A territorialidade do capital imobiliário na Região Metropolitana de São Paulo

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1. Resumo

O objetivo deste trabalho é abordar sobre a questão da territorialidade do capital imobiliário, que através dos processos de gentrificação, reconfiguram a cidade, se tornando esse processo numa reconfiguração de classes, provocando a exclusão de uma parcela da população de baixa renda. Buscamos alcançar a totalidade deste assunto, não se restringindo apenas à contemporaneidade, resgatando a historicidade dos acontecimentos, tendo em vista que cada espaço com suas particularidades contém em si dinâmicas geográficas, históricas e econômicas que repercutem nas mais variadas escalas territoriais e temporais. Trabalhamos aqui sob diversas perspectivas de análise, contextualizando o processo histórico da Região Metropolitana de São Paulo, implicando a necessidade de se entender a configuração territorial física e as características socioeconômicas desta região, e com isso apreender os vários fenômenos que ocorreram e vêm ocorrendo geograficamente, abordando também, escalas temporais diversas, o que acreditamos trazer uma maior riqueza conceitual a este trabalho. A territorialidade do capital imobiliário impõe barreiras geográficas através de uma linha imaginária, ou seja, uma delimitação territorial constituída pelos fatores econômicos impostos pela lógica da propriedade privada, da acumulação do capital financeiro, e do modo de produção capitalista.

Palavras chave: Capital. Imobiliário. Segregação. Empreendedores. Geografia

2. Introdução

Dentre os grandes problemas existentes nas cidades, a moradia se torna um dilema e talvez um dos problemas mais difíceis de ser solucionado no espaço urbano.

A moradia como habitat, além de resultante do processo de urbanização, também define e condiciona em parte a sociedade e as suas relações sobre vários aspectos, através do ambiente construído socialmente, sendo a paisagem urbana o reflexo do tipo de sociedade residente e existente nesses espaços.

O processo de urbanização da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), acompanhando o desenvolvimento econômico mundial, se espelhando em padrões internacionais hegemônicos, também traz em si, características próprias de seu desenvolvimento econômico de efeito macro e microescalar. Há uma brutal diferença entre o papel exercido pela cidade São Paulo pré-século XIX e a São Paulo do século XXI nos âmbitos regionais, nacionais e mundiais.

As transformações ocorridas com o desenvolvimento científico, que implicou em inovações tecnológicas e que propiciaram a sofisticação do modo de produção capitalista, ocasionaram numa mudança muito rápida do espaço urbano em quase todas as partes do mundo, trazendo a sua expansão impulsionada pelas indústrias, que também trouxeram o fenômeno da metropolização.

As cidades passam a abrigar pessoas de vários outros pontos de seus respectivos países e/ou de fora de seus territórios, se transformando em polos de atração econômica, centralizando suas atividades. Elas começam a ser demasiadamente ocupadas, enquanto o campo começa a ser desertado, principalmente após o processo de mecanização da produção agrícola.

O modelo urbano-industrial no Brasil se deu através de um processo desigual e concentrado espacial e especialmente na cidade de São Paulo, onde suas atividades econômicas resultaram num crescimento exponencial da metrópole, que será o polo de atração das várias e principais atividades econômicas e do fluxo migratório.

A expansão do urbano em São Paulo se deu através de vários movimentos sempre centrados no aspecto econômico, desde a monocultura do café de fins do século XIX, até o Toyotismo do final do século XX, atravessando várias etapas, culminando na horizontalidade de sua mancha urbana e na verticalidade de suas edificações, dando origem ao que conhecemos atualmente por Região Metropolitana de São Paulo (RMSP).

Essa expansão da horizontalidade de São Paulo, onde se produz as maiores riquezas do país e abriga mais de vinte milhões de pessoas num território de aproximadamente 8 mil Km2, e que embora seja a grande produtora de riquezas, é também uma grande produtora de exclusão, pois é uma região densamente povoada com uma riqueza cada vez mais concentrada numa pequena parcela de sua população, pois a sua organização econômica, assimilada pelo poder público, assim como a sua espacialidade geográfica alimentam essa pobreza que por sua vez reforça a segregação metropolitana. Milton Santos (2009. p. 66) - "A forma como a cidade é geograficamente organizada faz com que ela não apenas atraia gente pobre, mas que ela crie ainda mais gente pobre. O espaço é, desse modo, instrumental à produção de pobres e da pobreza [...]".

Dessa forma, São Paulo não só atraiu ou atrai pobres através do fluxo migratório, como também produz a pobreza através da expulsão de uma parte considerável da população, e nesse processo de atração e repulsão, que concentra riquezas nas mãos de poucos, acabam sendo geradas territorialidades dentro da metrópole.

A territorialidade do capital imobiliário abordada neste trabalhou, buscando uma visão de totalidade a essa problemática, se pautou em aspectos gerais que ocasionaram e ocasionam a segregação de uma grande parcela da população que habita nesta região de forma insatisfatória, no sentido de se obter um mínimo de direito à cidade, que poderia se traduzir em moradias dispondo de um mínimo básico de serviços públicos, de locais de trabalho e de lazer, etc. em seus entornos.

No primeiro capítulo, buscamos trazer à tona como foi o início do processo da expansão urbana de São Paulo, que após da crise de 1929, implicou na transformação característica econômica da cidade agroexportadora de café, para o modelo industrial, que passou a ser o processo indutor da urbanização, que além de concentrar uma crescente população década após década, também ocasionou na fragmentação territorial, gerando novos municípios.

No segundo capítulo é que entramos de fato no conceito da territorialidade do capital imobiliário, na qual a matriz econômica é quem dá as diretrizes para a (re) produção espacial da metrópole, seguindo as lógicas do capital financeiro nacional e internacional, tendo o Estado como um agente de suma importância para conduzir esses processos.

Os conjuntos de ações promovidos pelos grandes empreendedores imobiliários dispondo de todas as suas ferramentas, tendo a importante parceria do Estado, produzem o espaço urbano para o consumo, passando a serem a moradia e a metrópole, meramente mercadorias, causando a exclusão e segregando a cidade em classes.

No terceiro capítulo, abordamos de forma sucinta as resultantes dessa territorialidade que tende a desenhar e modernizar as áreas centrais, dotando-as de equipamentos e infraestruturas enquanto aumenta a periferização da metrópole, criando barreiras até mesmo para os mais simples deslocamentos cotidianos de quem mora nas franjas urbanas da metrópole.

Em virtude da complexidade do assunto e do recorte territorial relativamente grande, não foi possível detalhar em minúcias as especificidades dos locais, porém, trouxe uma visão panorâmica de como a metrópole foi (re) produzida, (re) desenhada, transformada, organizada e administrada, pois acreditamos que o problema da moradia na RMSP não se resume a uma só localidade, ou seja, este problema abrange toda a sua extensão territorial, assim como os fatores que permitiram (re) construí-la, também recebem determinações de ordens econômicas multiescalares.

3. A urbanização na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP): a industrialização como fundamento

São Paulo atualmente e já de algumas décadas (especialmente a partir da segunda metade do século XX), desponta como o maior centro financeiro e produtivo do país, apesar da onda de deslocalização industrial que vem ocorrendo desde os anos 1980. Todavia, continua sendo um dos principais centros financeiros e produtivos do Brasil e do mundo.

Como Mariana Fix (2007) aponta, São Paulo foi se tornando, principalmente na década de 1990, em uma cidade global, nos moldes ou padrões das grandes cidades globais do mundo, como Nova Iorque, Londres, Tóquio, Zurique entre outras, porém, com uma peculiaridade de ser uma cidade global encravada num país periférico do capitalismo financeiro mundial, assim como outras cidades globais da América Latina e dos países emergentes de um modo geral.

Contudo, desde os tempos coloniais, por mais ou menos três séculos, a partir do período da dominação portuguesa, o atual Estado de São Paulo era apenas um território dentro do Brasil, constituído por pequenos vilarejos e só começa a se desenvolver econômico e financeiramente, através do ciclo do café no século XIX, inicialmente cultivado no Vale do Paraíba, e depois se estendendo a oeste, o que implicou a formação de uma classe dominante agroexportadora do café, inserindo São Paulo na divisão internacional do trabalho, com a função de abastecer o mercado europeu e norte-americano. Como afirma Oliveira (1984, p. 9):

A economia da República Velha ou Primeira República, no Brasil, que vai de 1889 a 1930, é geralmente entendida como uma extensão da economia do Segundo Império, do ponto de vista da completa inserção da economia brasileira no padrão da divisão internacional do trabalho "produtores de manufaturas versus produtores de matérias-primas" [].

Segundo o autor, a economia do país, sobretudo do Estado de São Paulo na época da Primeira República, nada mais é do que uma continuação das ações econômicas da fase imperial, com base na agroexportação do café. Por esse período, temos Irineu Evangelista de Souza, o "Barão de Mauá", como um dos pioneiros do processo industrializante no Brasil. Sua indústria de construção naval e a sua parceria com empresários britânicos inaugurando a via férrea denominada São Paulo Railway, ligando o planalto paulista (Jundiaí) a Santos (litoral paulista), facilitou o escoamento da produção cafeeira ao Porto, fazendo a ligação desta comoditie com o mercado internacional. Barão de Mauá, além de industrial e banqueiro, também era produtor de café.

A industrialização neste período era composta por empresas que basicamente faziam parte de um subsetor da produção de café, ou seja, era um tipo de indústria que visava abastecer, alimentar e otimizar a produção e a circulação logística desta cultura. As indústrias têxteis instaladas ainda no século XIX foram concebidas pela necessidade de se produzir sacos que serviriam de embalagens para o transporte do café produzido, assim como a via férrea São Paulo Railway e as demais ferrovias que foram sendo construídas também com o intuito de transportar o café até o Porto de Santos, para seguir a rota marítima mundo afora, assim como as próprias embarcações construídas inicialmente pela indústria do Barão de Mauá também serviriam para facilitar essa logística. Tirando essas indústrias ligadas à produção cafeicultora, algumas delas se estabeleceram em São Paulo, no ramo do setor alimentício, por exemplo, mas essas indústrias não possuíam ligações com o setor do café, nem com outros setores da economia, e se deram praticamente de forma espontânea e em sua maioria, eram propriedades de famílias de imigrantes que se estabeleceram no Brasil. Como afirma Caio Prado Júnior, (2012, p. 265):

Analisando-se o tipo dos industriais brasileiros, observa-se que boa parte deles se constitui de indivíduos de origem modesta que estabelecendo-se com empreendimentos a princípio insignificantes, conseguiram graças aos grandes lucros dos momentos de prosperidade e um padrão de vida recalcado para um mínimo do essencial à subsistência, ir acumulando os fundos necessários para ampliarem suas empresas. Este será o caso, em particular, de imigrantes estrangeiros, colocados em situação social que lhes permita tal regime de vida. Efetivamente, a maior parte da indústria brasileira encontrou-se logo nas mão de adventícios de recente data ou seus sucessores imediatos - os Matarazzo, Crespi, Jaffet, Pereira Ignácio, etc. E se formou assim por pequenos e sucessivos concursos de economias reunidas.

A industrialização no Brasil, na época da Velha República, fazia parte daquilo que alguns autores definiriam como economia molecular, sem ligação com os demais setores da economia, a não ser o da indústria têxtil, que era o setor que abastecia a produção cafeicultora, todavia, ainda não possuíam o caráter de parques industriais completos e complexos, com variadas gamas de cadeias produtivas.

O Brasil como um país agroexportador, se insere na divisão internacional do trabalho, e fica à margem do capitalismo industrial e financeiro, pois durante esse período se no Brasil embora já houvesse algumas fábricas, era uma industrialização ainda incipiente se comparada à atividade fabril dos países desenvolvidos, como Inglaterra, França Alemanha, e os Estados Unidos.

As condições herdadas pela Primeira república, já pormenorizadas, levam à reiteração da 'vocação agrícola' do País, atingindo o auge da exportação de café entre 1910 e 1925. Essa reiteração se dá tanto pelas novas relações de produção internas quanto pelo papel que naquela desempenhava a intermediação comercial e financeira [...] (OLIVEIRA, 1984, p. 15).

Essa centralização na monocultura do café implicou em obstáculos ao desenvolvimento tanto de outras culturas, como à industrialização, como afirma Oliveira (1984, p. 29):

O movimento da sociedade na República Velha tem seu ponto de partida na constituição de uma burguesia agrária - o antigo baronato brasileiro -, e seu limite na metamorfose daquela classe em seu contrário, que termina por constituir-se numa oligarquia antiburguesa. A luta de classes, nesse movimento, dá-se em dois planos: o primeiro, o do antagonismo fundamental entre proprietários e não-proprietários ou entre exploradores e explorados, e o segundo o do antagonismo no seio da própria classe dominante, proprietária e exploradora.

O predomínio da cafeicultura acabou por gerar no país, conflitos de interesses entre as classes burguesas. Segundo Oliveira (1984), pelo fato do café assumir um papel de hegemonia na economia brasileira, ele normalmente não transferia recursos para os outros setores da economia, e sim muitas vezes, demandava recursos, pois os custos da produção se davam às vezes através de altos investimentos externos que causavam impactos na economia brasileira de um modo geral, dificultando o desenvolvimento de outros setores econômicos, em particular o do setor industrial, tornando proibitivo o desenvolvimento mais sistemático deste último.

Esse complexo movimento vai separar e distinguir as distintas personas do capital, transformando-as em classes sociais com interesses antagônicos. A negação do valor da própria economia agroexportadora implicava necessariamente na negação das demais atividades econômicas. (OLIVEIRA, 1984, p.34).

Como sabemos, o modo de produção capitalista tem uma marcante característica por ser uma forma de se produzir mercadorias calcada na acumulação de capital, e essa acumulação envolveu uma enorme concorrência entre empresas e mercados, onde a inovação tecnológica foi sempre constante, buscando criar meios, técnicas e equipamentos que facilitassem a produção e que permitissem que houvesse uma maior produção de mercadorias. Isso se deu através da concentração do capital. Singer (1980), analisando Marx, aponta que o processo do desenvolvimento da produção capitalista no final do século XIX e início do século XX, através da sofisticação técnica realizada pelos países industrializados, permitiram uma maior concentração de capitais, que ao sabor do momento experimentou uma alternância na evolução técnica desse processo produtivo, atravessando momentos de alternâncias com movimentos de ascensão e queda. Singer (1980, p. 76) - "[...] o ciclo de conjuntura da economia capitalista se caracteriza por períodos de 'vacas gordas' e 'vacas magras', por uma fase de crescimento da produção, e depois, por crise, à qual se segue uma fase de depressão".

Segundo Singer (1980), a partir da evolução das técnicas, a produção começa a obter um processo de evolução que tende a concentrar o capital num primeiro momento, o que consequentemente ocasiona num crescimento dos lucros, porém, num próximo momento, com a alta da produção, o excedente das mercadorias não tem para onde escoar, gerando o que se chama de crise de superprodução, que é inerente ao capitalismo. A "Grande Depressão de 1929" ocorrida na Bolsa de Valores de Nova Iorque é um exemplo claro disto. Essa crise, como a maioria das crises capitalistas ocorridas, causadas pela superprodução, fez com que as mercadorias ficassem "encalhadas" e não fossem escoadas para o mercado mundial, ocasionando uma grande perda, não só para o produtor, como também para vários outros setores: para os meios produtivos à montante e a jusante da produção1; para o sistema bancário que concede o crédito; para o Estado, e também para a classe operária, que com a crise, vê o seu emprego ameaçado.

Além de criar uma reação em cadeia dentro do próprio setor industrial, a crise também aflorou em outros setores capitalistas para além do território sede da instalação fabril, ou seja, essa crise extrapolou também as fronteiras territoriais dos países industrializados, atingindo os países agroexportadores, pois com uma grande crise acontecendo, o consumo de produtos agrícolas importados acabou sendo reduzido drasticamente nos países industrializados, isso quando este consumo não acabou ficando totalmente fora de cogitação, gerando uma grande crise nos países exportadores de comodities. Dentro desse grupo de países agroexportadores dos anos 1920, está o Brasil como um dos maiores exportadores de café do mundo. Um agravante desta crise de 1929 para o Brasil consistiu no fato de que o café era a cultura mais dinâmica que o Brasil possuía nessa época, principalmente no Estado de São Paulo, o que geraria em território "tupinikim", uma crise quase que sem precedentes, pois quase toda a produção de café ficou "encalhada" sem movimentação no mercado internacional.

Não cabe a este trabalho, pormenorizar os conflitos que ocorreram nesta época no território brasileiro, apenas mencionaremos que o movimento tenentista 2 , por exemplo, teve um importante papel na mudança da economia brasileira no que podemos nos referir à Revolução de 1930, assim como, a instabilidade nas relações políticas internas do "Café Com Leite"3.

Com Washington Luís, presidente da República representando o Estado de São Paulo, e o seu apoio ao paulista Júlio Prestes para a sua sucessão, provocaria assim, uma ruptura nos acordos de poder entre São Paulo e Minas Gerais, pois quebraria a alternância de poder entre essas duas Unidades Federativas, acabando por culminar na "revolta" da burguesia mineira, que decidiu então apoiar um candidato à Presidência de outro Estado brasileiro, como Getúlio Vargas, por exemplo, que era gaúcho.

Não é estranho à dinâmica da história, portanto, que a reação a esse quadro, que vai desaguar na Revolução de 1930, tenha começado pela dissidência oligárquica de outras regiões do País em relação à oligarquia hegemônica, a cafeicultora, sediada, sobretudo em São Paulo. (OLIVEIRA, 1984, p. 34).

Nas eleições que ocorreram em março de 1930, o vencedor foi Júlio Prestes sob suspeitas de fraude, porém, apesar de ganhar as eleições, não pôde exercer o cargo de Presidente em virtude da Revolução de 1930, que depôs através de um golpe de Estado, o governo de Washington Luís, colocando o poder nas mãos de Getúlio Vargas.

A partir daí, a industrialização passou a ser um processo cada vez mais real e sistemático, onde o país a cada nova década vai aumentando seu parque produtivo e diversificando suas atividades, e à medida que esse processo industrial vai se tornando cada vez mais real e presente dentro da economia brasileira, a característica de um país meramente agroexportador como o Brasil de fins do século XIX e início do século XX vai perdendo sua força, embora a exportação de comodities não seja excluída de todo o modo, pois ainda houve incentivo do governo Vargas para a produção e exportação de café como forma de se criar um meio de se subsidiar a industrialização através do recolhimento de impostos do café4.

A quebra do monolitismo oligárquico é condição necessária para a Revolução, mas no seu rastro, terminando por impor-se, serão os novos interesses burgueses, será a nova forma de produção do valor, serão as novas condições de reposição do pressuposto fundamental - do lucro, em última instância - que darão a pauta desde a metade da década de trinta, quando se reorienta principalmente a intermediação comercial e financeira que de externa passa para interna, depois de demonstrada in extremis a inviabilidade de permanência da economia agroexportadora e de suas relações internacionais com a crise de 1929 e a política de destruição dos excedentes de café. (OLIVEIRA, 1984, p. 34).

A partir de então, após a fragilização do processo agroexportador, fundamentado predominantemente na monocultura do café, que tem na crise mundial de 1929 o seu processo de relativo desmantelamento, obrigando em alguns casos o governo de Vargas a ter que comprar uma boa parte da produção excedente, para em seguida, destruir partes dessa produção adquirida5, é que o então processo de industrialização no país começa a ser basicamente financiado e regulamentado pelo Estado, que terá um papel fundamental no processo industrial brasileiro, influenciado pelos preceitos keynesianos que começa a partir da grande crise de 1929, a ser implantado como modelo econômico de forma sistematizada no mundo de uma forma geral.

Nesse processo, o Estado vai jogar um papel fundamental no financiamento da acumulação de capital e na regulação das relações entre o novo capital e o novo trabalho e, agora, na subordinação dos interesses da oligarquia aos interesses da acumulação industrial. (OLIVEIRA, 1984, p. 34).

A princípio, Vargas priorizou no Brasil, a ainda inexistente indústria de base, que consistia na implantação de uma indústria de bens de equipamentos, bens intermediários (insumos e matérias-primas) e de bens de capital que asseguraria futuramente o desenvolvimento e o crescimento da industrialização de bens de consumo duráveis e não-duráveis.

A implantação da CSN (Companhia Siderúrgica Nacional) em Volta Redonda (Rio de Janeiro) e a indústria de mineração da Companhia Vale do Rio Doce em Itabira (Minas Gerais), proporcionaram em certa medida, uma plataforma base para o crescimento industrial brasileiro.

Essa crescente industrialização vai acarretar na expansão da urbanização do centro-sul do país, em especial do Estado de São Paulo, sendo a capital, o motor da economia industrial do país.

É na transformação da então pacata cidade de São Paulo do século XIX, na maior metrópole do país a partir dos anos 1940, que veremos o fenômeno da urbanização se expandir de forma rápida e progressiva, culminando no fluxo migratório, principalmente da região do nordeste brasileiro para a região sudeste, e expandindo a mancha urbana de São Paulo para além do seu território, constituindo-se então na Região Metropolitana de São Paulo (RMSP).

3.1. Breve histórico e conformação territorial da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP)

As cidades são dinâmicas e se alteram continuamente no tempo, os municípios são estáticos e se alteram em datas marcadas. As cidades são um fenômeno social, econômico e geográfico; e, como tal, altamente mutáveis. Sua existência e transformações não podem ser determinadas por lei. Sem entrar no mérito, o fato é que o processo de criação e extinção de municípios é um processo "artificial", em relação à realidade econômica, social e geográfica que é uma cidade. O município é uma entidade estática; a cidade, não. Não há qualquer relação entre a cidade - como realidade econômica, geográfica e social - e o município, cuja existência decorre de outra lógica. Nenhuma cidade para de crescer no limite do município. No entanto, do ponto de vista político, a cidade termina abruptamente no limite do município. Atravessa-se um córrego ou uma avenida e, do lado de lá, o prefeito é outro, os impostos territoriais urbanos são outros, os vereadores são outros e as leis municipais são outras. Do ponto de vista social, econômico e geográfico, o limite municipal é uma linha totalmente artificial e ilógica. (VILLAÇA, 2012, p. 234).

A Região Metropolitana de São Paulo (RMSP) é uma região composta por 39 municípios, sendo São Paulo a espinha dorsal e o eixo centralizador das relações econômicas e produtivas desta região.

Embora haja 39 municípios nesta região, para alguns autores, a cidade é apenas uma só (São Paulo) que se constitui na metrópole paulista onde os demais municípios que compõem a RMSP são partes deste todo, e onde a cidade de São Paulo por ser a metrópole em si que centraliza e agrega as principais relações econômicas do país até mesmo em escala planetária, inevitavelmente, seria também, a centralizadora regional da RMSP.

A ocupação da Grande São Paulo se deu basicamente através da massiva ocupação do município de São Paulo proporcionada em grande parte pela industrialização da capital paulista, que agora sob a expansão do setor industrial, engloba a crescente onda de urbanização.

Em 1920, o estado de São Paulo dispunha de 84% de sua população no interior, quadro que começou a se modificar com a concentração industrial na capital e com os fluxos crescentes de migrantes de Minas Gerais e do Nordeste. Assim, embora a urbanização continuasse a se disseminar pelo interior paulista, em função da expansão da fronteira agrícola e da industrialização leve (viabilizadas pela acumulação cafeeira anterior), dirigindo-se pelos eixos definidos pelas estradas de ferro, o processo urbanizador cada vez mais dominante passou a ser o da metropolização da capital. (DEDECCA, MONTALI e BAENINGER et al, 2009, p. 23).

O processo industrial centralizado na cidade de São Paulo ocasionou o adensamento urbano que rapidamente se expandiu pelo território do município, que abrigou além dos galpões industriais, a ocupação massiva de pessoas vindas de vários cantos do país.

A partir de 1940, inicia-se o processo de configuração da metrópole paulistana, pois, a partir deste ano, o município de São Paulo já englobava um contingente populacional de mais de um milhão de habitantes. Nos anos seguintes, continuou a crescer de forma vertiginosa e a disputar a primazia do sistema urbano com o Rio de Janeiro. (DEDECCA. MONTALI E BAENINGER et al, 2009, p. 23).

Esse crescimento acelerado acabou por ocasionar o "espraiamento" de sua mancha urbana para além do seu território que hoje conhecemos como sendo o município de São Paulo.

As indústrias impulsionaram a configuração territorial em questões de estruturas e infraestruturas logísticas e produtivas, assim como, a crescente ocupação por moradias.

A expansão e fortalecimento da metrópole paulista se concretizaram enquanto expansão do urbano e a constituição de um tecido que lhe correspondia. O aumento dos impostos territoriais na capital, o crescimento da população e a expansão do parque industrial, tornavam oneroso tanto a moradia operária, como a necessidade de grandes glebas para a produção industrial, o que impulsionou a instalação de indústrias e a formação de loteamentos urbanos ao entorno da capital. (ALVAREZ, 2008, p. 71).

A partir daí começa a se constituir o que se tornará ao longo do século XX, a Região Metropolitana da São Paulo, que hoje abriga 20,93 milhões6 de pessoas, numa área de 7.946, 82 mil Km2 7.


Figura 1
: Mapa da distribuição territorial da RMSP. Fonte: Emplasa.

Essa é a configuração atual da RMSP, fruto "espraiamento" da capital paulista para outras áreas, o que possibilitou a emancipação política de novos municípios, sendo essas emancipações responsáveis pela atual conformação territorial. O território da RMSP foi sofrendo diversas alterações até se tornar o que é hoje na atualidade, apresentando uma grande densidade demográfica em seus principais municípios, em especial, no município de São Paulo.

Para se chegar à configuração que tem hoje os limites das divisas da RMSP ocorreram alguns desmembramentos importantes no município de São Paulo. A começar por Santana de Parnaíba, criado em 1625, que depois cedeu terras para as criações dos municípios de Itu, em 1654, Sorocaba, em 1661 e São Roque, em 1832. São Paulo também perdeu área, no ano de 1769, para a criação do município de Atibaia. (CUNHA, 2014, pp. 10).

Antes do século XVII, a área que poderíamos considerar pertencente à jurisdição de São Paulo, era uma área bem maior em extensão territorial, pois além conter toda a área da atual RMSP, compreendia também, partes do interior do Estado de São Paulo. Dessa forma, podemos observar que a conformação territorial da RMSP passou por diversas fragmentações, diminuindo a sua extensão territorial até chegar nessa área de quase 8 mil Km2.

Com essas transformações no espaço territorial do que é hoje a RMSP, a partir de 1832, a região se desvincula definitivamente das terras do Interior e passa a ter os limites municipais com a extensão territorial da RMSP que conhecemos hoje, passando a se articular, a se desenvolver e a se organizar num raio menor de extensão territorial. Portanto, o ano de 1832 marca o início de um novo processo de configuração espacial que resultaria no que temos hoje em termos de Região Metropolitana de São Paulo. (CUNHA, 2014, p. 10).

A crescente urbanização já presente no período da cafeicultura, que se expandiu de forma mais rápida e intensa no século XX com o desenvolvimento industrial, passa então a fragmentar este território, e assim novos municípios vão sendo criados.


Figura 2
: Fragmentações da RMSP (entre os séculos XVI e XIX). Fonte: Cunha (2015).

 
Figura 3:
Fragmentações da RMSP (séculos XX e XXI). Fonte: Cunha (2014).

Os municípios que se emanciparam politicamente de São Paulo até o século XIX segundo o esquema da figura 4, logo adiante são: Cotia, Itapecerica da Serra, Guarulhos, Santo André 8 e Santo Amaro9.

De Mogi das Cruzes se emanciparam até o século XIX: Santa Isabel, Salesópolis e Guararema, e de Guarulhos, há a emancipação de Mairiporã em 1889.

Entre os séculos XVI e XIX, as transformações territoriais ocorridas neste período de mais de trezentos anos chegou ao máximo de 12 municípios. Depois disso, num período de menos de 100 anos, o número de municípios passou a 39, ou seja, o número de municípios criados apenas no século XX corresponde a mais de duas vezes o número de emancipações que ocorreram entre o século XVI até o final do século XIX.

Figura 4: Desmembramento de municípios na Região Metropolitana de São Paulo entre 1558/2000. Fonte: Fundação Seade.

Siqueira (2003, p. 39) - "[...] o surgimento de novos municípios em qualquer região do país deverá considerar dois fatores: a ocupação territorial e o desenvolvimento econômico em análise" - assim, os aspectos econômicos pelos quais passaram o país, sobretudo, a RMSP com o desenvolvimento industrial, foram trazendo uma maior intensidade de ocupações, transformações e emancipações, das quais os fatores econômicos em grande medida, vão determinando o tipo e o fluxo das ocupações, pois são eles que em certa medida torna mais viável ou não a ocupação de um determinado lugar. Como São Paulo foi e ainda é um polo de atração de capitais, que alimenta a produção e o comércio, e que também atrai e agrega atividades variadas, também será um polo magnetizador dos fixos de ocupação e dos fluxos de mobilidade.

A partir da (re) afirmação do modo de produção capitalista pós Revolução Industrial na Inglaterra, houve um fator determinante para condicionar por meio deste modelo econômico, as relações sociais no mundo todo, onde essas relações tem como seu ponto de partida, as relações de trabalho, que tem na forma do trabalho assalariado, o seu caráter de acumulação de capital, proporcionado pela mais-valia. Esse modo de produção capitalista para se manter funcionando bem e para cumprir a sua missão que é gerar riqueza para o capitalista que é o proprietário dos meios produtivos necessita se externar para além de suas fronteiras territoriais, definindo os futuros dos outros países, que até início do século XX ainda não eram consistentemente industrializados, impondo através do poder econômico para o mundo ao seu redor, não só seus interesses econômicos, como também, as relações sociais, relações essas que tem no trabalho, o seu mote.

Daí, a divisão internacional do trabalho, da qual o Brasil possuiu um papel fundamental de abastecer o mercado europeu e norte-americano através do café que era predominantemente produzido no Estado de São Paulo em fins do século XIX, numa época em que coincide com que Lenin (2015) sistematizou como Imperialismo, ou seja, o estágio superior do capitalismo.

Segundo Lenin (2015), o capitalismo no final do século XIX e meados do século XX atingiu um grau de desenvolvimento tão grande, que transcendeu sua fase concorrencial, entrando na sua fase monopolista, o que significa uma enorme concentração de renda e lucro nas mãos de um número cada vez mais reduzido de empresas e de nações. Lenin (2015, p. 124) - "O monopólio é a transição do capitalismo para uma ordem superior".

Essa ordem superior do capitalismo consiste em que a partir da consolidação do capitalismo monopolista entrando na sua fase imperialista, este passa a possuir características muito mais sofisticadas do que o capitalismo meramente industrial e concorrencial aplicado a partir da Revolução Industrial.

[...] convém dar uma definição do imperialismo que inclua as seguintes cinco características fundamentais: 1) a concentração da produção e do capital alcançou um grau tão elevado do desenvolvimento que criou monopólios, os quais desempenham um papel decisivo na vida econômica; 2) a fusão do capital bancário com o capital industrial e a criação, baseada nesse "capital financeiro", da oligarquia financeira; 3) a exportação de capitais, diferentemente da exportação de mercadorias, adquire uma importância particularmente grande; 4) a formação de associações internacionais monopolistas de capitalistas, que partilham o mundo entre si; 5) conclusão da partilha territorial do mundo entre as potências capitalistas mais importantes. (LENIN, 2015, p. 124)).

Essas são as principais características, do Imperialismo, e são elas que vão definir ou determinar em grande parte as relações econômicas e de trabalho no mundo todo, o que implicará direta e indiretamente na transformação e na configuração espacial do globo terrestre. Essas relações econômicas imperialistas terão bastante influência na forma como será ocupada a Região Metropolitana de São Paulo, principalmente no que diz respeito às características 2 e 3 citadas acima: com a fusão do capital industrial ao capital bancário, se transformando no capital financeiro; e com a exportação de capitais, - que consiste no empréstimo do excedente do lucro gerado pelos maiores bancos internacionais. Este excedente de capitais muitas vezes vão servir para os países subdesenvolvidos ou ainda não industrializados, como forma de se criar estruturas e logísticas de escoamento da produção. No caso do Brasil, um dos meios logísticos de grande impacto para o escoamento da produção de café foi a ferrovia:

A construção das ferrovias brasileiras realiza-se, na sua maior parte, com capitais franceses, belgas, britânicos e alemães; tais países, ao efetuarem as operações financeiras relacionadas com a construção de ferrovias, reservam-se as encomendas de materiais de construção ferroviária. (DESCHANEL 1912, apud LENIN, 2015, p. 98).

Vale ressaltar que uma peculiaridade muito forte do Imperialismo se caracterizou por ser uma ferramenta de dominação econômica dos bancos mundiais mais poderosos com sede nos países capitalistas centrais, em relação às instituições ou empreendedores dos países ainda não, ou muito pouco industrializados, na medida em que através do excedente de capitais exportados por estas instituições bancárias ou associações capitalistas mundiais aos demais países, estes retornaram aos bancos acrescidos de juros, causando nos países devedores, uma grande dívida pública.

Mas não contente com isso, além do capital retornar com juros, temos um fator agravante: os bancos internacionais além de emprestarem o capital para esses países, também são muitas vezes, proprietários parciais ou totais de insumos e tecnologias industriais nas estruturas que vão ser empregadas para as implantações dos empreendimentos que serão realizados nos países que solicitaram os empréstimos, ou seja, os países solicitantes também têm que adquirir os materiais produzidos por essas indústrias. Resumindo, os países periféricos pagam para os bancos os juros dos empréstimos, os materiais usados nos empreendimentos e a tecnologia empregada para a realização dos mesmos.

As associações de monopolistas capitalistas [...] partilham entre si, em primeiro lugar, o mercado interno, apoderando-se mais ou menos completamente da produção do país. Mas, sob o capitalismo, o mercado interno está inevitavelmente vinculado ao externo. Há muito que o capitalismo criou um mercado mundial. E, à medida que aumentava a exportação de capitais e se ampliavam, sob todas as formas, as relações com o estrangeiro e com as colônias, assim como as "esferas de influência" das maiores associações monopolistas, a marcha 'natural' das coisas levou um acordo universal entre elas, à constituição de cartéis internacionais. (LENIN, 2015, p. 99).

A ferrovia São Paulo Railway instalada em 1867, idealizada pelo Barão de Mauá, obteve sua construção possibilitada pelo capital externo provindo do banco britânico Rotschild. Banco que também possuía ações nas indústrias de dormentes e aços para a construção dos trilhos.

A São Paulo Railway Company (SPR) foi a primeira ferrovia construída em São Paulo, e a segunda no Brasil. Financiada com capital inglês, sua construção foi iniciada em 1860, enfrentando muitas dificuldades técnicas durante a implantação, principalmente no trecho da Serra do Mar. (WALM, Engenharia e Tecnologia Ambiental - EIA-RIMA Linha 18 Bronze do METRÔ, 2012, p. 1).

Essa ferrovia, (assim como as outras ferrovias que foram sendo instaladas), além de transportar o café e cargas em geral, possibilitou também, a ocupação na área que compreende o Estado de São Paulo:

[] a inauguração da São Paulo Railway, que ligava o Porto de Santos a Jundiaí, a partir de 1867, funcionou como elemento de consolidação do processo. A instalação desse primeiro corredor de exportação que ligava o Porto de Santos às regiões cafeeiras marcou o fim de um processo de disputa entre vários grupos econômicos e políticos, gerando uma fase de estabelecimento de uma rede ferroviária que conformaria a Metrópole. (FÁVERO, 2005, p. 62).


Figura 5:
Trecho da via férrea São Paulo Railway (Santos a Jundiaí). Fonte: Centro Oeste Brasil.

A ferrovia São Paulo Railway parte de Jundiaí, corta a grande São Paulo a partir dos municípios de: Francisco Morato, Franco da Rocha, Caieiras, São Paulo (de noroeste até um pedaço do trecho sul) e dos municípios do ABC - São Caetano do Sul, Santo André, Mauá, Ribeirão Pires, Rio Grande da Serra, Paranapiacaba (hoje distrito de Santo André) - cruzando a Serra do Mar e chegando ao Porto de Santos (seu destino final). Segundo consta no EIA-RIMA elaborado pela Walm (Engenharia e Tecnologia Ambiental, 2012), as demais ferrovias fundadas após a segunda metade do século XIX, além da São Paulo Railway, são: a Companhia Paulista em 1872 (ligando Jundiaí à Campinas); Mogiana, também em 1872 (ligando São Paulo ao nordeste paulista); a Companhia Ituana em 1873, (ligando Jundiaí a Itú) e a Sorocabana em 1875, ligando São Paulo à Sorocaba.

Polarizado pelo Município de São Paulo, o sistema ferroviário organizou as forças centrífugas da expansão metropolitana e, simultaneamente, reforçou a hegemonia da capital enquanto pólo centralizador. [...]. Com o tempo, entretanto, começava também a ganhar características de serviço público, à medida que se tornou o mais importante meio de transporte de passageiros para os Municípios do entorno e mesmo para os distritos mais afastados da cidade. (FÁVERO, 2005, p. 62/63).

As ferrovias que a princípio possuíam a finalidade de escoar cargas até o Porto de Santos, com o passar do tempo, foram agregando diversas atividades:

"A expansão das ferrovias fez com que a própria estrutura ferroviária exigisse a implementação de várias atividades tipicamente urbanas: trabalhadores urbanos assalariados, que precisavam se alimentar, vestir e morar. [...] Nesse sentido, as ferrovias foram responsáveis, direta e indiretamente, por estimular inúmeras atividades urbanas. Sem contar, as diversas indústrias implantadas nas suas proximidades, que dela se beneficiavam tanto para escoar suas respectivas produções como para receber equipamentos específicos voltados a atividade fabril, bem como os bairros operários que se formaram."(WALM, Engenharia e Tecnologia Ambiental - EIA-RIMA Linha 18 Bronze do METRO, 2012, p. 4).

Nesse primeiro momento, as ferrovias ainda não haviam sido as principais responsáveis pela fragmentação territorial que originaria a RMSP, porém, permitiram a ocupação de povoados no seu entorno e a diversificação das atividades econômicas.

Todavia, é com a industrialização que a emancipação dos municípios vão acontecendo com maior frequência e impacto no século XX, através da atividade econômica calcada no modelo industrial.

Mesmo com o adensamento populacional, as emancipações políticas começaram a ocorrer com mais frequência a partir do final do primeiro governo de Vargas, isto se deve segundo Siqueira (2003), pelo fato de que no Brasil, a criação de municípios sob governos de caráter mais centralizador a emancipação de municípios tendeu a ser mais rígida, enquanto que com governos mais descentralizados, a emancipação ocorreu de uma forma mais flexibilizada.

É a partir do final do primeiro governo Vargas, intensificando-se no período de Juscelino Kubitshek, que ocorrerá o desmembramento em massa dos municípios da RMSP, que com a lei complementar Federal nº 14 de 08 de julho de 1973, junto com outras regiões metropolitanas do Brasil 10 , ficou estabelecida como uma região oficialmente.

Embora no histórico desta Região houvesse esses numerosos desmembramentos municipais, devemos levar em consideração que eles não ocasionaram e não ocasionam a independência política e econômica dos demais municípios da Região Metropolitana em relação à metrópole:

"[...] a metrópole é uma devoradora de cidades (de municípios) e uma criadora de bairros. Ela transforma cidades em bairros. Santo Amaro, Santo André, São Bernardo, São Caetano do Sul, Guarulhos, etc. tornaram-se bairros e subúrbios de São Paulo [...]" (VILLAÇA, 2012, p. 233).

Ou seja, os municípios da RMSP, embora estejam constituídos como cidades "independentes" de São Paulo, ainda possuem uma característica de submissão frente à metrópole.

3.1.1. O ABC Paulista

O ABC paulista é uma faixa territorial dentro da RMSP constituído por sete municípios: Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra. Possui uma extensão territorial de 828,7 Km211 e uma população estimada em 2014 pelo IBGE de aproximadamente 2,7 milhões de pessoas.12.

Foi e ainda é considerado um dos maiores polos industriais do país, possuindo ainda importantes unidades das montadoras multinacionais, especialmente em São Bernardo do Campo, onde se encontram a Volkswagen do Brasil, Scania e a Mercedes Benz. Em São Caetano do Sul, temos a General Motors do Brasil (GMB).

Em Mauá, se situa o polo petroquímico em Capuava e o distrito industrial de Sertãozinho, pelo qual se tem fácil acesso às rodovias após a construção do Trecho Sul do Rodoanel Mário Covas.

A nomenclatura ABC foi originada através das iniciais dos nomes dos três municípios fundadores: André, Bernardo e Caetano. Às vezes é denominado ABCD, onde a letra "D" contempla o município de Diadema. Também, às vezes, para englobar todos os sete municípios, usa-se: ABCDMRR (André, Bernardo, Caetano, Diadema, Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra), porém, normalmente quando falamos ABC, fica-se subentendido de que se trata de assuntos relacionados aos sete municípios.

Segundo Almeida (2008), o ABC Paulista não é uma região à parte ou em separado da RMSP, como tentam supor os governos e as mídias locais ao longo do tempo, porém, de alguma forma está naturalizado o conceito de que o ABC é de fato uma região para o senso comum.

Almeida (2008) aponta que o conceito de região, se for levado em conta a partir do ponto de vista Lablachiano13, teria que ser um conjunto de localidades (no caso do ABC em questão), de municípios que houvesse entre si, similaridades intrarregionais, que pudessem trazer uma certa singularidade inter-regional que dessem a essa suposta região do ABC, uma identidade que a distinguisse de toda a Região Metropolitana de São Paulo, o que não acontece, dada as diversas disparidades que há entre esses sete municípios.

Almeida, (2008, p. 69) - "Todavia o ABC perfaz sete cidades que não correspondem ao mesmo grau de produção em relação à indústria" - ou seja, a autora toca no ponto em que o ABC possuindo uma marcante característica de ser o lócus industrial, sobretudo, no que se refere à indústria automobilística, na realidade, não possui uma atividade fabril no ABC com intensidade semelhante nesses sete municípios para que se caracterizasse essa similaridade sugerida que a fizesse possuir essa identidade de região industrial, pois as indústrias estão distribuídas no ABC de forma desigual, possuindo uma maior intensidade em São Bernardo do Campo, e uma intensidade descomunalmente menor em Rio Grande da Serra, sem contar Santo André que por muitos anos teve um papel forte no processo industrializante paulista, mas que vem desde os anos 1990, mudando sua característica de cidade industrial, se firmando recentemente com mais ênfase no setor de comércio e serviços.

A gênese do que hoje conhecemos como ABC Paulista, provém basicamente da denominação de dois dos seus mais importantes municípios: Santo André e São Bernardo - onde ao longo de suas fundações e povoações, consistiam num mesmo território onde hoje estão contidos os sete municípios, que principalmente após a urbanização, passou por processos de emancipações que separaram e fragmentaram este território, seguindo a lógica da fragmentação territorial da RMSP como um todo.

Consta que a cidade de Santo André possui hoje no ano de 2015, 462 anos que datam da fundação desse povoado liderado pelo português João Ramalho, que data de 08/04/1553, porém, com a fundação da vila de São Paulo de Piratininga em 25/01/1554, a vila de Santo André da Borda do Campo ficou de certa forma "desativada".

Dificuldades de subsistência e de proteção fizeram com que a vila de Santo André fosse transferida para São Paulo de Piratininga em 1560, através de proposta do Padre Manoel da Nóbrega ao Governador Geral Mem de Sá. A partir de então, Santo André deixou de existir enquanto unidade administrativa, passando a ser um bairro de São Paulo14. A região passou por um período de estagnação, tornando-se local de passagem entre o Porto de Santos, a capital e o interior15.

Apesar de que o cidadão andreense comum entende que este município possua mais de quatrocentos anos, Tizio (2009) contesta essa possibilidade:

[...] a verdade é que nada liga a Santo André da Borda do Campo, fundada por João Ramalho, com a Santo André atual. Na época de sua emancipação, nem mesmo o lugar onde aquela se assentava corresponde ao indicado como tal. (TIZIO, 2009, p. 167).

Perez, (2009) afirma que o motivo do deslocamento se deu por alguns fatores, entre os quais, a rivalidade do fundador João Ramalho e dos demais moradores de Santo André da Borda do Campo contra os jesuítas. Outro motivo era de defender o povoado do ataque dos índios da tribo dos Tamoios. Perez (2010, p. 51) analisando Callado (s.d).

[...] Santo André era muito precária e não conseguia defender-se dos Tamoios, mesmo com a tentativa de fortificá-la. [...].Como as atas da vila de Santo André da Borda do Campo desapareceram entre 1558 e 1560, o autor conclui que a cidade "desapareceu" nesse período. As atas seguintes datam de 1562, quando a vila já estava transferida para São Paulo.

Apenas a partir da segunda metade do século XIX é que Santo André passou defato a ser ocupada de forma mais consistente, e também é quando começou a se ter registros mais claros sobre os fatos históricos.

Tizio (2009) aponta para a perspectiva do povoamento neste território onde se situa hoje o ABC paulista: - "O surgimento daquele que se tornaria o município de Santo André, ocorre em 1867 com o nome bairro da Estação de São Bernardo. [...] formava-se Santo André, o que o torna relativamente novo em termos históricos. (TIZIO, 2009, p. 167, destaque do autor).

Com base nesta afirmação, temos duas importantes observações a fazer: a) a ocupação deste território não recebe a denominação Santo André e sim São Bernardo; b) o termo "bairro" que o autor coloca, não dá a esse território a denominação de município, como vem sendo colocado pelo poder público e aceito pela maior parte dos cidadãos andreenses de que o município de Santo André possua 462 anos.

No trabalho de Dedecca, Montali e Baeninger et al, (2000, p. 25), consta que a emancipação de Santo André se deu em 1889, porém, não é a denominação "Santo André" que prevaleceu por esta época. No site da Prefeitura de Santo André consta: - "Em 1889, quando foi criado o município de São Bernardo, este nasceu sob a marca da industrialização, utilizando, predominantemente, a mão de obra de imigrantes. Este município abrangia toda a região do Grande ABC".16 (grifo nosso).

O nome "Santo André" só passa a ressurgir em 1910 como distrito de São Bernardo, e não como um município propriamente dito: - "Certa Autonomia é adquirida em 1910, quando é criado o distrito já denominado Santo André". (TIZIO, 2010, p. 169). Então a partir do final da década de 1930:

O distrito de Santo André abrigava na década de 1930 várias indústrias importantes, possuía a Estação de São Bernardo por onde era transportada grande parte dos produtos aqui produzidos e tinha entre seus moradores vários políticos influentes. Tal situação levou à transferência da sede do município de São Bernardo para Santo André, em 1939. Toda a região do Grande ABC, composta por vários distritos, passou, então, a ser denominada pelo nome Santo André 17.

A partir de então, toda essa faixa territorial que engloba os sete municípios vai se chamar Santo André, onde será palco do processo industrializante do Estado de São Paulo com mais intensidade na era Kubitschek. É preciso lembrar que já havia algumas indústrias, todavia elas ainda faziam parte de um subsetor da produção cafeeira, ou da substituição de importações da Primeira Guerra Mundial, e não possuíam um sofisticado processo de sistematização e com pouca interação na economia.

(...) no final do século XIX, já havia inúmeras indústrias instaladas ao longo do eixo da ferrovia, (...) logo se espraiando em direção à serra (...) o grande centro industrial (...) já começara a ser gestado a partir do século XIX, ampliando-se durante os primeiros anos do século XX, particularmente a partir dos anos 20, sendo desta época a instalação de grandes indústrias (...). (MELLO, 2001, p.112 apud ALMEIDA (2008, p. 186).

Entre as causas mais comuns das emancipações ocorridas dentro do ABC Paulista, são as formações de subcentros constituídos como distritos, que atingem certa autonomia e reivindicam melhor destinação de repasses de recursos financeiros.

Com o crescimento do setor industrial, temos a emancipação de São Bernardo do Campo em 1944, de São Caetano do Sul em 1948, Mauá e Ribeirão Pires em 1954. Diadema se separa de São Bernardo do Campo em 1959 e Rio Grande da Serra se separa de Ribeirão Pires em 1964. A partir de então, principalmente nos anos 1950, começa a ocorrer no ABC, uma grande onda de transformação no espaço:

[...] na década de 50, os municípios abecedenses assistiram ao ritmo frenético da intensificação de desapropriações, assim como a devastação de matas para receber novos traçados de circulação como pontes, viadutos, avenidas, estradas intermunicipais, ou para dar lugar ao dinamismo incessante dos loteamentos, ou mesmo por conta da administração pública procurar atender aos serviços de água e esgoto aquém das demandas locais. (ALMEIDA, 2008, p. 220).

Com as indústrias instaladas, houve a necessidade de se criar uma logística que propiciasse a circulação viária 18 . A partir daí, a urbanização se tornou constante, trazendo rede de comércios, sistemas de transportes públicos, escolas, universidades, etc., bem como o loteamento de terrenos para moradias que começou a se tornar bastante intensivo, ocasionando em um grande processo de ocupação, que muitas vezes ultrapassam os limites territoriais entre os municípios do ABC, se configurando em áreas bastante conurbadas, tanto que em muitos casos, nas divisas entre um município e outro, fica muito difícil de percebermos quais são os seus reais limites.

4. Segregação social da metrópole através da territorialidade do capital imobiliário;

Nas já tradicionais áreas que hoje conhecemos como locais de residências de alto padrão, o uso do solo urbano perdeu seu valor de uso, e ganhou cada vez mais seu valor de troca, sendo alguns lugares inacessíveis para maioria da população de baixa renda. Os agentes imobiliários, ao produzirem o urbano, desenham e redesenham o espaço, tornando o mercado imobiliário mais complexo, sofisticado e excludente, visando exclusivamente o lucro. Ou seja, a moradia deixa de ser o local de abrigo, descanso e privacidade do cidadão e se torna uma mercadoria que traz status de um modo ideal de viver, ou de um modo ideal de habitar.

A verticalização, bem como a construção de condomínios fechados para a população de alta renda, aglomera ao seu redor uma gama de atividades dos setores de serviços e comércio, amenidades 19 , estruturas e infraestruturas, que em certa medida, encarecem o custo de vida20 nesses locais. Sendo assim, apenas uma seleta parcela da população com alto poder aquisitivo é que consegue usufruir de suas propriedades e do que é oferecido no entorno dessas áreas nobres ou revitalizadas, restando à população de baixa renda, e até para uma parte da população que já morava em determinados pontos da cidade ainda não enobrecidos, procurar outras áreas ainda não valorizadas ou supervalorizadas pelo capital imobiliário, sendo assim, uma parcela considerável se vê obrigada a se fixar em locais cada vez mais distantes dos espaços (re) valorizados.

A especulação imobiliária e a sua manipulação monopolista de mercado e tudo o que delas resultam determinam em muitos aspectos a forma de viver da população de um modo geral, pois encarecendo o valor do uso do solo, encarece também, o valor do imóvel, refletindo no custo de vida, provocando o êxodo de uma grande parcela da população, facilitando ou até mesmo obrigando o processo de deslocamento para locais cada vez mais distantes das áreas urbanas consolidadas21.

As ações dos produtores do espaço urbano, ao monopolizarem esse espaço, configuram não só os elementos materiais da cidade, como também os seus elementos sociais, através de novos arranjos paisagísticos, impondo uma lógica mercantil no habitat, de caráter exclusivista e excludente, onde uma seleta parcela de alto poder aquisitivo é que consegue manter e adquirir seu direito à cidade.

Isto se dá analisando a expansão industrial ocorrida na Região Metropolitana de São Paulo, e o seu intenso e rápido processo de urbanização, que por sua vez, possibilitou uma (re) configuração e (re) territorialização da cidade, configurando suas características socioespaciais. Esse intenso processo de industrialização fruto do Plano de Metas de Juscelino Kubitschek, sobretudo na região sudeste e mais precisamente em São Paulo, transformou radicalmente as relações sociais no país e modificou em grande parte a sociedade brasileira, principalmente entre os anos 1960 e 1970.

A partir da década de 1990, com a reestruturação produtiva, abertura da economia no mercado global e o princípio das deslocalizações industriais ocorridas nas principais cidades da Região Metropolitana, o setor financeiro começa a ganhar terreno no circuito das transformações espaciais de São Paulo.

O setor financeiro apropria-se do espaço como lugar possível de realização do investimento produtivo, ao passo que o setor imobiliário reproduz (aliado à indústria da construção civil), constantemente, o espaço enquanto mercadoria consumível. Em todos esses momentos da reprodução do capital, a interferência do Estado é fundamental e a sua ação desencadeia um processo de revalorização/desvalorização dos lugares e, com isso, expulsão/retração de habitantes (em função de sua compatibilização com os movimentos de renovação), produzindo o fenômeno de explosão do centro - movimento de expulsão de habitantes em direção à periferia, reproduzindo-a. (CARLOS et al., 2015, p. 17).

Nesse processo de apropriação do espaço urbano, é cada vez mais presente a figura dos empreendedores imobiliários nas cidades capitalistas, reforçando a valorização das áreas centrais ou nobres da cidade, bem como também promovendo a revalorização de áreas com potencial de crescimento que podem vir a condicionar um alto ganho para o mercado imobiliário após as revitalizações urbanas. Nessas ações, além de ocasionar a segregação em relação às camadas de baixa renda, podem vir a acarretar a desvalorização de determinadas áreas da cidade. Processo esse muito comum no Centro Histórico de São Paulo, que a partir da expansão de seu centro para as camadas de alta renda que agrega as áreas residenciais de alto padrão como os setores de comércio e de serviços, prédios corporativos e serviços do meio técnico científico, temos a formação do que se pode considerar como o "novo" Centro da Capital, enquanto que se deteriora o seu Centro Histórico que já há um certo tempo vem dando sinais de degradação acentuada em alguns pontos, como os prédios abandonados e a "Cracolândia, por exemplo".

[...] a escassez de terrenos disponíveis na metrópole paulista, na contiguidade das áreas onde as atividades já se desenvolvem. Essa situação obriga o estabelecimento de novas estratégias que se realizam a partir de uma ampla aliança entre as frações de capital (industrial e financeiro), exigindo do Estado políticas de renovação/requalificação das áreas ocupadas da metrópole, bem como mudanças nos códigos de construção, leis de zoneamento, além da aplicação de leis de desapropriação seguidas da expulsão da população residente, tornando a urbanização um negócio rentável. (CARLOS, VOLOCHKO, ALVAREZ, et. al., 2015, p. 55).

O adensamento ocupacional nas áreas nobres, criado pela construção de diversos empreendimentos visando atrair o alto padrão de consumo, gerando lucros astronômicos para os grandes empreendedores do setor imobiliário, acaba em algum momento, provocando a falta de áreas edificáveis, não sendo possível dar continuidade ao processo de construções de mais empreendimentos, o que traz à tona, o fenômeno da escassez, ou raridade espacial. Nesse sentido, os promotores imobiliários buscam revalorizar outras áreas com potencial especulativo, no qual o papel do Estado será de fundamental importância, como provedor de infraestruturas e serviços, regulador do uso do solo e detentor do poder de fiscalização, policiamento, e consequentemente, através de atos de desapropriações com o uso ou não da violência psicológica e/ou física por meio de seu aparelhamento burocrático e militar, promovendo a expulsão de quem se encontra (legal ou ilegalmente) numa área almejada para a construção de mais novos superempreendimentos.

Dadas às necessidades de continuidade de produção ampliada da acumulação urbana, e dadas algumas barreiras como a raridade do espaço em certas regiões valorizadas e densamente ocupadas das cidades e metrópoles, o setor imobiliário de ponta e o capital financeiro, com o auxílio do Estado, passam atualmente a investir pesadamente na produção habitacional nos espaços periféricos [...]. (VOLOCHKO, 2015, p.112).

Nesse sentido, Fix (2007 e 2012) pauta seus trabalhos nas operações urbanas Água Espraiada e Nova Faria Lima, onde a autora trata da revitalização dessas duas áreas, que embora, não façam parte da periferia consolidada da Zona Sul da capital, são áreas que não faziam e não fazem parte do Centro Histórico de São Paulo, sendo denominada como uma parte do Quadrante Sudoeste22.

Essas revitalizações foram concebidas por conta do adensamento da região da Avenida Paulista, onde o solo urbano se torna escasso tanto para a implantação de novos escritórios corporativos, quanto para a expansão do comércio e serviços e conjuntos residenciais de luxo, onde o fenômeno da raridade espacial começa a se constituir.

[...] o deslocamento dos centros urbanos tradicionais, nas cidades brasileiras tem a ver com a popularização desses mesmos centros. Eles se desvalorizam quando sua frequência se torna popular e são substituídos por outra centralidade que passa a ser o novo cartão-postal da cidade. Capitais, empresas e até mesmo órgãos públicos participam da busca [...] de um espaço que confira distinção, isto é, que não seja tão acessível por meio de transporte público. (MARICATO apud FIX, 2012, p. 9).

Segundo Fix (2012), para que fosse possível haver essa nova centralidade do setor financeiro na região da Nova Faria Lima e da Avenida Água Espraiada, foi necessário que houvesse a remoção de 68 núcleos de favelas que estavam próximos a essa área, no Jardim Edith, próximo ao prédio do Centro Empresarial Nações Unidas (CENU). Com isso, houve um deslocamento em massa de boa parte das famílias que habitavam esse local a se deslocarem para outros bairros da cidade de São Paulo, ou outros municípios da RMSP: "São Luís, Paraisópolis, Real Parque, Parelheiros, Grajaú, Vargem Grande, Itapecirica, Embú, Mauá, Cocaia, Campo Limpo, Franco da Rocha e Francisco Morato." Fix (2012, p. 50).

A apropriação do espaço urbano pelos setores financeiros com intervenção do poder público permite que as ocupações massivas em áreas irregulares (encostas de morros, aterros sanitários, áreas de mananciais, etc.), se tornem processos cada vez mais constantes, pois uma grande parcela da população não consegue ou não conseguiria arcar com o alto custo imposto pela lógica do capital imobiliário em determinados pontos da cidade. Ou seja, os promotores imobiliários, seguindo as tendências do mercado imobiliário capitalista, promovem através da especulação, a (re) produção e transformação dos lugares, ocasionando numa reconfiguração espacial de determinados pontos da cidade, claro que tudo isso mediado pelas ações do Estado, no que diz respeito às obras de melhorias e infraestruturas urbanas.

O Estado transforma-se, assim, no principal "sócio" da inciativa privada na renovação urbana de algumas áreas, funcionando como um grande empreendedor imobiliário. O poder público é quem realiza os investimentos iniciais do empreendimento, com a instalação da chamada "âncora" (ou "motor") da Operação urbana [...] (FIX, 2012, p. 117).

Dessa forma, o Estado investe pesadamente em infraestrutura urbana melhorando a circulação viária que propicie uma melhor logística e uma melhor localização, retifica os rios, canaliza os córregos, constrói praças, parques, museus, casas de cultura, etc.. Após isso, a iniciativa privada entra com seus megaprojetos construindo shopping centers, hotéis de luxo, edifícios de apartamentos de alto padrão. Em todos esses empreendimentos se exige uma melhoria na localização, então se faz necessária a construção de pontes, viadutos, alça de acesso, alargamento de ruas, etc., que ficará por conta do Estado. É a famosa Parceria Público-Privada se configurando como uma parceria da exclusão (Fix, 2012).

A partir de então, a moradia toma a forma de mercadoria, causando a princípio, a segregação através especulação que envolve a seleção de certas áreas da cidade através das revitalizações, que direta e/ou indiretamente obriga parte dos moradores que ali residem, a procurar por outros pontos da cidade, se tornando então a segregação, um fator determinante a posteriori, a partir do momento em que se consolida a gentrificação23 de algumas áreas, onde fatalmente, ocorrerá umimpedimento para que as pessoas de baixa renda possam morar nelas, ou simplesmente frequentá-las.

[...] é historicamente "nas áreas rejeitadas pelo mercado imobiliário privado e nas áreas públicas situadas em regiões desvalorizadas que a população trabalhadora pobre vai instalar-se", em "beiras de córregos, encostas de morros, terrenos sujeitos a enchentes ou outros tipos de riscos [...]. (FIX, 2012, p. 134).

As Operações Urbanas aparentam ao senso comum, como se fossem ações de promoções e de melhorias no espaço urbano em uma determinada área, que causa uma ilusória e agradável impressão na paisagem através de novos rearranjos paisagísticos, escondendo em si, os artifícios que a parceria público-privada promove. Fix (2007) aborda as ações organizadas e postas em práticas pelo poder público e pela iniciativa privada no entorno do Jardim Edith:

As ameaças para que abandonassem suas casas rapidamente, aceitando a proposta da Prefeitura, a falta de alternativa dadas aos moradores, as tentativas de corrupção das lideranças, as péssimas condições dos alojamentos provisórios, descritos por eles como "campos de concentração", os cortes de água e luz, os tratores e os caminhões de mudança que rondavam os barracos "feito urubus", a pressão psicológica, a saída de cena da Prefeitura - que deixou as empreiteiras negociarem diretamente com a população -, enfim, toda sorte de violência e terror praticados contra os favelados e de ilegalidades cometidas pela Prefeitura durante a remoção. (FIX, 2007, p. 100).

Como consta na obra "Parceiros da Exclusão" de Mariana Fix (2012), no dia 10 de janeiro de 1996, o prefeito de São Paulo à época, o Sr. Paulo Maluf foi até a cerimônia de inauguração do primeiro trecho da Avenida Água Espraiada e discursou desta forma:

Quero agradecer também aos favelados que moravam aqui. Não teve nenhum problema. Ninguém tirou ninguém à força, não. [...] Eu agradeço, porque Deus está me vendo [...] Deus um dia há de ser misericordioso. Quando a gente chegar lá, Deus vai dizer para a gente: olha, eu vi você lá no Água Espraiada, você melhorou a vida daquele povão. Vai ficar uns dez minutos no purgatório e pode ir para o céu. (MALUF 1996 apud FIX 2012, p. 50).


Figura 6:
Família dos últimos moradores da favela do Jardim Edtih entre as avenidas Engenheiro Luís Carlos Berrini e Jornalista Roberto Marinho. Fonte: Marcelo Min.

Na cidade há mais mistérios entre um discurso político e seus atos visíveis e invisíveis, do que sonha a nossa vã percepção. No mais, podemos afirmar que as operações urbanas ocorridas em São Paulo, através das parcerias público-privadas, visando o lucro e a acumulação do mercado imobiliário, aparentando melhorias na circulação viária, e no lay out espacial urbano, nos dando a impressão de "enriquecimento" nas delimitações de uma determinada área urbana, também nos dá a impressão de que a pobreza vem diminuindo, porém, apenas esconde o fato de que ela está sendo deslocada para outro canto da cidade, ou para uma "subcidade".


Figura 7
: Fonte - Dálcio (retirada do blog "Deve haver algum lugar..., 2012).

4.1. Os grandes empreendedores (construtores, incorporadores, proprietários fundiários, empresas privadas, bancos, etc) e o papel do Estado diante da segregação social na metrópole;

No espaço urbano, o papel dos agentes sociais é de fundamental importância, segundo Lobato Corrêa (1989, p. 12):

A complexidade da ação dos agentes sociais inclui práticas que levam a um constante processo de reorganização espacial que se faz via incorporação de novas áreas do espaço urbano, densificação do uso do solo, deterioração de certas áreas, renovação urbana, relocação diferenciada da infra-estrutura e mudança, coercitiva ou não, do conteúdo social e econômico de determinadas áreas da cidade.

Os agentes sociais presentes nas figuras humanas e institucionais das cidades são os agentes modeladores do espaço urbano, e de acordo com a forma, função, espaço e tempo, promovem e instituem os centros, as novas centralidades ou subcentros, as áreas periféricas, os subúrbios, etc.. Claro que sempre de acordo com o modelo econômico vigente, que em grande parte determina a atração e repulsão dos aglomerados urbanos.

Mas quem são esses agentes sociais? Segundo Lobato Corrêa (1989, p. 12): "a)Os proprietários dos meios de produção, sobretudo os grandes industriais; b) Os proprietários fundiários; c) Os promotores imobiliários; d) O Estado; e) Os grupos sociais excluídos.".

Segundo Lobato Corrêa (1989), o espaço urbano é fragmentado, articulado e um reflexo da sociedade. Fragmentado através do uso deste espaço pelos seus diversos agentes sociais ou por cada pessoa em particular. Articulado por forças não muito visíveis pela ação normalmente dos agentes majoritários do espaço urbano (o Estado, proprietários dos meios de produção, promotores imobiliários, etc.), se constituindo a cidade num reflexo da sociedade.

Como vivemos numa sociedade capitalista periférica, o que se reflete na paisagem urbana é uma cidade estratificada em classes com características profundamente desiguais, tanto em relações de renda, como em relações de direitos, que se configuram nas relações de poder, e se refletem nas paisagens das grandes cidades brasileiras.

A industrialização como o processo indutor da urbanização na metrópole paulista, por muito tempo configurou este território, promovendo o seu adensamento, influindo na estrutura viária e na aglomeração urbana de seus municípios e influenciando com bastante força nas relações de poder entre o Estado e o cidadão comum. Hoje com a reestruturação produtiva e o enfraquecimento do modelo fordista de produção fabril, que ocasionou em parte, a deslocalização industrial de importantes empresas e setores produtivos para outras cidades brasileiras, as indústrias acabaram perdendo sua força relativa no que diz respeito à produção do espaço urbano na RMSP24, e com a grande financeirização do capital, empregada com a consolidação da mundialização financeira neoliberal a partir de fins do século XX e início do século XXI, outros atores começam ganhar mais força dentro do espaço urbano, como os promotores imobiliários, por exemplo.

Segundo Lobato Corrêa, os promotores imobiliários na verdade são: um conjunto de atores que fazem parte desde o projeto arquitetônico, o processo de financiamento e produção das obras, até a venda dos imóveis para o cliente final da mercadoria, e se dão na forma de proprietários fundiários, incorporadores, financiadores, consultores, grandes construtoras, fornecedores de materiais para a construção, corpo técnico-científico, vendedores e representantes comerciais, e atuam normalmente desta forma:

a) Incorporação, que é a operação-chave da promoção imobiliária; o incorporador realiza a gestão do capital-dinheiro na fase de sua transformação em mercadoria [...];

b) Financiamento, ou seja, a partir da formação de recursos monetários provenientes de pessoas físicas e jurídicas, verifica-se de acordo com o incorporador, o investimento visando à compra do terreno e à construção do imóvel;

c) Estudo técnico, realizado por economistas e arquitetos, visando verificar a viabilidade técnica da obra dentro de parâmetros definidos anteriormente pelo incorporador e à luz do código de obras;

d) Construção ou produção física do imóvel, que se verifica pela atuação de firmas especializadas nas mais diversas etapas do processo produtivo; [...]

e) Comercialização ou transformação do capital-mercadoria em capital-dinheiro, agora acrescido de lucros [...]; (CORRÊA, 1989, pp. 19/20).

Todavia, é importante lembrar que, embora, a produção imobiliária de alto valor agregado envolva todas essas operações distintas, não significa necessariamente que, haja um agente diferente ou específico para cada ação, ou seja, muitas vezes, (e muito mais comum nos dias atuais), poder haver uma única empresa, ou um número reduzido de empresas que controlam todo o processo, desde a concepção dos projetos através da incorporação, até a construção e comercialização dos imóveis, já que o capitalismo financeiro têm se tornado cada vez mais tendencialmente monopolista, onde uma grande construtora possivelmente além de se especializar na produção de grandes empreendimentos, ela ainda pode atuar nos mais diversos setores imobiliários, tanto de materiais de construção ou até mesmo, nas empresas financiadoras dos imóveis construídos.

Segundo Lobato Corrêa (1989), não há interesse das grandes incorporadoras e empresas do ramo de construção civil que seguem o padrão do mercado capitalista de produção em construir empreendimentos populares, por conta mesmo do baixo poder aquisitivo das famílias de baixa renda, o que pode ocasionar um baixo o lucro, ou até mesmo, o prejuízo devido às possíveis inadimplências. De acordo com Lobato Corrêa, os promotores imobiliários buscam: "a) Dirigir-se, em primeiro lugar, à produção de residências para satisfazer a demanda solvável; e b) obter ajuda do Estado no sentido de tornar solvável a produção de residências para satisfazer a demanda não-solvável". (CORRÊA, 1989, p. 22).

Assim sendo, os promotores imobiliários enquanto protagonizam a produção de imóveis para as classes médias e altas da cidade em áreas nobres ou enobrecendo certas áreas para viabilizar os seus projetos de acumulação de capital, quando é para a construção de empreendimentos populares, atuam como coadjuvantes, deixando que o Estado assuma o papel principal.

A obrigação de oferecer habitação àqueles que não têm condições econômicas de pagar por uma, passa progressivamente a ser do Estado. Este, contraditoriamente, ao mesmo tempo que reconhece essa obrigação como sua, dá provas concretas de que é incapaz de, desincumbir-se satisfatoriamente dela. (VILLAÇA, s.d., p. 4).

A produção para a demanda solvável é que permite aos promotores alcançarem seu desejado lucro. Corrêa (1989, p. 23) coloca que a ação dos promotores imobiliários se faz correlacionada a:

a) o preço elevado da terra e alto status do bairro; b) acessibilidade, eficiência e segurança dos meios de transporte; c) amenidades naturais ou socialmente produzidas; e d) esgotamento dos terrenos para construção e as condições físicas dos imóveis anteriormente produzidos [...].

Nos bairros nobres já existe um paradigma estabelecido que possibilita gerar um maior lucro aos empreendedores, porém, a moradia além de ser um elemento material que requer um grande tempo para sua construção (embora as técnicas de produção estejam cada vez mais sofisticadas nos dias atuais), é também uma mercadoria que exige uma dispendiosa quantia de capital para a sua produção e uma quantia de dinheiro muito alta para a sua aquisição, o que dificilmente possibilita a sua compra à vista, tendo muitas vezes que ser financiada por longos períodos para o seu pagamento, fazendo com que o lucro para os promotores imobiliários normalmente venham a longo prazo. Para os empreendedores imobiliários a solução muitas vezes se dá com:

[...] o artifício do financiamento. Este envolve um novo intermediário que surge entre a produção e o consumo e que faz com que o capitalista produtor receba mais rapidamente o capital inicialmente investido, devidamente valorizado. Pelo financiamento, adianta-se esse capital. (VILLAÇA, s.d., p. 20).

Através do financiamento das obras junto aos bancos, torna-se possível aos promotores imobiliários, obterem parte de seus lucros adiantados. Muitas vezes, os próprios empreendedores possuem suas empresas de finanças que podem atuar no financiamento da dívida de quem vai adquirir o imóvel, e assim, se por acaso houver inadimplência por parte do comprador, a empresa ainda pode retomar o imóvel.

A moradia também é uma mercadoria durável que demora muito tempo para se deteriorar, além de ocupar grandes parcelas do solo urbano, tornando em certa medida, escasso ou raro encontrar parcelas disponíveis de terras para a construção de novos empreendimentos em áreas nobres, o que induz aos promotores ter que procurar novas áreas para a realização de novos empreendimentos. Daí se tem um dos motivos para novos processos de gentrificações.

Estas características em conjunto tendem a valorizar diferencialmente certas áreas da cidade, que se tornam alvo da ação maciça dos promotores imobiliários: são as áreas nobres, criadas e recriadas segundo os interesses dos promotores, que se valem de maciça propaganda. Assim, de um lado, verifica-se a manutenção de bairros de status, que continuam a ser atrativos ao capital imobiliário e, de outro, a criação de novas áreas nobres em razão do esgotamento de áreas disponíveis em outros setores valorizados do espaço urbano: os novos bairros são efetivamente criados ou resultam da transformação da imagem de bairros antigos que, dispondo de alguns atrativos, tornam-se de status elevado. (CORRÊA, 1989, p. 23).

A partir do momento em que se solidificam os Centros Históricos das grandes cidades brasileiras, torna-se emergencial para o capital imobiliário, ter que encontrar ou transformar em novas centralidades, as outras áreas da cidade, para enfim, continuar o processo de reprodução do ciclo do capital.

A condição de raridade do espaço manifesta-se em áreas precisas, na metrópole, no centro, ou nas proximidades do centro. O fenômeno da raridade se concretiza pela articulação de três elementos indissociáveis: a existência (e realização) da propriedade privada do solo urbano, a centralidade do capital e das novas atividades econômicas [...], e o grau de ocupação [...] da área no conjunto do espaço da metrópole. (CARLOS, et al, 2015, p. 30).

A raridade do espaço se constitui no fato da existência de um espaço urbano já construído e transformado, impedindo ou dificultando novas edificações. Também se manifesta no eixo da centralização do capital em determinadas áreas que passa a ser investido em outros locais da cidade, se constituindo como novas centralidades. Um bom exemplo disso já foi abordado neste trabalho que é a região da Nova Faria Lima, que tem se tornado junto com a região da Avenida Paulista, no Centro do capital financeiro. Os investimentos nessa nova centralidade tornam-se uma necessidade dos grandes grupos nacionais e internacionais financeiros, haja vista que o tradicional centro do capital em São Paulo na região da Avenida Paulista já se encontrava densamente ocupado.

O próprio centro da cidade sempre se deslocou na mesma direção de crescimento das camadas de mais alta renda. No começo do século, o centro de São Paulo se localizava no chamado "Triângulo" (Ruas 15 de Novembro, Direita e São Bento). Na década de 30 caminhando no sentido do quadrante sudoeste, ele pulou o Vale do Anhangabaú e ocupou a região da Rua Barão de Itapetininga e da Avenida Ipiranga. Na década de 60, já de forma bastante pulverizada, o centro ocupou uma grande região entre as Avenidas Paulista e Faria Lima na qual, inclusive, surgiram alguns shopping centers. Estes, juntamente com os hipermercados, se expandiram na década de 70 e a absoluta maioria deles se encontra no quadrante sudoeste. Nesse deslocamento, quanto mais perto o centro fica para a classe dominante, mais longe fica para os dominados. (VILLAÇA, s.d, p. 43).

Segundo Villaça (s.d.), o Centro de São Paulo vai se deslocando e se expandindo (daí a expressão "Centro Expandido"), de acordo com o uso preferencial das camadas de alta renda em detrimento das demais. Este deslocamento tende a segregar as classes na medida em que o Centro Histórico por ser o local de atratividade geral, concentra aglomerações da maioria das pessoas que habitam a cidade, inclusive e principalmente as camadas de baixa renda. Então as classes mais abastadas passam a "desertar" o Centro Histórico e criar o seu próprio Centro. Segundo Villaça (2012): A AGCCAR25 [...] é fruto do esforço das classes acima da média para produzir seu próprio centro, na sua própria área de concentração e, assim, minimizar seus deslocamentos entre seus locais de moradia, trabalho, comércio e serviços. (Destaque do autor).

Para Villaça (2012), São Paulo passa então a possuir dois centros, o Centro Histórico que atrai várias camadas da população em geral, e o Centro Novo, que pertence às classes mais ricas que tende a ser um local exclusivo do que o autor define como área de concentração de camadas de alta renda.

Já segundo Carlos, não é o movimento das camadas mais ricas que definem ou promovem a criação de novos centros ou centralidades, e sim, a expansão do capitalismo que conduz esse processo. Carlos et al (2015, p. 15) - "A extensão do capitalismo tomou o espaço, fez dele sua condição de produção, primeiro como recurso, depois como força produtiva, e finalmente como mercadoria reprodutível, através do setor imobiliário". Segundo a autora, é o capital, que passando por suas diversas fases, se apropria do espaço urbano com o uso do solo para a instalação de seus meios produtivos, pela especulação imobiliária através dos vazios urbanos e agora na atualidade, o solo urbano se torna além de um elemento condicionante para a reprodução do capital, também se metamorfoseia em mercadoria, fruto da produção e da reprodução da acumulação do mercado capitalista.

Diante dos pontos de vista dos dois autores (VILLAÇA, 2012 e CARLOS, 2015), as nossas perguntas são: as forças de transformação espacial nas cidades se originam através da vontade das camadas de alta renda para permanecer ou desertar certas áreas do espaço urbano, e com isso elas vão atraindo o investimento público do Estado nesses novos centros, se tornando também esses novos centros, no foco da iniciativa privada para estabelecer como área prioritária de investimentos através da parceria público-privada?

Ou é através da iniciativa privada que ocorre a transformação espacial da cidade, que ao dar o primeiro passo na incorporação de seus empreendimentos, induz e/ou obriga o Estado a intervir nessas áreas selecionadas a investir em melhorias de infraestrutura e circulação viária, que então atrairá as camadas de alta renda para ocupar determinadas áreas nobres ou enobrecidas da cidade?

Analisando essas duas questões, podemos afirmar que as determinações das conformações e transformações espaciais é uma questão temporal e/ou escalar, no sentido em que, de acordo com Villaça (2012), o Centro de São Paulo foi se deslocando de acordo com a vontade de sua burguesia especialmente na primeira e meados da segunda metade do século XX, onde essa burguesia vai assim redesenhando o Centro da metrópole, porém, no momento atual, a metrópole assumindo as dimensões territoriais, econômicas e políticas, adentrando na cena global do capital financeiro, essas determinações já não passam a ser mais das classes mais altas, e sim do capital financeiro que vai conformando a metrópole visando a acumulação do capital.

Caminhando na direção de nossas pesquisas, podemos afirmar segundo Lobato Corrêa, que o Estado no espaço urbano é responsável:

a) Direito de desapropriação e precedência na compra de terras; b) regulamentação do uso do solo; c) controle e limitação dos preços da terra; d) limitação da superfície da terra de que cada um pode se apropriar: e) impostos fundiários e imobiliários que podem variar segundo a dimensão, uso da terra e localização; f) taxação de terrenos livres, levando a uma utilização mais completa do espaço urbano; g) mobilização de reservas fundiárias públicas, afetando o preço da terra e orientando espacialmente a ocupação do espaço; h) investimento público na produção do espaço, através de obras de drenagem, desmontes, aterros e implantações da infra-estrutura; i) organização de mecanismos de crédito à habitação; e j) pesquisas, operações-testes sobre materiais e procedimentos de construção, bem como o controle de produção e do mercado deste material." (CORRÊA, 1989, p. 25).

Segundo Corrêa (1989), embora o Estado possua todo esse leque de ações, como regulador e regulamentador do espaço, não significa que ele seja um elemento neutro dentro da sociedade capitalista que proverá de maneira justa e igualitária todas as condições de direitos para todos os segmentos sociais da cidade. Na verdade, o Estado é um elemento que reforça a segregação de classes através mesmo de suas leis.

Tendo em vista estes propósitos, o Estado capitalista cria mecanismos que levam à segregação residencial e à sua ratificação. Assim, os diferenciais de imposto territorial e predial, são um forte fator discriminante, afetando o preço da terra e dos imóveis e, como consequência incidindo na segregação social: os grupos de renda mais elevada residem em imóveis mais caros localizados em bairros onde o preço da terra é mais elevado. (CORRÊA, 1989, p. 26).

Dessa forma, os imóveis localizados em áreas nobres, onde valor do solo urbano é bem maior, permite ao Estado recolher mais fundos do Imposto Predial (IPTU) nesses espaços valorizados, onde ocorre também, a valorização do preço dos imóveis situados nesses locais, o que possibilita o aumento do valor do patrimônio dos moradores de alta renda. Assim, os aluguéis também se tornam muito mais onerosos, dificultando a fixação de porções de pessoas de médio à baixo piso salarial para a locação de residências nessas áreas. Os comércios tendem a encarecer os produtos que vendem, pois muitas vezes não trabalham com sedes próprias, assim como o lazer em cafés, casas de espetáculos e bares noturnos tendem a ser mais caros, portanto seletivos, segregando seus frequentadores. Dessa forma, o Estado reforça a segregação, na medida em que suas leis e seu aparelhamento não contemplam a população em sua totalidade.

A legislação exclui a maioria da população que vive em péssimas condições habitacionais, fora do alcance das regulamentações urbanísticas e edilícias. Nossas cidades não previram a localização dos mais pobres, que ocuparam áreas de risco, de proteção ambiental, de preços fundiários depreciados, com a anuência velada das autoridades governamentais. (VILLAÇA, 2012, p. 225).

A legislação também se constitui num empecilho para esse problema, pois não abrange a realidade dessas frações da população urbana, pois visa a adequação da cidade às leis de mercado, que costumam ser tendencialmente excludentes, e a partir disso, a população mais pobre encontra outras alternativas para se estabelecer na cidade, ocupando os espaços da "subcidade", onde de alguma forma, essas ocupações seguem a lógica e caminham em concordância com as leis do mercado, que embora estes usem de sofisticações sistemáticas para produzir e consolidar o espaço urbano, também usam de artifícios arcaicos para a geração, produção e reprodução da acumulação, a partir do momento em que nas periferias, há uma grande concentração do exército de força de trabalho que garante aí, uma grande disponibilidade de mão-de- obra barata.

Em estudos realizados ainda no final da década de 1980, Maricato (1995) constatou que:

[...] 49,3 % das favelas de São Paulo tem alguma parte localizada em beira de córrego, 32,2% estão sujeitas a enchentes, 29,3% localizam-se em terrenos com declividade acentuada, 24,2 % estão em terrenos que apresentam erosão acentuada e 0,9 % estão em terrenos de depósitos de lixo ou aterro sanitário. Do total, 65 % estão situadas em área pública e 9 % em terrenos de propriedade mista, ou seja, pública e privada. Esses dados são de 1987 quando o número de favelas era de aproximadamente 1600 núcleos onde moravam aproximadamente 8,0 % da população. Em 1993 essa proporção é de 19,8%". (MARICATO, 1995, p. 31).

O que podemos notar de importante nesta citação é que, além dos problemas decorrentes característicos das típicas ocupações irregulares, é que esse tipo de ocupação vem aumentando exponencialmente em períodos relativamente curtos. Quando Maricato afirma que em 1987 as ocupações irregulares causando o adensando das favelas correspondiam a 8% da população do município de São Paulo, vemos esse número crescer para 19,8% num período de apenas seis anos, mais que dobrando o número de pessoas em precárias condições, considerando que em seis anos, a população de São Paulo também cresceu em números absolutos.

MARICATO (1995) afirma que o Estado e todo o seu aparelhamento, possuindo suas rígidas legislações de ocupação e uso do solo urbano, não se faz valer de suas regras estabelecidas quando não há motivação, interesse, ou mesmo, uma solução plausível para a problemática das ocupações irregulares. "A ocupação é consentida inclusive em áreas de proteção ambiental, mas raramente em áreas valorizadas pelo mercado imobiliário calcado em relações capitalistas." - Maricato (1995, p. 5).

Como o Estado tende a caminhar na direção da conformação da cidade de acordo com as leis do mercado capitalista imobiliário e como o poder público, segundo Villaça (s.d) é incapaz de solucionar o problema habitacional, as ocupações irregulares em áreas impróprias da cidade, que podem vir a acarretar diversos problemas e riscos, como a ocupação nas encostas de morros íngremes, bem como a contaminação ambiental em áreas de mananciais que servem para abastecer toda a população da cidade, é permitida com o mínimo de intervenção do Estado, já que as áreas de expansão das favelas normalmente vão ficando cada vez mais distantes das áreas valorizadas da cidade. Segundo Maricato (1995), este é um ponto onde o Estado é classificado pela autora como "contraventor de si mesmo", uma vez que ele mesmo cria as regras, às quais ele não as cumpre.

Podemos afirmar diante disso, que a sociedade excluída é marginalizada e passa como se ela não existisse oficialmente, pois ela não se enquadra nos padrões do mercado e das normas instituídas e atestadas pelo poder estatal.

Enquanto os imóveis não têm valor como mercadoria, ou têm valor irrisório, a ocupação ilegal se desenvolve sem interferências do Estado. A partir do momento em que os imóveis adquirem valor de mercado (hegemônico) por sua localização, as relações passam a ser regidas pela legislação e pelo direito oficial. É o que se depreende dos dados históricos e da experiência empírica atual. A lei do mercado é mais efetiva do que a norma legal. (MARICATO, 1995, p. 12).

Quando as favelas ocorrem em áreas planas e/ou próximas às áreas centrais, ou num ponto da cidade em que permite a revitalização por conta de uma geomorfologia privilegiada, como aconteceu no Jardim Edith, e como vem ocorrendo no núcleo Gamboa em Santo André, assim como em áreas onde ocorrem reintegrações de posse, onde os proprietários fundiários, empreendedores imobiliários e o Estado, (com o auxílio de sua máquina burocrática e de sua força policial), promovem um massacre psicológico e/ou físico para com os ocupantes destes locais, a intervenção do poder público vem à tona, usando a força da lei que não usava quando não era conveniente, e a força de suas milícias, no caso de haver resistência por parte dos moradores dessa possível área privilegiada para investimentos.

A figura 8 é da Favela Gamboa, situada na Vila Assunção, bairro que fica nas proximidades do Centro do município de Santo André:


Figura 8:
Muro que divide o Parque Central e a favela Gamboa. Fonte: Mencosini, 2013.

Em parceria com a prefeitura, a remoção vem ocorrendo gradativamente, realocando os moradores da favela em outros conjuntos habitacionais e, deliberadamente, expulsando-os do centro, objetivando os interesses de higienização e valorização máxima das áreas de interesse do capital imobiliário. (MENCOSINI, 2014, p. 62).

De acordo com Mencosini (2014), a favela do Núcleo Gamboa começou a se formar no final dos anos 1970, onde o poder público permitiu a ocupação da área que se consolidou por mais de duas décadas, porém, com a instalação do Parque Central, no ano de 2006, e com a revalorização da área, boa parte dos moradores deste núcleo teve que ser remanejada.

A preocupação e atuação do Estado nas favelas tem sido, ao longo dos anos, marcada por duas propostas básicas: erradicação da favela, através da remoção dos moradores e a liberação da área antes ocupada, para outros usos, com o objetivo de extirpar estes aglomerados, que sem dúvida interferem no preço da terra das imediações. A existência das favelas desvaloriza a terra das proximidades. Ao remover a favela, remove-se um dos obstáculos para aumentar a renda da terra, ao mesmo tempo que se leva "para mais longe" os seus moradores e sua pobreza. (RODRIGUES, 2006, apud MENCOSINI, p. 62).


Figura 9:
Desapropriação da favela Gamboa em ritmo acelerado. Fonte: Mencosini, 2013.

Dessa forma, tendo em vista que a partir do momento em que a cidade vai se tornando num "polo magnetizador" que atrai as pessoas dos mais variados lugares por concentrar as atividades econômicas de maior importância, contraditoriamente vai também, afastando-as.

4.2. São Paulo: cidade global?

As metrópoles globais de um modo geral obedecem a uma lógica padronizada que é a lógica do capital financeiro mundial, ou a mundialização financeira26, porém, apesar desta padronização na escala global, as metrópoles tomam a forma peculiar do processo histórico de seus países de origem ao longo de seus respectivos desenvolvimentos econômicos e sociais, culminando na expansão do urbano, bem como também, no processo histórico, econômico e social de suas respectivas regiões ou arredores. Ou seja, apesar do formato de padrão internacional de metropolização e/ou urbanização, as metrópoles globais mantêm suas características locais e acompanham também, o desenvolvimento histórico de seus respectivos países. Na periferia do capital, as metrópoles se constituem como verdadeiros enclaves ou "aberrações", se comparadas com as demais cidades dentro de seus respectivos países, ou até mesmo, com os seus arredores regionais.

As metrópoles contemporâneas são os maiores objetos culturais jamais construídos pelo homem. Nas últimas décadas - não importa onde se situem -, elas trabalham em compasso com o ritmo do mundo, na medida em que a realidade da globalização se impõe sobre o processo secular de internacionalização. Desse modo, essas metrópoles funcionam e evoluem segundo parâmetros globais. Porém, elas têm especificidades, que se devem à história do país onde se encontram e à sua própria história local. O mundo e o lugar, intermediados pela formação socioeconômica e territorial [...]. (SANTOS, 2009, pp. 11/12).

As cidades globais se constituem como os maiores centros do capital financeiro mundial, onde se situam as sedes das mais importantes empresas do planeta, e se constituem como o "quartel general" do mundo corporativo financeiro nacional e internacional, impondo um modelo padrão instituído pelos centros financeiros do mundo corporativo central, promovendo um espaço urbano cercado por símbolos:

[...] as Torres Gêmeas são emblemáticas de um modelo de desenvolvimento urbano que confere à valorização imobiliária o caráter virtuoso de "revitalizar" áreas tidas como deterioradas ou degradadas. Foram a peça chave da operação de renovação ao sul da ilha de Manhattan27 [...] (FIX, 2007, p. 76).


Figura 10
: Vista frontal da ilha de Manhattan. Fonte: Hellowallpaper.

São Paulo é uma metrópole global que atua nos mais variados setores econômicos e financeiros, e centraliza as maiores atividades produtivas do país em todas as escalas geográficas possíveis, que segundo Fix (2007, p. 166), "se constitui numa metrópole semiperiférica que se quer global" - pois analisando a paisagem paulistana em sua totalidade, o termo "se quer global" utilizado pela autora nos indica que esta cidade não é de fato global em toda a sua extensão, pois percorrendo o seu perímetro em direção à periferia, encontraremos enormes disparidades em seu formato espacial, com áreas de altíssimo padrão, e áreas extremamente precarizadas.

Todavia, essas disparidades têm relações diretas com o processo histórico do desenvolvimento econômico em todas as escalas, (inclusive em escala mundial), que através de sua formação social e de seu desenvolvimento, chegou naquilo que resultou em uma metrópole global com ares de países desenvolvidos em alguns pontos da cidade, e áreas de extrema pauperização comparável a alguns dos países mais pobres do mundo. A cidade São Paulo passa a se fundamentar segundo Fix (2007), na financeirização de sua economia, que culminou também, na financeirização de seu espaço geográfico.

Quando o "mito do desenvolvimento" parece ultrapassado, pela inviabilização da superação do subdesenvolvimento, quando a construção nacional na semiperiferia do capitalismo é interrompida, ele renasce na forma do "mito das cidades globais", das cidades competitivas, das cidades de "classe mundial" ou ainda das cidades que dão certo. Ou seja, esse discurso acompanha um movimento real de transformação. Um movimento que tem nos enclaves globais, cidades dentro da cidade [...] Esses enclaves são uma figuração urbana dessas fragmentações. (FIX, 2007, p. 166).

A cidade de São Paulo do quadrante sudoeste não é a mesma cidade de São Paulo dos extremos da zona leste e sul do município, sem contar que alguns prédios executivos como o CENU e dos condomínios residenciais de luxo se assemelham cada vez mais como uma cidade dentro da cidade, ou uma cidade à parte da mesma, se constituindo muitas vezes como segundo Fix (2007) define: "cidades em miniatura".

Como Caetano Veloso afirma em sua música: "Da força da grana que ergue e destrói coisas belas" - Sampa é uma das canções brasileiras que mais se aproximam da descrição do que é a cidade São Paulo, onde o poder de transformação do espaço está intimamente ligado não só ao poder de transformação do homem, mas sim também, um poder de transformação humana potencializada pelo poder econômico com grande atividade dos grupos majoritários do capital financeiro nacional e mundial, mediada pelo Estado, transformando o espaço ao sabor da acumulação financeira capitalista global. Ou seja, em São Paulo, a paisagem se modifica constantemente através dos agentes transformadores do espaço: construindo e reconstruindo obras e empreendimentos, alargando ou duplicando avenidas (donde muitas vezes se faz necessário desocupar algumas áreas promovendo a remoção e consequentemente, a "expulsão" de antigos moradores), destruição de monumentos para a construção de shopping centers, ou lojas de comércio de alto padrão, etc..

A cidade de São Paulo é segundo Fix (2007), apesar de sua "vocação" global, nada mais do que uma metrópole facilitadora da penetração do capital estrangeiro nas suas várias formas, onde as suas feições de cidade global e centro financeiro são caracterizadas apenas em alguns pontos da cidade.

Essas dessemelhanças se devem em grande parte ao próprio modo de desenvolvimento econômico-industrial brasileiro como um dos países retardatários do capitalismo industrial, que almejando seu crescimento econômico, adotou uma forma de urbanização que tendeu a crescer de forma vertiginosamente rápida, expandindo seus "tentáculos" para todos os lados e para todas as direções. Maricato (1995, p.15) "a 'modernização do arcaico' que é simultânea à 'arcaização do moderno', constitui uma marca do capitalismo periférico que acaba por lhe conferir características próprias".

Muitos autores usam a expressão: "Capitalismo Ornitorrinco" creditada ao economista Francisco de Oliveira para explicar o fenômeno da urbanização brasileira, da qual a forma de desenvolvimento econômico aplicado no Brasil ao sabor das dinâmicas econômicas externas vai tomando a forma de um ser indefinido em praticamente todas as esferas: sejam elas políticas, econômicas ou sociais. Esse ser sem forma definida, tal qual um "Frankenstein", se reflete na paisagem paulistana, pois a renda e as riquezas se concentram nas mãos de uma minoria que se constitui na classe social que se situa ao topo da pirâmide socioeconômica.

Portanto, a cidade global passa a ser um fator meramente ideológico, pois o desenvolvimento da metrópole carrega em si, sequelas e desdobramentos de seu crescimento desigual. Desigualdades estas que se revelam em sua paisagem, como podemos ver nas figuras 11 e 12.


Figura 11
: Vista lateral às margens do Rio Pinheiros. Fonte: Corretor Vip.


Figura 12
: Parque Santa Madalena (Sapopemba, Zona Leste). Fonte: Estadão28.

São os movimentos desiguais do modo de produção capitalista, agora sob a égide do capital financeiro, que ajudam a promover tais disparidades na paisagem urbana, que se torna cada vez menos global, e cada vez mais fragmentada e territorializada.

4.3. O que seria a territorialidade do capital imobiliário?

O conceito de territorialidade do capital imobiliário nas cidades capitalistas sugere que exista uma territorialização do espaço urbano através da consolidação da propriedade privada, prevalecendo esta sobre o direito à cidade de uma grande parcela da população.

[...] a cidade e a realidade urbana dependem do valor de uso. O valor de troca e a generalização da mercadoria pela industrialização tendem a destruir, ao subordiná-las a si, a cidade e a realidade urbana, refúgio do valor de uso, embriões de uma virtual predominância e de uma revalorização do uso. (LEFEBVRE, 2011, p. 14).

Assim, os grandes empreendedores através da consolidação mercadológica da cidade, tornando a mesma em uma mercadoria solvável, através do processo de valorização e revalorização do espaço urbano, delimitam territórios, sendo que os mesmos expressam relações de poder na sociedade. Seria como se determinadas áreas se tornassem territórios pertencentes a uma determinada classe social com poder aquisitivo disponível para adquirir e usufruir de uma parcela local da cidade, onde parece estar proibido (não no sentido jurídico da palavra, mas no sentido figurado), tanto para os trabalhadores de baixa renda, quanto para o exército de mão-de-obra e moradores de rua, de frequentarem ou de permanecerem em certos locais da cidade.

Desta forma, os mais pobres, que eventualmente circulam nestas áreas de alto padrão, não se sentem pertencentes a esses locais, possuindo um sentimento de "estranheza" ao ver as grandes mansões e edifícios residenciais luxuosos com seus sofisticados planejamentos e padrões arquitetônicos e as ruas com suas belas formas geométricas de circulação quase sempre bem arborizadas e os grandes e lindos jardins, dando um aspecto harmônico quase "mágico" à paisagem destes locais. Normalmente, além de se sentirem deslocadas frente a essas paisagens, estas pessoas também se sentem "expulsas" das mesmas, embora juridicamente não há nada na lei que as impeçam de transitarem nestes locais.

Para nós, este é um dos pontos que definem o conceito de territorialidade do capital imobiliário, ou seja, uma territorialidade que implica numa conformação territorial de classes. Lefbvre, (2011, p. 32), sobre o urbanismo dos promotores de vendas:

Eles o concebem e realizam, sem nada ocultar, para o mercado, visando o lucro. O fato novo, recente, é que eles não vendem mais uma moradia ou um imóvel, mas sim urbanismo. Com ou sem ideologia, o urbanismo torna-se valor de troca. O projeto dos promotores de vendas se apresenta como ocasião e local privilegiados: lugar de felicidade numa vida cotidiana miraculosa e maravilhosamente transformada. (destaque do autor).

Os promotores de vendas, não só comercializam imóveis, como vendem uma ideia ou um ideal de urbanização agregada ao estilo de vida cotidiana das classes médias e altas, onde estes imóveis não são mais simplesmente imóveis contendo um valor de uso para quem vai morar, e sim um valor de troca que gera grande lucro para essa imensa engrenagem que envolve a produção imobiliária.

Um imóvel já não é mais adquirido isoladamente e sim, acompanhado de um "grande pacote" que envolve desde a moradia, como também todo o lay out espacial da área em que se localiza. Através desse novo modelo de urbanização idealizada pelos promotores de vendas, se tornando em um ideal de urbanização e de uma vida ideal, o processo de "gentrificação" propicia uma concentração de riquezas promovendo o deslocamento através do processo quase "natural" - para não dizer, socialmente darwinista29 -, para outras áreas, as pessoas de renda mais baixa.

Carlos, Volochko e Alvarez et al (2015, p. 61) - "[...] no século XXI, o que se vende no mercado como momento necessário do movimento da acumulação não é a cidade, mas o urbano [...]" - assim, através de vários sinônimos ou adjetivos no decorrer das décadas, até a "gourmetização"30 dos dias atuais, temos um modelo ou um modo de vida carregado de simbologias e rituais que fazem parte do estilo de vida das grandes cidades.

Ser urbano cada vez mais, não é ser apenas morador de uma grande cidade, mas sim, praticar os cada vez mais comuns rituais da urbanidade moderna e adotá-los como modo de vida. Dessa forma, toda área de alto padrão que se preze, não basta apenas conter moradias com padrões arquitetônicos sofisticados, tem que haver em suas proximidades, shopping centers, lojas de comércio sofisticadas e segmentadas, academias, institutos de beleza, pet shops, livrarias, cafés, restaurantes com iguarias de todos os tipos para satisfazer aos mais requintados paladares, etc.. Assim, um morador urbano de alta renda, na expressão da palavra, usufrui de todos esses artifícios de forma rotineira ou sistemática como se fossem meios necessários básicos para a sua vida, que cada vez mais se encontra calcada num modelo de alto padrão e num estilo high society e high tech31de se viver.

Pádua (2015, p. 152) - "[...] a qualidade de vida é um produto explorado no mercado imobiliário e torna-se uma nova raridade, indicando que quanto maior poder de compra, maior qualidade de vida." - com a crescente mercantilização do urbano nos espaços valorizados, a qualidade de vida está intimamente relacionada com o poder aquisitivo, sendo essa qualidade de vida uma nova mercadoria ou um "brinde dentro do pacote" do que podemos classificar como um alto urbanismo. Morar perto do "verde", se torna uma opção almejada de requinte. Além de áreas verdes, nesses locais também podem conter quadras poliesportivas, piscinas, academias de ginástica, salões de beleza, playground, etc., tudo isso e mais um pouco é o que é oferecido nos edifícios luxuosos, condomínios fechados e áreas residenciais nobres sob um forte esquema de segurança privada.

[...] a vida proposta pelos novos equipamentos (condomínios verticais, fechados e espaços de consumo), que ideologicamente propiciam uma "qualidade de vida" urbana, tampouco realizam uma apropriação concreta da cidade, pois se fecham à cidade, colocando a autossegregação como uma solução dos problemas urbanos (violência, trânsito, falta de lazer, escassez de espaços verdes, etc.) naturalizando a segregação. (PÁDUA, 2015, p. 97)

Os condomínios de alto padrão, por serem espaços fechados ao cotidiano da cidade, faz com que seus moradores não precisem sair deles para exercerem suas atividades cotidianas, ou de poderem desfrutar de seus momentos de ócio. "Os condomínios fechados simulam a cidade, pois dentro deles há [...] uma série de elementos que simulam espaços públicos e serviços característicos da cidade, mas que se realizam negando a cidade [...]" (PÁDUA, 2015, p. 152).

Os condomínios fechados são na realidade, verdadeiros enclaves nas cidades que permanecem fora ou à margem dela socialmente. Gomes (2006), apud Pádua (2015) os classifica como espaços de homogeneização social e aparecem como uma solução para as classes mais abastadas na medida em que oferecem todos os tipos de serviços que a cidade também poderia oferecer, sem precisar de correr os riscos que contêm a cidade, sugerindo uma vida mais segura e com maior qualidade.

A "urbanização" proposta por esse movimento de expansão do setor imobiliário esvazia o conceito de urbanização, pois revela mais um processo desurbanizante, que se utiliza dos elementos do urbano para se realizar, do que uma efetiva concretização dos elementos do urbano". (PÁDUA, 2015, p. 52).

O autor agora nos aponta uma situação de grande paradoxo que é o urbanismo na forma dos grandes condomínios residenciais fechados, se localizando dentro da cidade, se negando a ela e sendo a sua equivalente. São cidades em miniatura como também são os prédios corporativos, vendidos como um novo ideal de urbanismo, que se nega ao urbano e se isola da cidade, para fugir dos problemas existentes nela. Assim, a cidade deixa de ser o local de encontro dos mais variados tipo de pessoas e passa a ser um ponto de isolamento das diferenças, buscando um lugar sempre tendencialmente mais homogêneo.

Todos esses arranjos paisagísticos de um espaço encravado na cidade, sendo independente a ela, sugerem uma territorialidade ou uma delimitação de uma área pertencente a uma determinada classe social, que exclui uma grande parcela da sociedade. Assim como nas periferias que extrapolam a franja urbana, também se constituem numa territorialidade daqueles que não conseguiram se fixar nos locais mais privilegiados, ou pelo menos mais habitáveis da cidade.

A territorialidade como um conceito derivado de território, contém em si, relações de poder e controle. No caso, essas relações de poder e controle são exercidos por um grande conjunto dos produtores majoritários do espaço urbano: proprietários dos meios de produção, produtores e empreendedores imobiliários e o Estado, que possui um papel fundamental de provedor de infraestrutura, de regulação, de fiscalização, de condicionamento das classes, além de grande poder de intervenção no espaço urbano. A territorialidade do capital imobiliário impõe barreiras geográficas, que não são cadeias de montanhas, serras, escarpas ou cordilheiras, e sim, uma barreira geográfica com uma linha imaginária. Uma delimitação territorial constituída pelos fatores econômicos impostos pela lógica da propriedade privada e do modo de produção capitalista.

5. Direito à cidade (quem a possui?)

Como vimos no presente trabalho a espacialidade na Região Metropolitana de São Paulo, em todos os seus sentidos, se deu de forma desigual, em movimentos desiguais e combinados, de forma que seus fatores resultantes foram produzidos socialmente.

Ao contrario do que se pensa, o tempo e o espaço não são obras da natureza, mas produtos do trabalho humano. No caso urbano, o tempo se manifesta fundamentalmente por meio do tempo gasto pelos moradores da cidade em seus deslocamentos espaciais. [...] esse tempo está intrinsecamente ligado ao espaço urbano produzido. (VILLAÇA, 2012, p. 70).

Assim sendo, a paisagem urbana da RMSP como elemento estrutural da transformação humana do espaço, propicia e condiciona os demais fatores dentro da cidade e da sociedade a partir do momento em que essa paisagem cristalizada e construída socialmente pelos seus agentes sociais modela o espaço, tanto no seu aspecto físico, quanto em seu aspecto econômico e sociocultural, e também influencia no fator temporal histórico e contextual, determinando desde as questões mais complexas como também, as mais pragmáticas. Dentro dessas questões pragmáticas, temos o fator tempo como um elemento fundamental para a fluidez dos movimentos na metrópole.

Quando Villaça (2012) nos aponta que o tempo e o espaço não são obras da natureza, ou meramente fenômenos do acaso, ele nos diz que tempo e espaço são elementos construídos socialmente, onde esse espaço produzido e determinado pelos seus agentes sociais majoritários, munidos de capital, mediados pela ação do Estado em suas três esferas (União, Estados e Municípios), além de determinarem os investimentos, crescimentos e espaços diferenciais, promovem a segregação ou a seleção de pessoas nas suas mais variadas ações, e interferem nos mais variados movimentos e deslocamentos das pessoas no espaço urbano.

Assim, deteriora-se o Centro Histórico de São Paulo e se criam novas centralidades, que atrairão o setor de serviços e comércio sofisticados, escritórios corporativos, prédios residenciais, condomínios fechados, etc. onde as distâncias para essa parcela mais rica exercer suas várias atividades, tanto de trabalho, como de lazer, serão menores, assim como seu tempo de deslocamento será reduzido.

Essas áreas atraem também, trabalhadores e as expectativas de emprego dos habitantes dos mais variados cantos da metrópole, inclusive vindos de suas periferias ou de outros municípios da região, onde muitas vezes, o deslocamento dessa parcela da população será bem maior, em virtude de motivos vários como: distância do local de moradia para o local de trabalho, transporte público ineficiente ou insuficiente, vias de circulações precárias ou insuficientes, etc. o que aumenta o tempo de deslocamento dessas pessoas.

As áreas mais ricas da cidade, além de possuírem as mais variadas opções de serviços e empregos e a maioria dos elementos responsáveis pelo menor tempo de deslocamento, possuem os melhores equipamentos públicos, as melhores vias de circulação, e é onde os sistemas de transporte, além de possuírem as melhores condições de uso, também funcionam sistematicamente melhor.

Villaça, (2012, p. 95) - "A atuação sobre o poder político faz, por exemplo, com que o sistema viário e alguns sistemas de transporte (como o metrô, por exemplo) sejam, na região dos mais ricos, muito melhores que no restante da cidade". Assim então, podemos notar que o sistema de transportes no quadrante sudoeste é muito melhor, como as linhas: verde do metrô (Vila Alpina/Vila Madalena) e a linha amarela (Luz/Butantã), onde se encontram os trens mais novos circulando em curtos intervalos de tempo, as estações além de mais limpas e bem conservadas possuem o sistema inteligente de abertura e fechamento das comportas para evitar que os passageiros ultrapassem a linha amarela quando os trens estacionam na plataforma, dentre outros aspectos.

A Região de Grande Concentração das Camadas de Mais Alta Renda da Região Metropolitana, [...] tem o melhor sistema viário da metrópole, não só em termos de vias expressas, semi-expressas e avenidas, mas também em termos de túneis, viadutos, vias perimetrais, etc.. Ao produzir o sistema de transportes sobre trilhos o poder público vem prosseguindo nesse favorecimento da minoria mais rica em detrimento da maioria mais pobre. (VILLAÇA e ZIONI, 2005, p. 12).

O urbanismo na RMSP afetou toda a região de forma desigual. A extensa Zona Sul de São Paulo se expandiu horizontalmente na faixa contínua do que conhecemos hoje por centro expandido. A população que, ou não conseguiu se fixar nas proximidades das áreas mais ricas da cidade, ou que foram "expulsas" destas, achou na expansão da mancha urbana de São Paulo o seu local de moradia em loteamentos legais ou ilegais, que pouco a pouco começaram a se transformar em favelas, em virtude do grande adensamento que se espraiou espacialmente, atingindo então, boas parcelas dos mananciais das represas Billings e Guarapiranga.

A Zona Leste e os municípios do ABC Paulista foram em certa medida, ocupados ao redor de suas vias férreas, sendo a Zona Leste contemplada pelo sistema ferroviário Central do Brasil, ligando o Centro de São Paulo à Mogi das Cruzes, e o ABC Paulista pela estrada de ferro Santos-Jundiaí, onde a capital se situa praticamente no centro da via férrea ligando de sudeste - Rio Grande da Serra a noroeste em Francisco Morato. Podemos afirmar que nos municípios do ABC, principalmente Santo André, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul, e em certa medida, Mauá e Diadema, por terem sido contemplados pelo fenômeno industrial, a segregação (embora também seja bastante grave nestes municípios), não foi tão acentuada como nos extremos da porção leste da RMSP (de Itaquera até Mogi das Cruzes). Segundo Villaça (2012, p. 66), a Zona Leste:

[...] é a grande região dos mais pobres da metrópole. Servida por apenas uma linha de metrô (incompatível com suas dimensões demográficas) e por um péssimo serviço ferroviário suburbano, é a região dos "derrotados", ou seja, dos que perderam a disputa (de pobre versus pobre) pela proximidade do emprego industrial e da maior concentração de empregos terciários da metrópole [...]. (VILLAÇA. 2012, p. 66).

O deslocamento entre os municípios do ABC, a partir da consolidação do parque industrial paulista, se deu na maioria das vezes, de forma bastante dinâmica, de modo que o acesso entre os locais de moradia para os locais de trabalho, e vice-versa, (podendo ser esses deslocamentos para as indústrias ou comércios dentro de seus próprios municípios, ou nos municípios vizinhos, ou até mesmo para a capital) fosse realizado de forma não tão dificultosa quanto que para os moradores da Zona Leste, que normalmente tiveram e têm que se deslocar de seus bairros para o Centro da metrópole ou para a Zona Sul, ou até mesmo, precisando se deslocar para as indústrias e comércios no ABC32. VILLAÇA e ZIONI (2005, p. 30) [...] "a Zona Leste (que não é cruzada por nenhuma rodovia) nunca teve um significativo desenvolvimento industrial, apesar de ser uma grande região de moradia popular".

Na Zona Leste, o deslocamento normalmente se dá de forma mais difícil, pois a única linha de metrô existente só vai até Itaquera que fica praticamente no meio do caminho entra a capital e o extremo da região (Guaianases e Cidade Tiradentes) e não contempla a porção setentrional onde se situam os bairros de São Miguel Paulista, Itaim Paulista e Ermelino Matarazzo, e a porção meridional onde se situa São Mateus, obrigando os moradores destas localidades a ter que usar os sistemas de transporte rodoviário com menos vias de acesso do que possui a Zona Sul, o que possivelmente patrocina os intensos congestionamentos naquela área, ou as duas precárias linhas de trens que saem da Estação Brás/Roosevelt sentido Calmon Viana (Poá) e Estudantes (Mogi das Cruzes), e que operam em péssimas condições.

À Noroeste da metrópole, para se deslocar até o Centro de São Paulo, normalmente se usa a antiga ferrovia São Paulo Railway, construída ainda no século XIX, tendo esses moradores, poucas opções de transporte para a Capital, haja vista que municípios como Franco da Rocha e Francisco Morato possuem pouca disponibilidade de trabalho e lazer em seus territórios.

Diante disso, usamos esses exemplos como forma de problematizar as questões referentes ao espaço urbano, sobre o qual Villaça (2012) o define como um espaço produzido socialmente, onde as distâncias (do que pode ser considerado perto ou longe) e do tempo (considerado curto ou longo) tem relação direta com a determinação do interesse público e privado, na medida em que temos as melhores vias de circulação, e os melhores meios de transportes que normalmente atendem a uma parcela mais rica da população e que se concentram em sua maioria nessas áreas que se situam nas proximidades do Centro Histórico de São Paulo com a Zona Sul (principalmente no trecho do Centro Expandido, ou Quadrante Sudoeste).

Logicamente esses dois fatores (distância e tempo de deslocamento) não são os únicos ou mais importantes elementos que reforçam ou alimentam a segregação na RMSP, mas possuem um peso considerável e podem ser até considerados como uma resultante da segregação na RMSP, pois dificultam ou até mesmo inviabilizam em alguns casos, a circulação de uma grande parcela da população metropolitana para os seus locais de trabalho, compras, lazer e demais serviços, e torna proibitivo o seu direito à cidade, pois o setor de serviços ofertados que empregam uma grande quantidade de pessoas, assim como suas principais lojas e equipamentos de lazer e cultura se concentram entre o Centro Histórico e o Centro Expandido da capital.

Então, podemos afirmar que o direito à cidade não é igual para todas as pessoas que residem na Região Metropolitana de São Paulo, em virtude mesmo do espaço urbano produzido seguindo a lógica da propriedade privada versus necessidade coletiva, onde como já colocado neste trabalho, sempre se pautou na busca de se construir um espaço urbano em prol do capital e das parcelas mais ricas da cidade, estas que ficam geralmente com as partes mais privilegiadas da metrópole.

A Região Metropolitana de São Paulo foi e vem sendo desenvolvida para facilitar os processos de acumulação do capital, buscando desenhar a cidade e roteirizar o papel de seus atores ou agentes sociais, buscando acomodar um modelo de consumidores destes espaços concebidos sob a forma de uma mercadoria que agrega não só elementos físicos como os imóveis construídos e/ou transformados, mas também elementos culturais e socioeconômicos. Quem pode pagar o "ingresso", poderá desfrutar de tudo o que há de melhor nesses espaços, assim como podem obter o tão sonhado Direito à Cidade, que cada dia mais vem se tornando um privilégio de poucos.

6. Considerações finais

Vimos neste trabalho que o desenvolvimento da Região Metropolitana de São Paulo, atrelado ao desenvolvimento do capitalismo em suas diversas fases e em suas diversas facetas, se constituiu e ainda se constitui como um local estratégico para o desenvolvimento do processo de acumulação, produção e reprodução do capital, nas mais diversas escalas.

A cidade de São Paulo foi e vem sendo um local estratégico e um importante "dente na engrenagem" dessa máquina extremamente complexa da macroeconomia, que de livre e concorrencial até o século XIX, passou a ser cada vez mais imponente e monopolista ao longo de seu desenvolvimento.

Os efeitos desse desenvolvimento político e econômico, estabelecidos por parte das economias do capitalismo central, além de dividir as relações de produção mundial, passou também a impor novos modelos de desenvolvimento econômico e implicou na transformação radical dos países da periferia capitalista. Transformação essa revelada na paisagem da metrópole, articulada, fragmentada e um reflexo da sociedade (Corrêa 1989).

O modo de produção já construído e sistematizado pelas potências hegemônicas se tornou em um poderoso instrumento de dominação dessas potências frente aos países ainda não desenvolvidos, que por não disporem de uma força suficiente frente a um esquema fortemente montado, cumpriram seu papel de submissão e dependência que ditaram as regras do jogo, pelo qual o Brasil, na condição de um país retardatário do desenvolvimento econômico e industrial, teve que acatar.

As periferias da RMSP são reflexos de uma periferia do capital, que sempre dispôs de movimentos e investimentos desiguais, consequentemente produzindo desigualdades e reproduzindo a exclusão. As favelas são o resultado desse processo de acumulação do capital, que para isso, se fez necessário políticas de cunho desenvolvimentista e economicista, enfim, segregacionista, pelo qual o descaso público se torna um reflexo.

São Paulo não foi só "a bola da vez" para o desenvolvimento econômico produtivo do país, mas também, para o processo de acumulação do capital nacional e internacional, cada vez mais concentrado de riquezas nas mãos de uma minoria, dispersando seus habitantes, sobretudo, os excluídos, que sem muitas opções, "agarram" o que estiver aos seus alcances.

São Paulo é um ambiente excludente, que vive sob um sistema excludente e impõe um modo de vida pautada na exclusão, e ainda assim, continua sendo polo de atração, pois ainda é um local do país onde as coisas sempre aconteceram a partir de seu desenvolvimento econômico, e ainda continuam acontecendo sob esse viés. As riquezas continuam se acumulando, e os mais pobres continuam sendo expulsos, e mesmo assim, continuam precisando da cidade, mesmo tendo o seu direito a ela cada vez mais reduzido e morando cada vez mais longe do centro e das centralidades.

Este trabalho se pautou na produção do espaço urbano, onde a preocupação inicial foi tentar buscar a essência da lógica da produção do setor imobiliário da RMSP, e é claro que seria um assunto inesgotável pela complexidade do assunto, que não traz em si apenas o resultado material observado na paisagem. Existe e exige toda uma conjuntura econômica, histórica e contextual para que possamos compreender, (embora não tão detalhadamente), mas pelo menos de forma abrangente, de como foi a transformação do espaço nesta região, e abrir uma discussão de suma importância para a tentativa de alcançar e compreender a totalidade.

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1 Fornecedores e compradores

2 Movimento liderado pelo Tenente Luís Carlos Prestes que contava com oficiais de baixa e média patente do Exército brasileiro que estavam descontentes com a forma de governo exercida pelos oligarcas da Velha República.

3 A política do Café Com Leite foi uma política em que os Estados de São Paulo e Minas Gerais, por conta de suas economias, onde, Minas Gerais através do leite, e São Paulo através do café, tinham o poder de definir os rumos do país a partir do final do século XIX e início do século XX, dominando além da cena econômica, também a cena política, pois assim a presidência do país era alternada basicamente por membros da classe política entre esses dois Estados Federativos.

4 A agricultura também se faz muito presente nos dias de hoje, agora sob o título de agrobusiness,porém, deixa de ser um fator determinante na cultura e na economia do país, que começa a partir doperíodo de 1930, a ter na urbanização, o espelho de seu modo de vida nas próximas décadas, pelo menos em suas principais cidades, sobretudo São Paulo.

5 Com a superprodução do café, grandes quantidades ficavam praticamente sem utilidade mercantil.

6 IBGE - estimativas 2014.

7 Fonte - Emplasa.

8 Há uma peculiaridade no desdobramento dos municípios do ABC, correspondente a Santo André e São Bernardo que serão abordados no próximo item.

9 Santo Amaro era um município até o ano de 1935, data em que se torna um bairro distrito da cidade de São Paulo.

10 As outras regiões também oficializadas por esta lei são: Belo Horizonte, Porto Alegre, Salvador, Curitiba, Recife, Belém e Fortaleza.

11 IBGE.

12 Idem.

13 Segundo Almeida (2008), o conceito regional a partir de Vidal de La Blache, apesar de suas falhas e limitações ao caracterizar uma dada região, pelo fato de classificá-las de modo estático algumas vezes,sem levar em consideração, certas dinâmicas ou fenômenos físicos e sociais, ainda é um conceito de referência para estudos regionais, dado o fato de La Blache ser um dos pioneiros, senão o pioneiro na sistematização dos estudos regionais.

14 Pode ser que haja um equívoco contido no site da Prefeitura de Santo André quanto à colocação do termo "bairro de São Paulo", uma vez que este termo passa a ser empregado mais sistematicamente a partir do fenômeno da urbanização, e não no início da colonização portuguesa.

15 Prefeitura de Santo André.

16 Prefeitura de Santo André.

17 Idem.

18 Leia-se, circulação e escoamento de mercadorias.

19 Amenidades são elementos contidos numa paisagem que agregam um certo valor ao local onde ela se encontra. Pode ser uma amenidade natural como praias, rios, quedas d' água, ou amenidades socialmente construídas como parques, praças, cafés, etc..

20 Custo de vida é o valor em moeda corrente despendido pelas pessoas de um modo geral num determinado local e numa determinada época, para a manutenção de suas necessidades que podem ser vitais e básicas como os gastos com alimentação, saúde, transporte, vestuário, moradia, etc., como podem ser as necessidades vulgarmente conhecidas como mais supérfluas, normalmente relacionadas a objetos de prazeres e desejos pessoais, como vestuários de grife, carros de luxo, perfumes e cosméticos, vinhos e queijos, etc..

21 Isso ocorre principalmente com quem mora de aluguel, pois com a alta valorização do uso solo urbano em uma determinada área, o valor do aluguel tende a aumentar exponencialmente.

22 Villaça (2012) define como quadrante sudoeste a área que corresponde à continuidade do Centro deSão Paulo, partindo da Avenida Paulista, se expandindo para a Zona Sul até a região de Santo Amaro,passando por Butantã, Moema, Vila Olímpia, Vila Madalena e Morumbi, que é justamente onde se concentra a população mais rica de São Paulo.

23 Gentrificação deriva da palavra em inglês gentry que significa "nobre". O significado do termo"gentrificação" no texto está no sentido de enobrecimento de uma determinada área, que consiste nocaso deste trabalho, estabelecer uma equiparação deste enobrecimento com a ação dos grandes empreendedores imobiliários.

24 Claro que as grandes indústrias ainda controlam com bastante força as tomadas de decisões na metrópole, influenciando e demandando ações do poder público no sentido de se exigir cada vez mais subsídios para permanecer na cidade onde se encontra instalada, bem como em alguns casos, também podem demandar investimentos públicos na forma de recursos financeiros ou infraestruturas necessárias para suas instalações ou permanências.

25 AGCCAR - Área de Grande Concentração de Camadas de Alta Renda (Flávio Villaça, 2012). É uma sigla que o autor usa para definir essas áreas, que segundo o autor, em São Paulo se situa no Quadrante Sudoeste.

26 Mariana Fix (2009, p.13, nota de rodapé) - designação financeira mais precisa para a reviravolta das últimas décadas que expressa "as estreitas ligações entre os sistemas monetários e os mercados financeiros nacionais resultantes da liberalização e da desregulamentação adotados inicialmente pelos Estados Unidos e pelo Reino Unido entre 1979 e 1987 e nos anos seguintes pelos demais países industrializados".

27 A ilha de Manhattan é um dos cinco grandes distritos da cidade de Nova Yorque, e é o locus do capitalfinanceiro mundial.

28 Matéria jornalística publicada em 07/12/2013.

29 Usamos esse termo fazendo uma alusão à seleção natural de Charles Darwin, no qual a segregação eexclusão social causada pelo poder econômico se tornou um processo tão naturalizado em nossa sociedade, que essa mesma segregação e exclusão até parecem uma seleção natural darwiniana.

30 Termo adaptado do francês gourmet, normalmente relacionado à uma culinária sofisticada que normalmente possui um maior requinte do que as refeições que as pessoas consomem em seu dia-a-dia.O termo "gourmetização" na expressão popular se refere não só à culinária, mas também a vários elementos ligados à um estilo de vida de alto padrão de consumo.

31 Termos em inglês que significam: alta sociedade e alta tecnologia, respectivamente.

32 Um exemplo disso pode ser uma pessoa que mora no distrito de São Mateus (porção meridional da Zona Leste de São Paulo), se desloca para locais de trabalho, estudo ou lazer com muito mais facilidade para Santo André, por exemplo, do que para o Centro de São Paulo ou para o Quadrante Sudoeste.


Publicado por: Ismael de Bastos

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