4 TONS: Estudo do discurso de Tássio dos Santos sobre o mercado/produtos de maquiagem
índice
- 1. RESUMO
- 2. APRESENTAÇÃO
- 3. JUSTIFICATIVA E PROBLEMA DE PESQUISA
- 4. WEB - O AUDIOVISUAL E SUAS INTERFACES
- 5. Panorama histórico: o audiovisual ao longo das décadas
- 6. Canais e influência: o papel dos influenciadores
- 7. O lugar do público: os seguidores
- 8. COSMÉTICA E CULTURA
- 9. METODOLOGIA DE ANÁLISE
- 10. Descrição do objeto de estudo
- 11. CONSIDERAÇÕES FINAIS
- 12. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1. RESUMO
A maquiagem sempre esteve presente no cotidiano dos indivíduos, porém foi no século XX que a indústria da cosmetologia, como é conhecida no modelo atual de produção, teve seu maior desenvolvimento. A Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial atribui essa evolução a maior liberdade que a mulher passou a ter após o período das Grandes Guerras, além do maior poder econômico que a classe C passou a ter ao longo dos anos. O fato é que, mesmo com o desenvolvimento da indústria de cosméticos - sobretudo o avanço tecnológico, que possibilitou a produção de diversos produtos das mais variadas categorias - ainda há uma parcela da sociedade que não possui acesso a itens básicos de maquiagem. Uma pesquisa foi realizada pela empresa AVON - e ouviu mil mulheres, de 18 a 61 anos, de todas as regiões do Brasil e classes sociais, entre os meses de setembro/outubro de 2020. Ela foi apresentada pela pesquisadora Winnie Bueno, que ressaltou inicialmente que até 2023, 70% dos brasileiros vão se declarar negros (hoje, são 56%). Segundo os dados do “Black Paper”, a beleza negra ainda é de certa forma invisível para a sociedade e 70% das mulheres negras não estão satisfeitas com os produtos específicos de maquiagem para elas disponíveis hoje no mercado. Além disso, 46% disseram desistir de uma compra por não encontrar sua cor. Sendo assim, o objetivo da seguinte monografia intitulada 4 Tons: um estudo do mercado de maquiagem a partir do discurso de Tássio dos Santos é buscar entender o porquê desta segmentação de mercado e para além disso, compreender como essas mulheres se adequam a tal realidade. Ademais, o projeto também busca observar a mídia através da utilização e influência das redes sociais sobre as pessoas.
PALAVRAS-CHAVE: Beleza. Maquiagem. Cosméticos. Internet. Influenciadores.
2. APRESENTAÇÃO
Na sociedade primitiva, era comum o uso de plantas, mistura de pedras moídas e terra para pintar a face e o corpo (CEZIMBRA, 2010, p. 11). Contudo, essa prática possuía uma finalidade diferente da atualidade. Esses povos se enfeitavam e pintavam-se como meio de adorar os deuses, além de proteger a pele contra os raios solares. Como ainda completa o autor, já em sociedades como a japonesa, a pintura facial (Kabuki) era comumente usada no teatro milenar japonês e reforçava todo o drama presente nas cenas.
Já na Grécia Antiga, beleza, longevidade e saúde eram cultuados e, atualmente, esses ideais também fazem parte do século XXI (CEZIMBRA, 2010, p. 10). De acordo com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), o aumento na produção e venda de cosméticos, sobretudo a maquiagem, aconteceu por uma série de fatores. São eles: a maior liberdade que as mulheres passaram a ter neste século; o avanço tecnológico pelo qual a indústria atravessou; e o aumento do poder de compra da classe C. A ABDI ainda afirma que o Brasil é o décimo primeiro lugar no ranking daqueles que mais consomem produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos. Esses dados evidenciam que a indústria de cosméticos é uma das mais lucrativas no país e devido a isso, a busca pelo desenvolvimento de produtos de alta qualidade é constante. Ademais, com o mercado de beleza sempre em constante mudança, os profissionais dessa área também devem manter-se atualizados com as novas técnicas e a diversidade de produtos lançados.
Mas, o que tudo isso significa para o consumidor final? Aquele que investe seu dinheiro nesses produtos e move a economia dessa indústria? Segundo Márcia Cezimbra, autora do livro “Maquiagem: técnicas básicas, serviços profissionais e mercado de trabalho”, tudo o que foi descrito acima deveria culminar em produtos nacionais de excelente qualidade, além de ter à disposição linhas segmentadas para atender a características e necessidades específicas.
Em uma busca rápida e menos refinada em canais no Youtube[1] (como o de Tassio dos Santos e Camilla de Lucas) é perceptível a insatisfação dos consumidores de pele negra com o que há disponível no mercado nacional de cosméticos. Se em países como os Estados Unidos é possível encontrar marcas que disponibilizam 50 tons de base - como é o caso da “Fenty Beauty”, marca de maquiagem da cantora Rihanna - no Brasil, as marcas geralmente disponibilizam de quatro a oito tons para venda. Com a escassez de tonalidades, uma parcela da sociedade pode não se ver representada dentro do mercado e, por esse motivo, em diversos casos optam por não usarem maquiagem, ou precisam adequar-se a essa situação.
Atentando-se para tal fato, surgiu a ideia de analisar o quadro “O tom mais escuro”, do jornalista e youtuber, Tássio dos Santos. O objetivo central se deu a partir da análise do comportamento das marcas e discutir o mercado de cosméticos, a partir da abordagem nos vídeos do Tássio, observando como as estratégias de comunicação em seu discurso influencia todo esse processo, no mercado de cosméticos para indivíduos de pele negra. Procura-se aqui analisar também o comportamento comercial das marcas de maquiagem após serem exibidas e comentadas no canal de Tássio.
3. JUSTIFICATIVA E PROBLEMA DE PESQUISA
Autoestima e maquiagem sempre estiveram lado a lado. É construído culturalmente que toda mulher deve ser vaidosa, cuidar das unhas, cabelo e pele. A vontade de maquiar-se começa ainda na infância, quando a menina vê bonecas com os olhos e boca pintados, ou passa a ter um contato com os produtos - sobretudo os batons - de mulheres da própria família. Na adolescência, revistas e blogs ditam o padrão de beleza que essas mulheres devem seguir. Porém, em um período em que as redes sociais tomaram conta do dia a dia das pessoas, é comum o público feminino - foco deste trabalho - buscar referências na mídia digital.
No Brasil, o mercado da beleza ainda não se adequa totalmente à diversidade existente no país. Se a maquiagem consegue elevar a autoestima, como seria percorrer diversas lojas e não conseguir encontrar seu tom de base, corretivo, ou sombras que consigam pigmentar em seu tom de pele? Para além disso, como seria ter que utilizar produtos de beleza que não se adequam ao seu tom de pele, ou ainda passar por um clareamento digital para que esses cosméticos possam parecer corretos em determinada tonalidade?
Em um caso recente, a modelo Júnia Evaristo[2] utilizou seu perfil no Instagram para denunciar a marca da youtuber de beleza Mari Maria. Júnia relatou que, as fotos finais para a campanha da nova base da marca haviam sido clareadas digitalmente e, segundo a modelo, isso não é um acontecimento isolado. Já no que se diz respeito à TV, é comum críticas em relação a maquiadores profissionais que não possuem tons de base, corretivo e pó compacto que se adequem à pele da mulher. Júnia conta que, diversas vezes, já teve que levar produtos de casa, "a gente tem que levar o nosso produto porque sabe que, muitas vezes, não tem um do nosso tom, e a gente tenta retocar. Tentam clarear a nossa pele demais ou escurecer demais…” (VOGUE, 2019)
O maquiador Tássio Santos, que possui o canal no Youtube “Herdeira da Beleza”, vem contribuindo para expor marcas que não possuem este cuidado em relação à cartela de cores presentes em sua linha. Com a série especial “O tom mais escuro”, realizada em conjunto com Joyce Maria, Tássio vem movimentando o mercado da maquiagem e conscientizando os consumidores da importância de respeitar a diversidade.
Com os recentes avanços da indústria de cosmetologia, a questão acerca dos produtos voltados para pele negra e a segmentação realizada pela indústria de cosméticos para com essas consumidoras, foram pouco debatidas. Sendo assim, o presente projeto procurou analisar o canal no YouTube, “Herdeira da Beleza”, de Tássio dos Santos, focando principalmente no quadro “O tom mais escuro”, onde Tássio e Joyce testam a tonalidade mais escura de cosméticos, como base e corretivos. Com a visibilidade do canal, como tais marcas que “não passam no teste”, se portam após serem analisadas? Mudam o comportamento e passam a ser mais inclusivas? Ou continuam fechando os olhos para a realidade do mercado? Tais perspectivas foram analisadas a partir do discurso e estratégias de comunicação do influenciador Tássio Santos, a partir de como as marcas adotam a criação de seus produtos.
4. WEB - O AUDIOVISUAL E SUAS INTERFACES
O escritor estadunidense Russell Baker (1925-2019) considerava que a televisão foi o invento mais revolucionário do século. Em termos de importância, equipara-se à invenção da pólvora e da imprensa, que mudaram a condição humana nos séculos que se seguiram. A TV está presente nos lares de boa parte das famílias ao redor do mundo, de acordo com Kellinson (2007, p. 25) “desde a década de 1950, a televisão surgiu como um catalisador global para mudanças políticas e sociais, afetando enormemente o modo como aprendemos e nos comunicamos”. Essa presença massiva da TV também se deve ao fato de que, devido ao seu imediatismo, ela é a principal fonte de informação para muitas pessoas (KELLISON, 2007, p. 26).
Em um primeiro momento, a transmissão no país ocorreu apenas nas cidades mais desenvolvidas, como São Paulo e Rio de Janeiro. Porém, a disseminação do novo meio de comunicação foi rápida. A TV Tupi-Difusora iniciou transmitindo o sinal de TV para 500 aparelhos em São Paulo, e em 3 meses já eram 2 mil aparelhos recebendo as imagens da emissora.
Paralelamente às transformações enfrentadas pela TV no início do século, a Internet também começa a avançar em todo território nacional. O primeiro contato brasileiro com a Internet aconteceu em 1987, quando a Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp) em parceria com o Fermilab[3] realizou a primeira conexão de rede. O objetivo da reunião foi desenvolver um meio que facilitaria a comunicação entre as comunidades acadêmicas e científicas do Brasil e do exterior (KNIGHT, 2013, p. 07). A Internet começou a ser usada comercialmente no Brasil em 1995, quando diversos provedores de rede começaram a surgir. Em “A Internet no Brasil”, Peter T. Knight afirma que:
A Internet se transformou no mais importante meio de processamento das informações do mundo. É comparável à invenção, por Johannes Gutenberg, no século 15, da impressão gráfica com tipo móvel, que expandiu o acesso à palavra impressa e os horizontes dos conhecimentos da humanidade. (KNIGHT, 2013, p. 05)
Atualmente, segundo dados fornecidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), através da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD)[4], no ano de 2017, 74,9% dos domicílios brasileiros possuíam acesso à Internet. Sendo que, 97% dessas pessoas acessam a rede através do celular e 16,3% por meio do próprio aparelho de televisão (smart TV). O PNAD ainda revela que, 81,8% dos internautas utilizam a rede para assistir a filmes ou vídeos.
Logo, é possível afirmar que a Internet modificou a relação do indivíduo para com as produções audiovisuais, seja na forma de telespectador ou como produtor de conteúdo. Segundo Fernando da Silva Barbosa, “a produção e o consumo de conteúdos audiovisuais fazem parte da cultura brasileira” (BARBOSA, 2013, p. 46). Entretanto, a forma como o telespectador consumia o conteúdo ofertado pela TV - de forma linear com uma grade fixa de programas - pode ter começado a entrar em desuso (BARBOSA, 2013, p. 52). Em “Narrativa Audiovisual para Multiplataforma - Um Estudo Preliminar”, Cosette Castro e Cristiana Freitas afirmam que “o avanço do processo de comunicação nas plataformas digitais abre a possibilidade da interação da audiência com o conteúdo de um programa audiovisual” (CASTRO; FREITAS, 2010, p. 02). Ou seja, a ideia de sentar-se em frente à TV, em um horário pré-definido para se ter acesso a determinado conteúdo, pode passar a não faz mais sentido, visto que, o acesso a tal programa, filme, ou novela é possível ser feito através dos aplicativos ou sites nas mais diversas plataformas no horário mais viável para o telespectador.
No que diz respeito à produção de conteúdo voltada para web, “observa-se que estes possuem como referência os produtos desenvolvidos para o cinema e/ou para a televisão” (BARBOSA, 2013, p. 46). Isto é, a organização dos funcionários, a linguagem, o enquadramento e toda a parte estética e artística possuem como ponto de partida os conteúdos produzidos e vinculados a outras formas de distribuição e consumo midiático bem mais antigas e consolidadas, como o cinema e a televisão. É extremamente importante frisar que, grande parte desses conteúdos publicados online, seja em sites como o Youtube ou serviços de streaming como a Amazon Prime ou a Netflix “são ligados às empresas de radiodifusão, estúdios de cinema, portais de internet, tecnologia e/ou telecomunicações, o que demonstra a preocupação das mesmas em disponibilizar seus conteúdos àqueles que consomem produtos audiovisuais na internet” (BARBOSA, 2013, p. 49).
Um exemplo dessa migração do espectador para a internet e serviços de streaming é a Netflix. A empresa foi criada nos Estados Unidos em 1997 por Reed Hastings e Marc Randolph. O objetivo era possibilitar a locação online de filmes. De 1997 até a atualidade a Netflix deu um grande salto. Atualmente, o serviço funciona em 190 países e possui mais de 100 milhões de assinantes. Todavia, o maior feito da plataforma foi “infiltrar-se” na mais prestigiada premiação de filmes de todo o mundo, o Oscar. Em 2017, com documentário “Os Capacetes Brancos”, dirigido por Orlando von Einsiedel e produzido por Joanna Natasegara, a Netflix ganha seu primeiro Oscar.
Atualmente, as plataformas de streaming, antes consideradas grandes “inimigas” dos estúdios de cinema, alcançaram feitos que explicitam como o modo de consumo audiovisual modificou-se e, por este motivo, quem produz tal conteúdo também precisou adequar-se às essas mudanças. Quanto ao YouTube, segundo a revista online Exame (2014) o Brasil é o segundo maior consumidor mundial de conteúdos vinculados ao site[5]. Posto isso, de acordo com a diretora executiva da plataforma, Susan Wojcicki, o YouTube “vem crescendo em ritmo acelerado” e, em 2015 registrou um aumento de 50% nos números de visualizações.
5. Panorama histórico: o audiovisual ao longo das décadas
O tópico anterior deixa claro que, o modo de consumo televisivo linear parece estar caindo em desuso (BARBOSA, 2013, p. 52). Entretanto, houve uma época que esse tipo de programação levou a TV aos seus “anos dourados”. Esses “anos dourados da televisão chegaram até mesmo a mudar a rotina de milhares de pessoas, como afirma Jambeiro, “a televisão transformou-se num importante fator em torno do qual as pessoas estruturam suas rotinas e seu ritmo de vida, suas ocupações domésticas e mesmo a arrumação de suas salas de visita” (JAMBEIRO, 2002, p. 106). O autor reitera que, para grande parte da sociedade “a vida diária se compõe de dormir, comer, trabalhar e ver televisão” (JAMBEIRO, 2002, p. 106).
Tratando exclusivamente do Brasil durante a década de 1960 até 1990, antes da chegada da TV digital e todas as mudanças que a tecnologia trouxe consigo, o consumo televisivo foi impulsionado pelo crescimento econômico relativo a tais anos, além de estímulos por parte do governo militar durante toda a época da ditadura. Deste modo, “os militares estimularam que a indústria televisiva brasileira formasse cadeias nacionais e concentrasse capital, a fim de melhor explorar o novo meio de comunicação de massa. (JAMBEIRO, 2002, p. 106)
5.1. O audiovisual na web: as plataformas digitais
A transição de tecnologias trouxe grandes mudanças para o âmbito tecnológico e midiático, bem como para o mercado de consumo e das informações em tempo hábil. Percebe-se que os novos contextos sociais têm impulsionado de forma avassaladora que as novas tecnologias ganhem cada vez mais espaços nas práticas cotidianas das pessoas, acarretando um estreitamento entre os indivíduos. O uso da internet se dissemina em grande parte da população mundial, se transformando em um meio rápido de comunicação, informação, bem como, para diversas outras finalidades.
Na internet, a troca de informações e a contribuição dos usuários em sites e serviços virtuais são considerados essenciais, uma vez que, os usuários deixam de ser apenas consumidores para serem colaboradores na criação e compartilhamento de diversos conteúdos dentro das redes e canais, através do uso de blogs, websites pessoais, plataformas e outras ferramentas que tornam o conteúdo mais colaborativo e disseminado a um maior público.
O acesso à internet passou a ser algo utilizado para os mais variados fins, como entretenimento, trabalho, consumo, estudo, pesquisas, dentre outros. As novas tecnologias digitais, que surgiram no final do século XX, romperam com este paradigma linear da informação ao introduzir um novo elemento na comunicação, que possibilita a interatividade que oportuniza a coautoria e a intervenção na mensagem, nos seus conteúdos.
Com a disseminação de aparelho celulares mais modernos, a internet hoje, está literalmente em nossas mãos, as informações estão ao nosso total alcance, diferente de alguns anos atrás, em que a televisão era um dos meios mais utilizados para estes fins. Atualmente, com o advento da internet e todas as possibilidades que a rede oferece, diversos programas que antes eram vinculados somente à televisão, tornaram-se acessíveis também pelo computador e celular. Emissoras como a Rede Globo dispõem de aplicativos e/ou sites que disponibilizam toda a programação da TV para que os consumidores assistam em qualquer lugar, no horário que desejarem.
No que se diz respeito a conteúdos voltados para moda e beleza, canais como o GNT (pertencente à Rede Globo e vinculado também ao Globoplay) suprem há alguns anos a demanda de programas voltados para o tema. O canal foi criado em outubro de 1991 sob o nome de “Globosat News Television” e transmitia apenas conteúdo noticioso. Em 2003, o GNT passou uma por mudança de posicionamento e começou a abordar temas a respeito do “universo feminino” (moda, beleza, gastronomia e maquiagem). Outra empresa que cumpre com esse propósito (além do Youtube), é a Netflix. O serviço de streaming disponibiliza séries, filmes e documentários sobre beleza e maquiagem. Em 2019, o reality show “Glow Up”[6] entrou para o catálogo da empresa. O reality baseia-se em uma série de desafios que maquiadores iniciantes precisam cumprir e, ao final de cada desafio serão julgados por grandes nomes da indústria de cosméticos. Glow Up oferece como prêmio a oportunidade de entrar no mundo profissional da maquiagem.
Os canais de comunicação se tornaram amplos, trazendo muitas possibilidades. Analisar o entendimento acerca da história da maquiagem bem como da indústria que a sustenta é crucial para que possamos compreender este tipo de programação.
5.2. Internet: A identidade nas redes sociais
Na rede, os indivíduos vivem interligados, conectados, independentes e indissociáveis. A sociedade em rede se caracteriza pela globalização, a flexibilidade e sua interatividade. A pós-modernidade é acompanhada de diversas características na qual pode-se citar entre outras questões, a velocidade de informações, a instantaneidade, a transitoriedade e também falta de profundidade. Considerando o indivíduo, esse, tem o objetivo de se auto representar dentro de um contexto social que é organizado em rede, expressando na internet suas referências, seus interesses e as suas características pessoais.
Em um mundo cada vez mais conectado a partir de uma rede de comunicação mundial, a Internet, se faz pertinente atentar-se ao fato de que os indivíduos que dela se apropriam tendo o intuito de comunicar-se com outros indivíduos a partir de mídias, sites ou softwares possuem, em grande parte deles, objetivos semelhantes. Tais objetivos buscam firmar relações, que por sua vez, são usadas como pontes de acesso para que cada usuário use-as como achar necessário e viável. Essa relação que é firmada entre os usuários da rede não se mantém ligada apenas no âmbito do compartilhamento de informações, mas também, possibilita que os usuários compartilhem suas vidas e as suas personalidades, através principalmente das redes sociais. Castells salienta que a internet, muito mais do que uma simples tecnologia, se tornou o meio de comunicação que se configura como um organizador das nossas sociedades.
A internet é o coração de um novo paradigma sociotécnico, que constitui na realidade a base material de nossas vidas e de nossas formas de relação, de trabalho e de comunicação. O que a internet faz é processar a virtualidade e transformá-la em nossa realidade, constituindo a sociedade em rede, que é a sociedade em que vivemos. (CASTELLS, 1999a, p. 287)
Nesse contexto, a partir do advento da internet, o sujeito social exerce as atividades de comunicar-se e relacionar-se com os outros indivíduos, através da tecnologia existente. A rede se configura como um ideal de democratização, diminuindo deste modo utopicamente as diferenças e assim possibilita um sentimento de liberdade que pode se dar por meio do anonimato em diversos níveis: emocional, cultura, profissional e relacional.
A sociedade em rede, a partir da revolução tecnológica e informacional, bem como, da nova economia, trouxe a globalização, a flexibilidade, a “realidade midiática”, o tempo intemporal, dentre outros. Uma sociedade que é conectada pela convergência de telecomunicações, computadores e redes.
Dentro da internet existe uma diversa gama de possibilidades de criar, recriar, inverter os papéis da identidade dos indivíduos. Castells se apega a ideia de que os atores sociais podem possuir múltiplas identidades, tendo essa pluralidade como uma fonte que produz contradição a partir do ato de se autor representar como forma de interação social e no que diz respeito a sua verdadeira realidade. Para o autor, “No que diz respeito a atores sociais, entendo por identidade o processo de construção de significado comum com base em um atributo cultural, ou ainda um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, o(s) qual(ais) prevalece(m) sobre outras fontes de significado.” (CASTELLS, 1999b, p. 22)
Nesse sentido, a fim de exemplificar essas múltiplas identidades, é importante considerar que as redes sociais nasceram com a finalidade para integrar membros com os interesses e as ideologias ligados pela relevância de um determinado assunto, como também, para proporcionar a interatividade e a integração através do compartilhamento de conteúdo. Os perfis das redes sociais possibilitam a personificação das pessoas, e o mesmo usuário pode se apresentar de forma totalmente diferenciada.
Deste modo os indivíduos usam papéis como um artifício. Um indivíduo pode desempenhar diversos papéis sociais como por exemplo: ser pai, marido, fumante, vizinho, sindicalista, jogador de futebol e militante político, e tudo isso ao mesmo tempo. Esses papéis, nas palavras de Castells, “são definidos por normas estruturadas pelas instituições e organizações da sociedade” (CASTELLS, 1999b, p. 23)
Estes papéis se ligam a identidade formada pelo indivíduo através da internet. É importante salientar que estes papéis têm uma importância relativa e considerável no ato de influenciar o comportamento, diferentemente da identidade. A identidade se constitui como fonte de significado e experiência de um povo, possibilitando a identificação simbólica, que representa algo para alguém. Castells (1999b) vê papéis como funções sociais e a identidade como processo de construção do significado com base em um atributo cultural, bem como, um conjunto de atributos culturais inter-relacionados, o qual prevalece sob outras fontes de significado.
A construção das identidades, virtuais ou não, ocorre no espaço do simbólico. Toda concepção identitária se configura em forma de representação e considerando as redes virtuais de relacionamento, a representação do indivíduo se dá por meio da publicidade através do eu, a representação de si tem uma centralidade na rede.
A construção da identidade depende fortemente da situação em que se encontra o indivíduo, bem como, da sua intenção naquele determinado momento. Deste modo, posições menos fixas e mais unificadas aparecem em um contexto onde se coloca o sujeito pós-moderno em simultaneidade com o novo conceito espaço e tempo. Possibilitando o surgimento de novas identidades na rede. É importante destacar que no mundo virtual, existe uma realidade em que o indivíduo se mostra a partir de como realmente ele quer ser visto, sendo assim, tem-se um sujeito pós-moderno livre que se apresenta com a identidade que ele deseja mostrar.
Com os espaços sociais virtualizados, as relações interpessoais sofrem muitas mudanças, fragmentando os locais de sociabilidade e permitindo a criação de novos. No mundo offline é necessário um certo tempo para que o indivíduo crie e mantenha um relacionamento, já no mundo online essa possibilidade existe, com muito mais velocidade, mesmo que aconteça de modo superficial e efêmero.
As redes sociais na era dessas novas tecnologias confirmam seu espaço como uma importante ferramenta que possibilita a construção de identidades pessoais. Visto que, em uma época em que a utilização desses recursos cresce de forma gigantesca, as redes ganham um corpo de intensa influência e que se revelam como algo que possibilita a mudança radical das formas de relacionamento na sociedade.
Delarbre (2006, p. 207) completa que “as identidades virtuais são máscaras que podemos trocar à vontade, exceto quando nos envolvemos demais com algumas delas”. Ainda na visão do autor,
[...] as identidades sempre estão ou podem estar mascaradas: fantasia e o jogo são elementos indissociáveis da relação que podemos estabelecer, a qual está condicionada pela fugacidade como característica constante, mas, também, pela prerrogativa de quem entra nesses espaços de reunião. (DELARBRE, 2006, p. 208)
Existe desse modo a sensação de pertencimento pelo reconhecimento de identidades semelhantes, mesmo entre contextos sociais e históricos diferenciados. “Identificar-se com.” significa dar abrigo longe da influência ou dominação, um sentimento de liberdade, pertencimento que amenize a sensação de solidão ou abandono. (BAUMAN, 2005, p.37)
Assim, tem-se a busca por uma imagem e um meio que tenha a identificação e que possibilite o usuário ser igual e diferente ao mesmo tempo. Consequentemente, existe também a preocupação de construir uma identidade que deverá ser reconhecida pelos outros, e que tenha a pretensão de valor social na comunidade da web em que deseja estar inserido.
Sendo um paradoxo, o mesmo ambiente que viabiliza identidades incógnitas em comunidades virtuais, chats e dentro de salas de bate-papo também possibilita uma superexposição do indivíduo. Tendo em vista que, com a mesma facilidade que a internet permite ao indivíduo assumir mais de uma identidade, ocultar ou dissimular, também potencializa uma sociedade do espetáculo, onde são expostas muitas faces e maneiras de viver a vida e agir.
Assim, ao mesmo tempo que a internet estimula o desenvolvimento de capacidades expressivas, emocionais e relacionais, ela também tende a provocar um certo abalo nas estruturas. A internet facilita o contato, poupa os esforços e reúne os indivíduos interessados, porém também os coloca na dependência do subjetivismo de uma vida social que é dominada pelo fetiche da mercadoria. Sendo que essa mercadoria, nem sempre é real, nem tão pouco consumível.
6. Canais e influência: o papel dos influenciadores
Os indivíduos produzem movimentos sociais divididos por grupos, que se formam no que eles são ou no que acreditam que são, e assim vão em busca da fonte e do significado de um povo. Nesse sentido, eles buscam se inserir em determinados grupos sociais, de acordo com suas personalidades, valores, gostos, escolhas, etc., considerando que tais grupos se formam por meio da convergência de interesses comuns. Na atualidade, configurando-se a partir das fortes mudanças acometidas em todos os âmbitos, como a globalização, a digitalização e a virtualização, as transformações ocorrem na medida com que os indivíduos evoluem e vivem as suas experiências subjetivas. Quando se fala em identidades nas redes sociais, não pode-se deixar de falar em como mediar a atuação e a influência entre os usuários a partir das mídias sociais.
Numa época em que as redes sociais tem se tornado muito valorizadas, as postagens são cada vez mais estimuladas, afim de abranger um número maior de seguidores e consequentemente consumidores. É pertinente destacar que os influenciadores digitais que mais se destacam e ganham visibilidade são aqueles que utilizam de maneira eficiente as plataformas que são disponíveis para produção de conteúdos e de interação, para se aproximarem de seus seguidores. Essas plataformas são majoritariamente as redes sociais, embora algumas se destaquem mais e ofereçam maior visibilidade ao influenciador.
As redes sociais estão se tornando cada vez mais uma ferramenta poderosa, da qual as pessoas têm a possibilidade de expor de maneira eficiente e mais eficaz seus traços de personalidade, de comportamento, os seus conceitos próprios, como também, os seus estilos de vida.
Toda essa conjuntura tem modificado a rede social, tornando-a como um canal propício para influenciar. A Internet surgiu, nesse parâmetro, como uma ferramenta facilitadora e incentivadora de inúmeros tipos de relações, assim confere-se a ela os créditos por ter se tornado tão importante na efetivação das relações, sejam elas econômicas, políticas, sociais ou interpessoais. Como completa Cobra “[...] o principal direcionador do crescimento da economia digital tem sido a internet. A internet está se tornando não apenas um mercado global, mas também significado de comunicação e distribuição de informação mais eficiente e com as maiores audiências.” (COBRA. 2009, p. 407-408)
Nesse sentido, as empresas utilizam e exploram essa ferramenta com o intuito de analisar e se comunicar com os seus clientes, buscando criar um vínculo e, assim, posteriormente manter um relacionamento duradouro, mantendo o contato direto com seu público-alvo através das redes sociais, influenciando na decisão de compra do produto final. Deste modo um cliente satisfeito irá comunicar a sua satisfação com o produto adquirido, originando um resultado positivo para a marca, que trará como informação para possíveis outros clientes passando uma imagem mais positiva dos serviços prestados pela empresa ou organização.
De acordo com Las Casas (2014), as principais plataformas colaborativas das mídias sociais, são Facebook, Twitter e Instagram, dentre outros, que tem ganhado maior centralidade nesses últimos anos, como é o caso do YouTube. Através desses canais de influência as empresas podem procurar meios de divulgar seus produtos ou serviços, utilizando a técnica de marketing que mais atinja o seu público-alvo, mantendo deste modo, um relacionamento próximo com os seus clientes.
A pós-modernidade propiciou que as identidades se constituíssem em torno do lazer, da aparência, da imagem e consequentemente do consumo. Impreterivelmente tornaram-se frágeis os laços que a delimitavam. Para Bauman (2005, p. 51), “houve um tempo em que a identidade humana de uma pessoa era determinada fundamentalmente pelo trabalho produtivo desempenhado na divisão social do trabalho”. Atualmente ela pode ser fruto de determinadas escolhas em meio as inúmeras possibilidades existentes dentro da internet.
Com o advento da internet e a forma como as redes virtuais de relacionamento vêm interferindo nas questões de identidade, que está presente em tudo, sendo representada também na cultura do consumo, visto que, a materialidade do consumo é que sustenta a identidade.
A internet como mídia social que possibilita a conexão com o mundo todo, exerce o poder de influência na atitude e comportamento dos usuários. Tratando-se de uma troca social e cultural, que na visão de Thompson (2005), a orientação midiática seria maior que uma simples recepção da mensagem. Como ainda completa o autor, “essa orientação significa também que a recepção é uma atividade situada: os produtos da mídia são recebidos por indivíduos que estão sempre situados em específicos contextos sócio históricos.” (THOMPSON, 2005, p.42)
No contexto contemporâneo é possível identificar nas novas gerações uma disposição bem maior com relação ao consumo de conteúdo de vídeo do que apenas verbal. Ainda assim, diferentemente do cenário de épocas anteriores, a nova era da informação trouxe uma noção de individualismo que mudou as interações dos ídolos com seus fãs, permitindo um encurtamento da distância entre ambos. Além disso, a identificação com aquele personagem famoso passou a ser cada dia mais importante, resultando que aquela figura de celebridade endeusada e muito distante se torne algo inexistente.
O conceito de influenciadores digitais para Silva e Tessarolo (2016) remete a um indivíduo que tem se destacado e alcançado uma grande visibilidade em algumas redes sociais e assim influenciado milhares ou até mesmo milhões de pessoas. Assim, pode-se definir o influenciador digital como um indivíduo que é produtor de conteúdo, através da web e das mídias sociais e que utilizando essas ferramentas consegue inspirar e persuadir pessoas, trazendo transformações comportamentais, bem como de pensamentos, tanto na internet, quanto na vida real de seus seguidores.
Na visão de Gomes e Gomes (2017) os influenciadores digitais podem ser classificados como os indivíduos que tem poder para engajar e assim envolver seus espectadores conseguindo deste modo, impactar no comportamento e no consumo de seus seguidores. Os influenciadores ganharam um amplo espaço para mostrar sua identidade, bem como sua vida, interligando também a formas diretas e intrínsecas de envolver mais indivíduos, afim de envolver estes seguidores de forma a influenciá-los. Como completa Zimmerman,
Essas pessoas eletronicamente (online) influentes – ou influenciadores online – podem fazer um bem enorme, ou um mal enorme, em um fórum de discussão, blog, rede social ou site de análise de resenha de consumidores. Eles são frequentemente os primeiros a adotar novas mídias e prestam muita atenção à publicidade. (ZIMMERMAN. 2014, p.172)
Nessa perspectiva, Silva e Tessarolo (2016) afirmam que essas “personalidades digitais” possuem o poder de influenciar as pessoas a escolher determinadas marcas ou produtos iguais aos que elas utilizam, direcionando assim, as decisões de compra dessa nova geração de consumidores.
Os influenciadores mudaram a forma como o marketing é realizado atualmente, considerando que primeiro, mudaram o espaço onde passou-se a ser online. Depois, mudaram o tipo de influenciadores, tendo em vista que, atualmente qualquer pessoa pode ser influenciadora, e não somente apenas as celebridades.
Faria e Marinho (2017) apontam que o influenciador digital transmite uma sensação de proximidade com o público, sendo essa uma das características que fazem com que o seu poder de influência seja expandido. E para as organizações essa é uma das grandes vantagens de se contratar um influenciador digital para fazer a publicidade de sua marca, tendo em vista, a possibilidade de ter o feedback instantâneo de seus consumidores, permitindo que através do mundo virtual os mesmos consigam externalizar os seus anseios e as suas necessidades.
A partir do momento que o influenciador compartilha uma publicação com algum produto ou serviço, os seguidores tem o costume de interagir e de externar as suas impressões, suas curiosidades, como também, as suas experiências com as marcas ou empresas que estão sendo divulgadas. Cardoso (2016, p.11) afirma que “as redes permitem fácil e rápida interação com os leitores. É frequente a troca de opiniões, experiências, reclamações e sugestões nos canais em tempo real.”
O compartilhamento dessas informações através dos influenciadores no meio digital faz com que as ações de marketing das empresas atinjam um número cada vez maior de pessoas, possibilitando que os resultados obtidos pelas organizações se tornem ainda maiores no mercado. “A consequente possibilidade de ganho financeiro causada pelo reconhecimento público do produtor de conteúdo como um influenciador tornou-se uma estratégia mercadológica para as marcas.” (FARIA E MARINHO, 2017, p. 4-5)
Portanto, observa-se que os canais de influência juntamente com os influenciadores têm ganhado um destaque primordial na internet e na sociedade, visto que desempenham um papel de criar identidades, fidelizando seguidores que se familiarizam com aquele perfil, consequentemente, sendo um nicho bastante viável para o consumismo, como também para exposição de produtos e marcas.
6.1. Consumo e as marcas
O ato de consumir tem ganhado centralidade no cenário atual, muitos estudiosos da contemporaneidade trazem abordagens especificas sobre o consumo. Consumo esse que, reduz o indivíduo a sua condição de consumidor consequentemente trazendo a automatização do sistema de produção. Para Bauman (2001), o atual sistema social envolve os sujeitos primeiramente enquanto consumidores, considerando que somos guiados pela sedução e desejos voláteis, aos quais se movem as marcas e os símbolos com uma leveza quase imperceptível dentro das relações sociais. A lógica do consumo abordada por ele, o considera não como um fenômeno que emerge espontaneamente, mas sim que reflete como o consumo é estruturado dentro da sociedade contemporânea.
A sociedade tornou-se capitalista, o consumo emerge em todas as esferas sociais, variando de acordo com a realidade de cada indivíduo, assim, para o consumo na sociedade contemporânea, os objetos se tornaram a verdadeira mola propulsora dos instintos humanos. Considerando que os objetos atuais estão perdendo o significado que ainda possuem com os objetos antigos, graças à produção em série, bem como, a redução da vida útil dos objetos industrializados que se tornou um obsoletismo planejado. Nesse aspecto existe, toda uma manobra tecnológica que mantém a massa sempre em busca de significações as quais os objetos factualmente não possuem. Esse processo fomenta nos indivíduos a busca pela personalização, por identidade, nesse sentido, o homem contemporâneo se perde e se frustra, através da busca da autenticidade nos objetos, que ele mesmo já massificado, não possui.
O consumo tornou-se algo comum e acarretou uma “falsa” necessidade nos indivíduos, o mercado oferece uma variada gama de possibilidades ao consumir os produtos ofertados. O mercado busca incansavelmente fidelizar o consumidor, uma vez que, cresce diariamente a concorrência no mercado, novas mercadorias, novos atrativos que chamam a atenção do consumidor.
Nesse sentido é pertinente destacar que é bastante comum que os consumidores se disponham a adquirir um produto que tenha um preço mais elevado, sendo de uma marca conhecida, do que um produto mais barato e que seja desconhecido. A segurança, e não a economia, muitas vezes, se torna um fator decisivo de compra. Na perspectiva de Cobra (2002), o consumo é influenciado pelas variações de aspectos que envolvem a idade, o sexo, a renda, o nível de educação, o padrão de modalidade e os gostos ou preferência por uma determinada marca.
Para Kotler (2008) menciona que devido aos consumidores terem cada vez mais opções de compra atualmente, e devido ao mercado se tornar cada vez mais amplo, buscando tentar atender os vários segmentos existentes na sociedade, muitas empresas fazem pesquisas detalhadas sobre as decisões de compra de seus clientes para saberem assim, o que eles realmente compram, onde, como, quando, porque e quanto compra.
O consumidor aceita a marca como sendo de boa qualidade, sendo assim, ao comprar, o consumidor pede à marca que deseja recusando outras. É perceptível ainda que ele está disposto a buscar em algum outro ponto de venda que tenha a sua marca preferida. Com isso, pode-se verificar que os consumidores estão mudando cada vez mais e também estão se tornando mais exigentes, mais sofisticados, sensíveis e também mais seletivos.
É notório que atualmente, os consumidores possuem várias opções de compra e isso os tornam cada vez mais exigentes. Na visão de Clotilde (2003, p. 67), “uma marca existe num espaço psicológico, na mente do consumidor. É uma entidade percentual, com um conteúdo definido, que é absolutamente mutante e flexível”.
A marca tornou-se então uma referência para o consumidor, agregando valores e significados importantes para o mercado do consumo. Na visão de Severiano (2007), em pesquisa feita com alguns publicitários brasileiros e espanhóis, a marca é considerada a alma do produto que agrega valores subjetivos, empresta personalidade e é componente fundamental para as identidades contemporâneas. Completa o autor:
O valor de uso não mais seria o principal critério na escolha de um produto, que não diferia dos demais produtos similares, exceto pela marca. “Haveria ser mais completo? A “marca” é “tudo”! Ela é a conjugação dos atributos mais desejados por todos os consumidores e o “ser” mais prestimosamente cuidado pelos publicitários. (SEVERIANO, 2007, p. 217)
A marca grega valor, personalidade, traz referências para grupos sociais. Nesse aspecto, a marca ganha atributos personalistas e chama atenção mais pelas suas “qualidades ‘inessenciais’ e atributos ‘subjetivos’” (BAUDRILLARD, 1970). Torna-se assim, uma espécie de substituto nas relações humanas, a partir da sua tamanha idealização decorrente do processo de fetichização que o objeto traz, tido como um ideal de consumo a ser obtido, no intuito de satisfazer um desejo, que acomete a ordem do efêmero, uma vez que, a lógica do mercado não pretende trazer uma satisfação plena através de seus produtos e marcas, considerando a necessidade de manter a produção e o consumo, atendendo assim, momentaneamente as “necessidades” do consumidor, e perenemente trazendo os objetivos de lucro do produtor.
É notório que a marca se tornou parte integrante e fundamental no processo de diferenciação do negócio, considerando que estabelecida com sucesso pode transformar-se em vantagens na determinação do preço, bem como, do serviço. A marca atribui cuidados extremos, e uma constante reavaliação quanto aos níveis de satisfação dos consumidores, observando o entendimento de quem são os seus consumidores e porque escolheram a sua marca. Estas e outras perguntas buscam como objetivos, provocar um repensar constante da imagem e das mensagens que são transmitidas pelas marcas, visando assim, o seu rejuvenescimento e ocupação efetiva dentro da mente dos consumidores.
As marcas têm uma importante função dentro das estratégias comerciais e publicitárias das empresas, uma vez que elas possibilitam a distinção das empresas e de seus produtos, bem como os da concorrência, contribuindo assim à definição da imagem e da confiabilidade dos produtos de uma empresa dentro do mercado. Os símbolos e imagens são importantes mecanismos que podem ser ampliados com símbolos fortes, acarretando uma fixação e lembrança daquela determinada marca. Uma marca pode ser construída em torno de uma pessoa famosa, como também a cor pode ser vista como elemento identificador tornando-se um atrativo diferencial para o consumismo.
A marca é considerada o principal elo entre o comprador e o vendedor, uma vez que, é por intermédio dela que ele identifica o negócio e o diferencia dos demais. O tempo também agrega mais valor à marca, considerando que com o passar do tempo, a marca passa a ser o referencial da qualidade daquele produto ou serviço prestado por um longo período de tempo. Nesse sentido, observa-se a grande necessidade das marcas em oferecer um produto que atenda os seus consumidores, bem como os fidelize.
Assim, para que isso aconteça, é necessário que a empresa crie uma posição na mente do cliente, pois só assim, ele saberá o que a marca, realmente representa, o que ela promete e o que ele pode esperar dela. Ela deve então encontrar um espaço vazio para ocupar no mercado, além de manter o propósito de reconhecimento da marca que pode ser definido como a capacidade que o consumidor tem de reconhecer e lembrar que uma marca pertence a uma determinada categoria de produto.
Com isso, as marcas mais antigas acumulam através dos anos, um número considerável de exposições e experiências de uso que possibilitam ampliar o seu conhecimento e representam uma garantia de longevidade para o produto.
As marcas se associam à economia de mercado, tendo em vista que, se não houvesse marcas, não haveria a concorrência. Portanto, está aí a importância que as marcas têm de sempre buscar inovações, para se manterem vivas, pois a inovação é essencial para o sucesso de uma empresa, bem como, para o desempenho delas, considerando não somente a inovação tecnológica, mas também ao nível da marca, buscando sempre suprir as necessidades de seus consumidores.
7. O lugar do público: os seguidores
Os consumidores são todos os dias bombardeados como várias informações e cada vez mais estão sobrecarregados com a quantidade de informações sobre os produtos e serviços, não sendo capazes de reavaliar todas as vezes que tomam uma decisão de compra. A única defesa que o consumidor tem é a sua mente que simplifica e seleciona o que se quer receber, de acordo com suas necessidades. Considerando que em média, os indivíduos não podem lidar com mais de sete coisas ao mesmo tempo, as pessoas aprenderam a simplificar tudo e assim a classificar mentalmente e cognitivamente as marcas perante a sua complexidade e sua qualidade. Neste processo, a mente funciona como um filtro seletor, organizando os produtos em categorias, posicionando seus serviços e dando um significado para cada marca.
O público assume, assim, um papel crucial para as marcas, o de: consumir aquele produto, fazer com que a marca seja disseminada a mais consumidores.
Essa espetacularização da sociedade caracteriza-se como um momento em que a mercadoria passa a ocupar toda a vida social, considerando que os objetos idealizados do consumo poderiam fornecer todas as respostas e identificações para o indivíduo, cujos os seus valores subjetivos só importam quando são identificados incondicionalmente com o universal, como completa Severiano;
Na idealização, o sujeito, ao fascinar-se pelo objeto fetichizado, cria um estado a-conflitivo, no qual toda falta está ausente. Esse movimento regressivo da psique, aos moldes do ego narcísico primitivo, de natureza conservadora, gera uma atitude de imobilidade e ausência de qualquer negatividade ou crítica. Provavelmente, essa pseudocompletude fornecida pelo “fascínio” do objeto-fetiche é um dos principais responsáveis pelo poder de sedução que a “marca” exerce e os mas media em geral, sobre seus consumidores, fornecendo-lhes “prestígio” e “personalidade”, atenuando e gerenciando conflitos. (SEVERIANO, 2007, p. 222)
Desse modo, é nessa perspectiva que a marca sobressai como uma imagem onipotente, como algo que vai para além do objeto em si, agora mais despojado de seu valor de uso, uma vez que, todos os produtos similares teriam a mesma função, não haveria assim, grandes variações entre seu valor de câmbio considerando os produtos similares que estão numa mesma faixa de preço e, devido ao seu caráter efêmero e da obsolescência programada, não haveria mais tempo e espaço para atribuição de um valor simbólico aos objetos. A marca assume o poder tanto de diferenciar quanto de singularizar, tornando deste modo ainda mais rígidas as hierarquias e evidenciando os valores de estratificação social (SEVERIANO, 2007, p. 224).
Mesmo divulgando seus produtos e marcas de maneira tal que atribuam ao consumidor certos atributos de personalidade como jovialidade, potência, beleza, sedução, glamour, essas ofertas são feitas de maneira estandardizada, segmentada no mercado consumista de acordo com as preferências pessoais de muito mais além que apenas um sujeito. O consumidor assume um papel de consumir e construir uma identidade, uma personalidade através daquele determinado produto.
Portanto o consumidor se torna o alvo direto das marcas, uma vez que, agrega a ele o poder de consumir e disseminar aquela marca. É relevante, também, reconhecer o papel do consumidor, que não é visto meramente como um joguete nas mãos da mídia, mas como o astro principal na disputa pelas fatias de mercado, bem como a busca de satisfação de desejos infindáveis, que são prometidos a partir do consumo daquele produto. Estando nós todos inseridos dentro dessa lógica de produção e consequente massificação, os indivíduos são intensamente bombardeados pelos apelos midiáticos, como também pela própria sociedade.
O próximo capítulo narra brevemente os primórdios da história da maquiagem e seu desenvolvimento.
8. COSMÉTICA E CULTURA
Segundo relatos históricos, desde 3000 A.C a maquiagem se fazia presente no universo dos indivíduos. Considera-se o povo egípcio como precursor no ato de maquiar-se. No antigo Egito, os olhos eram destacados com Khol, – pigmento de cor preta, rico em chumbo, carvão e malaquita – para colorir a boca o Carmim, – pigmento extraído do inseto cochonilha – e nas pálpebras era utilizado um pó verde, também derivado da Malaquita – mineral esverdeado pertencente ao grupo dos carbonatos, resultado da alteração de minérios de cobre. Contudo, tais minérios e pigmentos eram empregados com um intuito diferente da atualidade: serviam como proteção contra os raios solares, adoração os deuses, além de serem utilizados em festejos e em guerras. Ademais, neste período acreditava-se que a limpeza aproximava o indivíduo dos deuses, deste modo, era comum haver um culto à higiene. Portanto, cidadãos de maior status social chegavam a depilar o corpo e raspar o cabelo, utilizando perucas no lugar - o que ajudava a não disseminar a proliferação de insetos, como o piolho (LOBO, 2015, p. 39).
Também era culturalmente estabelecido que mulheres deveriam ter a pele mais clara em relação a dos homens, logo, era comum ser utilizado na derme argila ou uma mistura feita com leite de cabra e miolo de pão, com a finalidade de conservar a pele o mais clara possível (LOBO, 2015, p. 39). Paralelamente ao Egito Antigo, na Grécia os padrões de beleza baseavam-se nos deuses. De acordo com a maquiadora Kris Xiva[7], a beleza era baseada em uma ideia de formosura exterior que conseguisse refletir a beleza interior. Ademais, o culto à pele branca também estava presente na Grécia. Kris Xiva reitera que, em seu período clássico, as mulheres não poderiam dedicar-se a si mesmas, e sim somente aos filhos e marido. Portanto, deveriam ter a pele alva e não deveriam usar maquiagem. Nesta época somente a beleza masculina era valorizada.
Durante o século III, a maquiagem começou a ser usada pelas mulheres gregas. Era usado blush para pintar as bochechas e escurecer as pálpebras e, assim como no Egito Antigo, o Khol passou a ser utilizado. Além das diferenças nas técnicas de maquiagem, comparando-se com a atualidade, o ato de demaquilar (retirar os produtos) também era distinto do que é conhecido hoje em dia. As mulheres retiravam a maquiagem somente pela manhã, e logo em seguida faziam novamente todo o processo.
A indústria da cosmetologia, como é conhecida atualmente, surgiu no século XX. A ABDI em “Estudo prospectivo sobre higiene pessoal, perfumaria e cosmético”, atribui este crescimento aos avanços tecnológicos pelos quais o mundo atravessou, bem como a maior liberdade que a mulher passou a ter após as guerras mundiais - o que resultou em uma maior preocupação com a imagem pessoal. Analisando brevemente o percurso da indústria de maquiagem ao longo dos anos, é possível perceber algo em comum em relação a todas as antigas civilizações e suas técnicas: a valorização da pele clara. Até a atualidade esse aspecto se faz presente na indústria de cosméticos. É comum uma marca de beleza desenvolver produtos melhores e mais elaborados para peles brancas, deixando de lado as consumidoras de pele negra.
Um exemplo deste fato é a base da blogueira Bianca Andrade (conhecida popularmente como “Boca Rosa”). Bianca Andrade possui uma linha de produtos com a empresa brasileira Payot Ltda. Recentemente a “Boca Rosa By Payot” lançou em nove tons a “Base Matte Hd Boca Rosa Beauty By Payot”. Entretanto, a última cor do produto (tom “Aline”) não chegou a ser lançada juntamente com os outros tons, além disso, houve uma divergência na consistência do produto. As bases com tonalidades voltadas para pele clara e média eram mais espessas, o que resultava em uma maior cobertura quando aplicado sob a derme. Já os tons para pele negra eram líquidos e, deste modo entregavam pouca cobertura. O maquiador Tássio dos Santos gravou para o seu canal “Herdeira da Beleza”[8] um vídeo pontuando essa e outras problemáticas envolvendo a linha de Bianca Andrade em colaboração com a Payot.
Essa situação reflete um cenário de racismo estrutural presente dentro da indústria cosmética, bem como a desvalorização da beleza negra. Em “Estética negra empodera, sim. Porque não dá para enfrentar o racismo quando você ainda se odeia” (2016)[9], Robin Batista trata acerca da inferiorização da beleza natural negra. Segundo ele “a desvalorização, inferiorização e ridicularização da negritude, ao longo dos séculos, fixou no imaginário social da sociedade brasileira a ideia de que negros são naturalmente inferiores”. O autor conclui afirmando que, essa inferiorização faz com que pretas e pretos pensem que somente “pela miscigenação, pela auto violência estética, poderiam ser “menos piores”. Junto a este cenário, temos um mercado estético que contribui ainda mais para o sentimento de menosprezo da negritude. De acordo com Maria do Carmo Nicolau[10], proprietária do Espaço Cor da Pele Ltda "a maquiagem para a pele negra é diferente da fórmula para a pele branca, vermelha ou amarela; a pele negra tem segmentos subcutâneos que dificultam a definição de produto" (Jornal de Brasília, 1992). Entretanto, um kit de maquiagem básico (base, corretivo e pó), para consumidoras de pele negra (seja ela clara ou retinta), não é impossível de fabricar-se.
Um exemplo disso é a marca Negra Rosa, criada em 2016 pela youtuber e empresária Rosangela José da Silva. Em entrevista à revista Marie Claire[11], a empresária relata que sua relação com a maquiagem começou ainda criança, quando usava os batons de sua mãe. Contudo, em sua adolescência Rosângela conta a dificuldade em encontrar outros itens para a sua pele, “Base? Nem pensar! As pessoas diziam que pele negra não precisa de base, que eu não podia usar batom vermelho, entre outros comentários que te fazem sentir inadequada”.
De acordo com o Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas[12] (Sebrae), com a retração econômica pelo qual o Brasil atravessa, o consumidor final procura itens de maquiagem de longa duração, como por exemplo: bases, batons e pós faciais. O Sebrae ressalta que “investir nesses produtos é uma forma de corresponder às necessidades e expectativas de consumidores”.
Apesar disso, o mercado de cosméticos segue em falta no que se diz respeito a produtos para pele negra. Recentemente, a marca de maquiagem Océane[13] foi acusada de manipular os swatches[14] de sua nova paleta - 12 shades, uma colaboração com a blogueira Mariana Saad. A marca teria escurecido digitalmente o tom de pele de uma modelo branca, vendendo ao público uma imagem de que tais sombras teriam pigmentação suficiente para aparecer em uma pele retinta. Outro caso parecido aconteceu com o youtuber Tássio dos Santos. Tássio relatou[15] em seu perfil no Twitter que ao tentar comprar uma base (um lançamento disponível no mercado), deparou-se com tons extremamente claros. Contou ainda que, a vendedora que realizou o atendimento o orientou a “esfoliar o rosto para servir [o tom] direitinho.”
Posto isso, outra problemática que envolve o desprestígio de indivíduos de pele negra dentro da indústria de cosméticos é a venda de produtos que prometem o clareamento da pele. Em lugares como a Índia, Emirados Árabes e Nigéria, é comum a venda de produtos que prometem uma pele mais clara a partir do uso contínuo de cremes e loções.
A síndrome de bleaching “é o processo consciente e sistemático de autonegação e pretensão à semelhança via inclusão de ideais estrangeiros” (HALL, 2015, p. 01). O bleaching, skin whitening ou skin bleaching, é descrito pelo Dr. Ronald E. Hall como “patologia psicológica peculiar a pessoas de cor” e pode ter sido desencadeada a partir do processo de colonização sofrido por países como o Brasil. No que se diz respeito à indústria de beleza, o bleaching pode ser visto em comerciais e propagandas que prometem clareamento da pele. Em 2018, foi ao ar na Nigéria, Senegal, Gana, entre outros países da África, um comercial do novo creme corporal da Nivea, o “Nivea Natural Fairness Body Lotion”.[16] No anúncio, uma mulher negra de pele retinta usa a loção corporal e obtém um clareamento instantâneo da derme. O maquiador Tássio dos Santos usou seu perfil no Instagram para debater sobre o tema. No vídeo intitulado como “Como é o mercado de clareadores de pele na Índia?”[17], Tássio relata a experiência que teve em sua viagem para a Índia e como a promessa de uma pele clara (“fair skin”) é fortemente vendida ao consumidor.
Levando em conta tais problemas, a maquiadora Daniele da Mata, especializada em maquiagem para pele negra, afirma que a falta de diversidade vai além das dificuldades em conseguir determinado pigmento, falta de capital ou tecnologia. Segundo Daniele “a razão das empresas não investirem em bases, ou quaisquer produtos cosméticos para pessoas de pele negras é o racismo. O mercado ainda não acredita no poder de compra da mulher negra. Para eles, se é negro, é pobre”[18].
8.1. O mercado de produtos cosméticos no brasil
De acordo com a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (2009)[19], a indústria de higiene e cosméticos começou a avançar na década de 50, quando políticas de incentivo surgiram no Brasil propiciando a vinda de grandes empresas para o país, como por exemplo a multinacional francesa L’Oréal[20] e a norte americana Avon[21]. Já nos anos 60 e 70, O Boticário e Natura surgiram trazendo uma alternativa nacional para o consumidor brasileiro. E até a atualidade, conforme o levantamento acerca do “Panorama da indústria de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos”[22], realizado pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), a Natura segue como a principal empresa de cosméticos no Brasil. Com a compra definitiva da Avon pela Natura, a companhia se torna a 4º maior empresa de cosméticos[23] do mundo, ficando atrás apenas da L’Oréal, Estée Lauder e Shiseido.
Além disso, de acordo com a Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC),[24] em 2014 o Brasil era o terceiro no ranking dos 10 maiores mercados de cosméticos, perdendo apenas para os Estados Unidos e China. A Associação informou que nos últimos 19 anos, a indústria obteve um crescimento de 10% ao ano. Em 1996 o mercado de higiene e cosméticos (HPPC) lucrou cerca de R$ 4,9 bilhões, já em 2014 o faturamento foi de R$ 43,5 bilhões. Mesmo com a crise enfrentada atualmente pelo Brasil, o setor de cosméticos continua em constante crescimento. O Brasil é um dos países que mais consomem produtos de higiene pessoal, perfumaria e cosméticos (HPPC) e, em 2018, o setor movimentou cerca de 30 bilhões de dólares. Em 2019 obteve um crescimento de 5% em relação ao ano anterior, e para 2020 o presidente da Associação Brasileira da ABIHPEC, João Carlos Basílio[25] acredita que este crescimento será de cerca de 5,1%.
A ABIHPEC (2015)[26] associa o crescimento deste mercado à incorporação de novas tecnologias de produção pelas empresas, maior acesso das classes C e D aos produtos do setor, aumento da expectativa de vida (que resulta na maior vontade de conservar a aparência jovem) e acima de tudo, aos lançamentos de novos produtos que atendem às necessidades do consumidor final[27].
Posto isso, é necessário questionar se as necessidades do consumidor final estão de fato sendo atendidas, já que, como visto ao longo deste capítulo, o cliente de pele negra é constantemente deixado de lado e suas necessidades muitas vezes não são atendidas ou ao nem mesmo são ouvidas pelas empresas de maquiagem e dermocosméticos.
9. METODOLOGIA DE ANÁLISE
Para a melhor compreensão do mercado de beleza nacional foram realizadas pesquisas bibliográficas em sites, livros, revistas online, além da análise do quadro “O tom mais escuro”, de Tássio dos Santos. A fim de obter uma percepção mais ampla sobre o tema, antes de adentrar na questão sociológica do problema, foram analisados textos voltados para a indústria de cosméticos. Entre eles, o “Estudo técnico sobre as relações entre a indústria química e a indústria de cosméticos”, publicado pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), e o “Panorama do Setor de HPPC, disponibilizados anualmente pela ABIHPEC, entre outros documentos voltados especialmente para a indústria. Tais textos se mostraram essenciais para a continuidade do projeto.
Após leituras detalhadas foi possível tecer uma linha do tempo em relação à "chegada" das primeiras fábricas de cosméticos no país na década de 50, até a consolidação do mercado brasileiro no setor. Percebe-se que, o avanço do setor no Brasil foi consideravelmente rápido. Segundo a ABIHPEC, em 2014 o Brasil era o terceiro no ranking dos 10 maiores mercados de cosméticos, perdendo apenas para os Estados Unidos e China, movimentando ao todo R$ 43,5 bilhões de reais no ano. Sendo assim, podemos considerar que a indústria brasileira de higiene e beleza, atualmente está consolidada e dispõe de meios para pesquisa e tecnologia.
Posto isso, o estudo voltou-se para a área mais sociológica do tema. Como um setor tão consolidado, com alto faturamento e em constante avanço tecnológico continua negligenciando uma grande parte da população? Essa foi a pergunta que norteou todo o trabalho de pesquisa. E, tendo em mente esse questionamento, foram realizadas pesquisas bibliográficas a respeito da relação da população preta com a beleza e o setor de cosméticos. Essa pesquisa analisou textos acadêmicos, como o estudo de Tania Haddock Lobo em “Faces pintadas no tempo: padrões de beleza associados à maquiagem e sua evolução através do século” e a contribuição de Alan Roman Ros em “O crescimento da indústria de cosméticos no brasil no século XXI”.
Como objeto de estudo tem-se como foco principal de análise alguns vídeos do quadro “O tom mais escuro” de Tássio Santos, que é um maquiador profissional e jornalista de beleza. Tássio Santos tem um canal focado em beleza negra, em que dá dicas de maquiagem e produtos para pessoas com esse tom de pele. Em 2012 criou o Herdeira da Beleza, uma página que tinha como finalidade compartilhar dicas de maquiagem e logo depois se tornou um espaço de resistência e reflexão. Considerando que sempre houve uma preocupação em direcionar as postagens para a comunidade negra, pois ainda hoje é um nicho carente.
Aquilo que começou como um passa tempo para Tássio, conquista hoje seguidores do país inteiro. Ele viaja os quatro cantos oferecendo oficinas de maquiagem, dando consultorias para empresas e produzindo conteúdo digital. Tudo isso fez do Herdeira da Beleza o maior canal de maquiagem profissional para pele negra da América Latina. Para ele a busca pela valorização da estética negra é um complemento fundamental na luta antirracista e a maquiagem é uma ferramenta importantíssima, jamais pense que isso é futilidade.
Contudo, a fonte principal de estudo concentrou-se na pesquisa de Tássio dos Santos em “Tem minha cor? Breve estudo sobre raça e o mercado brasileiro de maquiagem” e sobretudo em seu canal no Youtube, intitulado “Herdeira da Beleza”. Na plataforma online, Tássio faz vídeos sobre beleza e maquiagem, com enfoque em produtos para a pele negra. Entre esses vídeos um quadro em especial ganhou grande repercussão online. Em “O tom mais escuro", Tássio junto com Joyce Maria testam a última tonalidade da cartela de cores de diversos produtos, entre eles: bases, corretivos, concertos e etc. Analisando brevemente os comentários deixados nos vídeos da série, é possível perceber o impacto causado por esses vídeos na vida das consumidoras. Mas, esses vídeos só impactaram o jeito como o público final enxerga a maquiagem e toda carga cultural que ela carrega consigo? Ou de algum modo as marcas mudaram sua produção, seu comportamento e postura após a publicação dos vídeos?
A fim de adentrar ainda mais no cerne da questão, foram analisados três vídeos compartilhados por Tássio, sendo eles: “Por que não me chamou, Mari Maria? Base Velvet Skin #OTomMaisEscuro”; “Assiste esse vídeo quando sair do BBB, Boca Rosa! Resenha base #OTomMaisEscuro” e “Por onde começar?! Base Pausa Para Feminices #OTomMaisEscuro”. Nos próximos tópicos, tais vídeos são descritos e analisados, procurando observar as estratégias de discurso empregadas pelo influenciador ao abordar, analisar e comentar os produtos, bem como buscando verificar como tais marcas receberam as críticas e quais foram as medidas tomadas pelas mesmas após a divulgação do vídeo.
10. Descrição do objeto de estudo
Com as análises dos quadros, buscou-se uma observação detalhada das abordagens trazidas nestes vídeos, a fim de verificar acerca de como o discurso, a performance e a influência de Tássio, bem como do canal, através do seu quadro; e como isso influencia o público e as marcas. Pautando-se em como o papel que Tássio, seu discurso e comportamento influenciam seguidores, destacando as possíveis consequências e impactos causados nas marcas.
Os vídeos analisados fazem parte de uma série de vídeos, intitulada “O Tom Mais Escuro” criado por Tássio Santos que é jornalista de beleza e maquiador profissional. Nestes vídeos, Tássio faz resenhas de algumas marcas de bases com tons mais escuros para peles negras, e ainda conta com a participação de uma modelo chamada Joyce que tem a pele em tom escuro. Nos vídeos, Tássio faz uma análise geral dos produtos, observando a embalagem, o produto como um todo. Abaixo seguem o resumo feito através das descrições de cada vídeo.
- VÍDEO 01 - “Por que não me chamou, Mari Maria? Base Velvet Skin #OTomMaisEscuro”
Inicialmente, Tássio faz uma crítica com relação às bases da marca Mari Maria com tons mais escuros, que estão “encalhadas” em um loja em Salvador – BA. Tássio faz uma visita à loja para analisar as bases. Juntamente com a modelo Joice eles analisam o fato destas bases não estarem sendo vendidas como se esperava, a modelo relata que possivelmente elas não estão saindo pelo fato de ninguém de pele negra estar usando e indicando. Tássio ressalta que pessoas de pele branca testando maquiagens para pele negras é um desserviço, pelo fato de destonar muito da realidade. No vídeo, Tássio traz uma abordagem crítica acerca de produtos para peles negras. Tássio juntamente com a modelo faz uma aplicação do produto, fazendo um crítica até mesmo pela embalagem do produto que é feita de plástico, chamando atenção para as marcas que se preocupam com o meio ambiente. Tássio faz uma análise geral das características da base, tanto de apresentação do produto quanto da qualidade. Para o tom mais escuro da base, a base está clara. A base tem uma cobertura leve, porém a marca promete uma cobertura média a alta. A base do tom mais escuro, ela não atende realmente de forma fidedigna a peles negras. O sub tom não valorizou a pele da modelo.
Tássio faz uma exposição da base da Mari Maria e compara com outra base que se adequa ao tom da pele da modelo. Chamando a atenção que a base não dá para usar o ano todo, levando em consideração as oscilações e mudanças de estações e climas, com relação a alteração da textura da pele. As considerações de Tássio não foram positivas, mostrando que a base não atende ás necessidades das pessoas. Ao final do vídeo a modelo não indica o uso da base por pessoas de pele negra. Em dois anos que Tássio está fazendo esses vídeos do Tom Mais Escuro, ele ressalva que seus vídeos não têm chegado a todas as marcas, pelo fato delas colocarem produtos no mercado que não atendem a todos.
- VÍDEO 02 - “Assiste esse vídeo quando sair do BBB, Boca Rosa! Resenha base #OTomMaisEscuro”
Neste vídeo da série “O tom mais escuro”, Tássio já inicia o vídeo abordando uma crítica que ao procurar muito pela base de tom mais escuro da marca Boca Rosa ele levou bastante tempo, pois a base de tom mais escuro demorou um pouco mais a chegar no mercado com relação as outras tonalidades, porque levou mais tempo para ficar pronta, estando essa fora do lançamento. Ele chama atenção por muitas marcas brasileiras priorizarem a elaboração das bases de tons mais escuros, do que as tonalidades mais claras. Ele mostra que a base da diferença de tonalidade entre as bases da mesma cor, interferindo no resultado final da resenha que ele faz. Até mesmo a foto de divulgação da base difere da cor real. Chamando atenção que a base de tom mais escuro da referida marca não serve para o último tom da cartela de cores, pois não abrange toda as tonalidades de peles escuras. Ao analisar a base da marca Boca Rosa com uma base de outra marca, Tássio ressalva a diferença entre elas, chamando a atenção de que muitas marcas ao desenvolverem um produto eles utilizam um maquiador na sua elaboração, que muitas vezes tem a pele clara, interferindo assim, de forma direta na produção de bases de tons mais escuros que consiga contemplar a vasta gama de tonalidades de peles mais escuras.
Ele chama a atenção para a marca que produz esta base, salientando que a marca, assim, como outras, tem uma certa dificuldade com a cartela de cores para tons mais escuros. Ele ressalva que as marcas precisam incluir em seus profissionais pessoas da comunidade negra, para contribuir na elaboração de produtos que atenda a todas as tonalidades. Ao final do vídeo Tássio ainda apresenta uma paleta de maquiagem que foi desenvolvido pela marca, onde todas as tonalidades não se encaixam para peles escuras. Tássio ressalva que a base não serviu.
- VÍDEO 03 - “Por onde começar?! Base Pausa Para Feminices #OTomMaisEscuro”
Neste vídeo, Tássio discorre sobre um parceria feita com a marca Pausa para Feminices, onde eles ofereceram uma consultoria para criação da base de tons mais escuro. Ele relata como foi o processo de consultoria e a sua contribuição no projeto. Como Tássio fez a consultoria na elaboração desta base, ele e a modelo Joyce foram testando até chegar em um tom que se adequasse ás tonalidades mais escuras. A base se adequa a pele, a textura é boa. Assim, ao final do vídeo ele ressalta a que esta base atende ás tonalidades mais escuras, sendo um produto de ótima qualidade.
10.1. Análises e discussões
Ao analisar os vídeos notou-se como o mercado de cosméticos traz a questão de abranger todos os tipos de tonalidades de tons de peles de forma desigual, tendo em vista as inúmeras críticas feitas por Tássio em sua série de vídeos. Como ele mesmo ressalta seria importante que as marcas olhassem seus vídeos analisando as suas críticas, para que assim, desenvolvam produtos que contemplem de forma fidedigna todas as tonalidades mais escuras.
Muitas são as críticas realizadas nos vídeos por pessoas que seguem e acompanham o trabalho de Tássio, chamando a atenção para essa grande necessidade das marcas darem mais importância para a criação de produtos que atendam realmente os tons mais escuros.
Neste aspecto ressalta-se que os pontos de análise se dão a partir da observância no papel do influenciador, visto que, nos vídeos observando o próprio Tássio chama a atenção para que as marcas tenham conhecimento das análises e críticas feitas por ele, para que assim possam criar produtos que alcancem mais consumidores. Chama-se ainda a atenção para o fato de que em seus vídeos seus seguidores, independente da tonalidade da pele, ficam incomodados pela forma como as marcas tratam essa questão de abrangência de produtos para todos os públicos.
Diante tais perspectivas observa-se o quanto a figura do influenciador desempenha um papel importante na decisão de compra ou até mesmo com relação ás impressões dos produtos ou da marca. Uma vez que a internet tem transformado o modo como os consumidores interagem com as empresas, como compram e como se relacionam com os seus demais consumidores.
A figura que Tássio Santos, como influenciador, representa uma versão divertida e ao mesmo tempo crítica e reflexiva ao bordar sobre os produtos para tons mais escuros de peles. Posto isso, é pertinente ressaltar que ao abordar o racismo estrutural dentro de tal mercado poderia contribuir para a quebra de preconceitos e estereótipos. Considerando que as mulheres negras não se enquadram dentro dos padrões estéticos que são impostos socialmente e, deste modo, os produtos que são produzidos para a pele negra são geralmente mais escassos e muitas vezes ineficazes, mesmo quando estas mulheres englobam uma grande parcela da população brasileira.
A partir da identidade e conhecimentos que o influenciador transmite, reflete em seus seguidores uma pessoa que entende do que fala, que tem propósitos e experiências, tornando seu discurso mais evidente e verossímil, mais próximo do seguidor. Esse profissional consegue transmitir conteúdos de forma simples, autêntica e cotidiana, tendo o potencial e a capacidade de provocar mudanças comportamentais, como também de mentalidade em seus seguidores, a fim de influenciar no ato final de consumir determinado produto.
Em seu canal chamado Herdeira da Beleza no YouTube, Tássio Santos, que está inscrito desde o ano de 2014, traz consigo o total de 454 mil inscritos. Como podemos observar na imagem abaixo.
Figura 1: Imagem do canal de Herdeira da Beleza de Tássio Santos no YouTube.
Observa-se nesta demonstração que Tássio busca retratar em grande parte sobre a questão de tons mais escuros no mercado da maquiagem, fazendo uma interferência sucinta de como é este mercado, como os produtos atendem o público. Mas é importante ressaltar que estes quatrocentos e cinquenta e quatro mil seguidores inscritos, possuem todas as tonalidades de pele, sendo assim, o público de Tássio não se resume somente em pessoas negras. Nesse sentido, observa-se o quanto o conteúdo que ele traz chama a atenção de milhares de pessoas, influenciando assim, no processo de aquisição de produtos de beleza, tendo em vista que ele traz conteúdos variados sobre esse tema.
Os influenciadores digitais são uma tendência de mercado e têm começado a chamar a atenção de grandes marcas em virtude da quantidade de seguidores que eles possuem, bem como, do grande nível de interação que eles têm com o seu público. Também, devido ao fato dos mesmos falarem para uma audiência segmentada fazendo, assim, uma publicidade mais direcionada e assertiva, uma vez que, seus seguidores o acompanham porque faz referências com seus gostos. Para Cardoso (2016 p.11), “os Digital Influencers acabam se tornando espécies de líderes que ditam as tendências a serem seguidas pelo seu público. Elas se tornam um exemplo para suas seguidoras, que adotam determinado estilo semelhante ao seu e com isso passam a “ditar” modelos a serem copiados.”
Fazendo essa correlação é importante destacar que além de Tássio abordar sobre o universo da maquiagem, trazendo o seu perfil de influenciador, ele demonstra uma visão reflexiva da importância de considerar os diversos tipos de peles escuras, bem como, a inclusão no negro no mercado de maquiagens. Como abordado em um de seus vídeos, chamam a atenção das marcas para que elas possam incluir pessoas de peles negras em seus testes e no processo de elaboração de seus produtos, para assim, garantir uma maior eficiência e abrangência do produto.
Tendo em vista que os influenciadores expõem seus estilos de vida, as suas opiniões, as suas experiências e seus gostos, tudo que eles compartilham na internet acaba gerando uma repercussão em determinados assuntos e no modo de pensar dos seus seguidores, como é possível perceber em comentários deixados pelos seus seguidores em seus vídeos. Como completa Cardoso (2016, p.11) “as redes permitem fácil e rápida interação com os leitores. É frequente a troca de opiniões, experiências, reclamações e sugestões nos canais em tempo real”.
Isso contribui para demonstração da existência de um público-alvo específico e que pode ser analisado para que as empresas possam deste modo, direcionar as suas ações aos consumidores de forma mais eficiente. Para Adolpho (2011), uma organização pode descobrir como anda a imagem da sua marca e o impacto de suas ações na mente do consumidor monitorando as redes sociais. Portanto, o papel do influenciador se liga também ao sucesso das marcas, uma vez que, a sua figura de influenciador tem grande peso no processo de escolha de produtos. Como destaca Faria e Marinho, “a consequente possibilidade de ganho financeiro causada pelo reconhecimento público do produtor de conteúdo como um influenciador tornou-se uma estratégia mercadológica para as marcas” (FARIA E MARINHO, 2017, p. 4-5).
Figura 2: Imagem da página do perfil do Instagram de @herdeiradabeleza.
Em seu perfil no Instagram Tássio também traz um grande número de seguidores, compartilhando seu dia a dia, seu trabalho, seu estilo de vida e principalmente dicas de maquiagem e cuidados com a pele, o que volta-se para o foco do seu trabalho abordando a beleza. Ele aproveita esse espaço que o Instagram possibilita para a divulgação do seu trabalho, como retorno, suas publicações trazem muitas curtidas e comentários. Observa-se assim, que seus seguidores são efetivos e ativos, mantendo um contato próximo a ele. Em seu perfil no Instagram nota-se que ele compartilha a sua vida, sua personalidade, seus gostos, sem perder o foco de trazer uma abordagem sobre a beleza. Já em seu canal no YouTube Tássio traz uma abordagem mais voltada para a maquiagem e o seu trabalho.
Portanto, nota-se que os influenciadores buscam atualmente trazer múltiplas abordagens, mas sempre tentando manter o seu foco principal em determinada área. De acordo com Gomes e Gomes (2017, p.8) “os influenciadores digitais criam e distribuem conteúdos diversificados em múltiplas mídias, estruturando-os em uma narrativa transmidiática”. Assim sendo, o papel do influenciador se desloca de um simples comentador de produtos, atualmente ele ganha a função de gerador de novas consciências, novas visões e percepções. Considerando que o influenciador é uma pessoa capaz de influenciar o comportamento e a opinião de milhares de pessoas através do conteúdo que é publicado em seus canais de comunicação.
Analisando principalmente a mensagem subliminar que Tássio passa através das suas abordagens, é importante destacar que ele traz uma questão necessária a ser discutida na atualidade, a beleza negra e a maquiagem, ressaltando a importância de se acabar com esse paradigma do preconceito racial. Tássio afirma em seu blog que “A busca pela valorização da estética negra é um complemento fundamental na luta antirracista e a maquiagem é uma ferramenta importantíssima, jamais pense que isso é futilidade (SANTOS, 2019)”.
Tendo em vista que, ao se falar em beleza feminina um dos rituais mais utilizados pelas mulheres para alcançá-la se dá através da maquiagem. A utilização da maquiagem contribui para realçar a beleza feminina, como também, é um instrumento que melhora a auto estima de diversas mulheres, possibilitando a prática de enxergar a sua própria beleza.
Uma situação simples que envolve o ato de se maquiar, não se torna tão simples, como destaca Tássio, se tratando de uma mulher de pele negra, considerando que o mercado de maquiagem para peles negras, ainda está longe de ser abrangente para todos os tons de peles escuras. Entretanto, a beleza negra tem sido mais discutida no ciberespaço, ganhando centralidade principalmente nas mídias sociais. Constituindo-se também como um espaço de luta e resistência para as minorias, que por muitas vezes não tem as suas pautas abordadas na mídia tradicional.
Tássio traz esse enfoque de forma direta, sendo bastante sucinto em seus diálogos, promovendo uma visão ampla de como a maquiagem aborda as mulheres de peles negras. Ele afirma que no Brasil, uma das principais formas de racismo se dá quanto à cor da pele, deste modo, quanto mais escura for, maior é preconceito sofrido. Ele afirma ainda, que as marcas não produzem produtos específicos para as peles negras, pois as marcas não consideram estas mulheres como a maior parte de seu público consumidor. O discurso de Tássio é pautado também em levantar o potencial da mulher negra, principalmente como participante dos processos de criações dos produtos de maquiagens voltadas para peles negras.
Santos (2018) ressalta que existem vários tons e também subtons de pele negra e que o mercado ainda não consegue atender toda essa demanda, e com isso segue perpetuando o racismo ao produzir maquiagens que em sua maioria são destinadas apenas para peles brancas. Considerando a relevância mercadológica, se faz pertinente analisar como esses produtos tem se apresentado para o público consumidor negro e também discutir sobre as principais questões que eles trazem, dando uma maior relevância para a enxuta cartela de cores. Como ainda destaca o autor, “é negado a gente o direito de consumir, a possibilidade de consumir, e a gente neste mundo capitalista escroto que a gente vive é uma das formas de ser cidadão, consumindo. Se eu tenho meu dinheiro e sequer tenho a possibilidade de consumir nem sou visto como um cidadão. (SANTOS, 2018)”
Partindo dessa premissa observa-se que o discurso que Tássio evoca vai além de uma simples resenha de um produto de maquiagem, ele transcende as questões, pautando-se também em uma forma de discurso que chama a atenção dos seguidores para uma questão social bastante discutida em outros âmbitos na sociedade contemporânea. Deste modo, Tássio traz um enfoque social e midiático que possibilita também trazer à tona a necessidade do mercado de produtos de maquiagem de se adequar às demandas sociais existentes, trazendo uma maior abrangência para os consumidores. Sendo interessante pensar que as marcas nunca estiveram dispostas ao aperfeiçoamento ou a potencialização dos traços da negritude, mas sim, garantir o embelezamento eliminando a cor escura. E numa questão plural de sociedade, considerando as perspectivas raciais, esse fator se torna pesado e excludente, nesse sentido, Tássio sempre busca ressaltar a importância de se pensar na elaboração da maquiagem tendo como participação pessoas de peles escuras, aproximando-se ao máximo da realidade.
É nessa vertente que observa-se que o diálogo trazido por Tássio, perpassa simplesmente a questão de maquiagem, ele enfoca numa abordagem plural, e nesse sentido, constata-se também que seus seguidores constroem uma visão mais realista e humanitária acerca da necessidade de inserir o indivíduo negro dentro da sociedade. O papel de influenciador que Tássio transmite ganha centralidade e destaque, tendo em vista que, desde a evolução da era digital o comportamento do consumidor vem se transformando, saindo da figura de um personagem passivo, para um sujeito mais ativo, criando assim uma opinião própria. Decorrente dessas mudanças, as organizações vêm buscando se reinventar, para sugerir uma melhor percepção do que a marca propõe, bem como, do que o mercado demanda. Visto que os influenciadores têm ficado cada vez mais exigentes, pois buscam assumir uma postura verídica para os seus seguidores, compartilhando ideias e percepções reais.
Fica evidente portanto, para o mercado, que no processo de decisão de compra o consumidor não se limita somente à escolha de marcas ou busca de valores, atualmente ele visa em outros signos pertinentes que se relacionam a cada pessoa, de acordo com a sua experiência ou com as informações que são passadas para a aquisição daquele produto através dos influenciadores. Nesse sentido, os consumidores além de consumirem o produto, buscam consumir a marca, o estilo de vida que aquele determinado produto aborda, de modo que, o influenciador faz a venda de um produto que se relaciona com a identidade e a personalidade dos consumidores remetendo a marca.
Fica claro e evidente a importância que a figura do influenciador desencadeia na sociedade como um todo, sendo uma pessoa que detém não somente a postura de influenciar, mas também de trazer conteúdos que se relacionam com as escolhas pessoais de cada indivíduo, sendo desse modo, uma figura que possibilita o mercado a ganhar novos consumidores.
11. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Mediante o estudo realizado observou-se que a tecnologia e a forma como as pessoas a utilizam possibilita uma vasta gama de espaços onde os indivíduos se relacionam, consomem, criam seus gostos, dentre tantos outros. Observou-se que o papel dos influenciadores, assim como da utilização das redes sociais, têm ofertado uma nova visão, como também, criado uma perspectiva subliminar frente aos novos meios de utilizar a mídia.
A utilização das redes sociais com o auxílio das ferramentas do marketing possibilita que as empresas além de interferir na decisão de compra, se tornem cada vez mais como uma ferramenta eficaz, sendo também um diferencial competitivo dentre as demais. É importante salientar que por meio dessas estratégias de marketing, as empresas que as utilizam a seu favor, considerando a tecnologia da comunicação como forma de conquistar, reter e fidelizar os seus clientes, como também divulgar a imagem da sua marca ou empresa, e portanto atingir satisfação a partir do consumo daquele determinado produto, que consequentemente promoverá a adesão do cliente.
Nessa visão, ao analisar o trabalho do youtuber Tássio Santos na série “O tom mais escuro”, observou-se o quão subjetivo e analítico é o seu trabalho frente a influência, abrindo importantes reflexões sobre o mercado de cosméticos para peles de tons mais escuros. Analisar a mensagem que Tássio transcreve em suas falas, possibilita uma visão mais ampla de como esse mercado se comunica, de como os consumidores agem frente aos lançamentos desses produtos, bem como, a finalização de compra do produto.
É importante destacar ainda a propriedade com que Tássio faz suas resenhas de produtos, ressaltando a importância das marcas em se adequarem e trazer a abrangência de tons mais escuros e direcionados a pessoas de pele negra. Nessa perspectiva nota-se o poder de influência que ele tem, uma vez que, os comentários deixados pelos seus seguidores se entrelaçam com as críticas e análises feitas por ele ao longo da resenha. Outro fator importante, é que ele utiliza uma modelo de cor escura para mostrar o resultado do produto na pele, o que traz maior veracidade a sua fala.
De modo geral, observa-se o quão importante se configura a comunicação que esses influenciadores trazem dentro da sociedade midiática. Permitindo novas percepções, como também trazendo um maior abrangência para o mercado do marketing. Portanto, conclui-se que as redes sociais e os influenciadores tem grande poder de influência na tomada de decisão de compra, considerando que os consumidores utilizam os recursos oferecidos por eles para auxiliar no seu processo decisório de consumo.
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[1] Blogueiros negros reclamam sobre a dificuldade que enfrentam quando buscam itens de maquiagem para pele negra. Tassio Santos, canal Herdeira da Beleza – disponível em: https://www.youtube.com/results?search_query=canal+tassio+santos. Camila de Lucas, disponível em: https://www.youtube.com/results?search_query=canal+camila+de+lucas.
[2] Modelo negra diz que clarearam sua pele em anúncio: "Inaceitável". Disponível em: https://vogue.globo.com/Video/Lifestyle/noticia/2019/08/modelo-negra-diz-que-clarearam-sua-pele-em-anuncio-inaceitavel.html. Acesso em: 08 de maio. 2020.
[3] Fermilab é um laboratório especializado em física de partículas de alta energia do Departamento de Energia dos Estados Unidos. Disponível em: https://www.fnal.gov/. Acesso em: 18 de abr. 2020.
[4]Acesso à Internet e à televisão e posse de telefone móvel celular para uso pessoal 2017. Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/visualizacao/livros/liv101631_informativo.pdf. Acesso em: 17 de abr. 2020.
[5] YouTube afirma que Brasil é o segundo país em consumo de vídeos do portal. Disponível em: https://exame.com/tecnologia/youtube-afirma-que-brasileiros-sao-maiores-consumidores-de-videos-no-portal/. Acesso em: 17 de jun. 2020.
[6] Glow Up. Disponível em: https://www.netflix.com/title/81075536. Acesso em: 20 mai. 2020.
[7] Maquiagem na Grécia Antiga. Disponível em: https://www.xivamaquiagembh.com.br/2013/05/maquiagem-na-grecia-antiga/. Acesso em: 24 mai. 2020.
[8] “Assiste esse vídeo quando sair do bbb, boca rosa! resenha base #otommaisescuro”. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=J8SVdb_ghvg. Acesso em: 17 mai.2020.
[9]Artigo publicado por Robin Batista no portal online Geledés. Disponível em: https://www.geledes.org.br/estetica-negra-empodera-sim-porque-nao-da-para-enfrentar-o-racismo-quando-voce-ainda-se-odeia/. Acesso em: 27 abr. 2020
[10] Trecho da entrevista concedida ao Jornal de Brasília (1992) e disponibilizada no artigo de Jocélio Teles dos Santos, “O negro no espelho: imagens e discursos nos salões de beleza étnicos”. Disponível em: http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/veiculos_de_comunicacao/EAA/N38/03.PDF. Acesso em: 25 abr. 2020
[11]Entrevista completa disponível em:
[12] Artigo publicado em Junho de 2019 no portal online do Sebrae (Santa Catarina). Disponível em:
[13] Marca brasileira fundada em 2007. Segundo a instituição, a Océane é “uma nova forma de comprar, consumir, pensar a beleza”. Disponível em:
[14] Swatch - Amostra. Disponível em: https://dictionary.cambridge.org/pt/dicionario/ingles/swatch. Acesso em: 10 mai. 2020
[15] Relato compartilhado por Tassio dos Santos em seu perfil no twitter (@santostassio). Disponível em:
[16] Nivea Natural Fairness Body Lotion #Glowlikeabride. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=o1hFLYqK69I. Acesso em 19 mai. 2020
[17] Vídeo disponibilizado no perfil do maquiador Tássio dos Santos. Disponível em: https://www.instagram.com/tv/CAV5G8LFuoJ/?utm_source=ig_web_copy_link. Acesso em: 19 de maio. 2020
[18] Trecho da entrevista concedida ao portal online Pleno.News. Disponível em: https://pleno.news/comportamento/mercado-de-maquiagem-ainda-nao-satisfaz-mulheres-negras.html. Acesso em: 15 de mai. 2020.
[19] Estudo prospectivo realizado pela Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) publicado em 2009. Disponível em: https://docplayer.com.br/4877358-Higiene-pessoal-perfumaria-e-cosmeticos.html. Acesso em: 11 de mai. 2020.
[20] A empresa L’Oréal se estabeleceu no Brasil em 1959 com a FAPROCO (Fabrica Produtos Cosméticos S.A.). Disponível em: https://www.loreal.com.br/grupo-l%C2%B4or%C3%A9al/sobre-a-lor%C3%A9al-brasil/historia-da-loreal-no-brasil. Acesso em: 15 de mai. 2020
[21] A empresa Avon estabeleceu-se no Brasil em 1958. Disponível em: https://www.avon.com.br/institucional/a-avon. Acesso em: 15 de mai. 2020.
[22] Estudo realizado pelo BNDES acerca da indústria de higiene e cosmético. Disponível em: https://www.bndes.gov.br/SiteBNDES/export/sites/default/bndes_pt/Galerias/Arquivos/conhecimento/bnset/set2505.pdf. Acesso em: 10 de mai. 2020.
[23] “Um abacaxi chamado Avon: a sucessão de desafios que aguardam a Natura”. Disponível em: https://exame.abril.com.br/negocios/um-abacaxi-chamado-avon-a-sucessao-de-desafios-que-aguardam-a-natura/. Acesso em: 12 de maio. 2020.
[24] Publicação realizada anualmente pela Associação Brasileira da Indústria de Higiene Pessoal, Perfumaria e Cosméticos (ABIHPEC). Disponível em: https://abihpec.org.br/publicacao/panorama-do-setor-2015/. Acesso em: 10 de mai. 2020.
[25] Mercado de beleza continua em expansão no país. Disponível em: http://amasms.com.br/mercado-de-beleza-continua-em-expansao-no-pais/. Acesso em: 13 de mai. 2020.
[26]Disponível em: https://cosmeticinnovation.com.br/wp-content/uploads/2016/03/ABDI_relatorio_isumos_cosmeticos.pdf. Acesso em: 15 de mai. 2020.
[27] Informações disponíveis na pesquisa de Alan Roman Ros a respeito do “O crescimento da indústria de cosméticos no brasil no século XXI “. Disponível em: https://drive.google.com/open?id=1wFOvDgV7uNMvxvFlKf_VV-GwAWEVwjva. Acesso em: 10 de mai. 2020.
Publicado por: Acsa Vitória Alves da Cosya
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