Música como documento em sala de aula - Música popular brasileira no ensino de história do Brasil

RESUMO

A presente pesquisa tem por objetivo defender e afirmar a necessidade da utilização da musica como documento histórico em sala de aula abordando o Tema MPB no período da ditadura militar no Brasil de 1968 a 1975, demonstrando a importância do uso das inovações metodológicas em loco à ditadura militar no Brasil visando à relevância deste período histórico como história crítico-reflexiva nos meandros educacionais além de compreender alguns aspectos da história do Brasil sob a ótica da música e todo o cenário musical de desenvolvimento da música e sua influência na vida política, social e cultural do país abordando ainda fatos históricos que contribuíram para a evolução e firmação da MPB como parte da cultura brasileira. Sobretudo, esta pesquisa possui sua importância na construção da identidade do aluno como agente histórico crítico-reflexivo. Assim, o professor de história, rompendo com as barreiras que dificultam o uso da música como documento, podendo usá-la ao seu e a favor do aluno como um instrumento a mais na construção do conhecimento histórico do aluno e da sua identidade. Portanto, a luz da pós-modernidade, a utilização da MPB como documento histórico vai ao encontro dos anseios do ensino de História atual.

Palavras-chave: Documento histórico - Musica popular brasileira – história – ensino de história

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO 8
2 CAPÌTULO 1- A música como documento histórico em sala de aula 10
1.1- Música popular brasileira no ensino de história 12
3 CAPÌTULO 2 - O “olhar” da MPB sob a Ditadura Militar no Brasil (1968 – 1975) 16
2.1. Uso da música na construção da identidade do aluno 18
4 CAPÍTULO 3- Planejando uma aula sobre ditadura militar (1968 – 1975) 23
3.1- Trabalhando a música dentro do contexto da ditadura militar (1968 – 1975) 27
5 CONCLUSÃO 37
6 REFERÊNCIAS 39

1 INTRODUÇÃO

Este pesquisa pretende abordar o uso da “Musica popular brasileira no ensino de História, tem como principal preocupação e a necessidade de utilização das inovações metodológicas no ensino de história e introduzir uma historia inclusiva.

Assim, diante do fato, de que, no ensino de história ainda prevalece uma visão eurocêntrica e positivista, especialmente no que diz respeito à história do Brasil, que devido aos muitos anos de utilização da metodologia positivista se apresenta desinteressante, repetitivo, pronto e acabado, repleto de vultos políticos e dotado de uma visão eurocêntrica direcionando o rumo da história para a evolução econômica e capitalista. Esta pesquisa pretende conduzir o professor a utilizar a música no ensino de história, não se detendo a simples interpretação da letra ou como fundo musical de determinados temas, mas em todo seu aspecto histórico.

Assim, pretende-se que ao aplicar esta metodologia em aula, contendo música como fonte histórica, o aluno perceba o momento histórico através da musica, e a analise como um todo, e a perceba como uma forma de expressão de idéias popular, uma linguagem, reconhecendo ainda sua influência na vida social, política e econômica do país. Pretende-se ainda nesta pesquisa, trabalhar a música abordando ainda a questão da “MPB na ditadura militar 1968 - 1975”, tema a ser aplicado no “3º Ano do Ensino Médio” analisando os acontecimentos desde o período de surgimento da MPB, até sua propagação na sociedade, sua influencia social, política, econômica e ainda ideológica.

Diante da rica quantidade de musicas que existem apesar de não estarem organizadas em acervos como ocorre com os documentos históricos, e mesmo com a falta de estudos mais contundentes paralelos entre o passado e presente a partir da musica, entende-se assim, a importância que é conhecer a história e saber extrair dela conhecimentos para construção da identidade.

A música tem facilidade de romper com o óbvio, levantando novas questões, problemáticas e abordando temas até então pouco debatidos em sala de aula.

“A musica é um elemento capaz de informar, expor ou explicitar as ações humanas, sua historia, existências, angústias e necessidades” (Madeira, 2008).

Para Madeira (2008), um exemplo típico da musica como forma de retrato social esteve presente no período da ditadura militar no Brasil, uma época de repressão e resistência. Muitos compositores brasileiros utilizaram essa forma de expressão como meio de torna publicas suas discordâncias políticas e sociais.

Diante desse fato, se torna possível a utilização de musicas desse período em sala de aula, fazendo uso de diferentes momentos históricos, confrontando e fazendo relação, passado-presente. Abordando assuntos propostos pelos PCNs e dando ênfase a acontecimentos atuais dentro da realidade do aluno.

O uso da musica popular brasileira em sala de aula, como documento histórico, alem de ser prazeroso para o aluno, será um grande desafio para o professor, pois esse é um tema pouco trabalhado pelos autores e as fontes não estão organizadas como as fontes escritas, no entanto será um desafio que vai fazer toda a diferença no ensino de história, será uma forma quantitativa de atrair a atenção dos alunos e promover o processo ensino-aprendizagem.

2 CAPÍTULO 1: A música como documento histórico na sala de aula

Maria Auxiliadora Schimidh (2004) no seu livro “Ensinar História”, demonstra que inovações em sala de aula fazem com que a prática docente desmitifique a noção que se tem do “professor enciclopédia” detentor do saber, substituindo pela imagem de um “professor construtor”, que contribui para o conhecimento de seus alunos em sala de aula, e que se percebe que a música é uma forma de indicar ao aluno novas formas de compreender a história.

A partir dessa conjectura surge a proposta de utilização da musica popular brasileira como documento histórico em sala de aula. Abordando a MPB na ditadura militar (1968 a 1975). Considerando que essas possibilidades de inovações só se tornaram possível, devido a uma vertente ocorrida na historiografia e na ampliação do uso de fontes históricas que antes se restringia ao escrito:

A partir da década de 30 do século XX, que marcou o início da produção historiográfica da Escola dos Annales, uma nova perspectiva foi incorporada: o homem e as sociedades humanas no tempo são identificados como sendo o objeto do historiador, possibilitando a multiplicação dos atores históricos e, ao mesmo tempo, as variantes temáticas e o uso de fontes, o que exige ampliação das reflexões teóricas e metodológicas (REIS, 1994 apud MAGALHÃES, 2000?).

Com isto pretende-se não só resgatar o uso da música importante como documento histórico, mas utilizá-lo de maneira ainda mais proveitosa, visto que, segundo MOSCOVICI, 1979:

A observação, a leitura, a audição de documentos aleatórios, informais, são importantes para as representações sociais dos alunos que são intimamente ligadas aos conceitos espontâneos desenvolvidos nas interações sociais imediatas, transformados, em situações formais de aprendizagem, em conceitos científicos. (1979 apud ABDU, 2005).

Nota-se no pensamento de Moscovici, a importância da espontaneidade no processo de assimilação da aprendizagem por parte do aluno, e com a musicalidade traz-se um novo estímulo ao aprendizado, pois, é isto, justamente o que a música utiliza-se desta ferramenta essencial, que é a espontaneidade do processo assimilativo dos conteúdos pré-estabelecidos pelo professor. Entretanto, se estudarmos de uma formação ainda mais global com a música não se adquire somente conhecimentos linguísticos e história, mas desenvolve-se na criança a musicalidade, a atenção, cultura, socialização, meio ambiente, o civismo..., como nos explica:

As chamadas linguagens alternativas para o ensino de história mobilizam conceitos e processam símbolos culturais e sociais, mediante os quais apresentam certa imagem do mundo. Imagem esta que acarreta outras instâncias de referências, como comportamentos, moda, vocabulário. Elas provocam uma atividade psíquica intensa feita de seleções, de relações e com representações criadas e expressas por outras formas de linguagem. Donas de identidades próprias, as linguagens exigem uma proposta didática e instrumental adequada para sua exploração nas aulas de história. (apud Moniot, 1993, p. 21).

O livro Revolução Francesa da Historiografia – A escola dos Annales (1929 – 1989), escrito por Peter Burker, demonstra a importância que teve a escola de Annales para que grandes mudanças que dão vazão para a utilização de novas fontes documentais. Essas mudanças surgiram num momento em que os historiadores sentiram a inviabilidade do absoluto e do excesso de cientificidade da historiografia positivista, surge à corrente dos Annales, propondo uma renovação no conceito de história, abrindo os horizontes, despertando para a colaboração de diferentes ciências do homem, numa luta incansável por uma historia total, centrada na atividade humana, na vida dos grupos e das sociedades. Defendiam, essencialmente, uma história problema, comparativa, analisando, questionando, criticando, levantando hipóteses, na construção de uma história inclusiva.

Para AROSTÉGUI:

O pesquisador histórico, ainda que de forma implícita e mesmo inconsciente, busca seus fatos do passado servindo ao propósito de explicar por quês... Construir hipóteses é uma tarefa que está sempre ligada á formulação de perguntas e que se faz necessária desde que são reunidos os primeiros fatos pertinentes no fenômeno que se pesquisa... Sem construção de hipóteses não é possível dar conta, ao final de uma pesquisa das razões pelas quais uma situação histórica é como é... Pesquisar é justamente ir destruindo essas primeiras hipóteses e, se for preciso, mudar toda a orientação da busca de novas realidades e verdades.

Weaseling menciona um observador alemão simpatizante do movimento de Annales que chegou à conclusão que “uma história, ao estilo de Annales”, sobre a história de nosso século é, ao mesmo tempo, necessária e impossível. Se for escrita, não será história ao estilo dos Annales. “Mas a história contemporânea não pode continuar a ser escrita sem os Annales”. (1978, apud BURKER, 1992, pg. 154)

Essa conjectura há tanto tempo escrita, permanece sendo uma verdade, alguns passos foram dado, no ensino os Pcns buscam renovar o currículo escolar com proposta de abertura de utilização de metodologias de ensino e avaliação que estimulem a iniciativa dos estudantes. (PCNS art. 36 – II)

SCHIMITCH (2004) ressalta que:

O professor de história ajuda o aluno a adquirir as ferramentas de trabalho necessárias para aprender a pensar historicamente, o saber-fazer, o saber-fazer-bem, lançando os germes do histórico. Ele é o responsável por ensinar ao aluno como captar e valorizar as diversidades das fontes e dos pontos de vista históricos, o levando a reconstruir, por adução. O percurso da narrativa histórica. Ao professor cabe ensinar ao aluno a levantar problemas, procurando transformar, em cada aula de história, temas e problemáticas em narrativas históricas.

Deste modo, estando à música imbuída nesse processo de formação da memória e de construção do conhecimento histórico a intenção é de que a musica possa ser discutida enquanto recurso didático em sala de aula. Tornando possível, e respaldada, a indicação da utilização da musica popular brasileira no ensino de história, para a construção de uma cultura totalmente brasileira, com a possibilidade de tornar a aula de história dinâmica, prazerosa, e inovadora.

De acordo com os PCNs, aprendizagem deve desenvolver competências e habilidade para que o aluno entenda a sociedade que vive como uma construção humana, que se reconstrói constantemente ao longo das gerações num processo continua e dotado de historicidade... Para que compreenda o espaço ocupado pelo homem... Para que construa a si próprio como um agente social que intervém na sociedade.

1.1 Música Popular Brasileira no ensino de história do Brasil

“A história do Brasil é cheia de brechas e lacunas ainda não preenchidas” (Schimidt), mas que segundo Moraes, a musica popular brasileira pode desvendar; Em seu trabalho “História e música: canção popular e conhecimento histórico”, Moraes aborda e discuti algumas questões teóricas e metodológicas que surgem das relações entre historia, musica popular. As transformações teóricas, nas concepções de material documental e a renovação na prática do historiador, determinando a inclusão de novas linguagens pela história. Expressando assim, a importância que pode ter, a utilização da música popular brasileira como fonte documental para divulgar a história de setores da sociedade pouco lembrados pela historiografia.

Também Abdu, professora de Metodologia de Ensino de História Na USP, afirma em seu texto “Registro e representação do cotidiano: A música popular na aula de História”, que a musica popular é uma linguagem alternativa que tem sido utilizada como um importante recurso didático para a aprendizagem de história e que tem ocupado espaço, como instrumento pela qual se revela o registro da vida cotidiana, na visa ode autores que observam o contexto social no qual vivem. Abdu ainda defende a música como evidência do passado que pode facilitar a compreensão histórica pelos alunos.

Para ABDUD (2005):

As letras das musicas se constituem em evidencias, registros de acontecimentos a serem compreendidos pelos alunos em sua abrangência mais ampla, ou seja, em sua compreensão cronológica, na elaboração e re-significação de conceitos próprios da disciplina. Mais ainda, a utilização de tais registros colabora na formação dos conceitos espontâneos dos alunos e na aproximação entre eles e os conceitos científicos.

Diante da real dificuldade que é romper com os ideais positivistas inda contidos no ensino brasileiro, e dos livros didáticos ainda possuir traços euro centristas, o musica popular brasileira no ensino de história se apresenta como uma rica fonte cultural, capaz de levar a compreender a realidade da cultura popular e desvendar detalhes ainda fragmentados. No entanto, raramente são feitas investigações, que busquem ratificar a musica como fonte histórica, existindo poucos trabalhos que evidenciam a relação entre história e musica.

Quando o assunto é MPB, fica difícil não relacionar a fatos que marcaram a história brasileira. Como grandes movimentos embalados pela musica popular, que causaram impactos, e a ditadura militar reprimindo e censurando a liberdade de expressão e obrigando muitas obras a serem revistas, sob pena da censura, nesse período muitos cantores surgem no cenário, lutando através da musica contra a ditadura, compondo musicas com duplo sentido, num confronto marcado por violência, prisões e exilo (1968 a 1981).

Essas músicas ganham um poder histórico pouco valorizado no que diz respeito ao seu estudo histórico, ou superficialmente abordados, como forma de expressão artística.

NAPOLITANO (2002), em seu artigo “A produção do silêncio sob suspeita: A violência do regime militar contra há MPB nos anos 70”, diz que:

A partir de fontes pesquisadas junto às coleções documentais da censura federal e da polícia política ligadas ao regime militar brasileiro, podemos vislumbrar não apenas o impacto do autoritarismo na cena musical brasileira, entre 1970 e 1979, mas também a lógica da repressão e do controle do Estado autoritário sobre os músicos. Neste período, o controle da circulação das canções e da realização de shows com cantores esquerdistas (ou simpatizantes) marcaram a atuação dos órgãos de censura e repressão, voltados principalmente, mas não apenas, contra o gênero MPB. A ação repressiva dos órgãos do regime tornou-se parte da cena musical do período, entrando em conflito com um momento de grande expansão da indústria fonográfica nacional.

A música estava em fase de crescimento, e a partir daí é possível compreender a abrangência do movimento musical na luta contra a ditadura, em busca da mobilização social. Daí se percebe a importância que da musica na elucidação de fatos perdidos ou mascarados da história que não estão contidos nos livros didáticos, mas que são fundamentais para a compreensão do aluno, com relação a determinados períodos da ditadura militar no Brasil.

De acordo com VIANA em seu texto “Dura Travessia: a importância da música popular na mobilização pelas Diretas Já e na comoção pela morte de Tancredo Neves” (2005), a música é um tipo de produção simbólica contextualizada, ou seja, carrega traços de contextos culturais, políticos e econômicos da sociedade em que foi produzida e ainda tem o poder de formar opiniões ou até influenciar, pois, move com o subjetivo do individuo, a partir do momento em que reflete sua realidade. Assim, diz:

Este sentido extra musical reconhecível possibilita a associação da música a elementos da vida cotidiana ou a elementos da identidade coletiva da qual o indivíduo faz parte. Quando esta música é utilizada em campanhas políticas, pode-se contribuir para a identificação da existência de uma vontade popular pertencente a esta identidade coletiva, pois, a canção constrói e, quando compreendida, dá a conhecer questões essenciais, tais como nossa identidade coletiva, nossa soberania, a alegria, a dor, o amor. A música popular, ao ser utilizado em tais campanhas, seria capaz de evidenciar a vontade popular e ao, mesmo tempo, mobilizar a população a fim de concretizá-la.

VIANA (2005) ainda enfatiza a importância da musica popular no momento da mobilização popular na Campanha pelas Diretas Já:

A campanha, em 1984, pela aprovação da emenda Dante de Oliveira, que propunha eleições diretas para Presidente da República, teve como característica principal a manifestação popular nas ruas das principais cidades brasileiras do país... Podia perceber a presença da música popular brasileira nos comícios. Músicas estas que foram cantadas juntamente com os Hinos oficiais, como se fossem também, tais como estes hinos à liberdade e ao Brasil. A voz que canta a música popular é a mesma que canta o Hino oficial. O dono desta voz era o artista popular acompanhado pelas multidões que participavam de comícios como o de Belo Horizonte, brasileiros que, apesar de "todo o problema" e contra o "todo sistema" político, vão levando a vida e o movimento pelas Diretas adiante. As músicas populares cantadas nestes eventos passaram também a fazer parte da programação de emissoras de rádio que apoiavam a campanha.

Abordar os temas propostos pelos PCNS a partir de música popular brasileira do passado e do presente contribuiria com a construção da identidade do aluno moldando e acrescentando em conhecimento. A pesquisa aborda um tema a ser trabalhado no ensino médio, tendo em vista que a DCNEM de 2002, no art. 8º - II pg. 105, diz que:

O ensino deve ir além da descrição e procurar constituir nos alunos a capacidade de analisar, explicar, prever e intervir, objetivos que são mais facilmente alcançáveis se as disciplinas, integradas em áreas de conhecimento, puderem contribuir cada uma com especificidade, para um estudo comum de problemas concretos, ou para o desenvolvimento de projetos de investigação e ou de ação.

E ainda, segundo BITTENCOURT (2004):

As propostas de renovação dos métodos de ensino pelos atuais currículos organizam-se em torno de dois pressupostos. Um pressuposto básico e fundamental é a articulação entre o método e o conteúdo... O segundo pressuposto é que atuais métodos de ensinos tem de se articular as novas tecnologias para a produção do conhecimento, e tal constatação interfere em qualquer proposta de mudança dos métodos de ensino.

Levando em consideração a mudança no comportamento social, que o aluno de hoje convivem e obtém mais informação devido às inovações tecnológicas que não estavam presentes nas décadas anteriores, os professores precisam buscar meios para despertar o interesse desses alunos, utilizando esses meios tecnológicos com a qual os alunos se identificam em favor do ensino; computadores, MP3, Pen Drive, etc. E através deles, aprofundar a analise da musica em sala de aula.

Essa pesquisa só confirma a importância da pesquisa e a necessidade de que outras disciplinas se unam no mesmo objetivo, de construir um saber rico e proveitoso, valorizando o conhecimento prévio do aluno para partindo dele selecionar o melhor método de abordar os assuntos tendo a musica como uma das fontes, tornando cada aula, no ponto de vista de SHIMITH (2004), um “espetáculo cheio de vida e sobressaltos” onde cada aula é única e a matéria fornecida pelo professor para raciocinar, possibilite de fato o raciocínio.

3 CAPÍTULO 2: O “olhar” da MPB sob a Ditadura Militar no Brasil (1968 – 1975).

Porque a História da MPB deve ser trabalhada no Ensino de História da Ditadura Militar no Brasil (1968 – 1975)?

Considerando o fato de ter sido o período da ditadura militar o momento que a MPB se impôs no panorama histórico, em que a musica como forma de protesto ganhou popularidade, é imprescindível falar da importância que teve não só a musica popular, mas também a bossa nova, para que a musica aparecesse no cenário político e dando possibilidade de ser trabalhada como documento histórico na reconstrução da história em sala de aula.

As mudanças ocorridas na sociedade podem ser observadas a partir do período da “Bossa Nova” iniciada na década de 30, sendo reconhecida na década de 50, tendo forte influencia do jazz norte americano, uma junção do samba com o jazz, dando origem ao primeiro movimento urbano egresso das faculdades, associado ao crescimento urbano, que surgiu na euforia do crescimento econômico gerado pela segunda guerra mundial; Músicos jovens de classe média que buscavam fugir do estilo operístico que predominava no Brasil, que buscavam influenciar o mundo com a cultura brasileira e internacionalizar a música. Sua principal característica era o canto falado ao invés da valorização da grande voz.

A partir dessas mudanças, já se torna possível perceber as mudanças na mentalidade do país, e sobre tudo, na busca pela identidade nacional. A música popular brasileira apresenta em seu desenvolvimento o embate entre “O capitalismo” e o “Socialismo” no cenário mundial e o duro regime ditatorial interno. Uma mistura de ritmos que pretende representar a sociedade brasileira entre 1968 a 1975.

Para Febvre:

Um rio pode ser tratado por uma sociedade como uma barreira, mas por outra como meio de transporte. Em ultima analise, não é o ambiente físico que determina a opção coletiva, mas o homem, sua maneira de viver, seu comportamento. (1922, apud BURKER, pg. 18).

O que nos leva a entender que o homem é quem produz a história, com seu comportamento, sua ação, seu vestígio de existência. E fazendo uso dessa afirmação de Frebvre, analisando a música popular cenário político notou que o controle da produção artística marcou o Estado Novo (Regime dirigido por Getulio Vargas entre 1937 a 1945) onde era comum o uso de estratégias para convencer os artistas a cooperar com a propaganda oficial. Já no período dos militares (1964 – 1985), a repressão se deu num confronto muitas vezes direto e de forma violenta, devido às idéias contidas na música e sobre tudo o reconhecimento das autoridades no que diz respeito à capacidade da musica de despertar para a realidade e considerando que naquele contexto era vista como ameaça, hoje se pretende que aquelas musicam sejam utilizadas como forma de contribuir na construção do conhecimento histórico. (Cavalcanti, 2010).

Em 1964 com o golpe militar, muitos professores foram perseguidos por sua posição ideológica, e o decreto lei 477 limitava o direito de expressão dos professores e alunos. O período mais rígido da ditadura militar decide abafar a voz de qualquer pessoa que aparentasse ser uma afronta ao governo, e a forma de censura era muitas vezes feita através da força e atingindo o ápice da agressividade após a instalação do AI5, em 1968.

Essa pesquisa aborda a questão dos professores, alunos e universidades, por que a música popular surge exatamente nesse espaço, e seu maior público se relacionava as universidades e estudantes da classe média e pretende ainda apontar o caminho para que o aluno compreenda por que o governo combatia a difusão das músicas sem antes passarem por analise.

O movimento estudantil posto na ilegalidade desde o governo de Castelo Branco (1964 a 1967), continuava sendo alvo de inúmeras medidas arbitrárias e violentas, como a invasão de universidades, que mais de uma vez resultou em prisões e ferimentos graves. As lideranças estudantis mesmo perseguidas, ameaçadas e muitas vezes presas, conseguiam canalizar as insatisfações especificas do setor. A morte de estudantes universitários repercutiu grandemente, inclusive no seio da classe média; novas violências e prisões fizeram com que esses protestos se alastrassem pelo país. (FICO, 2001).

O Jornal “A última hora” assim anunciava acerca dos acontecimentos:

Os ministros Gama e Silva, justiça, anunciou as horas de ontem o Ato Institucional nº5, baixado pelo presidente da republica, assinada por todo o ministério após reunião do conselho de segurança Nacional. São as seguintes as principais decisões contidas no documento, cujo objetivo anunciado é salvar a revolução de março de 64:

1- São mantidas as constituições: Federal e Estaduais;

2- Através de ato complementar, o presidente da republica tem o poder de decretar o recesso do congresso, que só voltara a funcionar quando convocado novamente pelo poder executivo;

3- O presidente poderá decretar a intervenção em estados e municípios;

4- Fica restabelecido o poder presidencial de cassar mandados e direitos políticos, de demitir, remover ou aposentar funcionários públicos, autárquicos ou de empresas mistas;

5- O presidente poderá decretar estado de sitio e de determinar confisco de bens;

6- Estão suspensas garantias de habeas corpus para delitos políticos.

O ato complementar nº38, buscando logo em seguida, decreto recessivo do congresso por tempo indeterminado. 14/12/1968

Segundo o jornal, Ultima Hora; em meio aos rumores que seria decretado o recesso do congresso e editado um “Ato Adicional” e de que o Marechal Costa e Silva se reuniria no palácio das Laranjeiras, com chefes militares e o conselho de segurança nacional para examinar a situação de crise em todo país. Já se anunciava as 21m20h, que as tropas do I Exército haviam entrado em regime de prontidão rigorosa em toda sua área, que abrangia alem da Guanabara, Brasília e os estados de Minas, Rio de Janeiro e Espírito Santo. Para coibir manifestações na rua, que já estavam programadas por setores estudantis, em regozijo pela decisão da câmara, segundo apuraram os setores de informação do governo. (13/12/1968)

“A aprovação do Ato Institucional nº5 (AI5), foi o mais duro golpe na democracia dando poderes absolutos a junta militar. Essa lei entrou em vigor em 13 de dezembro de 1968, foi lida a noite em cadeia nacional de radio e televisão”. (FICO)

O período governado pelo presidente, general Emílio Garrastazu Médici (1969 a 1974), escolhido por uma junta militar, substituindo Costa e Silva, foi considerado o mais duro e repressivo, denominado como “Anos de Chumbo”. Momento em que a repressão atinge seu auge: revistas, jornais, livros, peças de teatros, filmes, músicas e outras formas de expressão artísticas têm sua exposição proibida pela censura. O DOI – CODI (Destacamento de Operação de Defesa Interna e ao Centro de Operação de Defesa Interna), atuando como centro de investigação e repressão militar.

ODOI – CODIs, ou órgãos semelhantes. Agiam impunemente. Tinham a sua própria lei. E não respeitavam as do país, nem mesmo os prazos processuais estabelecidos pela própria Legislação de Segurança Nacional. As pessoas eram interrogadas encapuzadas. Seus interrogatórios usavam codinomes ou apelidos e não se identificavam aos presos. Dificilmente haverá pessoas que tenham passado por eles sem terem sido torturados. (ARNS, 2009)

Esse período marcou um declínio nas manifestações estudantis, com a desarticulação das entidades e, perseguição das lideranças que eram assim empurradas para a oposição clandestina. As mais singelas tentativas de retomar lutas reivindicatórias as faculdades eram reprimidas. O movimento estudantil, só começaria a agir depois de 1974, ocorrendo em 1976 às primeiras manifestações de rua que serviriam para reanimar a participação estudantil rumo à reconstrução da UNE (União Nacional de Estudantes). (ARNS, 2009, pg. 173).

Se por um lado o país estava no considerado Anos de Chumbo, por outro, devido ao crescimento econômico, no período de 69 a 73, fica marcada a “Época do Milagre Econômico”. O PIB brasileiro estava crescendo a uma taxa de quase 12% ao ano, a inflação orçava os 18%. Os investimentos exteriores geraram milhões de empregos, enquanto houve avanço e estruturou uma base de infra-estrutura. Grandes obras foram executadas, como a Rodovia Transatlântica e a Ponte do Rio Niterói, e grandes incentivos ao consumismo. E buscando implantar essa imagem de prosperidade, as repressões aos órgãos de imprensas acabam por impedir a denúncia das arbitrariedades que se espalhavam pelo país, utilizando os meios de comunicações para instituir uma visão positiva sobre o governo militar. As palavras de ordem eram “Brasil, ame-o ou deixe-o”, elas integravam o discurso político da época que defendiam o ufanismo brasileiro.

Houve uma intensa produção musical no período da ditadura militar, que podem nos fornecer uma visão mais abrangente dos acontecimentos, sob a ótica do compositor e mesmo considerando sua produção como produto comercial, percebe-se que a musica teve um papel de destaque na ditadura entre estudantes de classe média, pois mesmo com a censura, era bem divulgada e embalava movimento. A utilização da mesma no ensino de história visa uma verdadeira construção de identidade, trazendo a luz à realidade obscura do passado do Brasil contido nas músicas.

2.1. Uso da música na construção da identidade do aluno

Hobsbawn (1998, pg. 285) diz em seu livro, Sobre a História, que:

O exemplo padrão de uma cultura de identidade, que se ancora no passado por meio de mitos disfarçados de história, é o nacionalismo. Ernest Renan observou há mais de um século, “Esquecer ou mesmo interpretar mal a história, é um fator essencial na formação de uma nação, motivo pela qual o progresso dos estudos históricos muitas vezes é um risco para a nacionalidade”. As nações são entidades historicamente novas fingindo terem existido durante muito tempo. É inevitável que a versão nacionalista, omissão, descontextualização e, em casos extremos, mentiras. Em um grau menor, isso é verdade para todas as formas de história de identidades, antigas ou recentes.

Contudo, Bittencourt (2009, pg. 17 e 18), analisa o ensino de história do Brasil nos moldes dos currículos atuais, e diz que:

A existência da história escolar deveu-se sobre tudo ao papel formador da identidade nacional, sempre paradoxal, no caso brasileiro, uma vez que deveríamos nos sentir brasileiros, mas antes de tudo pertencentes ao mundo ocidental e cristão (cf. Bittencourt: Nadai). Novamente a questão da identidade tem sido considerada nas propostas atuais, mas tendo que enfrentara relação nacional/ mundialização, dentro dos propósitos neoliberais que, em essência preocupam-se mais em identificar o individuo como pertencente ao sistema capitalista.

Hobsbawn aborda a questão da obrigação do historiador desconstruir mitos políticos ou sociais disfarçados como história e ainda critica o controle do estado sobre o canal mais importante para comunicar informações históricas, a escola. Infere que o ensino de história e de história nacional como ocupante de lugar importante na educação pública. Sua grande preocupação consiste no fato de que os historiadores são produtores básicos da matéria prima que é convertida em propaganda e mitologia. E numa época em que está desaparecendo as matérias alternativas de preservar o passado, como a tradição oral que é passada de pai para filho, memória familiar, tudo que depende da efetiva comunicação inter geracional em desintegração na sociedade moderna; em que a história não se apóia mais na memória popular, e sim no que historiadores, cronistas ou antiquários escrevem sobre o passado, diretamente ou mediante livros escolares, na forma como escritores de ficção, produtores de filmes ou programadores de televisão, sites, blogs e vídeos transformaram em seu material.

Caetano Veloso (1997) fez uma analise em seu livro Verdades Tropicais:

Aprendemos desde a infância que o Brasil foi descoberto pelo navegador português Pedro Álvares Cabral a 22 de abril de 1500. Todos os outros países da América consideram-se suficientemente descobertos em conjunto por Cristóvão Colombo em 1492. O Brasil, no entanto, teve que ser descoberto depois, separadamente. Quando menino... Eu já perguntava: “Por quê?”.
Podiam dizer-nos, por exemplo, que Colombo não passou das ilhas da América Central e que o continente propriamente dito só veio a ser alcançado, pelos portugueses, oito anos depois: ou então que Cabral descobriu a existência da América do Sul, de que os espanhóis não teriam a menor idéia; mas não: contam-nos que o Brasil apareceu como um continente independente ou uma ilha descomunal no meio do Atlântico Sul, para surpresa dos navegadores lusitanos que, querendo costear a África para chegar às “Índias”, afastaram-se demasiadamente para oeste. Que esse acontecimento histórico tão mal definido seja situado com tanta exatidão na metade do segundo milênio da nossa era só estimula a produção de uma autoconsciência nacional há um tempo inconsistente e exagerada.

Para Abdu (2009, pg. 24):

A história do Brasil tem sido apresentada e introduzida no ensino escolar como resultante da Europa. Na visão liberal mais tradicional, o “descobrimento” é o momento fundante da nação e as relações do mundo europeu com as populações nativas ocorrem em função de transformá-la em grupos “civilizados”, moldados segundo modelos ultramarinos. Também para que os que trabalham com “modo de produção”, o nascimento do Brasil se explica pela lógica do mercantilismo europeu. Assim em ambas as propostas, o Brasil nasce na Europa e, casualmente, em Portugal. Trata-se, portanto de uma história nacional que não se origina no espaço nacional, mas no lugar central do capitalismo emergente.

Levando em conta os dois pontos de vista, tanto de Veloso quanto de Abdu, percebemos que o ensino segue a vertente da sua época, hora defendendo os ideais da ditadura ou se adequando ao sistema capitalista.

Para Chauí, os currículos e programas constituem o instrumento mais poderoso de intervenção do estado, o que significa sua interferência em ultima instancia, na formação da clientela escolar para o exercício da cidadania, no sentido que interessa aos grupos dominantes. (apud, ABDU, 2009, pg. 28).

Assim, é preciso levar em consideração o que diz SHMIDTH (2009, pg. 60):

Na pratica da sala de aula, a problemática acerca de um objeto de estudo pode ser construída a partir das questões colocadas pelos historiadores ou dos que fazem parte das representações dos alunos, de forma que eles encontrem significado no conteúdo que aprendem. Dessa maneira pode-se conseguir dos educando uma atitude ativa na construção do saber e na solução dos problemas de aprendizagem. É preciso que se leve me consideração interpretações possíveis dos fatos históricos. Nesse caso, a problematização é um procedimento fundamental para a educação histórica.

A partir das renovações teóricas metodológicas da história, bem como das novas concepções pedagógicas, o uso escolar de documentos passou a estimular a observação dos alunos e a ajudá-lo a refletir, o aluno tem sido levado a construir, debater, questionar, levantar hipóteses dando sentido à história através dos documentos históricos, sobre tudo, ele mesmo buscando documentos, considerando que os documentos não são exclusividades do professor. (SHMIDTH, 2009. Pg. 62).

Seguindo nessa vertente considero a música popular, um excelente documento a ser estudado, investigado, debatido e incluído no ensino de história. Sobre tudo na abordagem da ditadura militar, no ensino médio.

Knauss (2004) propõe buscar novas soluções para problemas atuais devido à necessidade de superar a cadeia normatizadora do conhecimento pronto, acabado e localizado. Sob esse aspecto, a música surge no como uma alavanca, um ponto de apoio para o ensino. Considerando a sua inserção na sociedade, que abrange todas as idades.

4 CAPÍTULO 3: Planejando uma aula sobre ditadura militar (1968 – 1975)

O “Correio Braziliense” publicou um artigo do jornalista Leonardo Cavalcanti nos dias 25, 26 de abril de 2010, investigando acontecimentos ocorridos na Ditadura Militar, relacionados à censura e a MPB. Essa publicação contou com testemunhos orais de pessoas que ficaram marcadas pela ditadura, sobretudo músicos que entraram para a história, esses relatos podem também servir como complementos para a música, até mesmo para que o aluno compreenda o contexto histórico em que a musica foi composta e produzida.

As formas que eram usadas para driblar a ditadura foram relatas por algumas pessoas entrevistadas e um dos advogados mais procurado por músicos, João Carlos Muller.

Segundo Muller, aconselhava os compositores a comporem seis musicas, e nas primeiras usarem palavras duras contra a ditadura, assim quando a censura analisasse, vetaria logo as primeiras e seriam mais brandos com as seguintes, dessa forma, entre sete musicas, cinco eram vetadas. No entanto, ninguém sabe, até hoje, quais eram os critérios utilizados para a censura de musicas.

Muller deduz que Ivan Lins e Vitor Martins chegaram a ter 50 composições vetadas. Assim, faz- se necessária a analise da seguinte musica de Ivan Lins e Ronaldo de Souza, do ano de 1973:

“Deixa dizer”

Refrão

Deixa, deixa, deixa... Eu dizer o que penso dessa vida
Preciso demais desabafar

Ah... Ah. Ah

Suportei meu sofrimento
De face mostrada e riso inteiro
Se hoje canto meu lamento
Coração cantou primeiro
E você não tem direito
De calar minha boca
Afinal me dói o peito
Uma dor que não é pouca
Tem dó!

Quando se pensa em música como documento em sala de aula, essa música é uma das possibilidades, considerando que a mesma foi reescrita e atualizada por Marcelo D2, e pode ser comparada, fazendo paralelo entre o passado e o presente, analisando as realidades sob a ótica da musica. Ao escolher essa música, o critério foi à forma como ela é bem aceita no meio da juventude da atualidade, e ao buscar informações e descobrir que ela também já influenciou outras juventudes, foi interessante selecionar como um exemplo a ser trabalhado em sala de aula.

[...] um trabalho didático, no qual as letras de músicas populares sejam colocadas como evidências de fatos históricos. Elas são representações, não se constitui num discurso neutro, mas identificam o modo como, em diferentes lugares e em diferentes tempos, uma determinada realidade social é pensada e construída (ABUD, 2005:312).

Na versão de Marcelo D2, lançada em novembro de 2008 com o tema “Desabafo”.

“Desabafo”

Refrão:

Deixa, deixa, deixa dizer o que penso dessa vida
Preciso demais desabafar “

...

Eu já falei que tenho algo a dizer e disse
Que falador passa mal e você me disse.
Que cada um vai colher o que plantou.
Por que raiz sem alma como o flip falou é triste.
Andam dizendo que o bem vence o mal
Por aqui eu vou torcendo pra chegar ao final.
É, quando mais fé, mais religião.
A mão que mata, reza, reza ou mata em vão.
Me contam coisas como se fosse corpos.
Deixa pra La, eu devo tá viajando
Enquanto eu faço besteira, nego via se matando.

...

Ok! Então vamos lá, diz:
Tu quer a paz, eu quero também
Mas o estado não tem direito de matar ninguém
Aqui não tem pena de morte, mas segue o pensamento
O desejo de matar um capitão Nascimento
Que, sem treinamento, se mostrar incompetente,
O cidadão do outro lado se diz impotente, mas
A impotência não é uma escolha também
De assumir a própria responsabilidade, heim?

Trabalhar essas duas músicas, fazendo paralelo entre as duas realidades, conduzindo o aluno a analisar o tempo histórico, estabelecer relação entre permanências e transformações no processo histórico, extrair informações atuais e de outros tempos, identificar momentos de ruptura ou de irreversibilidade no processo histórico.

Pretende-se que a música seja trabalhada numa abordagem interdisciplinar, e para isso faz-se necessário um projeto que abranja todos esses aspectos.

A primeira preocupação que se deve ter ao escolher a música como documento histórico é conhecer o documento que se pretende utilizar, processo que se repete com qualquer outro documento histórico.

É preciso identificar a gravação relativa à época que pretendemos analisar, localizar o vinculo que tornou a canção famosa, mapear os diversos espaços sociais e culturais pelo qual a música se realizou, em termos sociológicos e históricos. (NAPOLITANO. 2002. Pg. 86).

No caso da música, ouvi-la, prestar atenção na letra, no ritmo, buscar fazer uma pesquisa histórica fazendo uma abordagem de todos os aspectos da música e procurar compreender o momento histórico do Brasil e do mundo, buscar informações sobre o compositor, pesquisar outras fontes de documentos complementares e no caso específico, fica a sugestão do Correio Braziliense, com os depoimentos orais registrados e escritos, sites sobre jornais da época que podem ser localizados viam web, e assim, elaborar um planejamento de aula.

O cantor e compositor sofrem influências musicais de sua época e de época anteriores, portanto a música não pode ser vista como própria de um momento histórico, pois, não é mecânica, faz parte de uma estrutura complexa, sofrendo interações. (NAPOLITANO, 2002. Pg.83)

Um planejamento, que pretende desenvolver o lado crítico do aluno; devendo conter, pesquisas, levantamento de hipóteses, perguntas, debates e a partir desse planejamento, elaborar um plano de aula.

Para Vasconcelos (2000):

O professor deve compreender o aluno em sua realidade e partir de onde o aluno está em termos de conhecimento. Conhecer a realidade do aluno é essencial para trabalhar em função do aluno real, verificar interesses e possibilidades, considerar seu universo social, cultural e econômico, evitando-se rótulos e preconceitos. Além do aluno, o professor precisa conhecer o grupo de trabalho que envolve, ou seja, funcionários da escola, outros professores, equipe pedagógica, diretores e outros. (apud SANTOS, 2009)

O professor conhecer o meio em que o aluno convive, e indagar o aluno buscando descobrir o tipo de musica que ele gosta, irá contribuir no processo de ensino, sobre tudo, quando o professor for selecionar as músicas atuais que serão utilizadas para fazer um paralelo entre tempos diferentes e para que isso ocorra, cabe ao professor conversar com o aluno sobre o uso de música no ensino de determinado conteúdo, considerando que a participação do aluno e seu empenho são essenciais para que a aula seja significativa.

Mas alguns obstáculos ainda precisam ser superados no uso da musica como documento histórico.

Para Moraes são grandes as dificuldades que surgem quando pensamos na música como documento histórico em sala de aula ou fonte histórica para o historiador, assim, afirma que:

Normalmente, os trabalhos historiográficos que tratam de desvendar as relações entre história, música e produção do conhecimento enfrentam uma série de interminável de dificuldades (que de maneira geral também são aquelas enfrentadas por boa parte dos historiadores). Isto é, a dispersão das fontes, a desorganização dos arquivos, a falta de especialistas e estudos específicos, escassez de apoio institucional etc. Por isso, as pesquisas, não raro, acabam resumindo-se a trabalhos individuais de campo e de arquivos isolados de quaisquer investigações sistemáticas e de longa duração.

Compreende-se, portanto, que é um grande desafio para o historiador optar por uma história tendo a música como fonte histórica e também para o professor, mesmo com as inovações metodológicas, no uso de fontes, no trabalho de pesquisa histórica tenham ocorrido, o fato é que, as músicas populares, sobretudo do período da ditadura militar, não tiveram o mesmo tratamento dado a outros documentos históricos, o que ara Moraes, leva a entender que a música ainda está em segunda categoria no universo da documentação. Segundo pesquisas feitas por Cavalcanti e relatadas em seu artigo, com um subtítulo “Os números do silêncio” publicado no dia 25/04/2010:

Os documentos referentes à censura de letras musicais, guardados na Coordenação Regional do Arquivo Nacional em Brasília equivalem a 597 metros de papéis enfileirados. Os documentos foram abertos pela polícia federal em 1989 e transportados de sede da corporação até arquivo nacional naquele mesmo ano. Atualmente estão condicionados no subsolo do órgão. Na sede do Arquivo Nacional do centro do Rio, há outras centenas de caixas desde 1993, muitos sem nenhum controle e em péssimos estado de conservação. (grifos do autor)

O descaso com esses arquivos é um elemento que nos leva a perceber o quanto o valor histórico da música é desvalorizado, enquanto fonte. O que torna difícil, mas não impossível o trabalho em sala de aula.

Vasconcelos (2002) aborda o papel do professor em sala de aula, buscando domínio do conteúdo, do tema a ser trabalhado, planejando o que utilizar, como e quando; para ele, o professor precisa se organizar e agir com postura diante dos desafios que o cotidiano escolar oferece. (apud SANTOS, 2009)

O trabalho com música em sala de aula exige constante dialogo, sobre tudo, perguntas a serem respondidas, duvidas a serem questionadas. Não se pretende que o professor seja um profundo conhecedor de música, mas precisa superar os obstáculos, assim como foram superados das línguas desconhecidas, dos códigos religiosos e das fontes pictóricas, e como diz Moraes, desta forma “mesmo não sendo musicólogo o historiador pode compreender aspectos gerais da linguagem musical e criar seus próprios critérios, balizas e limites na manipulação do documento”. Assim, o professor precisa investigar e obter seus próprios critérios para trabalhar a musica enquanto documento histórico e aplicar em sala de aula, articulando com outros documentos históricos; imagens, filmes, jornais, documentos orais, documentos escritos para que despertem o aluno para a pesquisa, levantando hipóteses, se questionando, elaborando perguntas e buscando respostas, levantando problemática. Com objetivo de formar alunos conscientes, críticos diante das situações e com capacidade buscar o conhecimento e utilizar os meios disponíveis para alcançar.

3.1. Trabalhando a música dentro do contexto da Ditadura Militar (1968 – 1975)

Como já citado no decorrer da pesquisa, uma das fontes utilizadas foi retirada do Correio Braziliense que pode ser encontrado no site WWW.correiobraziliense.com.br, artigos do Jornalista Leonardo Cavalcanti, que trabalhou na matéria sobre a MPB na ditadura militar e registrou fatos importantes sobre o momento histórico, relacionado às musicas que se pretende trabalhar nessa parte como documento histórico. E pretendo trabalhar músicas nesse capitulo utilizando esse documento como base, entre outros.

Quando se propõe trabalhar a música, é preciso entender o momento em que foi produzida. As músicas retiradas do site http://letras.terra.com.br/, “Apesar de Você” e “Cálice”, compostas por Chico Buarque em 1970 e em parceria com Gilberto Gil em 1973. De acordo com Muller, advogado entrevistado pelo jornalista, a música “cálice”, teve seu pedido negado varias vezes pelo censo entre 1979 e 1981. A música em questão possui um jogo de palavras que pretendia driblar a censura. Essa parte do trabalho pretende utilizar duas músicas da ditadura militar e ainda uma musica atual, confrontando duas realidades, com a finalidade de afirmar a importância da MPB como documento no ensino de história da ditadura, entre outros temas. (Cavalcanti, 26/04/2010).

Para Muller, conseguir a liberação dessa música virou uma questão de honra. Quanto a Chico Buarque, as tensões com o censo eram bem anteriores, possivelmente, em 1966 devido a uma de suas musicas serem interpretadas como ofensas a um almirante. Essas tensões aumentaram em 18 de dezembro de 1968, quando acordou com a polícia dentro de casa as 07h00minh da manhã, e foi levado num carro do DOPs (com chapa fria), para ser submetido a um interrogatório no ministério do exército, na avenida Presidente Vargas, devido a cenas da peça Rodas Vivas escritas por ele. Foi solto no fim da tarde. (Cavalcanti, 25/04/2010)

Com o clima fechado, foi autorizado a viajar à Europa em janeiro onde se apresentaria numa feira de música em Cannes, na França, assim se exilou na Itália. Segundo Chico Buarque, em entrevista com o Correio Braziliense, Vinicius de Moraes recomendou “volte ao país fazendo barulho”, e em março de 1970, o poeta retornou e respondeu á euforia do governo com a música “Apesar de Você” que foi um sucesso radiofônico que veio a ser vetado um mês depois de divulgada, devido à análise feita por um jornal, afirmando que a letra era direcionada ao presidente Médici. Assim, os discos do estoque foram quebrados. E em 1973, a música cálice foi interpretada pela dupla em versão quase que totalmente instrumental. Mas a batalha durou pouco, pois os microfones foram desligados.

“Cálice”

Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
Pai! Afasta de mim esse cálice
De vinho tinto de sangue.

Em primeiro momento, a letra da música parece uma critica a igreja católica, faz menção de trechos da bíblia em que Jesus cita palavras semelhantes, sabendo que está para ser traído e sabendo que precisa passar por aflições sem abrir sua boca e reclamar, então clama ao Pai, dizendo que se for possível, afaste o cálice, que simboliza todo o tormento e dor que o espera (Lucas 22 – 42). Mas a intenção desse cálice é criticar a censura, é uma critica ao “cale-se” imposto em forma de censura.

Como beber dessa, bebida amarga
Traga a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silencio na cidade, não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta.

A análise desta musica, faz compreender o clima da cidade, o sentimento das pessoas que protestavam, e a visão de que melhor seria viver fora da lei, contra o regime militar do que se submeter a uma lei injusta e uma realidade falsa, com propagandas que transmitiam a idéia de um “milagre econômico”.

Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento
Na arquibancada pra a qualquer momento
Ver emergir o monstro da lagoa...

Essa parte da música é bem clara com relação ao sentimento de impotência diante da ação do sistema ditador, considerando que o próprio Chico Buarque foi retirado da cama as 07h00minh da manhã. Esse trecho é necessário, buscar entender o propósito do monstro da lagoa, um ser mitológico, que vive imerso em águas escuras, aterrorizando o imaginário do ser humano.

De muito gorda a porca já não anda (cálice)
De muito usada a faca já não corta
Como é difícil, Pai abrir a porta (cálice)
Essa palavra presa na garganta
Esse pileque homérico no mundo
De que adianta ter boa vontade
Mesmo calado o peito resta à cuca
Dos bêbados do centro da cidade

Essa música é um documento perfeito a trabalhar em sala de aula, a forma como ela descreve o sistema ditatorial, a corrupção e a ineficiência que segundo o compositor, impedia o sistema de funcionar. Sobretudo, relacionado aos censores, e os critérios que utilizavam para cortar e censurar as obras, muitas vezes obscuros.

Talvez o mundo não seja pequeno (cálice)
Nem seja a vida um fato consumado (cálice)
Quero inventar o meu próprio pecado (cálice)
Quero morrer do meu próprio veneno (Pai! cálice)
Quero perder de vez tua cabeça (cálice)
Minha cabeça perder teu juízo (cálice)
Quero cheirar fumaça de óleo diesel (cálice)
Me embriagar até que alguém me esqueça (cálice)

Essa parte da música é forte, pois é quando expressa o desejo de despertar da limitação imposta, e em reposta se diz “cale-se” ou cálice. E outra parte ainda dando ênfase a Bíblia, quando faz uso do fato consumado, ou do pecado. A música expressa que a vida não é um fato consumado, que a situação pode ser mudada. Defende ainda a idéia de ter liberdade de tomar suas próprias decisões, pagar por seus erros cometidos, seguir sua noção de certo e errado e se libertar das idéias impostas pela ditadura e em reposta ouve um “cale-se”. O final ainda é marcante, fazendo analogia à tática de tortura usada pela ditadura com a finalidade de calar.

A censura não conseguiu silenciar a revolta de Chico Buarque. Mas abafaram por completo os protestos de compositores como o uruguaio Taiguara Chalar da Silva (1945 – 1996), que entrou nos anos 70 com fome de política, o que causou conseqüências desastrosas. Foi perseguido pela censura, teve mais de 60 músicas vetadas e, sem dinheiro, endividado abandonou o país só retornando em 76 e teve um álbum proibido, assim deixou o país e só retornou no fim do regime militar. (26/04/2010).

Em 1973, a música descreveu uma trajetória que, durante todo o período do regime militar, não poupava ninguém: ameaçava ídolos da MPB. No entanto, os compositores relembram dos acontecimentos, das ameaças e das perseguições que sofreram pouco lembradas pelos livros didáticos.

Com já citado, em 1972, a música “Apesar de você”, significou um grito em meio à ditadura, considerada por alguns críticos como um hino contra a ditadura militar, com letras direcionadas ao Presidente Médice e que criticam o AI5. Importante essa analise.

“Apesar de você”

Amanhã vai ser outro dia
Amanhã vai ser outro dia
Amanhã vai ser outro dia
Hoje você é quem manda
Falou tá falado
Não tem discussão, não.
A minha gente hoje anda
Falando de lado e olhando pro chão.
Viu?
Você que inventou esse Estado
Inventou d e inventar
Toda escuridão
Você que inventou o pecado
Esqueceu-se de inventar o perdão.

Esse trecho é claro, ao abordar a questão da falta de liberdade de expressão, sobre a introdução do AI5 na lei, e como a lei era posta em pratica sem que houvesse direito a habeas corpus

(Coro)

Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Eu pergunto a você onde vai se esconder
Da enorme euforia?
Como vai proibir
Quando o galo insistir em cantar?
Água nova brotando
E a gente se amando sem parar.

O coro é a parte onde o compositor expressa o otimismo, argumentando sobre a possibilidade de mudanças sobre o momento em que a voz fosse impossível de conter. O galo pode ser uma analogia ao momento em que nasce o novo dia e o galo canta, ou seja, quando as mudanças acontecerem e o censura não puder controlar a voz.

Quando chegar o momento
Esse meu sofrimento
Vou cobrar com juros. Juro!
Todo esse amor reprimido,
Esse grito contido,
Esse samba no escuro.
Você que inventou a tristeza
Ora tenha a fineza
de “desinventar”.
Você vai pagar, e é dobrado,
Cada lágrima rolada
Nesse meu penar.

Aqui o compositor parece acreditar que a justiça vai ser feita, e que os crimes políticos, as práticas seriam julgadas e condenadas.

Importante que nesta parte, busque documentos e informações sobre o que sucedeu com o presidente Médice, e com todos os presidentes envolvidos na ditadura militar do Brasil.

(Coro2)

Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Ainda pago pra ver
O jardim florescer
Qual você não queria.
Você vai se amargar
Vendo o dia raiar
Sem lhe pedir licença.
E eu vou morrer de rir
E esse dia há de vir
antes do que você pensa.
Apesar de você

A música ainda afirma que o momento de mudança vai chegar, e que as coisas vão acontecer sem que o presidente possa controlar e que o tempo está próximo.

(Coro3)

Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai ter que ver
A manhã renascer
E esbanjar poesia.
Como vai se explicar
Vendo o céu clarear, de repente,
Impunemente?
Como vai abafar
Nosso coro a cantar,
Na sua frente.
Apesar de você

A liberdade da imprensa, dos artistas, dos compositores expressando sua opinião e discursando abertamente.

(Coro4)

Apesar de você
Amanhã há de ser outro dia.
Você vai se dar mal, etc e tal,
La, laiá, la laiá, la laiá…….

De acordo com o Correio Braziliense, essa música foi lançada em LP compacto chegando a vender 100mil cópias, mas teve os restantes dos discos apreendidos pela censura por sua clara alusão a ditadura militar brasileira e ao presidente Médice.

Como defendido nesta pesquisa trabalhar a música através de paralelo entre os períodos históricos e de comparação é uma forma interessante de trabalhar a ditadura militar, utilizando musicas do período estudado, comparando com músicas mais atuais e abordando a visão impressa nas musicas, de acordo com os temas trabalhados. Sendo assim a música de Gabriel, o pensador, lançada em 1993 e extraída do site http://letras.terra.com.br/gabriel-pensador/96133/, é uma opção pertinente ao tema a ser trabalhado em sala de aula, abordando a ditadura militar de 1968 – 1975 considerando a realidade do aluno.

“Abalando”

Gabriel, o Pensador o homem que eles amam odiar

Agora voltou para ham...ham tentar falar
Isso é se ninguém quiser me censurar me calar
(Manera rapaz
Da última vez eles te tiraram do ar)
Não eu não consegui acreditar nisso
Mas não vâmo esquecer e nem permanecer omissos num caso que diz
Respeito ao direito de um cidadão
De carregar no peito a sua liberdade de expressão

O interessante desta música na abordagem da ditadura militar de 1968 – 1975 é o fato de que ela por si só, já faz uma retrospectiva entre os fatos do passado dialogando com o presente.

Liberdade de expressão aqui? Há
Não existe
Eu fiz "Hoje eu tô feliz" e fiquei triste
Pois já não posso mais nem sair em paz
Os fdp confundem artistas com marginais
Mas eu não sou um marginal
Isso é um grande erro
Sou apenas um artista como todo brasileiro
E o meu erro foi dizer o que não devia
Acreditei que existia o quê: Democracia...

Neste trecho, o compositor critica a atualidade fazendo um paralelo com o tempo da ditadura, sobre a falta de liberdade de expressão e a forma como eram tratados os artistas no regime militar, sendo vistos como marginais.

Então eu disse simplesmente o que o povo sente
Mas fui covardemente censurado pelo "Minha gente"
E a vontade que me dá não me venha perguntar
Eu vou falar
A vontade que me dá é de matar
É uma loucura ninguém cura esse país se num acabarmos com a censura
Que me lembra a ditadura militar
"Cale-se! "Cuidado" Como é difícil acordar calado"

Nesta parte da música, seria interessante trabalhar a questão dos debates sobre censura e seus mecanismos na atualidade. De que tipo de censura o compositor está falando e a forma como está é percebida pelo povo. E buscando confirmar e comparar utiliza um trecho da música “cálice”, símbolo da luta contra a ditadura militar.

Eles não censuram só o artista
Eles censuram o povão
Pior do que acordar calado é acordar sem o pão
"Paiê cadê o pão?" Foi censurado "Paiê cadê o leite?" Foi censurado "Paiê o
Quê que é carne hein?"
Essa é a censura na panela de um descamisado
"Paiê cadê o ovo?" Foi censurado "Paiê cadê o arroz?" Foi censurado porra
"Pai tem feijão?" – Não

Aqui, o compositor afirma que a ditadura não se limitava aos artistas, mas a todo o povo brasileiro, que mesmo estando vivendo “o milagre econômico” não faziam parte do tal milagre. Fazendo ainda uma alusão ao seu momento histórico. Assim, uma abordagem que investigue o momento histórico em que a musica foi divulgada se faz importante para que o aluno perceba a importância da musica como documento e expressão social.

Toma essa água suja com farinha e num reclama pra num ser processado
E a diversão era um futebol inocente
"Quero perder de vez sua cabeça"
(Então eu vi um pessoal numa pelada diferente
jogando futebol com a cabeça do Presidente)
"Cale-se" O povo unido outra vez foi vencido
Pediu pra ouvir meu rap mas não foi atendido
"Ué mas não existe mais censura no Brasil"
Amigo vai nessa que tu tá é fudido
E foi só uma cabeça que caiu
Nem demos a primeira então não vâmo sair de cima ouviu?

Neste do trecho da música, mais uma vez surgem versos da música “cálice”, onde expressa a vontade de ter sua liberdade de pensar. Critica a questão da utilização da política “pão e circo”. E da forma como a voz do povo foi calada com a violência.

Vem! A gente abala quando quer
A gente abala se quiser

Esta parte é clara, o povo é capaz de mudar a história. O que se completa com o trecho seguinte.

Porque o Pensador veio falar do que passou
Eu te digo
Não se lembre do passado e o teu futuro será escuro
Não se esqueça o que passamos há tantos anos
Procure a luz
Mete o dedo na ferida vive a vida
Limpa o pus
E conduz o pensamento para o tempo que quiser
Fique atento não se esqueça a gente abala quando quer

Abordando a questão da capacidade que o individuo tem de construir a história, o pensador convida a esquecer o passado, mas não esquecer tirando da memória, mas fazendo a diferença, tendo consciência do seu papel na sociedade como agente transformador e não permitir que o passado volte a fazer parte do presente.

"Agora que lembramos um passado recente
Vamos falar do presente"
(E daqui pra frente?)

Não vamos nos intimidar
Chega de ser prego
É melhor ser o martelo rapá
Mas também não pense que o Brasil já foi pra frente pois como sempre ele
está no mesmo lugar
E sempre estará
Se a gente não se julga inteligente o suficiente pra mudar
Seria melhor se suicidar
Mas na verdade esse momento é de nascimento
(É a hora H) Não vamos nos alienar

Nesta parte acontece uma critica ao momento histórico do Brasil e a mentalidade do povo, despertando para o momento de nascer para a realidade, se impor, participar deixando de ser alienado.

Olhe pro seu lado e veja como o povo está
"A arte é de viver da fé”
“Só não se sabe fé em quê”
E que fé será se não for à fé em nós mesmos
(Isso aí Pensador)
"Get up Stand up" Você não veio ao mundo á toa
E se veio fazer algo faça alguma coisa boa
O que tá errado (tudo)
Deve ser mudado
Abalando as estruturas com o Pensador
(Tô ligado!)

Utiliza mais uma música, de 1986, do grupo “Paralamas do Sucesso”, chamados “Alagados” música que critica o capitalismo, o trecho “A arte é de viver da fé, só não se sabe fé em que”, para descrever o povo em sua fé na política.

Eu tô falando de uma reformulação
Que começa na cabeça e vai passando pelo coração
Se você tem cabeça e coração
Não seja um vegetal
Seja um cidadão

A busca por reforma na mentalidade do cidadão brasileiro, que se pretende que inicie na razão acima dos sentimentos. Agir, criticar, lutar, mudar, transformar e não vegetar.

É "geração cara pintada"?
Não. Jovens em geral
Caras pretas, coroas, pessoas, malucos e caretas
(Entrem nessa união)
Não seja um imbecil meu irmão
Põe a mão na cabeça
Pára pra pensar
Nós Temos o poder de abalar...

Essa parte completa a música ao se referir ao movimento estudantil dos caras pintadas ocorrido em 1992 que foram as ruas para protestar e exigir a saída do presidente Fernando Affonso Collor de Mello. Mas ao se direcionar a geração cara pintada, está se generalizando, estendendo o convite a toda a sociedade de exercer o poder de mudar, de mover a história.

Enfim, analisar músicas, além de ser um trabalho interessante e exigir pesquisa por parte do professor que precisa ter certo domínio do conteúdo, é um trabalho prazeroso que envolve não só o aluno, mas também o professor e todo o ambiente do aluno, pois a partir do momento em que a música passa a fazer parte do documento histórico, o aluno, vai buscar compreender a realidade incutida, observando o tempo em que foi lançada, a forma como foi recepcionada e todo o processo que a envolve. Tornando assim a sala de aula, um ambiente de pesquisa envolvendo outras disciplinas com a finalidade de tornar o conhecimento amplo, contribuir para a compreensão dos alunos e indicar caminhos para a construção do conhecimento histórico e formação da identidade do aluno como cidadão histórico.

5 CONCLUSÃO

Conclui-se com esta pesquisa que a música é uma importante ferramenta na busca por uma aula de história diferenciada, atrativa e envolvente. Considerando que está presente na vida humana e embala todas as gerações, se desenvolvendo e evoluindo juntamente com ela.

A música popular brasileira engloba varias temáticas além da proposta nesta pesquisa, e sua utilização em sala de aula não pode estar restrita a simples análise da letra, mas ao seu papel histórico e, sobretudo, seu poder de construir e transformar idéias e conceitos, ainda contribuindo para a constituição da identidade histórica do aluno, abordando os assuntos propostos pelos PCNs sob a ótica da música e documentos complementares. Ainda, conclui-se que a o trabalho interdisciplinar é importante para que o conhecimento fornecido por esse documento histórico não seja algo fragmentado u uma biografia de compositores, como ocorre atualmente.

Ao optar pelo uso da música popular no ensino de história, a problemática da questão estava em defender a abordagem da musica como documento histórico a ser estudado em todos os seus aspectos da mesma forma que os demais documentos o são. Dando a musica sua devida importância quanto ao seu valor histórico e sua importância no cenário historio, sobretudo, na ditadura militar do Brasil (1968 – 1975) tema abordado por esse trabalho.

A partir desta pesquisa, percebe-se que a música realmente possui um diferencial como documento histórico devido a sua evolução simultânea com o desenvolvimento da sociedade. Então, se faz necessário que ao empregar a música como documento no ensino de história em sala de aula, o professor analise a realidade do aluno, buscando perceber seu ambiente, o tipo de musica que ouvem com mais freqüência e a partir de analises, elaborar um planejamento em conjunto com o aluno e um plano de aula buscando efetivar a aula.

O ensino de história tendo a música como ferramenta, surge como a prática das inovações metodológicas há tanto tempo existente, mas ainda limitada. Portanto parte desta limitação, ao que refere a musica enquanto documento histórico sobre a ditadura militar no Brasil (1968 – 1975) se deve ao fato do assunto ainda ser um desafio a ser enfrentado e vencido que devido à falta de incentivo, de organização das músicas, entre outras questões que envolvem o difícil trabalho de uma pesquisa histórica especifica sobre a MPB como documento histórico e consequentemente como parte da história, não somente cultural, mas social e política acaba por se limitar a pequenas abordagens que não a valorizam como documento.

Analisar músicas exige trabalho, dedicação e paciência, mas muito recompensador considerando que sua utilização em sala de aula, tornara o ambiente escolar inclusivo e o ensino construtivo.

6 REFERÊNCIAS

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Publicado por: Dilcéia Boaventura dos Santos

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