica abortiva em casos de fetos diagnosticados com microcefalia. Essa ação é encabeçada pela antropóloga Débora Diniz que esteve à frente do processo de legalização em casos de fetos anencéfalo no ano de 2004 e aprovado em 2012.

O pedido feito por esse grupo de pessoas é para que seja considerado um fato atípico a pratica abortiva em casos de fetos com microcefalia, assim como já ocorreu nos casos de fetos diagnosticados com anencefalia. A anencefalia se trata de uma má formação do cérebro durante a formação embrionária, caracterizada pela ausência total do encéfalo e da caixa craniana do feto, onde a sobrevida extrauterina é quase impossível, e em raríssimas vezes o feto sobrevive por curto período de tempo, logo após o seu nascimento, o que se torna diferente da microcefalia, pois neste caso, o feto possui perspectiva de vida após o seu nascimento.

No entanto, a legislação brasileira, em algumas decisões vinculantes do Supremo Tribunal Federal (STF), baseia-se na viabilidade de vida após o parto, tornando o aborto em casos de microcefalia controverso.

O aborto em casos de microcefalia no Brasil, via de regra, não é legal, pelo fato da lei brasileira não permitir que nenhuma doença justifique o aborto, ao menos naqueles casos em que coloque em risco a vida da gestante ou que certamente não venham a sobreviver após o nascimento do nascituro, por causa da gravidade da doença.

Em caso de microcefalia, interpreta-se que o aborto seria uma interrupção da vida do nascituro, ou seja, seria impedir que aquele pequeno indefeso pudesse desfrutar do seu bem maior, garantido na constituição, que é a vida, já que a lei põe a salvo desde a concepção os direitos do nascituro. E quando se trata de anencefalia, interpreta-se que o aborto se trata apenas do impedimento do nascimento de um feto que não conseguirá sobreviver.

Tal discussão aberta à cerca da descriminalização do aborto, põe também em discussão a questão do livre arbítrio da mulher em escolher o que fazer com seu corpo, a liberdade de escolher e planejar o seu futuro, haja vista que receber um diagnóstico de que o feto presente em seu ventre tem microcefalia e poderá viver com algumas limitações, deve mexer com o psicológico das gestantes, fazendo, algumas delas, pensar na possibilidade do aborto como forma de evitar um futuro sofrimento.

Essa questão também entra como pauta quando se requer ao Supremo a legalização do aborto de microcéfalos, porém, deve-se levar em consideração principalmente que, a partir do momento da concepção, um novo ser já foi formado e já é detentor de direitos, sendo o principal deles, o direito à vida. E, assim sendo, deve-se pôr a salvo todas as garantias constitucionais desse novo ser, que não tem culpa de ter sido vítima de uma falta de cuidado da gestante ou até mesmo, da precariedade da saúde pública no Brasil e da falta de programas mais efetivos no combate ao mosquito transmissor do zika vírus.

Uma mudança na legislação penal em relação ao aborto com as justificativas postas em questão pode ser um avanço perigoso e que pode abrir precedentes. E, ademais, analisado o risco de vida da gestante e a possibilidade de uma vida quase normal desse novo ser, apesar das limitações já sabidas, não deveria ser posta em risco diversas garantias constitucionais que se sobrepõem a tal discussão.

Hoje, passado o susto inicial sobre as consequências da anomalia causada pelo zika vírus, já é fácil de encontrar inúmeros casos de crianças que nasceram com a microcefalia e conseguem viver com uma certa qualidade de vida. É devido a esses casos visíveis, que a legislação no Brasil não permite que seja praticado o aborto do microcéfalo, ao menos que agravado por qualquer outro tipo de circunstancias que prejudique a vida da mãe e do bebê.

A possível legalização do aborto de fetos com microcefalia no Brasil poderá acarretar na consequência de novas discussões sobre a também legalização do aborto em casos de nascituros diagnosticados com outras síndromes, como por exemplo, a Síndrome de Down, tendo em vista que esta também tem características relativas a um atraso mental em seu desenvolvimento e que seu diagnóstico, dado ainda na fase intrauterina, também põe a gestante e familiares em um conflito sobre o futuro desse novo ser.

Portanto, até o momento, a legislação brasileira confere ampla proteção ao nascituro diagnosticado com microcefalia, resguardando a garantia de seu nascimento com vida e seu desenvolvimento como cidadão, devendo ser amparado por programas sociais, de saúde e educação comum a todos os brasileiros, porém com a especial atenção que o caso exige.

5.2. Posições desfavoráveis ao aborto de microcéfalo

Desde 2015, com o surto do zika vírus e da microcefalia, voltou à tona a discussão em torno da ampliação do aborto legal para casos de malformação do nascituro, apesar de haver ainda muita falta de conhecimento por parte da sociedade quanto à doença da microcefalia.

Um dos principais argumentos contrários ao aborto de microcéfalo é pelo fato do diagnóstico nem sempre ser confirmado durante a gestação. O diagnóstico intrauterino é reconhecido quando o perímetro cefálico é inferior a 2 desvios padrões abaixo da média. A microcefalia é mais fácil de ser diagnosticada por ultrassonografia entre o segundo e o terceiro trimestre da gestação. Porém, a detecção pelo ultrassom é um desafio, pelo fato da posição do feto e o artefato de movimento fetal. As anormalidades do feto podem não ser aparentes no ultrassom fetal, mas sim no parto ou durante o período pós-natal.

Outro argumento desfavorável ao aborto de feto com microcefalia, é que eles não são incompatíveis com a vida, pois eles podem nascer e levar uma vida saudável, dentro de suas limitações, que são bastantes variáveis. O nascituro tendo um acompanhamento pré-natal e pós-natal, inclusive com uma equipe de profissionais multidisciplinares, podem se desenvolver naturalmente e ter uma qualidade de vida bastante significativa.

Outros argumentos que devem ser considerados são os de ordem moral e, principalmente religiosa, pois a igreja repudia qualquer tipo de aborto, pois independente de nascer com limitações ou defeitos, abortar é negar a vida a um novo ser, é brincar de ser Deus, é crime.

Descriminalizar o aborto de microcéfalos é um motivo eugênico, que ocorre quando se sabe que o feto nascerá com defeitos físicos ou mentais que dificultarão seu desenvolvimento. Evitar o nascimento por conta dos defeitos anunciados é ampliar o preconceito sobre os deficientes físicos ou mentais, é como afirmar que esse novo ser não teria a dignidade e os mesmos direitos que todo cidadão possui.

Existem outros motivos pelos quais não se deve legalizar o aborto de fetos diagnosticados com microcefalia, pois mesmo diante de tantas limitações físicas e mentais, eles podem ter uma vida digna como qualquer outro ser humano. Negar o seu nascimento é, acima de tudo, negar um direito constitucional conferido a todos desde a concepção: o direito à vida.

5.3. Posições favoráveis ao aborto de microcéfalo

Como já relatado em tópico anterior, muito se tem discutido sobre a descriminalização do aborto, inclusive em casos de gestantes com diagnóstico de feto com microcefalia. O assunto divide opiniões e o debate envolve mais questões morais e religiosas que de direito.

Há quem defenda o aborto do microcéfalo como forma de minimizar ou prevenir o sofrimento da futura mãe de uma criança com sequelas causadas pela má formação cerebral, pois há de se convir que não deva ser nada fácil não só para a mãe, mas também para a toda a família, se ver diante de uma nova realidade que jamais pensou viver e com a qual não tem qualquer contato ou experiência. Deve ser muito dolorido receber um diagnóstico de má formação de seu bebê tão esperado e se ver diante de uma problemática que poderá mudar completamente a forma de encarar a vida.

A posição favorável ao aborto de microcéfalo que teve mais destaque nos últimos anos é a encabeçada pela antropóloga Débora Diniz do Instituto de Bioética Anis, que em 2004 articulou a discussão sobre o aborto de fetos anencéfalos, conseguindo aprovação no STF em 2012. Através da ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) 5581 apresentada ao STF (Supremo Tribunal Federal) em 2016, Diniz põe em foco a garantia dos direitos das mulheres, principalmente na saúde, colocando o Estado como responsável pela epidemia de Zika, defendendo que constitucionalmente as mulheres não poderiam ser penalizadas pelas consequências de políticas públicas falhas.

Em uma entrevista para a BBC Brasil, Diniz assevera,

Somos uma organização que já fez isso antes. E conseguiu. Estamos plenamente inspiradas para repetir, sabendo que vamos enfrentar todas as dificuldades judiciais e burocráticas que enfrentamos da primeira vez.

(...) Em 2004 não havia epidemia nem havia um vetor (como o mosquito Aedes Aegypti). Agora ambos existem e isso torna a necessidade de providências mais urgente.

Por outro lado, na anencefalia os bebês não nascem vivos e assim escapávamos de um debate moral. Hoje, sabemos que a microcefalia típica é um mal incurável, irreversível, mas o bebê sobrevive (na maioria dos casos). Portanto, trata-se do aborto propriamente dito e isso enfrenta resistência. (DINIZ, 2016, P.01)

Na ADI (Ação Direta de Inconstitucionalidade) proposta, se requer que a mulher possa escolher se quer ou não praticar o aborto legal quando diagnosticada com feto microcéfalo, de forma a garantir seus direitos constitucionalmente garantidos, da dignidade da pessoa humana, do direito à saúde e o direito ao planejamento familiar e liberdade reprodutiva. Que a mulher possa ter a livre escolha sobre a continuidade ou não de sua gestação, como forma de lhe garantir escolher sobre sua própria vida e futuro.

Uma das principais argumentações para a propositura da ação e a defesa da liberação do aborto de microcéfalo é a vulnerabilidade específica de mulheres pobres, já que a epidemia do zika vírus ainda se concentra em áreas carentes do país, principalmente no Nordeste. A ideia é possibilitar também para essas mulheres o direito ao aborto, já que aquelas que podem pagar para fazer um aborto ilegal já o fazem.

Defende ainda a antropóloga Débora Dinis que, “autorizar o aborto não é levar as mulheres a fazê-lo”, mas sim não privar àquelas que mais necessitam de poder escolher sobre a própria vida.

5.4. O Direito à Saúde do microcéfalo

Diante da problemática trazida pelo zika vírus e a consequente microcefalia que, como já dito anteriormente, atinge principalmente a população mais carente do país, principalmente o Nordeste brasileiro, onde os serviços públicos essenciais são mais precários, uma nova questão é posta, sobretudo no conflito de opiniões acerca da legalização do aborto de microcéfalo, quando a falta de programas eficazes de saúde pública é colocada no topo dos maiores motivos pra se justificar a legalização ou descriminalização do aborto de fetos diagnosticados com microcefalia.

Neste cenário, a fim de fundamentar a possibilidade de vida do feto microcéfalo, necessário se faz trazer a analise os artigos 196 e 197 da Constituição Federal da República de 1988, que assim foram redigidos,

Art. 196. A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Art. 197. São de relevância pública as ações e serviços de saúde, cabendo ao Poder Público dispor, nos termos da lei, sobre sua regulamentação, fiscalização e controle, devendo sua execução ser feita diretamente ou através de terceiros e, também, por pessoa física ou jurídica de direito privado.

Posto isso, resta-nos claro o dever do Estado em prover o livre acesso da população aos serviços públicos de saúde de qualidade, de forma a reduzir os riscos de doenças ou, mediante ações afetivas, minimizar os efeitos e consequências delas.

Sabemos, porém, que esta é uma interpretação ampla e que a realidade e a prática estão bem distantes da teoria. Sabemos também, que a saúde púbica no Brasil atualmente padece com a má gestão de recursos e com a má prestação de serviços básicos. Dessa forma, como pensar que seria possível o portador de microcefalia viver dignamente dentro desse caos?

Na contramão da crise, é sempre importante estar atento aos nossos direitos, como forma de não nos deixar sermos vítimas da situação. É preciso dar crédito às instituições que nos resguardam direitos e buscar o seu amparo. É necessário nos fazer valer sempre do direito positivado de forma a alcançar a tutela jurisdicional.

Diversas são as decisões dos Tribunais Superiores acerca do tema, garantindo aos portadores de diversas doenças e síndromes, entre elas a microcefalia, o direito à medicação, à consultas e exames, à alimentos que, mesmo que demoradas, por conta de um judiciário engessado, tais decisões reforçam às garantias constitucionais de saúde para todo e qualquer cidadão.

O Tribunal de Justiça do Ceará já se posicionou quanto a assistência de saúde a ser prestada ao nascituro diagnosticado com microcefalia, vejamos:

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. APELAÇÃO CÍVEL/REEXAME NECESSÁRIO. REALIZAÇÃO DE EXAME PELO MUNICÍPIO DEMANDADO. PACIENTE PORTADOR DE MICROCEFALIA. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO. RECONHECIMENTO. DIREITO À VIDA E À SAÚDE. ARTS. , 6º, 196 E 197 DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL. INEXISTÊNCIA. APELAÇÃO E REEXAME DESPROVIDOS. SENTENÇA EFICAZ.

1. Cuida-se de apelação cível/reexame necessário em ação ordinária ajuizada com o objetivo de compelir o Município de Juazeiro do Norte à realização de exame de ressonância magnética, por ser o autor portador de microcefalia e não possuir recursos suficientes para custeá-lo.

2. A jurisprudência dos Tribunais Superiores tem consolidado o entendimento de que os entes federativos possuem responsabilidade solidária pela efetivação do direito à saúde assegurado constitucionalmente, sendo possível exigi-la de qualquer dos responsáveis por seu adimplemento.

3. Pleito emergencial por tratar de matéria fundada no direito à saúde, assegurado pelos arts. e 196 da Constituição Federal e incluído como dever do Estado lato sensu, no que seja essencial para a sua efetivação.

4. Não há que falar em violação ao princípio da igualdade por tratamento diferenciado em relação ao recorrido, se o exame é essencial para o tratamento de grave doença. Assim, a Administração tem o dever de realizá-lo, independentemente do ingresso do indivíduo no Judiciário para ver satisfeita sua necessidade. 6. Apelo e Reexame conhecidos e desprovidos. Sentença Eficaz. ACÓRDÃO: Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de Apelação Cível/Reexame Necessário nº 0043098-94.2013.8.06.0112, em que figuram as partes acima indicadas, ACORDA a 8ª Câmara Cível do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do Ceará, por unanimidade, em NEGAR PROVIMENTO ao recurso e à remessa oficial para conferir eficácia à sentença, nos termos do voto do relator. Fortaleza, 22 de setembro de 2015. DES. RAIMUNDO NONATO SILVA SANTOS Presidente do Órgão Julgador, em exercício DES. JOSÉ TARCÍLIO SOUZA DA SILVA Relator.

De igual teor temos vários outros julgados, que nos faz crer que é possível sim que o portador de microcefalia possa gozar de uma vida com qualidade e saúde adequada, desde que sejam percorridos os caminhos corretos e necessários para tal alcance. O portador de microcefalia é um cidadão como qualquer outro e como qualquer outra pessoa tem direito a saúde pública e gratuita, sendo dever do Estado buscar os meios adequados para provê-la.

5.5. Como vivem os portadores de Microcefalia?

A microcefalia, apesar de ser um tema bastante discutido nos últimos anos, principalmente a partir de 2015, por conta da chegada e epidemia do zika vírus, é, porém antes ligada a outros agentes causadores como o citomegalovírus, o vírus do herpes simples, da rubéola e o protozoário toxoplasma gondii.

No Brasil, apesar de estar hoje totalmente associada ao zika vírus, que se supõe ter chegado ao Brasil em 2014 junto com a Copa do Mundo, vindo provavelmente da África ou Ásia, bem antes disso já se registrava casos da doença, de forma que é possível encontrarmos vários casos de adultos que nasceram e vivem hoje com microcefalia, lutando diariamente com suas consequências.

As crianças nascidas com tal síndrome, a depender do momento que foi feito o seu diagnóstico, se na fase intra ou extrauterina, poderá levar uma vida normal, apesar de algumas limitações como distúrbios de fala, atraso mental, dificuldades de mobilidade, hiperatividade, podendo apresentar em grande parte dos casos, convulsões. Aquelas diagnosticadas com a microcefalia ainda durante a gravidez poderão apresentar mais sequelas que aquelas diagnosticadas após o nascimento. Essas últimas poderão ter uma qualidade de vida bem maior, desde que bem acompanhadas desde o nascimento.

Alguns tratamentos podem ajudar a melhorar ou reduzir essas sequelas, sendo sempre importante o acompanhamento com pediatra e neurologista, além de profissionais fonoaudiólogos, fisioterapeutas, terapeutas ocupacionais e, em alguns casos, psicólogos, além da interação medicamentosa, o que irá contribuir com o desenvolvimento da criança, que tem uma expectativa de vida semelhante à das outras crianças sem a doença.

Apesar do atraso mental, os microcéfalos, se bem cuidados e acompanhados, podem obter habilidades normais como andar, ler e escrever, podendo até ir muito mais além, chegando inclusive à universidade, como em alguns casos pesquisados. Porém, esse desenvolvimento maior é alcançado geralmente por aqueles que tiveram o diagnóstico de microcefalia após o nascimento e que, por isso, possuem menos características visíveis da doença.

Um desses exemplos de superação é o caso da jornalista Ana Carolina Dias Cáceres, graduada em 2014 pela Universidade Católica Dom Bosco de Mato Grosso do Sul. Na época com 23 anos, Ana Carolina, que teve o diagnóstico de microcefalia logo após o nascimento, teve seu trabalho de faculdade editado em livro, o “Selfie: em meu autorretrato, a microcefalia é diferença e motivação.”

Neste livro, Ana Carolina narra toda sua trajetória desde sua concepção, os problemas em seu nascimento, as sequelas trazidas pela microcefalia, a questão do preconceito, além de também contar histórias de outros portadores da síndrome que, assim como ela, vem superando todas as expectativas em relação à doença. A agora jornalista, com apenas nove dias de nascida, já teve que passar por uma primeira cirurgia das sete que fez, para resolver um afundamento frontal do crânio e um entupimento nasal, já sofrendo dois grandes abalos: duas paradas cardíacas.

Mas ela sobreviveu, e é ela quem nos conta toda sua história e segue da melhor forma possível sua vida, sempre com um bom acompanhamento médico e psicológico e buscando vencer o preconceito e se inserir na sociedade, seja através de seus estudos ou através de uma de suas paixões, que é a música.

Em seu livro, Ana Carolina conta casos de várias outras crianças, jovens e adultos que hoje também vivem com a microcefalia e que enfrentam diversos tipos de situações e sequelas, algumas não falam, outras não andam, a maioria tem um desenvolvimento mental mais lento que o normal, mas todas elas têm algo em comum, a vontade de viver e o amor incondicional de seus pais e da família, fator primordial para o enfrentamento de todas as barreiras trazidas com a síndrome, porém demonstrando que é possível viver com a microcefalia, contrariando algumas equivocadas previsões.

Portanto, como demonstrado, é notório que a microcefalia, mesmo não tendo cura, pode ser tratada, de forma que seus portadores possam viver de forma digna e saudável, gozando de todos os seus direitos e garantias constitucionais. E essa não é uma realidade utópica, mas algo possível atualmente para uma grande maioria dos microcéfalos, o que reforça a defesa pelo seu direito à vida e pela não descriminalização do aborto.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Tomando como base todo o conteúdo exposto no presente trabalho, consegui identificar que o aborto de microcéfalos ainda é assunto que abrirá novos debates e discussões com o avanço das pesquisas sobre os agentes causadores da microcefalia e com o desenvolvimento das crianças portadoras da doença e os resultados obtidos com o tratamento.

O tema hoje ainda divide opiniões, principalmente levando em consideração o sofrimento da criança durante toda a sua vida por conta das sequelas causadas com a má formação, bem como pelas dificuldades que serão encontradas pela mãe e família do microcéfalo para o correto e devido tratamento, pois, se faz necessário o acompanhamento desta criança por profissionais de especialidades várias como neurologia, fisioterapia, fonoaudiologia, terapia ocupacional e psicologia, que nem sempre estão disponíveis ou de fácil acesso no Sistema Único de Saúde em todo Brasil.

Porém, a fim de encontrar soluções para a problemática do presente trabalho, necessário se faz estudar os preceitos fundamentais do nascituro positivados em nossa Carta Maior e, coloca-los em confronto com os direitos garantidos a toda mulher, inclusive em momento gestacional, e sopesar os riscos trazidos para ambos com o diagnóstico da microcefalia ou síndrome do zika. Como já fora dito, o nascituro adquire direitos desde a sua concepção, sendo o principal deles o direito à vida. Admitir a possibilidade da descriminalização do aborto para gestantes com fetos diagnosticados com microcefalia é negar ao nascituro tal garantia. Ao mesmo tempo, proibir a mulher de decidir pelo aborto, não deixaria de ser uma forma de negação de direitos, no caso o de decidir o que fazer com seu corpo, decidir sobre seu futuro.

O ordenamento jurídico brasileiro não permite a interrupção da gravidez de feto com microcefalia, porém, já há no Supremo Tribunal Federal ação tramitando com pedido de liberação do aborto nesses casos, tomando como exemplo a ADPF 54 que trata do aborto de anencéfalos, ajuizada em 2004 e aprovada em 2012. Contudo, quando o STF analisou a questão do aborto do anencéfalo, levou em consideração primordialmente o fato de o mesmo constituir-se em um feto com morte cerebral, logo sem expectativa de vida, diferente do microcéfalo, onde a expectativa de vida é inquestionável.

A distinção entre anencéfalo e microcefalia é evidente. Enquanto a primeira não é capaz de gerar vida e pode ser considerada como um feto sem vida, na microcefalia a vida se faz presente e é plenamente capaz de gerar uma pessoa humana apta a adquirir personalidade jurídica, portanto com aptidão genérica para adquirir direitos e contrair obrigações, porém com limitações próprias da condição. Some-se ainda, que a pessoa humana dotada da microcefalia é inegavelmente destinatária de toda a proteção do ordenamento constitucional e infraconstitucional que veda a discriminação em qualquer de suas formas. Nesse contexto, não se justificaria, pois, que a Suprema Corte, como guardiã maior do texto constitucional, viesse a admitir tamanho desrespeito à nossa Magna Carta.

Sabemos que uma criança portadora da microcefalia, sobretudo pelas características físicas aparentes, principalmente a cabeça em tamanho menor que o normal para uma criança da mesma idade, viria a se deparar e teria que conviver com a discriminação que é comum ainda hoje em nossa sociedade para com os deficientes físicos, porém, o fato de uma possível aprovação pelo STF para a descriminalização do aborto de microcéfalo, estaria totalmente eivada de discriminação, de preconceito, pelo fato de saber vir a ser esse feto, detentor de anomalias que os diferenciaria dos demais. Essa não poderia ser uma justificativa defendida por aqueles que tem como atribuição zelar pelo direito igual a todos os cidadãos.

Somos todos sabedores da dificuldade pela qual passa o nosso país no momento atual de nossa história, sabemos ainda da precariedade da saúde pública no Brasil, com o sucateamento de equipamentos e unidades básicas. Da mesma forma, entendemos a transformação que vem a sofrer a vida de uma mãe de uma criança portadora de microcefalia. De exemplos reais, extraímos algumas experiências de mães que deixam de trabalhar para viver unicamente para cuidar de seu filho com tal patologia. Mas ao mesmo tempo, de igual forma sabemos, utilizando dos mesmos exemplos, que as mesmas mães, mesmo inegavelmente tendo sofrido ao encarar o diagnóstico de microcefalia para seu bebê, são portadoras de um amor incondicional que supera qualquer tipo de preconceito e que nos faz acreditar que é possível sim garantir ao microcéfalo uma vida digna e feliz, mesmo dentro de suas limitações.

Portanto, com o fato de trazer soluções para a problemática levantada neste trabalho, entendo que, restando clara a possibilidade do nascimento do feto com vida e da expectativa de desenvolvimento do portador da microcefalia, deve-se resguardar como de valor supremo o princípio da dignidade da pessoa humana sobre os demais, garantindo-se os preceitos fundamentais do nascituro, como o direito à vida e a saúde, de forma a garantir que o aborto de microcéfalos deixe de ser pauta de discussão, devendo sim ser ampliada a busca de melhores condições para a saúde pública no Brasil, de ações de combate ao principal vetor causador da doença, o mosquito Aedes Aegypti, e a busca incessante pela garantia de uma vida saudável e digna para o portador da microcefalia.

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Publicado por: EBSON COSTA SANTOS

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