O AUTORRETRATO NA ARTE CONTEMPORÂNEA

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1. RESUMO

O presente trabalho é motivado pela necessidade de investigar o gênero do autorretrato durante todo o percurso da história, pontuando a presença do gênero na antiguidade, passando pelo desenvolvimento dos métodos pictóricos no período medieval e renascença, pelo romantismo, impressionismo e dando enfoque em especial na poética contemporânea. Não seria possível traçar uma história do autorretrato contemporâneo sem comentar as ressonâncias da produção de Andy Warhol no âmbito das artes visuais. Por fim, busca-se fazer uma breve abordagem da obra de dois artistas americanos contemporâneos, Scott Hutchison e Bryan Lewis Saunders, que trabalham com o tema do autorretrato na pintura e no desenho de maneira figurativa.

Palavras-chave: Autorretrato. Arte Contemporânea. Pintura.

2. Introdução

Segundo Debray (1993), na obra de arte de gregos arcaicos e egípcios a imagem do deus ou do morto implicava em sua presença. Nessas culturas, os retratos de governantes e oficiais importantes trariam um simbolismo de homenagem e de certa forma, eternização da imagem.

No caso do autorretrato, parece haver esse mesmo sentimento de admiração voltado a si mesmo, um sentimento narcísico. Um estudo de suas feições por pura curiosidade sobre como os outros o vêm ou, como no autorretrato moderno e contemporâneo, uma externalização de sentimentos através da reprodução da própria imagem.

A noção e a expressão da individualidade se deram de formas muito particulares em cada período na sociedade ocidental. Na Europa, autorretratos genuínos eram colecionados e venerados desde o século XVI. Mas esse simples interesse é superado facilmente pela obsessão que começou a existir há apenas 40 anos.

Hoje, em cidades do mundo todo, existem artistas que dedicam suas carreiras apenas ao autorretrato. O autorretrato pode ser definido como o gênero típico de nossa sociedade confessional. O número de autorretratos contemporâneos é incontável.

O presente trabalho é motivado pela necessidade de investigar o gênero do autorretrato na história da arte, em especial na arte contemporânea. Esperamos que estimule o interesse de outros pesquisadores para que possamos ampliar a parca bibliografia em português que é encontrada sobre o tema.

Não seria possível traçar uma história do autorretrato contemporâneo sem comentar as ressonâncias da produção de Andy Warhol no âmbito das artes visuais. Para Warhol, o mundo real não pode ser representado, ele seria como um negativo do mundo ficcional. Convencionalmente se pensa o autorretrato e a própria pintura como uma expressão subjetiva e íntima de um artista, no qual ele dedica tempo e trabalho ao fazer, mas Andy Warhol desvinculou o fazer artístico à espiritualidade e ao esmero.

Por fim, busca-se fazer uma breve abordagem da obra de dois artistas contemporâneos, Scott Hutchison e Bryan Lewis Saunders, que trabalham com o tema do autorretrato na pintura e no desenho.

3. As origens do autorretrato e as novas formas da auto representação no Modernismo

Esse capítulo busca fazer um apanhado sobre as origens do autorretrato na história da arte e sua contextualização com o momento histórico para que se possa entender melhor de que maneira se desenvolve as mudanças da concepção na autoimagem no período moderno.

3.1. As origens do autorretrato

Nas cavernas de Lascaux, na França, em que se encontraram diversas pinturas rupestres, os hominídeos usavam um procedimento que consiste em introduzir um pigmento em pó em um tubo oco e soprar em cima da própria mão colocada na pedra, formando assim um padrão. O vestígio é uma mão desaparecida que estava ali. Em tal processo, pode-se notar que existe um suporte (a parede) e uma projeção (o sopro), que como resultado surge uma imagem, uma “pintura não pintada”, uma sombra de uma mão que estava ali (DUBOIS, p.116, 1993). A primeira pintura da história é também um autorretrato.

Figura 1 - Mão gravada na Caverna de Chauvet, na França, cerca de 30.000 anos atrás.

Foi na Grécia Antiga e em especial durante o Império Romano que os retratos de fato se tornaram mais comuns – como em moedas, bustos e medalhas – e a prática no meio artístico se populariza, apesar de só a partir do século VI a.C. as assinaturas de artistas começaram a aparecer. Nesse mesmo período, alguns autorretratos podem ter sido produzidos na Grécia Antiga, mas a única evidência existente hoje são referências em textos escritos centenas de anos depois. No livro História Natural, de Plínio O Velho (77-9 d.C.) somente dois autorretratos são mencionados.

O escultor e arquiteto Theodorus (sexto século a.C.) fez uma estátua de bronze em miniatura de uma carruagem com cavalo, com um homem em cima e este seria seu autorretrato. O segundo autorretrato citado por Plínio era o de uma artista mulher, Laia de Cyzicus (século primeiro a.C.). Ela pintava principalmente retratos de mulheres - e também um retrato dela mesma, feito com o uso de um espelho. Essa é a primeira menção de um autorretrato feito com espelho – usualmente de metal polido – os quais eram comumente comprados por mulheres e com finalidades cosméticas.

O autorretrato é abordado no décimo livro de A república (380 a.c.), de Platão, um dos ensaios mais influentes na teoria das artes visuais. Para Platão, obras de arte são meras imitações do mundo exterior, o que seria um fraco reflexo do mundo das ideias e das “formas ideais”. Para ele, pintores são enganadores que trabalham com ilusões e fingem que conseguem reproduzir tudo que existe na natureza, distorcem a percepção da realidade com o uso de espelhos. Segundo Hall (2014), essa foi a primeira alusão literal da possibilidade de se fazer um autorretrato – apesar de Platão considerar que o pintor seja um mero reprodutor de fenômenos visuais aleatórios e que o autorretrato do artesão não possui nenhuma importância especial.

Ainda que a Antiguidade nos ofereça alguns autorretratos, não oferece um ponto de partida para uma história coerente sobre o gênero. Ele ganha força no período medieval. Alguns livros que tratam do autorretrato tendem a dar pouca importância à Idade Média, considerando que logo após a queda do Império Romano seria um período de estagnação na arte, e que o gênero do autorretrato naturalístico e independente não poderia ter existido. Tem-se a ideia de que os artistas medievais eram meramente artesãos que trabalhavam como escravos, subservientes à vontade de Deus. Entretanto, é no Cristianismo da Idade Média que os artistas – preocupados com a própria salvação e escrutínio – revelam o início de uma tradição coerente do autorretrato.

Plotino (204-70 d.C.), o último grande filósofo da antiguidade, que trata da estética de modo particular, é a base para que se desenvolva no período medieval o autorretrato, como um gênero artístico significante. Um egípcio com fluência em grego, Plotino estudou em Alexandria antes de se mudar para Roma. Sua revisão das teorias de Platão o fez ser conhecido como o fundador da escola Neoplatônica, sendo importante destacar que teve grande influência para os primeiros pensadores cristãos como Origen (que estudou com ele em Alexandria), para Santo Agostinho e para a filosofia renascentista. Para Plotino, o autorretrato não é feito baseado na imagem refletida em um espelho, mas no ato de olhar para dentro de si mesmo (HALL, 2014).

A perda de muitas obras medievais torna inadequada uma generalização. Porém, é uma surpresa descobrir quantos autorretratos medievais sobreviveram. Os primeiros exemplos significativos datam do século X. As expressões podem não parecer muito naturais, mas não impedem as imagens de trazerem uma essência particular. A visão do artista como artesão, exposto à mecânica do trabalho artístico se mostra em uma iluminura do século XII, feito pelo padre Rufillus de Weissenau, que retrata um homem ruivo com um rosto longo e magro sentado em uma cadeira de cavalete, embaixo de sua própria inicial “R”, no qual o artista retratado termina de pintar a “cauda” da letra. Trás um poderoso sentido de que o artista individual vive dentro de seu próprio trabalho, e é responsável por ele. (HALL, 2014).

Figura 2 - Padre Rufillus de Weissenau, Autorretrato iluminando a letra “R”, 1170-1200, tinta e cor sobre pergaminho.

A arte do autorretrato certamente floresceu durante o Renascimento. Pela primeira vez na história sendo produzidos autorretratos naturalísticos e frontais. Até então, o retrato e autorretrato não era como o imaginamos hoje. Era comum que os artistas simplesmente pintassem retratos colocando o nome da pessoa retratada embaixo, sem que houvesse o cuidado de que fosse fiel à imagem real (GOMBRICH, 1999). Na renascença, com a invenção da tinta a óleo por Jan van Eyck (1390-1441), torna-se mais fácil descrever a luz, a textura e os detalhes em uma pintura como nunca antes. Simultaneamente, Filippo Brunellenschi (1377-1446) trabalhava pela primeira vez com a perspectiva de um ponto, o que permitia aos artistas representarem corpos em um dado espaço. Outros tipos de perspectiva foram desenvolvidos também por Giotto, o que demonstra que o século XV foi um período de grande evolução de técnicas já antes conhecidas.

Os espelhos tiveram papel importante nesse processo. É sabido que somente no final do século XVII os espelhos planos de vidro começam a dominar, pois anteriormente eram produzidos em pequenas escala e consequentemente, eram caros. Somente no século XVIII há registros de que os espelhos convexos com a base metálica começaram a ser substituídos por pinturas na decoração das casas. O grande biógrafo de artistas italianos Giorgio Vasari (1511-74), em meados do século XVI, descrevia quando os autorretratos eram feitos “alla sphera” (com um espelho convexo, do tamanho de um pires) ou “allo specchio” (tanto convexo quanto plano, mas provavelmente em um espelho metálico).

E do ponto de vista artístico, é nesse momento quando os pintores entram de fato em contato com a representação do olhar refletido. A auto-observação e a produção da autoimagem foi extremamente reveladora. A sabedoria popular (e alguns autores, como Burckhardt) considera que em 1500 o individualismo havia nascido, época em que espelhos de cristal de boa qualidade foram inventados, permitindo que as pessoas vissem a si mesmas claramente. E que a partir dessa invenção, o gênero do autorretrato teria um crescimento significativo. O espelho na realidade não foi tão imprescindível para o desenvolvimento do autorretrato nesse período, o que importava mais era a ideia de utilizar um espelho e não tanto a precisão com que a imagem era feita. Trazia credibilidade ao artista possuir um espelho em seu estúdio, o que demonstraria suas virtudes e seu intelecto. (HALL, 2014).

A primeira representação de um artista pintando seu próprio autorretrato aparece em um manuscrito francês datado de 1402, escrito pelo autor italiano Giovannio Boccaccio (1313-1375), no qual escreve uma série de biografias em língua latina sobre mulheres famosas (De mulieribus claris – 1374). Em um deles, aparece uma artista da Roma Antiga, “Marcia”, sentada de frente a uma mesa, se retratando com o uso de um pequeno espelho convexo.

Figura 3 - Marcia pintando seu autorretrato, do manuscrito de Boccaccio sobre mulheres famosas, 1402, tinta e cor sobre pergaminho.

O pintor Giotto di Bondone (1267-1337) foi o principal percursor do retrato – possivelmente do autorretrato - e da nova linguagem artística no mundo ocidental (BURCKHARDT, 2012). Há registro de que o pintor, que viveu no fim da era medieval na Itália, século XIII, se retratava utilizando espelhos e buscava sempre uma imagem individual, com a fisionomia mais próxima à realidade. Segundo Burckhardt, “Giotto cuidou com todas as suas forças e decerto com grande distinção a imagem absolutamente individual, a começar pela sua própria, que ele realizou com a ajuda de espelhos” (BURCKHARDT, 2012, p. 57). O pintor e arquiteto italiano Giorgio Vasari (1511-1574) acreditava que Giotto também se incluía em algumas de suas obras encomendadas, como nos afrescos de Assis e na Annunziata, em Gaeta e em Pádua.

Figura 4 - Giotto, Juízo Universal, afresco, 1304-06 Cappella degli Scrovegni, Pádua.

Dante Alighieri (1265-1321) foi um escritor e poeta italiano que teve grande importância à arte do autorretrato. Em sua obra, A Divina Comédia, não só faz referência a diversos autorretratistas como Giotto (que havia pintado o retrato de Dante), como escreve seus próprios quase autobiográficos poemas de amor e usava frequentemente espelhos como símbolos em seus escritos. Dizia o autor que se deve proibir o homem de falar de si mesmo, a não ser que seja extremamente necessário (HALL, 2014). É interessante como Giovanni Villani (1276-1348), cronista italiano, descreve que Giotto usaria mais de um espelho para pintar seu autorretrato, e que havia utilizado alguns também para pintar o retrato de Dante. Uma possibilidade é que ele tenha usado vários espelhos também para estudar a incidência da luz no rosto humano.

Imagina-se que no renascimento os autorretratos eram feitos por artistas membros da aristocracia, e que eles produzissem retratos de si mesmos em busca de status. Na realidade os melhores retratos de artista do século XV não foram feitos por artistas que faziam parte da corte - que na verdade dificilmente trabalhavam unicamente para um patrão – os artistas recebiam encomendas de diversas pessoas. Nesse período, os artistas buscavam retratar a si mesmos como heróis, como seres especiais – assim como na obra de Giogione Barbarello (1478-1510) como Davi, rei de Israel segundo a Bíblia - o que indicava uma maior independência e destaque do artista dentro da sociedade (HALL, 2014).

Figura 5 - Giorgione, Autorretrato como Davi, 1505-10, óleo sobre tela.

Lorenzo Ghiberti (1378-1455) é conhecido por ter feito algumas esculturas com seu retrato em bronze nas portas na catedral do Batistério de Florença. Ele havia aprendido a função de ourives, o que o tornou muito mais qualificado que qualquer outro artesão, e por seu talento é considerado o artista de maior sucesso em seu tempo. Ghiberti foi um dos quatro artistas que Leon Battista Alberti (1404-1472) faz referência em seu manuscrito Della pittura – e o único a produzir um autorretrato sobre o qual haveria um tratado teórico. Alberti foi o primeiro artista/escritor a escrever sua autobiografia e a primeira pessoa desde a antiguidade a escrever sobre a história da arte – o que o torna tão relevante também para a história do autorretrato.

Figura 6 - Lorenzo Ghiberti, Autorretrato, 1447-8, bronze dourado, Batistério de Florença.

A questão é que no Renascimento, diferentemente do período medieval na Europa, havia entre os artistas um rebuscamento dos valores da arte clássica, como o uso da perspectiva, uso de cálculos matemáticos em busca da perfeição na representação pictórica, valorização do realismo de cores e formas e o ressurgimento da ideia de individualidade. Anteriormente, a ideia de “originalidade” de um artista parecia um tanto quanto absurda para qualquer artesão bizantino, egípcio ou chinês. Com a percepção de si mesmo como indivíduo pensante, o artesão criava a oportunidade de não só executar um bom trabalho, mas garantir o prestígio social e ter sua profissão reconhecida como uma profissão liberal (BURCKHARDT, 2012).

Albrecht Dürer foi um pintor e gravurista alemão que ficou muito marcado pela frequência com que se representava, em séries, e pelo fato de assinar sempre suas obras, o que não era comum entre os artistas da época. Ele buscava se retratar como que de modo alegórico, com um caráter icônico como, por exemplo, no quadro em que se fez com a posição, a barba e com as vestes de Cristo. (BURCKHARDT, 2012). Dürer é o pintor não italiano mais celebrado e inventivo criador de autorretratos durante a Renascença. Ao total ele fez cerca de 16 imagens de si mesmo, entre desenhos e pinturas, e pintou a si mesmo como espectador em alguns retábulos. Também fez estudos de suas mãos e pernas. (HALL, 2014).

Figura 7 - Albrecht Dürer, Autorretrato, 1500, óleo sobre painel.

Durante o século XVI não era muito comum se encontrar mulheres retratistas, mas, a partir da edição de 1568 do Le Vite, de Vasari, 13 mulheres retratistas são mencionadas, sendo que na edição de 1550 havia apenas uma. Esse fato talvez tenha se dado pela crescente procura pelo gênero. Em 1556, Sofonisba Anguissola (1532-1625), uma famosa artista italiana - conhecida por ser o artista que mais fez autorretratos antes de Rembrandt - chegaria a trabalhar posteriormente para a família real espanhola. Em uma de suas pinturas, ela faz a si mesma segurando um medalhão. Apesar de já ter 23 anos, parece ter buscado se retratar de maneira que parecesse bem jovem, até de certa forma infantil, o que não era incomum entre os artistas, Parmigianino e tantos outros já teriam feito o mesmo (HALL, 2014).

Figura 8 - Sofonisba Anguissola, Autorretrato segurando um medalhão, 1556, aquarela envernizada sobre pergaminho.

Em certo momento, no século XVI, o autorretrato se tornou um gênero pictórico reconhecido na Itália, com autorretratos dos mestres como Rafael Sanzio (1483-1520), Jacopo Robusti, conhecido como Tintoretto (1519-1594) Ticiano Vecelli (1477-1576), e Girolamo Mazzola, o Parmigianino (1503-1540). A glorificação à vida dos artistas já era feita por Vasari através das biografias que ele escrevia.

O pintor Rembrandt van Rijn (1606-69) se representava em pinturas, desenhos e gravuras em um total de cerca e 100 registros, durante toda a vida, mostrando suas feições desde a juventude até a velhice, numa incomparável autobiografia. Pode-se perceber que o autorretrato, no caso de Rembrandt, tem um caráter completamente novo, de uma espécie de confissão. Ele se retrata com diferentes expressões e poses, parece querer mostrar algo de si, de modo íntimo e sincero (GOMBRICH, 1999).

Figura 9 - Rembrandt, Autorretrato, 1652, óleo sobre tela.

O artesão, por mais que pudesse receber encomendas de diversos tipos de pessoas, sempre acabou sendo um serviçal de reis, das cortes, das academias de arte, de colecionadores e críticos. No século XIX, com o processo de “privatização do gosto” (DEBRAY, 1993, p. 234), em que o artista agora vende suas obras para a mídia, empresas e museus, os papeis se modificam. Ele começa a trabalhar quase que para si mesmo e isto é de suma importância no que diz respeito à produção do autorretrato. O artista adquire fama através de sua arte, e começa a se tornar mais importante que ela própria. O culto à arte se converte no culto ao artista.

Diversos artistas que trabalharam para a corte espanhola fizeram autorretratos para que fossem exibidos juntamente com os da família real, como o italiano Ticiano Vecelli (1485-1576) e o holandês Anthonis Mor (1517-76). Mas um em especial era extremamente ambicioso, o espanhol Diego Velázquez (1599-1660), que em 1656 pinta o quadro As Meninas, em que retrata toda a família real, os criados, o rei, a rainha, e o próprio artista, todos juntos, em seu estúdio. O interessante sobre esse quadro é que ele lança a ideia de um olhar refletido, como se todos os personagens não olhassem para o pintor, Velázquez, que está também retratado ao lado deles, pintando. É como se todos se voltassem ao espectador do quadro, e ao fundo, pode-se ver um espelho onde está o reflexo do rei e da rainha.

Figura 10 - Diego Velázquez, As Meninas, 1656, óleo sobre tela.

Francisco de Goya (1746-1828) em 1799 produziu sua famosa série de gravuras “Os caprichos”, em que fazia uma sátira à sociedade espanhola do século XVIII. Nesta publicação ele colocou na folha de rosto uma gravura com seu próprio autorretrato, com uma expressão enigmática. Esta gravura foi de certo modo inovadora, pois seria um novo tipo de autorretrato, em que o artista finge não olhar para o expectador.

Figura 11 - Francisco Goya, Autorretrato, 1799, folha de rosto de os Caprichos, água forte e água tinta.

Goya acreditava que os artistas à época estavam convencidos de que os erros e vícios humanos poderiam ser objetos da pintura, assim como retratados na série. Esse tipo de pensamento já traria novas ideias para o campo da arte, que provavelmente seriam o embrião do pensamento modernista, no âmbito do autorretrato. A partir do momento em que a arte se torna muito mais subjetiva que objetiva, os artistas fariam as coisas à sua maneira e retratariam o que tem vontade, e com isso o autorretrato ganha força como gênero pictórico e como forma de expressão subjetiva (HALL, 2014).

3.2. As mudanças da concepção na autoimagem no período moderno

As raízes da subjetividade na idade moderna propriamente dita (há autores que consideram que a idade média se estenda até o século XVIII) podem ser encontradas ainda durante a revolução francesa, no romantismo e na revolução social de 1848 e que irão culminar nas principais ideias do que posteriormente surgirão na arte moderna (HARRISON, 2001).

Durante o século XVII e XVIII, na Europa a preocupação com a autenticidade das obras começou a fazer parte do contexto dos artistas. Isso se deu em vista das mudanças que aconteciam no mundo da arte: o aumento do número de exposições abertos ao público, leilões, e proliferação de diversos gêneros como retratos, paisagens e cenas cotidianas. De fato a maior comercialização da arte traria igualmente benefícios: a menor dependência dos artistas em relação a um único patrão seja ele aristocrata eclesiástico ou o próprio Estado (nesse caso específico, logo após a Revolução Francesa).

Gustave Courbet (1819-1877) foi pioneiro da arte realista e liderou a Escola Realista francesa. Em 1854, Courbet informou por uma carta a seu patrão de que já havia feito tantos bons autorretratos durante a vida, que alguns diriam que ele teria escrito sua autobiografia. Para ele, os autorretratos eram uma categoria especial de pintura, que provariam seu próprio desejo de realizar um milagre único, de demonstrar as diferentes mudanças de humor e expressão, de forma realista. De acordo com a mesma carta, Courbet demonstrou seu princípio de vida de pintar de forma autêntica, sem jamais se vender a ninguém em troca de seus ideais (HALL, 2014).

Figura 12 - Gustave Courbet, O homem desesperado, 1844-45, óleo sobre tela.

Suas pinturas ilustram a definição da pintura Romântica feita pelo filósofo Georg Hegel (1770-1831). Ele argumentava que a pintura e a música românticos não expressavam somente o espírito das épocas e dos indivíduos, mas também a vida subjetiva – a aflição, a agonia, os sentimentos profundos, o medo, o amor.

Os artistas de vanguarda, em meados do século XIX, rejeitavam a pintura histórica, gênero mais em voga na época, para buscar temas mais simples para a pintura. Alguns artistas como Cézanne e Monet saíram dos ateliês para pintar ao ar livre, para captar a cor e a luminosidade da paisagem em diferentes horas do dia. Queriam capturar suas impressões transformando a sensação em expressão estética. Por este motivo, eram acusados de não se darem ao trabalho de terminar seus quadros, como se eles aparentassem inacabados. Aliás, por que buscar retratar a realidade se as máquinas fotográficas já o faziam? (HARRISON, 2001).

Em 18 de agosto de 1839, o Institute de France lançou um novo instrumento para se estudar a natureza, o daguerreótipo, o primeiro equipamento fotográfico. O irônico é que a sessão de teste foi realizada na Academia de Ciências, e não na de Belas-Artes. O pintor Paul Delaroche (1797-1856), que costumava pintar batalhas, saiu da sessão alegando que naquele dia, a pintura havia morrido (DEBRAY, p. 263, 1993) Quanto mais os artistas fugiam da representação superficial de si mesmos, a fotografia surgia representando tudo exatamente como era.

Em 1888, a previsão de Delaroche se concretiza e é lançado o primeiro anúncio publicitário da Kodak: “Aperte o botão, nós faremos o resto”. A pintura não seria mais a mesma. Na realidade, em 1850 grande parte dos retratistas profissionais já estavam arruinados, assim como em 1900 seria a ruína dos paisagistas, com a criação do cartão postal. Picasso anunciou que a fotografia havia chegado no momento oportuno para liberar a pintura de toda literatura, da anedota que a envolvia e até mesmo do tema (DEBRAY, 1993).

A condição da agora não semelhança entre o autorretrato e o artista se dá nesse contexto de mudança da representação: agora o autorretrato não é mais de caráter fisiológico, mas psicológico. No período em que nascia o modernismo, a auto representação pareceu muito mais reveladora e sincera do que jamais havia sido. Esta necessidade de auto figuração derivou da angústia do artista em viver em uma sociedade conturbada, com guerras, tecnologias surgindo com uma rapidez assustadora e com uma expectativa muito grande em relação ao “futuro” (HARRISON, 2001).

Os autorretratos modernistas são como monumentos à subjetividade, fazendo contato direto da arte com os espectadores, apesar de os pintores os fizessem para si, para ninguém mais. Uma imensa variedade de artistas modernos pintavam a si mesmos, por vezes de maneira um tanto obsessiva, e ao mesmo tempo extremamente auto reveladora. De qualquer modo, não seria certo defini-los como meramente narcisistas, porque de certa maneira seus retratos mostravam seres depressivos e neuróticos, mas apresentavam o artista assim como ele era. Os autorretratos possuíam mais um caráter confessional.

Vincent Van Gogh (1853-1890) foi um pintor holandês que pintou a si mesmo mais de 20 vezes, e gradualmente adotou o uso de cores vibrantes, com poucos contrastes de claro escuro e com pinceladas marcadas, estilo que ficou conhecido como neoimpressionismo. Van Gogh utilizava seus retratos como forma de expressão, acreditando que eles possuíam vida própria, e pintava vários ao mesmo tempo. De fato pintar a si mesmo o poupava dinheiro, por não ter que pagar um modelo (HALL, 2014). Certa vez, em uma das inúmeras cartas que escreveu a seu irmão Theo, Van Gogh declara que apesar de as pessoas falarem que é difícil conhecer a si mesmo, ele considerava que pintar a si mesmo também não era tarefa fácil, ainda mais se fosse para ser diferente de uma fotografia (GAY, p. 121, 2008).

Por mais que o pintor se encaixasse de certa forma no movimento impressionista, já possuía características modernas, visto que expressava suas aflições e crises em seus quadros e as relatava a seu irmão numa série de cartas que o enviava – as quais estão disponíveis em coletânea no livro Cartas a Theo (L&PM Editores, 2012). Buscava a semelhança na imagem mais profunda do que um fotógrafo buscaria com suas “lentes democráticas” (GAY, p. 121, 2008), essas as quais Van Gogh desprezava, pois, segunda ele, a fotografia se restringia meramente à superfície. Mesmo em quadros em que sua figura não aparece, como na famosa A noite estrelada (1889), pode-se encontrar algo de autobiográfico, sejam nas pinceladas características ou simplesmente por serem imagens de sua mente. O grande destaque de Van Gogh na História da Arte seria inconcebível sem a existência de seus autorretratos.

Figura 13 - Vincent van Gogh, Autorretrato no cavalete, inverno de 1887-8, óleo sobre tela.

Paul Gauguin (1848-1903) pintor também pós-impressionista e amigo de Van Gogh, em 1889 moldou em argila (mais precisamente grés) um caneco com o formato de sua cabeça. Esse novo tipo de representação já dá uma ideia do que estava por vir durante o século XX. A função da arte estava se ressignificando, e o artista inevitavelmente estimula o expectador a observar sua vida privada e doméstica. Essa mistura da arte e da vida privada é o ponto chave que moldará o autorretrato nos movimentos modernistas (HALL, 2014).

Figura 14 - Paul Gauguin, Autorretrato em Jarro, 1889, cerâmica esmaltada.

Se Van Gogh e Gauguin buscavam expor seu íntimo sem pudor, outro grande pintor impressionista, Paul Cézanne (1839-1906), tratava de se retratar de forma mais sutil. Fez cerca de vinte esboços de autorretratos, totalmente espontâneos e nada meticulosos, diferente de seus autorretratos em pinturas, nos quais sempre se retratava um pouco preocupado, distante, talvez demonstrando pelo olhar uma personalidade conturbada e caótica. Em um autorretrato de 1864, Cézanne se retrata a partir de uma fotografia e transformando sua feição comum em uma face de certa maneira ameaçadora, pode-se dizer que tenha sido mais fiel a seu estado de espírito na pintura que na fotografia, em que se mostra preocupado, e até mesmo enraivecido (GAY, p. 123, 2008).

Figura 15 - Fotografia de Paul Cézanne, 1861.

Figura 16 - Paul Cézanne, Autorretrato, 1864, óleo sobre tela.

Pintar a autoimagem nesse contexto pode representar uma busca da eternização da imagem de si mesmo, e de uma preocupação com o eu e com o respeito que o artista agora impunha à sua categoria, pois antes os artistas eram vistos como uma profissão marginal, subordinada às vontades da alta classe ou da Igreja. O objetivo de ser “moderno” se dava ao fato de uma percepção de que o presente era moldado pelo passado, o que não necessariamente era uma concepção de alguns “desajustados”, mas provavelmente se devia a uma mudança da noção de autoimagem por parte significativa da sociedade.

Na verdade existiam muitas preocupações dos artistas referentes às práticas e tradições no âmbito artístico, o que pode ter sido o principal motivo da busca por novas formas e estilos. Começam a surgir mais possibilidades para a expressão plástica e mais liberdade para se autorretratar. Sem serem subordinados, os artistas às escolas de arte, às regras de bom gosto e à merchants e galerias, o subjetivo tem liberdade para florescer. Contra o que pensavam ser uma arte imitativa e voluntária, os modernistas buscavam feições menos artificiais e condenavam o academicismo pois acreditavam que ele engessava a liberdade criativa.

A maior parte da história do autorretrato (assim como do retrato) pós-medieval é a história da semelhança de fisionomia: a história de rostos individuais e dos detalhes dos olhos que diferenciam as feições de cada um. No período moderno, percebe-se gradativamente uma mudança nesse panorama, e os autorretratos começam a mostrar mais cor, expressão e emoção, e menos fidelidade figurativa. Foi também no período moderno quando o autorretrato teve mais destaque no meio cultural. Não só existiram muito artistas que produziram múltiplos autorretratos e em série, como surgiram artistas cujo trabalho consistiu unicamente na produção de autorretratos. Nesse contexto, o gênero ganha cada vez mais interessados e adquirem grande valor comercial, especialmente quando se trata de trabalhos de artistas renomados (HALL, 2014).

3.3. As novas formas da auto representação no século XX

Em 1906, a pintora alemã Paula Modersohn-Becker (1876-1907) havia viajado sozinha para Paris, na noite anterior ao aniversário de seu marido Otto Modersohn, e devido a suas crises de identidade e no casamento, havia escrito uma carta a uma amiga sua. Na carta, Paula dizia não sabia mais como assinar seu nome nos quadros, pois não sentia que era mais uma Modersohn, não era mais Paula Becker, que só buscava se tornar mais e mais ela mesma, e que esse haveria de ser o objetivo de todo mundo, a procura por si mesmo.

Essas crises de identidade e a busca pelo “eu” foi determinante para o desenvolvimento do autorretrato no século XX, porque os artistas começaram a documentar suas vidas em suas obras e registrar isso da maneira mais autêntica possível. Em 1906, ela teria sido a primeira mulher artista a pintar um autorretrato nu. Paula Becker foi sempre uma autorretratista dedicada. Logo após retornar de sua viagem a Paris, grávida, escreveu a Otto que não queria ter o filho dele. Em seguida ela pintou seu maior autorretrato, grávida, em tamanho natural, com trinta anos de idade e no aniversário de seis anos de seu casamento.

Figura 17 - Paula Modersohn-Becker, Autorretrato, 1906, óleo sobre cartão.

Nos anos 20 e 30 na Europa, as autobiografias de artistas e escritores começam a ser chamadas de autorretratos (HALL, 2014). Ainda assim, poucos artistas entre os anos 10-70 contribuíram para o gênero. Um dos motivos óbvios foi o crescimento da arte abstrata e não figurativa, que se opuseram a qualquer tipo de retrato, por mais que se pudesse considerar que mesmo artistas abstratos “pintavam a si mesmos.” Contrariando esse pensamento, existe o texto do historiador alemão Wilhelm Worringer (1881-1965), chamado Abstração e Empatia (1908), no qual o autor insiste que a abstração viria de um impulso de afastar-se de si mesmo. Ele faz uma crítica ao naturalismo, o que ele consideraria ser apenas uma forma de figurar a auto apreciação do artista. Para ele a auto expressão era apenas uma opção, e não uma necessidade.

A “necessidade” pela abstração foi sentida na arte figurativa da mesma maneira, e ajuda a explicar porque os mais importantes artistas figurativos, Henri Matisse (1869-1954), Pablo Picasso (1881-1973), Georges Braque (1882-1963), a maior parte dos surrealistas, Willem de Kooning (1904-1997), Robert Rauschenberg (1925-2008) e Jasper Jonhs (1930-) se mantiveram relativamente indiferentes ao gênero do autorretrato. Picasso é um bom exemplo. Seu interesse pelo gênero se expressou apenas durante os primeiros anos de carreira, como em sua pintura de 1901, Yo Picasso ou em “Autorretrato com paleta” de 1906. Mas em 1908 sua colaboração com Braque resultou na revolução Cubista.

Um dos aspectos mais radicais em relação ao Cubismo é a sua antipatia para com a ideia do artista como gênio. Eles buscavam a ideia do artista como aquele trabalhador mecânico, que esperavam pelo seu pagamento, e deixaram de assinar na frente dos quadros, como tradicionalmente se fazia. A ideia era fazer uma arte anônima. A colaboração entre Picasso e Braque teve seu ponto alto quando, em 1912, eles usaram materiais comuns encontrados para fazer colagens e esculturas. Sua aspiração em serem artistas-trabalhadores humildes foi uma “repaginação” do culto ao artista medieval anônimo e à irmandade artística. Picasso até certa vez brincou que Braque seria sua esposa (HALL, p. 233, 2014).

A abordagem que Braque e Picasso rejeitavam é exemplificada por um livro sobre retrato publicado em 1908, do historiador da Arte alemão, Wilhelm Waetzoldt (1880-1945). Em um dos capítulos, que toma cerca de um quarto do livro, chamado “Psicologia da Auto Representação”, é uma celebração à personalidade (gênio) individual. Segundo o autor, cada autorretrato é produto da “compulsão interna” do artista, uma manifestação do monólogo íntimo, revelando sua personalidade. Múltiplos autorretratos de um mesmo artista poderiam ilustrar o desenvolvimento do “gênio” e os caminhos da autocrítica, como, por exemplo os autorretratos de Rembrandt, que não documentaram sua vida, mas a jornada de mudanças de sua personalidade e seu humor durante os anos. A definição de autorretrato presente em Waetzoldt representa um ideal, sem dúvida, Romântico, de que no autorretrato são encontradas características sensíveis e autobiográficas... Traços, expressões, altivez, os quais seriam invisíveis, não fosse o artista a pintá-las “de dentro para fora” (HALL, 2014).

René Magritte (1898-1967) pintava constantemente pessoas usando chapéu coco, ao que se tem registro, desde 1926-7. E em quase todos seus autorretratos, Magritte também usa um chapéu coco, inclusive em seu quadro Meditações do Viajante Solitário (1926), em que encontra-se um homem de costas, usando chapéu, e um corpo feminino flutuando em primeiro plano, e representaria uma meditação acerca da morte de sua mãe por afogamento, quando o artista era criança. Talvez o homem com chapéu coco seja seu alter ego (HALL, p. 247, 2014).

Figura 18 - René Magritte, Meditações de um Viajante Solitário, 1926, óleo sobre tela.

Magritte foi o artista que trouxe a ideia de identidade anônima. Ele dizia que tentava ter certeza de que a verdadeira pintura não fosse identificada, que fosse o “menos visível” possível, evitando qualquer efeito estilístico. Para ele, o autorretrato se apresentava como um “problema de consciência”. Em seu autorretrato O Filho do Homem (1964), ele se representa como um homem trajado em paletó, com chapéu coco e uma maçã na frente do rosto. Parece trazer um simbolismo bíblico do pecado original, cegando o homem com uma espécie de máscara, e com a consequente perda da individualidade. Trabalhos como esse teriam sido de grande influência para os Neodadaístas, para a Pop Art e para a Arte conceitual nos anos 60 e 70. O conceito de retrato do mestre se desfazia em obras como essa, numa espécie de morte do autor, por anonimato.

Figura 19 - René Magritte, O Filho do Homem, 1964, óleo sobre tela.

Em retrospectiva, a artista mexicana Frida Kahlo (1907-1954) aparece como uma ponte entre o anonimato do autorretrato do começo do século XX e a obsessão pelo corpo do artista na segunda metade do século. Um rosto sem expressão, como se fosse uma máscara, faz parte de seu trabalho. Seu primeiro autorretrato data de 1926, e tal feição se modifica muito pouco com o passar dos anos. Frida produziria um tipo moderno de retrato, pois possuía características de certa forma hermafroditas, como sobrancelhas grossas e um bigode. Em sua obra Pensando sobre a morte (1943), ela faz seu autorretrato com uma caveira no meio da testa. O autorretrato, nesse sentido, parece fazer referência ao método da lobotomia, introduzido em meados dos anos 1930, em que eram seccionadas partes do cérebro pré frontais e do tálamo, como tratamento de doenças psiquiátricas. Nas obras de Frida parece haver um sentido de sentimento reprimido e sofrimento.

Figura 20 - Frida Kahlo, Pensando sobre a Morte, 1943, óleo sobre tela.

Suas obras eram extremamente autobiográficas. Eram reflexo de sua vida, das dificuldades que havia passado, a poliomielite que teve quando criança, seu relacionamento conturbado com o artista Diego Rivera (1886-1957), e do acidente que sofreu em 1925, quando fraturou a coluna e a pélvis. Durante sua recuperação desse acidente, começou a pintar autorretratos com a ajuda de um espelho à beira de sua cama. Além das dores crônicas que sentia, e as diversas cirurgias que teve de fazer durante a vida, seu marido Rivera, com quem se casou duas vezes, constantemente a traía, inclusive com sua própria irmã – o que a causava ainda mais angústia.

Kahlo poderia facilmente ser considerada uma terceira geração expressionista. Ela falava pouco sobre seu trabalho, mas quando fazia – como em uma carta de 1939 - dizia que seus autorretratos eram a maneira mais sincera e real de expressar o que sentia sobre si mesma e sobre o que existia à sua volta. Suas obras também trazem um paradoxo entre rosto e corpo, homem e mulher, europeu e mexicano. (HALL, p. 250, 2014)

Pintado durante seu divórcio, o quadro As Duas Fridas (1939), existem duas versões da artista, uma vestindo roupas tipicamente mexicanas e a outra, vestindo roupas europeias. Uma veia passa de uma das Fridas à outra, como um cabo de telefone que liga os dois corações. No colo da Frida europeia, o sangue do seu coração cortado escorre, como em uma referência ao culto cristão do Sagrado Coração de Jesus. Pelo fato de já ter estudado medicina anteriormente ao seu acidente, Kahlo constrói o conceito da relação entre expressão artística e patologia (HALL, 2014).

Figura 21 - Frida Kahlo, As Duas Fridas, 1939, óleo sobre tela.

Edvard Munch (1863-1944) foi um artista norueguês que mudou consideravelmente a ideia de autorretrato, especialmente ligada ao ato fotográfico. Depois de 1900, ele pintou um autorretrato por aniversário, somando 42, além dos autorretratos em centenas de desenhos, 57 fotografias e 20 gravuras. Munch tinha a fama de ser excêntrico e de manter relacionamentos com outros homens durante o tempo que viveu e expôs seus trabalhos na Alemanha, nos anos 1890.

Depois do fim de seu relacionamento conturbado com Tulla Larsen, Munch começa a se pintar de forma andrógina e hermafrodita do pescoço para baixo. A androginia era um ideal simbólico, um emblema da autossuficiência. Esse ideal já havia sido trazido por Platão em seu livro O Banquete (380 a.C.), em que considerava que a humanidade teria começado toda como andrógina até que se separassem os sexos entre homem e mulher (HALL, p. 221, 2014). Munch torna seu corpo feminino, mas só do pescoço para baixo. Em Autorretrato no Inferno (1903) ele se encontra, como um Frankenstein, com um corpo afeminado à frente do que parece ser uma paisagem de caverna em chamas, vermelha e laranja. Mais tarde ele faria diversos autorretratos andróginos, inclusive com grandes seios.

Figura 22 - Edvard Munch, Autorretrato no Inferno, 1903, óleo sobre tela.

Alguns outros artistas já teriam se representado como andróginos. Gauguin teria se imaginado com características femininas e masculinas, em um autorretrato que fez para Van Gogh; o ilustrador Aubrey Beardsley (1872-1898) descreveu a si mesmo como uma mulher espreitando um sátiro com grandes seios em Retrato dele mesmo na cama (1894); e de 1920-41 Marcel Duchamp (1887-1968) tinha um alter ego Rrose Sélavy: ele assinava trabalhos no nome dela e se vestia com roupas de mulher.

Figura 23 - Marcel Duchamp como Rrose Sélavy – 1920-1921

Ao analisar a tendência que surge em relação ao autorretrato moderno ser aquele de corpo inteiro, expressando uma subjetividade, sem necessariamente mostrar o rosto, existe uma despersonalização do artista, tendo em vista que as feições e os olhos são o principal indício da individualidade. Friedrich Nietzsche (1844-1900) considerava raso esse narcisismo que surgia nos artistas contemporâneos. A cultura do espelho de corpo inteiro teve um papel importante no novo simbolismo do corpo.

Esse tipo de visão possivelmente foi base para a profunda subjetividade expressa nos autorretratos modernos e contemporâneos, tendo também em vista o conceito da relação observador-obra que se mesclam, em uma espécie de ligação que se torna inseparável entre duas coisas que sempre foram distintas, a arte e a vida. A visão sobre a obra - ou sobre a fonte de Narciso - irá variar dependendo das lentes que a observam.

4. O Autorretrato contemporâneo e a produção de Andy Warhol

Esse capítulo busca trazer à luz fatos relacionados ao autorretrato da segunda metade do século XX em diante, desde o surgimento da arte contemporânea e as novas concepções de como o artista se vê e se mostra para a sociedade. Não seria possível traçar uma história fiel da autorretratística contemporânea sem comentar sobre a influência que Andy Warhol (1928-87) trouxe à produção artística e ao pensamento contemporâneo no âmbito das Artes Plásticas.

4.1. Autorretrato contemporâneo

No início do século XX, a pintura abstrata começa a surgir com a ideia de fugir de tudo aquilo que era considerado ilusão, o que de fato foi condenado pelos modernistas, pois era característica fundamental da própria pintura tradicional. Os cubistas buscavam representar a forma pura, a essência do objeto, rompendo com o ponto de vista renascentista e rejeitando a imitação da natureza. Porém, uma forma de autorretrato gestual centrado no corpo do artista começou a emergir em meados dos anos 1950, em reação à pintura abstrata, especialmente a americana. O abstracionismo era o movimento artístico com maior prestígio nos países não comunistas nos anos 1950-65 e associado não só à liberdade de expressão (os nazistas e comunistas o haviam banido), mas também ao individualismo.

Jackson Pollock (1912-1956) foi um pintor abstracionista norte americano e pioneiro do estilo pictórico conhecido como Action Painting, que em movimentos performáticos, com a tela no chão, Pollock jogava tinta nela de forma aleatória - atos que eram geralmente filmados e fotografados. O crítico de arte Harold Rosenberg (1906-1978), em um famoso artigo “The American Action Painters” (1952), declarou que a tela era uma espécie de arena onde se deveria atuar, e que a foto era o registro do “evento”. Segundo ele, a pintura como ação é inseparável da biografia do artista, e que a nova pintura havia quebrado qualquer distinção entre a arte e a vida. Para Rosenberg, esse ato não era um diário comum, mas uma experiência quase mística em que o “eu” alcança a autorrealização. De fato, esse conceito se tornou tão forte que Jackson Pollock teria sido o único artista em que sua imagem ao executar a obra foi mais influente que as próprias obras (HALL, p. 255, 2014).

Figura 24 - Jackson Pollock em seu estúdio, s/d.

As imagens e vídeos de Pollock e o artigo de Rosenberg acabaram por influenciar diversos artistas e escultores a interagir com seus trabalhos e com o ambiente ao redor, o que deu origem à Performance - significa “desempenho”, em português. Nessas performances, a ação que o artista realizava era filmada ou fotografada, pois além da obra em si, o registro era essencial.

Em Self-Painting, Self-Mutilation (1965), Günter Brus (1938-) pintou suas roupas e seu corpo de branco e performou em frente à câmera como estivesse se mutilando, com facas, tesouras, machado, abridor de garrafa e diversos outros objetos. Ele caminhou dessa maneira pelo centro de Viena, capital da Áustria, como um Frankenstein mumificado, porém foi preso por perturbação. No dia seguinte, decidiu fazer uma colagem documentando a ação, com fotografias intercaladas com alfinetes, lâminas e canivetes. Em 1968, depois de performar atos obscenos cantando o hino austríaco, Brus deixou o país por uma condenação de seis meses de prisão.

Figura 25 - Günter Brus, Sem título, 1965, fotografia.

"IMAGEM FORTE"

O autorretrato vai perdendo o sentido místico, profundo, e adquire um sentido muito mais de registro diário, e de certa forma, mais grotesco. Jim Dine (1935-) em sua performance O Trabalhador Sorridente (1960), que durava 32 segundos foi performado em Nova York. No vídeo, ele chega ao estúdio vestido em uma bata com as mãos e pés pintados de vermelho, com sobrancelhas e boca pintadas de preto. Ele ficou em frente a uma tela grande pendurada na parede, e usando três baldes com tinta azul, laranja e vermelha, escreveu I LOVE (EU AMO) em azul seguido de WHAT I AM (O QUE SOU) em laranja. Ele então tomou a tinta vermelha (que era molho de tomate), depois de derrubar a tinta que não utilizou na própria cabeça e pulando sobre a tela.

Figura 26 - Jim Dine, O Trabalhador Sorridente, 1960, vídeo.

Apesar das numerosas documentações de autorretratos de artistas em ações performáticas, nos anos 1970 o crítico americano Max Kozloff (1933-) escreveu um artigo chamado A Divisão e o Escárnio de Si Mesmo, que seria uma espécie de obituário do autorretrato. Segundo ele, os autorretratos são os defuntos da arte moderna, são aqueles assuntos sobre os quais ninguém espera mais ver. Apesar dessa declaração de certa forma apocalíptica, Kozzloff estaria anunciando uma renovação que havia começado desde os anos 60 (HALL, p. 257, 2014).

Os corpos ou rastros de artistas estiveram presentes de diversas formas em uma exposição de 1963 do escultor Robert Morris (1931-), e fazia referência aos conceitos de identidade, autobiografia e virilidade. Melhor conhecida como I-Box, a obra era uma estante de compensado com uma porta pintada de giz rosa com formato de “I”. A porta aberta revelava uma foto do artista nu com um largo sorriso e com o pênis parcialmente ereto. Portrait foi também uma obra de Morris em que ele pintou várias garrafas de cinza e em cada uma delas colocou seu sangue, suor, esperma, saliva, lágrima, urina e fezes; Self-Portrait era um eletroencefalograma que indicava as ondas cerebrais do artista.

Figura 27 - Robert Morris, I-Box, 1962, madeira e fotografia.

"IMAGEM FORTE"

Esses tipos de relíquias autorreferenciais certamente fazem parte do legado do “culto ao artista”. Moldes das mãos e rosto de artistas foram incluídos em museus durante o século XIX e partes do corpo foram preservadas, como no caso de Antonio Canova (1757-1822), com seu coração e sua mão direita. O neodadaísta italiano Piero Manzoni (1933-63) vendeu impressões digitais em edição limitada, latas com seu próprio excremento e balões cheios com sua própria respiração fixados à uma base assinada de madeira.

Trabalhos nesse estilo questionam noções românticas do artista gênio e da individualidade, e colocam o artista no papel de palhaço, bobo e até mártir. Para Max Kozloff, o autorretrato contemporâneo representaria um enigma, um desmembramento, uma despersonificação, o auto estranhamento, a crueldade e o pavor. O narcisismo se tornou um conceito importante nos círculos da contra cultura desde a publicação de Herbert Marcuse (1898-1979) de Eros e Civilização – Uma Interpretação Filosófica do Pensamento de Freud de 1955.

Dentro da psicanálise, o narcisismo seria meramente uma fase inicial de desenvolvimento que precisaria crescer em cada um de nós. Marcuse tornou Narciso a chave da libertação do “eu”. O Narciso de Marcuse desafia a cultura de repressão capitalista do trabalho, do progresso e da produtividade (também da reprodutividade). Narciso ultrapassa a oposição entre homem e natureza, e quando ele morre, continua a viver como flor. Ele não somente ama a si mesmo por não saber que aquela imagem é seu reflexo; seu sentimento é estendido para fora, dando a ele um sentimento oceânico que transborda ao seu redor (HALL, p. 260, 2014).

O Narciso de Marcusi possivelmente seria mais tarde um ícone da geração flowerpower. A artista japonesa Yoyoi Kusama foi fotografada deitada em meio a sua instalação Narcissus Garden (1966), que continha cerca de 1.500 bolas refletivas de plástico, as quais ela vendia.

Figura 28 - Yoyoi Kusama, Narcissus Garden, 1966, esferas de aço inoxidável.

4.2. Andy Warhol – Uma visão geral

Andy Warhol (1928-87) foi um artista americano que é considerado o pioneiro da Pop Art e teve destaque pelo uso de diversos meios alternativos nas artes plásticas. Fazia diversas experimentações e não tinha escrúpulos para imaginar e mesclar a pintura com a fotografia. Foi o primeiro artista a expor videoarte. Em seus trabalhos era usada predominantemente tinta serigráfica para fazer impressões sobre linho, tinta acrílica, além da numerosa quantidade de fotografias.

Andy Warhol veio de uma família bem simples de imigrantes da Tchecoslováquia e nasceu e cresceu em Pittsburgh, nos EUA durante a Grande Depressão. Vivia com seu pai, sua mãe e seus dois irmãos mais velhos, os quais passavam dificuldades financeiras, e por vezes por não ter o que comer, compravam sopas Campbell”s, que só bastando adicionar água quente já estavam prontas e alimentavam. Aos oito anos de idade passou por uma desordem neurológica e acabou por ficar confinado em casa, sem poder ir à escola por aproximadamente um ano. Aos cuidados da mãe, que tentava distraí-lo comprando para ele revistas de celebridades, quadrinhos, livros de colorir, certamente foram influências que deram o pano de fundo para seus trabalhos artísticos na vida adulta. (LARRATT-SMITH, 2010)

Em 1949, pouco depois de terminar o colégio, por não poder pagar por uma faculdade de artes, Andy Warhol foi viver em Nova York, aos 21 anos. Iniciou sua carreira ainda jovem como ilustrador comercial, e fazia diversas ilustrações para revistas de moda, como a Vogue, a Harper's Bazaar e The New Yorker, e apesar de bem sucedido, Warhol sempre desejou ser um artista famoso. Em busca disto, nos anos 50 pôs em circulação um série de desenhos homoeróticos, o que chocou bastante os padrões da época e acabou por ser rejeitada pelas galerias de arte. Com este tipo de experiência e apesar de sua condição como homossexual, Warhol desenvolvia seu estilo e aprendia a se adaptar às demandas dos grandes colecionadores e de seu conteúdo extremamente heterossexual (LARRATT-SMITH, 2010).

Devido à constância com que lia revistas de celebridades na infância e na crescente glamorização dos artistas que ocorria nos anos 50, nos Estados Unidos em especial, Warhol pensava seus trabalhos no âmbito da fama, do glamour, da riqueza, e criou sua autoimagem baseado nisso, afinal, as celebridades eram nada mais que valores de troca, ícones com personalidades criadas pela publicidade - por exemplo Marilyn Monroe como símbolo sexual (LARRATT-SMITH, 2010).

A PopArt, inaugurada por Warhol, foi caracterizada pela visão de que a arte, assim como todo os produtos industrializados na economia de mercado capitalista, era nada mais que uma mercadoria como qualquer outra. O que realmente importava era se as obras seriam vendidas ou não, e em face a isso, a beleza, a importância estética e o valor transcendente do trabalho pouco importavam (ARCHER, p.117, 2001).

O pensamento vigente da classe artística à época nos Estados Unidos estava centrado no repúdio à Guerra no Vietnã da classe artística nos Estados Unidos fazia os artistas buscarem formatos não tradicionais, como a performance ou alguma outra linguagem que demonstrasse algo de mais profundo, que não fosse vendável, pois isso era visto como uma forma de resistência ideológica e de força política.

Esse tipo de pensamento de politização de qualquer obra de arte se opunha à crença de que as mensagens artísticas deveriam ser simples e sem caráter ambíguo. As questões individuais do artista se tornavam agora coletivas. Ao mesmo tempo em que Andy Warhol produzia suas serigrafias com ícones da cultura pop, os artistas de modo geral, que há algumas décadas carregavam o pensamento moderno atrelado à individualidade e à aversão às associações, se uniam em grupos que buscavam afirmar que o artista era responsável por estabelecer o conceito de sua obra e ao mesmo tempo por produzi-la. Durante os anos sessenta, em meio a diversos movimentos surgindo, o questionamento principal era em relação ao sentido da atividade artística. Os artistas buscavam agora novas formas de pensar a arte, como e o que pintar. (GIANOTTI, p.117, 2004).

Nos anos 1960 os artistas de certa forma ganham autonomia, mas o autorretrato se perde no paradoxo entre ação política e produto banal. Tanto na coletividade quanto na banalização da própria imagem, o autorretrato perde o sentido. De qualquer modo, Warhol descartava que a arte deveria emanar algum tipo de espiritualidade ou subjetividade e transformou o ato artístico em um ato mecânico, com caráter de operação empresarial.

Durante anos na história os artistas sempre representaram a si mesmos e as coisas ao seu redor. Warhol parecia acreditar que aquele mundo de consumo desenfreado em vivia os EUA também poderia ser representado, todas aquelas celebridades e aquelas marcas famosas. Warhol parecia buscar uma ruptura entre a alta cultura na cultura popular, qualquer objeto poderia ser arte (LARRATT-SMITH, 2010).

Suas exposições por vezes pareciam-se mais com supermercados, expondo o que qualquer pessoa nos Estados Unidos poderia adquirir, uma garrafa de coca cola ou uma lata de sopa, fosse o presidente dos Estados Unidos ou qualquer cidadão comum. Ele quebrou com a ideia de que as obras de arte possuíam uma “aura”, que fossem feitas para ser observadas em galerias com paredes de cores neutras, como teria acontecido por muito tempo no meio artístico.

Em seu ateliê, Andy contava com diversas pessoas que trabalhavam para ele na produção, e sua produção era em série, como em uma fábrica, por isso mesmo ele o batizou de The Factory. Ele constantemente desconstruía a ideia de o artista ser necessariamente um artesão talentoso, e afirmava que qualquer um poderia fazer arte (LARRATT-SMITH, 2010). Ao que se pode perceber, Warhol não pensava a arte tão politicamente, via mais como uma forma de fazer negócios. Em entrevista, perguntado se acreditava no American Dream, Warhol responde que não, mas que se poderia ganhar muito dinheiro com ele (LARRATT-SMITH, p.79, 2010).

Segundo o escritor Edmund White (1940-), Warhol teria contestado todas as definições de arte, uma a uma. Se a arte revela a mão do artista, Warhol usou o processo serigráfico; se a obra de arte é uma peça única, Warhol produziu múltiplos; Um pintor pinta, mas ele fez fotografias e filmes, e uniu o que antes era diverso: arte e produto comercial. Andy assinava qualquer objeto como se fosse sua obra de arte e enviava sósias seus em turnês de palestras (DANTO, p. 93-94, 2012).

4.3. Self-made man - O homem se torna sua própria obra de arte

Se você quer saber tudo sobre Andy Warhol, é só olhar para a superfície: das minhas pinturas, dos meus filmes e de mim, eu estou lá. Não há nada por trás disso.”

Andy Warhol.

Na Grécia antiga, acredita-se que a pintura começou traçando-se um contorno sobre a sombra projetada de um homem. Para eles, a sombra simbolicamente representava a alma – ou o duplo – da pessoa. Já para Warhol, o mundo real não pode ser representado, ele seria como um negativo do mundo ficcional. (GIANOTTI, 2004). Andy Warhol produzia seus autorretratos de modo mecânico, como se não retratasse a ele mesmo, como se fosse qualquer outra pessoa, e a imagem era baseada nas fotos que ele tirava com Polaroids. Era como se as fotos fossem o negativo e a imagem representada como um positivo, apenas imagens refletindo outras imagens, como espelhos. Se suas fotos eram a realidade, então talvez ele mesmo fosse uma sombra.

O retrato certamente foi um gênero importante na obra de Warhol. Todos os seus trabalhos eram feitos em série, como a da já citada Marilyn, dos famosos Elvis Presley, Liz Taylor, Mao Tsé-Tung, Vladimir Lênin e até mesmo a Mona Lisa.

Mas quanto à autoimagem, Warhol talvez ele tenha sido o primeiro artista a se fotografar em série. Ele considerava que as obras de arte não teriam uma “aura” a ser admirada, mas uma obra sem aura seria uma imagem banal. Por isso seus autorretratos parecem ter sido tirados aleatoriamente, de maneira meio experimental, banal. De certa forma, Warhol acabou por ser um visionário em seu tempo, sem jamais imaginar que em questão de décadas, os autorretratos fotográficos se tornariam extremamente democráticos e seriam produzidos desenfreadamente.

Figura 29 - Andy Warhol, Autorretrato (fotografias de passaporte), 1956.

O autorretrato fotográfico é também um tema que se torna impossível de não falar ao descrever sua obra, principalmente no fim de sua vida, nos anos 1980, quando começa a trabalhar praticamente só com a fotografia. Visto que a linguagem fotográfica era a principal usada em revistas e jornais, e isto se tornava mais familiar ao espectador, já a partir de 1960 Warhol abandona o desenho que lhe era tão usado no início da carreira, e começou a aprender fotografia para fazer com que seu trabalho fosse mais vendável. Em 1979, Andy foi um dos artistas convidados pela Polaroid Corporation para testar a câmera fotográfica Big Shot, que estava em desenvolvimento pela empresa, e com a qual ele começa a experimentar e realizar diversos autorretratos (LARRATT-SMITH, 2010).

Figura 30 - Andy Warhol, Autorretrato (“peruca assustada”), 1986, Polaroid™.

Tentando recriar sua própria imagem, Warhol encontra na drag queen a personificação perfeita, onde ocorre a identificação com a feminilidade, representando aquele homem que se rebela contra a biologia, rejeitando a própria anatomia como destino. As drags usam nomes compostos e seu comportamento é baseado em acessórios, cenas, performances do universo feminino, o que choca e não diferencia mais o real do irreal, o masculino do feminino. Em um primeiro momento, Warhol deu às drags papeis em seus filmes amadores, que tinham explícito conteúdo sexualmente transgressor. Warhol não era uma drag queen, mas o fato de tirar Polaroids com suas perucas – tinha uma coleção delas - e de se maquiar como mulher, era como se representasse seu alter ego feminino, assim como havia feito Marcel Duchamp, décadas antes.

Figura 31 - Andy Warhol, Autorretrato como drag queen, 1980, Polaroid™.

A maior obra de arte de uma drag é ela mesma, sua montagem, a maquiagem, as roupas, todo o figurino. A “montagem” de um homem como drag queen é um comportamento certamente autobiográfico, pois ele produz uma espécie de ilusão de seu próprio corpo, um trompe l'oeil. Inspirado nesta ideia e na mescla de realidade e ficção que a publicidade cria na mente das pessoas, Andy Warhol, num ato performático e extremamente inovador, criou a si mesmo como uma marca, o que fez com que sua fama pessoal fosse maior ainda que a fama de seus trabalhos. Na realidade ele usava sua imagem para divulgar suas pinturas e filmes.

Por meio da observação e estudo se pode notar que esse culto ao artista era anterior a Warhol, como no caso do já citado Pollock, que possuía mais fama que seus próprios quadros (HALL, 2014). Ele era a celebridade. Talvez o fosse de maneira acidental, mas Andy Warhol propositalmente buscava se promover e transformou a si mesmo em sua própria obra (LARRATT-SMITH, p. 84, 2010). Andy Warhol se torna então a versão travestida de si mesmo.

Mais que um artista, Warhol era visto como um homem de negócios. Frequentemente era visto cercado de ricos e famosos, de “pessoas da moda”. Tinha compulsões por compras e por colecionar objetos que não estavam em alta. De um simples ilustrador de revistas se transformou em um artista cool, blasé, com seus óculos Ray Ban, jaquetas de couro e seu aspecto andrógino. Este comportamento de androginia e decadência foi certamente o que influenciou artistas como David Bowie (que se diz que tinha uma obsessão por Warhol), Lou Reed, Iggy Pop, Kiss, New York Dolls e no Brasil, os Secos e Molhados (LARRATT-SMITH, 2010).

Figura 32 - Andy Warhol, Autorretrato, 1986, grafite sobre papel HMP.

Gianotti em seu artigo “Andy Warhol ou a sombra da imagem” (2004) confessa sempre ter tido a sensação de que os autorretratos de Warhol parecem estar ausentes. O artista trabalhava muito com a ideia da repetição das imagens, com o múltiplo, baseado no trabalho de De Chirico, artista modernista italiano, de quem Andy era grande admirador exatamente pelo uso das repetições, por isso sua produção de autorretratos (e no geral) sempre foi de certa forma obsessiva, desde a infância. Mesmo em suas obras em que ele não aparecia, parecia haver algo de autobiográfico, de íntimo. Em uma de suas mais famosas pinturas, “The Skull” (1976), a figura de uma caveira é impressa e pintada em série, Warhol dizia que aqueles poderiam ser os retratos de cada um de nós.

Figura 33 - Andy Warhol, A caveira (The skull), 1976, tinta acrílica e serigráfica sobre linho.

Em 1968, Valerie Solanas, uma escritora um tanto desequilibrada que costumava frequentar a Factory tentou atirar nele. Warhol após ser atingido de raspão e sobreviver disse que sentiu como se tivesse morrido. Sua constante ansiedade em relação a mortalidade, aos 14 anos ao viver a morte de seu ausente pai e ao observar tragédias diariamente nas capas de jornais o deixava atônito e o fazia produzir sempre trabalhos relacionados ao tema. Suas obras recomendavam uma insensibilidade do espectador, para que fossem observadas sem nenhum conteúdo emocional. Por mais que mostrassem a violência, era como se traduzissem uma indiferença a ela, uma banalização. Mesmo seus autorretratos trouxessem imagens irreais, fictícias, ainda assim pareciam buscar eternizar sua figura, enganar a natureza – e a morte (LARRATT-SMITH, 2010).

De fato suas pinturas, assim como em diversos movimentos artísticos do século XX e em especial no Minimalismo, não traziam nenhum significado, não revelavam nada, nenhum simbolismo oculto. Não era preciso estar munido de grandes conceitos e conhecimentos para ver. Estava ali. Mas diferente do Minimalismo, em que o trabalho falava por si só, nada importa o artista, na Pop o artista é mais importante que a própria obra.

Warhol se tornou um ícone mesmo para as pessoas que conheciam pouco sobre arte. Em 1965, em uma retrospectiva do artista, realizada no Institute of Contemporary Art, na Filadélfia, um multidão de 2 mil pessoas aguardava a presença do artista, e mesmo o curador do evento, Sam Green, não esperava uma multidão dessa ordem. Houve muita gritaria, empurra-empurra, e as pessoas aclamavam por Andy e sua parceira, Edie. Tal comportamento em um museu de arte jamais poderia ser imaginado, pois é um local onde se esperaria silêncio e respeito. Ninguém de fato parecia ter ido à exposição por conta dos trabalhos expostos. Após o evento, Warhol declara que era apenas uma exposição de arte pop, porém, a exposição eram eles (DANTO, p. 26, 2012).

Convencionalmente se pensa o autorretrato e a própria pintura como uma expressão subjetiva e íntima de um artista, no qual ele dedica tempo e trabalho ao fazer, mas Andy Warhol desvinculou o fazer artístico à espiritualidade e ao esmero. Transformou-os em simples imagens de consumo rápido, separados de qualquer vivência e aproximou a arte ao mercado acionário, de um modo jamais antes imaginado, em que seu nome assinado na obra valia mais que o conteúdo estético da obra – e isso reverbera na arte atual, no dito “conceito da obra”.

5. O autorretrato na obra de artistas contemporâneos

Esse capítulo final busca fazer uma breve abordagem sobre a obra de alguns artistas contemporâneos que trabalham com o tema do autorretrato no âmbito da pintura e do desenho.

5.1. Scott Hutchison

É um artista americano, nascido em 1973. Depois de se graduar na universidade George Washington em 1999, continua a pintar em seu ateliê em Arlington, no Texas. Explorar todas as facetas da figura humana continua a ser seu objetivo na arte. No início da carreira costumava representar paisagens monocromáticas, mas nos últimos anos suas pinturas retomaram a cor e a imagem em movimento, as animações começaram a fazer parte de seu processo criativo. Na animação, a pintura se move através da superfície pictórica, resultando em uma imagem com fluxo contínuo e sensação de movimento.

Figura 34 - Scott Hutchison, Shift, s/d, óleo sobre linho.

Suas animações combinam a pintura tradicional e técnicas de desenho com a arte digital para criar retratos animados e são expostas em pequenos painéis de LCD ou projetadas em larga escala. Cada vídeo é composto de múltiplos retratos em pintura ou desenho e possuem diversas variações de tratamento e cor. Quando animadas, suas pinturas variam as cores e formatos na superfície, resultando em um retrato que se modifica continuamente.

Em seu tríptico, nomeados separadamente como Displaced, Shift e Counterpoint, Scott trabalha na investigação da imagem em movimento. Em cada uma das pinturas, existem camadas de figuras que se sobrepõem e criam um ritmo próprio, que chega a levar os olhos à abstração. Nesse tríptico, o artista explora a ideia de que todos somos fruto de nossas experiências. Esta série é fruto de 15 anos de trabalho em cima de pinturas fragmentadas que o artista vem fazendo e a estética é baseada em antigas obras de Scott. Todas têm cerca de 60 por 81 cm e são pintadas à óleo sobre linho.

Figura 35 - Scott Hutchison, Displaced, s/d, óleo sobre tela.

Enquanto a pintura e a animação dominam as técnicas as quais Scott utiliza, conceitualmente ele explora sua própria identidade e introspecção, através da análise minuciosa de seu rosto. Alguns trabalhos mostram uma face sem expressão, ao mesmo tempo em que outras mostram feições exageradas, por vezes ameaçadoras. O espectador é levado a supor quais das tais personalidades condizem com a verdadeira identidade do artista. O questionamento principal em seu trabalho é se necessariamente existe uma constância na personalidade humana, mesmo que uma face mude sua expressão sutilmente ou se contorça de maneira drástica em uma pintura, isso isoladamente talvez não defina quem a pessoa realmente é.

Seu próprio corpo é a base de estudo para seus trabalhos. De qualquer maneira, o artista não acredita que seu trabalho seja só sobre autorretratos. Scott argumenta que seus desenhos e pinturas, apesar de se assemelharem muito a sua própria imagem, são muito mais relacionados ao estudo de diversas expressões faciais e mudanças de humor de modo genérico do que uma forma de expressão subjetiva. Há um distanciamento, e é como se o artista pintasse um modelo qualquer, a diferença é que esse modelo encontra-se em frente ao espelho.

Figura 36 - Scott Hutchison, Counterpoint, s/d, óleo sobre linho.

Apesar da impessoalidade de seu trabalho, Scott frequentemente contempla a noção de self. Perguntas como “Quem sou eu?” também fazem parte do trabalho do artista, por mais que sejam de certa maneira coadjuvantes no processo pictórico. De qualquer modo, este conjunto multifacetado de identidades e diferentes experiências é inspirador para ele. Esse personagem o qual ele anima, desenha e pinta continua a ser seu objeto de arte. Ele manipula suas cores e contorce sua face, criando diferentes camadas de sua própria identidade.

Hutchison aproxima a vida e o processo da animação descrevendo-os como eventos de eterna mudança. De um dia para o outro, as experiências na vida tomam diferentes formas como em cenas de um filme, e a reflexão sobre isto culmina na nossa compreensão de mundo e da verdade. A animação também possui uma série de pequenos momentos, que unidos formam uma só imagem, assim como a própria vida.

5.2. Bryan Lewis Saunders

Bryan é um artista americano, nascido em 1969. Esse artista é interessante pois ele trabalha de modo um tanto excêntrico. Trabalha com desenhos, pinturas, performances e áudios que sempre envolvem ele de alguma forma. Bryan é o tipo de artista que dedica sua carreira quase que completamente à autoimagem.

Durante os últimos 21 anos, Bryan criou por volta de um autorretrato por dia, e garante que o fará pelo resto da vida. Ele começou o projeto dia 30 de março de 1995 e até o momento já produziu mais de 10.300 autorretratos. Segundo Saunders, assim como as impressões digitais, os flocos de neve e o DNA, nenhum autorretrato é igual, mesmo que seja da mesma pessoa.

Por centenas de anos, os artistas se pintaram em meio a representações do mundo ao seu redor. Saunders faz o exato oposto; coloca o mundo como pano de fundo de si mesmo, refletindo sobre como nosso cérebro percebe as experiências. O artista se preocupa mais em canalizar as experiências do que simplesmente guardar memórias de sua própria face. Mas faz ambas as coisas.

Um de seus projetos que chamou atenção das pessoas certamente foi o projeto Under the Influence, em que o artista ingeriu um tipo de substância diferente por dia - entre drogas lícitas, ilícitas e substâncias estimulantes no geral- durante semanas. Cada dia em que ele usasse uma droga diferente deveria fazer um desenho de si mesmo, utilizando materiais diversos. O objetivo do projeto era avaliar o efeito que as drogas fariam na percepção que ele teria de si mesmo. Por sorte, Bryan não teve nenhum dano que fosse irreversível após a experiência.

Figura 37 - Bryan Lewis Saunders, Under the Influence – 20mg de Valium, 2001, materiais diversos.

Figura 38 - Bryan Lewis Saunders, Under the Influence – Cogumelos, 2001, materiais diversos.

Figura 39 - Bryan Lewis Saunders, Under the Influence – Ativan/Haloperidol, 2001, materiais diversos.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Observamos um maior interesse no autorretrato em certas épocas, como no Renascimento italiano, onde o estilo foi aprofundado no estudo da fisionomia. Porém, o autorretrato tem sido mais relevante na sociedade contemporânea do que nas que a precederam.

A maior parte da história do autorretrato (assim como do retrato) pós-medieval é a história da semelhança de fisionomia. No período moderno, percebe-se gradativamente uma mudança nesse panorama, e os autorretratos começam a mostrar mais cor, expressão e emoção, e menos fidelidade figurativa. O autorretrato vai perdendo o sentido místico, profundo, e adquire um sentido muito mais de registro diário, e de certa forma, mais grotesco. O autorretrato contemporâneo representaria um enigma, um desmembramento, uma despersonificação, o auto estranhamento, a crueldade e o pavor.

Leone-Battista Alberti (1404-72), em seu livro Della pittura (1435), trata do aspecto intelectual da pintura e de suas origens. Segundo o autor, Narciso, da lenda grega do homem que se apaixona pelo seu reflexo, teria sido o inventor da pintura, na medida em que a origem da pintura para Alberti é mais baseada na essência do pintar que na própria origem formal. Pintar teria o sentido de “abraçar, envolver uma imagem com o olhar”, assim como Narciso fez ao tentar alcançar sua imagem no reflexo na água e nunca se alcançar, se transformando depois em flor.

Se Narciso acredita que a imagem que observa refletida na fonte é seu próprio reflexo “pintado”, e não outra imagem, uma analogia pode levar a crer que o que se reflete na pintura – como ilusão - é a imagem do espectador que o observa, pois todo olhar é subjetivo. “Sou, portanto, sempre eu que me vejo no quadro que olho. Sou (como) Narciso: acredito ver um outro, mas é sempre uma imagem de mim mesmo” (DUBOIS, p.143, 1993).

7. REFERÊNCIAS

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WOLF, Norbert, Ingo F. (ed). Romantismo. Editora Taschen, 2008.  


Publicado por: Isabel Carpes Napoli

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