A identidade dos Agentes Penitenciários do Estado do Ceará: uma análise dos impactos ocorridos intra e extramuros e as possibilidades de ascensão cognitiva

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1. RESUMO

Quando se produz uma pesquisa referente à temática apresentada, busca-se despertar de forma específica e direcionada a atenção da sociedade, em grande parte desconhecedora acerca do real papel desempenhado pelos agentes penitenciários, fazendo um recorte para a categoria no Estado do Ceará. Corroborando com esta realidade, verifica-se que há por parte da categoria uma lacuna tangente a sua identidade funcional quanto ao seu caráter punitivo e ressocializador, sem uma diretriz de execução concernente a essa dupla tarefa em um mesmo profissional. Em meio à complexidade da função, os agentes penitenciários são submetidos a situações intrínsecas do cárcere, exclusivas de sua escolha profissional como o estigma diante dos reclusos por representarem o Estado falho que os custodiam e o estigma diante da sociedade pela “aproximação” funcional que devem manter com os reclusos. Passam ainda, pelo processo de prisionização, devido à necessidade de adaptação com o mundo prisional como forma de melhor compreender esse universo. A partir da função intramuros, vários são os impactos extramuros sofridos por esses profissionais, ocasionando diversos problemas de ordem emocional, psíquica e de saúde. Como maiores interessados em melhor compreender e operacionalizar suas tarefas, de maneira pessoal e profissionalmente e de acordo com os dispositivos legais, os agentes penitenciários buscam adquirir conhecimentos capazes de atingir essas finalidades e colaborarem para um sistema penitenciário com menos distorções. Nesse trabalho monográfico, realizar-se-á uma abordagem sobre a importância da categoria dos agentes penitenciários para a estrutura geral da segurança pública social, das dificuldades de sua realização desde os riscos inerentes e possíveis durante a sua execução, até as consequências sofridas mesmo fora do horário de trabalho e como a ausculta positiva desses profissionais pode dar um direcionamento exitoso às ações, na busca da efetivação dos objetivos da execução penal, demonstrando de forma exemplificativa proposições, a partir do pensamento da categoria no Estado do Ceará. A pesquisa é do tipo bibliográfica, pura, qualitativa, exploratória e descritiva.

Palavras-chave: Agentes Penitenciários. Encarceramento. Punição. Ressocialização. Conhecimento.

2. INTRODUÇÃO

Desde os primórdios da humanidade, a figura do agente penitenciário andou junto com o encarceramento, porém o enfoque aos encarcerados e os pensamentos e reformas das prisões ao longo dos tempos se distanciaram desses profissionais no que tange ao aprimoramento e reconhecimento de suas funções, relegando-os a meros elementos de segunda ordem no contexto do sistema carcerário, quase sempre alvo de inúmeras críticas. Do carrasco ao agente penitenciário, pouco se evoluiu quanto à precariedade nas condições de trabalho, remuneração incompatível e número insuficiente de profissionais para a adequada realização dos trabalhos.

Dentre as várias modificações atinentes às reformas das prisões, adveio a necessidade de pensar na reeducação do encarcerado com a finalidade de devolvê-lo remodelado ao convívio social, missão esta incumbida, no primeiro momento, ao agente penitenciário por ser ele a primeira forma de ligação do recluso com o mundo externo. Porém, os servidores penitenciários não foram contemplados com medidas postas que os propusessem à realização adequada e uniformizada dessa tão meritória tarefa.

De acordo com Lei Estadual Cearense, cabe a esses profissionais a responsabilidade de atender, vigiar, custodiar, guardar, escoltar, assistir e orientar os reclusos de liberdade, no entanto, não há legislação local que traduza de que forma são desmembradas essas atribuições, reforçando a dúvida indentitária, as dificuldades e conflitos na atuação e os impactos ocorridos em vários segmentos da vida desses profissionais.

Nesse contexto conflitivo entre a atuação e as funções do agente penitenciário, o pensamento de seus operadores busca atingir uma prospecção futura, no sentido de galgar perspectivas norteadoras de um comportamento real e definido que, por meio do conhecimento e de ações que se aprofundem no âmbito pessoal do cuidador (agente penitenciário), tenham a finalidade de compreender de forma total a sua missão, erradicando as conflagrações pessoais geradas a partir das contendas profissionais.

Dessa forma, no decorrer deste trabalho monográfico, procurar-se-á responder a questionamentos relevantes, tais como: Existe compatibilidade na identidade profissional paradoxal do agente penitenciário em sua função repressora e ressocializadora na legislação pátria? De que forma o duplo estigma vivenciado pelo agente penitenciário através do preso e da sociedade traz impactos em sua vida familiar, profissional e social? Quais perspectivas podem ser propostas a partir da ascensão cognitiva dos agentes penitenciários na atualidade para que possam exercer o seu mister com eficiência e qualidade?

A justificativa para a apresentação deste trabalho decorre da necessidade de se demonstrar a complexidade da função intramuros dos agentes penitenciários do Estado do Ceará e como essas dificuldades influenciam suas vidas extramuros nos âmbitos familiar e social, ressaltar a importância da participação ativa desses profissionais como conhecedores reais da realidade vivenciada cotidianamente no interior das prisões, bem como demonstrar a importância do conhecimento da matéria por parte da sociedade.

Em razão disso, tem-se como objetivo geral analisar a identidade dos agentes penitenciários do Estado do Ceará, objetivando verificar a existência dos impactos ocorridos intra e extramuros e examinar as perspectivas de ascensão cognitiva dessa categoria.

Os objetivos específicos são: investigar se existe compatibilidade entre a identidade profissional paradoxal do agente penitenciário em sua função repressora e ressocializadora na legislação pátria; avaliar de que forma o duplo estigma vivenciado pelo agente penitenciário através do preso e da sociedade traz impactos em sua vida familiar, profissional e social; examinar quais perspectivas podem ser propostas a partir da ascensão cognitiva dos agentes penitenciários na atualidade para que possam exercer sua função com eficiência e qualidade.

Em relação aos aspectos metodológicos, a pesquisa é do tipo Bibliográfica, pois busca compreender através da literatura já existente a dinâmica da rotina carcerária, fazendo um recorte para o cenário cearense. Segundo a utilização dos resultados, a pesquisa é pura, pois busca se apropriar de conhecimento sobre o assunto proposto, com a finalidade de demonstrar a realidade existente e sugerir parâmetros modificadores que possam tornar mais efetiva e positiva a atuação intramuros dos agentes penitenciários cearenses, com o fito de contribuir para uma melhor qualidade dos trabalhos realizados e como consequência uma melhor forma de vida extramuros.

Segundo a abordagem, é qualitativa, pois busca ser capaz de conhecer de forma mais detalhada os acontecimentos nas prisões relativos ao ramo em estudo. Quanto aos objetivos, a pesquisa é exploratória, determinando os objetivos e se apropriando de mais referências sobre a temática em tela, e descritiva, expondo particularidades, acontecimentos e características da função prisional.

No primeiro capítulo, retratam-se a definição da função dos agentes penitenciários e sua evolução. Apresenta-se ainda a localização desses servidores públicos no contexto do Sistema Penitenciário do Estado do Ceará, e se discutem as contradições da sua dupla função de reprimir e ressocializar dentro do ordenamento pátrio.

No segundo capítulo, demonstram-se as influências intra e extramuros a partir da função penitenciária. Analisam-se ainda os impactos decorrentes da profissão na vida familiar, profissional e social desses profissionais.

No terceiro capítulo, abordam-se a importância da participação ativa dessa categoria na produção de um encarceramento que se torne mais próximo dos objetivos da execução penal, através da concretização de ideias construídas a partir da vivência cotidiana e legitimada desses conhecedores institucionais do ambiente carcerário.

O ponto central do presente trabalho é demonstrar a relevância da função dos agentes penitenciários cearenses como componentes importantes no contexto da segurança pública social, buscando estimular o conhecimento da sociedade sobre o tema e fomentar políticas públicas que programem condições adequadas na execução desse labor, que favoreçam pessoal e profissionalmente à categoria.

3. FUNÇÃO E IDENTIDADE DO AGENTE PENITENCIÁRIO DO ESTADO DO CEARÁ

Agentes penitenciários são servidores públicos responsáveis pela manutenção, fiscalização, segurança e disciplina nos estabelecimentos prisionais, encarregados de movimentar toda a dinâmica interna que envolve a população reclusa, bem como, são eles os executores do primeiro contato dessa pessoa com as possibilidades de reinserção social. Trata-se de uma função intrínseca do universo carcerário, capaz por si só de caracterizar esse ambiente.

Sua função é a de assegurar que nada ocorra em violação às regras da prisão, sejam as disciplinares ou as de segurança. Seu trabalho é essencialmente preventivo: ele deve manter-se atento e ser capaz de detectar e interpretar corretamente indícios de perturbação da ordem ou de ameaças à segurança. Isso requer o domínio de um saber que é essencialmente prático em sua origem: não está codificado, é intransmissível por métodos formais e de difícil reprodução em curto prazo (COELHO, 2005, p.97).

A inserção do cenário prisão remete imediatamente a pensamentos cujas expressões reportam a confinamento, vigilância, cerceamento, regramentos, privações, pessoas presas; vocábulos formadores de um dos lados da “moeda”, cujo outro protagonista, não menos importante e institucionalmente atuante, são os agentes penitenciários, unidos por um antagonismo que os norteiam cotidianamente. Para Coelho (2005, p.29) “O confinamento e o regime de vigilância ao qual está submetido o interno, estimulam-no a arquitetar uma infinidade de fórmulas para burlar os regulamentos da prisão e infernizar a vida do guarda”.

Analisada de forma conceitual faz-se necessário compreender a função do agente penitenciário a partir de um breve contexto histórico. Inicialmente, há que se verificar que se trata de uma das funções mais antigas da humanidade: cuidar, vigiar e aplicar punições àqueles que violassem a tranquilidade social era tarefa atribuída ao funcionário inicialmente conhecido pela nomenclatura de carrasco, posteriormente carcereiro, guarda de prisão, guarda de presídio e atualmente agente penitenciário.

Atividade frequentemente associada à prática de maus tratos e torturas, trouxe em seu arcabouço a sobrecarga de um pensamento vislumbrado por um inveterado com capuz, malvado e sanguinário somado à exclusão originada através do vínculo com o encarceramento.

[...] e como as funções da cerimônia penal deixavam pouco a pouco de ser compreendidas, ficou a suspeita de que tal rito que dava um ‘fecho’ ao crime mantinha com ele afinidades espúrias: igualando-o, ou mesmo ultrapassando-o em selvageria, acostumando os espectadores a uma ferocidade de que todos queriam vê-los afastados, mostrando-lhes a frequência dos crimes, fazendo o carrasco se parecer com o criminoso, os juízes aos assassinos, invertendo-se no último momento os papéis, fazendo do supliciado um objeto de piedade e de admiração (FOUCAULT, 1999, p.13).

Ao longo dos tempos, a mudança dos suplícios do corpo ao encarceramento do criminoso, no que se refere à punição, fez também com que a trajetória percorrida dos encargos da função de agente penitenciário desde a época do carrasco, passasse a aglutinar em suas atribuições não mais apenas a função de vigilância e punição, mas também a de resgate e recolocação da pessoa reclusa à sociedade.

Ressalte-se que até os dias atuais, não há uma forma homogênea ou explicitada referente à execução da tarefa específica de recuperação da pessoa reclusa, que possa efetivamente proporcionar ao agente penitenciário o êxito nessa finalidade de reinserção social desse encarcerado, o que acaba por acentuar sobremaneira a ênfase funcional aplicada à vigilância nesses locais.

Essa necessidade de um castigo sem suplício é formulada primeiro como um grito do coração ou da natureza indignada: no pior dos assassinos, uma coisa pelo menos deve ser respeitada quando punimos: sua ‘humanidade’. Chegará o dia, no século XIX, em que esse ‘homem’, descoberto no criminoso, se tornará o alvo da intervenção penal, o objeto que ela pretende corrigir e transformar, o domínio de uma série de ciências e de práticas estranhas (FOUCAULT, 1999, p.95).

Poucos são os documentos existentes que demonstram a evolução histórica dos agentes penitenciários referentes à sua função e identidade. Lopes (1998, online) assegura que o primeiro documento que relata de forma mais direcionada a função do guarda de presídio é o Decreto nº 3.706, de 29 de abril de 1924 que continha critérios inerente, tais como idade mínima de 21 anos e máxima de 45, ter bons antecedentes, ser brasileiro e gozar de boa saúde. A seleção era feita pelo diretor do estabelecimento prisional. Sobre as características próprias, ressalta que comumente os guardas de prisões tinham sido levados àquela condição por estarem sem emprego ou por já existir na família alguém pertencente ao grupo.

Ainda sobre os aspectos históricos associados à função, Moraes (2005) expressa que devido à proximidade funcional com os reclusos de liberdade cotidianamente, os agentes penitenciários deveriam ocupar relevante posição na provável atividade de reinserção social, porém ao contrário, o que ocorre é uma grande mudez e desinteresse em pesquisar esses profissionais que, quase sempre quando aparecem, acabam por ser sempre relegados à posição desprivilegiada no universo carcerário, como componentes a serem remodelados.

Não obstante as rápidas menções aos agentes penitenciários, nos momentos em que eles são citados, aparecem sempre como um importante grupo no que diz respeito à dinâmica do sistema penitenciário. Aliás, em todos os processos de reforma penal, os agentes penitenciários aparecem como um dos elementos a serem modificados e apontados como exemplos a não serem seguidos (MORAES, 2005, p.52).

No Ceará, os agentes penitenciários são os responsáveis por exercer a segurança e o disciplinamento interno e externo das unidades prisionais. Porém, ainda há uma marcante presença da Instituição Polícia Militar, especialmente, nas portarias e muralhas dos estabelecimentos, bem como na condução externa dos detentos. O Regimento Geral dos Estabelecimentos Prisionais do Estado do Ceará revisado e publicado no DOECE, de 16 de dezembro de 2014 estabelece que:

Art. 17 Nas unidades elencadas no artigo 6º deste Regimento, respeitadas suas especificidades, deverão ainda ser respeitadas as seguintes determinações: I - Segurança externa, através de muralha com passadiço e guaritas de responsabilidade dos Agentes Penitenciários do quadro efetivo da Secretaria da Justiça e Cidadania, submetidos a uma capacitação específica para tal finalidade. II - Segurança interna realizada por equipe de Agentes Penitenciários do quadro efetivo da Secretaria da Justiça e Cidadania que preserve os direitos do preso mantenha a Segurança, a ordem e a disciplina da Unidade.

Os agentes penitenciários desempenham ainda, a incumbência de assistir, orientar e reinserir o encarcerado ao convívio social ou pelo menos oportunizá-lo a essa prática através da dinamização intramuros realizada cotidianamente.

A categoria desses servidores não está incluída dentre as que compõem a Segurança Pública do Estado, todavia contribui efetivamente com a tarefa de manutenção da segurança da sociedade, quando assegura a adequada permanência daqueles que tiveram suas liberdades cerceadas como consequência do cometimento de delitos.

No Estado, a Lei nº 14.582, de 21 de dezembro de 2009, alterada pela Lei nº 14.966 de 13 de julho de 2011, criou a Carreira de Segurança Penitenciária, estabelecendo como suas atribuições o atendimento, a vigilância, a custódia, a guarda, a escolta, a assistência e a orientação de pessoas recolhidas aos estabelecimentos prisionais do Estado do Ceará (2014, online).

Art. 1º A carreira Guarda Penitenciária, integrante do Grupo Ocupacional Atividades de Apoio Administrativo e Operacional, prevista no item 2, do anexo I, da Lei nº 12.386 de 09 de dezembro de 1994, fica redenominada para carreira Segurança Penitenciária e estruturada na forma do anexo I desta Lei, passando os Agentes Penitenciários a ter as seguintes atribuições: atendimento, vigilância, custódia, guarda, escolta, assistência e orientação de pessoas recolhidas aos estabelecimentos penais estaduais.

Ideal ressaltar que os agentes penitenciários ocupam lugar no quadro de servidores da Secretaria da Justiça e Cidadania do Estado e, para ingressarem na carreira, devem ser aprovados em concurso público de provas, necessitando para a aprovação no certame, de resultado satisfatório em seis etapas constantes de duas fases explicitadas no edital Nº 29/2011 – SEPLAG/SEJUS para o provimento do cargo de agente penitenciário, último concurso público realizado:

2.7 O Concurso Público de que trata este Edital constará de 02 (duas) Fases, sucessivas, abaixo discriminadas: 2.7.1 Primeira Fase que constará da Prova Escrita de Conhecimentos, com questões objetivas de múltipla escolha, de caráter eliminatório e classificatório, para mensurar os conhecimentos gerais e específicos dos candidatos; 2.7.2 Segunda Fase que constará das cinco etapas seguintes: 2.7.2.1 Inspeção de Saúde, de caráter eliminatório que compreenderá exames médico, odontológico e toxicológico, conforme critérios estabelecidos neste Edital; 2.7.2.2 Curso de Formação Profissional, de caráter classificatório e eliminatório de acordo com critérios estabelecidos neste Edital; 2.7.2.3 Avaliação de Capacidade Física, de caráter apenas eliminatório e pertinente ao exercício do cargo público objeto deste Concurso será aplicada por comissão formada de pessoal técnico (árbitros credenciados e pessoal treinado) para os registros das marcas dos candidatos e coordenada por profissionais graduados em Educação Física, que tenham registros no Conselho Regional de Educação Física; 2.7.2.4 Avaliação Psicológica, de caráter apenas eliminatório, deverá ser realizada mediante o uso de instrumentos capazes de aferir, de forma objetiva e padronizada, os atributos psicológicos do candidato para o desempenho das atribuições inerentes ao cargo de Agente Penitenciário, mediante testes aprovados pelo Conselho Federal de Psicologia. 2.7.2.5 Investigação Social e Funcional, de caráter eliminatório, objetiva avaliar o candidato quanto ao seu procedimento e sua idoneidade moral que devem ser respectivamente irrepreensível e inatacável, requisitos essenciais ao ingresso na carreira de Segurança Penitenciária.

A formação educacional mínima exigida é o ensino médio completo, sendo indispensável a comprovação de conduta ilibada. A efetivação funcional somente se dá, após um período de estágio probatório compreendido por três anos, estando a categoria sob fiscalização permanente da Controladoria Geral dos Órgãos de Segurança Pública e do Sistema Penitenciário do Estado, conforme estabelecido na Lei Complementar nº 98, de 13 de junho de 2011, DOE de 20/06/2011:

Art. 1º Fica criada, no âmbito da Administração Direta do Poder Executivo Estadual, a Controladoria Geral de Disciplina dos Órgãos de Segurança Pública e Sistema Penitenciário do Estado do Ceará, com autonomia administrativa e financeira, com a competência para realizar, requisitar e avocar sindicâncias e processos administrativos para apurar a responsabilidade disciplinar dos servidores integrantes do grupo de atividade de polícia judiciária, policiais militares, bombeiros militares e agentes penitenciários, visando ao incremento da transparência da gestão governamental, ao combate à corrupção e ao abuso no exercício da atividade policial ou de segurança penitenciária, buscando uma maior eficiência dos serviços policiais e de segurança penitenciária, prestados à sociedade.

Mencione-se, que a temática que envolve a categoria dos agentes penitenciários é pouco explorada pelo público acadêmico, pelo caráter singular e reconhecidamente de difícil acesso. Mesmo diante de vários enfoques sobre o sistema penitenciário, pouco se observa sobre literaturas que abordem os “profissionais do cárcere”, mesmo estando eles sempre ativos no dia a dia das prisões.

No Ceará, essa realidade é ainda mais enfática, não sendo encontradas pesquisas científicas que se debrucem sobre a especificidade peculiar dessa tão importante função, nem relatos sobre sua historicidade e evolução, porém comprovadamente trata-se de uma categoria moderadamente incipiente e pouco numerosa, especialmente quando contrapomos ao número de reclusos existentes no Estado.

Conforme a Secretaria da Justiça e Cidadania (NOVOS..., 2014, online) no ano de 2007, o número de agentes penitenciários era de 252 e ao final de 2014, com a convocação dos candidatos aprovados em concurso público através do edital 010/2013, de 07 de fevereiro de 2013, esse número atingiu o patamar de 2.178 servidores.

3.1. Localização na estrutura do Sistema Carcerário

Sobre o pessoal penitenciário, disciplinam as Regras Mínimas para o Tratamento dos Reclusos da Organização das Nações Unidas- ONU (1977, online), a necessidade de seleção criteriosa daqueles que labutam no interior das prisões, por depender efetivamente deles o êxito da gestão penitenciária, bem como reconhecem também, a dificuldade existente na realização desse mister ao classificar como “penosa” a natureza do trabalho realizado intramuros.

Importante ainda ressaltar, que dentre as orientações referidas nas supracitadas regras, àquelas que norteiam a função do diretor do estabelecimento, amparam e direcionam a ocupação desses cargos por servidores penitenciários capacitados e experientes:

50.1 O diretor do estabelecimento deve ser bem qualificado para a sua função, quer pelo seu caráter, quer pelas suas competências administrativas, formação e experiência. 2. Deve exercer a sua função oficial a tempo inteiro. 3. Deve residir no estabelecimento ou nas imediações deste. 4. Quando dois ou mais estabelecimentos estejam sob a autoridade de um único diretor, este deve visitar ambos com frequência. Em cada um dos estabelecimentos deve haver um funcionário responsável.

Previsão semelhante verifica-se no artigo 75, incisos I a III da Lei nº 7.210 de 11 de julho de 1984, que instituiu a Lei de Execução Penal em nosso Ordenamento pátrio, sobre o disciplinamento específico da formação necessária para a ocupação do cargo de diretor:

Art. 75 O ocupante do cargo de diretor de estabelecimento deverá satisfazer os seguintes requisitos:

I - Ser portador de diploma de nível superior de Direito, ou Psicologia, ou Ciências Sociais, ou Pedagogia ou Serviços Sociais; II – possuir experiência administrativa na área; III – ter idoneidade moral e reconhecida aptidão para o desempenho da função (KUEHNE, 2010, p.230-231).

Pertinente ao assunto, o Regimento Geral dos Estabelecimentos Prisionais do Estado do Ceará (2014, online) demonstra a preferência para ocupação em cargos de diretor de estabelecimento carcerário por servidores de carreira, bem como àqueles vocacionados e com preparação específica:

Art. 20 O (a) ocupante do cargo de diretor(a) de Unidade Prisional, escolhido preferencialmente entre os servidores de carreira da Secretaria de Justiça e Cidadania, com atenção à sua vocação e preparação profissional específica, deverá satisfazer os seguintes requisitos: I - ser portador(a) de diploma de nível superior em Direito, ou Psicologia, ou Ciências Sociais, ou Pedagogia, ou Serviços Sociais; II - possuir experiência administrativa na área; III - ter idoneidade moral e reconhecida aptidão para o desempenho da função.

A estrutura organizacional e o regulamento da Secretaria da Justiça e Cidadania do Ceará (SEJUS) foram alterados pelo Decreto nº 31.419, de 24 de fevereiro de 2014, cujo teor disciplina as competências e os desdobramentos desta Pasta governamental, organizada e disciplinada para atuar em duas vertentes: a primeira direcionada à cidadania, cuja principal missão é garantir as políticas de direitos humanos aos cidadãos; e a segunda voltada à execução penal e à reinserção social dos reclusos de liberdade. O objeto central, porém, dessa pesquisa são os servidores penitenciários, cuja localização na referida estrutura é a Coordenadoria do Sistema Penal-Cosipe.

Art.2º A Secretaria da Justiça e Cidadania (Sejus) tem como missão promover e garantir as políticas de direitos humanos, a execução penal e sua função social em parceria com a sociedade e demais instituições governamentais, competindo-lhe: I - executar a manutenção, supervisão, coordenação, controle, segurança, inteligência e administração do Sistema Penitenciário e o que se referir ao cumprimento das penas; II - promover o pleno exercício da cidadania e a defesa dos direitos inalienáveis da pessoa humana, através da ação integrada entre o Governo Estadual e a sociedade, competindo-lhe zelar pelo livre exercício dos poderes constituídos;

O Sistema Penitenciário Cearense é regulado pela Cosipe, órgão descentralizado e hierarquicamente vinculado à Secretaria da Justiça e Cidadania, que dirige os agentes penitenciários através do Núcleo de Segurança e Disciplina (Nused) e das Células Regionais do Sistema Penal Norte (CRSPN) e do Sistema Penal Sul (CRSPS).

Concernente à estrutura organizacional, o Sistema Carcerário Estadual através da Cosipe é constituído pelos seguintes estabelecimentos, conforme preconiza o Regimento Geral dos Estabelecimentos Prisionais do Estado (2014, online): I Centro de Triagem e Observação Criminológica; II – Unidades Prisionais e Casas de Privação Provisória de Liberdade; III – Penitenciárias; IV - Colônias Agrícolas, Industriais ou Similares; V - Complexo Hospitalar (Hospital Geral e Sanatório Penal e Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico); VI - Casas do Albergado; VII - Cadeias Públicas.

Art.2º - O Sistema Penitenciário do Estado do Ceará tem como finalidade a vigilância, custódia e assistência aos presos e às pessoas sujeitas a medidas de segurança, assegurando-lhes a preservação da integridade física e moral, a promoção de medidas de integração e reintegração socioeducativas, conjugadas ao trabalho produtivo (REGIMENTO Geral dos Estabelecimentos Prisionais do Estado do Ceará, 2014, online).

Os agentes penitenciários formam a espinha dorsal do sistema carcerário estadual, compreendendo nos estabelecimentos prisionais as seguintes atividades: grupo operacional composto por quatro equipes plantonistas que se revezam em escalas de serviço de 24 horas de trabalho por 72 de descanso em atendimento diuturno aos presos. As equipes são organizadas e dispostas ordenadamente por letras, de maneira uniforme em todo o Estado: equipes A, B, C e D, com a orientação de um chefe do plantão em cada grupo.

Diariamente existe a figura do chefe de segurança e disciplina, que é o responsável pela fiscalização das equipes e por traçar o plano de segurança da unidade. Fazem parte da direção do estabelecimento, o diretor adjunto e o diretor geral, responsáveis pela coordenação de todas as atividades que envolvem a massa carcerária, os servidores, os colaboradores e visitantes daquele ergástulo. Existe ainda o gerente administrativo, responsável pela limpeza e manutenção do prédio. Todos os cargos comissionados elencados, de acordo com o Regimento devem ser exercidos preferencialmente por servidor de carreira da Sejus.

Art.18 - As Unidades Prisionais do Estado do Ceará serão dirigidas por um (a) Diretor (a), que será assessorado pelo (a) Diretor (a). Adjunto (a), pelo Gerente Administrativo, pelo Chefe de Segurança e Disciplina e pelo Chefe de Equipe dos Agentes Penitenciários, sendo ainda integradas pelo Conselho Disciplinar e pela Comissão Técnica de Classificação (REGIMENTO Geral dos Estabelecimentos Prisionais do Estado do Ceará, online, 2014).

Dentro dessa dinâmica, Chies (2008) aduz que esse modelo de gestão que busca no interior de sua estrutura funcional ocupantes da administração dentre os servidores penitenciários, tende a solucionar a problemática no que tange ao conhecimento empírico para a realização das tarefas cotidianamente executáveis, porém, nascem a partir daí também outros impasses.

A Lei de Execução Penal em seus artigos 76, 77 e parágrafos (KUEHNE, 2010, p. 235-238), determina a organização diferenciada das categorias funcionais na estrutura organizacional dos estabelecimentos prisionais, bem como estabelece a observação à idoneidade moral, vocação e capacitação profissional:

Art.76. O Quadro do Pessoal Penitenciário será organizado em diferentes categorias funcionais, segundo as necessidades do serviço, com especificação de atribuições relativas às funções de direção, chefia e assessoramento do estabelecimento e às demais funções. Art. 77 A escolha do pessoal administrativo, especializado, de instrução técnica e de vigilância atenderá a vocação, preparação profissional e antecedentes pessoais do candidato. § 1° O ingresso do pessoal penitenciário, bem como a progressão ou a ascensão funcional dependerão de cursos específicos de formação, procedendo-se à reciclagem periódica dos servidores em exercício. § 2º No estabelecimento para mulheres somente se permitirá o trabalho de pessoal do sexo feminino, salvo quando se tratar de pessoal técnico especializado.

Infere, ainda, Chies (2008) que o fato de serem os cargos preenchidos através de indicações sob o critério de confiança, remontam a transitoriedade dependente da eletividade política, o que acaba por deixar esse profissional em posição medial com os demais grupos existentes, pois, sabedores que em dado momento voltarão aos corredores para o convívio direto com os reclusos, bem como poderão se encontrar em posições invertidas hierarquicamente dentro da classe que ocupam, acabam por empregar uma postura permissiva.

No Ceará, não há literaturas ou mesmo documentos públicos que apontem essa transigência por parte da administração carcerária comissionada, mesmo porque não existe quase nenhum referencial teórico referente à totalidade do tema proposto nesta pesquisa em nível estadual.

Através do conhecimento experimental, todavia, percebem-se não raros os comentários e reivindicações tangentes ao comodismo e à falta de posicionamento claro dos agentes penitenciários que ocupam cargos de Direção e Assessoramento na Secretaria da Justiça e Cidadania, ou seja, aqueles que detêm o conhecimento das prisões de forma familiarizada, porém institucionalizada, que deveriam realizar um trabalho que efetivamente pudesse contribuir para a construção de um sistema penitenciário mais justo, tanto para os internos como para os servidores, acabam negligenciando esse “poder” por questões burocráticas, políticas ou particulares.

Para Chies (2008), por outro lado, buscar externamente ao corpo institucional prisional, pessoas com a finalidade de compor a gestão administrativa dos estabelecimentos, ao passo que podem esses estrangeiros ter menor dificuldade em cumprir as designações organizacionais estabelecidas em relação aos demais grupos existentes, incorrem em outros obstáculos advindos de sua natureza extrínseca, tais como a insciência dos assuntos relacionados à execução prisional, o que acarreta por vezes condutas abusivas ou negociais referentes àqueles que são conhecedores do sistema, qual seja os agentes penitenciários.

Finalmente, o guarda compartilha com os presos a opinião de que as direções de estabelecimento são incompetentes, e é inevitável que comparem o seu próprio saber prático, acumulado em anos de convivência com a massa carcerária, com a ‘ingenuidade’ dos que creem nos resultados positivos da tolerância, da benevolência, da flexibilidade (COELHO, 2005, p.155).

Convém destacar, que compõem também a estrutura prisional funcionários contratados por empresas terceirizadas, prestadoras de serviço do Estado para atuarem nos seguintes setores: setor administrativo encarregados da organização dos prontuários e demais documentos existentes; enfermaria composta por médico, enfermeiro, farmacêutico, dentista e técnicos de enfermagem; equipe multidisciplinar formada por psicólogo, assistente social, advogado e defensor público. Importante mencionar, que o número desses profissionais por localidade carcerária, também está aquém do adequado para satisfazer toda a demanda.

O modelo de gestão adotado atualmente no Estado, não difere em proporções daquele visualizado em todo o País, a superpopulação carcerária aliada à precariedade nas condições de trabalho e o ínfimo efetivo de servidores e funcionários são suscitações frequentes nos corredores das unidades prisionais, demonstrando insatisfações e descontentamentos por parte de todos os envolvidos.

[...] no ambiente penitenciário o sistema formal e burocrático de controle é estruturalmente falho, pois estão inseridos no contexto outros fatores como: o não necessário reconhecimento, por parte dos apenados, de legitimidade nas ações e regras dos seus carcereiros e do sistema burocrático que representam; a falhabilidade do sistema para possíveis arbitrariedades, ataques e vinganças -inclusive vitimando agentes penitenciários em situações de rebeliões e motins- (CHIES, 2008, p.64).

O Ceará possui a segunda maior população carcerária do Nordeste (POPULAÇÃO..., 2015, online), conforme relatório do Infopen (Sistema Integrado de Informações Penitenciárias) do Ministério da Justiça, com um total de 21.789 presos.

Diante de dados como esses, tarefas como garantia de segurança, ordem e reinserção social tornam-se atividades utópicas. Para Coelho (2005, p.64), “De forma análoga a uma recomendação médica que proibisse de correr a um paciente sem suas pernas, várias prescrições e normas do Regulamento seriam mera crueldade ou zombaria se não fossem antes fruto do irrealismo do legislador”.

Polo sensível nesse sentido é o que se refere aos Agentes Penitenciários que, como grupo de funcionários da burocracia carcerária, encontra-se na “linha de frente” dos antagonismos e contradições da instituição. Essa expectativa e imputação incongruente de papéis é correlata de imputações sancionatórias de responsabilidade e tende a ocasionar o efeito de domínio de um objetivo organizacional sobre o outro (CHIES, 2008, p.62).

Para o agente penitenciário local, garantir a segurança e a ordem com desdobramentos voltados à reinserção social da massa carcerária já é tarefa por si só controversa e de difícil alcance, ademais quando aliada à realidade atual, torna-se deveras traumática, frustrante e aflitiva para esse trabalhador. Chies (2008) conclui que os objetivos propostos às prisões cujas finalidades são castigar e resgatar seja uma missão inverossímil, quiçá inexequível de acontecer dentro do ambiente carcerário.

[...] o agente (de segurança penitenciária) continua sendo aquele que vigia os excluídos, que atua na ponta do sistema ordenador, aplicando punições e corrigindo as inadequações dos insubmissos e que se utiliza de todos os mecanismos possíveis para manter a disciplina (LOPES, 1998, p.52 apud LOURENÇO, 2010, P.44).

Considerando as características anteriormente mencionadas, direcionadas à função dos agentes penitenciários, adequado se faz mencionar a necessidade de adaptação rápida às normas do estabelecimento, bem como a conduta reiterada, internalizada pela população reclusa, cujas peculiaridades próprias englobam códigos, costumes e linguagem específica, processo conhecido como prisionalização.

3.2. Contextualização do trabalho no cárcere

Para melhor identificar a conjuntura dos trabalhos realizados intramuros pelos agentes penitenciários, adequado se faz a referência de forma direcionada a uma unidade prisional específica, cuja dinâmica retrata de forma bastante abrangente o cotidiano carcerário estadual: a Unidade Prisional Agente Luciano Andrade Lima, conhecida como CPPL I em Itaitinga, reverencia com o seu nome um agente penitenciário que foi assassinado na porta de casa, quando chegava de um plantão na década de 2000.

Importante se faz demonstrar inicialmente, a estrutura física, administrativa e funcional da unidade para posteriormente adentrar no cotidiano do cárcere, onde será verificada a dinâmica diária que envolve os agentes penitenciários.

Trata-se de um dos estabelecimentos que albergam alguns dos presos de maior periculosidade do Estado, atualmente com 1.486 reclusos dentre os quais provisórios; condenados em regime fechado de pena e semiaberto, porém, esses últimos, mesmo tendo adquirido a progressão de regime, por terem alcançado os requisitos objetivo (lapso temporal) e subjetivo (bom comportamento) continuam sem nenhuma modificação no trato penal. “Assumida a privação de liberdade como opção basilar do sistema punitivo moderno, todos os seus desenvolvimentos posteriores se direcionam à constituição de um aparato burocrático de execução penal” (CHIES, 2008, p.59).

O estabelecimento é composto por 03 pavilhões, estruturados em dois pisos (superior e inferior) cada piso é composto por 04 corredores chamados de ruas, cada rua tem entre 06 e 07 celas, cada cela tem 06 camas (chamadas pedra ou comarca), totalizando 03 pavilhões, 24 ruas, 129 celas e 774 camas. Cada cela possui capacidade estrutural para comportar 06 presos, estando, contudo, com ocupação entre 11 a 14 pessoas, aqueles que não têm sua “pedra” ocupa a “pista” na cela, ou seja, dormem no chão nos espaços disponíveis, ou seja, 712 presos de acordo com a população atual.

O local não dispõe de espaço para atividades de educação, lazer e cultura. Recentemente a unidade foi beneficiada com o Projeto MOVA - Movimento de Alfabetização de Jovens e Adultos (SOUSA, 2015, online) em uma parceria da Secretaria da Justiça e Cidadania com o Instituto Paulo Freire e apoio da Petrobrás, mediante o improviso de uma pequena sala com capacidade para 20 detentos.

A direção da unidade é composta por um diretor, um diretor adjunto, um gerente administrativo e um chefe de segurança e disciplina, todos são cargos comissionados escolhidos dentre agentes penitenciários de carreira, através de indicação do Secretário da Justiça e Cidadania. Há ainda quatro chefes de equipes que se revezam nos plantões. As equipes plantonistas diárias oscilam em número de agentes penitenciários entre 09 a 11.

O serviço de saúde oferecido à população carcerária é realizado por um médico, que atende duas vezes por semana, um número não superior a 20 internos por dia de atendimento; existem também duas enfermeiras que trabalham vinte horas semanais e quatro técnicos de enfermagem que se alternam em escalas de 12 horas de serviço por 36 horas de folga; uma dentista; um auxiliar odontológico e um atendente de farmácia.

A equipe multidisciplinar da Casa é composta por duas Assistentes Sociais; um advogado terceirizado; uma psicóloga e um defensor público que atende uma vez por semana. Todos os atendimentos são ordenados sempre de acordo com o funcionamento da Unidade, que determina se o clima está propício ou não para acontecer.

Hodiernamente, a pessoa reclusa de liberdade tem posição jurídica de sujeito de direitos. No Brasil, no início dos anos 80 foi promulgada a Lei de Execução Penal que trata especificamente sobre a aplicação e cumprimento da pena. A Carta Magna Pátria de 1988 incorporou ao capítulo que assinala os direitos e garantias fundamentais, vários incisos atinentes à pessoa do preso; na esfera internacional podemos também mencionar Tratados e Convenções, dos quais o Brasil é signatário que também acolheram essas garantias.

Art. 1º A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições da sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado. Art. 3º Ao condenado e ao internado serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei. (KUEHNE, 2010, p.35).

Com o empenho voltado à satisfação dos preceitos constitucionais e a efetivação do cumprimento do que preconiza a Lei de Execução Penal, a rotina carcerária ocorre totalmente dependente e atrelada ao trabalho desempenhado pelos agentes penitenciários, conforme o que se demonstra na rotina da CPPL I.

Por volta das 06h30min da manhã, a equipe plantonista “paga” (termo utilizado pelos agentes penitenciários para designar a entrega das refeições aos reclusos) o café da manhã em todos os pavilhões. A troca da equipe operacional ocorre às 8h; cerca de 9h, os presos são retirados dos pavilhões para o “banho de sol”, que é a permanência deles no período compreendido entre 9h até o meio dia para uma quadra onde podem ficar reunidos com os demais do mesmo pavilhão para conversar, e como o próprio nome retrata, levar um pouco de sol.

Saliente-se que esse procedimento é realizado em dias diferentes para cada pavilhão e que a equipe composta por no máximo onze agentes penitenciários faz o translado de aproximadamente 450 detentos. Nesse ínterim, são realizados os atendimentos disponíveis de acordo com a presença dos profissionais que se encontram na Instituição, aos internos que se encontram no “banho de sol”. A Lei de Execução Penal em seus artigos 10 e 11 elencam as assistências destinadas ao preso, ao internado e ao egresso:

Art.10 A assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade. Parágrafo único: a assistência estende-se ao egresso. Art. 11 A assistência será: I- Material; II- À saúde; III- Jurídica; IV- Educacional; V- Social; VI- Religiosa (KUEHNE, 2010, p.64).

Na Unidade, esse processo de rotinas e procedimentos nem sempre ocorre, e quando ocorre, nem sempre acontece de maneira tranquila e homogênea, seja pelo número aquém dos profissionais, desde a equipe técnica até a operacional para atender a demanda, seja pela exasperação da massa carcerária que muitas vezes encontra-se em conflitos entre si ou com os operadores dessa dinâmica: “os servidores do cárcere”.

Ademais, mesmo que esse mecanismo não ocorra em condições favoráveis e adequadas, necessária se faz a busca incessante de catalisar institucionalmente os objetivos do encarceramento, no qual a figura do agente penitenciário surge para essa missão como o combustível para um automóvel, ou seja, sem eles nem os estabelecimentos prisionais nem os carros funcionam. E nessa dinâmica diária, torna-se cada vez mais aparente e conflitante o antagonismo intrínseco da função dos agentes penitenciários quanto à ressocialização e à repressão.

Esse depoimento é exemplar no que revela a respeito dos dilemas atuais do papel do guarda e das ambiguidades introduzidas nas condições de seu desempenho. Em primeiro lugar a administração emite comandos para que ele seja “mais moderado” e “exija menos dos presos”. [...] Digamos mais flexível. Mas ao mesmo tempo a administração exige “a disciplina seja mantida”, comando que ao guarda parece incompatível e contraditório com o anterior. Certamente, há pelo menos ambiguidade na situação, agravada pelo fato de que a administração não instrui o guarda a respeito de como ele deve ser ao mesmo tempo flexível e disciplinador. O resultado é insegurança no desempenho de suas funções, a indecisão quanto ao que fazer para simultaneamente atender à nova orientação e as diversas situações nas quais ocorre seu contato com o preso (COELHO, 2005, p.115-116).

Na Casa existe um setor comum aos internos denominado “tranca”, onde ficam aqueles presos que não têm convivência com os demais ou aqueles que infringiram alguma norma estabelecida pela Unidade. Aos agentes penitenciários incumbe a vigilância constante para assegurar a permanência da “tranquilidade” local, a verbalização com a massa carcerária para esclarecer e executar os procedimentos que ocorrem a todo o momento, a observação para identificar sem equívocos, dentre vários detentos, aquele que por ventura age de encontro ao regulamentado, bem como, a condução do infrator ou infratores ao local de correção.

Essa eficiência do guarda supõe um grau de competência que só pode ser adquirido através do contato prolongado com a massa carcerária. Mas, nesse particular, a relação é simétrica, pois também os presos adquirem um saber prático através desse contato: as rotinas, hábitos, preferências, temperamento e personalidade do guarda. (COELHO, 2005, p.98).

Para toda e qualquer retirada de cela para atendimento diverso, é sempre realizada pelo agente penitenciário uma revista corporal no recluso como forma preventiva de evitar que o mesmo porte objetos ilícitos ou não permitidos que possam inclusive ser utilizados como ameaça à integridade do próprio agente ou daquele que for prestar o atendimento. Não raros são os conflitos existentes entre presos e guardas ocorridos durante essas conduções, especialmente, quando o translado seja para o setor da “tranca”.

As visitas de familiares do sexo feminino, ocorrem aos sábados e domingos, de forma que a metade da unidade é atendida em um dia e a outra metade no outro. Isso ocorre devido ao grande número de visitantes mulheres, aproximadamente seiscentas por dia de visitação. Os parentes do sexo masculino têm esse acesso às sextas feiras, no período vespertino, sendo essa parcela um número bastante inferior, cerca de quarenta visitantes.

Os agentes penitenciários fazem a inspeção em todo o material trazido pelos parentes, bem como, fazem a revista pessoal, respeitando o gênero, em cada um dos visitantes. Para a execução dessa atividade, contam com a tecnologia de um aparelho de raio X e de um scanner corporal. A incidência de objetos não permitidos e ilícitos encontrados é uma realidade constante nessas inspeções. No Estado, a Secretaria da Justiça e Cidadania, através da Portaria 723/2014 (DOCE 21/08/2014, p.36, online), padronizou os procedimentos de revista para o acesso aos estabelecimentos prisionais através desses equipamentos.

Art.1º. A revista pessoal (eletrônica, mecânica ou manual) a qual devem se submeter todos que queiram ter acesso a um estabelecimento penal para manter contato com pessoa presa ou ainda para prestar serviços, ainda que exerçam qualquer cargo ou função pública, necessária à segurança de estabelecimentos penais, será realizada com respeito à dignidade humana, sendo vedada qualquer forma de desnudamento, tratamento desumano ou degradante. §1º. A revista pessoal deverá ocorrer mediante uso de equipamentos eletrônicos detectores de metais, bodyscanners, aparelhos de raio-X ou similares, ou ainda manualmente, preservando-se a integridade física, psicológica e moral da pessoa revistada.

A Lei Federal nº 13.271 de 15 de abril de 2016 proíbe a revista íntima de funcionárias nos locais de trabalho e trata da revista íntima em ambientes prisionais, abrangendo funcionárias e clientes do sexo feminino, como também vetou o artigo 3º que permitia em casos previstos por lei a revista íntima em ambientes prisionais.

O projeto de lei, cujo artigo 3º foi vetado na referida Legislação, tinha o seguinte teor: Nos casos previstos em lei, para revistas em ambientes prisionais e sob investigação policial, a revista será unicamente realizada por funcionários servidores femininos". O que ocasiona a inserção da revista feminina nos estabelecimentos prisionais no artigo 1º do referido dispositivo legal: “As empresas privadas, os órgãos e entidades da administração pública, direta e indireta, ficam proibidos de adotar qualquer prática de revista íntima de suas funcionárias e de clientes do sexo feminino”.

Ainda sobre os dias de visitações dos familiares aos internos, é salutar descrever que elas ocorrem nas próprias acomodações onde estão os apenados. Os agentes penitenciários inicialmente soltam todos os presos indiscriminadamente na rua estabelecida, mesmo aqueles que não têm visitas, para que as celas possam ficar abertas, propiciando, assim, a visitação íntima que é organizada entre os próprios reclusos. Realizada essa “destranca”, os agentes, dentre as tarefas já mencionadas, conduzem repetidas vezes esses visitantes até os locais onde se encontram os seus parentes recolhidos.

O guarda dispõe pela própria natureza de suas funções, de considerável autonomia decisória no âmbito de suas atividades [...]. Isso requer o domínio de um saber essencialmente prático em sua origem [...].O que constitui esse saber é, principalmente, o diversificado e sempre renovado repertório de recursos que os presos elaboram para iludir a vigilância do guarda. Como dizem os internos, “ a cabeça do preso é a oficina do diabo”; neste caso, cabe ao guarda interferir na “produção” dessa oficina, espionar sua “tecnologia”, desmontá-la para conhecê-la e neutralizá-la. Consegui-lo constitui para o guarda fator de honra e orgulho profissionais (COELHO, 2005, p.97-98).

Uma vez conhecida a práxis intramuros que envolve o mister dos agentes penitenciários, faz-se necessário analisar, de forma peculiar a compatibilidade das funções: punir e recuperar em um mesmo profissional, em meio a tantos conflitos estruturais e comportamentais próprios do ambiente.

3.3. Orientação e repressão – vigilância e recuperação

Considerando a necessidade de identificar a probabilidade de coexistência da paradoxal missão de punir e recuperar desses profissionais, imprescindível se faz analisar brevemente os aspectos norteadores que compõem uma instituição total como a prisão, para Goffman (2015, p.16) toda Organização obtém de seus envolvidos uma parcela de suas vidas e de suas conveniências, ao passo que lhes dá alguma coisa de um universo.

Aduz, ainda, que toda instituição tem propensões de “fechamento” de forma mais ou menos acentuada e o que vem a demonstrar a sua natureza total é o bloqueio, o impedimento ao acesso para com o relacionamento societário que envolve o universo exterior, evidenciado estruturalmente em suas concepções físicas como “portas fechadas, paredes altas, arame farpado, fossos, água, florestas ou pântanos” (GOFFMAN, 2005, p.16).

Nas relações sociais existentes, as diversas e mais básicas atividades humanas tendem a ocorrer em ambientes diferenciados e na presença de grupos distintos, tais como: o ambiente familiar e seus membros; a escola ou faculdade e os colegas; as relações interpessoais com o chefe ou colegas no trabalho; tudo numa sintonia organizada, cuja participação individual cabe à liberdade de escolha de cada pessoa. Numa instituição total como a prisão, há veementemente a quebra dessa idiossincrasia, na qual todos passam a partilhar das mesmas atividades, dispostas no mesmo grupo, durante os mesmos horários estipulados e sob o controle das mesmas autoridades.

O controle de muitas necessidades humanas pela organização burocrática de grupos completos de pessoas – seja ou não uma necessidade ou meio eficiente de organização social nas circunstâncias – é o fato básico das instituições totais. Disso decorrem algumas consequências importantes (GOFFMAN, 2015, p.18).

Observada a partir de uma visão panorâmica, a instituição total tem nitidamente um fracionamento entre dois universos: um mais numeroso e formado pela população que a habita e outro menos amplo constituído pelo grupo denominado por Goffman (2015) como “dirigente”.

Essa divisão, notadamente acaba por contrapor os dois grupos que inevitavelmente precisam conviver diariamente em suas posições antagônicas. Para Goffman (2015), nessas instituições, a atividade preponderante do “dirigente” é a vigilância, o controle no zelo pelo cumprimento daquilo que fora estabelecido. Entende que orientação ou inspeção periódica é atividade inerente às relações de empregador-empregado, o que não é o caso.

[...] uma vez que a necessidade de vigiar e manter a ordem em uma instituição total com as características das prisões coloca os agentes penitenciários sempre em uma posição ambígua posicionando os indivíduos desse grupo entre dois mundos: o da lei/ordem e o do crime/desordem. Um efeito imediato desta disposição seria um estresse contínuo produzido por um diferente e, por vezes, estranho tipo de familiarização (MORAES, 2005, p.221,- 222).

Nessa mesma linha de compreensão, acabam se delineando as características da prisão e das relações entre presos e guardas, o que se potencializa por ser este último o mais imediato e constante contato do primeiro com o mundo além das grades. A vigilância pressupõe uma autoridade por parte dos agentes penitenciários que em muito desagrada aos detentos, o que ocasiona um convívio constantemente desequilibrado, como afirma Coelho (2005, p.108) referindo-se “à relação guarda-preso”:

Existem fortes constrangimentos de ordem moral que restringem o número, a natureza e o conteúdo dessas interações. Já foi visto como o guarda, buscando preservar sua autoridade e a ascendência moral sobre o interno, impõe restrições severas à interação. Do lado da ‘sociedade dos cativos’, as suspeitas de delação funcionam como eficiente mecanismo de controle sobre as relações do preso com os guardas. De fato, o código dessa sociedade penaliza fortemente não só a colaboração com os guardiões, mas até mesmo formas mais amistosas de contato.

Com as mudanças históricas ocorridas notadamente no século XVIII, a nova concepção de castigo e prisão passa a ser reformadas sob a visão daquilo que é justo e reto, os pensamentos se direcionam, mesmo que acanhadamente, a um entendimento de que o infrator, independentemente do delito que cometeu, é um ser humano e por isso deve ser tratado como tal.

No Brasil, a concepção de direitos humanos ocorreu morosamente, preponderantemente devido à Ditadura Militar compreendida entre o período de 1964 e 1985, ocasião em que a falta de democracia e de direitos constitucionais imperava.

Começa então a surgir para os agentes penitenciários, mesmo que de forma embrionária, questões como “humanização” e “recuperação”. No pensamento de Moraes (2005, p.154), o aprisionamento concretizado no sistema prisional quando passa a enunciar, através dos seus defensores, ambientes de castigo, com maior ou menor ênfase à recuperação, são organizações singulares que já se iniciam carecendo de conserto.

Notabilize-se que de forma legal, compete ao agente penitenciário à atribuição de agir de forma a “humanizar” o ambiente do confinamento, atuando diretamente na ressocialização do preso, garantindo-lhe um tratamento penal digno obedecendo à dignidade da pessoa humana e a igualdade entre todos como preconiza a Constituição da República Federativa do Brasil em seu artigo 5º (1988, online): ”Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se, aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País, a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.

Estamos, outrossim, destacando que as prisões e os sistema penitenciários que nascem sob a égide da reforma são, na prática, reformados com uma certa frequência e continuam sendo o que sempre foram. Parece que essas instituições são caso mais exemplar do dito ‘mude para que tudo continue como está’ (MORAES, 2005, p.150).

A Lei de Execução Penal (KUEHNE, 2010, p.35) em seu artigo 1º já define o dúplice objetivo de sua aplicação, quais sejam à correção do ato criminoso cometido e a adequação na recolocação social daqueles que estão encarcerados.

No Estado do Ceará, essa dupla função paradoxal de vigiar/punir e recuperar/orientar do dispositivo legal recai na categoria dos agentes penitenciários de forma mais contínua, do que nos demais grupos existentes na estrutura prisional, por estarem estes servidores em contato direito e constante com os presos como representantes do Estado Poder.

Para Chies (2008), o encarceramento moderno, em seu aspecto de estrutura social, já deve ser compreendido como uma organização contraditória, na medida em que alberga propósitos institucionais inconciliáveis.

[...] visualizar a Prisão (os estabelecimentos prisionais) em concreto, na realidade brasileira, é confirmar a existência dos paradoxos teóricos, numa maximização de seus efeitos perversos e de suas exigências estratégicas em relação aos grupos presentes na organização (CHIES, 2008, p.156).

A internalização desses deveres contraditórios começa a ser inserida na rotina desses profissionais cearenses, no início do Curso de Formação, cujo disciplinamento coaduna módulos que tratam de valorização humana e reinserção social, como também a utilização de armas de fogo e aprendizagem adequada de imobilização e algemação de presos.

Destaque-se que tal disciplinamento vem disposto no Regulamento do Curso de Formação Profissional para os Candidatos ao Cargo de Agente Penitenciário (2012, p. 16-17) reproduzido de forma a indicar uma disciplina hierárquica bem definida com inclusão de tópicos que tratam dos direitos, deveres e medidas disciplinares aplicáveis ao “candidato-aluno”, num modelo similar àquele retratado para os reclusos. A instrução total tem duração de duzentas horas, sendo realizada completamente em cinco semanas.

Art. 72 São deveres dos candidatos-alunos: I- Obedecer às normas contidas no presente Regulamento; II- Ter zelo e desenvoltura no cumprimento das tarefas; III- Comparecer pontualmente e assiduamente às atividades do CFP/SEJUS; IX- Cumprir as determinações da Coordenação e dos Professores/instrutores; XIX- Cumprir e fazer cumprir o presente Regulamento.

Através desse processo de formação, os novos agentes penitenciários chegam ao ambiente carcerário e se deparam com uma realidade, em muito, diferente daquela que fora suscitada como exequível, salvo os esclarecimentos norteados por agentes penitenciários que fazem parte do corpo docente, que demonstram um pouco da realidade intramuros.

Segundo Bateson (1973, apud MORAES, 2005, p.95):

Quando o indivíduo ingressa no sistema penitenciário passando a trabalhar no interior das prisões em contato diário e intenso com os presos, lá constitui ou continua a constituir (considerando se é o primeiro emprego, se mudou de atividade, etc.) sua identidade de trabalhador. Vê-se diante de inúmeras ambiguidades do sistema penitenciário – que repousam na ideia de que a instituição é ressocializadora, e o agente penitenciário um dos importantes elementos desse processo e o que ele efetivamente vivencia, ou seja, a quase inversão do discurso oficial – fazendo com que se estabeleça um duplo vínculo que a todo instante ameaça seu equilíbrio.

A partir dessa frustração, se evidenciam claramente três modelos de agentes penitenciários no Estado: o primeiro que se percebe como polícia, portanto age de forma ostensiva, elegendo o viés punitivo como sua forma característica de trabalho; o segundo, formado por aquele que em meio à frustração funcional acaba por negligenciar os preceitos mais básicos da função, justificando esse comportamento como consequência da “humanização/liberalização”; e o terceiro, composto por aquele que busca aliar as especificidades ambíguas de suas funções, dentro dos limites que consegue e das condições de trabalho que lhes são ofertadas.

Obviamente o próprio interno percebe claramente o dilema do guarda e explora a situação. Ele capitaliza a seu favor, em todas as circunstâncias, a política de ‘humanizar’ ou ‘liberalizar’ as prisões, que ele atribui à ingenuidade e inexperiência dos que a propõem e dos que nela creem (COELHO, 2005, p.116).

A dinâmica cotidiana dos estabelecimentos prisionais cearenses muda bastante de um lugar para o outro; dentre penitenciárias, presídios, hospitais de custódia e cadeias públicas a diversidade das tarefas dos agentes é exaustivamente dificultada pelo número de internos, pelas poucas condições de trabalho que vão desde a falta de equipamentos de segurança até a padronização nos procedimentos a serem adotados, como também na exacerbação da massa carcerária que também está envolta nas mais diversas carências, como número excedente à capacidade local, falta de profissionais para atendimento mais básico como saúde, e que a todo o momento se reportam aos guardas para solicitar alguma coisa.

Devido a essa diversidade na estrutura e dificuldade na funcionalidade das unidades carcerárias, esses servidores são obrigados a se adequarem às condições existentes em cada ergástulo e sob o ponto de vista operacional, notadamente a segurança do local com vistas a impedir fugas e motins é o aspecto preponderante.

Não existe no Estado, um estatuto ou manual atual que discipline os procedimentos ou a forma de atuação de suas funções de um modo geral, o que ocasiona uma ocorrência procedimental envolta em subjetividades, que vão de uma escala mais ampla a mais restrita, convencionada pela direção de cada local, setor de chefia de segurança, equipe plantonista até alcançar o próprio agente penitenciário que mesmo inserido nesse sistema tem o “seu modo de trabalhar”. O que também favorece a inclinação para a realização apenas do supostamente possível, qual seja vigiar e tentar manter a ordem e a segurança.

A Comissão de Direitos Penitenciários da Ordem dos advogados do Ceará, em inspeção realizada em duas unidades prisionais localizadas no mesmo espaço físico: Casa de Privação Provisória de Liberdade Adalberto Barros Leal, conhecida como “Carrapixo” e o Centro de Triagem, relatou que há em ambas superpopulações carcerárias, condições insalubres com vários presos doentes, além de pequeno efetivo de agentes penitenciários e inexistência de projetos de reinserção social. O Presidente da Comissão fez também referência à propensão aos riscos de fugas para a segurança dos agentes penitenciários, o que vem a corroborar com as afirmações de más condições e insegurança laboral dos mesmos na atualidade (COMISSÃO..., 2016, online).

Ante o exposto, percebe-se que há no ordenamento jurídico, vários dispositivos que acolhem a duplicidade das finalidades do encarceramento quanto à correição e à recuperação do recluso de liberdade, cujo sentido restrito acaba por designar a missão dos agentes penitenciários, todavia faltam condições que favoreçam e positivem a execução dessas tarefas no contexto atual do sistema penitenciário brasileiros, recorte-se o cearense.

Esse antagonismo de atribuições destinadas especialmente aos agentes penitenciários é demasiadamente criticado por estudiosos que, caracterizam-no como “perverso” e inviabilizam sua coexistência em um mesmo profissional, o que acarreta nesses servidores impactos em todas as esferas de sua vida intra e extramuros vivenciados através de estigmas convergidos a eles pelos presos e pela sociedade, bem como pela manifestações de enfermidades físicas e psíquicas, que serão melhor examinados ao longo do próximo capítulo.

4. IMPACTOS INTRA E EXTRAMUROS A PARTIR DA FUNÇÃO PRISIONAL

Nos cárceres vivem as pessoas que cometeram delitos, que foram consideradas pela sociedade nocivas, e que por isso foram segregadas, retiradas da convivência social, através de dispositivos legais devidamente amparados, os “desviantes” (FOULCALT, 1999). Em paralelo a esse grupo estão os agentes penitenciários, responsáveis pela execução da tutela organizacional como representantes do Estado, cuja posição desconhecida e por consequência desvalorizada, acaba por absorver parcela negativa dos resultados do encarceramento “institucional”, somatizando no homem e no profissional, características específicas relacionadas à natureza do seu trabalho, bem como estigmas e pré-conceitos, “equipe dirigente” (GOFFMAN,2015).

Como decorrência direta das peculiaridades estruturais da instituição penitenciária, resta o sistema social da prisão por se constituir a partir de algumas características próprias que, se por um lado afetam de forma mais contundente os membros do grupo social constituído pelos apenados, atingem de forma mais ou menos direta a todos os membros que compõem a organização, determinando as formas concretas das relações sociais que reproduzem, mantêm e tendem a agravar a inerente conflitividade do sistema organizacional em questão (CHIES, 2008, p.71).

Para Andrade (2015), no interior das prisões existem verdadeiras comunidades, totalmente desligadas das comunidades extramuros, “convencionais”, que são formadas por aqueles que foram expurgados da sociedade por se apartarem dos preceitos legais, bem como por aqueles que institucionalmente são os responsáveis pela tutela e pela busca da modificação das atitudes dos primeiros, tendo esse último grupo a obrigação de assegurar a manutenção das normas estabelecidas, ambos vivendo cativos por entre as muralhas.

A partir desse entendimento, para que se possa melhor entender a contextualização intra e extramuros vivida pelos agentes penitenciários cearenses, necessário se faz, inicialmente situá-los em seu universo laboral: a prisão, demonstrando suas características físicas, emocionais e profissionais adequadas e/ou necessárias para a prática da função, com as insatisfações e obstáculos para sua realização, bem como buscar exteriorizar como se dá essa confluência de sentimentos e atitudes oriundas da especificidade de sua atividade laboral em sua vida familiar e social.

Em verdade, considerando-se como são representados nos filmes, na literatura e na imprensa, os agentes penitenciários sentem-se como os ‘homens maus’ da história. Tudo se passaria como se, no interior do sistema penitenciário, houvesse uma inversão de valores e os bandidos e ‘maus’ passassem para o lugar de vítimas, perseguidas, agora, pelos agentes penitenciários, seus satanizados algozes. Aliás, certa vez falou-nos um agente penitenciário: ‘ O interno atravessa a cadeia e passa de leão a anjo é a metamorfose do detento’ (MORAES, 2005, p.54-55).

Os estabelecimentos prisionais do Estado do Ceará têm várias desigualdades estruturais no que tange especialmente à arquitetura, à finalidade e às especificidades da população carcerária referente ao qualitativo e quantitativo por ergástulo, o que ocasiona uma variação dos trabalhos realizados pelos agentes penitenciários quanto à cadência dos serviços, os riscos, o comportamento e o nível de estresse que envolve esses servidores, ainda que, em tese, a função executada e suas concepções sejam as mesmas.

De acordo com a Portaria da Secretaria da Justiça e Cidadania de nº 059 de 2014, publicada no DOCE de 30 de janeiro do mesmo ano, os estabelecimentos prisionais de Fortaleza e Região Metropolitana estão dispostas da seguinte forma: Duas Unidades Prisionais-Ups: Unidade Prisional e Centro de Triagem e Observação Criminológica Desembargador Francisco Adalberto de Barros Leal – UPCT e Unidade Prisional Agente Penitenciário Luciano Andrade Lima – CPPL I; três Casas de Privação de Liberdade: Casa de Privação de Liberdade Professor Clodoaldo Pinto – CPPL II, Casa de Privação de Liberdade Professor Jucá Neto – CPPL III, Casa de Privação de Liberdade Agente Penitenciário Elias Alves da Silva;

Há também dois institutos penais: Instituto Penal Feminino Desembargadora Auri Moura Costa- IPF (destinado às mulheres encarceradas) e Instituto Penal Francisco Hélio Viana de Araújo, em Pacatuba; um Presídio (Instituto presídio Professor Olavo Oliveira- IPPOO II); e dois estabelecimentos hospitalares: Hospital e Sanatório Penal Professor Otávio Lobo e Hospital Psiquiátrico Governador Stênio Gomes.

Registre-se que a Portaria supramencionada, estabelece ainda que as duas unidades prisionais abrigam os presos de alta periculosidade, as CPPLs II e III acolhem os de periculosidade leve à média, a CPPL IV aqueles reclusos com periculosidade de proporção apenas média, bem como o Instituto Penal de Pacatuba que se destina a presos em regime fechado de pena, e o IPPOO II, aos apenados em regime semiaberto. O IPF, única unidade feminina do Estado, comporta presas em todos os regimes de pena como também as provisórias. O Hospital Penal e o Instituto Psiquiátrico albergam respectivamente os presos que necessitam de tratamento médico e àqueles submetidos à medida de segurança ou tratamento psiquiátrico.

Concernente aos estabelecimentos prisionais cearenses existentes há ainda no Estado, segundo o Censo Penitenciário do Ceará (2013/2014) realizado através de parceria entre a Secretaria da Justiça e Cidadania e a Universidade Federal do Ceará, 134 Cadeias Públicas distribuídas nas macrorregiões e duas Penitenciárias regionais, sendo uma ao norte: Penitenciária Industrial e Regional de Sobral- PIRS e outra ao sul do Estado: Penitenciária Industrial e Regional do Cariri- PIRC, ambas recebem presos em todos os regimes de pena, bem como presos provisórios. De acordo com Lourenço (2010, p. 36):

É nesse local, que grupos de funcionários irão empenhar-se profissionalmente boa parte de suas vidas, visando à constituição, ao desenvolvimento e à consolidação de suas carreiras. No interior das prisões, esses funcionários buscarão construir suas próprias vidas enquanto pessoas historicamente constituídas. Na lida diária pela sobrevivência física e psíquica, enfrentarão barreiras constituídas pelo próprio ato de trabalhar, bem como originadas da instituição prisão.

Algumas das Ups cearenses possuem estruturas fechadas, sendo totalmente circundadas por muralhas e outras no lugar dos muros elevados possuem alambrados por todo o entorno; ambas as estruturas são, de forma precária, prioritariamente vigiadas por policiais militares e a minoria delas por agentes penitenciários.

Sendo o contato direto do preso com o mundo além das grades, os agentes penitenciários são solicitados a todo o momento pelos reclusos, seja para condução na prestação de atendimentos diversos (saúde, jurídico ou outros disponíveis), seja para entrega de “catatau”, bilhete feito em qualquer papel redigível, normalmente tampa de marmitas (quentinhas) destinadas à direção ou outro setor, ou ainda pelos mais diversos e inusitados motivos.

Na execução das tarefas diárias, o agente penitenciário tem multifunções, é um pouco de padre, pastor, médico, advogado, irmão, ou seja, tem que lidar com as mais diversas situações e na medida em que precisa controlar suas emoções pessoais, estando sempre vigilante, necessita também aprender a pensar como o preso, se antecipando às suas atitudes, pois nunca se sabe quando a solicitação, em meio a gritarias de homens enclausurados, não é uma forma de tentar chamar a atenção do guarda para empreender contra ele uma emboscada com a finalidade de fugir ou se rebelar:

Para tão poucos controlarem tantos, é preciso conhecer as leis do crime, entender o funcionamento da cadeia, a dinâmica e o impacto do encarceramento na mente humana; decifrar personalidades e intenções ocultas, ter anos de experiência e empregar métodos nem sempre ortodoxos. O carcereiro que faz diferença na imposição da disciplina e na manutenção da ordem nas galerias é aquele capaz de antecipar-se aos acontecimentos inusitados. No entanto como adivinhar quem prepara um plano de fuga, destila pinga, suborna um funcionário para que traga celulares, drogas ou faça vista grossa à entrada do revólver que causará a próxima tragédia (VARELA, 2012, p.24).

Do ponto de vista de Moraes (2005), os agentes penitenciários estão rendidos às pressões referentes a uma sociabilização rápida do mundo na prisão, necessária para a permanência intramuros, tal qual acontece com os presos, porém esse tirocínio não ocorre sem um grande prejuízo da mente e da identidade, pois, para o agente penitenciário, isso indica assemelhar-se com o que ele classifica como seu oposto.

No que concerne aos agentes penitenciários especificamente, Varela (2012) infere que a estrutura física dos “guardas de presídio” era muito variada, não obedecendo a um padrão de compleição, porém aqueles mais antigos eram preponderantemente mais fortes fisicamente, por terem sido admitidos, certamente num período em que a defrontação era necessária.

Ainda segundo Varela (2012), quanto ao sentido social, a estabilidade do serviço público e a necessidade de começar a trabalhar cedo, como os demais membros da família, são fatores determinantes para a escolha da função, pois não é vontade da maioria desses servidores ingressar no mundo do cárcere. Ser agente penitenciário não parece uma opção vocacionada, mas uma necessidade de ocupação laboral com finalidade de provimento.

No Ceará, a constituição física dos agentes penitenciários, a exemplo do retratado por Varela (2012), também não obedece a padrões: altos, baixos, magros ou gordos, os agentes penitenciários cearenses são diferenciados entre si, não pela estatura ou pelo porte físico e, sim, pela coragem, postura, desenvoltura na verbalização e condução das atividades com a massa carcerária, bem como quanto à capacidade de decidir rapidamente sobre os mais diversos assuntos.

Essa ambiguidade ou imprecisão típica das ações ou tarefas profissionais no interior do cárcere, assim como das decisões que esses funcionários devem tomar de forma rápida e, às vezes, emergencial, se reflete quase invariavelmente, em situações de vida profissional (individual e coletiva) nada confortáveis para esses trabalhadores (LOURENÇO, 2010, p. 48).

Em uma unidade como a já exemplificada, CPPL I que abriga os presos mais periculosos do Estado, com superlotação ratificada e um histórico constante de fugas e resgates, os agentes lidam diariamente com a insegurança e instabilidade dentro e fora dos muros da unidade:

A fuga de cinco perigosos detentos, ocorrida na madrugada de ontem (21), numa das Casas de Privação Provisória de Liberdade (CPPL), no município de Itaitinga, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), confirmou as denúncias constantes de fragilidade e descontrole do Sistema Penitenciário cearense. A fuga na CPPL I só foi confirmada à tarde, depois que a própria polícia civil recebeu denúncias anônimas sobre o caso (RIBEIRO, 2016, online).

Nesse contexto de insegurança diária, os agentes penitenciários denotam sentimentos e emoções que se convergem e se confrontam a todo o momento diante das mais diversas situações ocorridas na “cadeia”.

A modalidade da clientela e as particularidades impostas pelo cotidiano prisional, ocasionam nesses profissionais um desgaste emocional e psicológico capaz de afetar sua saúde física e mental, bem como suas relações profissionais e pessoais, por ser “ um trabalho que se oferece por um lado como base de referência mais substantiva de sua identidade e que se reveste, por outro lado, da mais pesada carga de ilegitimidade perturbadora” (DUARTE, 1986, p. 233, apud SILVEIRA, 2009, p.3).

Diante de algumas das características que constroem a função dos agentes penitenciários, importante se faz analisar o duplo estigma vivenciado por esses profissionais, pois ao passo que são estigmatizados pelos reclusos por representarem a figura de um Estado que não atende de forma adequada suas necessidades mais básicas, como determinam os dispositivos legais, também são estigmatizados pela sociedade, devido à proximidade que estabelecem com os “fora da lei” em virtude de sua profissão.

4.1. Impactos da dupla estigmatização do agente penitenciário cearense em sua função

Para Goffman (2004, online), a sociedade define os critérios para qualificar os indivíduos e a soma das características julgadas como habituais e espontâneas para os elementos encontrados nessas qualificações; infere ainda, que as esferas sociais determinam os grupos de pessoas que têm probabilidade de estarem inseridas nessas qualificações, o que ele denomina de “identidade social”.

A partir dessa categorização pré-definida do indivíduo, o estigma se revela como um atributo que não se encontra dentro do coletivamente predito como costumeiro, se antagonizando aos chamados por Goffman (2004, online) de “normais”, ou seja, aqueles atributos que se encontram dentro das perspectivas sociais usuais.

A partir desse entendimento, observa-se que a prisão cria estigmas nos agentes penitenciários que se exteriorizam sob dois aspectos: um frente aos reclusos de liberdade que vem esses profissionais como vigilantes e opressores, não só pela realização da tarefa em si de manutenção da ordem carcerária, mas também como representantes de um Poder Público que não realiza efetivamente as prestações assistenciais descritas em Lei; outra, frente à sociedade que constrói a identidade desses servidores através das máculas das prisões, pela proximidade que tem com os presos diariamente, como também pelos noticiários exibidos pela mídia que sempre acabam atribuindo em maior ou menor escala a essa categoria o fracasso da reinserção social dos encarcerados:

Como este grupo profissional é visto como responsável exclusivo pela violência e pelos impedimentos à ressocialização, acredita-se que seu ceticismo seja decorrente deste fato. Por outro lado, como o acesso aos agentes penitenciários, por uma série de motivos por nós apresentados, não é fácil nem simples, este grupo tem sido pouco ouvido e sua compreensão do problema ignorada (MORAES, 2005, p.267).

Nas prisões cearenses, o agente penitenciário vivencia diariamente a hostilidade da massa carcerária em virtude das condições insuficientes, relativas às condições de sobrevivência intramuros; como representantes do Estado, esses trabalhadores figuram como a “ponta da lança” que evidencia a precariedade do tratamento penal dispensado aos reclusos de liberdade.

Não raras ameaças diretas a esses servidores são dirigidas ao Estado como forma de reclamações, como demonstra uma carta supostamente escrita por detentos de duas unidades prisionais do Estado, entregue a um motorista de um coletivo logo após ser o transporte incendiado, em que os presos, ao reivindicarem respeito, água e energia nesses estabelecimentos, ameaçam tirar a vida dos agentes penitenciários caso não fossem atendidos (SISNARDO, 2015, online).

Mas, para além de todo controle explícito ou da força do código, está o fato de que efetivamente o guarda representa e simboliza tudo o que oprime o preso, ou tudo que o preso experimenta, como negligência, frustração, carência e opressão. Consequentemente, o guarda constitui o alvo imediato de sua hostilidade e a interação entre ambos será frequentemente áspera (COELHO, 2005, p.108).

A Lei nº 12.993, de 17 de junho de 2014 alterou a Lei do desarmamento (Lei nº 10.826/2003) para autorizar que os agentes e guardas prisionais em todo o Brasil possam conduzir, mesmo não estando de serviço, arma de fogo particular ou da instituição, o que ratifica o entendimento do legislador quanto aos riscos da profissão mesmo estando esse trabalhador em seu momento de folga. Ressalte-se que a Lei do desarmamento (art. 6º, VII) já fazia menção aos agentes penitenciários, porém só podiam os mesmos portarem o armamento em serviço. Estabelece a Lei nº 12.993/2014:

Art. 6º 1- Os integrantes do quadro efetivo de agentes e guardas prisionais poderão portar arma de fogo de propriedade particular ou fornecida pela respectiva corporação ou instituição, mesmo fora de serviço, desde que estejam: I submetidos a regime de dedicação exclusiva; II sujeitos à formação funcional, nos termos do regulamento, e III subordinados a mecanismos de fiscalização e de controle interno.

Concernente ao Estado, anteriormente ao dispositivo federal, o Ceará já dispunha de legislação autorizativa referente ao porte de arma de fogo pelos agentes penitenciários fora de serviço, haja vista, os riscos inerentes à função dessa categoria, mostrarem-se deveras aparente: Lei nº 15.455, de 08 de novembro de 2013 dispõe sobre o direito de porte de arma de fogo pelos Agentes Penitenciários do Estado do Ceará: Art.1º Os integrantes da carreira de Agente Penitenciário têm direito de portar arma de fogo de propriedade particular, mesmo fora de serviço, no âmbito do Estado do Ceará, na forma e sob as condições previstas nesta Lei.

O risco de fugas e rebeliões associado às ameaças constantes dos presos aos agentes penitenciários locais, são fatores determinantes para o constante clima de insegurança vivenciado por esses profissionais dentro e fora das prisões cearenses, o que ocasionam vários impactos e desestabilidades físicas, psíquicas e emocionais em todas as esferas de suas vidas.

Não bastasse o número elevado de obstáculos encontrados pelos agentes penitenciários através da própria natureza de sua função intramuros, tem esse profissional ainda, que lidar extramuros, rotineiramente com a desaprovação da sociedade que o visualiza, em sua maioria, ora como malvado torturador e desumano invertendo os papéis entre presos e guardas, ora como corrupto e marginal em potencial pela proximidade estabelecida por seu labor com esse mesmo preso.

Pode-se relacionar que há um conflito quanto ao estigma existente em relação ao agente penitenciário, pois a sociedade imprime suas marcas em acordo com suas concepções e critérios. Por outro lado, essa ‘impressão’ é transferida ao profissional que, destarte, em vez de refutar, poderá ratificá-la, internalizando e potencializando esse estigma (SANTOS, 2007, p.30).

Para a sociedade, o agente penitenciário produz um laço de intimidade com o preso devido à proximidade que tem com o mesmo pela especificidade da sua função em meio ao confinamento, capaz de transformá-lo em uma pessoa “suspeita”. Nesse sentido Silveira (2009, online) entende que:

Tal contexto leva a sociedade como um todo a considerar ambos os grupos como sendo um só, quando na verdade uma situação especial, qual seja, a do trabalho, leva os agentes penitenciários a privarem da vida do indivíduo estigmatizado. Desta maneira, o olhar estigmatizante dirigido aos agentes penitenciários não deixa de ser uma extensão do estigma que marca os encarcerados e, o agente penitenciário que seria apenas um ‘informado’ a respeito do criminoso passa a ser tido como um ‘desacreditável’. . Daí o fato da condição fronteiriça vivenciada pelos agentes penitenciários torná-los desacreditáveis em alguns contextos extramuros, nos quais, trazer a público sua condição de custodiador pode torná-los depositários de um estigma, num movimento de deslocamento do estigma que originariamente cerca os presidiários.

Para Chies (2008), ainda que os agentes penitenciários trabalhem em meio a diversidades de suas próprias convicções e sempre buscando alcançar o que a sociedade espera deles, sentem-se imensamente desvalorizados profissionalmente, totalmente abalados em sua estima.

Frequentemente, agentes penitenciários cearenses se furtam de mencionar qual sua atividade no serviço público não apenas por garantia do sigilo necessário diante de ex-presidiários ou pessoas ligadas aos detentos, que possam de alguma forma vir a ser uma ameaça às suas integridades físicas, mas também pelo receio da desaprovação e desconfiança da sociedade, para Goffman (2004, online) “surge no estigmatizado a sensação de não saber aquilo que os outros estão ‘realmente’ pensando dele”.

4.1.1. O processo de prisionização

Outro fenômeno que se submete à categoria dos agentes penitenciários, recorte-se os cearenses, trata-se da “prisionização”, denominação inicialmente descrita por Donald Clemmer em 1970, através de uma pesquisa realizada em prisões americanas, referindo-se a um processo de sociabilização distinta que se submetiam especificamente os presos, devido ao encarceramento. Processo que indubitavelmente também acomete os profissionais carcerários.

Para Chies (2008), a prisionização é a principal consequência da ação do sistema comunitário prisional na vida das pessoas que a ele estão obrigadas. Evidencia-se, pela maneira que os hábitos e costumes carcerários são assimilados pelas pessoas ligadas a ele: Por meio da prisionalização, o indivíduo incorpora, assimila, aprende, se integra e adota, em menor ou em maior grau, e de forma mais ou menos consciente, os valores, padrões e práticas vigentes no sistema social da prisão (CHIES, 2008, p.72).

A forma própria na linguagem, códigos e condutas circundam todo o universo interno das prisões e causa nas pessoas nele inseridas, um processo de convivência com essa cultura tão recorrente, que ocorre naturalmente a modificação de vários hábitos anteriormente vividos por esses grupos.

Nos agentes penitenciários cearenses, a prisionização ocorre mais frequentemente no vocabulário e gestos por eles utilizados. Palavras como “cruzeta” (armação), “caô” (enrolação) e “goró” (cachaça), bem como as expressões: “bater cadeado” (fechar as celas e ruas) e “é nenhuma” (está tudo certo) são expressões usualmente utilizadas por grande parte dos agentes penitenciários locais em suas vidas intra e extramuros, corroborando a lógica do processo de prisionização existente. Para Silveira (2009), ocorre nos agentes penitenciários o que ele chama de “fragmentação da identidade”, uma vez que esses servidores estão subjulgados a uma sociabilização diversa da sua por ocasião da sua atividade profissional.

O agente de segurança relata que a vivência cotidiana nas prisões, o fato de estar também atrás das grades resulta, após certo período de trabalho na impressão, de que ele também está cumprindo. Consequentemente, seu comportamento sofre uma alteração. [...] e se manifestaria por uma série de comportamentos similares aos dos sentenciados – linguagem e gestos – que o agente passaria a expressar (LOPES, 1998, p.134 apud LOURENÇO, 2010, p.42).

Nos estabelecimentos prisionais cearenses, esse processo de prisionização ocorre visivelmente com os agentes penitenciários, devido logicamente à convivência constante e próxima com a massa carcerária no seu dia a dia de trabalho, do qual necessariamente, para que se estabeleça a ordem e a disciplina intramuros, os agentes precisam “pensar como o preso” (MORAES, 2005), o que tende a acarretar, imprescindivelmente, na vida extramuros desse profissional uma sobrecarga psíquica refletida diretamente em sua identidade podendo se externalizar de várias formas.

Depreenda-se que se torna deveras utópica a chamada função ressocializadora da pena na função dos agentes penitenciários do Estado do Ceará, diante dos vários óbices no caminho encontrados, dos quais neste momento, elenque-se: o duplo estigma a eles imputados, aparente através da desvalorização da sociedade, possivelmente pelo desconhecimento real da importância de tão significativa tarefa no contexto integral da segurança pública local; da exasperação rotineira da população reclusa, que visualiza nesses servidores a representatividade de um Estado falho diante dos dispositivos legais postos, incapaz de promover minimamente o princípio norteador da Constituição Federal Brasileira de 1988 que é o princípio da dignidade da pessoa humana e os efeitos intrínsecos da instituição prisional que acomete de várias maneiras esses profissionais física, psíquica e emocionalmente.

4.2. Efeitos do trabalho prisional na vida familiar, profissional e social do agente penitenciário

Inicialmente, é importante demonstrar um pouco do que representa o choque inicial do trabalho dos agentes penitenciários nas prisões cearenses, a partir do qual se estabelecem sentimentos novos, oriundos da necessidade de adaptação com o ambiente e a clientela, bem como se fortalecem outros, de acordo com a individualidade de cada pessoa no que tange à ética, à moral e à índole.

A partir desse conhecimento, necessário se faz analisar o caminho contrário dessa dinâmica, ou seja, analisar como se exteriorizam esses sentimentos provocados ou aflorados nesses servidores, diante da vida laboral no cárcere em suas realidades extramuros.

[...] a trama complexa dessa interface, numa visão preliminar, deixa entrever uma via de mão dupla: de um lado, há o fluxo em que a subjetividade desloca experiências familiares para o mundo do trabalho; de outro, a corrente que transporta para a vida familiar determinações emanadas do trabalho. Mas os dois fluxos se entrecruzam muitas vezes, ao mesmo tempo em que dão lugar a dinâmicas pelas quais se realimentam reciprocamente (SILVA, 1994, p. 197 apud MORAES, 2005, p.232).

O primeiro impacto na chegada dos agentes penitenciários estaduais, em seu primeiro dia funcional, se dá evidentemente pelo distanciamento daquilo que fora dito teoricamente, como executável no curso de formação, e o choque de realidade visualizado pelos mesmos diante das limitações dos estabelecimentos prisionais superlotados, insalubres e desprovidos de condições adequadas, tanto para a acomodação dos presos como para a realização dos trabalhos a eles designados.

Inicia-se nesse momento, irrefutavelmente, as mudanças no comportamento e na vida desses profissionais. Moraes (2005) explica que “assim o primeiro dia torna-se para o agente penitenciário que está entrando, iniciando seu trabalho, uma fronteira que delimita a vida do cidadão comum e a de agente penitenciário”.

Segundo Moraes (2005), a percepção dos agentes sobre trabalho é:

Aprender a ser agente penitenciário é um exercício que já começaria, pelo menos na percepção dos agentes penitenciários que estão se iniciando, de maneira frequentemente dura. A maioria dos agentes penitenciários com quem conversamos se referia a esse momento como uma fase a não ser esquecida (MORAES, 2005, p.234).

A partir dessa consciência da realidade do seu ambiente de trabalho local, visivelmente observável, e de suas condições limitadas e desproporcionais ao que comumente lhe é exigido, o sentimento que nasce é o de frustração, que acaba por ensejar uma desmotivação clara, que é percebida até mesmo na aparência de parte desses profissionais que não possuem sequer uniformização padronizada e instrumentalizada para a realização mínima dos trabalhos, “é raro ver o guarda com o uniforme completo” (COELHO, 2005).

Nesse sentido, a banalização da precariedade do possível existente e a necessidade de adequação dos trabalhos executáveis para a realização das atividades diárias exequíveis, desponta o aparecimento de uma das características mais latentes na categoria de agentes penitenciários e que inexoravelmente, se externaliza em todos os aspectos de suas vidas: a desconfiança. Para Moraes (2005, p.224), “O que vem diretamente ao encontro de uma de nossas preocupações, a saber, investigar a desconfiança, habilita-nos a pensar os níveis de solidariedade, cooperação e coesão, no nosso caso, presente em instituições prisionais” (grifo original).

A intensificação do sentimento de desconfiança está intimamente associada ao fato de, ter o agente penitenciário que estar atento e perceptível a tudo que o cerca nas prisões: para os agentes, se a “cadeia” está agitada, tem-se que ficar esperto, pois pode acontecer algo errado a qualquer momento, e se a “cadeia“ está calma deve-se ficar mais vigilante, ainda, pois possivelmente aquela calmaria está escondendo a real intenção dos detentos.

Para Silveira (2009), essa atenção ininterrupta, oriunda de uma desconfiança do ponto de vista desses profissionais, imprescindível para a adequada realização da sua função, provém da necessidade de prever antecipadamente a intenção do preso, visto que sua atuação está diretamente vinculada às pessoas envolvidas.

Nesse sentido, inegavelmente, o sentimento constante de desconfiança existente nesses servidores, desencadeia uma vigilância perceptual capaz mesmo de aguçar seus sentidos nesse foco, ocasionando, invariavelmente uma carga de estresse emocional que os afeta psíquica e fisicamente.

De uma maneira geral, nós constatamos que a missão de vigilância desenvolve entre os agentes penitenciários uma faculdade de ver (e uma capacidade de observação em geral), que surpreende o observador externo. A mobilidade, a acuidade, a rapidez no olhar e o dom da ubiquidade são aspectos reais das qualificações do agente penitenciário. Nós observamos igualmente um desenvolvimento da acuidade e da sensibilidade auditiva que lhes permite prever e prevenir incidentes (CHAUVENET; ORLIC; BENGUIGUI, 1994, p.25 apud MORAES, 2005, p.224).

Concernente à vida familiar, a incapacidade de dissociar o profissional da pessoa comum, haja vista, a sociabilização arraigada a partir das peculiaridades da instituição total, nesse caso a prisão faz com que esses profissionais, não somente pelo processo de prisionização, mas também por todos os demais sentimentos que o absorvem cotidianamente, acabem por estender ao seio familiar, sentimentos como desconfiança, intolerância e estresse, oriundos do dia a dia no cárcere.

Através dessa linha de compreensão, Coelho (2005) estabelece que para os agentes penitenciários, o deslocamento prevalecente de sentimentos e reações ocorre do meio profissional para o familiar, agindo como significativo desestruturador da estabilidade familiar, aqui demonstrado na fala de um desses profissionais:

Sabe, eu me surpreendi, pô gritando com a minha filha, sendo áspero com a minha mulher ou ralhando por causa de bobagem, entendeu, porque você sai carregado da cadeia, o estresse é muito grande. Sai, sabe, saturado aí qualquer pé de galinha vira canja. Às vezes, a mulher vinha me trazer um problema qualquer eu falava ‘ pô, acabei de sair da cadeia, pô, um monte de pepino para descascar’ começava a me incomodar com aquilo, ela estava fazendo certo pedindo opinião para mim, pedindo para resolver os problemas que era minha obrigação resolver (MORAES, 2005, p. 232).

Ainda sob o ponto de vista extramuros, essas características se externalizam de várias formas também na vida social desses profissionais: Não frequentar lugares muito movimentados ou fazer acepções a eles; verificar sempre a presença de pessoas que podem parecer “suspeitas” nos ambientes que estão ou associar sempre que alguém o cumprimenta e não lembra de pronto quem seja, a um possível ex-presidiário que representa risco iminente à sua integridade física, são situações rotineiras na vida social dos agentes penitenciários cearenses, limitadoras de seu convívio em sociedade.

Afirma Chies (2008, p. 100), através de pesquisa realizada com agentes penitenciários, que “constatou sobrecargas e acumulações que tendem a provocar desajustamento e afetação da sociabilidade, o desenvolvimento de doenças psicossomáticas, numa dimensão abrangente do estresse, entre outras situações que foram verificadas”.

No Estado, com uma escala de 24 horas ininterruptas no interior dos estabelecimentos prisionais, mesmo diante da folga de 72 horas, comumente há relatos de agentes penitenciários dando conta de que os mesmos não conseguem se desvencilhar das UPs e suas rotinas, frases como “saio da cadeia, mas a cadeia não sai de mim” são usualmente utilizadas para demonstrar o quanto esses profissionais se aglutinam ao ambiente laboral mesmo não estando nele, devido às características próprias da prisão.

Por consequência, o acometimento de doenças físicas e psíquicas ocorre com frequência devido à sobrecarga emocional a que estão expostos esses profissionais. Ademais, o clima constante de insegurança faz da profissão de agente penitenciário a segunda mais perigosa do mundo, conforme estudos realizados em 2008 pela Organização Internacional do Trabalho- OIT que se mostram atualizados em nossa realidade.

Problemas relacionados ao alcoolismo, dependência química, depressão, síndrome do pânico e de Burnout são alguns dos motivos de licenças médicas, devidamente periciadas pelo Instituto de Saúde dos Servidores do Estado do Ceará- ISSEC em agentes penitenciários.

[...] as frustrações que sofrem os funcionários penitenciários em realizar funções antagônicas como agente reabilitador e agente de segurança. Estas, entre outras dificuldades, como também o contato diário com atendidos problemáticos, a massificação dos centros penitenciários, o afrontamento de situações com grandes tensões diárias, o estilo de mando inadequado, o clima laboral, a insegurança derivada do próprio trabalho, os conflitos na motivação ocupacional e a escassez de meios humanos e materiais são as razões pelas quais estes funcionários estão enquadrados no grupo de risco do Burnout (KUROWSKI; MORENO-JIMENES, 2002, p.214 apud LOURENÇO, 2010, p.56).

No próximo capítulo, será realizada uma abordagem concernente às perspectivas de um conhecimento adequado dos agentes penitenciários na busca da produção de um sistema penitenciário mais efetivo, tangente à complexidade de suas incumbências legais, bem como, na construção de alternativas capazes de se mostrarem exitosas para a realização das atribuições inerentes à sua função.

5. BUSCA DE ASCENSÃO COGNITIVA DOS AGENTES PENITENCIÁRIOS

A elevação do conhecimento dos agentes penitenciários, analisada de uma forma genérica, consiste em buscar através do conhecimento empírico adquirido cotidianamente no interior das prisões, proposições fundamentadas capazes de tornar mais eficazes a atuação desses servidores em suas funções concernentes ao disposto na legislação pátria. De forma específica, pode-se entender, como sendo o diagnóstico da realidade vivida intramuros por esses profissionais, sob as perspectivas das dificuldades e incongruências do sistema carcerário local, com a finalidade de elencar através da ascensão cognitiva dessa categoria, alternativas possíveis para a realização adequada de suas funções.

Mas atentar para a percepção dos agentes penitenciários sobre o sistema prisional pode permitir a identificação de problemas que normalmente sequer são tocados nas eternas reformas de que são alvo as prisões, inclusive porque este grupo profissional, sendo acusado pelo fracasso do encarceramento na regeneração dos indivíduos, torna-se alijado dos processos de mudança (MORAES, 2005, p.267-268).

Observa-se que a população carcerária é frequentemente ouvida em suas opiniões e reclamações, especialmente se essas reclamações são atinentes aos agentes penitenciários. Como parte legítima interessada, os reclusos de liberdade se utilizam dessa ausculta de forma a se fazerem ver no interior das prisões, devido à precariedade do tratamento penal, como vítimas, buscando se beneficiarem através dos discursos rotulados por “direitos humanos” e “dignidade da pessoa humana”, em muito distorcidos daquilo que realmente esses termos sugerem.

Corroborando com o entendimento de que a outra parte legítima para falar sobre o encarceramento, com toda propriedade, são os agentes penitenciários e que os mesmos não dispõem de iguais oportunidades e compreensões por parte da sociedade e do poder público para demonstrar suas ideias e convicções, os agentes penitenciários em sua totalidade, seguem quase que no anonimato no que tange ao seu conhecimento e liberdade de propor uma atuação modificadora efetiva do sistema carcerário, inclusive no que é pertinente a sua própria atuação.

O agente penitenciário, como servidor público constituído para desenvolver seu trabalho no interior dos cárceres como agente de “transformação”, por unir em sua controversa tarefa as funções de correção e reinserção social dos reclusos de liberdade, tem a necessidade latente de buscar entender como é possível a realização concomitante dessas atividades, como forma precípua para sua realização, bem como anseia por políticas públicas que possam favorecer a categoria nas situações mais triviais, como condições mínimas para realização do seu labor e um reconhecimento social que o dignifique pelo trabalho realizado, por uma questão de justiça aos profissionais.

[...] o empregador estatal, ao produzir e manter políticas públicas rudimentares e preconizadas para o setor penitenciário, acaba por alimentar o círculo vicioso dos problemas infindáveis decorrentes, tanto da reclusão e do isolamento de sujeitos sociais, para os quais não há solução possível dentro do cárcere, quanto do próprio exercício profissional dos agentes de segurança penitenciária (LOURENÇO, 2010, p.68-69).

A partir dessas necessidades e de outras, urge nesses profissionais, através da legitimidade a eles conferida, através do conhecimento empírico e na busca cada vez mais fundamentada de um conhecimento técnico, a necessidade em demonstrar suas exiguidades, opiniões e recomendações capazes de entender e aprimorar suas funções dentro da administração pública, como profissionais e pessoas comuns e também buscar alternativas que possam minimizar as incontáveis mazelas do Sistema Carcerário.

5.1. Fatores dificultadores de uma atuação eficiente para os agentes penitenciários

Falar das dificuldades no sistema carcerário brasileiro, com ênfase no cearense, é uma tarefa de extrema facilidade, haja vista as inúmeras deficiências existentes na atualidade, designadoras mesmo de um caos público, notório e pacificado. Evidentemente que os motivos não se exaurem em si mesmos, se a análise buscar um caráter sociológico, porém a abordagem no momento busca retratar as dificuldades e incongruências do sistema através da ótica e conhecimento dos agentes penitenciários, com inclinação ao viés jurídico.

A Lei nº 7.210 de 1984 (LEP) em seu artigo 1º ao instituir como objetivo da execução penal a correção do indivíduo alcançado pela sentença ou decisão criminal, como também a reintegração desse mesmo indivíduo à sociedade, demonstra os parâmetros norteadores maiores do ambiente carcerário, sendo clara também em seu artigo 77 “A escolha do pessoal administrativo, especializado, de instrução técnica e de vigilância atenderá a vocação, preparação profissional e antecedentes pessoais do candidato” quando separa de acordo com o escalonamento de atribuições existentes intramuros as categorias que executarão esses objetivos.

O Regimento Geral dos Estabelecimentos Prisionais do Estado do Ceará em seu artigo 2º define como finalidade do Sistema Penitenciário local “a vigilância, custódia e assistência aos presos e às pessoas sujeitas a medidas de segurança” o que ratifica o artigo 1º da Lei de Execução Penal quanto aos objetivos de correição e reinserção no tratamento prisional.

Em consonância com o artigo 77 da LEP, o Regimento geral dos Estabelecimentos Prisionais do Ceará em seu artigo 17, incisos I e II, estabelece que a segurança externa e interna é de responsabilidade da “ equipe de Agentes Penitenciários do quadro efetivo da Secretaria da Justiça e Cidadania que preserve os direitos do preso, mantenha a Segurança, a ordem e a disciplina da Unidade” o que ratifica a especificidade tangente à vigilância e à segurança prisional como categorização das funções existentes intramuros.

Na acepção da Lei de Execução Penal, perpassando pelo Regimento Geral dos Estabelecimentos Prisionais do Estado, é visivelmente clara a localização estrutural da função dos agentes penitenciários como vigilantes e responsáveis pela segurança nas prisões, o que aponta um dos mais recorrentes fatores que dificulta a prática eficiente desses profissionais em suas atribuições que é a confusa caracterização de agente ressocializador que tentam incutir nas formações profissionais dessa categoria e no seu dia a dia, sem ao menos se preocuparem em explicitar como ocorre esse desmembramento ou quais as condições adequadas a essa realização.

O agente penitenciário, por ser o elo que liga a pessoa cerceada de liberdade a todas as suas outras condições não abrangidas pela sentença ou simplesmente pela prisão, acaba sendo responsabilizado por todas as ações e reações realizadas pelos presos enquanto custodiados pelo Estado, o que visivelmente não é nem de longe o acertado.

É extremamente equivocado o pensamento de que o agente penitenciário age como ressocializador, primeiro porque os próprios dispositivos legais não designam isso, depois porque esse entendimento e disciplinamento acabam por ocasionar uma confusão interna nesses profissionais designadores de condutas dúbias, relapsas ou truculentas e, por último, pela total inexequibilidade de realização concomitante com a manutenção da ordem e disciplina dentro do distanciamento necessário entre os envolvidos.

No confronto entre os objetivos teóricos e os serviços concretos atribuídos ao guarda, este, como facilmente se compreende, resolve a testilha com agarrar-se aos últimos, considerando que os primeiros são matéria adequada, apenas, para diletantes no assunto, tais como professores, políticos, sacerdotes, escritores, etc. – gente que pode dizer e pensar o que quiser a respeito, sem assumir o risco de sofrer sanções pelos erros cometidos (THOMPSON, 1991, p. 42, apud CHIES, 2008, P.63).

No Ceará, tenta-se a todo o momento convencer os guardas sobre sua função ressocializadora, especialmente àqueles que se dizem exímios conhecedores do sistema carcerário local, mas que nunca puseram sequer os pés no interior de uma prisão ou puderam sentir o barulho ensurdecedor de uma Unidade quando a massa carcerária está “batendo” às vezes simplesmente solicitando direitos básicos como atendimento médico.

Outro fator que em muito dificulta, não somente a atuação eficiente dos agentes penitenciários como também a realização efetiva dos objetivos da execução penal, é a forma já visivelmente consolidada como fracassada da implementação de uma política de ressocialização através de ideias e conhecimentos exógenos à realidade prisional existente. O que frequentemente ocasiona uma humanização/liberalização em muito, prejudicial à sociedade, aos servidores e à própria manutenção da segurança interna do presídio.

Essa falta de clareza e desconhecimento da administração carcerária local, referente à forma adequada de instrumentalizar a atuação ressocializadora no tratamento penal, cujo direcionamento dos comandos ora denotam garantias da segurança e disciplina prisional, ora flexibilizam os comportamentos dos reclusos no que se refere ao regulamento das normas estabelecidas, fazem com que os agentes penitenciários se sintam em uma posição confusa e desprivilegiada, por não se sentirem resguardados, especialmente quando não ocorrem as punições aos detentos que realizam atos de desrespeitos contra eles.

Para Coelho (2005, p. 116), é claro que o detento visualiza o impasse do agente penitenciário e esquadrinha o momento. Ele investe em seu proveito, na totalidade das oportunidades o regime da “humanização” ou “liberalização” dos estabelecimentos prisionais, “que ele atribui à ingenuidade e inexperiência dos que a propõem e dos que nela creem.”.

Essa humanização transvestida de liberalização, mencionada como imprescindível para a ressocialização dos reclusos ocasiona uma “disciplina frouxa” (COELHO, 2005) que desestabiliza o próprio universo carcerário, por instituir informal e internamente a “lei do mais forte sobre o mais fraco”, ocasionando na massa carcerária a sensação de insegurança de convivência, desobrigação das normas estabelecidas e de incredulidade na natureza da instituição que, ao passo que não atua de maneira uniforme e norteadora de condutas, também não garante a integridade física dos seus custodiados. Para os agentes penitenciários, dentre as várias consequências negativas dessa “liberalização” está a visibilidade nítida e constante da impunidade e a distância cada vez maior do fator corretivo da pena, como forma de reflexão de conduta do recluso de liberdade.

Experimentos, alguns perigosamente canhestros, de ‘humanizar’ e ‘liberalizar’ as prisões constituem para os presos alterações unilaterais das regras do jogo. Consequentemente, ele não se sente obrigado por nenhuma norma de reciprocidade e não altera seu comportamento. Assim o preso mantém o padrão de comportamento ‘desviante’. A réplica do ‘ agora quem sabe sou eu’, que tanto mortifica e humilha o guarda, é a expressão mais completa de que o preso explora a precária posição do funcionário: cobra dele a adesão compulsória às novas regras da ‘liberalização’, ao mesmo tempo em que ele próprio permanece fiel às normas da ‘sociedade dos cativos’, mas agora com uma certa margem de impunidade (COELHO, 2005, p.116-117).

Consigne-se a importância e a necessidade da existência de projetos voltados à ressocialização dos encarcerados com o fito de recuperá-los, pois, inevitavelmente, esses reclusos irão voltar ao convívio social, e espera-se sempre que de forma melhorada, o que efetivamente não vem ocorrendo, devido a vários fatores recorrentemente conhecidos, os quais, indubitavelmente, merece destaque a forma desacertada de propor a chamada “ressocialização”.

Hodiernamente, confunde-se a todo o momento a “ressocialização” dos encarcerados, cuja tradução remonta o retorno do privado de liberdade ao convívio da sociedade através de um processo que visa socializá-lo novamente, com uma “liberalização” das normas estabelecidas no interior das prisões, utilizando o discurso da “humanização”, como forma de esconder a falta real de ações efetivas do Poder Público neste foco.

A política pública se reduz à sucessão de expedientes, a ofertas de proteção, cuja lógica é a do resultado feliz mais próximo. Faz-se cada vez mais grandiloquência, buscando segurança na imprecisão do que se propõe a fazer e, oportunista, apostando na exploração de sucessos eventuais ou na resposta salvacionista a desastres. Tem-se um ambiente que pode confinar esforços de governabilidade a ações esquizofrênicas e pontuais. Compreende-se, assim, a adesão ao que quer que seja a “moda” do momento. O vácuo da política pública favorece uma realidade em que a “politicagem” prospera, em que patrões e clientelas empreendem monopólios dos recursos públicos de polícia (e, por que não da administração carcerária!) para redistribuí-los como mercadorias, gentilezas ou generosidades privadas (MUNIZ, JÚNIOR, 2007, p. 169 apud LOURENÇO, 2010, p.69).

Essa deficiência estatal no Sistema Carcerário, em especial, o local, se concretiza através de administrações permissivas e desordenadas, que demonstram claramente a negligência de preceitos básicos que também estão inseridos na adequada execução penal, cite-se a correição dos apenados através do cumprimento de regras postas, pautadas no disciplinamento intracarcerário, que funcionará como forma de atuação pedagógica, num “ensaio” constante da conduta social que deverá ser adotada extramuros, cuja quebra por eles em outrora acarretou o seu expurgo da sociedade, devendo ser retomada no cotidiano prisional com vistas ao fator corretivo da pena e à reintegração comunitária dos reclusos.

Para os agentes penitenciários cearenses, esse é, incontestavelmente, um limitador inenarrável de suas funções, capaz mesmo de impedi-los de realizá-las em suas formas mais simplificadas.

A falta de condições mínimas de trabalho, de equipamentos de segurança, de qualificação profissional, de treinamento específico e até mesmo de efetivo suficiente de profissionais para uma realização segura das tarefas são dificuldades constantes na realidade diária dos agentes penitenciários cearenses, profissionais obrigados a conviver cotidianamente com o risco iminente de motins, rebeliões, fugas e até mesmo com a possibilidade de se tornarem reféns e serem utilizados como barganha nas mãos dos internos:

Um grupo de agentes penitenciários protestou por mais segurança para a execução de seu trabalho nas unidades penais do Ceará. Eles denunciam o abandono das penitenciárias e dizem que os profissionais vêm sofrendo ameaças constantes por parte dos detentos. Ainda sobre os riscos, representantes do movimento disseram que as prisões estão deterioradas, com grades e celas quebradas, e que os presos estão soltos nos corredores (AGENTES..., 2016, online).

Em síntese, dentre as imensuráveis dificuldades encontradas por estes profissionais na realização de seu labor, adequado mencionar aquela que perpassa todas as outras, por se tratar mesmo de uma premissa que norteia as demais que é a ausência de reconhecimento e de entendimento por parte do Estado por eles representado quanto à importância de sua “missão”, cujo desmembramento envolve a “sociedade dos cativos” (COELHO, 2005) e a sociedade extramuros, visualizada na falta de políticas públicas que os resguarde dentro e fora das prisões como pessoas e profissionais.

Destaque-se que, mesmo diante de tantos obstáculos intra e extramuros, encontrados em meio à realização eficiente de sua função, os agentes penitenciários locais continuam brava e incessantemente realizando-a, dentro das condições possíveis e impostas a eles. No tópico seguinte, busca-se mostrar como o conhecimento constantemente perseguido por essa categoria pode ser efetivamente transformado em ações proativas na construção de um sistema carcerário mais acertado nas perspectivas dos seus objetivos.

5.2. Perspectivas de ascensão cognitiva dos agentes penitenciários a partir da visão jurídica, na atuação de suas funções

Historicamente os agentes penitenciários sempre foram vistos como profissionais rudes e com pouca instrução pedagógica, tendo como atribuição básica “abrir e fechar cadeados”, cuja associação desses fatores ao ambiente de trabalho insalubre com precárias condições de atuação os colocavam em condições sociais similares aos detentos por eles custodiados.

A função do carcereiro, se limitava a garantir a ordem interna e evitar fugas, tarefas para as quais eram designados homens sem preparo, que se sujeitavam a trabalhar em troca de salários aviltantes. Escolas com cursos de capacitação e de reciclagem para agentes penitenciários surgiram apenas nos últimos anos (VARELA, 2012, p.23).

Atualmente, embora a realidade concernente às dificuldades na execução dos trabalhos carcerários, pela falta de condições propostas pelo Estado, a insalubridade e a superpopulação prisional estejam agravadas, o nível de esclarecimento e instrução escolar desses profissionais vem constantemente se expandindo e demonstrando serem eles os verdadeiros responsáveis pela adequada atuação institucional intramuros em toda a sua estrutura operacional e administrativa no cumprimento dos dispositivos legais.

Evidentemente que somente o conhecimento e a atuação adequada dos agentes penitenciários, por si só, não resolvem a problemática do sistema carcerário, mas obviamente a realização positiva e eficaz da função desenvolvida por esses que são o contato diuturno do encarcerado com o mundo exterior, elimina em muito, o distanciamento entre a realidade vivenciada na atualidade e o alcance das finalidades destinadas ao aprisionamento.

No Ceará, de acordo com a Secretaria da Justiça e Cidadania (MARCOS..., 2009, online), foi inaugurada em 22 de maio de 2009 a Escola de Gestão Penitenciária e Formação para Ressocialização- EGPR, cuja sua criação se deu dois anos antes pela Lei 14.040 de 2007, organizada pelo Decreto nº 29.202 de 29/02/2008 com o “objetivo de formar profissionais com alta qualificação para atuar no complexo ambiente das prisões”.

Embora seja de suma importância a existência da EGPR na estrutura organizacional do Órgão para os agentes penitenciários na busca do conhecimento, importante enfatizar a busca pessoal extra Secretaria da Justiça- Sejus desses profissionais em se qualificarem nas diversas áreas do conhecimento com graduações acadêmicas, recorte-se a preferência desses profissionais pela área jurídica, bem como em cursos voltados à área de atuação específica de forma continuada e às suas próprias expensas. As Regras Mínimas para o Tratamento de Pessoas Presas (1977, online, p.12) demonstram a importância e a necessidade de qualificação e aperfeiçoamento constante:

47 1) O pessoal deve possuir um nível intelectual adequado. 2) deve frequentar, antes de entrar em funções, um curso de formação geral e especial e prestar provas teóricas e práticas. 3) após a entrada em funções e ao longo da sua carreira, o pessoal deve conservar e melhorar os seus conhecimentos e competências profissionais, seguindo cursos de aperfeiçoamento organizados periodicamente.

Como parte legítima e um dos atores principais do contexto prisional em sentido restrito, a categoria dos agentes penitenciários vem buscando adquirir valores e conhecimentos técnicos que, somados ao conhecimento empírico por eles assimilados cotidianamente, possam designar de forma clara a sua identidade profissional, como medida apriorística para o desenvolvimento qualitativo das suas funções intramuros, capazes de dar um direcionamento mais eficaz ao encarceramento com a ampliação de suas competências, bem como de sua qualidade de vida pessoal extramuros a partir de seu autoconhecimento e aceitação profissionais.

Com base nessa atual e constante busca de cognição, indispensável à existência de fatores que possibilitem sua aplicação real, como o favorecimento por parte do Estado na ausculta proativa dessa categoria no que tange ao funcionamento de sua função e na execução adequada dos objetivos concernentes à execução penal, como forma positiva de um novo pensar para a construção de um sistema carcerário menos perverso, não só para os servidores penitenciários, mas também para a população reclusa e todos os demais envolvidos.

Para Moraes (2005), observar sobre o entendimento dos agentes penitenciários a cerca das prisões é instrumento capaz de possibilitar o reconhecimento de questões que dificilmente são mencionadas nas mudanças constantes de metodologias adotadas nos cárceres.

Nesse ínterim, é importante ressaltar que a função dos agentes penitenciários não dispõe no ordenamento pátrio, de um disciplinamento específico que possa caracterizar seu funcionamento, ficando a cargo dos Estados disciplinarem isoladamente as atribuições desses profissionais de acordo com o pensamento de cada Ente Federado, abrindo assim uma lacuna para as distorções quanto a sua aplicabilidade entre as localidades, tendo em vista o desconhecimento e o desprestígio ainda hoje dispensado a esses profissionais.

Para Coyle (2002), os governantes e os dirigentes carcerários de status mais elevados, deveriam fomentar a ideia de se criar planejamentos de instruções das pessoas e de atenção por parte da mídia, pelo conhecimento da sociedade referente ao importante papel de proteção social desempenhado por essa categoria. Sobre essa questão também tratam as Regras Mínimas para o Tratamento da Pessoa Presa (1977, online, p.11):

46 2) A administração penitenciária deve esforçar-se permanentemente para suscitar e manter no espírito do pessoal e da opinião pública a convicção de que esta missão representa um serviço social de grande importância; para o efeito, devem ser utilizados todos os meios adequados para esclarecer o público.

A Lei de execução Penal, como dispositivo nacional que trata diretamente sobre o contexto laboral dessa categoria, quando regula e direciona os objetivos da Execução Penal, não identifica esses servidores como sendo preliminarmente os propulsores de toda e qualquer atividade a ser desenvolvida nos estabelecimentos prisionais, não especificando a forma de atuação no que tange à realização efetiva desses objetivos, pois se assim o fizesse, certamente traria com clareza as peculiaridades e os desmembramentos atinentes à função dos agentes penitenciários.

Com base no exposto, percebe-se que, devido ao desinteresse do poder público, ocasionando um espaço em branco sobre a temática, é cada vez maior a procura, por parte dos legitimamente constituídos na função de agentes penitenciários, pelo conhecimento que torne capaz o entendimento da sua função referente à identidade, à forma adequada de atuação e à aceitação pessoal tangente à atividade profissional realizada, cuja externalização se concretiza com a utilização efetiva de ideias para o mundo prisional prático.

5.2.1. Proposições funcionais, a partir da ótica dos agentes penitenciários, para o Sistema Carcerário Cearense

Várias são as ideias pensadas pela categoria ou parte dela, necessárias para a satisfação pessoal e profissional de seus membros, bem como a realização positiva dos trabalhos intramuros, nem sempre fáceis de serem operacionalizadas ou minimamente apoiados pelos superiores hierárquicos nas suas diversas escalas.

Buscar-se-á aqui exemplificar algumas dessas propostas, como forma de dar vazão aos desejos e vontades desses profissionais muitas vezes impedidos de buscá-las pela falta de unicidade desenvolvida através do desencorajamento de alguns e comodismo de outros.

Em 11 de novembro de 2004, o deputado do PTB/SP apresentou ao plenário da Câmara dos Deputados a Proposta de emenda à Constituição de nº 308 que altera os artigos 21, 32 e 144 da Constituição Federal, criando as polícias penitenciárias federal e estaduais, porém até hoje essa matéria não foi votada naquela Casa:

Art. 1º O inciso XIV, do art. 21, passa a vigorar com a seguinte redação: XIV - organizar e manter a polícia civil, a polícia militar, a polícia penitenciária e o corpo de bombeiros militar do Distrito Federal, bem como prestar assistência financeira ao Distrito Federal para a execução de serviços públicos por meio de fundo próprio (PROPOSTA..., 2004, online).

Com o intuito de retirar os pontos mais controversos referentes à PEC 308/2004 que previa inclusive as atribuições das novas polícias, a PEC 14/2016 de iniciativa do Senador Cássio Cunha Lima, somente se atém a fazer as modificações nos mesmos artigos da Carta Magna, como forma primordial de criar as policias penitenciárias federal e estaduais com a inserção da categoria no âmbito da segurança pública com a atribuição específica de garantir a segurança dos estabelecimentos prisionais e a escolta de presos (POLÍCIA..., 2016, online).

A criação da polícia penitenciária, não só dá uma autonomia de trabalho aos profissionais penitenciários, como também eleva a sua autoestima, criando uma identidade funcional imprescindível à compreensão do seu papel dentro do contexto prisional.

Aliada a essa perspectiva, inclui-se a criação de uma divisão clara e efetiva de um departamento governamental com foco exclusivo ao sistema penitenciário local, realidade bem diversa da atual, cujo pensamento seja totalmente direcionado às políticas carcerárias em todos os seus desmembramentos. Para tanto, os preceitos e diretrizes devem se pautar no princípio constitucional norteador de todos os demais princípios, que é a dignidade da pessoa humana, porém de forma justa e equitativa para todas as pessoas ali existentes, asseguradas as diferenças dos grupos.

Devem existir regramentos positivados e exequíveis, assecuratórios da segurança e do disciplinamento interno dos estabelecimentos prisionais, como também direcionamentos claros e ordenados com distinções claras dos papéis funcionais para a realização efetiva de um trabalho com qualidade, voltada à reinserção social dos reclusos de liberdade.

Os homens, as mulheres e os adolescentes em conflito com a lei que se encontram sob custódia continuam sendo seres humanos. Sua humanidade se estende muito além do fato de estarem presos. De igual modo, os servidores penitenciários também são seres humanos. Quanto mais esses dois grupos reconhecem e observam sua humanidade em comum, tanto mais digna e humana é uma prisão. Essa é a medida mais importante da humanidade e da dignidade de um estabelecimento prisional. Onde não existir esse reconhecimento, haverá um perigo real de os direitos humanos serem violados (COYLE, 2002, p. 43).

Outra proposta visivelmente verificada pela categoria dos servidores penitenciários é a necessidade de um atendimento clínico médico e psicossocial destinado a esses profissionais, que constantemente estão expostos a riscos de sua segurança e saúde, que são inerentes à profissão, como o contato constante com a população reclusa e por isso não tem como ser minimizados de um modo geral, mas podem e devem ser preventivamente acompanhados no intuito de diminuição de problemas outros, que podem inclusive ser evitados, tais como a depressão e o alcoolismo.

É latente a necessidade de um mecanismo estatal que proteja os profissionais que convivem diuturnamente com pessoas que foram expurgados da sociedade, exatamente por não terem possibilidades, naquele momento, de conviver com a coletividade por serem nocivos a ela, no entanto contraditoriamente, o Estado não propõe minimamente um artifício de resguardo, de amparo profissional ou até mesmo um desenvolvimento funcional que possa preservar institucionalmente esses profissionais dos impactos intrínsecos das prisões.

O melhor a ser feito quando analisamos os malefícios à saúde decorrentes da atividade de ASP, é considerarmos que os dois fatores descritos: a longa permanência em um ambiente marcado pela tensão, não permitindo que, mesmo nas horas de descanso seja possível ‘desligar’; e a percepção de que determinados postos são mais exigidos que outros, aumentando a carga do trabalho, que já é bastante acentuada, imprimem um sentido ainda mais grave às dificuldades que os trabalhadores enfrentam no desenvolvimento das tarefas (VASCONCELOS, 2000, p.57 apud LOURENÇO, 2010, p.63).

Em toda e qualquer profissão, é evidente que o valor de sua remuneração não só é um atrativo aos bons profissionais, elevando o nível da categoria, como também é uma forma de demonstração do reconhecimento dos trabalhos executados. No que se refere aos agentes penitenciários, pode-se citar ainda a questão da tentativa constante da população reclusa em corromper esse profissional, mais um motivo pelo qual a remuneração justa diante da complexidade da função se torna cada dia mais imprescindível.

De acordo com tabela salarial dos agentes penitenciários em todo o Brasil (TABELA..., 2015, online), o Ceará ocupa o 21º lugar dentre os Estados brasileiros quanto à remuneração desses profissionais, o que demonstra a necessidade urgente de uma melhoria salarial. Importante mencionar que o profissional bem remunerado evidencia diretamente essa satisfação na execução de suas atividades, pois se sente valorizado dentro do seu contexto laboral, o que ocasiona consequentemente uma predisposição a uma maior compreensão e tranquilidade no trato com sua clientela. Atualmente uma das reivindicações dessa categoria cearense é a elevação da Gratificação de Atividades Especiais e de Risco- GAER de 60% para 100%.

No mundo de hoje, o status de uma profissão se mede, em grande medida, pelo nível de remuneração que ela atrai. O trabalho penitenciário é um dos serviços públicos mais complexos. Isso deve ser reconhecido nos salários pagos aos servidores penitenciários em todos os níveis. Uma outra consideração em alguns países é que, se os servidores penitenciários não forem remunerados adequadamente, eles poderão ficar receptivos à corrupção direta ou indiretamente (COYLE, 2002, p.39).

Ações como estabelecer melhores condições físicas aos estabelecimentos prisionais, capazes de oferecer dignidade a todos aqueles que ali estão; realização efetiva e suficiente das assistências previstas na LEP aos reclusos de liberdade; quantidade adequada de profissionais em todas os setores, para o acompanhamento e trato penal; qualificação, treinamento continuado, valorização e instrumentalização dos agentes penitenciários, bem como as proposições anteriormente mencionadas, são medidas extremamente pertinentes para a melhoria do sistema carcerário local.

Sem a possibilidade de exaurir a temática, especialmente no que tange às ideias pensadas a partir da visão dos conhecedores do sistema penitenciário cearense que são os agentes penitenciários, deve-se buscar, incessantemente, a vontade estatal na ênfase de uma atuação proativa desses servidores, com a produção de políticas públicas que contemplem as atividades carcerárias como ferramenta principal para o êxito dos objetivos do encarceramento.

6. CONCLUSÃO

A evolução das prisões desde os primórdios, com os martírios do corpo físico até os pensamentos contemporâneos que as remetem como lugares de reeducação e remodelamento comportamental, trouxe consigo de forma discreta, equivocada e quase sombria, a figura do carrasco, carcereiro, agente penitenciário.

Ao longo do tempo, à medida que os críticos do sistema carcerário buscam entender e explicar os insucessos das prisões e o comportamento dos reclusos de liberdade, a partir do confinamento, mas se disseminam as ideias de vitimização dos encarcerados como consequência das injustiças e exclusões sociais, ocasionando uma visão unilateral, devido ao grande volume de pesquisas com preferência nesse foco, enfatizando o preso, como vítima de um sistema perverso por ser excluído de uma sociedade injusta, como sendo uma figura sofredora, quase um mártir.

Corroborando com esse arbítrio, os agentes penitenciários são comumente percebidos como parte do infortúnio totalizador do sistema penitenciário, não despertando interesse e curiosidades pela complexidade de sua função por parte dos pesquisadores, que salvo raras exceções, quando os mencionam, os utilizam para ratificar os malefícios do sistema. Infelizmente, as literaturas com abordagens direcionadas às peculiaridades e desdobramentos dessa importante função ainda são muito precárias, relegando-os ao quase anonimato ou ao conhecimento equivocado.

Observa-se que, em decorrência da desinformação histórica atinente às atividades desses servidores, há uma lacuna referente à identidade profissional paradoxal dos agentes penitenciários quanto a sua função repressora e ressocializadora na legislação pátria, pois os dispositivos legais brasileiros elencam de forma constante os objetivos da execução penal, bem como tratam em vários artigos, inclusive na Carta Magna de assuntos pertinentes à pessoa presa, no entanto, não descrevem de forma efetiva e coesa como operacionalizar direta e diariamente a repressão da conduta ilícita e a recuperação reintegrando socialmente o executor de tal conduta.

Posto isto, infere-se que os agentes penitenciários cearenses, não têm de forma definida e formalizada, o conceito total do seu verdadeiro papel profissional no contexto do sistema penitenciário em todos os seus desdobramentos, que possa demonstrar e sistematizar em um mesmo profissional as atribuições de reprimir e ressocializar de forma possível e adequada, sem um ordenamento preciso e exequível.

Ademais, os agentes penitenciários sofrem frequentemente uma dupla estigmatização cruel, somente pelo fato da sua escolha profissional os colocar diante da população reclusa, que os percebem como a representação de um Poder Público falho e insuficiente diante das suas obrigações tangentes ao tratamento penal, e diante da sociedade como uma pessoa indigna de confiança, pela proximidade funcional que obrigatoriamente devem exercer com os expurgados sociais.

Esses estigmas e as consequências da rotina no cárcere, trazem consequências em todas as esferas das vidas desses servidores, que comumente sentem-se compelidos a ordenarem suas vidas pessoais, familiares e sociais de acordo com os direcionamentos necessários, oriundos das peculiares de suas profissões, sempre envoltas em riscos, inseguranças e desconfianças, criando uma sobrecarga emocional desestabilizadora, cuja externalização advém na forma de doenças do corpo e da alma.

Na atualidade, é imperativa uma atuação eficaz referente à função dos agentes penitenciários, como profissionais designados para uma tarefa deveras específica, além de pensar como prioridade na saúde física, psíquica e profissional desses atores.

Por outro lado, emerge nesses profissionais a vontade de alcançar um conhecimento que os proporcione esclarecer sua identidade funcional, contemplando-os como executores de uma tarefa eficiente e eficaz, legitimamente reconhecida e valorizada, possibilitando-os a participação produtiva nos assuntos relacionados à temática do encarceramento e às reformas prisionais, constantemente alvo de mudanças.

No estado do Ceará, a categoria desses servidores vem buscando a qualificação técnica a cada dia como parâmetro norteador para a concretização desse objetivo grupal, cujas possibilidades se demonstram através de uma variedade de proposições positivas e possíveis pensadas entre eles, necessitando para sua efetivação de um melhor ordenamento de todos que compõem a classe, capaz de fazer nascer no Poder Público a vontade política de implementar no sistema penitenciário, ações que verdadeiramente busquem alcançar as finalidades propostas pelo encarceramento.

Contudo, deve-se, no entanto, ter em mente que para alcançar o êxito dessa complexa tarefa destinada a execução penal, a atuação dos agentes penitenciários é apenas uma das parcelas que deve se somar a um conjunto de ações, formadas pela sociedade e pelo Poder Público em todas as suas esferas, devendo atuar conjuntamente de forma constante em atividades que devem operar antes, durante e depois do confinamento de forma proporcional a cada segmento.

Finalmente, este trabalho pretende contribuir com o estudo da função dos agentes penitenciários cearenses, demonstrar à gestão penitenciária de acordo com seus vários níveis hierárquicos a necessidade de estabelecer condições de trabalho efetivas e dignas que contribuam efetivamente com seu bem-estar físico e psíquico, bem como despertar o interesse de outras pesquisas sobre a temática como forma de colaborar para o reconhecimento e a relevância dessa tão valorosa categoria.

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Publicado por: Maria do socorro de Oliveira Matias

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