Vitaminas e minerais: um breve estudo
índice
- 1. RESUMO
- 2. INTRODUÇÃO
- 3. OBJETIVOS
- 3.1 OBJETIVO GERAL
- 3.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
- 4. REVISÃO DA LITERATURA
- 4.1 Histórico
- 4.2 Dados Epidemiológicos
- 4.3 O Papel das Vitaminas no Organismo Humano
- 4.4 O Papel dos Sais Minerais no Organismo Humano
- 5. METODOLOGIA
- 6. RESULTADOS E DISCUSSÕES
- 6.1 Os micronutrientes e suas funções fisiológicas
- 6.1.1 Vitamina A
- 6.1.2 Vitamina B9
- 6.1.3 Vitamina D
- 6.1.4 Ferro
- 6.1.5 Zinco
- 6.1.6 Iodo
- 6.2 Deficiência de Micronutrientes
- 6.2.1 Carência de Vitamina A
- 6.2.2 Carência de Vitamina B9
- 6.2.3 Carência de Vitamina D
- 6.2.4 Carência de Ferro
- 6.2.5 Carência de Zinco
- 6.2.6 Carência de Iodo
- 6.3 Toxicidade de Micronutrientes
- 6.3.1 Toxicidade da Vitamina A
- 6.3.2 Toxicidade da Vitamina B9
- 6.3.3 Toxicidade da Vitamina D
- 6.3.4 Toxicidade do Ferro
- 6.3.5 Toxicidade do Zinco
- 6.3.6 Toxicidade do Iodo
- 6.4 Uso de Suplementos contendo vitaminas e minerais
- 7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
- 8. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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1. RESUMO
Dados da UNICEF (2009) sugerem que mais dois bilhões de pessoas no mundo sofrem alguma carência clínica ou subclínica alguma vitamina ou mineral. Cerca de um terço das crianças do mundo sofrem de carência de vitamina A e cerca de 130 mil mulheres grávidas morrem por ano por carência severa de ferro. Uma descrição da patofisiologia de doenças causadas por carência ou excesso de vitaminas e minerais pode levar a melhores diagnóstico, terapêutica e qualidade de vida. Esse trabalho tem como objetivo estudar a fisiologia e bioquímica de vitaminas e minerais, o efeito de seus excessos ou carências, e o uso de suplementos alimentares; e foi feito através de um levantamento de literatura no período de janeiro de 2013 a maio de 2015, onde foram pesquisadas as palavras chaves: “vitaminas”, “minerais”, “deficiência de vitaminas”, “deficiência de minerais”, “excesso de vitaminas”, “excesso de minerais”, e “suplementos alimentares”, em diversas bases eletrônicas. De acordo com os relatórios da UNICEF de 2004 e 2009 as deficiências de micronutrientes mais frequentes são as carências das vitamina A, B9 (folato), D, e carência de ferro, zinco e iodo. Essas vitaminas e minerais têm sua funções bioquímicas e fisiológicas descritas nesse trabalho, bem como os sintomas, sinais e patológicas causados por suas carências ou excesso no organismo. As deficiências vitamínicas e minerais tem grande impacto nas economias nacionais pois torna adultos menos produtivos e diminui a capacidade intelectual de adultos e crianças. O uso de suplementos é brevemente descritos, bem como a fortificação alimentar. É importante realçar que um consenso foi realizado em maio de 2008 em Copenhagen, Dinamarca, intitulado de Copenhagen Consensus, que considerou dentre 30 opções a provisão de micronutrientes a pessoas carentes nestes como a melhor opção para investimento em desenvolvimento no mundo. O estudo sobre micronutrientes e a aplicação deste nos sistemas de saúde publicas podem reduzir a incidência de diversas doenças no mundo inteiro, aliviando assim os sistemas de saúde público, prevenindo diversas doenças e patologias evitáveis.
PALAVRAS-CHAVE: Vitaminas, minerais, desnutrição, suplementação alimentar, fortificação alimentar.
ABSTRACT
Data from UNICEF (2009) suggest that over two billion people worldwide suffer from clinical or subclinical deficiencies of vitamins and mineral. About a third of the world's children suffer from vitamin A deficiency and about 130,000 pregnant women die every year from severe iron deficiency. A description of the pathophysiology of the diseases caused by deficiency or excess of vitamins and minerals can lead to a better diagnosis, treatment and quality of life. This work aims to study the physiology and biochemistry of vitamins and minerals, the effect of their excesses or deficiencies, and the use of food supplements; and it was made through a literature review from January 2013 to May 2015, where keywords were researched: "vitamins", "mineral", "vitamin deficiency", "mineral deficiency", "excess of vitamins ", "excess of minerals" and "food supplements" in various electronic databases. According to UNICEF reports of 2004 and 2009 the most common micronutrient deficiencies are the deficiencies of the vitamin A, B9 (folate), D, and deficiency of iron, zinc and iodine. These vitamins and minerals have their biochemical and physiological functions described in this work, as well as the symptoms, signs and pathologies caused by their deficiency or excess in the body. The vitamin and mineral deficiencies have great impact on national economies, makes adults less productive people and diminishes intellectual capacity of adults and children. The use of supplements is briefly described, as well as food fortification. Importantly, a consensus was held in May 2008 in Copenhagen, Denmark, entitled Copenhagen Consensus, which considered among 30 options the provision of micronutrients to people with deficiency as the best option for investment in human development. The study of micronutrients and its application on the public health systems can reduce the incidence of several diseases worldwide, thus relieving the public health system and preventing several diseases.
KEYWORDS: Vitamins, minerals, malnutrition, food supplementation, food fortification.
2. INTRODUÇÃO
De acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) (2009), as vitaminas e minerais são definidos como compostos essenciais para uma boa alimentação e saúde, uma vez que auxiliam o desenvolvimento físico e intelectual. Muitas vitaminas e minerais são classificados como micronutrientes, pois estão presentes no corpo em quantidades muito pequenas, mas são essenciais para o seu bom funcionamento.
As vitaminas e os minerais são de extrema importância para o organismo humano. As vitaminas são no nosso corpo que atuam em diversas reações e cascatas do metabolismo. Os minerais são nutrientes presentes em pequenas e grandes quantidades no organismo e atuam na regulação do metabolismo. Sua falta ou excesso no organismo podem causar diversas doenças (KLIEGMAN et all, 2012, HOLICK, 2009, PETTA et al, 2010)
Em 2009 um relato apresentado pela UNICEF demonstrou que mais de dois bilhões de pessoas no mundo sofrem de deficiência de vitaminas e/ou minerais. Um terço das crianças com menos de cinco anos de idade, em países subdesenvolvidos, têm carência de vitamina A. Estima-se que cerca de 130.000 mulheres grávidas morrem por ano no mundo por deficiência de ferro, representando 1/5 das mortes de mulheres grávidas (UNICEF, 2009).
As causas de deficiência de vitaminas e minerais são múltiplas e estão interconectadas, sendo a principal delas a dieta alimentar. Em diversos lugares do mundo muitas pessoas não se alimentam de quantidades suficientes de carne, ovos, peixe, leite, frutas, legumes e vegetais. O problema se agrava quando o sistema de atenção à saúde e educação são precários e faltam outros cuidados relacionados à saúde (UNICEF, 2009).
Recentemente, houve também um acréscimo da utilização inadequada de suplementos vitamínicos e minerais. Enquanto a desnutrição e a má alimentação podem causar uma falta de vitaminas e minerais no organismo, a utilização inadequada de suplementos pode levar ao seu excesso. Uma descrição da patofisiologia de doenças causadas por carência ou excesso de vitaminas e minerais pode auxiliar no diagnóstico dessas doenças e também ajuda ao profissional da saúde propor um plano terapêutico mais eficaz. O estudo sobre suplementos contendo vitaminas e minerais contribui para que o governo melhore a qualidade de vida de pessoas com deficiências alimentares quando outras ações que garantem o acesso aos alimentos variados forem inviáveis por falta de recursos e estrutura governamental. (MARTIN, KAYATH, 1999, PANIZ et al, 2005, UNICEF, 2009).
Uma dieta de alta qualidade e variada pode resolver a maior parte das carências de vitaminas e minerais. Contudo, em países subdesenvolvidos, melhorar a qualidade da dieta da população é muito complexo. Essas mudanças devem incluir estratégias para melhorar salários, acesso ao alimento, a serviços de saúde e alimentação, mudar os hábitos alimentares, educação e outros. Considerando um avanço em de curto prazo, a qualidade de vida de muitas pessoas pode ser melhorada de forma eficiente, com a utilização de suplementos vitamínicos e minerais (UNICEF, 2009).
3. OBJETIVOS
3.1. OBJETIVO GERAL
Realizar um breve estudo sobre vitaminas e minerais.
3.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Descrever:
-
o papel fisiológico de vitaminas e minerais.
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os efeitos causados pela carência de vitaminas e minerais nos seres humanos.
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os efeitos causados pelo excesso de vitaminas e minerais nos seres humanos.
-
a utilização de suplementos contendo vitaminas e minerais.
4. REVISÃO DA LITERATURA
4.1. Histórico
A ingestão adequada de vitaminas e minerais é importante para a manutenção das diversas funções metabólicas do organismo. Assim, o consumo inadequado desses micronutrientes pode causar estados de carência nutricional, sendo conhecidas diversas manifestações patológicas por ela produzidas (VELÁSQUEZ-MELÉNDEZ et al., 1997).
No século XIX, químicos e fisiologistas, ao estudarem a composição dos alimentos e requerimentos nutricionais pelos organismos humanos e animais, descobriram que esses seres necessitavam de outros nutrientes além de proteínas, lipídeos e carboidratos. Esses estudiosos observaram que os ossos continham grandes concentrações de óxido de cálcio e fosfato e que o organismo humano precisava de uma grande variedade de sais minerais. Naquela época se acreditava que uma dieta normal oferecia ao ser humano cálcio e fosfato em quantidades necessárias para o bom funcionamento do organismo, não havendo necessidade de se preocupar com a ingestão destes nutrientes. (CARPENTER, 2004).
Em 1906, um bioquímico inglês chamado Frederick Gowland Hopkins mostrou que havia nos alimentos fatores acessórios ao metabolismo do organismo humano. O químico polonês Casimir Funk, em 1911, notou que havia um "fator anti-beribéri" (que posteriormente foi caracterizado e denominado de vitamina B6 ou niacinamida) na casca do arroz e este era capaz de melhorar os sintomas da beribéri tanto em animais como em seres humanos . Como a substância foi identificada como uma amina, Funk a denominou de "vital amin" (ou amina vital). Essa terminologia evoluiu para o nome "vitamina", que permanece até os dias atuais para designar essa classe de substâncias (SABBATINI, 2010).
O escorbuto é desencadeado pela deficiência de vitamina C no organismo e se caracteriza por manifestações hemorrágicas (petéquias, equimoses, sangramento das gengivas), edema nas articulações, fadiga, lassidão, tonteiras, anorexia, alterações cutâneas, infecções e morte (MANELA-AZULAY et al, 2003). Crandon, Lund e Dill (1940) citados por Manela-Azulay e cols. (2003), relataram o conhecimento do escorbuto desde 1515 a.C.. Na idade média esta doença se tornou epidêmica no norte e centro da Europa.Um dos exemplos descritos na literatura está relacionado à alimentação dos navegadores à base de comida seca, por 10 a 12 semanas, durante as longas viagens pelo mar. Esses indivíduos desenvolviam, com certa frequência, o escorbuto, porém ao chegarem à terra firme e mudarem a dieta passando a ingerir frutas frescas e folhas verdes, se recuperavam cerca de 10 dias após (CARPENTER, 2004).
Em 1747, um cirurgião escocês chamado James Lind descobriu que um nutriente até então desconhecido (a vitamina C) estava presente em frutas cítricas e ajudava a prevenir o escorbuto. Em 1753, Lind publicou o Treatise on the Scurvy. Nesse tratado havia a recomendação para os marinheiros da Marinha Real Britânica ingerirem limão e limas durante as longas viagens, com o objetivo de prevenir o escorbuto, até então uma doença que acometia frequentemente os marinheiros e que matou milhares deles naquela época (CHALLEM, 1997).
Sabbatini (2010) descreveu que cientistas do século XX, utilizando metodologias da bioquímica e da nutrição experimental, demonstraram que o poder curativo das frutas cítricas, observado em indivíduos com escorbuto, pode ser atribuído à presença de substâncias químicas nessas que não são encontradas em outros alimentos.
Em 1928, o cientista húngaro Albert von Szent-Gyorgyi (1893-1986) descobriu e isolou o fator antiescorbuto em vários alimentos, denominando-o vitamina C. (FIORUCCI, SOARES, CAVALHEIRO, 2002)
4.2. Dados Epidemiológicos
De acordo com o Vitamin & Mineral Deficiency: A Global Progress Report 2009, texto da UNICEF (2009), controlar as deficiências de vitaminas e minerais é uma oportunidade acessível e barata que pode melhorar as vidas de dois bilhões de pessoas e fortalecer a economia, pois indíviduos com carências clínicas e subclínicas de micronutrientes estão mais sujeitos a doenças e infecções, drenando o orçamento destinado à saúde, e são menos produtivos. As deficiências de vitamina A, zinco e ferro estão entre as 10 maiores causas de morte no mundo e uma grande fração da população mundial sofre de carência de vitamina D (UNICEF, 2009, WFP, 2005).
A deficiência da vitamina A leva a morte de um milhão de crianças por ano no mundo. Cerca de 40% dos meninos e meninas em países em desenvolvimento tem seu sistema imunológico comprometido, pois têm deficiência desta vitamina e cerca de 250 milhões destas, em idade pré-escolar, por todo o mundo são deficientes desta vitamina e cerca de 250 a 500 mil crianças ficam cegas todos os anos devido a sua carência. No Brasil, estima-se que 15% das crianças apresentam deficiência subclínica de vitamina A e que 4 mil crianças morram por ano devido a insuficiência desta. A deficiência severa de vitamina A é a principal causa de cegueira evitável em indivíduos de até 17 anos. Formas menos severas de deficiência de vitamina A não apresentam sinais externos, mas “abrem as portas” para diversas outras doenças e infecções. (ONU, 2015, UNICEF, 2004, UNICEF 2009, WFP, 2005).
A deficiência em vitamina A é um problema de saúde pública no Brasil, principalmente nas regiões Norte, Nordeste e Sudeste do país e nos estados de São Paulo, Minas Gerais, e Amazonas, sendo as crianças nordestinas as mais vulneráveis a sofrerem esta carência: entre 16% e 55% das crianças nordestinas sofrem de carência de vitamina A. (MILAGRES, NUNES, PINHEIRO-SANT’ANA, 2007)
Um artigo feito por Milagres, Nunes, Pinheiro-Sant’Ana (2007) compilou diversos estudos acerca da deficiência de vitamina A no Brasil. Um estudo feito com crianças da periferia de Campinas, SP, demonstrou que cerca de 17,6% dessas crianças sofrem carência de vitamina A; um, feito em Ribeirão das Neves, SP, com 103 crianças, mostrou que 21,4% destas sofriam dessa carência. Em Minas Gerais, cerca de 30% das crianças de 6 a 12 anos da zona rural de Novo Cruzeiro apresentam a mesma carência. Uma pesquisa realizada com 253 recém-nascidos no Rio de Janeiro, RJ, constatou que 55,7% destas crianças sofriam de deficiência em vitamina a, e outra, realizado com 175 crianças de idade pré-escolar, revelou que 34,3% destas sofriam da mesma deficiência.
A carência de folato (vitamina B9 ou vitamina M) afeta homens e mulheres em todos os países do mundo. Dados sugerem que 25% das mortes causadas por derrame ou doenças cardíacas, em virtualmente todos os países, estão relacionadas a baixos níveis de folato nestes indivíduos. A deficiência em folato leva ao nascimento de aproximadamente 200 a 250 mil crianças em todo o mundo com defeitos congênitos severos, sendo o principal deles a espinha bífida. No Brasil, cerca de 5250 crianças nascem por ano com defeitos do tudo neural associados à deficiência de folato. Dados da UNICEF (2004) sugerem que se o folato fosse adicionado a toda farinha de trigo consumida mundialmente, o número de casos de espinha bífida cairiam pela metade (UEHARA, ROSA, 2010, UNICEF, 2004). Desde 1998, toda farinha de trigo consumida nos EUA e Canadá devem ser enriquecidas com folato e desde então houve uma redução de 20 a 50% no número de casos de espinha bífida e anencefalia, e, praticamente não há casos de anemia por deficiência de folato. Fortificação da farinha de trigo com folato reduz casos de aborto, anemia, defeitos congênitos e possivelmente reduz casos de doenças cardíacas e derrames. (UNICEF, 2004, ZIMMERMAN, 2011)
A deficiência em vitamina D é considerada uma pandemia, e é muito alta em diversas regiões do mundo, incluindo Europa, América do Norte e Oceania. De acordo com Spiro e Buttriss (2014), 50 a 85% dos europeus possuem deficiência de vitamina D subclínica e clínica. (PRENTINCE, 2008, SPIRO, BUTTRISS, 2014) A deficiência de Vitamina D atinge 70% das meninas iranianas, 80% das meninas sauditas e 32% das meninas libanesas. Baixos níveis de vitamina D são observados em 9-12% dos meninos libaneses. De acordo com El-Rassi, Balik e Fulheihan (2009), da American University of Beirut - Medical Center, os baixos níveis de vitamina D nessas meninas estão relacionados ao seu estilo de roupa. Bandeira e cols. demonstram que, intrigantemente, pessoas que moram em países mais ensolarados estão em maior risco de terem deficiências de vitamina D que pessoas que moram em países onde a exposição ao sol é considerada insuficiente, pois os últimos ingerem mais peixes ricos em vitamina D e alimentos fortificados. Em seus estudos, Bandeira e cols. comparam o Oriente Médio com taxas que variam de 50 a 97% de casos de idosos com deficiência de vitamina D, e Grécia, com 68%, à Noruega, com apenas 18%. No Brasil, embora os casos de raquitismo e malácia (doenças causadas pela falta de vitamina D) sejam raros, há evidências de que grande parte da sociedade sofra de casos de carência subclínica de vitamina D. Um estudo feito em São Paulo, SP, demonstrou que 69% de um grupo de 250 idosos sofriam dessa carência (BANDEIRA et al, 2006, EL-RASSI, BALIK, FULHEIHAN, 2009).
Segundo a Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia (2013), cerca de 85% dos idosos moradores na cidade de São Paulo, cerca de 90% dos idosos institucionalizados e cerca de 50% da população de jovens aparentemente saudáveis da cidade de São Paulo, SP, sofrem e carência clínica ou subclínica de vitamina D. A inclusão da vitamina D3 na lista de medicamentos do SUS foi solicitada pela Sociedade Brasileira de Endocrinologia e Metabologia em 2013.
A deficiência de ferro é a forma mais prevalente de desnutrição no mundo (WFP, 2005), sendo sua prevalência alta em países em desenvolvimento. No Brasil, estima-se que 45% das crianças com menos de 5 anos de idade e que 21% das mulheres com idade entre 15 e 49 anos sejam deficientes em ferro e que cerca de 880 mulheres grávidas morram anualmente por ano devido à essa deficiência (UNICEF, 2004).
A carênica de ferro interfere com o desenvolvimento mental normal de cerca de 60% das crianças idade entre 6 a 24 meses que vivem em países em desenvolvimento. Crianças que nasceram com peso ideal e são amamentadas no peito por mães que não possuem deficiência de ferro, terão ferro em níveis adequados até os seis meses de idade, metade vindo da mãe e metade de estoques de ferro presentes ao nascer, formados durante a gestação. A partir do sexto mês de idade o que é ingerido, além do leite, é crucial e pode determinar o desenvolvimento (ou não) da deficiência de ferro, pois as reservas presentes ao nascer terão se acabado e o leite materno, após o sexto mês, contribui com apenas 50% das necessidades de ferro (QUEIROZ, TORRES, 2000, UNICEF, 2004).
A deficiência de ferro também é muito difundida em adultos e reduz profundamente a energia e produtividade das classes trabalhadoras atingindo 40% da população, atingindo 40% das gestantes nos países em desenvolvimento e causa, também, a morte de 60 mil mulheres grávidas por ano por todo o mundo. Sabe-se também que crianças com insuficiência de ferro possuem um quociente de inteligência de 5 a 7 pontos menores (COZZOLINO, 2007, UNICEF, 2004).
A estimativa global da prevalência da deficiência do zinco é de 31%. A prevalência dessa carência varia de 4 a 7% na América do Norte, em Cuba, na maioria dos países da Europa e em países desenvolvidos da Oceania; de 9 a 26% na maior parte da América Latina, incluindo o Brasil, no Caribe, em alguns países do leste europeu, e países em desenvolvimento da Oceania; 68% na Bolívia, Peru, Haiti, Equador e Guatemala; entre 37 e 62% na África Central e do Sul; entre 35 a 52% no norte da África e países mediterrâneos; entre 34 a 73% em países do sul e sudeste da Ásia (CAULFIELD, BLACK, 2004).
Cerca de 18 milhões de crianças nascem com deficiência mental devido a carência de iodo. Dois terços das produtoras mundiais de sal enriquecem seu sal de cozinha com iodo e 70% dos neonatos de hoje estão protegidos da deficiência de iodo por essa medida. No Brasil, 87% das famílias tem acesso ao sal de cozinha enriquecido com iodo. No Brasil, apenas 5% da população sofre de bócio, porcentagem bastante reduzida se comparado a países como Afeganistão (48%) e Burundi (42%). Apenas 14 países do mundo possuem índices de prevalência de deficiência de iodo acima de 10%. Alguns deles, Afeganistão, Burundi, Índia e Paquistão, possuem índices acima de 20%. Os baixos níveis de deficiência de iodo em relação à vitamina A ou ferro mostram a eficiência da suplementação. Mesmo assim, ainda todo ano, 50 milhões de crianças nascem sem acesso ao sal iodado e aproximadamente 18 milhões dessas crianças sofrerão severa deficiência metal devido à carência de iodo. A deficiência em iodo é a principal causa de retardo mental evitável no mundo hoje (UNICEF, 2004).
4.3. O Papel das Vitaminas no Organismo Humano
Vitaminas são compostos orgânicos que não podem ser sintetizados em quantidades suficientes pelo organismo humano e por isso devem ser adquiridos ou suplementados pela dieta. São de grande importância para o correto funcionamento do corpo humano e homeostasia (CHAMPE, HARVEY, FERRIER, 2006). As vitaminas são requeridas pelo organismo em pequenas quantidades e por isso são chamadas de micronutrientes. Por conveniência, o termo vitamina não inclui os sais minerais, lipídeos essenciais e aminoácidos essenciais. (LIEBERMAN, BRUNING, 1990).
As vitaminas são requeridas para diversas funções celulares. Muitas vitaminas exercem a função de precursores de coenzimas e são importantes para enzimas do metabolismo intermediário (CHAMPE, HARVEY, FERRIER, 2006).
As vitaminas do complexo B podem ser classificadas de acordo com suas funções fisiológicas como liberadoras de energia, hematopoiéticas, ou tendo outras funções. As vitaminas do complexo B liberadoras de energia são a tiamina, a riboflavina, a niacina, o ácido pantotênico, a biotina e a vitamina B6. As com funções hematopoiéticas são o folato, a B12, a B6 e o ácido pantotênico, e as com outras funções que não podem ser classificadas estreitamente são a tiamina, a niacina, o folato, a B12 e a B6 (GROPPER, SMITH, 2012, UNIVERSITY OF MARYLAND, 2014).
A vitamina C possui diversas funções fisiológicas como participação na hidroxilação e síntese de colágeno, de carnitina e de norepinefrina, além de possuir diversas funções antioxidantes. Tem efeitos benéficos contra câncer, doenças cardiovasculares, catarata, colesterol elevado, oxidação lipídica, hipertensão, envelhecimento e outros. A vitamina C é adicionada a diversos alimentos tanto para uplementação alimentar como devido ao seu poder antioxidante, evitando a oxidação dos alimentos (GROPPER, SMITH, 2012, UNIVERSITY OF MARYLAND, 2014).
A vitamina A tem função de regulação do metabolismo e crescimento celular, regulando a expressão de diversos genes no corpo humano e também é essencial para a visão (GROPPER, SMITH, 2012).
A vitamina K é indispensável para a coagulação sanguínea, participando da síntese de diversos fatores da cascata de coagulação. Também participa da formação dos ossos, sendo indispensável à síntese de osteocalcina que por sua vez se mostra necessária para a formação da matriz óssea (GROPPER, SMITH, 2012).
A vitamina D atua como um hormônio no corpo humano e regula o metabolismo do cálcio, fósforo e osso (GROPPER, SMITH, 2012).
A vitamina E é um antioxidante lipossolúvel que mantém a integridade de membranas celulares, indispensável para a saúde do coração, olhos, prevenção de câncer. Possui ainda funções de sinalizador celular e regulação da expressão gênica. (GROPPER, SMITH, 2012, UNIVERSITY OF MARYLAND, 2014).
4.4. O Papel dos Sais Minerais no Organismo Humano
De acordo com Lobo e Tramonte (2004) os minerais são elementos inorgânicos distribuídos por toda a natureza e que, no organismo, desempenham uma variedade relevante de funções.
Apesar de existirem mais de 50 minerais no organismo, somente os minerais cálcio (Ca), fósforo (P), magnésio (Mg), potássio (K), sódio (Na), cloro (Cl), enxofre (S), ferro (Fe), cobalto (Co), cobre (Cu), iodo (I), manganês (Mn), zinco (Zn) e selênio (Se) são essenciais aos processos metabólicos e por isso mesmo devem estar presentes na alimentação. Os minerais Ca, P, Mg, K, Na, Cl e S são denominados macroelementos, pois são necessários em quantidades maiores, como, por exemplo, cerca de 1 kg a 1,5 kg de Ca e cerca de 170 g de S são encontrados no organismo. Os minerais Fe, Co, Cu, I, Mn, Zn e Se são denominados microelementos, oligoelementos ou elementos-traços, porque são necessários em quantidades muito pequenas, encontrados nos fluidos corporais em concentrações de mcg/dL e em concentrações de mg/kg nos tecidos. (MOURA, 1998, TOKARNIA, DÖBEREINER, PEIXOTO, 2000, BURTIS, ASHWOOD, BRUNS, 2008).
Os minerais desempenham três tipos de funções vitais para o organismo dos animais e do homem. A primeira delas diz respeito a sua participação como componentes estruturais dos tecidos corporais tais como o Ca e o P. Também atuam nos tecidos e fluidos corporais como eletrólitos para manutenção do equilíbrio ácido-básico, da pressão osmótica e da permeabilidade das membranas celulares tais como o Ca2+, íons fosfato PO43-, Na+, Cl-. Podem ainda funcionar como catalisadores e ativadores de processos enzimáticos como o Cu e o Mn ou como integrantes da estrutura de metaloenzimas como o Zn e o Mn ou de vitaminas como o Co (TOKARNIA, DÖBEREINER, PEIXOTO, 2000).
Alguns minerais são conhecidos como minerais ultratraços não essenciais, ou seja, estão presentes no organismo, mas não são necessários para a vida. Contudo, esses elementos podem trazer benefícios ao corpo humano. Um exemplo é o flúor, sem função bioquímica essencial à vida identificada, pode trazer benefícios aos dentes e sua deficiência pode levar ao aparecimento de cáries (GROPPER, SMITH, 2012).
5. METODOLOGIA
Foi realizado um levantamento da literatura no período de Janeiro de 2013 a Maio de 2015, a partir do cruzamento de palavras-chave, nas bases de dados eletrônicas do PUBMED, CAPES, SCIENCE DIRECT, SCOPUS e SCIELO, OMS (WHO), UNICEF, NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH e WFP.
As buscas foram feitas por artigos que continham informações sobre vitaminas e minerais, abordando aspectos relacionados ao papel fisiológico e aos efeitos decorrentes da carência e do excesso da ingestão desses nutrientes; vantagens e desvantagens da utilização de suplementos contendo vitaminas e minerais.
As palavras-chave utilizadas foram “vitaminas”, “minerais”, “deficiência de vitaminas”, “deficiência de minerais”, “excesso de vitaminas”, excesso de minerais”, “suplementos alimentares” e respectivos termos em inglês e em espanhol.
Os artigos selecionados podiam ser em português, inglês ou espanhol, porém sem restrições quanto aos países de publicação dos mesmos.
Após a coleta, as informações foram analisadas e comparados para, então, ser elaborado o texto da monografia contendo a discussão sobre os dados encontrados.
6. RESULTADOS E DISCUSSÕES
De acordo com relatórios da UNICEF (2004, 2009) as deficiências de micronutrientes mais frequentes no mundo são as carências da vitamina A, da vitamina B9 (folato), da vitamina D, de ferro, zinco e de iodo. Por estas razões, estes nutrientes são abordados neste trabalho.
6.1. Os micronutrientes e suas funções fisiológicas
6.1.1. Vitamina A
A vitamina A constitui um grupo de compostos orgânicos insaturados, nomeados retinoides, incluindo o retinol, o retinal, o ácido retinoico e diversos ésteres de retinil. É uma vitamina importante para a visão, que se combina com a proteína opsina para formar a rodopsina, molécula necessária para absorção de luz e transdução de sinais em cones e bastonetes. Cones e bastonetes são fotorreceptores especializados, presentes na retina ocular. Os cones são responsáveis pela alta acuidade e percepção de cor pelos olhos, mas pouco sensíveis à luz, enquanto os bastonetes não contribuem para percepção de cor e nem formam imagens definidas, mas são altamente sensíveis à luz.
A vitamina A deve ser adquirida por meio da alimentação e se apresenta disponível nos alimentos em duas formas: como vitamina A pré-formada (retinal, retinol, ácido retinoico e ésteres de retinil) ou como provitamina A. Carotenoides e ésteres de retinil são convertidos a retinol, e então em retinal, para em seguida serem convertidos em ácido retinoico. A provitamina A se apresenta na forma de carotenos, sendo o beta-caroteno o mais importante, mas também existindo outras formas como o alfa-caroteno e a beta-criptoxantina, que são convertidos à vitamina A pelo metabolismo. Alguns carotenoides não são convertidos em vitamina A, como os licopenos. A vitamina A é armazenada no corpo humano na forma de ésteres de retinil (BERNE, LEVY, 2010, INSTITUTE OF MEDICINE, 2001, NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2013, TANUMIHARDJO, 2011).
Alimentos ricos em vitamina A pré-formada são quase que exclusivamente de origem animal: leite materno, bovino e seus derivados, carnes, fígados e óleos de peixe, e gema de ovo. A vitamina A também pode ser adicionada a alimentos processados como cereais, gorduras, óleos, açúcares e outros. Os alimentos ricos em provitamina A, como por exemplo, carotenoides, são em geral vegetais de folha verde como o espinafre; amaranto e diversas outras fontes; vegetais amarelos ou laranjas como abóbora, cenoura e outros; e diversas frutas amarelas ou laranjas, como manga, mamão e outros (ONUAA, OMS, 2001).
De acordo com o National Institutes of Health (2013) o corpo transforma toda fonte de vitamina A ingerida, em retinol. As doses recomendadas diárias são 400 mcg de retinol para neonatos e crianças e 900 mcg de retinol para adultos e idosos.
No intestino, ésteres de retinil são emulsificados pela bile e hidrolisados pela lipase pancreática e pela fosfolipase B presente na borda em escova dos enterócitos. O retinol então é absorvido pelo enterócito e complexado com uma proteína ligante de retinol do tipo 2, sendo reesterificado pela enzima lectina-retinol acetiltransferase. Os ésteres de retinil são então incorporados aos quilomicros junto a outros lipídios e apolipoproteína B, e são lançados na linfa. A absorção da vitamina A é representada pela Figura 1. Após ser absorvida, cerca de 90% da vitamina A é armazenada no fígado, sendo mobilizada gradativamente para atender às necessidades de tecidos periféricos. O transporte de vitamina A dentro do corpo e seu metabolismo é muito complexo, envolvendo diversas proteínas e as diferentes formas da vitamina A, como ésteres de retinil, retinol, retinal, ácido retinoico e seus metabólitos oxidados e conjugados.
FIGURA 1 – Absorção da vitamina A. Fonte: GROPPER, SMITH 2012.
Durante sua digestão, o betacaroteno é clivado pela enzima β-caroteno-15,15’-monooxigenase (BCMO1) formando retinal (CHAGAS, 2003, D’AMBROSIO, CLUGSTON, BLANER, 2011, HARRISON, 2005).
Quando dentro da célula, a vitamina A se liga a proteínas denominadas receptores de ácido retinoico (RAR) e receptores rexinoides (RXR). Forma-se um heterodímero RAR/RXR, que interage com regiões promotoras específicas no DNA. A Figura 2 representa esquematicamente o modo de ação da vitamina A. Assim, ela exerce sua função de influenciar na expressão gênica e diferenciação celular, regulando cerca de 500 genes; está envolvida com funções do sistema imune, funções reprodutivas, desenvolvimento embrionário, comunicação celular, expressão de genes, diferenciação epitelial, dentre outras. (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010, D’AMBROSIO, CLUGSTON, BLANER, 2011).
FIGURA 2 – Mecanismo de ação da vitamina A. Fonte: GROPPER, SMITH, 2012.
Na retina, a vitamina A é armazenada na forma de éster de retinil. Quando necessário, ela é convertida a 11-cis-retinol e então oxidada a 11-cis-retinal. A molécula de 11-cis-retinal então se liga à proteína opsina, formando a rodopsina. A rodopsina é uma aloproteína capaz de absorver luz. Ao absorver luz, o 11-cis-retinal se transforma em 11-trans-retinal, mudando a estrutura da rodopsina, que então ativa uma cascata bioquímica que sinaliza a presença de luz por meio de uma proteína Gi (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010, MENON, HAN, SAKMAR, 2001).
A vitamina A tem suma importância no sistema imune, onde atua facilitando a diferenciação de leucócitos e ativação de linfócitos T, pela proteína RAR. Atuando por meio da proteína RAR e ativação de regiões promotoras do DNA, a vitamina A também tem importante função no crescimento embrionário e diferenciação de tecidos sendo, tanto sua carência quanto seu excesso, capazes de causar defeitos de desenvolvimento (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010).
Embora a vitamina A seja necessária durante toda a vida, sua atividade e necessidade mostram-se acentuadas quando há crescimento acelerado dos tecidos, como no desenvolvimento embrionário e fetal e na infância (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010).
6.1.2. Vitamina B9
O folato, termo genérico para um conjunto de estruturas quimicamente similares, é uma vitamina do complexo B solúvel em água, também conhecida como vitamina B9, vitamina M ou ácido pteroilglutâmico. Está naturalmente presente nos alimentos e também está disponível na forma de suplemento alimentar. Os termos folato e ácido fólico não são intercambiáveis. O ácido fólico se refere à forma sintética e oxidada do folato presente nos suplementos alimentares. Essa é a forma mais estável e não é encontrada naturalmente nos tecidos vivos. No corpo, o ácido fólico precisa ser reduzido in vivo, resultando em dihidrofolato e tetrahidrofolato. Os folatos estão envolvidos em um grande número de vias bioquímicas complexas e essenciais à vida. Atuam como cofator nas vias de síntese de nucleotídeos, timidilato e reações de metilação (NCBI, ca. 2013, BALUZ, CARMO, ROSA, 2002).
O folato é encontrado em grande variedade de alimentos, estando em maior quantidade no fígado bovino, em vegetais de folhas escuras, em ervilhas, em alimentos fortificados e outros. As recomendações alimentares de ingestão diária de folato são de 400 mcg para homens e mulheres e de 600 mcg para grávidas (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2012).
A estrutura básica desta vitamina é formada de três partes e todas devem estar presentes para sua atividade: um grupo pterina ou pteridina, que é um composto heterocíclico constituído por um núcleo de pirazina fundido com um núcleo de pirimidina, conjugados por um grupo metila e um grupo de ácido para-aminobenzoico (PABA), que juntos formam o ácido pteroico. O grupo PABA é ligado a glutamato para formar o folato, que existe na forma monoglutâmica e poliglutâmica (GROPPER, SMITH, 2012). A estrutura do folato é representada pela figura 3.
FIGURA 3 – Estrutura do folato. Fonte: GROPPER, SMITH, 2012
O folato poliglutâmico presente em alimentos deve ser digerido à forma monoglutâmica para ser absorvido. Essa digestão se dá por glutamato carboxipeptidases, presentes nas formas solúveis ou ligadas à borda em escova dos enterócitos. A enzima presente na borda em escova dos enterócitos é dependente de zinco e uma deficiência deste pode levar a uma baixa absorção de B9. O ácido fólico presente em alimentos suplementados ou suplementos alimentares se apresenta na forma monoglutâmica e não precisa ser digerido por essa enzima. Dentro do enterócito, folato e ácido fólico são reduzidos a dihidrofolato e depois a tetrahidrofolato, reações dependentes de nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato (NADPH), cujo principal transportador, no intestino, é o transportador de folato acoplado a próton (PCFT). O transporte intracelular se dá por proteínas ligantes de folato e sua passagam para a corrente sanguínea se dá por meio da membrana basolateral dos enterócitos, pela proteína multidrogas resistente (MRP). O transporte de folato para dentro dos hepatócitos e células de outros tecidos periféricos se dá por proteínas carreadoras de folato reduzido e por PCFT (GROPPER, SMITH, 2012).
A vitamina M funciona como um cofator ou co-substrato nas reações de metilação da síntese de DNA e RNA e do metabolismo de aminoácidos. Importantes reações bioquímicas dependentes de folato incluem a metabolização da homocisteína a metionina, a síntese de S-adenosilmetionina, importante doador de grupos metila, e a metabolização do desoxiuridilato a timidilato (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2012). A S-adenosilmetionina é um doador-chave de grupamento metil envolvido em mais de 100 reações de transferências de grupamento metil, incluindo alterações epigenéticas no DNA (BALUZ, CARMO, ROSA, 2002, CRIDER et al, 2012).
A principal função das coenzimas folato é ganhar e doar radicais metila, formila e hidroximetila em vias metabólicas essenciais. O folato endógeno circula sob a forma de 5-metiltetrahidrofolato e ligado a proteínas de baixa afinidade, principalmente a albumina, responsável por cerca de 50% da ligação dessa vitamina (BALU, CARMO, ROSA, 2002).
O folato participa do metabolismo de diversos aminoácidos, incluindo histidina, serina, glicina e metionina. O último passo no catabolismo de histidina requer folato: o catabolismo da histidina começa com a desaminação do aminoácido para gerar ácido urocânico, que sofre metabolismo adicional até a formação de formiminoglutamato. O grupo formimino é então removido para o folato, formando formiminotetrahidrofolato e glutamato. A enzima hidroximetiltransferase transfere um grupo metil da serina para o tetrahidrofolato, gerando glicina e 5,10-metiltetrahidrofolato, e esta é uma reação reversível. A metionina sintase transfere um grupo metil do 5-metiltetrahidrofolato para a homocisteína, gerando metionina, reação essa que depende de cobalamina (GROPPER, SMITH, 2012, BALUZ, CARMO, ROSA, 2002).
Na síntese de pirimidinas, a timidilato sintase usa 5,10-metiltetrahidrofolato para converter desoxiuridina monofosfato (dUMP) a timidilato (dTMP), formando dihidrofolato. O dTMP é requerido para a síntese de DNA e essa reação de síntese de dTMP limita a velocidade de síntese de DNA. Na síntese de purinas o folato, na sua forma de 10-formiltetrahidrofolato, contribui com grupo formato em duas reações necessárias para a formação do anel purínico presente na adenina e guanina (GROPPER, SMITH, 2012). Os mecanismos de ação do folato são simplificados na Figura 4.
FIGURA 4 – Mecanismos de ação do folato. FONTE: KALTSONOUDIS, PAPAGORAS, DROSOS, 2012
De acordo com Santos e Pereira (2007), o ácido fólico é o mais importante fator de risco para os defeitos do tubo neural. A suplementação de ácido fólico antes da gravidez e durante o primeiro trimestre reduz tanto o risco de ocorrência como o de recorrência de defeitos do tubo neural em cerca de 50 a 70%. Devido à gravidade dessas alterações e sua morbimortalidade, tornam-se muito importantes o aconselhamento genético, a suplementação dietética com ácido fólico e o diagnóstico pré-natal das malformações do tubo neural. Santos e Pereira (2007) também afirmam que o ácido fólico exerce um papel fundamental no processo da multiplicação celular, sendo, portanto, imprescindível durante a gravidez. Funções do folato incluem aumento dos eritócitos, o alargamento do útero e o crescimento da placenta e do feto.
O folato é co-fator importante na metilação do DNA e síntese de bases nitrogenadas deste, sendo bons marcadores de sua presença, sua concentração séria e hemática em níveis fisiológicos convencionais. A metilação da base de DNA é dependente de S-adenosilmetionina e quando este for deficiente pela falta de folato, pode bloquear a expressão genética (BALUZ, CARMO, ROSA, 2002).
6.1.3. Vitamina D
O termo vitamina D se refere aos compostos secosteroides que podem ser divididos em dois grupos: D2, ergocalciferol, de origem micótica e vegetal e D3, colecalciferol, de origem animal. A vitamina D é sintetizada na pele dos seres humanos e apenas pequenas quantidades são normalmente provenientes da dieta, razão pela qual não é considerada uma vitamina verdadeira, e sim um preprohormônio esteroide (GONÇALVES, 2014). Por isso a vitamina D proveniente da alimentação, em geral, não é suficiente para satisfazer a necessidade dos seres humanos, os quais devem se expor ao sol para a síntese de quantidades adequadas; por ser lipossolúvel, é armazenada no tecido adiposo (HOLICK, 2004). As vitaminas D2 e D3 são equipotentes e no corpo humano são metabolizadas igualmente (BERNE, LEVY, 2010).
Poucos são os alimentos ricos em vitamina D, dentre eles estão cogumelos, peixes como salmão, cavala, sardinha, enguia, arenque e atum, óleos de fígado de peixes, gema do ovo. Alguns alimentos, como leite e sucos industrializados, podem ser suplementados com vitamina D (BUENO, CZEPIELEWSKI, 2008, HOLICK, 2004).
A dose recomendada de vitamina D diária é de 5 mcg para todos os grupos etários, sendo que possa se recomendar que os idosos ingiram de 10 a 15 mcg/dia (BUENO, CZEPIELEWSKI, 2008).
A síntese de vitamina D3 nos seres humanos ocorre na pele, onde radiações ultravioletas convertem a provitamina D3, também conhecida como 7-desidrocolesterol, em pré-vitamina D3, conhecida como 9,10-secosterol, por uma reação de fotólise (GONÇALVES, 2014). A pré-vitamina D3 se isomeriza em vitamina D3 ao absorver calor (HOLICK, 2004). A síntese de 7-desidrocolesterol ocorre em altas quantidades na pele da maioria dos vertebrados a partir do colesterol (HOLICK, 2004).
A vitamina D é hidroxilada pela enzima D-25-hidroxilase no fígado para formar a 25-hidroxivitamina D, cujo acrônimo é 25(OH)D. Essa é a principal forma de vitamina D circulante no corpo. Nos rins e endotélio a 25(OH)D é novamente hidroxilada pela enzima CYP27B1 e forma-se 1,25-dihidroxivitamina D, abreviada por 1,25(OH)D, que é a sua forma ativa (CABRAL, GRUEZO, 2010, GONÇALVES, 2014).
A produção de 1,25-dihidroxivitamina D [1,25(OH)2D] é regulada por mecanismos de feedback negativo, onde a própria 1,25(OH)2D inibe sua formação. Baixos níveis de Ca2+ circulantes estimulam, indiretamente, os níveis de 1,25(OH)2D, pelo aumento dos níveis de paratormônio. Níveis elevados de Ca2+ inibem diretamente a formação de 1,25(OH)D, ao inibir a síntese de D-25-hidroxilase pela proteína sensível ao Ca2+ (CaSR) no túbulo proximal (BERNE, LEVY, 2010).
A vitamina D é um pré-hormônio e seu derivado na forma mais ativa, o 1,25(OH)2D, tem função hormonal e suma importância no metabolismo do cálcio e fósforo. Participa na reabsorção óssea, absorção de cálcio e fósforo no lúmen intestinal e reabsorção de cálcio filtrado nos rins. Seu efeito final é o aumento dos níveis de cálcio e fósforo plasmático (BERNE, LEVY, 2010, CABRAL, GRUEZO, 2010).
Nos enterócitos do duodeno a vitamina D estimula a absorção ativa de cálcio pelo estímulo à expressão de proteínas responsáveis pela captação do cálcio pelos enterócitos. Essas proteínas são chamadas de canais de cálcio de potencial receptor transiente (TRPV) das subfamílias 5 e 6 e de proteínas responsáveis pelo transporte intracelular de cálcio, calbidina, e de canais de cálcio ATP-dependentes responsáveis pela extrusão de cálcio da célula para o líquido extracelular. Nos enterócitos do jejuno a vitamina D estimula a absorção passiva de cálcio ao estimular a expressão de paracelinas, um canal de cálcio dependente de gradiente de concentração (CASTRO, 2011).
No metabolismo do fosfato, a vitamina D envolve uma complexa corregulação da expressão do FGF-23 e da proteína cotransportadora de sódio e fosfato tipo 2b, presentes na borda em escova dos enterócitos. Essa proteína cotransportadora promove a absorção de fosfato (CASTRO, 2011).
O 1,25(OH)2D exerce sua ação ao interagir com o receptor de vitamina D, cujo acrônimo é VDR. Este é um receptor nuclear que forma um complexo transcricional hormônio-receptor que ao se ligar à vitamina age como um fator de transcrição, ativando a transcrição de vários genes, em diferentes órgãos e células (BERNE, LEVY, 2010, MOORE et al, 2006). Esse complexo hormônio-receptor se dimeriza com o RXR e esse heterodímero se acopla a uma sequência específica do DNA nos seus genes-alvos, denominada elementos resposta da vitamina D. O dímero então acoplado ao seus elementos leva a resposta de vários complexos de protéinas regulatórias que são capazes de ativar ou inibir a expressão gênica (CASTRO, 2011).
A vitamina D também exerce um papel na regulação da proliferação, diferenciação e função celular, tendo ações moduladoras pleiotrópicas e também tem ação essencial para o processo de mineralização dos ossos (BUENO, CZEPIELEWSKI, 2008, CABRAL, GRUEZO, 2010).
A vitamina D tem papel autócrino no sistema imune e regula o metabolismo de CD4+, CD8+, linfócitos T e células apresentadoras de antígenos. O calcitriol participa da regulação e da diferenciação das células precursoras em células mais especializadas do sistema monocítico-macrofágico e estimula a expressão dos genes que codificam antimicrobianos sintetizados pelas células do sistema imune de mamíferos. Atua regulando a autoimunidade e o balanço das respostas de linfócitos Th1 e Th2 (Figura 5) (CASTRO, 2011).
FIGURA 5 – Vitamina D e sistema imune. FONTE: ARANOW, 2011
A vitamina D participa dos processos de parada do ciclo em G0/G1, diferenciação, multiplicação e apoptose celular em células de todo organismo. Nos ovários e testículos, estimula a esteroidogênese. No coração, ela atua no controle da função cardíaca e da pressão arterial ao regular o crescimento de cardiomiócitos e seu grau de contratilidade. A vitamina D estimula o crescimento de rabidomiócitos, aumentando tônus e força muscular e no cérebro, estimula o crescimento e desenvolvimento neural (CASTRO, 2011).
A 25(OH)D tem papel importante na tolerância à glicose. Ela estimula tanto a secreção de insulina, como aumenta a sensibilidade dos receptores de insulina. Vários estudos demonstram que a obesidade se associa a seus baixos níveis que possivelmente seria sequestrada pelo tecido adiposo (CABRAL, GRUEZO, 2010).
A vitamina D é essencial para o crescimento, sendo seu suprimento e de cáldio adequado de cálcio e vitamina D é importante para o desenvolvimento ósseo. Se uma criança está apta a alcançar seu potencial genético de crescimento e pico de massa óssea, a sua dieta deve ter quantidade suficiente destes nutrientes (BUENO, CZEPIELEWSKI, 2008). Os estudos bioquímicos e moleculares acerca da vitamina D tem provido fortes evidências de sua magnitude e da sua ampla abrangência na modulação de processos celulares, essenciais à homeostase sistêmica (CASTRO, 2011).
6.1.4. Ferro
O ferro, metal de símbolo Fe, é um dos micronutrientes mais bem estudados e melhor descritos na literatura e desempenha importantes funções no metabolismo humano. É um componente essencial da hemoglobina, importante para o transporte de oxigênio para os tecidos do corpo, e de diversas outras proteínas e enzimas. No corpo humano, existe nas formas Fe+2 e Fe+3. Há quatro classes principais de proteínas que contêm ferro em mamíferos: proteínas heme que contêm ferro (hemoglobinas, mioglobinas, citocromos), enzimas de ferro-enxofre (flavoproteínas e hemeflavoproteínas), proteínas para transporte e estocagem de ferro (transferrina, ferritina e hemosiderina) e outras proteínas e enzimas que contêm ferro (INSTITUTE OF MEDICINE, 2001, LATUNDE-DADA, SIMPSON, MCKIE, 2008).
O corpo humano possui cerca de 38 mg/kg de ferro para mulheres e 50mg/kg para homens, estando 65% contido na hemoglobina e 10% contido na mioglobina. Cerca de 1 a 5% é mantido por outras enzimas e o restante é estocado no sangue pelas proteínas de estocagem de ferro (GROPPER, SMITH, 2012).
As indicações para a ingestão diária de ferro estão representadas na Tabela a seguir:
TABELA 1: Ingestão de ferro diária recomendada de acordo com faixa etária. FONTE: BORTOLINI, FISBERG, 2010
Fontes alimentares podem conter dois tipos de ferro: heme ou não heme. O ferro heme pode ser encontrado em carne de boi, frango ou porco, peixe, fígado de boi e de galinha, e o não heme, em ovos e feijão. Outros alimentos ricos em ferro incluem abóboras, lentilhas, espinafre, tomate e diversos alimentos fortificados (BORTOLINI, FISBERG, 2010, CDC, 2011).
O ferro proveniente da dieta pode estar em duas formas, livre ou associado a heme. O ferro heme, cuja estrutura é elucidada na parte A da Figura 6, deve ser hidrolisado da hemoglobina ou mioglobina antes de sua absorção. Essa hidrólise se dá por proteinases do estômago e intestino, onde o ferro heme é liberado da porção globina dessas proteínas, sendo solúvel e prontamente absorvido de forma intacta pela proteína transportadora de heme (hcp1) que é encontrada primariamente no duodeno. Dentro do enterócito o anel porfirina do grupo heme é hidrolisado pela heme oxigenase, liberando íon ferro que é então armazenado pela ferritina e pode ser excretado do enterócito de acordo com as necessidades dos tecidos. O ferro não heme é tipicamente ligado a outros componentes dos alimentos e deve ser liberado enzimaticamente por secreções estomacais para ser absorvido. No ambiente ácido do estômago, a maior parte do Fe3+ é convertido a Fe2+, que é solúvel tanto nesse meio ácido, como no ambiente alcalino do intestino. Contudo no intestino o Fe2+ pode ser convertido a hidróxido de ferro [Fe(OH)2] que é insolúvel e tende a se precipitar e não é absorvido. Alternativamente Fe3+ pode ser convertido a Fe2+ pela enzima citocromo-b-redutase 1 e pela vitamina C no intestino. A quantidade de ferro absorvida é regulada pela necessidade do organismo e de 1 a 2 mg deste é absorvido por dia e o principal transportador de Fe2+ é o transportador de cátion divalente (DMT1) presente na borda dos enterócitos, que também transporta outros íons como o zinco, manganês e cobre como mostrado na parte B da Figura 6 (GROPPER, SMITH, 2012, GROTTO, 2008). Para ser secretado do enterócito, o ferro é transferido da ferritina para a ferroportina, processo dependente de cobre, e é então secretado. A expressão de mRNAs de ferroportina está aumentada nos casos de deficiência de ferro e hipóxia. Fatores que favorecem a absorção intestinal são a acidez e a presença de agentes solubilizantes, como açúcares (GROPPER, SMITH, 2012, GROTTO, 2008).
FIGURA 6 – A: Grupo heme. B: Absorção do ferro. FONTE: GROTTO, 2008, GROPPER, SMITH, 2012
A regulação da absorção de ferro se dá por uma proteína chamada hepcidina que é liberada pelo fígado por um processo de feedback. A hepcidina se liga a ferroportina presente na superfície dos enterócitos, causando sua internalização e destruição. Dessa forma o ferro não pode ser transportado ao sangue e se acumula dentro do enterócito. Quando as concentrações de ferro são baixas no corpo, a secreção de hepcidina diminui, ferroportina deixa de ser internalizada e degradada e o ferro pode ser transportado ao sangue, onde é transportado pela transferrina. A captação celular de ferro se dá por receptores ligantes de transferrinas, que interagem com a transferrina ligada ao ferro e a endocitam: inicia-se um processo onde uma bomba de prótons reduz o pH dentro do endossomo e o ferro é liberado e transportado ao citoplasma da célula, e a transferrina, na sua forma de apoproteína, retorna à superfície da célula e ao plasma. A quantidade de receptores ligantes de transferrina na superfície das células é regulada pela quantidade de ferro no interior da célula (GROPPER, SMITH, 2012, GROTTO, 2008).
A fagocitose e degradação de hemácias senescentes representam uma fonte importante de ferro de aproximadamente 25 a 30 mg por dia, que é reciclado e é suficiente para manter a necessidade diária de ferro para a eritropoiese (BRUNE et al, 1986, GROTTO, 2008).
Esse elemento pode ser estocado no organismo nas células do fígado, baço e medula óssea na forma de ferritina ou homossiderina. A ferritina consiste de uma apoproteína, a apoferritina, ligada ao ferro e a homossiderina corresponde a uma forma degradada da ferritina. A perda de ferro ocorre principalmente por hemorragias, menstruação, suor, excreção renal e descamação epitelial (BRUNE et al, 1986, GROTTO, 2008).
Um estudo feito por Fisberg e cols. (2008) descreve funções fisiológicas do ferro no organismo reconhecidas pelo Comitê de Cientistas Líderes e pelo Conselho do Joint Health Claims Initiative (JHCI): transporte de oxigênio e formação de sangue, participação na produção de ATP e GTP, metabolização de xenobióticos, formação de sistema imune e desenvolvimento neurológico de embriões (FISBERG et al, 2008). Sobressai-se como um elemento envolvido em vários processos metabólicos do organismo, incluindo a síntese de DNA e metabolismo energético. Participa também na neutralização de radicais livres e desintoxicação do corpo de diversos xenobióticos (FISBERG et al, 2008).
O ferro é um componente presente em várias enzimas e proteínas, incluindo a hemoglobina, sendo esta de grande importância para o transporte de oxigênio para os tecidos e o retorno do dióxido de carbono (CO2) para os pulmões. Na hemoglobina, uma proteína conjugada, o ferro está na forma heme (FISBERG et al, 2008). Cada grupo heme está ligado a quatro cadeias polipeptídicas, que formam a molécula de hemoglobina. O heme é responsável pela cor característica e pela capacidade transportadora de oxigênio e dióxido de carbono no sangue. O oxigênio se conjuga ao grupo heme da hemoglobina nos capilares sanguíneos pulmonares e forma a oxihemoglobina, que é transportada aos tecidos para a liberação de oxigênio que atua em diferentes processos oxidativos do metabolismo celular. O ferro também auxilia músculos a produzirem energia, sendo componente da mioglobina que armazena oxigênio nos músculos (FISBERG et al, 2008, GROTTO, 2008).
O ferro é componente das enzimas desidrogenases e citocromos oxidases da cadeia oxidativa. Os citocromos presentes na mitocôndria das células funcionam como componentes da cadeia respiratória e atuam na transferência de elétrons e energia através de oxidação e redução alternadas de ferro. Uma deficiência de ferro pode levar a uma redução na produção de energia nos músculos, independente de anemia, devido a uma redução na atividade dos citocromos (FISBERG et al, 2008, RAMOS, S. C.; MAGNONI, D.; CUKIERO, ca. 2005). O ferro também é constituinte das enzimas citocromos hepáticas (CYPs) e participa no metabolismo de compostos endógenos e xenobióticos. Todas as enzimas citocromos P450 possuem um ferro heme em seu sítio ativo (FISBERG et al, 2008).
A mitocôndria é essencial para o metabolismo de ferro e é o único local onde ocorre síntese de heme. No eritoblasto, o ferro entra na célula pelo receptor de transferrina e é transportado à matriz mitocondrial pela mitoferrina. Na matriz mitocondrial, uma proteína, a fatraxina, transporta o ferro ao local de síntese do heme. O heme é transportado ao citoplasma da célula por um transportador de membrana conhecido por ABCB7 (GROTTO, 2008).
Nos citocromos o ferro está presente na forma de Fe3+. O Fe3+ recebe um elétron e passa para seu estado reduzido Fe2+. O Fe2+ passa seu elétron para um próximo íon ferro, volta ao seu estado original e reduz o ferro da citocromo oxidase seguinte. Proteínas contendo ferro não heme que participam da cadeia transportadora de elétrons incluem a NADH desidrogenase, succinato desidrogenase (GROTTO, 2008). Diversas outras proteínas do corpo humano também são dependentes de ferro incluindo muitas monooxigenases, dioxigenases, oxidoredutases e peroxidases (FISBERG et al, 2008).
Numerosas proteínas contendo o ferro como cofator estão envolvidas com a replicação e reparo do DNA. Essas proteínas incluem as três DNA polimerases (Pol α, Pol δ and Pol ε), as DNA helicases, as DNA primases e as enzimas ribonucleotídeo redutases. Para se iniciar a replicação do DNA, primers devem ser inseridos ao DNA e esta ação é executada pela DNA primase. As DNA polimerases são responsáveis pela polimerização da nova fita de DNA no sentido 5'- 3', utilizando um DNA molde e desoxiriboses. A DNA polimerase também possui função de reparo, por isso atua tanto na replicação quanto no reparo do DNA. A DNA helicase tem função de abrir a fita de DNA para que reparo ou sua replicação sejam possíveis. As ribonucleotídeo redutases têm a função de formar desoxirribonucleotídeos a partir de ribonucleotídeos. Uma disrupção da homeostase do ferro leva a um impedimento da atividade dessas enzimas e deficiência na replicação ou reparo de DNA (ZHANG, 2014).
6.1.5. Zinco
O zinco é um metal, sólido a temperatura ambiente, de símbolo químico Zn e, em muitos aspectos, muito similar ao magnésio. É praticamente insolúvel em água e álcool, mas relativamente solúvel em soluções ácidas. É encontrado em altas concentrações no músculo, fígado e cérebro de mamíferos. Está naturalmente presente em diversos alimentos e disponível em suplementos alimentares (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2013, PERSON, FÉRES, 2005).
O corpo humano possui cerca de 1,3 a 3,0 g de zinco (GROPPER, SMITH, 2012). É um microelemento mineral com papel estrutural no organismo, principalmente na síntese de proteínas dos músculos e outros órgãos, desenvolvimento embrionário e reprodução (EMBRAPA, 2001). Está envolvido em numerosos aspectos do metabolismo, tendo funções metabólicas, estruturais, catalíticas e regulatórias. É cofator de mais de 300 enzimas. Tem papel importante na defesa do organismo, na síntese de proteínas, na cicatrização, síntese de DNA e divisão celular. Participa também de processos sensoriais da gustação e do olfato (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2013, PERSON, FÉRES, 2005).
O zinco está normalmente presente nos alimentos, complexado a proteínas e ácidos nucleicos. Excelentes fontes desse elemento incluem carnes bovinas e frutos do mar, em especial ostras e moluscos, além de carne de frango, porco e derivados do leite. Em indivíduos onívoros, carnes representam 70% da ingestão diária de zinco e em indivíduos vegetarianos, importantes fontes alimentares incluem grãos e cereais, folhas verdes escuras e raízes não sendo muito encontrado nas frutas (GROPPER, SMITH, 2012).
A tabela a seguir indica as ingestões diárias de zinco, de acordo com idade e sexo:
TABELA 2: Ingestão de zinco de acordo com faixa etária e sexo. FONTE: NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH (2013)
O zinco está presente em pequenas concentrações nos alimentos em relação a outros nutrientes que compõem as dietas das diversas espécies animais, no entanto, isto não significa que sua importância seja diminuta e isso é justificado por suas inúmeras ações no metabolismo humano. Uma ingestão diária de zinco é requerida para funcionamento normal e saudável do organismo (AZEVEDO, 2005, NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2013).
Em todo o intestina há proteínas capazes de absorver o zinco. Sua absorção ocorre principalmente nas porções iniciais do intestino delgado: duodeno e jejuno, pela borda em escova dos enterócitos, por proteínas carreadoras do tipo ZIP4 e regulada por feedback. Uma alta absorção de zinco leva a uma degradação das proteínas carreadoras do tipo ZIP4, enquanto que uma baixa absorção aumenta os níveis de mRNA para essa proteína. O zinco também é absorvido em baixas quantidades no intestino pela proteína transportadora de metal divalente (DMT1). Pode também se ligar aos aminoácidos histidina e cisteína e ser transportado para dentro do enterócito pelos transportadores de aminoácidos e por dipeptídeos. Além de ser absorvido por proteínas carreadoras, pode ser absorvido para o meio paracelular, se difundindo pelas junções oclusivas entre os enterócitos e caindo na corrente sanguínea (GROPPER, SMITH, 2012).
O zinco é um componente estrutural essencial para a ação de diversas metaloproteínas, incluindo a superoxido-dismutase, anidrase carbônica, alcool-desidrogenase, carboxipeptidase, fosfatase alcalina, DNA e RNA polimerases (AZEVEDO, 2005).
De acordo com o Institute of Medicine, mencionado por Nogueira, Parente e Cozzolino (2013), o zinco desempenha importante função na manutenção da integridade estrutural e na regulação da expressão gênica.
Seu papel imunológico e, principalmente sua capacidade de reduzir infecções, vem sendo estudado. Ele participa da proliferação das células do sistema imune, tanto específicas como inespecíficas e tem papel essencial na transcrição, tradução e multiplicação do DNA nestas células. O zinco e o cobre também tem papel estrutural e catalítico na enzima superóxido desmutase (MACÊDO et al, 2010).
O zinco apresenta diversas outras funções e está envolvido no metabolismo da vitamina A, espermatogênese, função celular adequada, neurotransmissão, estoque e liberação de insulina, tem função oxidante ao inibir a propagação de radicais livres e está presente nas membranas biológicas com a função de estabilizá-las. Acredita-se que possa modular os receptores NMDA e GABA, inibindo-os, e potencializar os receptores AMPA e a liberação de GABA (PERSON, FÉRES, 2005).
Acredita-se que o zinco pode diminuir o zumbido em pacientes que apresentam essa patologia por reduzir os níveis de radicais livres na linfa auditiva. Alguns autores descrevem que o zinco como parte estrutural e catalítica importante da enzima Na-K-ATPase, que está expressa e bem ativa na cóclea auditiva. Uma deficiência na atuação dessa enzima pode alterar o potencial endococlear (PERSON, FÉRES, 2005).
6.1.6. Iodo
O iodo é um micronutriente vital a todos os estágios da vida, crucial para o bem estar de todos os seres humanos. É um elemento traço e cerca de 5 g é o suficiente para satisfazer todas as necessidades de iodo do corpo por 70 anos. É crítico para a vida fetal e infância. A dieta é a única fonte de iodo e os níveis de iodo nos alimentos dependem dos níveis de iodo na água e solo onde estes alimentos cresceram. O iodo é metabolizado no corpo humano em uma série de locais e estágios envolvendo hipotálamo, pituitária, tireoide e sangue. O corpo de um indivíduo sadio possui cerca de 20 mg de iodo, dos quais 80% estão na tireoide (AHAD, GANIE, 2010).
A ingestão diária de iodo recomendada para adultos é de 150 mcg, dos quais 120 mcg são captados pela tireoide, e de 200 mcg para gestantes e mulheres em lactação. A OMS e UNICEF recomendam que mulheres grávidas ingiram 250 mcg de iodo por dia (AHAD, GANIE, 2010, NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2011). Alimentos ricos em iodo incluem plantas marinhas, em especial algas pardas, wakame, nori e kombu, frutos do mar, ovos e alimentos fortificados. Sua quantidade em frutas e vegetais depende da composição do solo: em solos ricos em iodo crescem frutas e vegetais ricos nesse elemento. Mais de 70 países do mundo possuem programas de iodização do sal de cozinha, estando o Brasil incluído nesta lista desde 1953 (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2011, PONTES et al, 2009).
Esse nutriente na dieta pode estar livre, ligado a proteínas, presente na tiroxina (T4) e triiodotironina (T3), na forma de iodeto (I-) ou iodato (IO3-). Pode estar ligado a proteínas e é liberado pela sua digestão e o iodato é convertido a iodeto pela glutationa no trato gastrointestinal. O iodeto é rapidamente absorvido no estômago. O iodo ligado a aminoácidos que escaparam do processo de digestão é absorvido no intestino por transportadores de aminoácidos. A T3 e a T4 são absorvidas sem sofrerem qualquer processo de digestão. Após a absorção, o iodo pode circular no plasma livremente ou ligado a proteínas. A tireoide aprisiona a maior parte do desse elemento quando absorvido. Apresenta em sua superfície um cotransportador de sódio e iodo (NIS) em sua membrana basolateral, dependente de bomba de sódio e potássio (AHAD, GANIE, 2010, GROPPER, SMITH, 2012). Nos rins não há modos de conservação desse elemento e sempre que filtrado, ele é excretado. Se sua ingestão for adequada, sua presença na urina deve exceder 100 mcg/L. Já nas fezes, sua presença é baixa e não excede 42 mcg/dia (GROPPER, SMITH, 2012).
A principal função fisiológica do iodo está na síntese do hormônio T3 e do pro-hormônio T4, conhecidos como iodotironinas, pela tireoide. Contanto que a ingestão diária de iodo seja superior a 50mcg, a produção diária destes hormônios será suficiente. A tiroide é uma glândula composta de múltiplos folículos de forma esférica, cercados por uma simples camada de células foliculares. Os folículos são preenchidos por um material proteináceo chamado coloide (GROPPER, SMITH, 2012).
O fator regulador mais importante da função da tireoide é o hormônio estimulante da tireoide (TSH), que é produzido e liberado pela adenohipófise em resposta ao hormônio liberador de tireotrofinas, liberado pelo hipotálamo, e sua regulação se dá pelo feedback negativo por T3 e T4. O TSH estimula a liberação de iodotironinas, a captação de iodo e expressão de NIS na superfície das células foliculares da tireoide, absorção do coloide das glândulas foliculares da tireoide (Figura 7) e a síntese de T3 e T4 (BERNE, LEVY, 2010).
FIGURA 7 – Antes (A) e depois (B) da estimulação da tireoide pelo TSH. FONTE: BERNE, LEVY, 2010
Uma vez dentro da célula folicular da tireoide, o iodeto (I-) é oxidado a iodo (I) e este é ligado na posição 3 de um resíduo de tirosina de uma glicoproteína chamada tiroglobulina, formando a tiroglobulina-3-monoiodotirosina (MIT). O MIT é iodado novamente na posição 5, dando origem à tiroglobulina-3,5-diiodotirosina (DIT). No coloide, duas moléculas de DIT se condensam, formando T4, ou uma molécula de MIT pode se condensar com uma molécula de DIT formando T3. O coloide contendo T3 e T4 é endocitado pela célula folicular e depois estes são liberados na corrente sanguínea por difusão (AHAD, GANIE, 2010).
Cerca de 99% de T3 e T4 circulam na corrente sanguínea ligadas a proteínas ligantes de tiroxinas, pré-albumina ligantes de tiroxinas ou albuminas ligantes de tiroxinas. As T3 e T4 livres são biologicamente ativas e 80% de T3 circulante deriva de T4 por um processo de desiodação (AHAD, GANIE, 2010).
A T3 age, virtualmente, em todas as células do corpo. No sistema cardiovascular, aumenta o débito cardíaco, tendo efeitos inotrópicos e cronotrópicos positivos, aumenta a pressão sistólica e diminui a pressão diastólica. A triiodotironina (T3) age nas arteríolas, causando seu relaxamento e diminuindo a resistência vascular periférica. Nos cardiomiócitos, diminui a expressão do transportador de sódio e cálcio e aumenta a expressão do canal de cálcio rianodina, aumentando assim os níveis de cálcio intracelular durante a contração. Também estimula a expressão da Ca2+ ATPase do retículo sarcoplasmático, facilitando assim a captura de cálcio durante o relaxamento dos cardiomiócitos. A T3 também tem a função de aumentar o uso basal de oxigênio, a produção de calor e o turnover das proteínas. No sistema respiratório, há um aumento do nível basal da taxa respiratória, ventilação por minuto e resposta respiratória. É essencial para crescimento dos tecidos e diferenciação celular e se mostra fundamental para a vida fetal. A triiodotironina (T3) aumenta a responsividade das células a catecolaminas, participa da ossificação, desenvolvimento do sistema nervoso central e outras funções (BERNE, LEVY, 2010).
Tanto a T3 como a T4 interagem com um grupo de receptores intracelulares denominado Receptor do Hormônio da Tireoide (TR). O TR pertence à família de receptores de hormônios nucleares de fatores de transcrição. As iodotironinas entram nas células por transporte ativo mediado por transportadores (BERNE, LEVY, 2010).
6.2. Deficiência de Micronutrientes
Diariamente, as deficiências vitamínicas e minerais apresentam impacto nas economias nacionais. Adultos com deficiência de ferro têm sua energia e produtividade drasticamente reduzidas. Deficiências de ferro e iodo também causam diminuição do quociente de inteligência e isso leva a economia a cambalear. Mães, cujos filhos estão doentes devido a carências de vitaminas e minerais, tendem a faltar de seus serviços. Adultos com energia e intelectualidade reduzidas por carências, em geral, contribuem menos para sociedade (UNICEF, 2009).
De acordo com Hill e cols. (2005), a suplementação da alimentação e consequente diminuição das carências vitamínicas e minerais, leva a uma diminuição da mortalidade e morbidade infantil, maternal e da classe trabalhadora, a um aumento da capacidade intelectual destes, que por sua vez, leva a um aumento na atividade física, produtividade e educação e isso alivia as economias nacionais. Dessa forma os autores demonstraram que há uma necessidade urgente de salientar os reais custos que essas deficiências causam às economias e resolvê-las. Governos gastam uma imensidão de recursos para tratar diversas doenças que poderiam ser evitadas se houvesse investimento adequado em suplementação de vitaminas e minerais. A relação custo-benefício da suplementação demostra a efetividade desta. Carências de vitaminas e minerais também tem um impacto no bem estar social da população e deve-se levar em consideração o direito humano de receber uma nutrição adequada: os governos devem combater agressivamente essas deficiências.
De acordo com o Banco Mundial (World Bank) (1994), mencionado por Hill e cols. (2005), as deficiências vitamínicas e minerais custavam aos governos cerca de 5% de seus produtos nacionais brutos, ao passo que tratar essas deficiências custaria cerca de 0,3%. A deficiência do ferro sozinha levava a perda de cerca de 2% dos produtos nacionais brutos dos países mais afetados. Deficiência de iodo levava ao nascimento de mais de 20 milhões de crianças com problemas mentais e com quociente de inteligência de 10 a 15 pontos abaixo da média, o que afetava desempenho escolar, produtividade e resulta num enorme peso econômico para as nações. Deficiência em vitamina A abre a porta para diversas infecções, cegueiras evitáveis e altos índices de mortalidade e era um problema de saúde pública caro. Deficiência de zinco causava altos índices de diarreia, doenças respiratórias e mortalidade. Deficiência de folato leva a anemias, anormalidades congênitas e problemas cardiovasculares.
A assistência profissional a pessoas com essas deficiências é cara, e quando governos não pagam essas despesas, cidadãos têm de pagar. Quando essa assistência não é paga pelo governo e nem pode ser paga pela família, alguns membros da família se dedicam a cuidar da pessoa incapacitada por essas deficiências, muitas vezes deixando de ir para escola ou trabalho. Doenças em crianças podem gerar custos elevados a famílias, em termos de tratamento e tempo gasto para se cuidado. O tempo e recursos gastos no diagnóstico e tratamento de crianças que não são capazes de evitar infecções e doenças devido a essas deficiências de vitaminas e minerais é também muito significativo (UNICEF, 2009).
6.2.1. Carência de Vitamina A
A carência de vitamina A era, em 2009, problema de saúde pública em metade dos países do mundo (UNICEF, 2009). De acordo com PAIVA e cols. (2006) os grupos de risco para carência de vitamina A são crianças de 5 meses a 6 anos, principalmente na presença de morbidades e outras carências nutricionais. Essa deficiência abala o sistema imune de cerca de 40% das crianças menores de cinco anos em países em desenvolvimento, resultando na morte de cerca de um milhão delas a cada ano.
A carência de vitamina A pode ser decorrente de uma ingestão de quantidades insuficientes, de uma absorção diminuída ou de um aumento na excreção dessa vitamina (STEPHENSEN, 2001).
Um dos efeitos provocados pela carência de vitamina A de maior incidência e de ocorrência precoce é a cegueira noturna. A deficiência desta vitamina leva a uma notável baixa nos níveis de 11-cis-retinal na retina, responsável pela deficiência visual, principalmente em ambientes de pouca luz, causando assim a cegueira noturna. Se a deficiência de vitamina A persiste, há alterações devastadoras na retina. A falta de vitamina A é a maior causa evitável de cegueira em crianças (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010, ONUAA, OMS, 2001).
Estudos demonstram que infecções que induzem uma resposta de fase aguda também diminuem as concentrações de vitamina A séricas e que a vitamina A é importante para formação e fortificação do sistema imune. Uma diminuição moderada dos níveis de vitamina A pode comprometer o sistema imune por comprometer barreiras fisiológicas como a regeneração do epitélio da pele, a diminuição da função de neutrófilos, macrófagos e células natural killers. Sua carência também leva a uma diminuição na função de linfócitos Th1 e Th2 e linfócitos B, diminuindo assim a resposta imune celular e humoral (STEPHENSEN, 2001).
Estudos demonstram que os baixos níveis de vitamina A estão relacionados com baixo desenvolvimento e retardo do crescimento em crianças, doença de Alzheimer, esquizofrenia, depressão e outras doenças (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010, ONUAA, OMS, 2001), além de um desenvolvimento anormal do embrião (CHAGAS et al, 2003).
Tais problemas de saúde causados por deficiência de vitamina A podem ser tratados com sucesso com o uso de preparações farmacológicas de vitamina A (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010).
6.2.2. Carência de Vitamina B9
A deficiência de folato existe geralmente associada à dieta pobre, alcoolismo e desordens de má absorção. Os grupos que apresentam maior risco de carência de folato são alcoólatras, mulheres em idade fértil, mulheres grávidas e pessoas com desordens de absorção de folato, incluindo pessoas com esprú tropical, doença celíaca, doença inflamatória intestinal e pessoas com função gástrica reduzida (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2012). Indicadores da deficiência de folato incluem baixos níveis plasmáticos e hemáticos e níveis elevados de homocisteína (OMS, 2008).
De acordo com a OMS, estudos sugerem uma forte associação entre deficiência de folato com anemia megaloblástica. Em regiões onde há alta incidência de deficiência de folato, em mulheres grávidas e em lactação, estudos sugerem que a incidência desta anemia aumenta com a prolongação da lactação e gestações consecutivas (OMS, 2008). Essa anemia é causada por uma deficiência da metilação do desoxiuridilato ao timidilato na formação do DNA, necessário para a divisão celular (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2012).
A OMS sugere que a deficiência de folato pode elevar o risco de neonatos nascerem com baixo peso corporal, de ruptura de placenta, de nascimentos prematuros e de má formação congênita. Há fortes evidências que relacionam a carência de folato a má formação de tubo neural (OMS, 2008).
Durante o desenvolvimento fetal normal, várias porções do DNA devem ser metiladas e desmetiladas, um processo importante que define quais genes serão expressos ou silenciados. Esse processo de metilação do DNA requer de S-adenosilmetionina, que é formada na presença de 5-metiltetrahidrofolato. Em situações de carência de folato, o DNA pode não ser metilado em padrões corretos, podendo levar a defeitos congênitos do desenvolvimento do tubo neural, sendo o mais comum a espinha bífida (Figura 8) (CRIDER et al, 2012).
FIGURA 8 – Espinha bífida: um defeito do tubo neural causado por deficiência de folato. FONTE: ESPINHA BÍFIDA, ca. 2008.
Crider e cols. (2012) descreveram que padrões alterados de metilação do DNA também estão associados a doenças cardiovasculares e câncer. Hipometilação e hipermetilação do DNA estão associadas a câncer a um nível global e podem levar ao silenciamento de genes supressores e aberrações na estrutura dos cromossomos. Hipometilação de elementos repetitivos do DNA podem levar a um risco aumentado tanto da incidência do câncer, quanto da mortalidade pelo câncer.
Em crianças, a deficiência em folato no cérebro, pode levar a baixo crescimento da cabeça, hipotonia e ataxia, desenvolvimento desacelerado, seguidos de discinesia, espasticidade, dificuldades da fala e epilepsia (GORDON, 2009).
6.2.3. Carência de Vitamina D
Alguns grupos populacionais têm mais risco de ter carência de vitamina D que outros. Os fatores de risco para o desenvolvimento de carência de vitamina D são diversos, dentre eles podemos citar: pouca exposição à luz UVB que pode ser causada pelo uso excessivo de roupas, pouca insolação (alta latitude), uso de bloqueadores ou protetores solares, pele escura; diminuição da síntese de vitamina D na pele, que pode ser causada pelo envelhecimento ou pode estar ligado ao fato de o indivíduo pertencer à raça mongoloide. Outras patologias que interferem com a capacidade de sintetizar a pré-vitamina D ou metabolizá-la a vitamina D incluem: fibrose cística, doenças gastrointestinais, doenças renais, doenças hematológicas, dentre outros. A obesidade interfere com a quantidade disponível de vitamina D livre no sangue, pois o tecido adiposo captura a vitamina D (BUENO, CZEPIELEWSKI, 2008).
O efeito mais pronunciado da deficiência de vitamina D no corpo humano é a diminuição da absorção de cálcio, levando a uma hipocalcemia. Nos adultos e idosos isso faz como que os ossos se tornem frágeis, levando à osteoporose, e nas crianças e adolescentes pode ocorrer raquitismo e deformidade dos ossos, sendo a perda de massa óssea muito notável. Outro fator decorrente da deficiência de vitamina D é o hiperparatireoidismo (PREMAOR, FURLANETTO, 2006).
A carência de 1,25(OH)D é a principal causa do raquitismo. Numa dieta deficiente em vitamina D, apenas 10-15% do cálcio e 50-60% do fósforo é absorvido. A baixa absorção do cálcio leva a uma baixa concentração de cálcio sérico, que é reconhecido pelas glândulas paratireoides, que funcionam como um sensor de cálcio, e resulta em expressão, síntese, e excreção aumentada de paratormônio. O paratormônio estimula a reabsorção de cálcio nos rins, e também estimula a produção de osteoclastos maduros e os mobiliza para reabsorverem cálcio do esqueleto. Na criança com deficiência de vitamina D, os níveis de cálcio estão usualmente normais, os níveis de fosfato estão baixos e há formação inadequada de fosfato de cálcio, produto responsável pela mineralização dos ossos. Esses efeitos se mostram mais significativos quando há grande crescimento dos ossos, como do nascimento aos 18 meses de idade. Os sinais do raquitismo incluem atraso no fechamento das fontanelas cranianas e no crescimento e no desenvolvimento motor; fronte olímpica, retardo na erupção dos dentes, abaulamento da junção costo-condral. Os ossos longos apresentam extremidades alargadas, encurvamentos, coluna vertebral pode apresentar deformidades em "S", cifose, escoliose e acentuação da lordose lombar. Na Figura 9 podemos comparar o aspecto físico de uma criança normal a de duas crianças raquíticas (HOLICK M. F., 2006, MECHICA, 1999).
FIGURA 9 – Representação típica do raquitismo: a criança do meio é normal e as outras duas crianças sofrem raquitismo. Deformidades ósseas e fraqueza muscular são observadas nas crianças raquíticas. FONTE: HOLICK, 2004
Em situações de baixos níveis de 25(OH)D séricos, há favorecimento do desenvolvimento de células T autorreativas no sistema imunológico. As células T autorreativas são direcionadas contra tecidos do próprio organismo. Nessas situações há uma síntese aumentada de interleucinas pró-inflamatórias que predispõe o organismo a um risco aumentado de desenvolver doenças autoimunes como o diabetes mellitus tipo 1, artrite reumatoide, esclerose múltipla, doenças inflamatórias intestinais (CASTRO, 2011).
A vitamina D está envolvida com as várias etapas do ciclo celular e é responsável por modular a ativação ou repressão de genes envolvidos na sinalização dos processos de parada do ciclo em G0/G1, diferenciação, multiplicação e apoptose celular. Assim, seus baixos níveis levariam à desregulação desses processos da divisão celular, e assim promoveriam proliferação celular e inibição da apoptose. Estudos epidemiológicos demonstraram associação entre baixos níveis de vitamina D e risco aumentado para o desenvolvimento de alguns tipos de cânceres, como os de mama, colorretal e próstata, cujas células expressam a CYP27B1. Como a vitamina D também tem ação inibitória na angiogênese, que é um processo fundamental para o crescimento de tumores sólidos, acredita-se que essa atividade antiangiogênica seja um dos mecanismos responsáveis por sua capacidade tumoral-supressiva (CASTRO, 2011).
Um estudo feito por Gouni-Berthold, Krone e Berthold (2009), intitulado Vitamin D and cardiovascular disease, identifica baixos níveis séricos de vitamina D como um dos principais fatores de risco para diversos cânceres, diabetes mellitus e diversas doenças cardiovasculares, como hipertensão, arteriosclerose, infarto do miocárdio, derrame pericárdico e insuficiência cardíaca crônica (GOUNI-BERTHOLD, KRONE, BERTHOLD, 2009).
A baixa ingestão dietética da vitamina D ou baixa exposição ao sol ou luz ultravioleta B entre crianças e adolescentes causa efeito deletério na saúde esquelética e metabolismo ósseo. Faz-se importante investigar as causas do seu baixo consumo entre indivíduos no período de crescimento, como na infância e na adolescência, e devem-se estabelecer estratégias nutricionais para aumentar seu consumo dietético e proporcionar o acesso aos alimentos ricos nestes nutrientes entre as populações em risco nutricional ou a exposição apropriada ao sol (BUENO, CZEPIELEWSKI, 2008). Os estudos bioquímicos e moleculares sobre o metabolismo da vitamina D provêm fortes evidências da magnitude e da ampla abrangência desse sistema na modulação de processos celulares essenciais à homeostase sistêmica. Analisando-se o conjunto de estudos sobre a fisiologia do complexo 1,25(OH)D-VDR, observa-se que há uma nítida associação entre o equilíbrio desse sistema endocrinológico com o grau de predisposição a determinadas doenças (CASTRO, 2011).
6.2.4. Carência de Ferro
De acordo com o National Institutes of Health (2015), os grupos mais propensos a não ingerirem uma quantidade adequada de ferro incluem gestantes, neonatos e crianças, doadores frequentes de sangue, pessoas com câncer, indivíduos com desordens ou que foram submetidas a alguma cirurgia no trato gastrointestinal e pessoas que sofreram falência cardíaca.
Durante a gravidez, o volume do plasma e o número de hemácias no sangue deve-se expandir drasticamente. Para atender a essas demandas de ferro e também às demandas do feto e da placenta, a quantidade de ferro que a gestante necessita aumenta. A deficiência de ferro aumenta o risco de mortalidade materna e infantil, de partos prematuros e de baixo peso ao nascimento. Crianças, em especial as que nascem com baixo peso ou aquelas cujas mães são deficientes nesse nutriente, estão em risco de deficiência de ferro devido aos seus rápidos crescimentos e altas necessidades. Crianças que nascem a termo, cujas mães não são deficientes em ferro e com pesos ideais, tem reservas suficientes de ferro até seus 6 meses de idade, podendo se tornar deficientes aos 9 meses de idade se não ingerirem quantidades adequadas desse nutriente. Doadores de sangue podem ter seus estoques depletados e, usualmente, 25 a 35% dos doadores de sangue desenvolvem carência de ferro. Pessoas com câncer estão em risco de desenvolverem deficiência de ferro devido a sangramentos crônicos, anemias induzidas por quimioterapia ou devido a anorexia induzida pelo câncer. Outros problemas relacionados a essa carência estão relacionados à alimentação pobre, má absorção, uso prolongado de ácido acetilsalicílico e outros (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2015).
A deficiência de ferro frequentemente leva a anemia chamada de ferropriva. A anemia ferropriva é o tipo de anemia mais frequente no mundo, acometendo cerca de 2 bilhões de pessoas, e no Brasil, 50% das crianças e 35% das gestantes (SILVA et al, 2002). A anemia ferropriva resulta de longo período de balanço negativo entre a quantidade de ferro biologicamente disponível e a necessidade orgânica desse micronutriente (JORDÃO, BERNARDI, BARROS FILHO, 2009). Uma depleção dos níveis de ferro no organismo leva a uma síntese diminuída do grupo heme e, em consequência, da hemoglobina. Na anemia ferropriva, as hemácias se caracterizam por uma diminuição em seu volume corpuscular médio (VCM) caracterizando essa anemia como microcítica (pequenas células) e as hemácias também apresentam uma diminuição de hemoglobina corpuscular média (HCM) e da concentração de hemoglobina corpuscular média (CHCM) o que caracteriza essa anemia como hipocrômica (pouca cor) (VICARI, FIGUEIREDO, 2010).
Yip e Dallman, citados por Fisberg e cols (2008), relataram que a carência de ferro leva a uma diminuição na capacidade de realizar atividade física. Essa diminuição se dá tanto pela diminuição do transporte de oxigênio aos tecidos, causada pela anemia, como pela diminuição da produção de energia das células do músculo, causada pela redução dos níveis de citocromo mitocondrial e desidrogenases. Essas alterações se manifestam como uma redução da capacidade para o exercício prolongado, uma oxidação menos eficiente da glicose, pois o piruvato não entra no ciclo do ácido cítrico e é convertido em lactato e um aumento na gliconeogênese, de modo que o fígado converte em glicose o lactato procedente do músculo.
Os citocromos extramitocondriais do fígado, como a P450, são enzimas que possuem ferro em seu sítio ativo e são responsáveis pela oxidação e degradação de xenobióticos, como toxinas, drogas e outros produtos químicos, e de substâncias endógenas, tais como hormônios. Dhur e cols., citados por Fisberg e cols. (2008), afirmam que mesmo reduções moderadas de ferro podem alterar a função dessas enzimas, interferindo com o metabolismo de drogas.
A deficiência de ferro também pode levar a alterações e erros no DNA em humanos, podendo ser observada em indivíduos anêmicos. Enzimas necessárias para reparo e replicação de DNA dependem de ferro e sua deficiência pode levar a uma diminuição na atividade dessas enzimas. Zhang (2014) afirma que algumas células podem ficar aprisionadas em fases G2 ou M da mitose na carência de ferro.
6.2.5. Carência de Zinco
As crianças constituem um dos grupos mais vulneráveis da população a ter carência de zinco, pois estão expostas a situações de alto risco para problemas nutricionais durante seu crescimento e por possuírem maior necessidade de zinco devido ao rápido crescimento. Ainda, crianças de países em desenvolvimento, além de ingerirem uma dieta pobre em zinco, ingerem menos proteínas, as quais ajudam na absorção de zinco. Uma alimentação pobre em proteínas e calorias e rica em cereais inibe absorção de zinco e potencializa os efeitos deletérios de sua carência (MACÊDO et al, 2010). Além disso, a deficiência de zinco é observada em pessoas com desordens gastrointestinais, como a sindrome da má absorção, doença de Crohn, esteatorreia, doenças hepáticas, doenças renais, alcolismo e anemia falciforme (HAGMEYER, HADERSPECK, GRABRUCKER, 2015).
Uma carência de zinco pode levar a diversas patologias como teratogenia, lesões cutâneas, retardo do crescimento, cicatrização diminuída e atrasada, alteração na função imune do organismo, hipogonadismo, cegueira noturna e mudanças comportamentais. O diagnóstico da deficiência do zinco é difícil, pois suas concentrações plasmáticas não refletem seus níveis celulares e, frequentemente, os níveis de zinco plasmático se mostram inalterados em pessoas com carência de zinco (HAGMEYER, HADERSPECK, GRABRUCKER, 2015, NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2013).
No âmbito comportamental, Hagmeyer, Haderspeck e Grabucker (2015) relatam que a deficiência de zinco pode levar a alterações comportamentais no espectro do autismo, desordem de déficit de atenção, esquizofrenia e ataxia. Gestantes com deficiência de zinco podem ter filhos com teratogenias ou retardo mental. (HAGMEYER, HADERSPECK, GRABRUCKER, 2015).
No âmbito do sistema imune, estudos demonstram que uma deficiência do zinco leva a uma capacidade diminuída de fagocitose pelos neutrófilos e mastócitos, uma deficiência na ação da enzima superóxido desmutase e uma diminuição na lise celular causada por células NK. Wintergerst et al e Wieringa et al, citados por Macêdo e cols. (2010), relatam que uma privação de zinco leva a uma carência na produção de interleucinas, interferons e fatores de necrose tumoral, citocinas imunorregulatórias. Além disso, a carência de zinco leva a diminuição de anticorpos IgM e IgG, atrofia do timo e outros órgãos linfoides, diminuição no número de linfócitos T circulantes, e alteração na relação de linfócitos T CD4+/CD8+ (MACÊDO et al, 2010, EMBRAPA, 2001).
De acordo com Palheta Neto e cols. (2011), uma deficiência de zinco pode levar a gustação e olfato alterados. Mackay-Sim e Dreosti (1989) afirmam que a essa carência leva a uma degeneração do neurônio olfatório de ratos em centros de processamento olfativo no cérebro e que, em humanos, causa uma insensitividade olfatória. Devido à importância do zinco no desenvolvimento neural embrionário e fetal, sua carência pode levar a uma ruptura na neurogênese de receptores olfativos. Estudo realizado por Person e Féres (2005) relata que a deficiência de zinco também pode levar à sensação de zumbido no ouvido, indicando que este elemento também tem atuação na fisiologia auditiva. De acordo com estes pesquisadores, a carência do zinco na linfa auditiva pode resultar em aumento dos radicais livres nesta, ou que pode levar a uma atividade diminuída da Na-K-ATPase, que é muito ativa na cóclea auditiva.
6.2.6. Carência de Iodo
A deficiência de iodo ainda é um problema de saúde em cerca de 47 países e 2,2 bilhões de pessoas vivem sob o risco de sofrerem deficiência de iodo. Esforços internacionais tem, desde 1990, reduzido drasticamente a incidência da carência de iodo, mas alguns grupos de pessoas ainda ingerem quantidades insuficientes de iodo (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2011).
Os grupos de pessoas que moram em regiões com solos pobres em iodo são os que apresentam maior risco de deficiência desse nutriente. Essas regiões incluem áreas montanhosas, como os Himalaias, Alpes e regiões dos Andes, além de regiões que são constantemente inundadas por rios, especialmente na América do Sul e sudeste da Ásia. A população destas regiões tem maior risco de apresentar deficiência de iodo se não tiverem acesso a sal iodado. Outro grupo vulnerável é composto por pessoas que utilizam alimentos ricos em substâncias goitrogênicas, ou seja, substâncias que inibem a captação de iodo pela tireoide. Alimentos ricos em substâncias goitrogênicas incluem a soja, a cassava, o repolho, a couve-flor e outros vegetais crucíferos. Grupos populacionais que não tem acesso a sal iodado e gestantes podem ter deficiência desse elemento (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2011).
A carência de iodo pode levar ao aparecimento de múltiplos efeitos adversos em humanos e as desordens por sua deficiência afetam a produção hormonal da tireoide. Cerca de 2,2 bilhões de pessoas no mundo sofrem de carência de iodo. Na Europa, cerca de 50% da população apresenta leve deficiência de iodo. Estudos demonstram que a ingestão de iodo vem diminuindo em países industrializados como Estados Unidos e Austrália. A deficiência de iodo durante a gestação e infância pode prejudicar o crescimento e desenvolvimento neural do feto e da criança, podendo levar ao aumento da mortalidade, pode provocar uma redução do crescimento somático e do desenvolvimento cognitivo e motor durante a infância. Marcadores da deficiência de iodo podem ser: a concentração de iodo na urina e plasma, o bócio, as concentrações plasmáticas de TSH, de T3 e T4 (ZIMMERMANN, 2009).
De acordo com Kapil (2007) o papel biológico mais importante de T3 é durante o estágio fetal da vida. A T3 assegura o crescimento, a diferenciação e a maturação dos órgãos do corpo, em particular do cérebro. A deficiência de iodo é considerada a maior causa evitável de retardo mental. Pode causar desde embotamento intelectual a cretinismo, uma condição que inclui um elevado nível de retardo mental, surdez, mudez, baixa estatura e outras alterações. Em áreas de deficiência severa de iodo, a maioria dos indivíduos tem risco de sofrer de algum tipo de deficiência mental. Os danos causados aos cérebros desses indivíduos fazem com que estes tenham muita dificuldade para aprender, trabalhar ou produzir satisfatoriamente.
A alimentação deficiente de iodo na gestante pode levar a uma baixa produção que interfere com a produção de T3 e T4 pelo feto, levando a um retardo no crescimento. Nesses casos, a gravidez pode não chegar a termo, ocorrendo aborto, ou os neonatos frequentemente morrem com poucos dias de vida. Estudos sugerem que o período mais crítico do efeito do iodo na gestação é na metade do segundo trimestre, momento em que neurônios dos gânglios basais e da cóclea são formados. A deficiência de iodo causa diminuição, muitas vezes extrema, do metabolismo celular do feto. Os efeitos da carência de iodo no desenvolvimento do cérebro incluem uma hipoplasia de seu tecido e diminuição da ramificação dos dendritos neuronais (KAPIL, 2007). A figura 10 ilustra uma idosa que sofre de bócio.
FIGURA 10 – Bócio. FONTE: BERNE, LEVY, 2012.
Em adultos a deficiência leve a moderada de iodo parece estar associada a maiores taxas de câncer de tireoide, bócio difuso, bócio nodular e hipertireoidismo. Estudos também sugerem que a deficiência de iodo pode estar associada a hipotireoidismo, função mental prejudicada, apatia, diminuição na produtividade no trabalho e baixo nível de educação (ZIMMERMANN, 2009).
A deficiência de iodo é identificada como a causa mais evitável de danos ao cérebro e retardo mental. Os efeitos danosos da sua carência foram reconhecidos no desenvolvimento físico e mental de crianças, tanto como a produtividade de adultos. As sequelas neuronais são mediadas pela deficiência de T3 e T4. Na deficiência de iodo durante a gestação, toda base do processo de neurogênese é prejudicada durante o desenvolvimento cerebral (KAPIL, 2007).
6.3. Toxicidade de Micronutrientes
6.3.1. Toxicidade da Vitamina A
Um abuso na ingestão de vitamina A na forma de suplementos ou uma dieta rica em vitamina A pré-formada está associada a toxicidade. A vitamina A tem uma meia-vida longa e se acumula no corpo. É rapidamente absorvida e tem clearance lento, podendo produzir toxicidade aguda se uma enorme quantidade é ingerida de uma vez, ou toxicidade crônica, se quantidades relativamente elevadas são ingeridas por um longo período. O quadro tóxico de vitamina A é denominado hipervitaminose A e pode se apresentar em crianças e adultos (HATHCOCK et al, 1990). No Quadro 1 estão descritos os sinais e sintomas da hipervitaminose A.
Fonte: HATHCOCK et al, 1990
Uma intoxicação por vitamina A pode se manifestar na forma de várias patologias graves. Um estudo feito por Huk e cols (2013) demonstrou que uma ingestão elevada de vitamina A pode causar calcificação da valva aórtica in vivo. Neste estudo, ratos foram injetados com 200UI/g de palmitato de retinil e observados por um período de 12 meses. O estudo demonstrou que os genes relacionados com ossificação estavam supre-expressos e que marcadores de cartilagem estavam infrarregulados.
Estudos demonstram que níveis tóxicos de vitamina A causam hepatotoxicidade, podendo levar a hepatite ou cirrose e elevada pressão intracraniana (BABB, KIERALDO, 1978, MINUK, KELLY, HWANG, 1988, WALL, 2008). Guerra e cols. (2014) conduziram um experimento onde gatos eram submetidos a uma hiperdosagem de vitamina A para avaliação da função e morfologia hepáticas. Estes animais desenvolveram fibrose hepática, com lipidose, hiperplasia e hipertrofia de células de ito. Os fígados destes animais se apresentavam de cor amarela clara a cor bronze, o tamanho se mostrou alargado e também desenvolveram alterações nos ossos cervicais, compatíveis com espondilose.
Estudos sugerem que altas concentrações de vitamina A são teratogênicas durante as primeiras semanas da gravidez. Essa ação teratogênica da vitamina A foi demonstrada em várias espécies de animais. A vitamina A, quando em altas concentrações, exerce efeitos teratogênicos sobre embriões, devido a elevadas concentrações de seu metabólito, o ácido retinoico, que age sobre genes no período crítico da organogênese e embriogênese. A OMS recomenda a diminuição da exposição de mulheres grávidas a altas concentrações de vitamina A na forma de suplementos. A vitamina A na forma de betacaroteno não apresentou potencial teratogênico em altas concentrações. (CHAGAS et al, 2003).
A ingestão crônica de alimentos ricos em vitamina A pré-formada ou preparações farmacológicas de vitamina A afeta seriamente o desenvolvimento e metabolismo normal de ossos e sistema nervoso central, altera o sistema cardiovascular, calcificando as válvulas do coração, e pode até precipitar teratogenias durante a gravidez. Ainda assim a vitamina A é de suma importância no desenvolvimento normal do embrião e feto, na infância e vida adulta, por isso seu uso deve ser otimizado para atingir os seus objetivos terapêuticos e profiláticos e evitar seus efeitos adversos (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010).
6.3.2. Toxicidade da Vitamina B9
O ácido fólico em geral é considerado não tóxico para humanos normais, mas pode causar injúria neuronal quando dado a pacientes que sofrem de anemia perniciosa. Deve ser dado com cautela a pacientes epilépticos em tratamento, pois estes, quando submetidos a doses de 30 mg, podem apresentar em seus encefalogramas picos anormais ou sofrer ataques epilépticos. Alguns estudos sugerem que os suplementos de ácido fólico interferem com a absorção do zinco em humanos e animais. As evidências clínicas sugerem que doses de 5 a 15 mg por dia de ácido fólico não afetam significantemente a absorção do zinco em indivíduos saudáveis (BUTTERWORTH, TAMURA, 1989).
Em indivíduos com anemia perniciosa, o ácido fólico mascara a sua manifestação anêmica, mas permite a progressão de lesões da medula espinal (BUTTERWORTH, TAMURA, 1989)
Hunter et al, 1970, mencionados por Butterworth e Tamura (1989), conduziram um experimento onde 14 voluntários saudáveis ingeriram 15mg de ácido fólico por dia, durante um mês. Esses indivíduos apresentaram alterações mentais, problemas ao dormir e sintomas gastrointestinais. No entanto, Sheeshy, mencionado por Butterworth e Tamura (1989), descreveu um caso de um indivíduo que tomou 60mg de ácido fólico por dia, durante três anos, e não apresentou nenhum efeito tóxico.
De acordo com pesquisas e observações epidemiológicas feitas por Sauer, Mason e Choi (2009) o excesso de folato adquirido por meio de suplementação pode aumentar as chances de um indivíduo desenvolver câncer colorretal, de próstata, de mama e doenças cardíacas crônicas. As informações sobre o mecanismo pelo qual o folato em excesso pode aumentar a incidência de câncer são insuficientes, mas estudos sugerem um desbalanço no padrão de metilação do DNA e histonas.
A suplementação com folato para prevenir doenças cardíacas ou incidência de defeitos do tubo neural deve ser feita com cautela para se assegurar níveis de folato adequados no organismo e prevenir a incidência de doenças causadas pelo excesso do folato (SAUER, MASON, CHOI, 2009).
6.3.3. Toxicidade da Vitamina D
De acordo com o National Institutes of Health (2013) uma intoxicação por vitamina D só ocorre se doses muito elevadas forem ingeridas por muitos meses. Essa intoxicação pode elevar absurdamente as concentrações de cálcio plasmático, levando a perda do apetite, náuseas e vômitos, seguidos por sede excessiva, aumento da emissão de urina, fraqueza, nervosismo e hipertensão arterial. O cálcio pode se depositar em todo o organismo, especialmente nos rins, onde pode provocar lesões permanentes, causando deterioração da função renal. A intoxicação por vitamina D também pode levar o paciente a sofrer de litíase e desidratação.
A concentração limiar plasmática de 25(OH)D para a hipervitaminose D não foi estabelecida e a hipercalcemia é o critério para seu diagnóstico. Alguns estudos, contudo, indicam que 50 mcg/dia de vitamina D é a maior quantidade que pode ser ingerida ou administrada ao organismo sem impor riscos ou efeitos adversos à maioria da população (VIETH, 2007). Um estudo sobre sua farmacocinética, realizado por Jones (2008), definiu sua toxicidade, também chamada de hipervitaminose D, como a ingestão de vitamina D acima da capacidade de a CYP24A1 manter os níveis de vitamina D ativada.
Nos estágios iniciais, a hipervitaminose D causa desordens gastrointestinais como anorexia, diarreia, constipação, náuseas e vômitos. Sintomas como dor óssea, muscular, e das articulações, dor de cabeça, batimento do coração irregular, perda de apetite e outros sintomas, como aumento da frequência urinária, principalmente à noite, sede excessiva, fraqueza, nervosismo, coceiras e pedra nos rins, aparecem depois de dias ou semanas (ALSHAHRANI, ALJOHANI, 2013).
De acordo com Alshahrani e Aljohani (2013) há três hipóteses sobre o mecanismo de ação da toxicidade da vitamina D:
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Níveis elevados de 1,25(OH)D plasmáticos levam a níveis de 1,24(OH)D intracelulares aumentados. Essa hipótese não é muito considerada, pois na maioria dos casos de hipervitaminose D, os níveis de 1,25(OH)D estão normais ou apenas levemente elevados;
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Níveis elevados de 25(OH)D, acima da capacidade da proteína ligante de vitamina D, e 25(OH)D livre agindo diretamente sobre a expressão gênica;
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Entrada elevada de vitamina D no organismo, acarretando altas concentrações de diversos metabólitos da vitamina D, incluindo o 25(OH)D.
Alshahrani e Aljohani (2013) também descrevem casos de hipersensibilidade à vitamina D que podem ser confundidos por hipervitaminose D. O tipo mais comum dessa hipersensibilidade é o hiperparatireoidismo, mas doenças granulomatosas, sarcoidose e alguns canceres podem causar essa hipersensibilidade ao produzirem quantidades excessivas de calcitriol.
O excesso de vitamina D leva a hipercalcemia e hipercalciúria e estas podem levar a diversas patologias como insuficiência renal, calcificação vascular e de outros tecidos, incluindo nefrocalcinose e nefrolitíase (INSTITUTE OF MEDICINE, 2011).
Entender a fisiologia e patologia da hipervitaminose D é de grande relevância clínica para levar ao diagnóstico e tratamento correto. Diante disso, mostra-se necessário cautela ao prescrever suplementação de vitamina D a pacientes (ALSHAHRANI, ALJOHANI, 2013).
6.3.4. Toxicidade do Ferro
O íon ferro, um elemento fundamental para o metabolismo energético e transporte de oxigênio, é altamente reativo e danoso pois participa de reações oxidativas lesivas ao organismo quando se encontra livre. Os organismos superiores desenvolveram mecanismos elaborados capazes de manter o ferro ligado a proteínas de transporte ou armazenado sob a forma de ferritina ou hemossiderina, com o intuito de limitar o ferro livre. Desta forma, a capacidade do organismo de armazenar o ferro tem finalidade de tanto prover reserva interna quanto proteger o organismo dos efeitos do ferro livre, quando sua quantidade absorvida exceder as quantidades perdidas e as necessárias pelo corpo. Em adultos saudáveis, a quantidade absorvida deste elemento diariamente equivale à quantidade excretada e este é continuamente reciclado no organismo. Fisiologicamente, o organismo não é capaz de aumentar a excreção de ferro mesmo em condições de sobrecarga, portanto, aumento do seu aporte, seja por via intestinal ou parenteral, leva a uma inevitável condição patológica de sobrecarga (CANÇADO, 2007).
O ferro livre participa como catalisador na iniciação de reações de radicais livres. Os oxirradicais formados têm o potencial de danificar lipídeos celulares, ácidos nucleicos, proteínas e carboidratos, causando má função celular e danos à sua integridade. A taxa de produção de radicais deve ser maior que a capacidade citoprotetiva de se defender antes que danos ocorram. Há evidências que o excesso de ferro pode resultar em oxidação de lipídios e que, no fígado, essa oxidação de membranas pode diminuir o ritmo de reações que ocorrem no interior de organelas dependentes de membranas como mitocôndrias e lisossomos (BRITTON, LEICESTER, BACON, 2002). O acúmulo deste elemento nos hepatócitos resulta, normalmente, de um excesso de absorção de ferro intestinal, enquanto seu acúmulo no sistema mononuclear fagocitário decorre de aumento da fagocitação de hemácias. Na ausência de tratamento adequado, o ferro se acumula em diversos outros órgãos, como baço, miocárdio, glândulas endócrinas, medula óssea, causando lesão celular, tecidual e fibrose, seguida de insuficiência funcional destes (CANÇADO, 2007).
A sobrecarga de ferro é classificada como primária ou secundária. A sobrecarga primária ocorre em situações resultantes de processos de regulação da homeostasia do ferro deficientes como na hemocromatose hereditária e nos casos de absorção aumentada inapropriadamente do ferro no intestino, que são associados a mutações genéticas. A sobrecarga secundária de é associada a doenças congênitas ou adquiridas como anemia hemolítica e eritropoiese ineficaz ou associada a múltiplas transfusões de hemácias. Também é observada em pacientes com talassemia beta maior, anemia falciforme, anemia de fanconi e outras (CANÇADO, 2007).
Um estudo feito por Weinberg e Miklossy (2008) relata que o excesso de ferro pode causar diversas doenças neurodegenerativas, doenças endócrinas, cardiomiopatia, artropatia, neoplasias e infecções e que o uso de quelantes de ferro pode trazer várias melhorias à saúde humana.
Weinberg (2009) descreveu outras condições em que o ferro é tóxico: intensificação de atrofia muscular, aumento da replicação do vírus da imunodeficiência humana (HIV) e do vírus da hepatite C (HCV), intensificação de rosácea e aumento da proteinose alveolar pulmonar.
O principal mecanismo de toxicidade pelo ferro está relacionado com o ferro livre (não ligado à transferrina ou outras proteínas), quando os mecanismos de quelação do organismo são ultrapassados e este está presente livre na circulação e órgãos. O íon ferroso (Fe2+) é convertido em íon férrico (Fe3+), que então atua como catalisador de reações oxidativas com consequente formação de superóxidos e radicais hidroxilas. A conversão do superóxido em H2O2 pela superóxido desmutase causa a peroxidação de lípídeos de membrana celular e de diversas organelas e consequente dano celular (CANÇADO, 2007).
O quadro clínico de sobrecarga de ferro, seus sintomas e sinais clínicos dependem do tipo de sobrecarga, da quantidade em excesso e do tempo de exposição do organismo ao ferro livre. Os sintomas iniciais são geralmente inespecíficos como fadiga, artrite, dor abdominal, diminuição de libido e perda de peso. Posteriormente, há hepatomegalia, esplenomegalia, baixa estatura e artropatia. Sem tratamento adequado, essa patologia evolui para fibrose portal, cirrose hepática e insuficiência hepática, hiperpigmentação da pele, hipogonadismo, diabetes mellitus e hipotireoidismo. A acumulação de ferro na hipófise e hipotálamo contribui para a impotência sexual, atrofia testicular, ginecomastia e queda de pelos corporais em homens e amenorreia em mulheres. Há ainda considerável comprometimento cardíaco causado pelo acúmulo de ferro nos cardiomiócitos, incluindo cardiomiopatia, arritmia e insuficiência cardíaca (CANÇADO, 2007).
Em um estudo feito com pacientes com atrofia muscular, os níveis de ferro não-heme em seus músculos gastrocnêmios estavam aumentados em 233% e os níveis de mRNA para o receptor de transferrina estava diminuído em 80%. Os níveis de ferro e oxidação do subsarcolema mitocondrial no músculo quadríceps também estavam aumentados (WEINBERG, 2009). O DNA também foi identificado como alvo de lesões induzidas pelo ferro e a análise do DNA de hepatócitos de pacientes com excesso de ferro demonstrou evidências de mutações, incluindo de diversos genes supressores como a p53 (BRITTON, LEICESTER, BACON, 2002).
O ferro, apesar de não ser componente dos vírus, é necessário para sintetizar partículas virais. Células infectadas pelo HIV e pelo HCV têm sua necessidade de ferro aumentada e se descobriu, nas últimas décadas, que o ferro excessivo diminui a capacidade do animal de lutar contra infecções virais (WEINBERG, 2009).
É fundamental o diagnóstico precoce de sobrecarga de ferro e instituir uma terapia ferroquelante ou flebotomia capaz de prevenir o aparecimento de complicações orgânicas graves ou reverter a progressão da mesma. O uso de ferroquelantes ou flebotomia pode reduzir as lesões teciduais e aumentar qualidade e expectativa de vida em pacientes com excesso de ferro (BRITTON, LEICESTER, BACON, 2002, CANÇADO, 2007).
6.3.5. Toxicidade do Zinco
Em geral, os seres humanos e animais são bem tolerantes ao zinco e estudos revelam que este é relativamente não tóxico. Há poucos estudos sobre sua toxicidade, exceto por registro de diversos surtos de uma doença chamada febre do fumo metálico aconteceram após acidentes industriais devidos à inalação de óxido de zinco e contaminação ambiental. Contudo, acidentes de ingestão aguda de zinco podem levar a casos de toxicidade, principalmente devido ao armazenamento de alimentos e bebidas ligeiramente ácidos em embalagem galvanizada. Uma dose de aproximadamente 1 a 2g de sal de zinco, correspondente a aproximadamente 450 mg de zinco pode causar náuseas e vômitos, dor abdominal e diarreia. A ingestão de aproximadamente 12 g de zinco elementar pode causar letargia, dor de cabeça, dificuldades ao caminhar e escrever, mas estes sintomas podem ser facilmente reversíveis com terapia de quelação. Estudos indicam que a ingestão de zinco elementar não causa efeitos gastrointestinais. A ingestão crônica de doses de 300mg/dia de zinco pode levar a uma deficiência de cobre no organismo, levando a uma hipocupremia, anemia sideroblástica, leucemia e neutropenia. Nesse caso, a reposição de cobre deve ser feita de modo intravenoso, pois mesmo com a cessação da ingestão de zinco, o corpo só absorverá o cobre no intestino após o excesso de zinco ser eliminado do organismo. A ingestão crônica de altas doses de zinco também pode elevar o colesterol LDL e diminuir o colesterol HDL plasmáticos (FOSMIRE, 1990, GROPPER, SMITH, 2012).
A febre do fumo metálico, também chamada de febre dos soldadores, trata-se de um quadro clínico de natureza anafilática, caracterizado por calafrios súbitos, febre intensa e sintomas de comprometimento das vias aéreas. Esse quadro pode surgir em indivíduos que se expõem a concentrações elevadas de fumo de zinco, e estes adquirem imunidade contra o fumo. Essa imunidade pode ser perdida pelo afastamento destes indivíduos dos locais onde estes estão sujeitos a exposições ao fumo ou recuperada após nova exposição ao fumo. Há gengivite marginal e acredita-se que esta ocorra devido a deposição de zinco na forma de sulfeto na orla gengival (NOGUEIRA , 1972).
De acordo com o National Institutes of Health (2015) a intoxicação por zinco pode levar a dores no corpo, sensações de ardência, calafrios, colapso, convulsões, tosse, febre, baixa pressão arterial, gosto metálico na boca, oligúria, dificuldades ao respirar, vômitos, diarreia e icterícia.
6.3.6. Toxicidade do Iodo
A dose máxima diária segura da ingestão de iodo ainda não foi determinada e a ingestão diária máxima recomendada sugerida é de 2mg, por até 3 semanas. Há evidências empíricas que doses muito maiores podem ser toleradas sem problemas. A ingestão em excesso de iodo é comum, pois está presente em altas quantidades em ovos, carnes, pães e algas marinhas ou em algumas drogas farmacêuticas como a amiodarona (BACKER, HOLLOWELL, 2000).
O excesso de iodo afeta a fisiologia da tireoide, cuja regulação é complexa e envolve vários mecanismos de retroalimentação em diversas vias bioquímicas e fisiológicas, e estas dependem da quantidade de iodo administrado ao indivíduo. Na maioria dos casos, esses mecanismos de regulação podem efetivamente controlar o excesso de ingestão de iodo. Estudos em animais que receberam administração aguda de iodo demonstraram diferentes respostas baseadas na quantidade de iodo. O acúmulo de iodo pela tireoide e a sua incorporação a T3 e T4 dependem da dose administrada. Em geral, doses altas inibem o acúmulo de iodo pela tireoide e a produção de novo T3 e T4. Em seres humanos, a ingestão superior a 2mg/dia resulta em diminuição proporcional da captação de iodo pela tiroide, mas não há evidência que T3 e T4 plasmáticos diminuam. Estudos demonstram que em doses superiores a 10 mg, apenas 1.5%, ou menos, do iodo é captado pela tireoide (BACKER, HOLLOWELL, 2000).
Em indivíduos previamente afetados por deficiência de iodo, uma ingestão ligeiramente alta de iodo pode levar a diversas patologias, incluindo hipertireoidismo. Contudo, mais frequentemente, a ingestão alta de iodo leva a um quadro de hipotireoidismo. Outros efeitos causados pela alta ingestão de iodo incluem acne e lesões cutâneas (BACKER, HOLLOWELL, 2000) e pode estar associada a hipotireoidismo autoimune e a doenças de Graves em indivíduos jovens (LAURBERG et al, 2000).
6.4. Uso de Suplementos contendo vitaminas e minerais
6.4.1. Uso de suplementos
Suplementos alimentares são produtos que supostamente devem ser tomados em adição a uma dieta normal. Podem estar disponíveis no mercado de diversas formas como cápsulas, pós ou líquidos, por exemplo. Possuem em suas composições componentes, como vitaminas e minerais, que estão presentes em dietas normais, porém, nos suplementos, eles se apresentam em concentrações mais elevadas. Podem ter em sua composição produtos de origem animal, vegetais ou de microorganismos. São normalmente vendidos sem prescrição médica e podem ser complementares a um tratamento médico. Normalmente contêm vitaminas e provitaminas, minerais, compostos semelhantes a vitaminas (como a coenzima Q10), ácidos graxos, aminoácidos ou compostos proteicos, carboidratos ou outros ingredientes como leveduras, algas e probióticos (IQWIG, 2012).
Evidências médicas sugerem que a suplementação alimentar pode ser benéfica para pessoas cuja dieta não seja balanceada e para atletas. Quando se comprova que um indivíduo possui deficiência em determinado nutriente, o aumento da sua ingestão pela adequação da dieta ou suplementos é indicado (ALVES, LIMA, 2009). Por exemplo, uma suplementação de vitamina A diminui morbidades e mortalidades causadas por infecções em crianças com deficiência clínica e subclínica de vitamina A (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010).
Análises feitas pela UNICEF (2009) sugerem que a suplementação com zinco pode prevenir 20% dos casos de diarreia e 40% dos casos de pneumonia. Estas duas doenças juntas são responsáveis por 40% da morte de crianças no mundo anualmente. Estudos também demonstram que a suplementação com zinco pode aumentar o peso e altura das crianças. Diversos países do mundo estudam como suplementar o zinco na dieta em larga escala. Como outras deficiências vitamínicas e minerais, a deficiência de zinco pode ser corrigida por melhores práticas dietéticas ou distribuição de suplementos.
A maioria dos adultos nos Estados Unidos toma um ou mais suplementos alimentares todos os dias ou ocasionalmente, e frequência de uso de multivitamínicos está representada na figura 11. Esses suplementos incluem vitaminas, minerais, herbais, aminoácidos, enzimas e muitos outros produtos. Suplementos populares nos Estados Unidos incluem vitamina D e E, cálcio e ferro, herbais como a echinacea e o alho e glicosamina, probióticos e óleos de peixe (NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2011).
FIGURA 11 – Uso de multivitamínicos por idade nos Estados Unidos. FONTE: NATIONAL INSTITUTES OF HEALTH, 2011.
Estudo realizado por Hirschbruch, Fisberg e Mochizuki (2008), demonstrou que dos 201 adolescentes e jovens que utilizam academias de ginástica de São Paulo, 61% destes afirmaram fazer/terem feito uso de suplementos. Esse estudo também demonstrou que homens tendem a usar mais suplementos que mulheres e adolescentes tendem a usar mais suplementos que adultos.
Brunacio e cols. (2013) realizaram um estudo com 865 indivíduos de São Paulo, SP, sendo 232 adolescentes, 343 adultos e 291 idosos. Os participantes foram entrevistados e questionados se tomavam algo para suplementar sua alimentação, como vitaminas, minerais ou outros produtos. Os resultados demonstraram uma prevalência de uso de suplementos de 6,35%. A frequência “diária” de consumo foi relatada por 82,9% dos participantes, seguida da frequência de "uma a seis vezes por semana" por 12,2% e "menor que uma vez por semana" por 4,9%. Brunacio e cols. (2013) consideraram a prevalência de consumo (6,35%) relativamente baixa, quando comparada com as taxas de uso de suplementos nos Estados Unidos, Reino Unido, Suécia ou Holanda. As taxas do estudo foram similares às observadas na Grécia, Itália e Espanha. Foi possível observar que suplementos compostos por vitaminas e minerais e multivitamínicos lideram o uso (BRUNACIO et al, 2013).
Considerando que os suplementos vitamínicos, minerais, complexos multivitamínicos e outros não são utilizados apenas por pessoas com necessidade aumentada ou com carência de tais nutrientes, há o risco de a quantidade dessas vitaminas ou minerais ultrapassar o limite de consumo máximo tolerável. Nos Estados Unidos a ingestão de nutrientes acima do limite máximo tolerável já foi observada (BRUNACIO et al, 2013).
A mídia é um dos mais importantes estímulos ao uso de suplementos alimentares. Em 2001, a indústria de suplementos alimentares investiu cerca de 46 bilhões de dólares em propaganda. Infelizmente o uso de suplementos, muitas vezes, ocorre sem a necessária orientação, estando não raramente associada às recomendações de colegas, treinadores, revistas e outras propagandas (ALVES, LIMA, 2009).
6.4.2. Uso de suplementos, câncer e doenças crônicas
Alguns estudos epidemiológicos e empíricos foram feitos para associar o uso de vitaminas e a incidência aumentada ou diminuída de câncer e outras doenças crônicas. De acordo com o National Cancer Institute (2013), níveis altos de vitamina D estão relacionados com menor incidência e menor risco de morte por câncer colorretal, de mama, de próstata e de pâncreas. Um estudo feito por Gouni-Berthold, Krone e Berthold (2009), intitulado “Vitamin D and Cardiovascular Disease”, identificou os baixos níveis séricos de vitamina D como um dos principais fatores de risco para diversos cânceres, diabetes mellitus e diversas doenças cardiovasculares, como hipertensão, arteriosclerose, infarto do miocárdio, derrame pericárdico, e insuficiência cardíaca crônica.
Bennasir, Sridahr e Abdel-Razek (2010) relataram que a vitamina A pode ser usada para previnir doença de Alzheimer, esquizofrenia e depressão. De acordo com eles, um baixo nível plasmático de vitamina A favoreceu a formação de placas amiloides. A vitamina A tem efeitos antioxidativos que podem explicar esse seu efeito. Ainda de acordo com Bennasir, Sridhar e Abdel-Razek (2010), placas beta-amiloides podem ser curadas por administração de ácido retinoico. No caso da esquizofrenia, estudos indicam que baixos níveis de vitamina A plasmática favorecem um alargamento ventricular e alterações no cortex frontal, amígdala, hipocampo, lobo temperal e girus cingulado. Também, na vida adulta, o sistema dopaminérgico é o principal alvo da vitamina A no sistema nervoso central. Em se tratando da depressão, a vitamina A é capaz de regular, também no sistema neversoso central, o sistema seratoninérgico, tendo implicações na regulação do sono e humor (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010).
Há evidências, desde 1925, de que a vitamina A pode ser utilizada para prevenção e tratamento de cânceres e experimentos clínicos revelaram que os retinoides são capazes de reduzí-los. O ácido 13-cis-retinoico é capaz de reduzir cânceres no trato respiratório e digestivo e o palmitato de retinol pode ser utilizado para previnir e tratar câncer de pulmão (BENNASIR, SRIDHAR, ABDEL-RAZEK, 2010). De acordo com Carmo e Correia (2009) suplementos de ácidos graxos podem ser utilizadaos para tratamento de câncer de cólon, próstata, mama e pulmão. O mecanismo de ação dos ácidos graxos na carcinogênese incluem a supressão da biossíntese de eucosanoides, mudando a resposta imune e modulação da inflamação, impactando a proliferação celular, apoptose, geração de radicais livres, dentre outros. Estudos indicam que em ratos que recebem ômega-3 ou ômega-6, os cânceres diminuem seu crescimento (CARMO, CORREIA, 2009).
6.4.3. Fortificação alimentar
Em adição a suplementação, governos vem tentando fortificar alimentos processados como vitaminas e minerais. Essa estratégia pode levar a melhorias rápidas no status do micronutriente na população a custos razoáveis e grandes benefícios, sendo uma intervenção de saúde pública muito custo-efetiva. Contudo, alimentos fortificados devem ser ingeridos em quantidades adequadas por grande parte da população alvo para mostrarem resultados. Os fortificantes devem ser bem absorvidos e não alterarem propriedades organolépticas dos alimentos (ONUAA, UNICEF, 2009).
6.4.4. O preço da suplementação
De acordo com a UNICEF (2004), cada governo deve investir 20 centavos de dólares americanos para se ter a quantidade de sulfato ferroso para suplementar a alimentação de uma criança por três meses. Ainda de acordo com a UNICEF (2009), uma capsula de vitamina A, que contém quantidade deste micronutriente o suficiente para suplementar a dieta de uma criança por 6 meses, custa 2 (dois) centavos de dólar americano; um tablete de zinco custa 2 centavos de dólar americano, e o custo de se suplementar uma dieta de uma criança com zinco por um mês custa cerca de 60 centavos de dólar americano; e o custo para se suplementar com iodo todo o sal usado por uma criança no período de um ano custa cerca de 5 centavos de dólar americano.
Micronutrientes são baratos e suplementos e fortificantes de baixos custos estão disponíveis. Iniciativas de se suplementar os alimentos podem ser facilmente integradas pelos serviços de saúde e produção de alimentos. Um consenso realizado em maio de 2008 em Copenhagen, Dinamarca, intitulado de Copenhagen Consensus, considerou dentre 30 opções, a provisão de micronutrientes a pessoas carentes nestes como a melhor opção para investimento em desenvolvimento no mundo.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O estudo sobre micronutrientes e a aplicação deste nos sistemas de saúde publicos podem contribuir para reduzir a incidência de diversas doenças no mundo inteiro. Apesar de os países em desenvolvimento possuírem as populações mais afetadas pela carência de micronutrientes, países desenvolvidos também demonstram índices elevados destas carências: um terço da população mundial sofre deficiência de minerais. O uso de suplementos e fortificação alimentar é relativamente barato, uma ótima opção para investimento pelos governos. Esse tipo de ação pode ajudar a diminuir a demanda por atendimento nos sistemas de saúde públicos, por favorecer a prevenção de diversas doenças e patologias evitáveis. Tanto a carência como o excesso de vitaminas e minerais nos seres humanos causam patologias, sendo necessário uma dieta equilibrada para manter seus níveis dentro de valores desejáveis.
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Publicado por: Riordan Kennedy Broseguini de Souza
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