Mérito ou merecimento? Uma etnografia dos critérios de avaliação docente de escolas públicas em Campos dos Goytacazes

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1. RESUMO

Esta pesquisa tem como objetivo identificar as diferentes percepções a respeito dos critérios adotados por docentes de escolas públicas na avaliação de seus alunos, considerando-as a partir de duas categorias analíticas utilizadas no campo: mérito e merecimento. A utilização das duas categorias foi consequência das discussões estabelecidas em projeto de pesquisa relacionado às formas distintas de avaliação discente no campo universitário em um contexto de aplicação das políticas inclusivas, estabelecidas no governo Lula (2003-2010). Enquanto a primeira tem critérios explícitos e universais, relacionadas às avaliações objetivas, a segunda implica em uma abordagem que se caracteriza pela inclusão de variáveis subjetivas, não necessariamente explícitas e universais e relacionadas à trajetória pessoal dos alunos. O campo de pesquisa utilizado foi a observação do cotidiano de duas escolas públicas na cidade de Campos dos Goytacazes / RJ.

Palavras-chave: mérito; merecimento; políticas públicas; ensino médio.

2. Introdução

Este texto é um trabalho monográfico que nasceu da minha inquietação e discordância com o posicionamento político de membros da minha família em um churrasco que era um evento comum no ano. Quis em primeiro lugar trabalhar com um tema que me trouxesse paixão ao pesquisá-lo. Ao mesmo tempo, a escolha do tema me permitiu vivenciar algo sempre mencionado no curso como necessário a um futuro profissional das Ciências Sociais: estranhar o familiar, algo que parecia natural entre os meus.

Em determinado momento no início da minha graduação entrei no grupo de pesquisa da minha futura orientadora Glaucia Mouzinho. O grupo de pesquisa tinha como tema de discussão central a Antropologia do Direito, e iríamos fazer uma pesquisa sobre jornais e o discurso adotado por estes sobre um crime ocorrido no município. Eu estava começando a coletar material bibliográfico, e estávamos recortando nosso objeto e caso de pesquisa, quando o churrasco da minha família ocorreu, assim como iniciei meu período de estágio obrigatório em uma escola pública de Campos/RJ. Desta forma, pedi que a professora considerasse o debate sobre meritocracia para um trabalho de pesquisa futuro. Como ela está vinculada ao INCT-InEAC1 da UFF, aproveitamos o debate de administração de conflitos com o qual minha orientadora tinha familiaridade, para inicialmente relacioná-lo aos critérios de mérito adotados e/ou reconhecidos dentro do ensino médio e superior.

Contudo, antes de iniciarmos a pesquisa sobre o tema proposto, tive outras experiências no campo acadêmico anteriores e que construíram minha trajetória, me permitindo ter contato com diferentes momentos do estudante no ambiente educacional. Possui uma bolsa Pibid2, orientado pelo professor Flávio Sarandy em 2014, uma bolsa do Programa de Monitoria3 para a disciplina de Teoria Antropológica II, orientado pela professora Simone Silva em 2015, minha participação no Estágio obrigatório em escolas públicas de Campos em determinados períodos dos anos de 2015 e 2016 e também atuei como professor voluntário no Pré-Universitário Comunitário da UFF de Campos4 nos também nos anos de 2015-2016. Logo, pude conhecer um pouco do aluno e da aluna do ensino médio dentro da escola, dentro de um pré-vestibular, e dentro da universidade pública, isso me deu o incentivo necessário para pesquisar.

No ano de 2016 consegui o financiamento de uma bolsa de Iniciação Científica da FAPERJ5 para continuar minha pesquisa em conjunto com minha orientadora. Iniciamos o debate sobre mérito, tomando como hipótese o contraste possível entre duas categorias analíticas, o mérito e o merecimento. Minha pesquisa então se concentrou em identificar em escolas nas quais cumpria estágio obrigatório em licenciatura, se e quando as formas de avaliação dos alunos poderiam assim ser classificadas. Ao mesmo tempo observaria os possíveis conflitos decorrentes destas formas diversas de avaliação. Deste modo, pude recortar meu objeto em meio a outras questões tratadas na pesquisa mais relacionadas diretamente ao contexto universitário.

Dentro do período de mais ou menos metade da minha trajetória acadêmica na universidade (UFF – Campos), me debrucei sobre o tema do mérito. Aos poucos, como citado, essa pesquisa se desenvolveu, com etnografia dentro da escola pública, como também algumas observações dentro da universidade pública, mais especificamente o pólo de Campos dos Goytacazes da UFF, com conversas com docentes, e minha percepção sobre o tema.

Tive a oportunidade de entrar em diversos espaços no trabalho de campo, e vários momentos trouxeram inquietação, mas que não puderam ser trabalhados por causa do foco e do tempo necessário à pesquisa. Exemplos como a relação de “rejeição” com alunos “problemáticos” em conselhos de classe, de relações naturalizadas e explicitamente racistas entre alunos da escola básica, da distinção na relação e percepção de alunos sobre o passado escravista de sua cidade, do posicionamento entre diferentes atores sobre greves e paralisações ocorridas no período de pesquisa, de conflitos em eleições de DCE (Diretório Central de Estudantes- UFF), de C.A s (Centros Acadêmicos), em momentos de ocupação estudantil deste pólo, do conflito gerado por corte de bolsas entre outros.

A partir de leituras sobre essas políticas iniciadas no período Lula (2003-2010) compreendo então que grupos populares começam a entrar com maior força na universidade, transformando o perfil dos alunos. Não é incomum a partir daí encontramos alunos de outros municípios e estados, assim como alunos negros ou moradores de periferia em universidades públicas, como aconteceu comigo no relato descrito. Isso gerou na época e, ainda hoje, discussões e debates sobre a “necessidade” ou “importância” dessas mudanças. Em meio àqueles que se posicionaram contra, ou a favor, identifico o questionamento sobre o mérito desses alunos “novos”, mesmo entre docentes. Ao mesmo tempo considerei a expectativa sobre o desempenho dos alunos de ensino médio em escolas públicas visto que os novos alunos da universidade são na sua maioria oriundos destas mesmas escolas.

E por isso, se faz necessário apontar o campo do ensino médio como válido para o contexto de pesquisa, e de abordagem do tema. O perfil de estudante do ensino superior é realmente um ponto central da pesquisa, mas quando se fala em oportunidades de acesso à universidade para um público que possuía e ainda possui dificuldades estruturais de entrada e permanência esse espaço, essas políticas, ainda que existam diversas criticas que reconheço como legítimas, também afetam a expectativa de futuro desses alunos, de classes populares em sua maioria.

A metodologia de pesquisa utilizada se baseou em trabalho de campo e produção de etnografia (GEERTZ, 1989) dos ambientes selecionados para a pesquisa: o cotidiano de duas escolas públicas, incluindo a sala de aula, reuniões, conselhos de classe e áreas de sociabilidade dos alunos e professores nas escolas. A metodologia se justifica pelo contexto em que a pesquisa foi feita: em paralelo com o período de estágio obrigatória do curso de Licenciatura. Se por um lado o estágio facilitou o acesso ao campo, por outro, tive dificuldades em separar completamente os objetos selecionados para a disciplina que me avaliava na época e a pesquisa feita para este trabalho monográfico.

Valorizei elementos institucionais de avaliação e classificação da escola, e todos os percalços possíveis para a prática docente e sua relação com o desempenho estudantil. Meu objeto, para a pesquisa que resultou nesta monografia, está nas relações e debates em torno do mérito e que se apresentaram nesse espaço. Portanto, se por um lado vi como vantajoso a experiência que o estágio me permitiu vivenciar ao longo da pesquisa, por outro, percebi que em alguns momentos, meu olhar foi contaminado pelos objetivos diversos do estágio, limitando as possibilidades de compreensão dos conflitos existentes no campo. Algumas vezes me vi preocupado excessivamente com a aplicação dos currículos ou com o cumprimento de objetivos institucionais. Após este trabalho de campo, no processo de construção da monografia, achei necessário fazer algumas entrevistas formais com docentes das duas escolas pesquisadas. Inicialmente pensei em seis professores, três de cada instituição escolar. A escolha se deu por diferentes motivos: ou por serem meus interlocutores no campo de estágio, ou porque em momentos de possíveis conflitos apresentaram questões pertinentes para a compreensão do meu objeto. Mas por causa do final do bimestre ser caracterizado por muitas provas e correções, três professores não puderam participar. Consegui então entrevistar dois docentes da primeira escola e um da segunda.

Como citado anteriormente, o objetivo original desta pesquisa consistia em dois campos de pesquisa diferentes: o ensino médio em duas escolas públicas do município, e a UFF/Campos. Porém, por conta do tempo necessário à análise dos dados obtidos recentemente no trabalho de campo na universidade, não o inclui no âmbito desta monografia.

No primeiro capítulo apresento políticas públicas recentes aplicadas ao contexto universitário. As mudanças ocorridas e fortalecidas nos mandatos do então presidente Lula da Silva, alguns exemplos são o ENEM, Sisu, Cotas Sociais e Raciais; com a expansão desse setor com o oferecimento de vagas e criação de novos campi e universidades no país através do REUNI, voltadas ao ensino superior público. Assim como permitiu também um acesso mais facilitado da esfera privada de ensino com os programas Prouni e Fies, com bolsas e financiamento. Assim, todo esse conjunto de programas permitiram a mudança do perfil de universitários no país. Apresento também como as categorias mérito e merecimento são estabelecidos para a pesquisa.

No segundo capítulo apresento o campo de pesquisa trabalhado e como diversas categorias nativas surgem para explicar os critérios de mérito usados no contexto local. As categorias de “aluno-destaque” / “aluno-superação”; “filhos verdadeiros” / “filhos emprestados” / a problematização do cotidiano como critério de mérito estudantil; e o “favelado” / “aluno honrado”. Todas essas categorias possuem uma relação com seus atores e justificativas particulares que analiso.

Finalmente apresento algumas breves conclusões com a expectativa de que possa reuni-las futuramente ao material relacionado ao campo na universidade e que não foi objeto deste texto.

3. Políticas Públicas e o contexto universitário

As novas políticas de acesso ao ensino superior nos anos 2003-2010 têm como principal justificativa a exclusão histórica de boa parte da sociedade brasileira desse espaço de educação. As medidas adotadas podem ser exemplificadas pela criação de novas vagas em universidades públicas e incentivos públicos a financiamentos em universidades privadas (CARMO et.al, 2014), assim como pela reformulação na distribuição de vagas e adoção de políticas de cotas sociais e raciais.

Assim, destaco que o investimento no aumento de vagas, possibilidades de entrada e permanência na universidade pública eram reduzidos nos governos anteriores ao período Lula (2003-2010). A partir de sua gestão se criou e fortaleceu ações voltadas para essa esfera. Ainda assim vale registrar que o sistema privado de ensino superior permaneceu forte, beneficiando-se das novas ações e expandindo sua atuação, conforme demonstra Araújo (2013), o setor privado era em 2010 maioria dentre as IES6, totalizando 88% delas. O setor administrativo privado ainda é forte, e teve seu boom no governo FHC (1995-2002):

Conforme dados do INEP7 (2013), no período de Fernando Henrique Cardoso os cursos de graduação presencial nas IES públicas aumentaram 103,5%, enquanto nas particulares foi de 211%. As matrículas de graduação presencial nas IES públicas aumentaram 62,2%, ao passo que nas privadas esse aumento foi de 159,7%. (...) pode-se contrastar esses dados com os dos governos de Luis Inácio Lula da Silva (2003-2010), na qual ocorreu um aumento de 40,4% nas matrículas presenciais em IES públicas e de 50,9% nas privadas. (Pág. 22)

Além disso, políticas de bolsas e financiamento possibilitaram a sobrevida deste setor como o Prouni (Programa Universidade para Todos), que concede bolsas parciais ou integrais para estudantes que se interessam em estudar em uma universidade privada no país, e o FIES (Fundo de Financiamento Estudantil), programa de financiamento para estes estudantes, principalmente de baixa renda.

Como citado anteriormente, através de pesquisas realizadas, o total de vagas preenchidas por alunos de origem no ensino público era de 44,8% em 2011. O que revela uma boa parcela dessa população está na universidade pública. Mas, pesquisas apontam também que um total de 74,2% dos estudantes matriculados em cursos de graduação em 2010 estudava em universidades privadas no país. Ou seja, mesmo com uma expansão de vagas e acesso ao ensino público, grande parte da população estudantil paga pelos seus estudos. O direito à educação ainda é colocada como mercadoria.

Após apresentar alguns dados sobre esse contexto, pretendo apontar as principais políticas públicas para o ensino superior no país, e seus impactos na relação do estudante que ingressava e ainda ingressa nesse espaço.

Conforme Carmo et. al (2014) alguns programas adotados nesse período tiveram impacto no acesso e expansão do ensino superior no país. O programa que promoveu o maior acesso de alunos ao ensino superior é o ENEM (Exame Nacional do Ensino Médio), que se tornou principal meio, total ou parcial, de nota necessária para ingresso nas universidades. Ele começou em 1998 e passou a avaliar e aprovar um número cada vez maior de estudantes. Em 20168, 9,2 milhões de alunos fizeram o exame que ao mesmo tempo em que avalia o desempenho do ensino médio, promove o acesso a uma parcela grande de universidades no país. Passou assim, a substituir o vestibular tradicional. Somou-se a isso a isenção da taxa cobrada aos alunos de escola pública para inscrição no exame. É necessário destacar que muitas IES privadas também usam a nota como critério total ou parcial para o acesso.

Ao mesmo tempo foi adotado um novo sistema de seleção, denominado Sisu (Sistema de Seleção Unificada), um sistema informático, que faz o cruzamento entre a nota obtida pelos alunos no ENEM com a nota mínima necessária para entrar em universidades públicas em todo o país. Deste modo o aluno pode optar, segundo seu desempenho e informações contidas no Sisu, por estudar em outros municípios ou regiões do país, portanto, tendo mais chances de cursar o ensino superior público, ainda que seja muitas vezes problemática a manutenção por recursos próprios ou familiares deste estudante que se deslocou de sua cidade de origem. Nesse contexto a política de bolsas oferecidas aos estudantes é central para sua permanência.

A expansão da educação superior contou ainda com o Programa de Apoio a Planos de Reestruturação e Expansão das Universidades Federais (REUNI), que tem como principal objetivo ampliar o acesso e a permanência na educação superior – em nível federal principalmente. O REUNI foi criado pelo Decreto nº 6.096/2007, e é uma das ações que integram o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE). Promove a criação de novos pólos universitários, de cursos noturnos, de vagas e combate a evasão. Esta expansão do ensino superior federal começou em 2003, com a criação de 100 novos campi e 14 novas universidades até o ano de 2010.

No setor privado do ensino superior as ações adotadas foram a promoção de bolsas parciais ou totais e de financiamento estudantil, já citado anteriormente. O primeiro se refere ao PROUNI (Programa Universidade para Todos) que concede bolsas de estudos integrais para aqueles que comprovarem renda de até um salário mínimo; e parcial para aqueles de até três salários mínimos.

A seguir, o Financiamento Estudantil (FIES), a partir da Lei 10.260/2001, permite que o estudante pague depois de um período após o término do curso em instituição privada. Com uma mudança ocorrida em 2010 as taxas ao ano se tornaram menores e com um período de carência maior. Conseguiu-se um aumento de adesão ao programa e permitiu o acesso ao ensino superior por um número maior de estudantes, permitindo que a esfera privada tivesse uma sobrevida maior neste período.

Além das questões apresentadas, são as cotas sociais e raciais como políticas de ações afirmativas, e que também representam as denominadas políticas de reconhecimento (FRASER, 2001), que demonstram ser maior foco de discussões e conflitos como Maggie (2005), Santos e Queiroz (2007) apresentam. Tanto na mídia, quanto no meio universitário, entre alunos ou entre docentes.

As cotas raciais são apresentadas como saída para reparação de injustiças e desigualdades históricas sofridas em função de pertencimentos a grupos étnicos. Seu público se restringe aos alunos que se autodeclarem pertencentes a estes grupos. Em paralelo, também são adotadas em nível federal e em alguns Estados, as cotas sociais, conectadas à situação socioeconômica (baixa renda), e reservando vagas para alunos originários de escolas públicas.

A política de cotas já pode ser observada pontualmente no ano de 2001 pelos governos estaduais do Rio de Janeiro, Mato Grosso e Bahia. Após estes primeiros exemplos, a primeira universidade federal foi a Universidade de Brasília9 em 2004, com cotas raciais. Ambas anteciparam conflitos e questões que marcarão os debates após a implantação da Lei 12.711/2012), momento em que passa a ser usada no Sisu para a seleção de estudantes.

Foi exatamente em torno da pertinência desta última como critério de inserção que ocorreram e ainda ocorrem os principais conflitos e que são frequentemente tornados públicos mesmo no interior das universidades, em particular no que diz respeito aos direitos dos cotistas, e o questionamento do mérito como critério adequado para o ingresso na universidade.

Apresento neste momento a contribuição de Bourdieu e Passeron (2011, 2014) para o debate sobre o ensino básico e o superior, mesmo que ele descreva uma análise no contexto educacional francês. Na sociedade francesa existe uma desigualdade dentro da escola: a desigualdade cultural, esta que tem relação direta com a origem social de cada estudante. É também pela origem social que a criança ou jovem adulto possuem uma base para competir na compreensão e aprendizado da cultura escolar.

O grupo social mais elevado tem acesso a bens culturais e simbólicos mais próximos do que é exigido na instituição escolar. Enquanto que pessoas de grupos populares se sentem aculturados em contato com essa mesma cultura. Pois ao mesmo tempo em que não tiveram acesso e meios de compreender com facilidade aquele conteúdo, são “reeducados” por uma cultura que é legitimada pela sociedade, em detrimento da sua própria, popular.

A escola, e o ensino universitário não permitem que se enxerguem as desigualdades sociais dos estudantes. Os professores não enxergam o aluno com baixo desempenho pela sua origem social, e capital cultural. Todos são formalmente e ficticiamente iguais. Faz parte assim, da ilusão do professor que o aluno é alguém, ou melhor, autônomo, sendo capaz de individualmente estudar e se organizar da melhor forma possível. Aqueles de grupos sociais superiores não são enxergados pelos seus privilégios, mas por mérito, e dons próprios. Enquanto os populares são enxergados sem estes.

Como afirma Dubet (2012, 2015), em contribuição ao pensamento de Bourdieu e Passeron (2014), se dentro da escola as desigualdades sociais se reproduzem, poderíamos dizer que não existe necessariamente ascensão social através desta. O aluno pobre, sem acesso à cultura de elite, que é exigida na escola, pode sair da escola sem condições de obter um trabalho bem qualificado, e teria uma vida muito próxima aos seus familiares. Segundo estes autores, a origem social tem um peso grande no futuro acadêmico e profissional do estudante. Contudo, cabe ressaltar que suas pesquisas se referem ao contexto da educação francesa, e que algumas de suas conclusões devem ser relativizadas para outras sociedades, como ressalta o próprio Dubet.

O debate que Dubet apresenta está nas desigualdades inerentes ao sistema de ensino, e que constroem obstáculos para o aluno de classe popular. Então, se o ensino superior, apoiado em um discurso meritocrático, se apresenta desigual no acesso, dentro das universidades existem sistemas de valorização dos diplomas a partir da influência de sua produção acadêmica, de professores e cursos reconhecidos no mercado de trabalho. Ele explica que o simples acesso, a partir da massificação, não garante a democratização do ensino público de qualidade (como no caso brasileiro, onde existe maior competitividade na entrada de universitários), e por isso, devem-se atentar às desigualdades existentes dentro da Universidade.

Um aspecto importante para essa discussão é a ideia de que para a real democratização, todos os grupos sociais teriam as mesmas oportunidades oferecidas. Mas não é assim que ocorre, em todas as sociedades, mesmo com as variações em suas configurações, nenhuma chega a essa igualdade. Logo, a massificação não beneficia todas as classes sociais da mesma forma. Tais desigualdades citadas anteriormente selecionam e excluem estudantes que se formam e entram no mercado de trabalho. A competição pela valorização do diploma obtido é outro sistema de desigualdade que atinge o profissional recém-formado, e por isso, não garante necessariamente uma ascensão social ou melhora na qualidade de vida.

A pesquisa realizada por Lima, Neves e Silva (2014), analisou as atitudes diante das cotas dos estudantes de cursos mais concorridos e procurados da Universidade Federal de Sergipe (UFS) antes das cotas em 2005 e em 2010, na primeira turma de cotistas. Sua hipótese é que pelo contato entre cotistas e não cotistas pode-se diminuir o preconceito e resistência ao caso.

Porém, o que se aponta como resultado é uma completa rejeição (mais de 90%) às cotas raciais, entre brancos e negros em 2010 e uma maior aceitação, mesmo que pequena das cotas sociais (29 - 31,4%). Isso demonstra que o contato com o “outro” não diminuiu o preconceito. Estes autores destacam que o ambiente universitário, que predomina a disputa e competitividade individual, não permite que se desenvolva necessariamente uma relação de amizade e desenvolvimento mútuo entre estudantes cotistas e não cotistas (BLUMMER, 1958 apud LIMA, NEVES e SILVA, 2014).

O texto de Ferreira e Mattos (2014) apresenta algumas análises sobre a política de cotas dentro de diversas esferas: esfera ético/jurídica; esfera étnica; político/assistencial; ideológica e pedagógica. Seleciono duas dessas esferas, que são importantes para a pesquisa, e apontam para o questionamento a respeito do mérito destes alunos. A primeira esfera é a ideológica, que discute exatamente qual o mérito do aluno cotista, considerando o meio que acessa a universidade pública: as cotas “ferem” a ideologia meritocrática ao apontar uma falta de igualdade de oportunidades entre os estudantes que competem pela vaga.

A outra esfera é a pedagógica, na qual os atores são os docentes que se posicionam contra ou favorável às cotas. Sendo estes os sujeitos que delimitam e determinam o mérito do aluno, são centrais em nossa pesquisa. Enquanto alguns defendem que irão diminuir a “qualidade” do ensino superior e uma posterior “aprovação compulsiva”, outros, por outro lado, defendem o sistema de cotas como sendo legitimador do mérito dos alunos.

Os que defendem o segundo ponto de vista entendem que não basta ser negro, por exemplo, mas que é necessário ter qualificação também, ou seja, dominar o conteúdo necessário para ser entrar na universidade. Além disso, os mesmo docentes, dizem os autores mencionados, ressaltam que com aulas de reforço e disciplinas instrumentais essa deficiência escolar poderia ser superada.

Estes dados apontam que o debate sobre cotas causa preocupações relacionadas à justiça e o acesso à cidadania no Brasil. Pois é a partir da noção de justo ou injusto em certos casos, como a entrada na universidade, que podemos identificar como a sociedade se enxerga (sendo desigual ou não) e se comporta diante de processos de mudança da realidade social. Um exemplo é o reconhecimento da desigualdade de renda – principal motivo das cotas sociais – e uma dificuldade e oposição ao debate ao racismo no contexto brasileiro que as cotas raciais denunciam

3.1. Mérito ou Merecimento?

Esta pesquisa se desenvolve na identificação e análise dos sentidos colocados para o uso do mérito ou merecimento no desempenho discente, tomando como lugar de observação duas escolas públicas de ensino médio. Entretanto, as questões que se apresentam sob essas duas classificações foram motivadas pelos debates em torno das políticas inclusivas destinadas às universidades e as divergências que nos levaram a relacioná-las também à forma como identificamos e verificamos nossos direitos. Apresento como ponto de partida as discussões levantadas sobre as políticas de acesso e expansão do ensino superior, mas principalmente sobre as políticas de reconhecimento (cotas) (FRASER, 2001). Se as cotas são um “problema” para o acesso “justo” ao bem público, então a noção de “igualdade” dentre os competidores parece estar afetada. Efeito este que aparece tanto pela necessidade dessa política de reparação de desigualdades estruturais, quanto pelos indivíduos que não concordam com essa suposta “injustiça” ou “desigualdade” no acesso à universidade pública no país. O problema central está na noção de igualdade. Utilizo assim de Mota (2014) e da contribuição de Kant de Lima (2011) para apresentar reflexões sobre como o reconhecimento de direitos e a igualdade estão conectados na sociedade brasileira. Entender como o cidadão comum enxerga sua posição em comparação com outros competidores na disputa meritocrática, supostamente estabelecida, é importante para explicar a distinção entre as categorias utilizadas: mérito e merecimento.

O Direito não se resume a um conjunto de regras e normas, mas é um sistema reconhecido e público, cujas sensibilidades jurídicas se apresentam de forma distintas (GEERTZ, 1997). A disputa meritocrática não é explicada como sendo somente uma ideologia liberal, mas possui relação com a percepção de justiça. Se antes a desigualdade era natural nos períodos anteriores as revoluções burguesas, o novo contexto criado coloca o Estado como aquele que garante a lei acima da diferença individual, e assim a igualdade entre os homens no meio público. O que pode ser nomeado de “liberalismo político” está na suposição de uma igualdade de direitos e oportunidade pelos sujeitos que são individualmente diferentes. Aquele que souber aproveitar estes mecanismos oferecidos possui vantagem momentânea no acesso de bens para a sua ascensão social. (Mota, 2014. p. 156).

Porém o contexto brasileiro possui suas especificidades que devem ser consideradas primeiramente para compreender o significado atribuído ao sentido de justiça. Baseado nas análises de Kant de Lima a respeito do sistema jurídico brasileiro, Mota ressalta que o Brasil passou de uma monarquia escravocrata, com uma hierarquia explicita e desigual para uma república com uma desigualdade implícita. E por isso, ao justificar a desigualdade entre as pessoas, o sistema jurídico utiliza da diversidade da natureza para afirmar uma desigualdade social e enfim determinar que existe assim uma desigualdade natural. Ou seja, ao mesmo tempo em que reconhece os valores liberais sobre igualdade, o sistema jurídico brasileiro afirma que o desigual deve ser tratado pela sociedade de forma desigual, porque a desigualdade é uma consequência natural da economia capitalista.

A sociedade brasileira se configura com uma desigualdade na distribuição de direitos de acordo com a posição das pessoas na hierarquia social estabelecida. Essa desigualdade natural dentro da nossa cultura coexiste com o discurso liberal de igualdade. As políticas de reconhecimento não são as primeiras a contestar essa “norma” e afirmam ter uma desigualdade anterior às características individuais, mas relacionadas à cultura e à hierarquia social. E por isso sofrem tanta resistência de uma parcela da população: intelectuais, acadêmicos, políticos e pessoas comuns. Justamente por que a ideologia liberal afirma uma igualdade de direitos, não uma desigualdade. Entendem que as cotas colocam “desigualdade” entre “iguais”. E por isso gera tanto conflito com essas políticas educacionais, pois elas denunciam justamente uma desigualdade no acesso ao bem público que é naturalizado pelo senso comum, e assim não questionado.

Considerando o debate levantado anteriormente, delimitei o que o mérito neste sistema de competições individuais a partir de Max Weber (2004), que caracteriza o mérito dentro da sociedade capitalista – e o mundo do trabalho. O homem que possui mérito é aquele “senhor de si”, que busca a prosperidade no trabalho como um sinal do chamamento divino. É aquele que não desperdiça tempo, e não é ocioso em suas atividades profissionais. Dentro da ética do trabalho apontado pelo autor, é o trabalhador, e para nós o estudante, que age e pensa sendo de sua responsabilidade o sucesso e graça alcançada.

Questões de entendimento diverso do mérito também se apresentam na universidade e na escola. Na universidade se estende mesmo aos critérios de exploração da força de trabalho, quando o mérito está fortemente associado à produtividade, como indicam os críticos da associação mérito e produtividade do trabalho docente, implicando inclusive em redução de recursos para pesquisa ou acesso ou permanência em programas de pós-graduação (ARAÚJO, 2013). Quanto aos alunos, sob avaliação dos docentes, é possível identificar também posições que apontam para tradições distintas de reconhecimento.

Logo, para a pesquisa que desenvolvemos o estudante com mérito é aquele que cumpre seus trabalhos e compromissos formais exigidos por seus professores. É o aluno ou a aluna que entrega no prazo os trabalhos segundo as regras formais propostas, considerando o domínio da linguagem escrita e algum capital cultural acumulado (BOURDIEU, 2014) que permita construir um trabalho criativo e original.

É necessário explicitar que a definição do mérito não se apresenta necessariamente universal nas diferentes sociedades do ocidente e que isso vai implicar na relação que estabelecemos no projeto de pesquisa, assim como estabeleço nesta monografia com o merecimento como categoria analítica. Logo, Kant de Lima (2011), ao descrever e analisar sua experiência nas academias brasileira e americana apresenta argumentos centrais para a pesquisa que realizamos.

Para o autor acima mencionado, na sociedade brasileira, em suas experiências na universidade, seja como aluno, ou professor, o aluno era valorizado pela sua oralidade, capacidade de articular assuntos e contribuir com a discussão dentro de sala de aula, por exemplo. O uso da oralidade pressupõe também o domínio de conteúdo não necessariamente acessível aos demais alunos, promovido pelas relações estabelecidas entre professores e alunos, marcadas por vezes pela informalidade e pelo acesso a textos ou regras de socialização acadêmica desconhecida pelos demais colegas. A relação com o professor permite o acesso a livros e informações para o seu grupo de alunos seletos. E contribui fortemente para a originalidade das posições públicas apresentadas pelos alunos incluídos nessas relações, auxiliando fortemente na construção de um capital cultural exigido e esperado pelos docentes.

Nos EUA, inversamente, segundo o mesmo pesquisador, a relação entre esses atores se dá pelo distanciamento da relação pessoal com a profissional e pela universalidade do acesso as fontes citadas ao longo das aulas e que também informavam a participação ou intervenção dos alunos, sempre com regras rígidas e marcadas pelo texto escrito. Deste modo, a produção acadêmica somente era valorizada se "bem escrita", ou seja, dentro das normas e “formas” exigidas pela academia. É a “forma”, cujas regras são bem marcadas, que é importante, e não o conteúdo. Deste modo, há pouco espaço para a originalidade tão valorizada no contexto brasileiro.

Logo, dentro de diferentes sociedades a definição de acesso ao conhecimento, e a competitividade meritocrática são apresentadas sob perspectivas diferentes. Segundo Kant de Lima (2011), neste mesmo texto, nos EUA é o amplo acesso à informação que confirma a universalização das regras de competitividade. Os alunos são colocados como diferentes, mas podem acessar qualquer conhecimento, pois não há nada não disponível para todos dentro daquilo que é exigido conhecer naquele contexto.

Em oposição àquele que detém o capital cultural, outro critério se contrapõe, que para efeito de contraste e análise denominamos merecimento. Nele os alunos são qualificados no seu desempenho escolar também por sua trajetória econômico-social, mas principalmente, pelo seu “esforço” e “dedicação”, como fatores de superação das dificuldades apresentadas ao longo da sua formação. O docente não vê mérito, mas merecimento – as justificativas que não são aceitas outrora - problemas pessoais, dificuldades subjetivas ou familiares, aqui são. Este aluno é visto como partindo de um local de desigualdade, e por isso, seu mérito está relacionado com as relações que estabeleceu, e o permitiu “chegar até ali”.

Uma característica importante para compreender seu significado está na “transmissão” do mérito pessoal para outros em momentos de reconhecimento do estudante. Logo, o reconhecimento de seu sucesso não é necessariamente atribuído a ele, mas a todos (e por vezes mais a eles) que o auxiliaram no percurso. Seus avaliadores recorrem à sua trajetória desigual para conferir o reconhecimento. Um caso exemplar, ainda que fora do contexto educacional formal, está no caso da judoca Rafaela Silva10 nas Olimpíadas de 2016 no Rio de Janeiro/RJ/Brasil. Tanto a mídia, quanto a própria medalhista colocam o programa de esportes da favela em que mora como sendo o principal responsável em sua trajetória particular que a tornou uma “vencedora”. As entrevistas nos principais meios de comunicação se referiam sempre a sua história de “superação”, enfatizando a responsabilidade e o “sucesso” à ONG e ao seu treinador.

Contudo, as duas categorias analíticas selecionadas não se opõem e não são colocadas em uma hierarquia moral de “mais eficiente” ou “mais correta” para a avaliação sobre o discente. O mérito se apresenta como oposto ao merecimento por ser objetivo, enquanto o segundo é subjetivo, justamente por considerar a perspectiva docente sobre o estudante em seu critério de mérito.

Foi considerando esta perspectiva e a relevância do ensino médio para a formação necessária à entrada dos alunos na universidade, assim como o fato das escolas estaduais serem futuro campo de atuação do aluno de Licenciatura em Ciências Sociais que resolvi centrar minha análise em duas escolas públicas classificadas como escolas “tradicionais” em Campos, com muitos anos de existência e apontadas durante um longo período como referência de ensino público no município.

4. Ensino Médio: ponto de partida da disputa meritocrática?

Desta forma, após explicar meus objetivos dentro do campo, no período de pesquisa investiguei como bolsista a escola pública e sua relação com o contexto de expansão universitária e políticas públicas de ações afirmativas. Foi feita etnografia sobre o cotidiano da escola: além da sala de aula, com a observação de reuniões, de conversas com os professores e a observação dos alunos em duas escolas públicas de Campos dos Goytacazes (RJ).

O município de Campos, onde as duas escolas pesquisadas estão localizadas, possui uma história singular. Foi nesta região que viveu inicialmente um grupo indígena brasileiro, os Goitacás, até serem exterminados completamente no século XVIII pelos colonizadores portugueses. Foi também conhecida pelo uso intenso mão de obra escrava: ainda no século XVIII, 60% da população era escravizada. Até os dias atuais se ouve notícias de trabalho análogo à escravidão em algumas regiões da cidade, o que tem sido objeto de ações por parte do Ministério Público do Trabalho, assim como de denúncias por sindicatos e movimentos sociais11. Isto por si só é significativo para pensarmos a relevância de pesquisar as práticas escolares, assim como as que sucederam as políticas inclusivas no meio universitário.

Com uma população de quase meio milhão de habitantes, é o município com maior tamanho territorial do estado. Na área de educação, Campos obteve uma visibilidade e protagonismo fortes no cenário brasileiro. O Liceu de Humanidades, é um caso exemplar para esse histórico, foi equiparado, durante algum tempo, em reconhecimento e qualidade de ensino ao Colégio Pedro II, localizado na cidade do Rio de Janeiro (MARTINEZ et al., 2012). Inclui também diversas universidades privadas e IES públicas - Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro (UENF12), Instituto Federal Fluminense (IFF13) e Universidade Federal Fluminense (esta última com Instituto formado somente por cursos voltados para a área de ciências humanas e sociais), entre outras existentes no município.

As duas escolas lócus de pesquisa que resultou nesta monografia possuem o nível fundamental e médio, com um perfil diverso de alunos. Ainda que pela legislação atual o governo estadual seja somente responsável pela oferta de vagas no ensino médio, neste caso também oferece vagas para o ensino fundamental, sendo responsável pelas duas escolas. Outro elemento é a presença do EJA (Educação de Jovens e Adultos) em uma delas. Este programa citado é um curso noturno, voltado para alunos mais velhos que retornam para a cadeira escolar para concluir seus estudos e se qualificar. Assim como também percebi em campo o incentivo para programas do governo estadual ou federal para os alunos como o PRONATEC (2011), “Estágio que rende” e “Renda melhor jovem”. Todos se direcionam para o estudante do ensino médio público, com possibilidade de ensino profissionalizante e técnico e estágio remunerado para alunos. O último citado ainda oferece uma poupança anual ao final do ensino médio como um reconhecimento do desempenho acadêmico do estudante. Noto que tais programas não se voltam necessariamente para o acesso à Universidade, na época da pesquisa.

São escolas que recebem uma grande quantidade de alunos de classes populares e compõe um perfil de estudantes heterogêneo. São públicas, e por isso são constantemente avaliadas através de sistemas de gestão e avaliação, tais como o GIDE14 (responsável pela avaliação das escolas) e o SAERJ15 (responsável pela avaliação do desempenho oficial dos alunos), ambos externos à comunidade escolar, pela SEEDUC16.

Apresento resumidamente os sistemas mencionados por conta de algumas relações entre seus objetivos e o observado no campo. O SAERJ é aplicado no final do ano, mas a primeira escola aplica o que denomina de “Saerjinho” todo final de bimestre, também obrigatório pela Secretaria de Educação, ambos aplicados a todos os alunos. Mesmo que inicialmente, segundo uma entrevista realizada com um docente, fossem avaliados somente os conhecimentos de Português e Matemática, atualmente inclui todas as áreas do conhecimento, semelhante à organização do ENEM: linguagens, matemática, humanas e biológicas. Assim como na aplicação do exame nacional do ensino médio, os alunos devem obedecer a um tempo de prova, e uma grande quantidade de questões.

Em paralelo, o GIDE consiste na visita de um avaliador do Estado que aparece sem data marcada na escola e segue um roteiro de pontos a observar. Exemplos são as metas de desempenho discente a partir de notas no IDEB, SAERJ e Prova Brasil, a presença de uma metodologia pedagógica inovadora pelos professores, a taxa de frequência, de evasão e etc. A gestão escolar tem que se desdobrar para “cumprir” os requisitos de avaliação no dia da visita. Mas critica essa avaliação por ser extremamente objetiva e baseada em metas atingidas ou não, sem abertura para apontamentos sobre a estrutura e condições de trabalho.

Mesmo que muitos dos pontos abordados pelos sistemas sejam complementares e relacionados com um conjunto de aspectos do espaço escolar, são as metas do desempenho estudantil que são mais cobradas pelos servidores que visitam as escolas. Assim como o desempenho dos professores com a utilização de práticas pedagógicas diferenciadas (grifo meu). A direção e funcionários devem procurar se adequar a estes critérios, para alcançar uma média estabelecida como ideal.

Por outro lado, a chamada “Bonificação por resultados” aparece como um incentivo para o docente da rede desenvolver e aprimorar suas aulas e práticas. Pode receber até três salários mínimos a mais se conseguir comprovar junto á direção dois critérios: o Indicador de Desempenho no SAERJ (ID), citado anteriormente, na qual os alunos que o fazem precisam atingir a média de 70%, e também o Indicador de Fluxo Escolar (IF), que tem como critério a boa frequência estudantil na disciplina, “(...) atribuindo-se, desta forma, pesos diferenciados de acordo com o cargo/ função exercido, conforme prevê a resolução”, segundo uma matéria do site oficial do governo estadual sobre esse sistema17.

Ou seja, conforme conversas informais com docentes, a escola se submete à lógica de atingir metas estabelecidas pelo governo estadual, mesmo que critiquem esse sistema e os considere ineficientes. Aqui, portanto, o critério de reconhecimento do trabalho docente, diversamente daquele exigido na universidade, se ancora não na capacidade de pesquisa ou de publicação do professor, mas no efeito que suas ações terão sobre o desempenho e frequência dos alunos.

Estas políticas, portanto, ainda que avaliem o professor, afetam diretamente o cotidiano escolar, assim como só serão efetivadas a partir da relação estabelecida entre alunos e professores e a perspectiva que tenham sobre o desempenho dos primeiros. Por outro lado, a administração apresenta aos seus alunos também um discurso marcado pela competição pelas melhores posições na turma, e por um possível lugar de destaque no mercado de trabalho, ao mesmo tempo em que apresentam expectativas relacionadas a mudanças comportamentais, valorizando a disciplina e a internalização de valores a partir da ótica da gestão ou dos docentes.

Logo, é importante destacar que os diferentes atores do ambiente escolar possuem seus posicionamentos sobre os métodos avaliativos e classificatórios para o desempenho estudantil, assim como os diferentes critérios de mérito apresentados. Um desses atores, e principal alvo de avaliação e questionamento são o aluno e a aluna. Mas nos dedicamos em compreender mais profundamente o discurso e construção dos critérios de mérito dos docentes e membros da gestão escolar. Mesmo que no trabalho de campo os estudantes apresentassem suas próprias perspectivas sobre seus estudos, desempenho escolar e futuro, e principalmente suas estratégias para burlar os critérios de mérito colocados sobre eles. Porém, não utilizei esses dados pelo recorte do objeto.

4.1. Primeira Escola

A partir do que apresentei anteriormente, irei descrever com maiores detalhes como cada campo de pesquisa se desenvolveu. A primeira escola é percebida com aquela que se alinha mais ao discurso proposto por programas oficiais de avaliação anteriormente mencionado do Estado, com uma categoria naturalizada como “aluno-destaque”. Com isso, os alunos são colocados supostamente como iguais na disputa meritocrática: pela estrutura escolar da qual fazem parte, são chamados para “correr atrás”, se responsabilizando por suas escolhas, buscando caminhos individuais em meio às ofertas existentes e são premiados caso consigam chegar merecer o título de “aluno-destaque”. A escola que descrevo aqui entende que os alunos de escola pública possuem baixo desempenho e por isso, construiu meios para reforçar e diminuir dificuldades nas disciplinas. Um exemplo dessa ação é a presença de projetos vinculados a universidades públicas localizadas no município de Campos e já mencionadas anteriormente, tais como PIBID (Programa Institucional de Iniciação à Docência), que propõe a conexão de licenciados para executar pesquisas e projetos dentro de escolas da região, em supervisão de professores da escola também. Outro exemplo é a monitoria de matemática que foi montada em uma das escolas pesquisadas e eventuais aulas de reforço nem sempre frequentadas pelos alunos.

Dentro dessa escola, um elemento que chamou atenção, já mencionado, e que contribui para a compreensão das práticas escolares e suas formas de reconhecer o desempenho do aluno é o denominado “aluno-destaque”, já investigado anteriormente no trabalho de Venturim (2013).

O foco central da autora, diverso do meu, está nos alunos e sua aproximação ou afastamento dos docentes considerando-os, a partir da analise de Norbert Elias, outsiders ou não. Diferentemente procurei observar também a relação com outros atores desse espaço como a direção e a sua forma de gestão e o impacto das políticas avaliativas da SEEDUC com variáveis a considerar.

Foi a partir do acompanhamento das reuniões de conselho de classe que obtive algumas pistas para as questões que levanto em meu trabalho. Nestas reuniões, a SEEDUC envia para a escola uma orientação dos pontos que quer conhecer para depois sistematizá-los. Os professores devem chegar a um consenso e escolher uma das opções para cada ponto de discussão, como, por exemplo, a frequência dos alunos: “frequenta” / “faltoso” / “não frequenta” e perfil da turma: “Melhorou” / “Regular” / “Ruim”. Além disso, dentre esses pontos, duas perguntas devem ser respondidas nominalmente: “Alunos que se destacam na aprendizagem?” e “Alunos com dificuldades”?

Assim como Venturim (2013) descreve, e confirmo no meu trabalho de campo, o critério principal para a definição do “aluno-destaque” está nas notas. Devem ser altas em todas as disciplinas, sem exceção. Além disto, os alunos-destaque são colocados em oposição aos denominados “alunos-problema”. Estes possuem justificativas muito variadas para seu baixo desempenho escolar desde: “falta de vontade”, “preguiça”, “família desestruturada”, serem “muito namoradores” etc. Uma característica importante e que ressalta o significado dessa categoria está na recompensa, já citada anteriormente, para os alunos-destaque de cada turma da escola: todos possuem seu nome exposto em um lugar importante e de visibilidade na escola.

Esta escola é dividida em dois prédios, o primeiro e principal que contem todas as salas administrativas distribuídas em um corredor. O outro prédio, que na realidade é um anexo, fica aos fundos deste primeiro, e é onde estão localizadas as salas de aula, quadra, biblioteca, banheiro e refeitórios. Os nomes dos alunos-destaque ficam em um painel no corredor principal, e o visitante quando entra pode encontrá-lo com facilidade. Está localizado perto da atual sala dos professores. Outro elemento de reconhecimento dado pela escola é a oferta de passeios como prêmios, como observado no momento da pesquisa. Ou seja, os alunos são incentivados à disputa meritocrática para ser o “aluno-destaque” do bimestre.

Entretanto, indo de encontro ao “aluno-destaque”, outra categoria foi criada pela escola e denominada de “aluno-superação”. Como descreve a docente que entrevistei, em oposição à categoria exigida pela SEEDUC, que prioriza notas acima da média em todas as disciplinas, esta considera os avanços que alguns alunos tiveram de um bimestre para outro. São os alunos que saíram de uma nota extremamente baixa e tiveram uma melhora surpreendente. E durante o período que foi implantado na escola, teve um espaço específico no painel principal da escola, ou seja, aparentemente, não substituiu os alunos-destaque, mas essa informação não pode ser confirmada.

Outro debate levantado pela docente que merece atenção está na justificativa de falha do “aluno-destaque”, e necessidade do “aluno-superação”:

Por que existem os casos em que o aluno tirou várias notas “9,5” ou “10”, mas tirou uma nota vermelha, então não é destaque. O aluno que vira destaque é aquele que ficou com azul em tudo, mas ficou com ”7”, “7,5”, não ficou com notão como o outro. Esse primeiro precisa ser elogiado, valorizado por isso. Porque ninguém é obrigado a ser bom em tudo. Existem várias inteligências que a gente estuda, como a matemática, a corporal, musical, a relacionada aos esportes (...) Às vezes o cara é fera nos esportes, mas se dá mal na matemática. Mas ele é bom. O “aluno-superação” apareceu por causa disso. Tem também o aluno que melhorou 100% no bimestre: tipo saiu de um “3” para um “8”. Então ele se destaca também, é uma categoria criada na escola. (Entrevista)

A professora explica primeiro que alunos podem ter mais facilidade com a área das ciências humanas, e dificuldades na linguística, ou na matemática. E que essas diferenças são distribuídas pelas áreas do conhecimento. A seguir ela descreve sobre outros tipos de inteligências que possuem relação com a diversidade de habilidades que são desconsideradas na avaliação formal de seus alunos, mas que existem, e poderiam ser exploradas como um ponto positivo em seu desempenho escolar. Mesmo que a docente não cite, a Teoria das Inteligências Múltiplas18 parece ser uma das bases de seu argumento.

Esta teoria explica que o ser humano possui múltiplas inteligências, e não uma única que envolva diversas “habilidades”. O debate central que utilizo está centrado em como a instituição escolar, prioriza a inteligência lógico-matemático em detrimento da inteligência corporal-cinestésica, por exemplo, do aluno que é bom em esportes. Todas as inteligências podem ser desenvolvidas e exploradas, mas o método principal de avaliação escolar não considera essa pluralidade. Um resultado indireto disso são categorias como “aluno-destaque” e “aluno-problema” sugerem.

Logo, quando a questiono sobre seus próprios critérios de mérito para o desempenho de seus estudantes, ela ressalta essas diversas habilidades19 que os alunos podem ter, e então diz que propõe atividades que correspondam com esses pontos: como o teatro, o uso de música, entre outros. Ou seja, mesmo que ela dê notas para seus alunos baseada no desempenho em provas, essas atividades tem como objeto de avaliação essas especificidades e estimular o desenvolvimento destas.

Em minhas considerações sobre as duas categorias apresentadas, deixo explicito aqui que “aluno-problema” não foi usado em nenhum momento do meu trabalho de campo, mas apresentado no trabalho de Venturim (2013). Assim como citado anteriormente, utilizo de dados que obtive nas entrevistas para complementar o trabalho de campo realizado.

Quando se compreende o peso que a categoria nativa do “aluno-destaque” possui para a comunidade escolar o conceito de cultura de gestão apresentado por autoras que também refletem a partir de Max Weber para construírem seu método analítico é valioso para entender esse contexto: “estamos chamando cultura de gestão os princípios inconscientes que organizam a vida escolar e dão sentido às práticas e crenças que têm assim uma lógica que lhes é própria” (MAGGIE; PRADO. p. 71, 2014). Ou seja, não é somente um momento do conselho de classe, mas o “aluno-destaque” está presente na lógica própria da escola, e é reconhecido por seus atores.

Um reflexo possível disso, a partir das entrevistadas, está na grande maioria dos professores dessa escola não avaliarem seus alunos para além da nota. Ou seja, não parecem possuir critérios ou uma expectativa do desempenho discente que envolva o comportamento, o posicionamento político, a reflexão ou conformismo, o debate ideológico, a adesão de valores específicos ou qualquer outro critério que esteja para além da nota de seus alunos. Mas na realidade o que acontece é o valor que a nota final tem para a definição do “aluno-destaque”, durante o trabalho de campo, e de conversas informais pude constatar que os professores, com propostas diferentes entre si, utilizam de diversas provas e testes para determinar a média do bimestre dos alunos. Como já relatado, uma docente utiliza de 3 ou 4 atividades avaliativas diferentes, e aqui se permite utilizar metodologias pedagógicas variadas, mas no conselho de classe esse processo de construção da nota, e também do mérito estudantil não é considerado. Em conversas informais um docente me relata que “(...) não importa como o aluno chegou naquela nota, a direção pergunta diretamente a média final”. Reafirma ainda mais o peso do “aluno-destaque” como um critério acima das avaliações docentes, pois delimita o desempenho estudantil na nota no final do bimestre, e no seu possível reconhecimento.

Mesmo que, como citado anteriormente, o “aluno-superação” seja uma categoria criada pela escola para valorizar aquele aluno que se desenvolve nas notas de um bimestre para outro, ainda se baseia no critério de notas. A mudança está no distanciamento daqueles que são suficientemente bons em todas as disciplinas, para daqueles que outrora seriam denominados alunos-problema e se “superaram”. E mais importante, no relato de uma dessas professoras, esse sistema teve pouca duração. Isso revela como a lógica dentro da escola ainda é muito restrita à avaliação e classificação discente do “aluno-destaque”. Baseada ainda numa perspectiva tradicional do oficio docente, confirma que o discurso da SEEDUC orienta fortemente nesse aspecto da primeira escola. Em paralelo, a gestão criticava a avaliação do GIDE, que transforma a escola em números, sem considerarem o processo necessário que a escola tinha que mobilizar para seu desempenho.

Em contraponto com o contexto escolar que valoriza o “aluno-destaque”, na fala das duas professoras os alunos não se importam com esse sistema. Para o primeiro caso, os alunos que não foram destaque ou não acham que serão, não dão importância nem se “esforçam” para isso. Ao contrário dos alunos-destaque que gostam desse reconhecimento por ganharem uma recompensa pelo “titulo” que recebem pela escola. No segundo caso, em nenhum momento dentro da sala de aula esse sistema é mencionado, e aqui, nem pelos próprios alunos-destaque. Ou seja, na realidade, uma maioria dos alunos não parece dar credibilidade ou reconhecerem esse sistema como “incentivo” para os estudos, como uma das professoras defende.

Logo, o debate levantado pelas categorias “aluno-destaque” e “aluno-superação” são meios reconhecidos no contexto escolar para a avaliação e classificação discente. O segundo surge em um contexto de critica ao sistema já estabelecido e adotado pela gestão, e reafirmo, é um sistema legitimado pelo discurso de professores e gestão, em uma maioria. Contudo, mesmo que por um curto período de tempo, o “aluno-superação” propõe valorizar e reconhecer o “esforço” e “desenvolvimento” do desempenho discente. Porém não tive a oportunidade de aprofundar minha pesquisa na segunda categoria, ainda por ter surgido após meu trabalho de campo. E só tive contato com ela a partir de conversas informais e as entrevistas realizadas. Não tive a oportunidade para identificar e investigar o efeito da implantação desse novo critério de desempenho discente na escola, assim porque essa categoria aparentemente sumiu. E ainda resta o questionamento dos motivos dos alunos não darem valor a este sistema, e o quê valorizam nos seus próprios desempenhos.

A partir da análise dos dados apresentados no trabalho de campo, e entrevistas, pode-se constatar que o mérito defendido dentro desse contexto está na valorização das notas, primordialmente. A valorização do “aluno-destaque”, que agora é denominado “estrela” ainda existe. E reflete principalmente a adoção e reconhecimento de métodos avaliativos da SEEDUC, por parte da gestão e docentes. Mesmo sendo, aparentemente rejeitado pelos alunos.

4.2. Segunda Escola

A seguir me debruço sobre como a segunda escola descreve, identifica e constrói sua expectativa sobre o mérito estudantil. Uma característica importante desta escola está na presença de representantes de duas linhas religiosas (batista e “espírita”) que em uma reunião com professores e membros da gestão, parecem direcionar ou orientar a expectativa da escola sobre seus alunos e docentes. Estes apresentam quais são os valores considerados essenciais para a formação da “personalidade” do estudante. Devem seguir e construir sua “personalidade” com base na família, escola e igreja, consideradas pontos fundamentais no contexto observado para a formação do caráter do aluno e seu desempenho. E em comparação, muito mais fortemente marcado do que seu desempenho meritocrático observado nas avaliações formais a que são submetidos.

Esta especificidade da segunda escola observada pode ser melhor compreendida com algumas observações do trabalho de campo. Tive a autorização da direção para participar de uma reunião de planejamento do inicio do ano letivo. Ou seja, diferente de um conselho de classe, não discutiriam suas avaliações sobre o desempenho dos alunos, mas iriam debater como se preparar para a chegada dos alunos, e outras informações importantes dadas pela gestão escolar.

Esta reunião teve a presença de professores do nível fundamental e médio de ensino presente na escola, com mais de 50 docentes na sala. A direção não se posicionava no espaço separadamente dos outros, e organizaram suas falas com informes sobre o espaço físico como mudanças e reformas feitas na escola no período de recesso. Começaram afirmando que a escola era uma “escola de paz”, e por isso, os membros da direção estavam vestidos de branco, confirmando de maneira simbólica, através do uso da cor, as propostas que seriam ali representadas.

Em determinado momento um pastor (da Igreja Batista de Campos) é chamado para falar com os professores, sendo ele também um docente. Seu discurso esta dentro do campo religioso, com referências a casos da bíblia, para descrever o que seria o trabalho docente, fazendo um paralelo com os tempos atuais:

(...) Nesse tempo tão difícil, pós-moderno, é difícil a profissão do professor. O Lar, Igreja e Escola são a forma como a personalidade do aluno é construída. O professor é um referencial aos nossos alunos. Nossa sociedade pós-moderna pode nos constranger com suas diversas filosofias e sua legislação. (...) O Brasil será salvo, não pelo Congresso, STF ou Câmara. Mas pelo tripé: Igreja, Lar e Família. (Caderno de campo, grifos meus).

Após este momento, outro representante religioso, dessa vez uma mulher que se identificou como “espírita”, faz seus comentários de saudações e “recomendações” para o trabalho docente:

O professor forma ideias, opiniões. É uma extensão da família. O professor não pode se impor, mas se doar. (...) Temos que ter paciência com alunos que tem uma criação diferente de nós. Os alunos são filhos emprestados. (...) A Crise econômica e política, motivo de preocupação, vai nos desequilibrar e passar para os alunos. O professor deve se focar na luz e no criador. (...) Temos um país com muita diversidade e problemas. (Temos que) abrir as negociações, temos que tentar! Aquelas pessoas trazem adversidades, são amarguradas. (...) Não podemos olhar a maldade. (...) (Temos que ter) o conflito como solução, mas com gentileza. (Caderno de campo, grifos meus).

Os trechos citados anteriormente em uma reunião pelos representantes religiosos, dentro de uma escola supostamente laica, revelam a relação próxima e legitimada pelos membros da gestão. Assim como pelos professores, que não se opuseram ou se manifestaram sobre a presença deles ali. A escola aceita essa interferência, e a reconhece como necessária. Algumas categorias são utilizadas e são importantes para compreender o contexto local da segunda escola.

Ambos comentam sobre a necessidade e importância da conexão entre família, escola e religião. Assim como o papel do professor é ser uma extensão dessa relação, prezando por essa tradicionalidade. E também ressaltam que os alunos são “de uma criação diferente” do esperado pela escola, e por isso são também “filhos emprestados”. A escola sempre teve papel principal na sociedade ocidental para transmitir valores e regras, tanto para se conviver e quanto se “comportar” corretamente. Neste caso suas falas descrevem quais valores são esperados para que estes alunos sejam de fato “filhos verdadeiros desta “família”.

Ao contrário de identificarem especificamente quais valores são esperados, suas falas são de oposição e enfrentamento esperado pelo docente a temas e assuntos considerados da “diversidade” ou “pós-modernas”. Ou seja, se posicionariam distantes da valorização da relação Família-Igreja-Escola, e também possíveis problematizações sobre o cotidiano.

Este "pós-modernismo" tenta constranger o docente dentro da sala de aula. E se recomenda enfrentar essas interferências com a autoridade docente: não permitir o debate e entrada dessas propostas no conteúdo escolar, nem pelos alunos. O docente representa uma extensão da família. E por causa disso, ele deve se focar na “luz e no criador” ao invés de discutir problemas (sociais, políticos, ideológicos, culturais) externos a escola ou um debate diferente do conteúdo curricular estabelecido. O conflito como solução está na oposição a estes debates, mas a gentileza citada (e recomendada) está na forma “pacifica” de lidar com este “problema” que os filhos emprestados podem trazer.

Caso tais temas apareçam na sala de aula a partir dos alunos, se recomenda “não olhar a maldade”. Esta categoria sugere fechar os olhos a questões e conteúdos diante dos alunos que não correspondem à expectativa docente. A “tolerância” e a “gentileza” na relação com o estudante são os principais meios recomendados para essa situação, mas não é canal de diálogo, mas de silenciamento. Gera assim a exclusão desses debates, e uma inclusão de valores considerados corretos aos alunos, que deverão deixar de serem “filhos emprestados” e se aproximarem do que esperam ser um perfil ideal.

As recomendações colocadas por ambos os atores, e direcionadas para professores e gestoras supõem que o trabalho principal do docente deve ser na construção de “personalidade” dos estudantes, como representantes legitimados pela família e igreja de um pensamento tradicional e conservador. Porém, mais importante que o comentado anteriormente, são as estratégias apresentadas aos professores caso percebam ideias muito diferentes em suas salas de aula: se opor fortemente a estes alunos; ou ignorar suas discussões ou comentários, e continuarem a aula.

Em minha análise, esse argumente é utilizado para que este estudante tenha um desempenho escolar de qualidade e melhor. Ou seja, nos dois casos, o estudante chega “influenciado” pela sociedade exterior à escola, e cabe ao professor impedir que determinados temas tenham força na sala de aula. E, além disso, que a relação com o sagrado seja colocada como essencial para o “bom aluno”. O que chamaríamos de “tornar o outro ‘eu’” exemplifica as recomendações colocadas. E por isso, não importa o meio desse enfrentamento, o objetivo é construir uma “personalidade” para que o aluno se conforme a esses valores.

Logo, percebo que são recomendadas estratégias para um “bom” desempenho docente na sala de aula. E por consequência, posso pensar sobre a expectativa sobre os alunos que, em primeiro momento podem trazer “adversidades” para o docente, mas que podem se tornar diferentes do que “eram”. Ao considerar as falas desta reunião e a legitimidade dada pela escola ao seu conteúdo, aparentemente a “educação” de seu público estudantil é mais importante, e anterior à preocupação com o desempenho escolar como a primeira escola ressalta.

Se no lado da gestão, em uma reunião oficial a discussão sobre o mérito estudantil há uma expectativa de transformação e educação do estudante de forma a serem considerados “filhos verdadeiros”, no trabalho de campo pude conversar com docentes que apresentam uma interpretação diferente dos critérios de atribuição do mérito.

Foi em um contexto específico, uma greve do ensino público estadual no ano de 2016 que me permitiu ter contato com professores que muito embora se aproximassem do discurso tradicional apresentado aos professores no início do ano, tinham também suas próprias interpretações. Devo ressaltar que existem também aqueles que concordam com os critérios estabelecidos pela escola.

O ensino público estadual no ano de 2016 passou por uma greve de mais ou menos dois meses. A greve permitiu a criação de uma “disputa” entre alunos “da ocupação”, alunos “comuns”, a direção, o Estado, os professores e agentes externos como movimentos sociais da UFF e IFF, por exemplo. As discordâncias ou alianças se davam em torno do significado e necessidade ou não da greve naquele momento. Ou seja, nesse período a escola ficou com suas atividades rotineiras paralisadas temporariamente, mas resultando exatamente no que aquela reunião tentava evitar: trazer o debate externo à escola para dentro dela. Este contexto trará um significado diverso aos discursos dos professores a respeito do que esperavam dos seus alunos.

O primeiro docente avaliará o desempenho de seus alunos a partir da presença ou não dos estudantes nas mobilizações sociais iniciadas pelos profissionais da educação naquele momento. Em uma conversa informal, as condições de trabalho relatadas anteriormente eram insustentáveis para a prática docente e o funcionamento eficiente da escola. Ou seja, naquele momento, aqueles alunos que se posicionaram a favor à greve e as pautas apresentadas eram vistos como exercendo e praticando o conhecimento curricular da escola no seu cotidiano, e por isso tinham um reconhecimento positivo, para além da nota das provas.

Como citado anteriormente, o estudante que esteve nas ruas, ou não se opôs a mobilização social em um momento de greve é percebido como dono de uma reflexão que o distingue dos outros estudantes. Em oposição ao silenciamento e enfrentamento proposto na reunião, é no diálogo com as pautas sociais apresentadas anteriormente como exteriores à escola que naquele momento os professores constroem esse mérito. O que alguns docentes relatam é que precisam da mobilização estudantil para serem vistos pelo poder público e estatal. Sem eles a luta por melhores condições de trabalho não possui apelo no campo de disputas.

“(...) A gente está contando com a participação dos alunos, porque eles estão sentindo na pele, eles estão sofrendo mesmo problema que nós, o descaso do governo, com a Educação. (...) a greve é um direito legal, que a gente tem de mostrar a sociedade o que a gente está passando e a gente tentar resgatar um pouco da nossa dignidade do exercício da nossa profissão de ser professor, né? É isso”– Professora em manifestação.

Em paralelo a este movimento que surgiu e tomou forma na cidade de Campos/RJ, agregando várias escolas públicas estaduais, ocorreu um movimento de resistência ao debate político e social dentro da segunda escola. A partir de conversas informais, pude ter a informação da existência de um discurso forte de ilegalidade do movimento grevista e movimento social/grevista estudantil por parte de outros docentes, estudantes e direção.

E por isso, confirma minimamente a internalização dos valores propostos na reunião por diversos atores no campo de pesquisa, e não simplesmente um discurso de boas vindas. A escola se organiza, extra-oficialmente, segundo aqueles valores de enfrentamento explícitos descritos anteriormente. Aqui a “gentileza” não teria efeito.

Outra perspectiva a respeito do mérito escolar pode ser observada na relação estabelecida pelos professores entre o ensino público e o ensino privado. Pois é na comparação destes dois públicos que um docente explica seu próprio critério de mérito. Este se apropria do discurso de que os alunos precisam de “educação”, mas não usa diretamente como solução a internalização de valores propostos na reunião, e sim de uma disciplina na relação com os estudos e expectativas de futuro, que resulte em um processo de “desfavelização”.

Este docente explica seu posicionamento e necessidade desta “educação” sobre o aluno “favelado”: o aluno do ensino público é em maior parte de origem pobre, e possuem uma expectativa para seu futuro muito limitada. Por causa de sua origem social, para ele estes alunos podem ser identificados de antemão como “meritórios”. Eles já passaram por diversas “barreiras” e dificuldades na sua trajetória pessoal que os colocam como inicialmente em posição desigual na disputa pelo acesso a bens culturais e simbólicos dentro da escola e, segundo o professor, se enxergam com poucas possibilidades de alcançarem um futuro diverso do presente.

Ao analisar o processo de “desfavelização” proposto pelo docente, é importante pensar nas contribuições sobre a construção do termo favela no Rio de Janeiro, a partir de Valladares (2000). Destaco essa abordagem como necessária para não cair na naturalização da favela em um discurso higienista e também moralizante. Esse conjunto espacial e de pessoas surgiu no inicio do século XX na cidade do Rio de Janeiro, no morro da Providência, que se tornou o arquétipo principal dos estudos sobre a favela quando passou a ser denominado como morro da Favella. Foi neste momento inicial que jornalistas, engenheiros e médicos passaram a definir a Favella como um “corpo estranho” ou “doença” para a cidade, que era o distrito federal na época. Com conjuntos de habitações de materiais simples, sem nenhuma presença de urbanização ou de serviços públicos. Aqueles que descreviam esse espaço, e seus moradores, diziam que ela era um problema urbano, de saúde e também estético.

A oposição de favela/cidade aparece ser o distanciamento que o professor apresenta entre o aluno e a expectativa docente. Ao mesmo tempo em que defende que as desigualdades dos “favelados” são maiores, e por isso, seu percurso escolar tem mais obstáculos que o aluno de escola particular. Destaco que ele utiliza o termo “favelado” para todos os alunos das escolas públicas, destacando a contribuição da escola para o “processo de desfavelização”, atribuindo outros hábitos e valores aos alunos, como discutirei mais a frente no texto.

A partir de sua percepção sobre estes estudantes, a educação familiar não cria neles a expectativa de serem alunos, e mais tarde profissionais, “honrados”. Para isso seria necessária a criação de uma disciplina e expectativa sobre si, uma internalização de valores que são bases para a “desfavelização”. O docente é colocado como um orientador deste processo, e referencial dentro da sala de aula. Ou seja, ele deve ser “honrado” também.

No momento da entrevista, o professor me explicou que para ser visto como um alguém “honrado” seria necessário “cumprir com o seu dever”. Tanto o professor, um individuo que já teve uma formação profissional, e o estudante que ainda está em processo. O profissional “honrado” é aquele que cumpre com seu papel social, seja como engenheiro, advogado ou professor. Esta categoria é colocada principalmente por este docente, para que os alunos desenvolvam um hábito com seus estudos, na entrega de trabalhos, na ajuda dentro da sala de aula. Porém, seus alunos tendem a relativizar esse “dever” usando de justificativas para a “flexibilidade” na avaliação de seus desempenhos como em uma fala descrita: “Eu esqueci o caderno em casa, quebra aí professor. Não pode ser tão rígido, tem que ser mais maleável”.

A partir desta categoria posso compreender elementos de disciplina pessoal, organização e compromisso na expectativa de mérito deste docente, sob a denominação da “honra”, que não admite “flexibilizações”. Este professor teve uma formação salesiana, e por isso segue uma orientação pedagógica cristã e católica, como ele próprio ressalta: “deve-se devolver para a sociedade bons cristãos e honestos cidadãos”. Ele reconhece que a “honra” deve ser parte do comportamento e hábito discente, para a construção de uma “(...) boa pessoa, e um cidadão honesto, exemplar. Ou pelo menos tenta ser exemplar”. Apresentando, neste segundo momento a interpretação para o contexto estudantil.

Ser um cidadão exemplar, entretanto, me remete à questão abordada por Zaluar (1994), que se refere ao trabalho como o dever do pobre. As relações entre direitos e deveres se desenvolvem na sociedade brasileira a partir do trabalho e contribuição para a sociedade. Pois os cidadãos são aqueles que “pagam impostos, os que cumprem seus deveres com o Estado: a cidadania dos deveres, não dos direitos” (ZALUAR, 1994, p. 187). O trabalho por outro lado é colocado como característica principal dentro de uma sociedade de deveres, em uma lógica de cooperação, todos contribuem para o bem público com o seu trabalho. O mundo do trabalho é a expulsão do paraíso, para a inserção do que a autora chama de nação dos trabalhadores.

A concepção de pobreza dentro da sociedade brasileira relaciona todos os pobres em uma única categoria: a falta material, de condições de vida. Mas ao mesmo tempo, se exclui a desigualdade política e jurídica desse grupo social. Em paralelo, para as famílias pobres a ideologia que se percebe está na naturalização que o trabalho é o dever do pobre. Com seus filhos, que perdem a infância e “deveriam ser treinados para cumprir com seu destino de pobre – o trabalho – desde cedo.” (ZALUAR, 1994, p. 190). Tanto para as crianças, quanto prisioneiros dependentes do poder público, o mundo do trabalho é colocado como sendo seu dever. E por isso o apoio a programas profissionalizantes para estes sujeitos pelos “cidadãos contribuintes”.

Em paralelo, ser um cidadão honrado é um objetivo principal a ser alcançado através da disciplina de seus hábitos na sua relação com a escola e com seus estudos. Mas, segundo este professor, ainda existe o debate sobre a expectativa limitada que o aluno tem de si. Como o professor afirma, o aluno da escola pública possui um “teto” das expectativas familiares, e próprias sobre si. O que se torna pior quando professores reafirmam essa posição de estagnação social, de pouca possibilidade de ascensão social, e em alguns casos, não incentivo aos estudos para a universidade. A “educação” que este docente propõe está também no aumento da auto-estima e reconhecimento de seu potencial pessoal e profissional de acesso a espaços “de elite”. Um trecho da sua entrevista explica melhor essa relação:

Onde o aluno de escola privada está inserido no mercado consumidor, de bens de consumo, de bens culturais e etc. Enquanto que o aluno da escola pública ele está alijado dessa dimensão do mercado cultural, ele tem um sub-mercado. Ele está num processo alienado, não que o outro não esteja, mas está fora de poder aproveitar (essa dimensão do consumo). Para além do cumprir o dever, este aluno tem uma questão existencial e psicológica: o aluno precisa entender que ele é capaz, que ele pode. Muitas vezes o sujeito está circunscrito a correntes invisíveis de não perceber que ele só vai até uma lagoa próxima e não vislumbra ir até Búzios (RJ), que é colocada como da elite. Não, é para ele também! Ele pode também. Existem correntes dessa perspectiva que aquele lugar não é para mim. (Entrevista)

Ou seja, é como se a perspectiva moral sobre o trabalhador pobre fosse admitida também pelos alunos e naturalizadas as diferenças entre eles e os “outros” representados no discurso do docente pelos alunos das escolas particulares.

Considerando os dois elementos comentados anteriormente, o processo de “desfavelização” seria na perspectiva docente possível para os alunos do ensino público, mas a partir de uma pedagogia específica. Este docente, em entrevista, define como sendo a “entrada no mundo da cultura, no mundo intelectual, saber lidar com as diferenças, deixar de ter um comportamento autodestrutivo, e anti-social”. Ele afirma que é necessário “resgatar” o aluno, mas não enquadrá-lo em um padrão estabelecido, mas retirá-los deste com o propósito de deixá-los livres e “poderem aproveitar a vida”. E poder aproveitar a vida. E por isso, segundo seu argumento, é necessário a esse processo.

Se o “processo de desfavelização” tem como proposta a mudança de comportamento do estudante para assim acessar um novo espaço, seja ele de consumo ou simbólico, isto parece indicar que o conceito de civilização de Elias (1990, 1993) é adequado para a análise.

“Duas ideias se fundem no conceito de civilização. Por um lado, ela constitui um contra conceito geral a outro estágio da sociedade, a barbárie. Este sentimento há muito permeava a sociedade de corte. Encontrara sua expressão aristocrática de corte em termos como politesse e civilité. Mas os povos não estão ainda suficientemente civilizados, dizem os homens do movimento de reforma de corte/classe media. A civilização não é apenas um estado, mas um processo que deve prosseguir. (...) Ele absorve muito do que sempre fez a corte acreditar ser - em comparação com os que vivem de maneira mais simples, mais incivilizada ou mais bárbara - um tipo mais elevado de sociedade: a ideia de um padrão de moral e costumes, isto é, tato social, consideração pelo pr6ximo, e numerosos complexos semelhantes”.(ELIAS, 1990. p. 62)

Porém, se em seu trabalho Elias apresenta as sociedades inglesa, francesa e alemã em relação e o processo histórico de construção de uma civilização ou Kultur20, no caso alemão, é justamente na perspectiva micro que posso fazer conexões com o trabalho de campo. Como ele mesmo aponta, as mudanças psicológicas não são todas intencionais, mas também não são aleatórias e sem sentido.

“E só então, por conseguinte, poderemos entender que a mudança psicológica que a civilização implica esteja sujeita a uma ordem e direção muito específicas, embora não tivessem estas sido planejadas por pessoas isoladas, nem produzidas por medidas “razoáveis", propositais. A civilização não é “razoável", nem "racional" como também não é “irracional".É posta em movimento cegamente e mantida em movimento pela dinâmica autônoma de urna rede de relacionamentos, por mudanças específicas na maneira como as pessoas se vêem obrigadas a conviver”. (ELIAS, 1993 p. 195)

O entrelaçamento social se constitui por essas relações de controle do comportamento e resultam em mudanças, a partir de tensões, na ordem social do momento em que as pessoas vivem. E posteriormente essas pequenas mudanças surgem no aparato psicológico dos membros daquela sociedade. Mas, se o caso estudado pelo autor Está centralizado em três países da Europa, como compreender a necessidade de “civilização” em todo o contexto ocidental? Ao contrário do período feudal, por exemplo, que a guerra, e a força era sinônimo de poder, no momento de transformações políticas/sociais a posição social se tornou importante. Um dos elementos de prestígio estava nos códigos de conduta, que eram colocados a partir de uma elite que determinada o que era “civilizado”. As sociedades ocidentais se caracterizam por uma forte individualização, que tornaram as pessoas dependentes para qualquer ação dentro do espaço em que viviam, então a lógica que se identifica é de que todos possuíam uma “função social” para um todo. Mesmo que o controle de conduta esteja presente desde os primeiros anos de vida, o contexto histórico se torna essencial para compreender este fenômeno:

“(...) o controle mais complexo e estável da conduta passou a ser cada vez mais instilado no indivíduo desde seus primeiros anos, como uma espécie de automatismo, uma autocompulsão a qual ele não poderia resistir, mesmo que desejasse. A teia de ações tornou-se tão complexa e extensa, o esforço necessário para comportar-se "corretamente" dentro dela ficou tão grande que, além do autocontrole consciente do indivíduo, um cego aparelho automático de autocontrole foi firmemente estabelecido. Esse mecanismo visava a prevenir transgressões do comportamento socialmente aceitável mediante uma muralha de medos profundamente arraigados, mas, precisamente porque operava cegamente e pelo hábito, ele, com frequência, indiretamente produziam colisões com a realidade social”. (ELIAS, 1993. p. 196).

Logo, se pode compreender as diferentes interpretações de mérito por alguns docentes da segunda escola como em alguns momentos distantes ou próximas do discurso legitimado pela gestão. Esta que valoriza a construção de uma personalidade estudantil, na perspectiva que o docente é uma extensão da família, e por isso não deveria tocar em debates ou assuntos que não fossem próximos dos valores tradicionais da Escola-Lar-Ingreja. Enquanto o primeiro docente apresente um critério de mérito voltado para o que eu denomino do “aluno crítico”; o segundo docente que tive contato no campo, e que pude entrevistar posteriormente, desenvolve seu critério de mérito sobre o aluno “favelado”, que precisa aprender a ser “honrado” para assim se aproximar do mundo da cultura, da intelectualidade, e segundo minha análise, do mundo do trabalho também. Mesmo que este apresente uma visão naturalizada sobre a posição social de seu aluno, através de sua reflexão e “desfavelização”, estes alunos podem se tornar livres de correntes invisíveis, como ele relata. Está então na perspectiva de distanciamento deste lugar colocado para eles.

Porém, algumas lacunas ficam com este trabalho de campo, e até onde a pesquisa se desenvolveu. Como citado anteriormente, os alunos não são interlocutores presentes neste trabalho, mas são essenciais para compreender sua posição diante dos critérios de mérito que são alvo. Principalmente no neste segundo caso, na qual todos os critérios apontam para uma “mudança” de posição do estudante, a partir da escola e docentes. Mesmo conseguindo capturar o entendimento desses atores sobre o debate, não discuti como estes alunos se enxergam e quais as reais consequências dos “processos” comentados. Se a expectativa docente ou da gestão se concretiza se os alunos “aceitarem” e “reconhecerem” a interferência docente e escolar. Além disso, também sobre as estratégias de negociação que os alunos evocam com seus docentes. Fica o questionamento sobre como se desenvolvem na prática os critérios de mérito, especificamente estes da segunda escola, em que se prioriza o “processo” do aluno.

5. Considerações finais: a Universidade como meio ou fim?

As definições de mérito dentro do ensino médio são variadas, mas possuem um discurso e análises específicas, que são locais. Demonstram assim como o campo de debate sobre “o quê é mérito” ainda é vasto e deve ser explorado. O campo de pesquisa se justifica pelo local que meus atores falam: o ensino médio público, que é considerado como “fraco” para disputa meritocrática para o acesso ao ensino superior, em comparação com ensino privado. No contexto recente de criação de políticas públicas voltadas para esse público para o acesso à universidade, como os critérios de mérito seriam definidos? É esse impacto que buscamos compreender, e assim analisar diante de duas categorias: o mérito e o merecimento.

Ressalto principalmente que todas as categorias “nativas” inseridas neste trabalho são utilizadas no seu contexto local, e apresentadas a mim pelos seus atores. Não tenho como proposta criticar a legitimidade do uso dessas categorias para os professores, professoras e gestões no seu cotidiano, mas analisar e relacionar com as categorias analíticas selecionadas. Com esta monografia, portanto, não desejo emitir nenhum juízo de valor sobre o trabalho docente, a gestão da escolas ou o desempenho dos alunos.

Na primeira escola, as categorias de “aluno-destaque” e “aluno-superação” são exemplares para apresentar o discurso meritocrático diretamente associado a uma determinada cultura de gestão (MAGGIE; PRADO, 2014) que associa mérito ao reconhecimento do desempenho individual, reconhecido publicamente a partir das notas atribuídas pelos professores aos seus alunos. A categoria do mérito se encaixa no “aluno-destaque” porque possui como característica principal de responsabilização individual do desempenho discente. Deste modo, aparece como dissociado da “personalidade” do aluno, presente na segunda escola observada: não considera seu contexto pessoal de estudos, assim como dificuldades sociais exteriores à escola.

Em comparação, o “aluno-superação” está em sua definição voltado para a categoria do merecimento, como descrevo no início da monografia. Mesmo que ainda utilize de um sistema de avaliação discente por notas, procura valorizar o “esforço”. É também importante ressaltar que tanto o SAERJ quanto o GIDE são sujeitos externos que valorizam a nota, e o alcance de metas, e por serem centrais na organização escolar, tanto na avaliação docente quanto discente, acaba por influenciar o poder destas categorias nesse contexto. Mesmo que um dos docentes entrevistados destaque a possibilidade de avaliação por outros critérios, é esse o sistema que se coloca presente.

A segunda escola por sua vez possui mais variedade de discursos, e também de critérios de mérito estudantil. Mas, mesmo que sejam reconhecido e legitimados pelos atores envolvidos, os critérios para a construção do mérito que são apresentados, tanto pela gestão quanto pelos dois docentes, não estão voltados para o desempenho estudantil frente aos conteúdos propostos pelo currículo escolar, mas para o próprio estudante e seu comportamento.

A primeira pode ser melhor definida como da gestão, e sua expectativa com o trabalho do corpo docente. A partir do discurso religioso, orienta seus docentes para a criação de uma personalidade estudantil voltada para valores tradicionais. Seria assim, algo como um mérito voltado ao “filho verdadeiro” para a escola. E se desenvolve principalmente na lógica de inclusão/exclusão, onde o estudante que entra possui uma educação diferente, ou seja, seria um “filho emprestado”, e que precisa se afiliar aos valores da escola para ser incluído; e em um movimento paralelo, os docentes e estudantes devem excluir debates e temas “diversos” ou questionadores da ordem escolar.

Dentro dessa escola, em contexto de greve, tive o acesso ao primeiro docente que me apresentou uma interpretação de mérito estudantil distinto da valorizada pela gestão. Este critério de mérito se desenvolve na crítica ao cotidiano e problematização de assuntos políticos, sociais, culturais etc. E utiliza de exemplo a própria greve, em que uma parcela de estudantes reconhece e valorizou o movimento critico e político em oposição àqueles que mantiveram seu cotidiano escolar sem se envolver ou refletir com o debate proposto. Este docente não distingue seus alunos, mas propõe que eles desenvolvam um hábito em identificar, problematizar e se envolver com temas políticos e sociais, assim desenvolver posições críticas sobre a realidade que vivem. Contudo a proposta de mudança para um posicionamento crítico está relacionado com o próprio estudante.

No discurso de outro docente, a “honra” é elemento central para a avaliação discente, paralelo às notas, mas igualmente valioso. Ela deve ser voltada para a disciplina, para o cumprimento do dever direcionado ao comportamento estudantil, de modo que ele passe da condição de “favelado” para um sujeito cidadão e próximo do mundo intelectual e do trabalho. É necessário priorizar a organização pessoal, mudar hábitos e exercer um controle de si. Contudo, ressalto que o resultado esperado, sempre associado ao “processo de desfavelização”, para usar aqui uma expressão do professor entrevistado, quando alcançado, acaba por ser atribuído a terceiros.

A mudança deveria ser associada à transformação de “favelados” em “cidadãos honrados”, ratificando a representação corrente, também analisada por Zaluar, a respeito dos pobres no Brasil. O empenho do aluno não parece ser a razão central do seu sucesso, pois esse mérito é dado da escola para ele, e permitiria aos estudantes vislumbrar um futuro promissor. Neste sentido, vai ao encontro da crítica estabelecida por Zaluar (1994), a respeito das ofertas e expectativas que se estabeleceram sobre os pobres. Outro caso está na mudança esperada pela gestão, que de “filhos emprestados”, passam a “filhos verdadeiros”. Como o exemplo da atleta Rafaela Silva nos faz lembrar que, não por acaso os sucessos nesses casos, são resultantes do “esforço” e não do empenho, demonstrando os limites do reconhecimento em contextos tão desiguais de atribuição de direitos, como nos recorda Mota (2014), já mencionado. Permanecem a despeito dos resultados esperados e alcançados, mais ou menos tutelados, ressaltando a hipossuficiência (AMORIM, KANT DE LIMA, TEIXEIRA MENDES, 2005; MOUZINHO, 2007; KANT DE LIMA, MOUZINHO, 2017) a que estão sujeitos.

Outro debate importante está na relação que os professores estabelecem com os métodos avaliativos do Estado sobre eles. Mesmo que o GIDE avalie e procure identificar métodos pedagógicos inovadores, e assim terem médias melhores com seus alunos em ambas as escolas, a segunda, a partir da gestão, se distancia de debates inovadores e considerados “problemáticos” para ela. Assim, em contraste com a realidade social apresentada por Kant de Lima em seu trabalho, muito mais que a originalidade e oralidade, é a assimilação de valores específicos que parece ser positivo para o desempenho discente.

O que pude observar no campo a respeito das percepções de mérito e que tive o propósito de expor nesta monografia informa o quanto o debate em torno das políticas públicas inclusivas recentemente aplicadas para ingresso nas universidades brasileiras, ainda é marcado pelo reconhecimento distinto de direitos, por questões que se apresentam no ensino em momentos anteriores à universidade e pela pertinência de estudarmos contextos diversos para melhor compreender as diferenças que o informa.

Finalmente cabe lembrar que os critérios de mérito no novo contexto político-social podem se modificar novamente, com restrições de investimentos públicos, mudanças no currículo do ensino médio, no corte de bolsas de assistência estudantil ou pesquisa na universidade, e consequentemente, com a possibilidade de restrição ao acesso ao ensino superior. O que me põe o desafio de continuar e aprofundar as questões que minha formação inicial permitiu, com o limite sempre apresentado a todos que lidam com o “outro” e o estranhamento de si.

6. Referências Bibliográficas

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1 O INCT-InEAC - Instituto de Estudos Comparados em Administração Institucional de Conflitos. “Foi aprovado em fevereiro de 2009, pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, através da iniciativa do Programa ‘Institutos de Ciência e Tecnologia’”. Disponível em:

http://www.ineac.uff.br/?q=page/apresenta%C3%A7%C3%A3o

2 Pibid - Programa Institucional de Iniciação à Docência. É um programa em que projetos feitos por professores são escolhidos pelos alunos que querem ser bolsistas CAPES. E se dedicam a fazer uma pesquisa, ou criar um material didático, por exemplo, que pode ser aplicado em uma escola do ensino fundamental ou médio do município em que o pólo da universidade pública está localizado. Tem como proposta a aproximação do estudante de graduação da realidade do ensino público, e a partir do projeto de pesquisa vinculado, investigar esse campo de pesquisa. Sua bolsa é de R$ 400,00 reais. Com um período mínimo de 2 anos. Podendo ser renovado uma vez, por mais 2 anos.

3 Programa de Monitoria: Este programa propõe a iniciação ao trabalho docente no auxílio de um professor supervisor em atividades da sala de aula e também com os plantões em horário diferente da aula da disciplina. O monitor ou monitora deve ser um ator que tira dúvidas, explica, e auxilia na resolução de trabalhos e tarefas pedidas pelo professor. Sua bolsa é de R$ 400,00 reais. Com um período mínimo de 10 meses. Que não é renovado. Somente se o estudante se submeter a seleção para a bolsa novamente.

4 O Pré-Vestibular Josué de Castro em seu nome original se tornou o “Pré-Universitário da UFF/Campos – Josué de Castro”. Coordenada pela Prof. Scheilla Beatriz Alves Bárbara. Possuía uma seleção inicial de dois professores para cada disciplina, sendo um bolsista, pago pela Pró-Reitoria de Extensão, e o outro voluntário. Esta configuração inicial tinha como objetivo central garantir que os alunos tivessem aula sempre caso um docente não pudesse dar a aula. Mas aproveitei, junto com meu colega e amigo de disciplina fazer as aulas em conjunto. Experiência muito efetiva e aprovada pelos alunos.Façam mais isso.

5 FAPERJ – Fundação Carlos Chagas Filho de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio de Janeiro. “É uma Pessoa Jurídica de Direito Público, vinculada à Secretaria de Estado de Ciência, Tecnologia e Inovação, e tem como objetivo fomentar a pesquisa e a formação cientifica e tecnológica necessárias ao desenvolvimento sócio cultural do Estado do Rio de Janeiro”. Disponível em: http://www.faperj.br/?id=3.4.4

6 IES - Instituições de Ensino Superior. Aqui estão incluídos todos os espaços que oferecem cursos de graduação e formação de ensino superior, como os IFs (Institutos Federais), estes casos também devem ser citados por causa da “responsabilidade” que o poder Federal possui para gerir, expandir, oferecer vagas e incentivar o ensino superior no país. O poder Estatal está responsável pelo Ensino Médio, enquanto que o poder Municipal está com o Ensino Básico e infantil. Disponível em: http://www.infoescola.com/educacao/gestao-educacional/

7 INEP - Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira.

8 Disponível em: http://guiadoestudante.abril.com.br/enem/enem-2016-registrou-92-milhoes-de-inscritos/

9 Para um debate mais aprofundado sobre este caso, ver: LEWGOY, Bernardo. Cotas raciais na UnB: as lições de um equívoco. Horiz. antropol., Porto Alegre , v. 11, n. 23, p. 218-221, June 2005 .

10 Disponível em: http://globoesporte.globo.com/olimpiadas/judo/noticia/2016/08/somos-todos-silva-rafaela-conquista-1-ouro-do-brasil-na-olimpiada-do-rio.html

11 Disponível em: http://www.mpf.mp.br/rj/sala-de-imprensa/noticias-rj/mpf-rj-trf2-condena-dois-empresarios-por-trabalho-escravo-em-fazenda-em-campos-dos-goytacazes-rj

http://reporterbrasil.org.br/2010/09/fiscalizacao-liberta-95-de-trabalho-escravo-no-rio-de-janeiro/

http://www.rj.gov.br/web/seasdh/exibeconteudo?article-id=546522

12 UENF – Universidade Estadual do Norte Fluminense Darcy Ribeiro. A partir de uma ementa popular de Campos e cidades vizinhas em 1989 até o ano de 1993, quando ocorreram as primeiras aulas, a UENF lutou para ser um projeto de universidade para o terceiro milênio. Com a contribuição de Brizola, Darcy Ribeiro e Oscar Niemeyer esta instituição de ensino superior estadual se tornou uma das 15 melhores do país. Disponível em: http://www.uenf.br/portal/index.php/br/

13 IFF – Instituição Federal Fluminense de Campos dos Goytacazes, que possui dois campi na cidade e é procurado por oferecer vagas em diversas áreas do ensino: Técnico Integrado ao Ensino Médio, Técnico Integrado ao Ensino Médio na modalidade Proeja, Técnico Concomitante, Técnico Subsequente, Técnico na modalidade da Educação a Distância (EaD), Educação a Distância, Superior de Bacharelado, Superior de Licenciatura, Superior de Tecnologia e Pós-graduação. Disponível em: http://portal1.iff.edu.br/

14 GIDE – Gestão Integrada Da Escola. “É um sistema de gestão que contempla os aspectos estratégicos, políticos e gerenciais inerentes a área educacional com foco em resultados”, segundo site oficial do Governo do Estado do Rio de Janeiro.

15 SAERJ - Sistema de Avaliação da Educação Básica do Rio de Janeiro. “É um programa de avaliação diagnóstica do processo Ensino Aprendizagem realizado nas unidades escolares da rede estadual de educação básica”.

16 SEEDUC – Secretaria Estadual de Educação.

17 Disponível em: www.rj.gov.br/web/seeduc/exibeconteudo?article-id=1359479

18 GARDNER, H. Inteligência: um conceito reformulado. Rio de Janeiro: Objetiva, 1999.

19 Como deixo explicito na fala dela, em nenhum momento ela cita este autor e teoria. Logo, mantendo o contexto da resposta, quando ela explica sobre essas diferentes “habilidades”, não irei afirmar que ela queria dizer “inteligência”.

20 “Enquanto o conceito de civilização inclui a função de dar expressão a uma tendência continuamente expansionista de grupos colonizadores, o conceito de Kultur reflete a consciência de si mesma, de uma nação que teve de buscar e constituir incessante e novamente suas fronteiras, tanto no sentido político como espiritual, e repetidas vezes perguntar a si mesma: "Qual. e, realmente, nossa identidade?"(...) Os conceitos de Kultur e "civilização", para sermos exatos, portam o selo não de seitas ou famílias, mas de povos inteiros ou talvez apenas de certas classes. Mas, em muitos aspectos, o que se aplica a palavras específicas de grupos menores estende-se também a eles: são usados basicamente por e para povos que compartilham uma tradição e situação particulares”. (ELIAS, 1990 p. 25-26)


Publicado por: Lucas Loureiro

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