Entrevista Clínica e Diagnóstico

1 - O PROCESSO CLÍNICO DE ENTREVISTA

Apesar da grande importância da entrevista clínica e de está existir em todas as disciplinas da saúde mental, ainda é muito pequena a quantidade de escritos a respeito.

Uma entrevista clínica tem muito em comum com uma interação social, porém, se difere em alguns pontos fundamentais de outros tipos de relacionamento. Na entrevista clínica a maioria das regras sociais de etiqueta não são utilizadas, a conversa é predominantemente unidirecional e o relacionamento é profissional. Outro aspecto que difere a entrevista clínica é a delimitação do tempo, do lugar e da freqüência da interação.

Na entrevista clínica a maioria das informações obtidas pelo terapeuta vem do relato do sujeito, porém é necessário que o terapeuta saiba acrescentar a estas informações a observação clínica, os relatos adicionais de pessoas significativas, registro sobre o caso, testagem psicológica e entrevistas suplementares. De inicio é preciso que já fique estabelecido o tempo que o paciente terá a sua disposição.

A entrevista clínica pode ser dividida em estruturadas e não estruturadas. As entrevistas estruturadas incluem uma série de questões sobre áreas definidas de conteúdo, já as entrevistas não estruturadas, são encontradas mais facilmente nos settings clínicos. Geralmente, apesar de não ter um formato rígido, ainda segue uma certa estrutura.

É preciso citar também a falta de valor que e dado ao setting físico, que é importantíssimo em qualquer entrevista clínica. O estabelecimento deve ser confortável. Bem mobiliado, Ter uma temperatura agradável e deve conter todos os elementos necessários ao terapeuta. O ambiente deve ser calmo e as interrupções evitadas ao máximo.

2 - TIPO DE ENTREVISTAS

Existem vários tipos de entrevistas, caracterizadas pelo objetivo em direção ao qual as entrevistas estão sendo conduzidas.

2.1 - Entrevista de tomada de dados

Tem como objetivo geral obter informações preliminares sobre um paciente, alguns outros objetivos mais específicos são: obter informações suficientes para apresentar o caso em uma conferência clínica, clarificar a natureza dos serviços que a instituição oferece ou a natureza do tratamento que o paciente vai receber, comunicar as regras da instituição ao paciente, determinar o tipo de tratamento e o terapeuta mais indicado para o paciente, obter informações gerais para os registros da instituição e determinar a indicação de recursos mais adequados. Esse tipo de entrevista se da geralmente em instituições.

2.2 – Entrevista da história de caso

Ocorrem geralmente na maioria das entrevistas clínicas. É uma rica fonte de informações sobre o paciente e é conduzida com o propósito de a natureza dos conflitos do paciente em sua história com o foco nos períodos críticos antecedentes e desencadeantes. Histórias de caso podem ser obtidos através da família e de amigos, além é claro do próprio paciente.

2.3 – Entrevista do estado mental

É utilizada para determinar o grau de prejuízo mental associado a condição clínica interligada. As áreas avaliadas são raciocínio, pensamento, juízo, memória, concentração, fala, audição e percepção.

2.4 – Entrevista de pré e pós-testagem

A entrevista antes da testagem são preferidas por alguns psicólogos a fim de poder explicar ao paciente as razões do teste e seus benefícios e discutir aspectos administrativos, local, hora e pagamento da testagem. Quando a entrevista é pós-testagem, o psicólogo já desenvolveu alguma hipótese com o resultado do testagem, desejando explorá-los melhor com o paciente de modo a avaliar a compreensão do paciente em relação a informação apresentada.

2.5- Entrevista breve de avaliação

Caracteriza-se por um formato focal e de tempo limitado. O terapeuta está interessado numa área específica e não considera outros elementos da entrevista. Possui os seguintes propósitos: avaliar os riscos imediatos de suicídio num paciente depressivo em crise, determinar a necessidade da internação involuntária em hospital psiquiátrico, determinar se o paciente poder ser tratado em regime ambulatorial, determinar se ele é apto para prestar testemunho. A entrevista breve da avaliação é requerida por encaminhamento sendo o paciente provavelmente submetido à entrevista clínica tradicional.

2.6 – Entrevista de desligamento

Ocorrem quando o paciente está concluindo um programa de tratamento em regime de internação ou de ambulatório. O objetivo é conhecer o ponto de vista do paciente em relação aos benefícios trazidos pelo tratamento, examinar os planos para pós-alta ou trabalhar qualquer problema não resolvido anteriores a alta ou ao término do tratamento.

2.7 – Entrevista de pesquisa

É específico para a natureza da pesquisa desenvolvida. A entrevista é realizada com a permissão do paciente que assina um documento atestando seu consentimento.

3 - A ABORDAGEM DO PACIENTE NA ENTREVISTA

A entrevista clínica se deve basicamente a motivação do paciente em buscar tratamento, isso depende se ele veio voluntária ou involuntariamente. Caso tenha vindo voluntariamente, provavelmente percebeu algum problema e não conseguiu solucioná-lo com sua auto-ajuda, procurando então a ajuda de um profissional.

Os pacientes voluntários são mais fáceis de conseguir informação e de estabelecer uma aliança terapêutica, pois tem a expectativa de que terão seus problemas resolvidos com ajuda profissional. Já os pacientes que não vem de forma espontânea são mais difíceis de fazer uma aliança terapêutica, pois tem um nível de resistência maior. Cabe ao terapeuta trabalhar essa resistência e conduzir a entrevista de modo que a tarefa clínica possa ser realizada apesar da resistência.

Muitas vezes, mesmo pelo fato do paciente ter vindo voluntariamente não significa que ele não possa Ter alguma resistência frente a motivos não revelados, essa resistência acaba comprometendo a pureza da entrevista clínica. Por isso cabe ao terapeuta descobrir os verdadeiros motivos do paciente pela terapia, pois esses intervirão não apenas na entrevista como em futuras tentativas de intervenções.

A expectativa é outro item que influencia a entrevista. Pois muitas vezes se tem visão errada de um atendimento terapêutico levado a uma expectativa que não condiz com o real. É importante então que pergunte-se ao paciente o que ele acha que vai ser feito na entrevista e que a razão desta a fim de clarear as idéias para o paciente.

A percepção do paciente pelo terapeuta também influencia na entrevista. Muitas vezes a visão que o paciente tem do terapeuta pode afetar todo o processo clínico. Por isso é importante que o terapeuta compreenda se tais percepções existem e se influenciam a interação dinâmica entre o paciente e terapeuta durante o processo de entrevista.

Todos estes itens citados acima são importantes pois influenciam a maneira como o paciente vai se conduzir na entrevista.

4 - A ABORDAGEM DO TERAPEUTA NA ENTREVISTA

O primeiro fator que influencia a abordagem do terapeuta na entrevista é a sua orientação filosófica. Raramente o terapeuta começa a entrevista com o quadro em branco. Os terapeutas possuem uma estrutura teórica que define as áreas de investigação, o método de investigação, suas avaliações e objetivos. Em uma perspectiva de sistema família/entrevista é bem diferente da entrevista de orientação comportamental.

Valores e crenças pessoais são o segundo fator que determina a abordagem do terapeuta na entrevista. A relação das técnicas que serão utilizadas é realizada à partir da sua orientação filosófica e de seus valores e crenças pessoais. Enquanto um terapeuta pode valorizar muito a expressão de sentimentos outro pode valorizar a disposição para a introspecção ou ainda o desejo de investigar antecedentes e conseqüências do comportamento.

Ao final da entrevista clínica o terapeuta já fez algumas avaliações, tanto sobre o problema como sobre o paciente. Com base nessa avaliação são definidos os objetivos e os métodos de tratamento.

5 - TÉCNICAS DE ENTREVISTA

Sua orientação filosófica geralmente determina quais delas eles utilizarão mais e o grau de ênfase atribuído a determinada técnica, mas em verdade, tais técnicas todas são a base do processo de entrevista.

Essas técnicas incluem o questionamento direto, a reflexão, a reexposição (paráfrase: colocar em palavras que possibilitem uma melhor compreensão), o esclarecimento, a confrontação, a auto-revelação, o silêncio, a explicação, a “reframing” (restruturação cognitiva), a interpretação e o humor.

Questionamento: Esta é a técnica mais freqüentemente empregada pelos entrevistadores clínicos. O questionamento pode ser tanto direto como em aberto.

Reflexão: Essa técnica requer que o entrevistador tenha habilidade de reproduzir o material cognitivo ou emocional do paciente, de modo a mostrar-lhe que seus sentimentos ou declarações foram compreendidas. O emprego excessivo da reflexão em uma entrevista é contraproducente, porque muitas áreas importantes são deixadas de lado.

Reexposição (Paráfrase): A reexposição simplesmente coloca em outras palavras, de maneira mais clara e articulada, o que o paciente diz. A reexposição é em geral empregada para facilitar a compreensão e para esclarecer, enquanto a reflexão e utilizada como uma intervenção terapêutica.

Clarificação: A clarificação geralmente se faz pela utilização de alguma das outras técnicas (questionamento, paráfrase ou reexposição), mas o seu propósito é auxiliar o paciente a compreender o que é dito na entrevista.

Confrontação: A confrontação é a técnica através da qual o terapeuta aponta discrepâncias entre o que é observado e o que é falado. Às vezes ela é empregada quando o paciente diz alguma coisa diferente daquilo que o terapeuta está percebendo dele. A confrontação é freqüentemente utilizada com drogados e outros pacientes com transtornos de caráter, a fim de desfazer suas negações e defesas rígidas. Ela em geral produz o efeito de aumentar a ansiedade e desencadear a negação e a evitação que ela buscava atingir.

A confrontação pode ser construtiva ou destrutiva, quando mal utilizada ela pode ser maléfica; deve ser utilizada por terapeutas experientes.

Auto-revelação: Através desta técnica, o terapeuta transmite ao paciente suas experiências pessoais ou sentimentos. A auto-revelação por parte do terapeuta facilita a auto-revelação do paciente. Porém, esta técnica deve ser empregada com moderação porque pode provocar uma falsa expectativa no paciente. O terapeuta precisa ser criterioso ao determinar quais informações devem ser reveladas, bem como seu possível efeito no paciente.

Silêncio: O silêncio pode ser uma técnica de entrevista e um artifício terapêutico que proporciona ao paciente uma oportunidade de processar e compreender o que foi dito, encaminhando a entrevista, assim, em direção positiva. O paciente deve compreender o motivo do silêncio porque geralmente visa facilitar a introspecção ou permite ao paciente reassimilar suas emoções depois de liberá-las.

Exploração: Através desta técnica é possível a investigação de áreas da vida do paciente que requerem um exame mais profundo. Também pode ser empregada para determinar o grau de insight do paciente, e o quanto ele precisa ser pressionado para que possa experienciar um dado sentimento. Os terapeutas não devem ter medo de explorar certas áreas, mesmo que elas possam ser encaradas como delicadas.

Reframing (Reestruturação cognitiva): Esta técnica faz com que o paciente e o terapeuta reafirmem suas crenças, atitudes ou sentimentos de maneira mais realista, proporcionando uma perspectiva nova de uma situação e servindo para desfazer afirmações negativas. Esta técnica pode levar a mudanças no comportamento e embora seja eficaz, ele não dispensa a prática e o desenvolvimento das habilidades do terapeuta, de modo que pode alcançar sua eficácia total.

Interpretação: Através desta técnica, o terapeuta oferece informações de um modo que permite ao paciente explorar seu comportamento e compreender sua motivação. Esta técnica é a mais difícil de ser alcançada, porque implica no domínio amplo da teoria da personalidade e motivação, acompanhada de experiências supervisionada.

A maioria dos terapeutas, usa a interpretação de uma forma ou outra. Alguns confiam nela muito mais do que nas demais e os pacientes podem simplesmente aceitar as afirmações do terapeuta, acreditando em sua experiência, sabedoria e autoridade. Por esta razão, devemos ser criteriosos e cuidadosos ao fornecer interpretações.

Humor: A compreensão do papel do humor na avaliação clínica é recente. Porém, o humor pode reduzir a ansiedade, facilitar o movimento terapêutico e enriquecer a entrevista. Uma confiança excessiva nesta abordagem dará ao paciente a impressão de que o terapeuta não está levando a sério a entrevista. Portanto, o humor deve ser empregado moderadamente com o propósito básico de beneficiar o paciente.

6 - AS QUALIDADES INTERPESSOAIS DO TERAPEUTA

Os terapeutas trazem consigo um conjunto de características pessoais que é considerado mais importante do que qualquer técnica de método teórico.

7 - FASES DA ENTREVISTA

Uma boa entrevista clínica desenvolve-se em fases controladas pelo terapeuta.

Sellivan caracterizou a entrevista como uma seqüência de fases classificando como: início formal, reconhecimento, investigação detalhada e término.

Benjamin divide a entrevista em 3 estágios: início ou apresentação do problema, seguido pelo desenvolvimento e o encerramento.

Kanfer e Scheff dividem em estruturação dos papéis, formação da aliança terapêutica, desenvolvimento do comprometimento com a mudança, análise do comportamento, discussão dos objetivos do tratamento e planejamento.

Para Rogers o paciente vem em busca de ajuda, a situação é definida, e através da aceitação, clarificação e da expressão de sentimentos positivos, ocorre o desenvolvimento do insight.

Há estágios na entrevista em que a maioria dos terapeutas concordam. Primeiro há a introdução, a qual tem como tarefa principal o desenvolvimento do rapport e o estabelecimento da confiança. Em segundo lugar, há a exploração, a qual irá formar uma hipótese que justifique os fatos principais do caso.

O terceiro é o teste da hipótese. O quarto estágio é oferecido o feed back, onde o terapeuta revela ao paciente os pontos mais importantes da avaliação. E a fase final é o término, onde a tarefa é desenvolver um plano de tratamento adequado a objetivos sobre os quais há concordância mutua.

8 - INTERAÇÃO DINÂMICA

A natureza desta interação foi enfatizada por algumas orientações e minimizada por outras. Os rogerianos admitem que a transferência se faz porém não que ela seja um aspecto importante no tratamento. Já os behavioristas acreditam que o relacionamento entre paciente e terapeuta é importante na medida em que facilita o desenvolvimento de estratégias comportamentais.

9 - OS ÚLTIMOS CINCO MINUTOS

Diz respeito ao término, que é o último estágio. É comum a entrevista ser encerrada abruptamente, sem um sinal e sem que sejam consideradas importantes informações clínicas que podem ser obtidas nos últimos minutos.

Porém ela deve ser dedicada a redução da intensidade emocional do paciente e assegurar-se de que todas as informações importantes foram apresentadas.


Publicado por: Brasil Escola

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