A Lei Seca e as alterações no Código de Trânsito Brasileiro por um trânsito mais seguro

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1. Resumo

O presente artigo visa apresentar um estudo sobre os impactos da Lei 11.705, também chamada de Lei Seca, no trânsito do Rio de Janeiro, e suas alterações. Fica demonstrada nesta pesquisa, a necessidade de tornar o Código de Trânsito Brasileiro mais rígido a fim de reduzir as estatísticas de óbitos e acidentes causadores de sequelas por vezes irreparáveis, e os custos que tais acidentes geram ao sistema de saúde no Brasil. Destacando o princípio da supremacia, fica claro o dever do Estado instituído pela Constituição Federativa do Brasil no que se refere aos direitos individuais e coletivos e, observa-se como ferramenta eficaz no combate ao binômio álcool e direção, as campanhas educativas e as operações de fiscalização que objetivam assegurar o direito à segurança da população. Para tanto, foram pesquisados dados estatísticos em anuário do Detran.RJ bem como analisadas matérias relevantes e opinião de estudiosos do assunto. Serão apresentadas as transformações ocorridas ao longo dos anos desde que a Lei foi sancionada em 19 de junho de 2008, levando a população a adotar uma mudança no comportamento. O tema central do artigo foi um levantamento das modificações realizadas em alguns artigos do Código de Trânsito Brasileiro – CTB, que dispõem sobre a infração de conduzir o veículo sob a influência de álcool, mais precisamente dos artigos 165 e 277, trazendo medidas mais rigorosas. A pesquisa será do tipo bibliográfico e aborda o estudo através da compreensão do Código de Trânsito Brasileiro.

Palavras-chave: Trânsito; Acidentes; Beber e Dirigir; Educação no Trânsito; Lei Seca.

2. Introdução

A Carta Magna de 1988 traz em seu preâmbulo a missão de assegurar à população o exercício dos direitos sociais e individuais, o bem-estar e a segurança, e o Código de Trânsito Brasileiro - CTB, em atenção a Lei suprema, objetiva garantir o trânsito em condições seguras para toda a sociedade. Assim, a administração pública atua para defender os interesses coletivos atendendo aos princípios constitucionais da legalidade, impessoalidade, moralidade face o poder/dever nela investido.

Através de seus departamentos de trânsito, as unidades da federação proporcionam, além da fiscalização, campanhas de educação. Também, durante todos os anos, entre os dias 18 e 25 de setembro, é promovida a semana nacional de trânsito, na qual todos os órgãos que compõem o Sistema Nacional de Trânsito são convocados a participar de ações que sensibilizem a sociedade, oportunizando uma reflexão quanto à responsabilidade do cidadão no que tange à mobilidade e convocando a população, desde condutores de veículos automotores e ciclistas até pedestres e passageiros, para a escolha por um trânsito mais seguro.

Fazem parte do Sistema Nacional de Trânsito, os seguintes órgãos e entidades, como indicado no Código de Trânsito Brasileiro, art. 7º, Seção II:

I – o Conselho Nacional de Trânsito (Contran), coordenador do Sistema e órgão máximo normativo e consultivo;

II – os Conselhos Estaduais de Trânsito (Centran) e o Conselho de Trânsito do Distrito Federal (Contrandife), órgãos normativos, consultivos e coordenadores;

III – os órgãos e entidades executivos de trânsito da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios;

IV – os órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios;

V – a Polícia Rodoviária Federal;

VI – as polícias militares dos estados e do Distrito Federal; e

VII – as Juntas Administrativas de Recursos de Infrações (Jari).

Ter cidadãos conscientes não é somente um desejo dos legisladores, mas da população que assiste o trânsito dizimar anualmente milhares de vítimas e busca alcançar um maior rigor na lei para reprimir comportamentos de condutores irresponsáveis.

Faz parte da cultura nacional o hábito de beber que por vezes é influenciado por campanhas de marketing da indústria do álcool e outras pelo consumo em eventos comemorativos, contudo, quando combinado com direção, torna-se o grande vilão no que diz respeito à segurança viária e pode, por vezes, ser fatal ou vetor de danos físicos e traumas tantas vezes irreversíveis.

A Resolução do CONTRAN nº 432 de 23 de janeiro de 2013 diz que quanto à conduta, o condutor embriagado pode mostrar-se agressivo, arrogante e disperso, dentre outras. Somando a estas características a visão distorcida, a falta de noção quanto à velocidade do próprio carro e de outros veículos e a redução de reflexos causada pela ingestão do álcool que torna mais difícil a realização de múltiplas atividades, atributo imprescindível quando se está na condução de um veículo, obtém-se a combinação letal que muito contribuiu para agravar as estatísticas de acidentes causados por imprudência. Cabe ao poder público prezar pela vida que é o direito e o bem maior a ser tutelado, devendo ser objeto de questionamento e cuidado, toda e qualquer ameaça a ela imputada.

O aumento no número de acidentes automobilísticos envolvendo motoristas alcoolizados foi fator preponderante para a criação da Lei nº 11.705 de 19 de junho de 2008, conhecida popularmente como Lei Seca, que transforma em crime de perigo abstrato o delito de dirigir alcoolizado. A partir do momento que a pessoa ingere álcool e conduz um veículo, mesmo sem a intenção, ela assume o risco de lesionar outro indivíduo. Assim, destaca-se a função central da Lei Seca, que é a conscientização e a diminuição dos acidentes de trânsito e dos transtornos que causa um condutor alcoolizado à sociedade. Em anos posteriores a lei enrijeceu com a finalidade de tratar de forma mais severa os abusos ao volante.

Em 2012, a Lei nº 12.760 reduziu para zero a tolerância no nível de álcool no sangue de quem dirige. Em 2014, a Lei Federal 12.971 foi mais uma tentativa do Congresso Nacional para reduzir os números alarmantes de mortes no trânsito brasileiro, apenando de forma mais rigorosa os condutores imprudentes. Em 2016, o Código de Trânsito se torna mais rigoroso com a Lei nº 13.281, pois gera mudanças em relação ao valor das multas e inclui o art. 165-A no capítulo das infrações. Este artigo versa sobre a recusa de submeter-se ao teste do etilômetro e tem a mesma força do art. 165 que dispõe sobre o condutor que dirige atestadamente alcoolizado. Em 2017, com a Lei nº 13.546, foi incorporada ao Código de Trânsito Brasileiro a previsão de pena de reclusão de cinco a oito anos para o condutor que praticar crime culposo na direção de um veículo automotor sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência.

Assim, as alterações no Código de Trânsito, as intensas campanhas educativas e a fiscalização, contextualizam as formas de aprendizado: um grupo entende que beber e dirigir é perigoso e que cria um risco desnecessário para a coletividade. O outro grupo somente reflete sobre seu comportamento após sofrer as consequências de suas ações quando se apercebe que o binômio beber e dirigir gera para si e para a sociedade grandes prejuízos financeiros. Além disso, há o constrangimento de ter seu direito de dirigir suspenso ou cassado, e, ainda pior, existe a dor pela perda de um ente querido ou a dor por tirar a vida de alguém ocasionando sequelas psicológicas não raro difíceis de reparar.

Desta forma, as penalidades previstas no Código de Trânsito Brasileiro são uma forma de desencorajar o cometimento de uma infração assegurando à população o direito à vida a ela garantindo através da Constituição da República Federativa do Brasil e do Código de Trânsito Brasileiro.

3. O Código de Trânsito Brasileiro e a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988

O Código de Trânsito Brasileiro, em seu art.1º, §1º dispõe: “Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga”. Ainda, no Anexo I, define trânsito como a movimentação e imobilização de veículos, pessoas e animais nas vias terrestres. Ele define atribuições das autoridades e órgãos ligados ao trânsito do Brasil e fornece diretrizes para a engenharia de tráfego além de estabelecer normas de conduta, infrações e penalidades para os usuários das vias (BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro, 1997, p. 20).

O primeiro Código Nacional de Trânsito surgiu em 28 de janeiro de 1941 através do Decreto nº 2.994 que foi revogado após oito meses de vigência, recebendo então, nova redação via Decreto nº 3.651 de 25 de setembro de 1941. Foi criado, a partir deste decreto, o Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, subordinado ao Ministério da Justiça, e os Conselhos Regionais de Trânsito – CRT, nas capitais dos Estados. O segundo Código Nacional de Trânsito (Decreto-Lei nº 3.651/41) teve vigência por mais de 20 anos e foi revogado em 1966, pela Lei nº 5.108/66 de 21 de setembro de 1966.  (Wikipedia, 2020)

Em 23 de setembro de 1997, foi promulgada, pelo Congresso Nacional, a Lei nº 9.503, que instituiu o Código de Trânsito Brasileiro – CTB em substituição ao Código Nacional de Trânsito. A lei entrou em vigor em 22 de janeiro de 1998 e, logo em seu artigo primeiro, estabeleceu aquela que seria a maior de suas diretrizes: que o “trânsito seguro é um direito de todos e um dever dos órgãos e entidades do Sistema Nacional de Trânsito" (BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro, 1997, p. 01).

O Código de Trânsito Brasileiro, respeitando a Convenção de Viena e o Acordo MERCOSUL, tem como base as premissas estabelecidas na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, que afirma em seu preâmbulo propiciar, dentre outros, a segurança, o bem-estar, do povo brasileiro, e a elenca no art. 6º quando trata dos direitos sociais e mais especificamente no art. 144 § 10 que dita sobre a segurança pública:

§ 10. A segurança viária, exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do seu patrimônio nas vias públicas:

I - compreende a educação, engenharia e fiscalização de trânsito, além de outras atividades previstas em lei, que assegurem ao cidadão o direito à mobilidade urbana eficiente; e

II - compete, no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, aos respectivos órgãos ou entidades executivos e seus agentes de trânsito, estruturados em Carreira, na forma da lei.

Lembrando o disposto no Código de Trânsito Brasileiro, art. 1, § 2º que diz: “O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito”. Percebe-se o trânsito como direito fundamental nas dimensões individual, social e coletiva. Traçando um paralelo com o Capítulo II da Constituição da República Federativa do Brasil, que é um resumo de como devem ser garantidos os direitos fundamentais dos indivíduos no país, observa-se no art. 5º os direitos e deveres individuais e coletivos:

“Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade” (BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil).

Fica demonstrado, portanto, que todo o direito de trânsito deverá estar formatado a partir das premissas constitucionais previamente estabelecidas.

4. O Estado e a administração pública

À administração pública é conferido o poder instrumental denominado “poder de polícia” que representa as intervenções estatais frente à liberdade e propriedade dos indivíduos. Como explica Gasparini (2008), "o condicionamento da liberdade e da propriedade dos administrados aos interesses públicos e sociais é alcançado pela atribuição de polícia administrativa ou, como é comumente designado, poder de polícia". Tal poder é observado no Código de Trânsito Brasileiro de 1997 quando estabelece a competência dos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição regular e controlar o uso das vias públicas e, em especial, concede aos cidadãos o direito de dirigir, desde que sejam cumpridas as exigências legais e estes cidadãos não representem um risco à sociedade e à vida das pessoas que com eles dividem as vias.

Cretella Júnior (2006) diz que o “poder de polícia é a faculdade discricionária da Administração de, dentro da lei, limitar a liberdade individual em prol do interesse coletivo”.

Já Madeira (2008) conceitua: “o poder de polícia é uma prerrogativa outorgada pela Administração Pública a seus agentes, que lhes dá o poder-dever de agir em nome desta. É através dessas ações que o Estado intervém nas relações sociais, que é o seu real objetivo”.

As definições apontam para um mesmo fim: a sociedade, que é o bem maior para a administração pública e que deve ser por esta preservada. Logo, não é o indivíduo em si o destinatário da atividade administrativa, mas sim todo o grupo social. O Estado passou a caracterizar-se como o Welfare State (Estado/bem-estar), dedicado a atender ao interesse público. “As relações sociais, logicamente, ensejarão, em determinados momentos, um conflito entre o interesse público e o interesse privado, mas, ocorrendo esse conflito, há de prevalecer o interesse público” (CARVALHO FILHO, 2011).

O poder de polícia acima explanado é sustentado pelo princípio da supremacia do interesse público que por sua vez está intrinsecamente vinculado à legalidade, formando o pilar do direito administrativo e estabelecendo as prerrogativas, privilégios e autorização que a administração pública possui em relação aos particulares. Di Pietro (2007) afirma que o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado “exige da Administração comportamentos que atendam às necessidades emergentes da vida em comunidade e não aos interesses dos entes que exercem a função administrativa”.

Importa registrar que a Administração tem a obrigação de praticar atos que atendam a sociedade como um todo e estes atos têm que ser convenientes para esta sociedade. Havendo conflito entre o interesse público e o particular deverá sempre prevalecer o interesse público.

Assim, a condução de veículo automotor sempre será regida pela supremacia do interesse público, sendo o Poder de Polícia (preventivo ou repressivo), o seu instrumento primordial quando tratamos do direito de dirigir. (CIRINO, 2015).

5. Grave Problema de Saúde Pública

O Dossiê Trânsito do ano de 2019 do Departamento de Trânsito do Rio de Janeiro reporta que, segundo o Ministério da Saúde, a cada 15 minutos uma morte é registrada nas ruas e estradas do país. Dados da Organização Mundial de Saúde mostram que no mundo, o trânsito é a causa número um de morte de crianças e adultos entre cinco e 29 anos (Global Status Report on Road Safety, 2018). Isso mostra que políticas públicas voltadas para a segurança no trânsito são extremamente necessárias já que é uma das principais causas de mortes não só no Brasil, mas no mundo. Ao trânsito cabe todo o destaque, pois, não diz respeito somente ao deslocamento de um lugar a outro, mas é uma questão social e política ligada às características da nossa sociedade. O Dossiê relata que:

No Estado do Rio de Janeiro, as mortes e lesões decorrentes de acidentes de trânsito acometem um altíssimo número de vítimas anualmente. Os acidentes com vítimas fatais correspondem a 9,6% de todas as mortes do estado (incluindo mortes por causas naturais ou externas, como mortes violentas por arma de fogo), vitimizando principalmente condutores jovens e adultos e pedestres idosos. Mesmo com a redução dos óbitos e lesões ao longo dos anos 2010, os acidentes de trânsito continuam se destacando como um grande problema para a população fluminense, inclusive no interior do estado. Em média, 6 pessoas morreram e 75 se lesionaram por dia no estado do Rio de Janeiro, no ano de 2018.

Nesse contexto, o número de óbitos causados por acidentes de trânsito é um indicador negativo para o setor de saúde. Além do impacto das perdas humanas, de custos imensuráveis, ainda há o impacto financeiro. O aumento da mortalidade e acidentes com lesões graves, principalmente em jovens, onera progressivamente os gastos com tratamentos hospitalares, acrescidos dos prejuízos ligados aos anos produtivos perdidos.

A tabela do IPEA/ANTP demonstra os custos dos acidentes de trânsito:

Figura 1 - Custos médios segundo a gravidade do acidente (dez./2014) (Em R$).

Conforme pesquisa no Dossiê, os acidentes apresentam-se como um problema vivenciado cotidianamente pela população. No ano de 2018, 1.957 pessoas morreram e 27.520 se lesionaram no trânsito, no estado do Rio de Janeiro. Os acidentes de trânsito incluem predominantemente os atropelamentos e colisões. E, pode-se acrescentar que o consumo de bebidas alcoólicas pode ser apontado como um dos principais fatores responsáveis pela alta incidência dos acidentes com vítimas (DETRAN.RJ, 2019).Os gráficos abaixo apresentam os números de vítimas fatais e não fatais causados por acidentes envolvendo álcool e direção:

Figura 2 - Vítimas fatais - Estado do Rio de Janeiro

Figura 3 - Vítimas não fatais - Estado do Rio de Janeiro

Mas, de forma geral, continua a análise do Dossiê, “pode-se ver que os acidentes de trânsito passaram a ter redução após o ano de 2012”. Acredita-se que a queda na trajetória dos indicadores possa ser resultado das alterações no Código de Trânsito Brasileiro – CTB (DETRAN.RJ, 2019, p. 12).

Na sede do Detran.RJ funciona o NAVI – Núcleo de Apoio a Vitima de Trânsito que tem como objetivo principal oferecer apoio a todos os que sofrem com as sequelas físicas e psicológicas, consequências da violência no trânsito, sejam as vítimas propriamente ditas ou os seus familiares. O NAVI realiza atividades em grupo nas quais os integrantes compartilham vivências e oferece atendimento psicológico individual, sempre que constatada a sua necessidade (DETRAN.RJ).

Cabe destacar nessa batalha, o Seguro sobre danos pessoais causados por veículos automotores de via terrestre - DPVAT, originalmente amparado pelo Decreto-lei nº 73, de 1966, recepcionado pela nova ordem constitucional como lei complementar, e depois disciplinado pela Lei nº 6.194, de 1974. O Seguro DPVAT é um direito de todo e qualquer cidadão acidentado em território nacional, seja motorista, passageiro ou pedestre. Ele é reconhecido como um relevante instrumento de proteção social dos mais de 210 milhões de brasileiros, oferecendo cobertura abrangente para todas as vítimas de acidentes de trânsito registrados em território nacional (Seguradora Líder).

Ainda, percebe-se que a prevenção de acidentes no trânsito e intervenções focadas na segurança de motoristas, passageiros e pedestres deve ser uma preocupação constante, pois representam um forte desafio para o sistema de saúde. Quando não há óbito, existem os custos de internação ou simplesmente de atendimento, os custos com previdência, com fisioterapia, sem contar com o custo social de um cidadão que não pode mais desempenhar um trabalho na comunidade. Conclui-se, portanto, que os prejuízos não ficam apenas para a vítima ou sua família, mas impactam financeiramente no Sistema Único de Saúde – SUS. Tanto o Estado quanto a sociedade devem estar empenhados nas intervenções voltadas para a segurança dos motoristas e na contínua redução dessas estatísticas.

6. A Lei Seca

Sabe-se que os problemas no trânsito não são recentes e que, com o aumento da população e o acréscimo de veículos conduzidos por particulares, houve um agravamento das condições de trafegabilidade. Não fossem esses fatos bastante relevantes para a aplicação de leis mais severas, somem-se as condições de violência trazidas à sociedade por condutores que combinam álcool e direção.

Desta forma, para tratar da segurança de uma sociedade já cansada de ter seus direitos violados por crimes ao volante praticados por motoristas embriagados, entrou em vigor a Lei nº 11.705 de 19 de junho de 2008 (Lei Seca) alterando o Código de Trânsito Brasileiro de 1997 com o intuito de conscientizar o cidadão da gravidade do ato de beber e dirigir, estabelecendo, contudo, uma margem de tolerância na indicação do grau de alcoolemia.

Desde que foi editada, a Lei Seca sofreu alterações aprofundando regras que já eram duras para a realidade nacional. A primeira delas foi em 2012, quando a Lei nº 12.760 estabeleceu pena de detenção, multa e suspensão da habilitação aos motoristas que conduzam o veículo “sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência”.

Mais severa e proporcionando um maior rigor punitivo à conduta da embriaguez ao volante, a Lei nº 12.760 reduziu para zero a tolerância no nível de álcool no sangue de quem dirige. Seu objetivo era reduzir os acidentes e transtornos causados pelo uso do álcool combinado à direção de um veículo, fator de risco para acidentes de trânsito. Nenhum nível dessa substância no organismo é seguro quando se trata de conduzir um automóvel. Assim, “Qualquer concentração de álcool por litro de sangue ou por litro de ar alveolar sujeita o condutor às penalidades previstas no art. 165”, conforme disposto no art. 276 do Código de Trânsito Brasileiro.

Capítulo XV - DAS INFRAÇÕES

Art. 165

Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)

Infração - gravíssima; (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)

Penalidade - multa (dez vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses. (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)

Medida administrativa - recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo, observado o disposto no § 4º do art. 270 da Lei no 9.503, de 23 de setembro de 1997 - do Código de Trânsito Brasileiro. (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)

Parágrafo único. Aplica-se em dobro a multa prevista no caput em caso de reincidência no período de até 12 (doze) meses. (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)

Como revela Araújo (2016), em seus comentários ao art. 306 do Código de Trânsito Brasileiro:

A alteração do CTB, pela Lei n. 12.760/12, teve como objetivo principal contrapor o posicionamento do Poder Judiciário, que vinha se consolidando no sentido da obrigatoriedade de mensuração da quantidade de álcool no organismo do condutor, tendo em vista que a redação anterior do artigo 306 exigia a quantidade mínima de seis decigramas de álcool por litro de sangue. Com o novo texto, A alteração do CTB, pela Lei n. 12.760/12, teve como objetivo principal contrapor o posicionamento do Poder Judiciário, que vinha se consolidando no sentido da obrigatoriedade passou a ser possível punir criminalmente os condutores que são flagrados sob visível influência de álcool, mas se recusam a se submeter aos testes de alcoolemia, sendo possível, segundo o seu § 2º, a configuração do crime até mesmo por meio de vídeo e prova testemunhal da condição do acusado.

Em 04 de maio de 2016, o Código de Trânsito se torna ainda mais severo com a Lei nº 13.281, que gera grandes mudanças em relação ao valor das multas bem como quanto ao tempo que o condutor poderá ter a carteira de habilitação suspensa e, especialmente é incluído no Código o art. 165-A que dispõe sobre o condutor que se recusar a submeter-se ao teste do etilômetro.

Art. 165-A.

Recusar-se a ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa, na forma estabelecida pelo art. 277:

Infração - gravíssima;

Penalidade - multa (dez vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses;

Medida administrativa - recolhimento do documento de habilitação e retenção do veículo, observado o disposto no § 4º do art. 270.

Parágrafo único. Aplica-se em dobro a multa prevista no caput em caso de reincidência no período de até 12 (doze) meses.

O art. 165-A trata da recusa à submissão dos procedimentos elencados na Resolução CONTRAN nº 432 DE 23/01/2013, por sua vez, prevê que o condutor que negar-se a realizar testes ou exames que certifiquem a influência dessas substâncias também configura infração gravíssima. Esta Resolução dispõe sobre os procedimentos a serem adotados pelas autoridades de trânsito e seus agentes na fiscalização do consumo de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência, para aplicação do disposto nos arts. 165, 276, 277 e 306 da Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 - Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e traz, especificamente em seu art. 3º, §2º que a autoridade de trânsito priorizará o uso do etilômetro em ações de fiscalização. Não sendo necessária a realização (ou sequer a oferta) de mais que um dos procedimentos determinados.

Assim, o art. 277, que anteriormente tratava da recusa, passa a ter a seguinte leitura:

Capítulo XVII - DAS MEDIDAS ADMINISTRATIVAS

 277

O condutor de veículo automotor envolvido em acidente de trânsito ou que for alvo de fiscalização de trânsito poderá ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que, por meios técnicos ou científicos, na forma disciplinada pelo Contran, permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa que determine dependência. (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)

§ 1º (Revogado). (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)

§ 2º A infração prevista no 165 também poderá ser caracterizada mediante imagem, vídeo, constatação de sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora ou produção de quaisquer outras provas em direito admitidas. (Redação dada pela Lei nº 12.760, de 2012)

§ 3º Serão aplicadas as penalidades e medidas administrativas estabelecidas no art. 165-A deste Código ao condutor que se recusar a se submeter a qualquer dos procedimentos previstos no caput deste artigo.

(Redação do § 3º dada pela Lei nº 13.281, de 2016)

Em 2016, a Lei nº 13.281 também passou a considerar infração gravíssima, com valor pecuniário multiplicado por dez, a recusa do condutor a ser submetido a teste, exame clínico, perícia ou outro procedimento que permita certificar influência de álcool ou outra substância psicoativa. No ano seguinte, com o advento da Lei nº 13.546/2017, foi incorporada ao Código de Trânsito Brasileiro a previsão de pena de reclusão de cinco a oito anos para o condutor que praticar crime culposo na direção de um veículo automotor sob a influência de álcool ou qualquer outra substância psicoativa que determine dependência. (BRASIL, Código de Trânsito Brasileiro).

Como é sabido, a Constituição Federal estabelece no art. 5° (dos direitos e garantias fundamentais) o direito de não produzir provas contra si e o Código de Trânsito Brasileiro, inclusive, não estabelece a obrigatoriedade de o condutor submeter-se ao exame do bafômetro, sendo permitida a recusa, contudo, mantém a infração administrativa conforme previsão legal, atualmente, as mesmas impostas ao motorista cujo resultado do teste do bafômetro atestou o consumo de álcool.

Segundo a OMS, na maioria dos países, associar álcool e direção tem sido causa importante de acidentes de trânsito com vítimas fatais. Nos Estados Unidos, no ano 2000, cerca de meio milhão de pessoas sofreram lesões e 17 mil morreram em acidentes de trânsito provocados pelo álcool. Na Suécia, Holanda e Reino Unido, a proporção de vítimas fatais entre os condutores de veículos com alcoolemia elevada foi de aproximadamente 20% em anos próximos a 2002. (WORLD HEALTH ORGANIZATION, 2009).

Leve-se em conta, ainda, que o álcool é metabolizado de forma diferente em cada organismo. Vários fatores como idade, sexo, raça e peso, por exemplo, devem ser tomados em consideração quando se pensa em sua absorção.

Pode-se afirmar que, ainda hoje, apesar de todos os esforços para educar os condutores no que tange à alcoolemia, os dados da Associação Brasileira de Medicina do Tráfego – ABRAMET (2020), indicam que o uso do álcool está estreitamente ligado às mortes por acidentes de trânsito e, mundialmente, em cerca de 35% a 50% das mortes registradas nas vias, constata-se a presença de álcool.

Doze anos após a Lei Seca entrar em vigor, o Rio de Janeiro se destaca no cenário nacional com a Operação Lei Seca, tida como uma política pública permanente no Estado do Rio de Janeiro, e, apresenta resultados importantes na conscientização da população. O Rio de Janeiro já fiscalizou mais de dois milhões de condutores cumprindo sua determinação de orientar que a cultura do respeito ao ato de não beber e dirigir faça parte do dia a dia dos cidadãos.

Não bastam, no entanto, campanhas exaustivas e fiscalizações diárias; o condutor deve se conscientizar que impinge à sociedade elevados riscos quando dirige após consumir bebida alcoólica; conduzir seu veículo com ingestão zero de álcool não deve significar receio de uma autuação pesada ou receio de ter o direito de dirigir suspenso, mas deve mostrar o nível de educação e conhecimento sobre o trânsito e especialmente, respeito à vida do próximo e a dele próprio.

Como instrui o Código de Trânsito Brasileiro, o condutor deverá, a todo o momento, ter domínio de seu veículo, dirigindo-o com atenção e cuidados indispensáveis à segurança do trânsito; ele deve tomar consciência de que é responsável por um trânsito seguro. A segurança pública também se faz com segurança no trânsito.

O Código de Trânsito prevê no art. 306 sobre a conduta considerada crime de trânsito, qual seja, conduzir um veículo com a capacidade psicomotora alterada em razão do consumo de álcool ou de outra substância psicoativa. Seus § 1º e 2º especificam os limites e as formas de constatar o crime descrito nesse artigo e as penas para quem conduzir um veículo nas condições previstas em tal artigo são detenção de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor como descrito:

Art. 306

Conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência:

Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

§ 1º. As condutas previstas no caput serão constatadas por:

I - concentração igual ou superior a 6 decigramas de álcool por litro de sangue ou igual ou superior a 0,3 miligrama de álcool por litro de ar alveolar; ou

II - sinais que indiquem, na forma disciplinada pelo Contran, alteração da capacidade psicomotora.

§ 2º. A verificação do disposto neste artigo poderá ser obtida mediante teste de alcoolemia ou toxicológico, exame clínico, perícia, vídeo, prova testemunhal ou outros meios de prova em direito admitidos, observado o direito à contraprova.

§ 3º. O Contran disporá sobre a equivalência entre os distintos testes de alcoolemia ou toxicológicos para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo.

(Redação dada pela Lei nº 12.971, de 2014)

§ 4º. Poderá ser empregado qualquer aparelho homologado pelo Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia - INMETRO - para se determinar o previsto no caput.

(§ 4º incluído pela Lei nº 13.840, de 2019)

Segundo informação da Agência Brasil, a Polícia Rodoviária Federal (PRF) apresenta dados nos quais indica que desde a mudança na lei para a tolerância zero o número de acidentes ocorridos por influência de álcool tem diminuído. Cabe destacar que em 2011 foi criado um Plano Nacional de Redução de Acidentes, com a meta de reduzir em pelo menos 50% o número de mortes no trânsito até 2020, determinado pela resolução da Organização das Nações Unidas (ONU). Esta Organização estabeleceu o período de 2011 a 2020 como a “Década de Ações para Segurança no Trânsito” (AGÊNCIA BRASIL, 2018).

A Lei Seca completou 12 anos em 2020 em meio a um cenário político favorável à revisão das regras do Código de Trânsito Brasileiro. Atualmente, pode-se afirmar que a Lei Seca é uma das legislações mais rigorosas no mundo e desde o ano que entrou em vigor, passando por suas alterações em 2012 e 2016 poupou mais de 40 mil vidas conforme indica um estudo da Escola Nacional de Seguros.

A Associação Brasileira de Medicina de Tráfego (Abramet), por meio do seu diretor Flávio Adura destaca que tal lei deve ser vista como “uma bandeira que não podemos deixar enfraquecer”, deve-se pelo contrário, tornar a aplicação da legislação ainda mais firme. José Montal, outro diretor da Abramet complementa:

“Os efeitos da bebida alcoólica na condução de veículos são inúmeros, causando um impacto significativo e crescente na morbimortalidade por acidentes de trânsito. Qualquer quantidade de ingestão alcoólica pode prejudicar a direção veicular e a segurança de trânsito. O álcool afeta negativamente a segurança viária por causar prejuízo à cognição, à performance e ao comportamento do condutor que esteja sob sua influência”.

7. Suspensão do direito de dirigir por descumprimento dos arts. 165 e 165-A

O Código de Trânsito Brasileiro, pela redação da Lei nº 13.281/2012, instrui em seu art. 261 que a suspensão do direito de dirigir será aplicada por soma da pontuação registrada na Carteira Nacional de Habilitação e em casos em que as infrações por si só já prevejam a suspensão. Estas infrações que por si só já preveem a suspensão do direito de dirigir são chamadas mandatórias. É um rol taxativo e inclui as infrações amparadas pelo art. 165 e pelo art. 164-A.

A penalidade de suspensão do direito de dirigir será imposta nos seguintes casos:

II - por transgressão às normas estabelecidas neste Código, cujas infrações preveem, de forma específica, a penalidade de suspensão do direito de dirigir. (Inciso II incluído pela Lei nº 13.281, de 2016)

§ 10. O processo de suspensão do direito de dirigir referente ao inciso II do caput deste artigo deverá ser instaurado concomitantemente com o processo de aplicação da penalidade de multa. (§ 10 incluído pela Lei nº 13.281, de 2016)

A Resolução CONTRAN nº 723 de 06 de fevereiro de 2018 endossa a Deliberação CONTRAN nº 163, de 31 de outubro de 217, que dispõe sobre a uniformização do procedimento administrativo para imposição das penalidades de suspensão do direito de dirigir e de cassação do documento de habilitação, previstas no art. 261 do Código de Trânsito Brasileiro, e dispõe em seu art. 3º:

Art. 3º A penalidade de suspensão do direito de dirigir será imposta nos seguintes casos:

I - sempre que o infrator atingir a contagem de 20 (vinte), no período de 12 (doze) meses;

II - por transgressão às normas estabelecidas no CTB, cujas infrações preveem, de forma específica, a penalidade de suspensão do direito de dirigir.

Tratando-se das infrações mandatórias, a Resolução 723/2018 instrui:

Seção II

Por Infração Específica

Art. 8º Para fins de cumprimento do disposto no inciso II do art. 3º, o processo de suspensão do direito de dirigir deverá ser instaurado da seguinte forma:

I - para as autuações de competência do órgão executivo de trânsito estadual de registro do documento de habilitação do infrator, quando o infrator for o proprietário do veículo, será instaurado processo único para aplicação das penalidades de multa e de suspensão do direito de dirigir, nos termos do § 10 do art. 261 do CTB.

Institui-se dessa forma, as infrações híbridas, ou seja, quando o infrator (condutor) é o proprietário do veículo e comete infração do tipo mandatória. Sendo este o caso, será instaurado um processo único para a aplicação das penalidades de multa e suspensão do direito de dirigir, respondendo assim, de maneira mais célere à demanda da população por um trânsito seguro.

8. Políticas públicas para a prevenção de acidentes

Os acidentes de trânsito ou acidentes de transporte terrestre (ATT), assim como a violência, têm merecido destaque no cenário mundial como importantes problemas de Saúde Pública. Tais agravos atingem principalmente homens e mulheres jovens, em idade ativa, gerando enormes custos sociais para esses indivíduos, suas famílias e comunidades das quais participam, além do grande impacto econômico, sobretudo no que se refere às despesas com assistência à saúde.

Araújo (2016) ensina que Educação e Fiscalização possuem o mesmo objetivo: a mudança de comportamento. Segundo ele, são ações que se agregam e se complementam, posto que a imposição de multa aos infratores busca corrigir aquilo que a ação educativa não foi capaz de fazê-lo.

9. Campanhas educativas e fiscalização

A Lei Seca através da conscientização dos transtornos que causa à sociedade um condutor alcoolizado, objetiva preservar vidas reduzindo acidentes de trânsito, e, desde a sua implantação, vem provocando mudanças nos hábitos da população brasileira pelas ações de fiscalização acrescidas das campanhas educativas promovidas. Quando se dirige sob o efeito de álcool, não é somente a vida do outro que está em risco, mas a sua própria. O consumo de bebida alcoólica provoca alterações do comportamento e das noções de perigo, inibindo barreiras morais e causando perda da autocrítica; esses motoristas são mais propensos a dirigir em alta velocidade, resultando em acidentes mais graves. O álcool pode alterar percepções e comportamentos, aumentar a agressividade e diminuir a atenção, prejudicando a aptidão de um condutor e tornando a direção veicular insegura, é o que indica O DNIT – Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes.

O Governo do Estado do Rio de Janeiro, por meio de um convênio entre a Secretaria de Estado de Governo e Relações Institucionais - SEGOV, a Secretaria de Estado da Casa Civil e Governança e o Departamento de Trânsito do Estado do Rio de Janeiro (Detran.RJ), instituiu como política pública, a fiscalização que tem como objetivo reduzir os acidentes de trânsito no estado e também advertir a população para o perigo de beber e dirigir. Além disso, promove palestras em escolas, universidades e empresas. Essas ações têm caráter permanente.

Estamos na década de ações para Segurança Viária (2011 a 2020), proclamada pelas Nações Unidas e destacada em Setembro de 2011 no Senado Federal através da campanha do Pacto Nacional pela Redução de Acidentes - Parada, lançada na Semana Nacional do Trânsito, tendo por objetivo promover ações de conscientização sobre segurança no trânsito, sendo o objetivo maior, o reconhecimento do trânsito como direito fundamental humano. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2018).

Um estudo recente do Observatório de Segurança Viária mostrou que só há eficácia da Lei Seca nos estados que realizam o maior número de blitz de fiscalização. “Os estados que têm mais fiscalização, têm menos acidentes relacionados à combinação entre álcool e direção. Quando ele tem a sensação de que a fiscalização está presente, acaba sendo mais prudente”, explica Renato Campestrini ao Jornal de Brasília. O Rio de Janeiro está entre os estados que realizam o maior número de fiscalizações. (AGÊNCIA BRASIL, 2018).

Prevista no Código de Trânsito Brasileiro (CTB) e organizada anualmente entre os dias 18 e 25 de setembro, a Semana Nacional do Trânsito busca conscientizar condutores de veículos e motocicletas a respeitarem a legislação e ajudar a construir um ambiente viário mais seguro. (DENATRAN).

Conforme já abordado em parágrafos acima, comparado a anos anteriores a 2008, as mortes por acidentes de trânsito no país estão em queda. Um levantamento inédito do Ministério da Saúde aponta que, em seis anos, houve uma redução de 27,4% dos óbitos nas capitais do país, no entanto, apesar da redução, o país segue longe da meta estabelecida pela Organização das Nações Unidas (ONU), que prevê redução de 50% no número de vítimas em 10 anos, contados a partir de 2011 e, não ultrapassar o número de 19.000 vítimas fatais por ano em 2020. (AGÊNCIA BRASIL, 2018).

Infere-se que as medidas de fiscalização em conjunto com as campanhas de educação e conscientização da população devam ser intensificadas e que, os cidadãos se unam contra o binômio beber e dirigir. Os acidentes de trânsito constituem pesado fardo econômico e social resultante da soma de prejuízos materiais, gastos médicos e os referentes à perda de produtividade pessoal. ("Rood Traffic Injuries: Confronting Disparities to Address a Global Health Problem”, 2006).

10. Polícia Militar como apoio à fiscalização

No artigo Lei Seca como ferramenta para garantir maior segurança no trânsito brasileiro, de Simão (2018), encontramos referência ao art. 144. da Constituição da Republica Federativa do Brasil onde aponta que a segurança pública é dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, e é exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através da polícia federal, polícia rodoviária federal, polícia ferroviária federal, polícias civis, polícias militares e corpos de bombeiros militares. Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem pública.

Assim, o Detran.RJ, a Secretaria de Estado de Governo e Relações Institucionais (SEGOV), a Secretaria de Estado da Casa Civil e Governança firmam um convênio em 2008 com o intuito de reduzir os acidentes de trânsito, promover campanhas educativas de conscientização da população para os perigos de beber e dirigir. Nasce então a Operação Lei Seca, sendo instituída em março de 2009. Ao Detran.RJ, dispondo de caixa suficiente para a manutenção financeira do projeto, coube a responsabilidade de garantir os recursos financeiros necessários, disponibilizar relatórios referentes aos índices de violência no trânsito e autuar os condutores infratores por meio de seus agentes atuantes nas blitz, devidamente portariados no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro. (DETRAN.RJ, 2019).

Pela relevância da Operação, fez-se imprescindível que a Secretaria de Estado de Polícia Militar se integrasse ao convênio. Os policiais militares realizam importante papel na abordagem dos condutores em apoio aos agentes do Detran.RJ. "Os policiais militares participantes da Operação Lei Seca são cedidos para a SEGOV, a fim de atenderem exclusivamente à política pública em questão" (DETRAN.RJ, 2019, p. 40).

Lembrando que beber e dirigir também está associado a outras infrações de trânsito, como por exemplo, conduzir em velocidade superior à máxima permitida e/ou deixar de usar o cinto de segurança, a Operação Lei Seca baseia-se não somente na fiscalização do uso de álcool, mas na conscientização dos motoristas sobre as todas as normas de trânsito contidas no Código de Trânsito Brasileiro.

11. Procedimento metodológico

A presente pesquisa se caracteriza como bibliográfico-descritiva, documental, de abordagem qualitativa e estudo de caso.

A realização da pesquisa ocorreu pela necessidade de comprovar que as alterações feitas ao Código de Trânsito Brasileiro através da Lei Seca, e modificações posteriores trouxeram resultados positivos para a realidade brasileira.

O seu caráter bibliográfico se dá por tratar-se de um tipo de pesquisa que possui como objetivo conhecer e analisar as principais contribuições teóricas existentes sobre um determinado tema ou problema (SOUZA e DIESEL, 2008). Ainda, classifica-se dessa forma por utilizar dados buscados em livros e artigos referentes ao tema.

Trata-se de uma pesquisa documental, posto que foi feita uma análise dos documentos disponíveis no Detran.RJ no que dizia respeito às estatísticas das principais causas de acidentes e infrações de trânsito com destaque para as que guardavam relação com o ato de beber e dirigir e o papel das fiscalizações realizadas pela autarquia. Para Gil (2002) esta abordagem apresenta uma série de vantagens, pois os documentos constituem fonte rica e estável de dados.

A pesquisa possui cunho qualitativo, pois não se busca quantificar os resultados e sim compreender o comportamento de determinado público alvo. Para Malhotra (2006, p.156) “é uma metodologia de pesquisa não estruturada e exploratória baseada em pequenas amostras que proporciona percepções e compreensão do contexto do problema”.

Por fim, merece destacar a pesquisa como estudo de caso, já que ela esteve restrita a um público alvo, como considera Rodrigues e Leite (2006). O trabalho foi dividido em etapas. Na primeira, buscou-se estudar livros e artigos que tratavam sobre seus pontos focais. Na segunda fase, as leis e suas aplicações foram analisadas para melhor compreensão quanto a sua eficácia.

Assim, com os dados colhidos, torna-se possível entender as alterações no Código de Trânsito ao longo dos anos e as expectativas do Estado e sociedade. Escolheu-se a Lei Seca como foco do estudo por tratar-se de uma lei que, em apoio a Constituição Brasileira, resguarda vidas.

12. Conclusões

Verifica-se no presente estudo que, antes de 2008, dirigir alcoolizado era crime de perigo concreto, pois não era suficiente que o condutor estivesse embriagado, era necessária também a demonstração de efetivo perigo. Depois, tornou-se crime abstrato, já que, independente do perigo bastava apenas que o condutor estivesse embriagado para ser penalizado.

As modificações à Lei objetivaram endurecê-la colocando atenção especial aos artigos 165 e 306. A combinação de álcool com direção faz diversas vítimas todos os anos e, não somente a vida do condutor é colocada em risco, mas a dos demais a sua volta. No entanto, apesar da Lei Seca e suas alterações, muitos ainda insistem nessa prática perigosa.

O artigo 165 versa sobre dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência; infração gravíssima que traz como consequência, além de multa, a suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses. No caso de reincidência no período de 12 meses, aplica-se a multa em dobro.

Com a inclusão do art. 165-A no capítulo das infrações, ficou prevista a aplicação das penalidades e medidas administrativas ao condutor que se recusar ao teste do etilômetro, conforme art. 277, §3° do CTB, não sendo necessária a apresentação de sinais de embriaguez ou a oferta de outro tipo de teste, visto que a infração se configura com a recusa a qualquer teste oferecido pelo agente fiscalizador, nos termos da Resolução CONTRAN n° 432/2013; infração também gravíssima com penalidade de multa e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses. No caso de reincidência no período de 12 meses, aplica-se a multa em dobro.

Além da infração administrativa do art. 165, o condutor também poderá responder pelo crime de trânsito previsto no artigo 306 que dispõe a respeito do motorista que conduzir veículo automotor com capacidade psicomotora alterada em razão da influência de álcool ou de outra substância psicoativa que determine dependência.  Ele terá pena de detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor. O artigo 306 afirma que pode ser considerado crime o uso de bebida alcoólica e direção caso seja constatada a concentração mínima de seis decigramas de álcool por litro de sangue ou três décimos de miligrama de álcool por litro de ar expelido pelos pulmões. A partir do momento em que o condutor do veículo obtiver essa quantidade mínima de álcool atestada, e estiver comprovado que ele está em estado de embriaguez e que suas funções motoras foram comprometidas por conta da ingestão da bebida alcoólica, ele é autuado por crime.

Não é redundante salientar que, atualmente o limite de álcool permitido no corpo do condutor do veículo é zero. Desde que entrou em vigor a Lei Federal nº 12.760 de 2012, atualizando a Lei Seca, não há margem de tolerância. Esse valor é medido pelo agente da PM, ou do Detran e também pelos agentes da Polícia Rodoviária Federal, com o etilômetro, instrumento utilizado para medir a concentração de bebida alcoólica ou qualquer concentração de álcool etílico (etanol) pela análise do ar pulmonar expirado pela boca dos condutores. Também conhecido como bafômetro, ele deverá ser verificado anualmente, sendo a calibração realizada quando o aparelho sofrer reparo conforme exigência legal.

O condutor que por dirigir embriagado levasse a óbito um indivíduo, poderia responder por dolo eventual, ou seja, com intenção, pois, a partir do momento que ingere bebida alcoólica e dirige, coloca em risco a vida dos outros, assumindo o possível resultado criminoso. A justiça brasileira, no entanto, entende que a embriaguez, por si só, não caracteriza dolo eventual em acidente com morte.

Há que se pensar que, um condutor alcoolizado não somente comete a infração por dirigir alcoolizado; ele fere outros artigos previstos no Código de Trânsito Brasileiro, igualmente importantes.

A Lei Seca completou 12 anos em 19 de junho de 2020, no ano em que a pandemia COVID-19 assola o mundo, mas nem por isso o Ministério da Infraestrutura – MINFRA, por meio da Secretaria Nacional de Transportes Terrestres e do Departamento Nacional de Trânsito – Denatran (órgão máximo executivo do Sistema Nacional de Trânsito), deixou de mobilizar a população com campanhas educativas por meio de redes sociais e instituições parceiras.

Muito se tem que caminhar até que as penalidades contidas nas leis sejam uma exceção a um comportamento irrepreensível dos motoristas, e a Lei Seca vem cumprindo seu papel na conscientização dos riscos de beber e dirigir para que possa atingir esta meta maior.

13. Referências

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Publicado por: Glaucia Costa da Silva

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